Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
41/17.9PFSNT.L1-3
Relator: NUNO COELHO
Descritores: PRISÃO POR DIAS LIVRES
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/29/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PARCIALMENTE PROVIDO
Sumário: 1.– Com a entrada em vigor da Lei n.º 94/2017 de 23/8, em caso de condenação em pena de prisão por dias livres, há que ponderar à luz da aplicação da lei penal no tempo qual o regime mais favorável ao arguido (Art.º 29.º da Constituição da República Portuguesa e 2.º, n.ºs 1 e 4, do Código Penal).

2.– Não tendo a decisão condenatória transitado ainda em julgado e verificada a vigência da alteração legislativa em fase de recurso, essa mesma aplicação da lei no tempo (regime penal mais favorável) tem de equacionar todos os requisitos inerentes às penas substitutivas inscritas no catálogo do Código Penal na sua versão última, preferencialmente a obrigação de permanência na habitação, nos termos do actual Art.º 43.º do Código Penal.

3.– Não estando verificados todos os pressupostos de aplicação dessas penas substitutivas, há que constatar tal falta que constituirá uma superveniente insuficiência da matéria objecto de julgamento, por via directa da alteração legislativa acima descrita a qual terá de ser suplantada através do esquema de reabertura de audiência e proferimento de nova sentença, pela primeira instância.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 3.ª Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Lisboa.


I.RELATÓRIO:


Nos presentes autos o arguido L.S.P., foi condenado pela prática de um crime de desobediência, previsto e punível pelo Art.º 348.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, por referência ao Art.º 152.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3, do Código da Estrada, na pena de 6 (seis) meses de prisão. Mais foi determinado que a pena de prisão aplicada a este arguido deveria ser cumprida em 36 (trinta e seis) períodos de prisão por dias livres, de 48 (quarenta e oito) horas, cada um, a cumprir das 19 (dezanove) horas de Sexta-feira até às 19 (dezanove) horas de Domingo, com início no fim-de-semana subsequente à notificação da guia de apresentação no estabelecimento prisional, nos termos dos Art.ºs 45.º, do Código Penal e 487.º, ns.º 1 e 3, do Código de Processo Penal.

Foi também condenado, o identificado arguido, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de quaisquer categorias, pelo período de 12 (doze) meses, nos termos do disposto no Art.º 69.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal.

Não se conformando com a decisão, o arguido recorreu para este tribunal da Relação.

Nas suas alegações, o mesmo recorrente conclui a sua motivação nos seguintes termos:
1. Deu-se como provado, na matéria de facto, que o arguido teve uma última condenação há mais de cinco anos.
2.– Deu-se como provado que, após ter sido devolvido à liberdade, procurou, arranjou e manteve trabalho.
3.– Deu-se como provado que tem agregado familiar composto pela companheira e pela filha de ambos.
4.– Deu-se como provado que desde a última condenação não se conhece qualquer ilícito criminal posterior que tenha praticado.
5.– O arguido confessou integralmente e sem reservas os fatos de que vinha acusado no inquérito n.º 41/17.9PFSNT.
6.– O crime de que vem acusado não visa em primeira linha proteger qualquer bem jurídico, mas, ao invés, traduz-se numa violação de deveres.
7.– A decisão recorrida viola aos artigos 40.º, 50.º e 75.º, todos do Código Penal.
8.– A decisão recorrida viola a doutrina proposta pela habitualidade jurisprudencial, no que respeita às finalidades das penas, a saber, prevenção geral positiva de integração e prevenção especial.
9.– A decisão recorrida enferma de uma atitude omissiva – de análise – e, já por acção, de uma mera e efémera remissão para o registo criminal do arguido como formas de sustentar a aplicação de uma pena de prisão – ainda que substituída pela reclusão contínua – em detrimento da respectiva e adequada substituição.
10.– O arguido não é reincidente, à luz do Direito Penal e respectivos princípios, e, como tal, o último crime, cometido há mais de cinco anos, não releva para a reincidência (artigo 75.º, n.º 2, do Código Penal).
11.– De acordo com as circunstâncias do caso, o arguido, face à sua conduta actual, não é de censurar sendo certo que a condenação anterior serviu de suficiente advertência contra o crime.

Nestes termos e nos demais de Direito, que V.Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser totalmente procedente, por provado e tempestivo e, consequentemente:
i.– Deve o arguido ser condenado numa pena de prisão fixada em 3 meses, suspensa na sua execução, mediante regime de prova; ou, em alternativa;
ii.– Deve o arguido ser condenado numa pena de prisão fixada em 3 meses, substituída por uma pena de multa de 100 dias, à taxa diária de €5,00.

Na resposta ao recurso o Ministério Público pronunciou-se pelo não provimento do recurso, devendo a decisão proferida ser mantida na íntegra.

Nesta instância de recurso a Ex.ma Procuradora-geral Adjunta, reiterou as alegações do Ministério Público em 1.ª instância, emitindo parecer no sentido de que o recurso do arguido não merecia provimento, sendo de confirmar a decisão recorrida.

Na sequência e na menção de que tinha sido entretanto publicada a Lei n.º 94/2017 de 23/8, que no seu Art.º 2.º, veio alterar o Art.º 45.º do Código Penal, vieram a ser notificados a acusação e a defesa para, nos termos conjugados dos Art.ºs 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, ex vi Art.º 4.º do Código de Processo Penal, se pronunciarem em dez dias sobre a matéria e a aplicação da lei penal no tempo.

Cumprida essa notificação, nem a defesa do arguido nem o Ministério Público se pronunciaram sobre esta questão.
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II.QUESTÕES A DECIDIR.
Tendo em conta o teor das conclusões efectuadas pelo arguido/recorrente, saber da escolha e determinação da pena de prisão aplicada e da possibilidade da mesma ser substituída por outra pena não detentiva da liberdade, designadamente suspensão da execução da prisão ou mesmo pena de multa. Face ao direito transitório aplicável, demonstra-se ainda necessário resolver a questão da aplicação do regime penal mais favorável face à publicação e entrada em vigor da Lei n.º 94/2017 de 23/8, a qual, alterando o Código Penal em vigor, instituiu com maior amplitude o regime de permanência na habitação, extinguindo a pena de substituição aqui em causa, prisão por dias livres.
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III.FUNDAMENTAÇÃO.
Importa, num primeiro momento, atentar na decisão recorrida e na factualidade dada como provada pelo Tribunal, bem como na sua fundamentação jurídica apenas circunscrita às questões em discussão – a escolha e determinação da pena de prisão que lhe foi aplicada, em face das penas substitutivas aplicáveis.

Assim, na decisão recorrida apresenta-se a seguinte fundamentação:

“IIFUNDAMENTAÇÃO

Factos Provados
1.No dia 08/03/2017, cerca das 0 horas e 5 minutos, na Rua ……………., Rio de Mouro, área desta Comarca, o arguido efectuava a condução do veículo automóvel, ligeiro de passageiros, de matrícula XX-XX-XX.
2.Foi o arguido instado a efectuar o exame quantitativo de pesquisa de álcool no sangue, recusando o mesmo, não obstante ter sido advertido que tal comportamento consubstanciaria a prática de um crime de desobediência.
3.Pese embora tal advertência, o arguido recusou fazer o teste.
4.O arguido bem sabia que a ordem que lhe havia sido dada era legitima e que provinha de autoridade policial no exercício das suas funções e, bem assim, que a recusa o faria incorrer na prática de um crime de desobediência.
5.O arguido actuou de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo a sua conduta, proibida e punida por lei.

