Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
120564/17.2YIPRT.L1-7
Relator: DIOGO RAVARA
Descritores: ABALROAÇÃO
PRESUNÇÃO DE FORTUITIDADE
SEGURO MARÍTIMO
BARATARIA
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/13/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I- É de considerar elidida a presunção de fortuitidade consagrada no art. 669º do Código Comercial[1]  quando um abalroamento é causado por um navio em movimento que vai embater num navio atracado ao porto e sem qualquer tripulação a bordo, devendo-se o abalroamento a avaria do navio abalroante.
II- Nas circunstâncias referidas em I- o abalroamento deve ser qualificado como culposo (art. 665º do CCom).
III- Por força da outorga de contrato de seguro marítimo, que cobre os riscos de responsabilidade civil emergentes de abalroamento, a seguradora é solidariamente responsável pelo pagamento de despesas decorrentes de contrato de prestação de serviços outorgado entre a empresa armadora do navio que culposamente abalroou outro, serviços esses que consistiram na execução e trabalhos de reflutuação, guarda, e movimentação do navio abalroado para o estaleiro onde veio a ser reparado.
IV- O conceito de barataria a que alude o art. 604º, §1 do CCom compreende apenas actos e omissões dolosos, e não inclui actos negligentes do capitão, da tripulação, ou do armador.
V- Em consequência do exposto em IV-, em caso de abalroamento culposo provocado por ato negligente do capitão, tribulação, ou armador do navio abalroante não pode considerar-se excluída a responsabilidade da seguradora decorrente da outorga do contrato de seguro que celebrou com a armadora do navio abalroante.
VI- Nas circunstâncias referidas em IV- e V-, se a empresa prestadora de serviços demanda judicialmente a empresa proprietária/armadora do navio abalroante pedindo a condenação desta a pagar-lhe o preço dos serviços contratados, e se este deduz a intervenção principal da seguradora, procedendo tal incidente e procedendo também a acção, devem a seguradora e a tomadora do seguro ser solidariamente condenadas no pedido.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Relatório
A, pessoa colectiva nº 503… intentou procedimento de injunção contra B, pessoa colectiva nº 504…, invocando ser credora da requerida pela quantia de € 42.004,60, acrescida de juros de mora vencidos, no valor de € 2.231,42[1].
Para tanto alegou, em síntese, que no âmbito da sua atividade prestou serviços à requerida, contratados por esta, nomeadamente uma operação de mergulho e reflutuação de um navio, seguida da sua remoção para cais, guarda do mesmo durante a estadia no cais, e posterior transporte do mesmo para estaleiro. Mais alega que pelos serviços prestados foi emitida e apresentada uma fatura no apontado valor de € 42.004,60, com data de vencimento em 04.03.2017, que foi aceite, mas que não foi paga.
Regularmente citada, a ré deduziu oposição[2], sustentando, em resumo, o seguinte:
- a embarcação “Aurora Boreal” de que é proprietária abalroou a embarcação “Mar da Armona”, propriedade de Companhia Pescarias do Algarve;
- o Capitão do Porto e o representante da Docapesca, perguntaram ao Mestre do “Aurora Boreal” se conhecia equipa apta a colocar um sistema de flutuação ao “Mar da Armona”, procurando precaver o afundamento total da embarcação embatida também por questões de segurança da navegação na doca;
- o seu representante legal da ré sugeriu que tal procedimento fosse levado a cabo pela empresa autora;
- a equipa de mergulhadores da autora terminou de colocar um sistema que permitiu que o “Mar da Armona” ficasse a flutuar;
- depois de colocado o “Mar da Armona” a flutuar, o Capitão do Porto pediu à ré que indicasse alguém para rebocar aquela embarcação para local mais apropriado, vindo a embarcação a ser rebocada para rampa dos estaleiros navais de Olhão;
- comunicou o sucedido à sua seguradora, que a instruiu a enviar a fatura referente aos serviços da autora, tendo procedido a esse envio;
- não aceitou a fatura apresentada pela autora;
- a sua seguradora prontificou-se a indemnizar a autora em € 29.093,00.
No mesmo articulado de oposição, a ré requereu ainda a intervenção principal provocada da C, com quem havia celebrado um contrato de seguro relativo ao navio “Aurora Boreal”.
Concluiu pela sua absolvição do pedido e pela condenação da C.
Admitida a intervenção principal[3], foi a C citada, tendo apresentado contestação, arguindo a incompetência absoluta do Tribunal[4].
Tal exceção foi julgada procedente[5] e, na sequência de manifestação expressa da autora nesse sentido, os autos foram remetidos ao Tribunal Marítimo, nos termos do disposto no art. 99º do CPC[6].
Recebidos os autos no Tribunal Marítimo, foi proferido despacho de convite da autora ao aperfeiçoamento do requerimento de injunção[7], ao qual a autora correspondeu, prestando os esclarecimentos solicitados[8].
Exercendo o seu direito ao contraditório, a ré Mútua dos Pescadores, apresentou requerimento[9], sustentando, em síntese, que:
- a colisão entre o “Aurora Boreal” e o “Mar da Armona” não se deveu a dolo ou negligência por parte dos tripulantes do primeiro;
- indemnizou a proprietária do “Mar da Armona” (Companhia de Pescarias do Algarve, S.A.) pelos danos sofridos por esta embarcação ao abrigo da cobertura de responsabilidade civil da apólice de seguro contratada com a ré, sem ter qualquer obrigação legal ou contratual de o fazer;
- a autora foi contratada pela ré, não tendo tido a C qualquer intervenção nessa escolha ou aprovado previamente os trabalhos ou serviços alegadamente prestados pela autora, que nunca aceitou;
- informou a ré B que não tinha contratado a autora e que a fatura de eventuais serviços que lhe tivessem sido prestados pela autora deveria ser emitida em nome daquela;
- a fatura emitida pela autora à ré B nunca foi por si aceite, porque apenas apresentava um valor total sem que fosse possível estabelecer a sua correspondência com os serviços alegadamente prestados por aquela a esta, tornando impossível comparar esses valores com os valores praticados no mercado para idênticos serviços.
Concluiu pugnando pela improcedência da ação e a pela sua absolvição do pedido.
Entretanto já tinha sido proferido despacho saneador. No mesmo despacho procedeu-se à identificação do objeto do litígio, e à enunciação dos temas da prova nos seguintes termos:
“Identificação do Objecto do Litígio
Atento os contornos da factualidade alegada pelas partes e o pedido deduzido, o cerne do objecto do litígio centra-se em apurar os serviços prestados pela Autora a pedido desta na embarcação “Mar da Armona”, na sequência do abalroamento sofrido por embate da “Aurora Boreal”, e o acordo estabelecido entre ambas acerca do pagamento. Mais importa apurar da intervenção da seguradora neste processo negocial e da assunção por esta do pagamento do valor facturado pelo serviço prestado pela Autora à Ré.
Temas de Prova
Para tanto, atenta a matéria controvertida nos autos e o objecto supra delimitado, os temas de prova reconduzem-se ao apuramento:
1º - dos serviços prestados pela Autora na embarcação “Mar da Armona” a pedido da Ré;
2º - da aceitação do valor facturado pela Autora;
3º - da assunção do pagamento da factura pela seguradora perante a segurada Autora.”[10].
Realizou-se audiência final, após o que foi proferida sentença com o seguinte dispositivo[11]:
“Em face do exposto, julga-se parcialmente procedente, porque parcialmente provada, a presente acção e, consequentemente, decide-se:
a. Condenar a Ré, B, a pagar à Autora, A, a quantia de € 42.004,60 (quarenta e dois mil e quatro euros e sessenta cêntimos), acrescida dos respectivos juros de mora, no valor de € 2.231,42 (dois mil e duzentos e trinta e um euros e quarenta e dois cêntimos); e
b. Absolver a Interveniente principal, C, do pedido formulado pela Autora, A
Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação[12], apresentando alegações cuja motivação sintetizou nas seguintes conclusões:
1- Não está provado que a apelante tenha aceitado o montante pedido pela autora, nem está provado que tenha reconhecido os pormenores do custo dos diversos segmentos desses serviços, nem está provado que a autora tenha interpelado a ré para pagar a fatura, o que nunca fez, antes esperava que a Mútua interveniente os pagasse à ré , querendo receber desta e não diretamente da seguradora, pois sabia que a ré tinha remetido para a seguradora esse pagamento, em virtude do contrato de seguro, tendo esta proposto pagar apenas parte desses custos, pelo que devem ser dados como não provados os fatos dos pontos 35, 36, 37, e 71 da matéria de fato dada por assente, e devem ser dados como provados os que constam das alíneas i) e j) de fatos considerados não provados pela sentença recorrida.