Outros factos, com relevo para a decisão da causa
6.O arguido confessou os factos de forma livre, integral e sem reservas.
7.O arguido aufere cerca de € 650, mensais.
8.Vive com a companheira, a qual se encontra desempregada e uma filha de 18 anos de idade, estudante.
9.A casa é própria, suportando mensalidade relativa a empréstimo bancário, no valor de € 250.
10.A viatura pertence-lhe.
11.O arguido tem o 6.º ano de escolaridade.

12.O arguido já sofreu as seguintes condenações:
a)-Por sentença do 1.º Juízo de Pequena Instância Criminal de Lisboa – 1.ª Secção, de 27/09/1996, atentos os factos praticados a 27/09/1996, transitada em julgado a 12/10/1996, por um crime de condução com álcool, na pena de 80 dias de multa e 2 meses de pena acessória de proibição de conduzir, declarada extinta, por prescrição, a 08/07/2004 (boletins ns.º 1 e 2);
b)-Por acórdão do Tribunal Judicial de Coruche, de 27/01/1999, atentos os factos praticados a 04/10/1992, transitado em julgado a 09/03/1999, por um crime de roubo, na pena de 250 dias de multa declarada extinta a pena, a 14/10/2002 (boletins ns.º 3 e 4);
c)-Por sentença do 3.º Juízo Criminal de Lisboa, de 02/11/2004, atentos os factos praticados a 25/03/2000, transitada em julgado a 15/09/2006, por um crime de condução de veículo sem habilitação legal, na pena de 4 meses de multa, declarada extinta, por prescrição, a 10/01/2007 (boletins ns.º 5 e 6);
d)-Por sentença do 1.º Juízo de Pequena Instância Criminal de Lisboa – 2.ª Secção, de 01/04/2005, atentos os factos praticados a 18/03/2005, transitada em julgado a 18/04/2005, por um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 120 dias de multa e 7 meses de pena acessória de proibição de conduzir, declaradas extintas, por cumprimento, a 09/06/2006 (boletins ns.º 7 e 8);
e)-Por sentença do 1.º Juízo Criminal de Sintra, de 03/10/2005, atentos os factos praticados a 02/08/2003, transitada em julgado a 18/10/2005, por um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 60 dias de multa e 4 meses de pena acessória de proibição de conduzir, declarada extinta a multa, por pagamento, a 03/11/2008 (boletins ns.º 9 e 10);
f)-Por sentença do 3.º Juízo Criminal de Sintra, de 16/07/2008, atentos os factos praticados a 08/07/1999, transitada em julgado a 15/09/2008, por um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 3 meses de prisão, substituída por 90 dias de multa e 5 meses de pena acessória de proibição de conduzir, declaradas extintas, por cumprimento, a 13/10/2010 (boletins ns.º 11 e 12);
g)-Por sentença do 3.º Juízo de Competência Criminal de Oeiras, de 25/03/2009, atentos os factos praticados a 30/10/1999, transitada em julgado a 04/05/2009, por um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 80 dias de multa e 3 meses de pena acessória de proibição de conduzir, declaradas extintas, por cumprimento, a 14/06/2011 e 20/01/2010 (boletins ns.º 13 a 15);
h)-Por sentença do Juízo de Pequena Instância Criminal de Lisboa – Juiz 2, de 23/03/2010, atentos os factos praticados a 10/11/2009, transitada em julgado a 23/04/2010, por um crime de violação de proibições, na pena de 4 meses de prisão substituída por 120 horas de trabalho a favor da comunidade, declarada extinta, por cumprimento, a 21/09/2013 (boletins ns.º 16 e 17);
i)-Por acórdão da 8.ª Vara Criminal de Lisboa, de 03/11/2010, atentos os factos praticados 25/05/2010, transitado em julgado a 23/11/2010, por um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, concedida liberdade condicional, a 05/03/2013 até 25/11/2014 (boletins ns.º 18 e 19).

Factos não provados
Inexistem, com relevo para a decisão da causa.

Motivação da decisão de facto
Para responder à matéria de facto, o tribunal atendeu ao apurado em sede de audiência de julgamento, analisando global e criticamente, segundo as regras da experiência e da livre convicção do tribunal, nos termos do artigo 127.º, do Código de Processo Penal.
Foram também tidos em conta os documentos juntos aos autos: auto de notícia e Certificado de Registo Criminal.
O Tribunal firmou a sua convicção nas declarações confessórias do arguido, o qual admitiu a prática dos factos, confirmando todo o circunstancialismo em que os factos ocorreram.
Relativamente à situação familiar, económica e social, atendeu-se igualmente às declarações do arguido.
 
ENQUADRAMENTO JURÍDICO-PENAL.
Vem o arguido acusado da prática, como autor e na forma consumada, de um crime de desobediência, previsto e punível pelo artigo 348.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal.
No crime de desobediência, tal como nos demais crimes contra a autoridade pública, o bem jurídico protegido é a autonomia intencional do Estado, “de uma forma particular, a não colocação de entraves à actividade administrativa por parte dos destinatários dos seus actos” (conf. MONTEIRO, Cristina Líbano; - Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo III, Coimbra Editora, 2001, pág. 350, no mesmo sentido Acórdão da Relação do Porto de 20 de Maio de 1987, CJ, XII, tomo III, pág. 225).
São elementos objectivos do tipo, verificados no caso concreto, o não cumprimento de ordem ou mandado legítimo e existência de disposição legal que comine, no caso, a punição da desobediência simples.
No caso em apreço, trata-se do artigo 152.º, n.º 3, do Código da Estrada, actualmente, sendo que a redacção se mantém a mesma tendo apenas ocorrido uma alteração de numeração, segundo o qual “devem submeter-se às provas estabelecidas para a detecção dos estados de influenciado pelo álcool (...) a) os condutores”, sendo que caso estes se “recusem submeter-se às provas estabelecidas para a detecção do estado de influenciado pelo álcool (...) são punidos com crime de desobediência”.
Da factualidade dada como provada, com relevo para este tipo criminal, resulta que o arguido conduzia um veículo tendo sido fiscalizado e quando interpelado para realizar teste de alcoolemia, se recusou a efectuá-lo. Acresce que resultou demonstrado que a autoridade policial o informou da correspondente cominação legal/resultante da lei, ainda que tal facto não seja relevante para a subsunção legal, uma vez que a consequência de tal recusa se encontra prevista legalmente, certo é que resultou apurado ter sido efectuada, daí considerada nos factos provados.
Mais resultou que o arguido ao proceder daquela forma, fê-lo consciente da sua conduta ser proibida e punida por lei, representou que estava obrigado a efectuar o exame, mas ainda assim decidiu não o fazer e conformou com tal resultado. O arguido actuou, pois, com dolo directo, nos termos do n.º 1, do artigo 14.º, do Código Penal.
Assim, perante os factos que resultaram provados, dúvidas não restam de que o arguido praticou os factos de vinha acusado, verificando-se in casu, preenchido o tipo objectivo e subjectivo do mencionado crime.
Não se verificam quaisquer causas de exclusão de ilicitude e/ou da culpa, nem falta qualquer condição de punibilidade, posto que, apesar das declarações prestadas pelo arguido e as razões subjacentes à sua actuação, não configuram as mesmas qualquer causa de exculpação ou exclusão da ilicitude.
 
DA PENA E DA MEDIDA DA MESMA
Efectuada a subsunção legal, há que atender a dois vectores para a determinação da medida concreta da pena: a culpa do agente e as exigências de prevenção.

Ao crime em apreço cabe a pena de prisão até 1 ano ou multa até 120 dias e, sendo caso disso, a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre 3 meses e 3 anos, nos termos do disposto no artigo 69.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal.

Sendo aplicável, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o artigo 70º, do Código Penal, impõe que se dê preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
As exigências de prevenção geral, em matéria de condução de veículo rodoviário são fortes, pelo grave perigo de ofensa de bens de inestimado valor, tais como a vida, a integridade física, a segurança e ordenação rodoviária, sendo ainda de atender à conduta anterior do arguido, onde sobressaem os seus antecedentes criminais, averbando condenações por factos praticados entre 1992 e 2010, por nove vezes, sendo sete delas contra a segurança rodoviária e duas de outro tipo de crime e gravidade, em seis penas de multa e três penas de prisão, ora substituídas, ora efectiva, o que permite concluir que as penas em que foi condenado não foram de molde a que não voltasse a violar o concreto bem jurídico tutelado.
Quanto a estes antecedentes criminais ponderados, uma palavra para esclarecer que, não obstante o lapso temporal decorrido desde a prática dos mesmos – 25, 21, 18, 14, 12 e 7 anos – serão de ponderar, nos termos da Lei n.º 37/2015, de 05/05, no seu artigo 11.º, no qual de dispõem os prazos de cancelamento definitivo, no registo criminal, das condenações sofridas, sendo que a mesma se prende sempre com o decurso de prazo sobre a data da extinção da pena e se não existirem averbamentos posteriores.
Ora, o caso dos autos, não encontra acolhimento na referida disposição legal, posto que a extinção de pena – em relação à última condenação – ainda nem sequer ocorreu, conforme informação obtida e ainda que por razões alheias ao arguido, encontrando-se em liberdade definitiva desde 2014, devendo e sendo, assim de considerar em condenação posterior, como é o caso da presente.
Como tal, crê-se incontroverso que se justifica a opção por uma pena privativa da liberdade, pensando-se que uma pena não privativa, de multa, não bastará para satisfazer as finalidades que as penas perseguem.
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Determinada que está a pena abstractamente aplicável ao arguido importa, então, estabelecer a concreta medida da pena, sendo a culpa e a prevenção os dois vectores a considerar (v. g. artigo 71º, do Código Penal). O primeiro fornece o limite máximo da pena que ao caso cabe aplicar, sendo depois razões de prevenção (geral de integração e especial de socialização) que condicionam a medida final e concreta da pena.
A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo o tribunal a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor ou contra aquele, como determina o artigo 71.º, do Código Penal, que exemplificadamente, enumera alguns daqueles factores.
Nos termos do artigo 40.º, do mesmo diploma legal, a pena não pode ultrapassar a medida da culpa.
Como ensina o Prof. Figueiredo Dias, a propósito do modelo de determinação da pena, compete “à culpa a função (única, mas nem por isso menos decisiva) de determinar o limite máximo e inultrapassável da pena; à prevenção geral (de integração) a função de fornecer uma «moldura de prevenção», cujo limite máximo é dado pela medida óptima de tutela dos bens jurídicos – dentro do que é consentido pela culpa – e cujo limite mínimo é fornecido pelas exigências irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico; e à prevenção especial a função de encontrar o quantum exacto de pena, dentro da referida «moldura de prevenção», que melhor sirva as exigências de socialização (ou, em casos particulares, de advertência ou de segurança) do delinquente” (DIAS, Figueiredo - Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 3, Abril – Dezembro de 1993, pág. 186 e 187).
Em consonância, segundo o artigo 71.º, do Código Penal, a medida da pena é determinada em função da culpa do agente e das exigências de prevenção e atendendo ainda às circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, revelem a favor ou contra o arguido, nomeadamente as aludidas no n.º 2 desse preceito.
A pena concreta há-de pois, fixar-se entre um limite mínimo e um limite máximo adequados à culpa, tendo como referencial os mencionados fins de prevenção geral e especial.
A aplicação de qualquer pena tem desde logo em vista a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente. Com efeito, as finalidades de aplicação da pena residem primordialmente na tutela dos bens jurídicos e, tanto quanto possível, na reinserção do agente na comunidade, surgindo a defesa da ordem jurídico-penal como finalidade primeira a prosseguir.
In casu, a prevenção geral afigura-se particularmente elevada, atentos os bens jurídicos ofendidos a autoridade do Estado e o cumprimento das regras de segurança e ordenação rodoviária.
E no que concerne à prevenção especial de socialização, conforme supra referido, são de considerar os antecedentes criminais do arguido, pela prática desde 1992, de nove crimes, sendo certo que o arguido não se coibiu de praticar novos factos, pelo que as penas aplicadas não foram suficientes para o afastar da prática de tais factos.
Por conseguinte, e com vista a garantir a satisfação das finalidades preventivas a pena deverá situar-se ligeiramente na mediana da moldura da pena.
O Tribunal atendeu ainda ao grau doloso das condutas do arguido, na modalidade de dolo directo, e a ilicitude que se reputa muito elevada, atendendo ao repetido e reiterado desrespeito pelas normas vigentes.
Ponderando todas estas circunstâncias, entende-se adequada e proporcionada a condenação do arguido na pena de 6 meses de prisão, relativamente ao crime imputado, ponderando igualmente a postura do arguido em audiência, com a confissão dos factos, o que, habitualmente, não ocorre neste tipo de crime, mantendo, os arguidos, a postura que já haviam assumido perante os agentes de autoridade.
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Da substituição da pena de prisão
Fixada a pena concreta, é altura de analisar e ponderar da aplicação ao mesmo de pena substitutiva da execução da pena de prisão.
In casu, e atentas as circunstâncias dadas como provadas, concretamente as referentes aos antecedentes criminais do arguido, entendo que não se mostra adequada e suficiente para prevenir o cometimento de novos crimes, a substituição da pena de prisão aplicada por pena de multa, a qual, em consequência, se afasta, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 43.º, do Código Penal, da mesma forma que se referiu quanto à pena principal e, ainda que, nesta sede estivesse em apreciação a título de pena substitutiva, entende-se não satisfazer as necessidades de prevenção em causa.
Assim como a substituição da pena de prisão por prestação de trabalho a favor da comunidade, a qual, em termos de necessidade de prevenção se entende, igualmente, não se adequar à situação em concreto, nem à culpa do arguido, havendo ainda de referir, ademais, já ter o arguido beneficiado da substituição de penas de prisão, por este tipo de penas substitutivas.

Da suspensão da pena de prisão
Pressupõe o artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal, que a pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos deve ser suspensa, se: “(…) atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
“A suspensão da execução da pena constitui uma medida de conteúdo reeducativo e pedagógico, de forte exigência no plano individual, particularmente adequada para, em certas circunstâncias e satisfazendo as exigências de prevenção geral, responder eficazmente a imposições de prevenção especial de socialização, ao permitir responder simultaneamente à satisfação das expectativas da comunidade na validade jurídica das normas violadas, e à socialização e integração do agente no respeito pelos valores ao direito, através da advertência da condenação e da injunção que esta impõe para que o agente conduza a vida de acordo com os valores inscritos nas normas” (neste sentido, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19 de Maio de 2004 in www.dgsi.pt, proc. 3549/2004-3).
Esta disposição legal representa, deste modo, um poder-dever, estando o juiz obrigado a suspender a execução da pena de prisão, sempre que os respectivos pressupostos se verifiquem.
Esta medida tem um carácter reeducativo e pedagógico, que nunca é demais salientar.
É desde logo pressuposto da suspensão da execução da prisão a formulação de «juízo de prognose» favorável relativamente ao comportamento futuro do arguido, no sentido de quanto a ele a simples censura e ameaça da pena de prisão serem suficientemente dissuasoras da prática de futuros crimes. Não se torna necessário que o juiz tenha de atingir a certeza sobre o desenrolar futuro do comportamento do arguido, mas a esperança fundada de que a socialização em liberdade possa ser alcançada.
Tal juízo no caso concreto, atento o teor do Certificado de Registo Criminal do arguido, não se mostra favorável, não se afigurando que a simples ameaça de execução da pena seja suficiente para inibir a prática pelo arguido de novos crimes, como o não foram até ao presente, as sucessivas penas de multa e de prisão, ora substituídas, ora efectiva, razão pela qual se afasta a sua aplicação.