2- O que se diz na conclusão anterior decorre do confronto desses mesmos pontos 35,36,37, 71 com os fatos dados por assentes nos pontos 32, 48 a 58, 59, 60, 63, 64, 66, e com os depoimentos do representante legal da autora, que disse, resumidamente, o que vem nos pontos 59 e 60, além do que resulta da gravação, e com os depoimentos das testemunhas José ....., e Fernando ......, e José ....., designadamente, que avaliaram os custos da autora com fundamento em folha de obra com discriminação de serviços e tempos e utensílios, com valor que coincide com a fatura, a qual não os discrimina e refere serviços prestados na “Aurora Boreal”, e que, segundo os respetivos depoimentos chegou a peritagem à conclusão de estarem justificados 29.093,00 euros, como vem no ponto 64.
3- Especificamente em relação ao fato da alínea i) e da alínea j) dos fatos dados por não provados, estes deverão passar a figurar no elenco de fatos dados por assentes, ainda em virtude de a interveniente seguradora ter, sim, proposto indemnizar os custos com os serviços da autora (vd. ponto 64 de fatos provados), ter assumido a necessidade dos serviços da autora como outro, mais um, efeito danoso do evento que aceitou estar a coberto do contrato de seguro que celebrou com a ré apelante.
4- Não podem ser dados como provados os fatos dos pontos 35, 36, 37, não só pelo que se disse nas conclusões anteriores, mas também porque a autora não fez prova nem documental, nem outra, de que tivesse remetido à ré a folha de obra, nem que a fatura foi aceite pela ré (vejam-se os pontos 59 e 60), nem que a tivesse interpelado para pagar a fatura, antes aguardava que o pagamento fosse feito pela Mútua, para receber.
5- Além do que dar como provados esses fatos contende diretamente com a indagação feita pelo tribunal recorrido sobre a extensão e custos dos serviços da autora, como decorre dos depoimentos do representante legal da autora, e das testemunhas Artur ......, Mafalda ....., e Ana .......
6- Deve ser dado como não provado o fato do ponto 69, atento que, naturalisticamente, a aprovação da contratação da autora pela Mútua era materialmente impossível atenta a urgência de conter o afundamento e de conter a extensão dos efeitos danosos do evento.
7- Deve ser dado como não provado o fato dado por assente no ponto 71, por estar em contradição, designadamente com o fato dado por assente no ponto 64.
8- Entre a ré apelante B e a interveniente C foi celebrado um contrato de seguro que cobre responsabilidade civil emergente de abalroamento provocado pela embarcação “Aurora Boreal”, propriedade da B, quer seja fortuito, quer seja meramente culposo, e cobre gastos/despesas necessários para minimizar os danos na embarcação embatida /abalroada, por causa do evento.
9- Nesta apólice em que a interveniente seguradora assegura o pagamento da indemnização a terceiros por danos causados por abalroamento, a cobertura “gastos de salvação” cobre os gastos necessários de salvação, ou seja, os destinados a evitar agravamento das consequências danosas do evento.
10- Tendo a embarcação segurada, a “Autora Boreal”, embatido, sem culpa da tripulação, por mero acidente, a embarcação “Mar da Armona” no interior da doca de pesca de Olhão, a interveniente seguradora responde pela indemnização devida ao proprietário ou armador desta pelos danos materiais que lhe foram causados, e responde pelos gastos necessários para conter a extensão dos efeitos danosos do evento, tais como afundamento total, poluição e outros males maiores.
11- A Ré apelante, proprietária da “Aurora Boreal” tinha a obrigação de minimizar os efeitos danosos do evento.
12- No âmbito da responsabilidade civil tanto o lesante como o lesado estão obrigados, no decorrer do princípio da boa fé, de minimizar os prejuízos decorrentes do evento lesivo.
13- A cobertura “003 gastos de salvação”, prevista no contrato de seguro referido, e a cobertura “47 responsabilidade civil por abalroamento a embarcação terceira”, determinam a responsabilidade da interveniente seguradora pelo pagamento do peticionado pela autora.
14- Tendo a embarcação “Aurora Boreal” embatido a “Mar da Armona”, a proprietária e tripulação daquela tinham a obrigação, que de imediato executaram de abraçar a embatida, dado que esta começou a afundar, e não sendo tal “abraço” suficiente, na sequência da ordem do Capitão de Porto, fazer intervir entidade, no caso, a autora, para evitar o afundamento total no interior da doca de pesca.