No que respeita aos demais regimes previstos e seguindo a lógica do Código, concretamente do confronto do regime da permanência na habitação, introduzido pela redacção da Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, com o regime da semidetenção e da prisão por dias livres, ponderando as finalidades na base de cada uma delas, o nível de privação da liberdade que implicam e as razões que a situação do arguido reclama, entendo que se reveste de maior proporcionalidade e adequação a aplicação ao mesmo do regime de prisão por dias livres, permitindo assim manter-se disponível para uma vida activa, atenta a sua idade – 42 anos.
Nos termos do artigo 45.º, do Código Penal, “a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano, que não deva ser substituída por pena de outra espécie, é cumprida em dias livres sempre que o Tribunal concluir que, no caso, esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
A prisão por dias livres tem por finalidade limitar o mais possível os efeitos criminógenos da privação continuada da liberdade, evitando ou, pelo menos, atenuando os efeitos perniciosos de uma curta detenção de cumprimento continuado, nos casos em que não é possível renunciar à ideia de prevenção geral (Cfr. Preâmbulo do Código Penal, ponto 7, e Eduardo Correia, As Grandes Linhas da Reforma Penal, Jornadas de Direito Criminal, Ed. Centro de Estudos Judiciários, Fase I, Lisboa, 1983, p. 28).
“Sem afastar de todo o conteúdo de sofrimento inerente a toda a prisão, e, deste modo, o seu carácter intimidativo, a prisão por dias livres é uma forma de reagir contra os perigos que se contêm nas normais penas de curta duração e de, ao mesmo tempo, manter, em grande parte, as ligações do condenado à sua família e à sua vida profissional” (Acórdão do Supremo Tribunal Justiça 2 de Março de 1988, Boletim do Ministério da Justiça, 375, 204).
Efectivamente, de tudo o que se deixou dito, resulta que a presente forma de cumprimento, visando garantir a satisfação das razões de prevenção, reprovar de forma firme a conduta do agente e afastá-lo da prática de idênticos ilícitos, com a criação de um regime intermédio, assegura tais objectivos/finalidades.
Neste âmbito e sem prejuízo do supra dito, atenta a sua situação pessoal e do agregado, a sua idade, como forma de permitir assim manter disponibilidade para trabalhar, entende-se, que a pena de 6 meses de prisão aplicada, deverá ser cumprida em dias livres, fixando-se para o efeito que o arguido cumpra 36 períodos, de 48 horas, das 19 horas de Sexta-feira até às 19 horas de Domingo, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 45.º, do Código Penal, este regime em termos de horas, mais exigente, dado o contacto anterior que o arguido já teve com o sistema prisional, atento o cumprimento de pena de prisão efectiva.
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Pena acessória:
Ao crime praticado pelo arguido corresponde em abstracto, a aplicação da pena acessória prescrita pelo artigo 69.º, do Código Penal, de proibição de conduzir veículos com motor, por um período fixado entre três meses e três anos.

Tal não poderá significar, no entanto, que se entenda ser aquela pena acessória de aplicação automática, devendo antes interpretar-se o citado normativo no sentido de prescrever a mera possibilidade de aplicação da sanção, atentas as circunstâncias do caso concreto, sob pena de, caso contrário, se violar o princípio plasmado no artigo 65.º, do Código Penal e no próprio artigo 30.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.

Considera-se assim, conforme se salientou no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 21 de Junho de 1995, que a lei “não estabelece qualquer proporcionalidade entre a taxa de álcool no sangue e a sanção acessória de inibição de conduzir, devendo esta ser fixada pelo tribunal perante todas as circunstâncias apuradas, nos termos do disposto no artigo 72.º do Código Penal”.

O mesmo é dizer que a aplicação do artigo 69.º, do Código Penal não pode ocorrer como simples consequência da condenação pelas infracções nele referidas, de forma meramente mecanicista, sem qualquer mediação do julgador e consideração dos factos pertinentes, devendo realçar-se, no entanto, as fortes motivações de prevenção geral que subjazem a tal preceito.

Ora, in casu, a demonstrada recusa de submissão a provas legalmente estabelecidas para detecção de condução de veículos sob efeito do álcool, aliado à postura em audiência, entende-se ser necessária a aplicação da referida pena acessória, considerando igualmente as antecedentes penas acessórias aplicadas.

Tudo ponderado, e atentos igualmente os critérios gerais referidos no artigo 71.º, do Código Penal, nomeadamente o grau de ilicitude do facto e a intensidade do dolo, temos por adequado fixar a aplicação ao arguido da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 12 meses, nos termos do disposto no artigo 69.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal.
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Das custas
Atenta a condenação do arguido, é este responsável pelo pagamento das custas do processo, em observância do disposto nos artigos 513.º e 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, 8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa a esse mesmo diploma e artigo 344.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC, reduzida a metade, em face da confissão.
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III–DISPOSITIVO
a)-Condenar o arguido L.S.P.F.M.S.P., como autor material da prática de um crime de desobediência, previsto e punível pelo artigo 348.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, por referência ao art. 152.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3, do Código da Estrada, na pena de 6 (seis) meses de prisão;
b)-Determinar que a pena de prisão aplicada ao arguido deverá ser cumprida em 36 (trinta e seis) períodos de prisão por dias livres, de 48 (quarenta e oito) horas, cada um, a cumprir das 19 (dezanove) horas de Sexta-feira até às 19 (dezanove) horas de Domingo, com início no fim-de-semana subsequente à notificação da guia de apresentação no estabelecimento prisional, nos termos dos artigos 45.º, do Código Penal e 487.º, ns.º 1 e 3, do Código de Processo Penal;
c)-Condenar o arguido na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de quaisquer categorias, pelo período de 12 (doze) meses, nos termos do disposto no artigo 69.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal;
d)-Condenar o arguido no pagamento das custas do processo, com a taxa de justiça que se fixa em 1 UC, reduzida a metade face à confissão, nos termos dos artigos 513.º, 514.º, 344.º, n.º 2, alínea c), do Código Processo Penal e 8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa.
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Após trânsito:
- Remeta boletim à D.S.I.C.;
- Comunique a presente decisão à A.N.S.R./I.M.T., D.G.R.S.P. e T.E.P.;
- Solicite à D.G.R.S.P., indicação do E.P. para cumprimento da pena aplicada, com vista à emissão de guia de apresentação.
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Ordena-se o depósito da sentença, nos termos do disposto no artigo 372.º, n.º 5, do Código de Processo Penal.
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Notifique, sendo o arguido para entregar a sua licença de condução, na Secretaria deste Tribunal ou no posto policial da sua área de residência, no prazo de dez dias (artigo 69.º, n.º 3, do Código Penal), a contar do trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de apreensão, nos termos do artigo 500.º, n.º 3, do Código de Processo Penal e de, não o fazendo no referido prazo, cometer o crime de desobediência, previsto e punido, pelo artigo 348.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal (conforme Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 2/2013, do Supremo Tribunal de Justiça).
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(texto processado em computador e revisto pela signatária
- artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal)
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Sintra, 19/04/2017”
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Importa analisar, agora, sobre cada um dos fundamentos suscitados pelo recorrente, em atenção à questão formulada da escolha e determinação da pena de prisão e da substituição desta por outra pena não detentiva da liberdade, nomeadamente a pena de multa ou a suspensão da execução da prisão.
Face ao direito transitório aplicável, demonstra-se ainda necessário resolver a aplicação do regime penal mais favorável face à publicação e entrada em vigor da Lei n.º 94/2017 de 23/8, a qual, alterando o Código Penal em vigor, instituiu com maior amplitude o regime de permanência na habitação, extinguindo a pena de substituição prisão por dias livres aqui concretamente aplicada.
Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. Art.º 119.º, n.º 1; 123.º, n.º 2; 410.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CPPenal, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25/6/1998, in BMJ 478, pp. 242, e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).
Nessa consideração, atender-se-à ao objecto aqui em apreciação, que diz respeito à condenação em prisão resultante da prática de um crime de desobediência por recusa ao exame de pesquisa de alcoolémia aquando de acção de fiscalização por condução de veículo automóvel em estado de embriaguez. 
No seu recurso o arguido, aqui recorrente, alega, entre outros argumentos, que a decisão recorrida enferma de uma atitude omissiva – de análise – e, já por acção, de uma mera e efémera remissão para o registo criminal do arguido como forma de sustentar a aplicação de uma pena de prisão – ainda que substituída pela reclusão contínua – em detrimento da respectiva e adequada substituição. Mais afere que não é reincidente, à luz do direito penal e respectivos princípios, e, como tal, o último crime, cometido há mais de cinco anos, não releva para a reincidência (Art.º 75.º, n.º 2, do Código Penal).
Ora, não se entende esta argumentação que se tem como perfeitamente inconcludente, pois o tribunal a quo não se baseou na aplicação do regime penal da reincidência e apenas tratou de evidenciar, como era aliás seu dever, o passado criminal do arguido e a subsistência no registo criminal não obstante o tempo decorrido. Isto não se confunde com a evocação do regime da reincidência.
Recorda-se, aqui, a passagem da sentença recorrida:
Quanto a estes antecedentes criminais ponderados, uma palavra para esclarecer que, não obstante o lapso temporal decorrido desde a prática dos mesmos – 25, 21, 18, 14, 12 e 7 anos – serão de ponderar, nos termos da Lei n.º 37/2015, de 05/05, no seu artigo 11.º, no qual de dispõem os prazos de cancelamento definitivo, no registo criminal, das condenações sofridas, sendo que a mesma se prende sempre com o decurso de prazo sobre a data da extinção da pena e se não existirem averbamentos posteriores.
Ora, o caso dos autos, não encontra acolhimento na referida disposição legal, posto que a extinção de pena – em relação à última condenação – ainda nem sequer ocorreu, conforme informação obtida e ainda que por razões alheias ao arguido, encontrando-se em liberdade definitiva desde 2014, devendo e sendo, assim de considerar em condenação posterior, como é o caso da presente.