15- O regime do instituto da salvação marítima invocado na sentença recorrida para condenar a autora na totalidade do pedido e absolver a interveniente seguradora do mesmo, não tem aplicação ao caso em apreço, cuja solução jurídica se funda na aplicação das normas contratuais emergentes do contrato de seguro celebrado entre a apelante e a Mútua seguradora interveniente.
16- O regime do instituto da salvação marítima invocado na sentença não tem cabimento no caso, porquanto a autora é alheia ao abalroamento, e não veio intervir de modo espontâneo, nem a ré apelante interveio espontaneamente, antes estava obrigada a minimizar os danos do evento lesivo causado pela embarcação segurada.
17- Nem a autora nem a ré apelante são qualificáveis como salvadores, para efeitos do citado regime de salvação marítima invocado na sentença, atenta a conclusão anterior.
18- A interveniente seguradora assumiu o evento lesivo em causa como risco coberto pelo contrato de seguro que celebrou com a apelante, tanto que pagou indemnização ao proprietário da embarcação embatida, para compensação da reparação dos danos materiais infligidos à mesma, e prontificou-se a pagar os serviços da autora, mas não na sua totalidade, por assim ter sido aconselhada pelos seus peritos.
19- Na troca de correspondência prévia à interposição desta ação, a interveniente seguradora nunca rejeitou a sua responsabilidade de indemnizar os custos dos serviços da autora.
20- Ao Tribunal recorrido está vedado afastar esta assunção de responsabilidade por parte da interveniente seguradora, bem como vedado lhe está afastar a aplicação das cláusulas do contrato de seguro acima referido, se a própria seguradora nunca o fez.
21- A interveniente seguradora aceitou indemnizar a apelante pelo valor de 29.093,00 euros, em virtude dos serviços prestados pela autora, apenas não aceitou o custo total apresentado por esta.
22- A interveniente seguradora ordenou a peritagem dos trabalhos da autora, com base em folha de obra fornecida por esta, que tem custo igual ao que consta da (única) fatura emitida e apresentada com a injunção.
23- No seguimento da correspondência que foi trocado com a interveniente seguradora, a ré apelante remeteu a fatura da autora para a interveniente, pedindo o seu pagamento diretamente à autora.
24- Tendo a interveniente seguradora ordenado a peritagem e trocado a correspondência que consta dos autos com a apelante, e tendo o seu perito Eng. ... tido comunicação com a representante legal da autora, e tendo a interveniente recebido relatórios da peritagem que ordenou, não se pode concluir que a interveniente seguradora se manteve ao largo das relações de autora e ré apelante.
25- Até porque apenas a fatura da autora, que não se refere à embarcação embatida, nem discrimina serviços, utensílios, horas de trabalho, sem a folha com a discriminação dos trabalhos e custos, não permitiria à interveniente seguradora chegar à conclusão de que só poderia indemnizar os serviços da autora em 29.093,00 euros.
26- Ao suscitar a intervenção da autora, para evitar o afundamento total e a poluição da doca, a ré operou em representação material da sua seguradora, para minimizar danos, e atento que as circunstâncias e meio marinho em que o evento lesivo ocorreu, e a ausência de representante da Mútua seguradora no local, não se compadeciam com contatos nem negócios prévios com esta.
27- É a interveniente seguradora, por força do contrato de seguro em causa nestes autos, a única responsável pelo pagamento dos serviços da autora.
28- A sentença recorrida fez errada aplicação do Direito, violando as disposições legais relativas à responsabilidade contratual, por não aplicar ao caso as estipulações que emanam do contrato de seguro celebrado entre a apelante e a sua seguradora, a interveniente Mútua de Pescadores.
29- Deverá ser substituída por outra decisão, que condene a interveniente Mútua seguradora a pagar o peticionado pela autora.
Termina nos seguintes termos:
deverá (…) ser revogada a sentença recorrida, condenando-se a interveniente Mútua Seguradora na totalidade do pedido da autora, absolvendo-se a ré apelante da totalidade do pedido da autora.”
Não foram apresentadas contra-alegações.
Admitido o recurso[13], e remetido o mesmo a este Tribunal da Relação, foi o mesmo recebido, após o que foram colhidos os vistos.