E quanto a esta condenação pela prática do crime de desobediência, sabe-se que ao arguido foi aplicada a pena de 6 (seis) meses de prisão, a cumprir em 36 (trinta e seis) períodos de prisão por dias livres, de 48 (quarenta e oito) horas, cada um, a cumprir das 19 (dezanove) horas de Sexta-feira até às 19 (dezanove) horas de Domingo, com início no fim-de-semana subsequente à notificação da guia de apresentação no estabelecimento prisional, nos termos dos Art.ºs 45.º, do Código Penal e 487.º, ns.º 1 e 3, do Código de Processo Penal. Foram afastadas outras possibilidades de penas não detentivas da liberdade, designadamente as pretendidas penas de multa ou a suspensão da execução da prisão.
Cumpre apreciar, designadamente se a pena aplicada ao arguido, prisão por dias livres, não deveria ter sido aplicada, ao invés da pena de multa substitutiva ou da suspensão da execução da prisão mediante regime de prova, tal como pedido em recurso pelo arguido/recorrente.
Isto, para além de se saber, que mesmo a considerar esta pena de prisão por dias livres em que o arguido foi condenado, face à entrada em vigor das alterações legais resultantes da Lei n.º 94/2017 de 23/8, nomeadamente do seu Art.º 2.º, veio a desparecer do catálogo das penas substitutivas da prisão, sendo alterado o Art.º 45.º do Código Penal que consagra agora prevalecentemente o regime da permanência na habitação e revogado o Art.º 487.º, n.ºs 1 e 3, do Código de Processo Penal.
Ora, torna-se evidente que esta alteração terá de ser equacionada, por este tribunal, em termos de aplicação da lei penal no tempo (cfr. Art.º 2.º, n.ºs 1 e 4, do Código Penal) e na consideração do princípio constitucional da aplicação retroactiva da lei penal de conteúdo mais favorável ao arguido (Art.º 29.º da Constituição da República Portuguesa).
A acusação e a defesa foram ouvidas sobre esta precisa questão e nada disseram sobre a matéria.
Sobre a primeira das questões que têm a ver com a aplicação primeva da prisão por dias livres, julgamos que atenta a situação sub judice comprovada e a moldura penal prevista para o crime de desobediência em questão, que a aplicação de uma pena de prisão de seis meses se enquadra como ajustada.
Ao fixar a pena de prisão efectiva em seis meses, cumprida em trinta e seis períodos de trinta e seis horas de dias livres, o tribunal a quo fê-lo de forma ajustada, atentos os antecedentes criminais do arguido.
Ora, tal como se refere na sentença ora recorrida, verificamos que a prevenção geral se afigura elevada, atentos os bens jurídicos ofendidos. Na verdade, o crime em apreço é uma afronta as autoridades e denota um desrespeito pelo Estado de Direito.
Acresce que o crime praticado pelo arguido decorre de uma obrigação que se impõe a todo e qualquer condutor que circule na via publica - submissão ao teste de despistagem de álcool no sangue, não podendo aquele recusar-se a fazê-lo, no intuito de furtar não só à obrigação legal que se lhe impõe pelo Código da Estada, como também, de se furtar à responsabilidade penal pela eventual prática do crime de condução de veículos em estado de embriaguez.
No que tange à prevenção especial de socialização e reintegração social que ao arguido se impõe, considera-se que a mesma é ainda mais elevada, o que está espelhado no CRC junto aos autos, de onde decorrem as inúmeras condenações pelas quais já foi condenado, e cujos efeitos as penas, se mostraram, infelizmente inócuas, porquanto não foram suficientes para o afastar da prática reiterada de crimes.
O arguido não manifestou, pese embora as penas em que já foi condenado, muitas delas por crimes da mesma natureza, um juízo critico que nos permita concluir que este interiorizou a censurabilidade das condutas praticadas e, que não voltará a cometer crimes. A circunstância de ter sido, inclusive, já condenado em penas de prisão efectiva, não surtiram igualmente qualquer efeito no arguido no sentido de o dissuadir a praticar novos crimes, sendo certo que o crime da natureza do praticado nestes autos denota um acrescido desrespeito pelas autoridades e pela ordem pública, porquanto põe em causa a autoridade, garante do Estado de Direito, como acima se afirmou.
A distância temporal entre os ilícitos criminais anteriormente praticados e este novo crime, que é valorizada pelo recurso, fica assim devidamente relativizada, sendo aqui de acolher o que manifestou o tribunal a quo na sentença recorrida.
Com efeito, na determinação da pena aplicada ao arguido/recorrente, atendeu o tribunal a quo, com equilibrado critério, não só a todos os elementos dosimétricos do Art.º 71.º, do Código Penal, como ao princípio estabelecido no n.º 2 do Art.º 40.º do mesmo Código, o qual proclama que “Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.
É que, ao contrário do que alega o recorrente, estes princípios não foram, de modo algum, desrespeitados.
O crime pelo qual o recorrente foi julgado nestes autos, é punível com prisão ou multa.
Dispõe também o Art.º 70.º do Código Penal que, “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Por seu turno, o Art.º 43.º do Código Penal, sob a epígrafe “Substituição da pena de prisão”, estabelece, no seu n.º 1, que “a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes”.
Nos termos do Art.º 45.º, n.º 1, do Código Penal, na redacção anterior à Lei n.º 94/2017 de 23/8, aplicada na sentença em recurso, “a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano, que não deva ser substituída por pena de outra espécie, é cumprida em dias livres sempre que o tribunal concluir que, no caso, esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Por sua vez, dispõe o Art.º 50.º, n.º 1, do mesmo Código Penal, que “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
E nos termos do Art.º 58.º, n.º 1, desse Código, “se ao agente dever ser aplicada pena de prisão não superior a dois anos, o tribunal substitui-a por prestação de trabalho a favor da comunidade sempre que concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Decorrem estas normas de um dos pensamentos fundamentais do sistema punitivo consagrado neste Código Penal de 1982/1995: o da reacção contra as penas institucionalizadas ou detentivas, por sua própria natureza lesivas do sentido ressocializador – em especial, quando de curta duração – que deve presidir à execução das penas.
O Código traça um sistema punitivo que arranca do pensamento fundamental de que as penas devem ser executadas com um sentido pedagógico e ressocializador (cfr. Preâmbulo do Código Penal, ponto 7).
Comecemos pela hipótese da suspensão da execução da pena de prisão.
Tal como dissemos, o Código Penal estipula que «O Tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição» - cfr. Art.º 50.º, n.º 1, do Código Penal.
A suspensão da execução da pena de prisão, como pena de substituição, não deixa de estar vinculada às finalidades que o citado Art.º 40.º do Código Penal estabelece como critério fundamental na aplicação das penas.
O que está em causa, na opção de aplicar uma pena de substituição é a protecção de bens jurídicos e da reintegração do agente na sociedade (n.º 1 deste Art.º 40.º), sendo que a opção sobre a suspensão da execução da pena privativa de liberdade radica na concretização de um juízo de prognose efectuado no sentido de apurar se face ao circunstancialismo provado relativo à personalidade do arguido é possível evidenciar-se que as finalidades subjacentes à aplicação da pena não necessitam da efectivação da pena de prisão.
A suspensão da execução da pena de prisão, como pena de substituição com objectivo primeiro de evitar a efectivação da pena de prisão, face à natureza de ultima ratio que esta pena assume, não deixa de estar vinculada às finalidades que o Art.º 40.º do Código Penal estabelece como critério fundamental na aplicação das penas. A decisão do tribunal, qualquer que ela seja, exige uma fundamentação específica, devendo explicitar as razões do juízo de prognose (positivo ou negativo) que formule quanto ao mencionado comportamento futuro do condenado (cfr., entre outros, os acórdãos do STJ, de 20/2/2003, CJ/Acs STJ, 2003, t1,  206, e de 11/2/2010, este disponível em www.dgsi.pt/jstj, e o acórdão desta RL de 27/1/2010, também disponível em www.dgsi.pt/jtrl; jurisprudência que acolhe a doutrina de Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, op. cit., p. 341-342), constituindo a falta de pronúncia expressa uma nulidade que é de conhecimento oficioso, nos termos do art.º 379.º, n.ºs 1, al. c), e 2, do CPPenal (cfr. acórdão do STJ, de 20/2/2008, em www.dgsi.pt/jstj).
É neste juízo de prognose que assenta essencialmente a especificidade desta pena e na razão de ser das suas virtualidades no leque de penas não detentivas substitutivas da prisão. O juízo de prognose de que aqui se fala nada mais é que uma previsão sobre o comportamento futuro do arguido, ou seja, trata-se de saber se, tendo em conta a sua personalidade, as suas condições de vida, a conduta anterior e posterior ao facto punível e as circunstâncias deste, é possível concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, sobretudo se bastarão para afastar o arguido da criminalidade, pois é esta a finalidade precípua do instituto da suspensão.
Entram aqui razões de prevenção geral, ligadas com os bens jurídicos protegidos tendo por destinatários a comunidade política e social, mas também de prevenção especial, ligadas com as circunstâncias concretas do caso e também do âmbito de subjectividade do arguido e do seu contexto social de vida.
Sendo considerações de prevenção geral e de prevenção especial (de (res)socialização) que estão na base da aplicação das penas de substituição, o tribunal recusará essa aplicação “quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente” ou, não sendo o caso, a pena de substituição só não deverá ser aplicada “se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias” – cfr.   Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, op. cit., pp. 333, e o acórdão desta RL de 17/4/2012, processo n.º 232/11.6JELSB.L1-5, em http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/db3db3a0dede0789802579e6003e95fa?OpenDocument&Highlight=0,suspens%C3%A3o,da,execu%C3%A7%C3%A3o,pris%C3%A3o.
Se é certo que a existência de condenações anteriores constitui um índice de exigências acrescidas de prevenção, também se aceita facilmente que essa circunstância não é impeditiva a priori da concessão da suspensão.
Relativamente ao juízo de prognose que importa efectuar – e é só esse que neste momento importa fazer – há que ponderar toda a factualidade que envolve: (i) a personalidade do arguido; (ii) as condições da sua vida; (iii) a sua conduta anterior e posterior ao crime; (iv) as circunstâncias do crime.
Ora no caso em apreço, está em causa a concretização de uma pena de prisão de seis meses em que o aqui arguido foi concretamente condenado, pelo cometimento em 8/3/2017, nas circunstâncias descritas, deste crime de desobediência.
O tribunal a quo fundamentou da seguinte forma a decisão de denegar primeiro a substituição por pena de multa e a suspensão da execução da pena de prisão, bem como a opção pela prisão por dias livres ou mesmo pelo regime de semi-detenção:
Da substituição da pena de prisão
Fixada a pena concreta, é altura de analisar e ponderar da aplicação ao mesmo de pena substitutiva da execução da pena de prisão.
In casu, e atentas as circunstâncias dadas como provadas, concretamente as referentes aos antecedentes criminais do arguido, entendo que não se mostra adequada e suficiente para prevenir o cometimento de novos crimes, a substituição da pena de prisão aplicada por pena de multa, a qual, em consequência, se afasta, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 43.º, do Código Penal, da mesma forma que se referiu quanto à pena principal e, ainda que, nesta sede estivesse em apreciação a título de pena substitutiva, entende-se não satisfazer as necessidades de prevenção em causa.
Assim como a substituição da pena de prisão por prestação de trabalho a favor da comunidade, a qual, em termos de necessidade de prevenção se entende, igualmente, não se adequar à situação em concreto, nem à culpa do arguido, havendo ainda de referir, ademais, já ter o arguido beneficiado da substituição de penas de prisão, por este tipo de penas substitutivas.