2.  Questões a decidir
Conforme resulta das disposições conjugadas dos arts. 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do CPC, é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso, seja quanto à pretensão dos recorrentes, seja quanto às questões de facto e de Direito que colocam[14]. Esta limitação dos poderes de cognição do Tribunal da Relação não se verifica em sede de qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. art. 5º n.º 3 do CPC).
Não obstante, excetuadas as questões de conhecimento oficioso, não pode este Tribunal conhecer de questões que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas[15].
Assim, as questões a apreciar e decidir são as seguintes[16]:
- Da impugnação da decisão sobre matéria de facto (conclusões 1 a 7);
- Da responsabilidade da R. B (conclusões 15 a 17);
- Da responsabilidade da ré C (conclusões 8 a 14, e 18 a 26).
3. Fundamentação
3.1. Os factos
O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:
1. A Autora é uma empresa que se dedica a atividades turísticas, atividades marítimo turísticas e organização de atividades de animação turística, ações de formação relacionadas com atividades desportivas, náutica, aquáticas e subaquáticas; aluguer de artigos e acessórios recreativos, desportivos, técnicos, profissionais, náuticos, embarcações, motores, atrelados, assistência técnica; aluguer, comercialização e manutenção de embarcações com e sem motor; comercialização de material de mergulho, recreativo e profissional; centro e escola de mergulho profissional e amador; comércio de gases; equipamentos, acessórios, analisadores e células de gases; comércio de vestuário e acessórios, calçado, malas, e outros bens similares; comércio de aprestos marítimos produtos alimentícios; corte ultratérmico e soldadura submarina; consultadoria de mergulho; demolição com uso de explosivos; escola de navegação de recreio; equipamentos de som e vídeo terreste e subaquática; equipamentos de comunicação terreste e subaquática; equipamento fotográfico e de filmar terreste e subaquática; informática e acessórios, equipamentos eletrónicos artigos para decoração, utilidades para o lar, artigos desportivos; instrução e fabrico certificado de misturas gasosas, trimix , heliox, nitrox , O2 , hipoxias e hiperoxias para o mergulho amador, técnico e profissional; mergulho profissional; mergulho amador; mergulho técnico; material de pesca desportiva; mecânica naval e atividades auxiliares dos transportes por água; organização e prestação de serviços relacionados com atividades lúdicas, culturais, de lazer, desportivas, náuticas e subaquáticas, nomeadamente, viagens, eventos recreativos de aventura, eventos desportivos, mergulho subaquático, educação física; prestação de serviços de manutenção de artigos e equipamentos recreativos e profissionais, desportivos, náuticos, aquáticos e subaquáticos; peritagem marítima e subaquática; peritagem aos equipamentos de mergulho recreativo, desportivo , técnico e profissional; salvação marítima; socorro naval e marítimo; reboques terrestes e náuticos, reflutuação e transporte de equipamentos e outros navais; resgate aquático, náutico e subaquático; representação, comercialização, importação e exportação, produtos, equipamentos recreativos e profissionais, desportivos, náuticos, aquático e subaquáticos; bem como outdoor.
2. Em 22 de Setembro de 2016, pelas 23 horas e 20 minutos, a embarcação "Aurora Boreal" embateu na embarcação "Mar da Armona", propriedade de Companhia Pescarias do Algarve.
3. A embarcação “Aurora Boreal” regressava da faina da pesca, e, ao fazer a manobra de acostagem ao cais de combustível da doca de pesca de Olhão, o comando da embraiagem elétrico não correspondeu à ordem de marcha a ré.
4. O que levou a que o Aurora Boreal fosse embater na ré de estibordo do catamarã denominado “Mar da Armona”, de casco em fibra de vidro, que aí se encontrava acostado.
5. Não se encontrava ninguém a bordo da embarcação “Mar da Armona”.
6. O abalroamento deveu-se a uma falha nos comandos da caixa redutora do “Aurora Boreal”, não tendo o sistema propulsor da embarcação engrenado a ré, apesar de acionado o comando para tal.
7. Ao embater no “Mar da Armona”, o “Aurora Boreal” desviou-se para o largo da doca e o Mestre dirigiu a embarcação para a saída da doca, para evitar mais acidentes.
8. E, em simultâneo, ordenou ao motorista, por meio do intercomunicador, que verificasse o que se passava.
9. O motorista atuou de imediato e conseguiu fazer o "reset" do "MicroCommander", executando a manobra de restabelecer novamente a energia ("reset") do "MicroCommander", e foi desta forma restabelecida a operacionalidade dos comandos da caixa redutora.