Da suspensão da pena de prisão
Pressupõe o artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal, que a pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos deve ser suspensa, se: “(…) atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
“A suspensão da execução da pena constitui uma medida de conteúdo reeducativo e pedagógico, de forte exigência no plano individual, particularmente adequada para, em certas circunstâncias e satisfazendo as exigências de prevenção geral, responder eficazmente a imposições de prevenção especial de socialização, ao permitir responder simultaneamente à satisfação das expectativas da comunidade na validade jurídica das normas violadas, e à socialização e integração do agente no respeito pelos valores ao direito, através da advertência da condenação e da injunção que esta impõe para que o agente conduza a vida de acordo com os valores inscritos nas normas” (neste sentido, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19 de Maio de 2004 in www.dgsi.pt, proc. 3549/2004-3).
Esta disposição legal representa, deste modo, um poder-dever, estando o juiz obrigado a suspender a execução da pena de prisão, sempre que os respectivos pressupostos se verifiquem.
Esta medida tem um carácter reeducativo e pedagógico, que nunca é demais salientar.
É desde logo pressuposto da suspensão da execução da prisão a formulação de «juízo de prognose» favorável relativamente ao comportamento futuro do arguido, no sentido de quanto a ele a simples censura e ameaça da pena de prisão serem suficientemente dissuasoras da prática de futuros crimes. Não se torna necessário que o juiz tenha de atingir a certeza sobre o desenrolar futuro do comportamento do arguido, mas a esperança fundada de que a socialização em liberdade possa ser alcançada.
Tal juízo no caso concreto, atento o teor do Certificado de Registo Criminal do arguido, não se mostra favorável, não se afigurando que a simples ameaça de execução da pena seja suficiente para inibir a prática pelo arguido de novos crimes, como o não foram até ao presente, as sucessivas penas de multa e de prisão, ora substituídas, ora efectiva, razão pela qual se afasta a sua aplicação.

No que respeita aos demais regimes previstos e seguindo a lógica do Código, concretamente do confronto do regime da permanência na habitação, introduzido pela redacção da Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, com o regime da semidetenção e da prisão por dias livres, ponderando as finalidades na base de cada uma delas, o nível de privação da liberdade que implicam e as razões que a situação do arguido reclama, entendo que se reveste de maior proporcionalidade e adequação a aplicação ao mesmo do regime de prisão por dias livres, permitindo assim manter-se disponível para uma vida activa, atenta a sua idade – 42 anos.
Nos termos do artigo 45.º, do Código Penal, “a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano, que não deva ser substituída por pena de outra espécie, é cumprida em dias livres sempre que o Tribunal concluir que, no caso, esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
A prisão por dias livres tem por finalidade limitar o mais possível os efeitos criminógenos da privação continuada da liberdade, evitando ou, pelo menos, atenuando os efeitos perniciosos de uma curta detenção de cumprimento continuado, nos casos em que não é possível renunciar à ideia de prevenção geral (Cfr. Preâmbulo do Código Penal, ponto 7, e Eduardo Correia, As Grandes Linhas da Reforma Penal, Jornadas de Direito Criminal, Ed. Centro de Estudos Judiciários, Fase I, Lisboa, 1983, p. 28).
“Sem afastar de todo o conteúdo de sofrimento inerente a toda a prisão, e, deste modo, o seu carácter intimidativo, a prisão por dias livres é uma forma de reagir contra os perigos que se contêm nas normais penas de curta duração e de, ao mesmo tempo, manter, em grande parte, as ligações do condenado à sua família e à sua vida profissional” (Acórdão do Supremo Tribunal Justiça 2 de Março de 1988, Boletim do Ministério da Justiça, 375, 204).
Efectivamente, de tudo o que se deixou dito, resulta que a presente forma de cumprimento, visando garantir a satisfação das razões de prevenção, reprovar de forma firme a conduta do agente e afastá-lo da prática de idênticos ilícitos, com a criação de um regime intermédio, assegura tais objectivos/finalidades.
Neste âmbito e sem prejuízo do supra dito, atenta a sua situação pessoal e do agregado, a sua idade, como forma de permitir assim manter disponibilidade para trabalhar, entende-se, que a pena de 6 meses de prisão aplicada, deverá ser cumprida em dias livres, fixando-se para o efeito que o arguido cumpra 36 períodos, de 48 horas, das 19 horas de Sexta-feira até às 19 horas de Domingo, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 45.º, do Código Penal, este regime em termos de horas, mais exigente, dado o contacto anterior que o arguido já teve com o sistema prisional, atento o cumprimento de pena de prisão efectiva.

Foram evidenciadas pelo tribunal a quo os antecedentes criminais do arguido e a natureza das penas que lhe foram anteriormente aplicadas e cumpridas pelo mesmo, as quais não serviram de advertência para a prática de um novo crime desta natureza. Para além disso, relevou-se que o arguido tenha voltado a praticar um crime contra a segurança rodoviária, recusando-se ao exame de pesquisa de alcoolémia (desobediência).
As exigências de prevenção geral, em matéria de condução de veículo rodoviário são fortes, pelo grave perigo de ofensa de bens de inestimado valor, tais como a vida, a integridade física, a segurança e ordenação rodoviária, sendo ainda de atender à conduta anterior do arguido, onde sobressaem os seus antecedentes criminais, averbando condenações por factos praticados entre 1992 e 2010, por nove vezes, sendo sete delas contra a segurança rodoviária e duas de outro tipo de crime e gravidade, em seis penas de multa e três penas de prisão, ora substituídas, ora efectiva, o que permite concluir que as penas em que foi condenado não foram de molde a que não voltasse a violar o concreto bem jurídico tutelado.
Todos esses factores que agravam a prognose de prevenção especial relativa a este arguido e que propendem para elevar de forma relevante os factores de risco de prática de novos ilícitos criminais desta natureza.
No que respeita à substituição da pena de prisão por trabalho a favor da comunidade, também aqui se assinalam as mesmas conclusões que obtivemos quanto à suspensão da execução da pena.
Dita o citado Art.º 58.º, n.º 1, do Código Penal, que  “se ao agente dever ser aplicada pena de prisão não superior a dois anos, o tribunal substitui-a por prestação de trabalho a favor da comunidade sempre que concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Ora, a verdade é que se demonstram também aqui esgotadas as virtualidades pedagógicas e ressocializadoras que as penas não detentivas poderiam ter tido sobre este arguido, do que se pode concluir que nem a aplicação de pena de multa, nem a suspensão da execução da pena de prisão, nem a substituição da prisão por trabalho a favor da comunidade satisfazem as exigências de prevenção e de reprovação do crime, pois a simples censura e ameaça da pena, o sacrifício inerente ao pagamento da multa e mesmo a suspensão da execução da prisão, decorrentes das anteriores condenações, não constituíram suficiente prevenção contra o crime, isto é, não evitaram que o arguido voltasse a delinquir.
Assim, o juízo de prognose a fazer em relação ao arguido, à luz de critério de prevenção especial de socialização não pode deixar de lhe ser desfavorável, demonstrando o arguido uma forte propensão para a adopção de condutas desconformes ao direito e ausência de qualquer autocensura quanto a condenações anteriores.
Acresce que ao arguido já foi aplicada as penas de prisão substituída pela prestação de trabalho, substituída por multa e pena de prisão efectiva, e ainda assim, a medida e execução das penas, não se mostraram suficiente para que o arguido não voltasse a praticar novos crimes.
No que respeita à substituição da pena de prisão por multa.
Igualmente, e atendendo as penas de multa em que o arguido já foi condenado, e concordando com a sentença condenatória, não se vislumbra que a substituição da pena de prisão por tal pena de multa surtisse os efeitos pretendidos, porquanto nem penas mais gravosas tiveram melhor êxito.
O tribunal a quo andou bem, na verdade, ao optar pela pena de prisão e ao recusar a suspensão da sua execução e a substituição pela pena de multa, verificada a necessidade de prevenção de futuros crimes, tendo, assim, interpretado correctamente o disposto nos citados Art.ºs 70.º, 50.º, n.º 1, 43.º, n.º 1 e 58.º, n.º 1, do Código Penal.
Assim, atendendo ao que ficou supra exposto, aos antecedentes criminais do arguido, a natureza das penas em que já foi condenado, o bem jurídico violado com a prática do crime pelo qual foi condenado - desobediência, a pena agora aplicada ao arguido de 6 meses de prisão efectiva, a cumprir por 36 períodos de prisão por dias livres, de 48 horas cada um, não se mostra de maneira nenhuma excessiva, pelo contrário mostra-se perfeitamente adequada às exigências que o caso requer.
Tudo ponderado, não existiam motivos à data da condenação em 1.ª instância, face a ter sido estabelecida uma pena de prisão de curta duração (6 meses de prisão), para que esta não lhe tenha sido substituída por prisão por dias livres, nos termos do então vigente Art.º 45.º do Código Penal.
Na verdade, esta prisão por dias livres era ainda uma pena de substituição (cfr. Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Lisboa: Aequitas Editorial Notícias, pp. 390-395) que se podia aplicar em substituição de pena concreta de prisão não superior a 1 ano de prisão, desde que não se verifiquem os requisitos de aplicação de outra pena substitutiva não detentiva. Por outro lado, esta pena de prisão por dias livres preferia ao regime de semidetenção.
Certo é que a esta data (29/11/2017), já se encontram em vigor as alterações decorrentes da mencionada Lei n.º 94/2017 de 23/8, que veio alterar o regime legal destas penas substitutivas, retirando do catálogo das penas substitutivas da prisão, justamente a prisão por dias livres, instituindo o regime de permanência na habitação como prevalecente para estas situações.
Este regime de permanência na habitação, a par da extinta prisão por dias livres e do regime de semidetenção, é também uma pena de substituição que se pode aplicar em substituição de pena concreta de prisão não superior a 1 ano de prisão.
Diz-nos o actual Art.º 43.º do Código Penal, no seu número 2, que o regime de permanência na habitação consiste na obrigação de o condenado permanecer na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, sem prejuízo das ausências autorizadas.

São pressupostos da sua aplicação, nos termos do número um do mesmo preceito legal, para além dos requisitos gerais das penas substitutivas da prisão, a conclusão de que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão, o consentimento do próprio arguido/condenado e face à previsão das seguintes situações:
a)- A pena de prisão efectiva não superior a dois anos;
b)- A pena de prisão efectiva não superior a dois anos resultante do desconto previsto nos artigos 80.º a 82.º;
c)- A pena de prisão não superior a dois anos, em caso de revogação de pena não privativa da liberdade ou de não pagamento da multa previsto no n.º 2 do Art.º45.º.

Nos termos do n.º 4 desse mesmo Art.º 42.º, diz-se que o tribunal pode subordinar o regime de permanência na habitação ao cumprimento de regras de conduta, susceptíveis de fiscalização pelos serviços de reinserção social e destinadas a promover a reintegração do condenado na sociedade, desde que representem obrigações cujo cumprimento seja razoavelmente de exigir, nomeadamente:
a)- Frequentar certos programas ou atividades;
b)- Cumprir determinadas obrigações;
c)- Sujeitar-se a tratamento médico ou a cura em instituição adequada, obtido o consentimento prévio do condenado;
d)- Não exercer determinadas profissões;
e)- Não contactar, receber ou alojar determinadas pessoas; e
f)- Não ter em seu poder objectos especialmente aptos à prática de crimes.

Certo que a apreciada alteração legislativa, mesmo a considerar esta pena de prisão por dias livres em que o arguido foi condenado, terá de ser equacionada, por este tribunal, em termos de aplicação da lei penal no tempo (cfr. Art.º 2.º, n.ºs 1 e 4, do Código Penal) e na consideração do princípio constitucional da aplicação retroactiva da lei penal de conteúdo mais favorável ao arguido (Art.º 29.º da Constituição da República Portuguesa).
Na mencionada Lei n.º 94/2017, prevê-se uma norma de cariz transitório – a do Art.º 12.º - em que se permite a reabertura da audiência de julgamento para substituição da prisão por dias livres ou do regime de semidetenção por pena não privativa da liberdade, sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, ou por este regime de permanência na habitação.
Percebe-se, daqui, que existe mesmo um juízo do legislador sobre o carácter mais favorável ao arguido deste regime de obrigação de permanência na habitação em face da prisão por dias livres, como nos parece ser claro esse mesmo juízo em face do contexto normativo-legal e também do grau de privação de liberdade que cada uma das penas contém.
Este regime de permanência na habitação tem potencialidades para realizar a tutela do bem jurídico protegido pela norma que pune o crime em causa – assim satisfazendo as exigências de prevenção geral – e facilitar a ressocialização do arguido, sem estender, de forma gravosa, as consequências da punição ao seu agregado, assim se evitando as consequências perversas da prisão continuada, não deixando de, com sentido pedagógico, constituir forte sinal de reprovação para o crime em causa.
O regime de permanência na habitação tem justamente por finalidade limitar o mais possível os efeitos criminógenos da privação total da liberdade, evitando ou, pelo menos, atenuando os efeitos perniciosos de uma curta detenção de cumprimento parcial ou continuado, nos casos em que não é possível renunciar à ideia de prevenção geral.
A filosofia do preceito assenta numa evidente reacção contra os consabidos inconvenientes das penas curtas de prisão (apoiando-se em razões de cariz humanitário na letra do seu n.º 2), situando-se a meio caminho entre a suspensão da execução da pena de prisão e a reclusão efectiva do delinquente, a qual se pretende evitar, pela ruptura com o ambiente familiar, social e profissional que representaria, verificados que sejam os seus pressupostos, mas sem deixar de prevenir-se a adequação desta pena substitutiva às finalidades das penas em geral. Mas a ideia apoia-se também em considerações que transcendem o delinquente. É, antes de mais, indesejável que se projectem sobre a família do condenado consequências económicas desastrosas, a ponto de se dizer que “une peine de prision clochodise la famille”, sendo ainda indesejável a ruptura prolongada com o meio profissional e social.
Diante este quadro comparativo, na linha do método comparativo consagrado no n.º 4 do Art.º 2.º do Código Penal, iremos aplicar em bloco o regime legal da lei nova, que versa sobre a obrigação de permanência na habitação que tal como vimos anteriormente assenta em pressupostos e requisitos, nos termos do Art.º 43.º do Código Penal, na sua nova redacção, como a viabilidade da instalação dos meios técnicos de controlo à distância (vigilância electrónica) e o consentimento do próprio arguido/condenado, que ainda terão de ser obtidos ou verificados em 1.ª instância. Numa reabertura da audiência de julgamento para essa precisa finalidade, não nos termos do Art.º 371.º-A do CPPenal, uma vez que ainda não sucedeu o trânsito em julgado da condenação, mas nos termos e para os efeitos do Art.º 426.º do CPPenal, sabendo-se que face à alteração legal supra mencionada ainda se encontram por elucidar os indicados requisitos da aplicação da obrigação de permanência na habitação.
Trata-se de uma superveniente insuficiência da matéria objecto de julgamento, por via directa da alteração legislativa acima descrita a qual terá de ser suplantada através do esquema de reabertura de audiência e proferimento de nova sentença, pela primeira instância, de acordo com os pressupostos de aplicação da lei penal nova.
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Pelo que, não por via dos fundamentos invocados pelo arguido, aqui recorrente, mas sim por virtude da aplicação de nova lei penal, terá parcial procedência o recurso interposto, relativamente à substituição da prisão por dias livres, acolhendo-se, aqui, a execução da prisão em regime de permanência na habitação, nos moldes acima expostos.
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IV.DECISÃO
Pelo exposto acordam os juízes desta Relação em conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido L.S.P., não pelos fundamentos invocados mas para aplicação da nova lei penal do tempo (Art.º 2.º da Lei n.º 94/2017 de 23/8), revogando-se, nesta parte, a sentença impugnada e determinando-se (face ao disposto nos Art.ºs  426.º, n.º 1 e 426.º-A, ambos do CPPenal), o reenvio do processo para reabertura de julgamento, circunscrita ao apuramento dos pressupostos em falta da aplicação do regime de permanência na habitação (consentimento do arguido e condições de  instalação dos meios técnicos de controlo à distância na habitação do mesmo arguido), e à subsequente elaboração de nova sentença, pelo mesmo juiz, na qual se deverá proceder à apreciação jurídico-criminal dos factos considerados provados e não provados segundo o entendimento acima explanado.
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Sem custas.
Notifique-se.
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Processado por computador e revisto pelo primeiro signatário (cfr. Art.º 94.º, n.º 2, do CPPenal).




Lisboa, 29 de Novembro de 2017 


                   
(Nuno Coelho)
(Ana Paula Grandvaux)