10. Após este "reset" foi possível manobrar normalmente a embarcação, pelo que a mesma não chegou a deixar a doca.
11. Em ato contínuo, o "Aurora Boreal" atracou ao "Mar da Armona" para abraçar este àquele.
12. Esta manobra de "abraço" foi feita mediante cabos de massa e cabos de aço, por parte da tripulação do "Aurora Boreal", para evitar o afundamento total da embarcação embatida, o que foi conseguido.
13. Terminadas de abraçar as duas embarcações, o sócio gerente da Ré, João ....., cerca das 23 horas e 42 minutos, telefonou para o seu interlocutor habitual da Mútua Seguradora (delegação em Olhão) e empregado desta.
14. Pretendia o auxílio da sua seguradora e instruções sobre como proceder, mas aquele, Sr. José ....., não atendeu a chamada, feita para o telefone 96 709 60 72.
15. Voltou a telefonar-lhe pelas 8 horas e 9 minutos da manhã do dia seguinte, sem resposta, e enviou-lhe SMS pelas 8 horas e 15 minutos, tendo, a esta mensagem, aquele respondido de imediato com uma chamada telefónica, pedindo desculpa por não ter ouvido as chamadas anteriores.
16. Os bombeiros não conseguiram bombear a água que havia inundado o flutuador de estibordo da embarcação “Mar da Armona”.
17. O Capitão do Porto e o representante da Docapesca queriam evitar o afundamento total da embarcação embatida também por questões de segurança da navegação na doca.
18. O proprietário do “Mar da Armona” e a respetiva seguradora não indicaram quem o fizesse.
19. Um dos representantes legais da Ré contactou a Autora, de modo a que esta interviesse e evitasse o afundamento da embarcação “Mar da Armona”.
20. A Autora recebeu da Ré B uma chamada para auxílio da embarcação "Mar da Armona", às 00h20 do dia 23 de setembro de 2016.
21. As duas embarcações ficaram abraçadas para evitar o afundamento total do “Mar da Armona” até cerca das 16.30 horas de 23 de setembro de 2016.
22. Por esta hora a equipa de mergulhadores da autora terminou de colocar um sistema que permitiu que o “Mar da Armona” ficasse a flutuar.
23. Esta operação tinha tido início pelas 2 horas de 23 de setembro de 2016.
24. A operação de reflutuação/mergulho teve a duração de cerca de 19h e a mesma incluiu a retirada de aguas residuais de todos os compartimentos da embarcação, limpeza da mesma, realização das respetivas seguranças da embarcação, assistência e orientação dos trabalhos de manutenção realizados aos motores e eletricista naval, formalidades com as autoridades competentes, preparação da embarcação para reboque, tratamento e assistência em todas as vistorias necessárias e exigidas pelas autoridades, transporte da lancha tal como exigido pelas autoridades para assistir e rebocar a embarcação para os estaleiros de Vila Real de Santo António, inclusive reunião de tripulação credenciada para levar a embarcação sinistrada para o estaleiro.
25. Nesta operação foram também utilizados, constantemente, geradores e bombas submersíveis, que fizeram parte do plano de segurança exigido pela Autoridade Marítima, também para a realização do reboque.
26. Esta embarcação foi removida do cais onde estava atracada aquando do acidente, por haver perigo de se voltar a afundar e causar danos à navegação e à entrada do porto de pesca de Olhão.
27. Por sugestão da Ré veio a embarcação "Adélia da Paz" (propriedade de um primo dos sócios da Ré) fazer o reboque, primeiro até à rampa dos estaleiros navais de Olhão, e, depois, com a preia-mar, e com ajuda dos mergulhadores da Autora, mais para cima, na mesma rampa, para maior segurança.
28. Foi colocada na única rampa existente no porto de Olhão, para ficar em segurança, sendo esta uma zona semi deserta e onde ocorrem roubos.
29. Por este motivo, a Autora colocou um elemento da sua equipa de serviço permanente de guarda à embarcação sinistrada, 24h sobre 24h.
30. Este serviço de guarda à embarcação pela Autora teve a duração de 12 dias, e teve início em 23.09.2016, sexta feira, cerca das 20h00 da noite, após o término dos trabalhos de reflutuação.
31. O serviço de guarda teve o seu termo no dia 06.10.2016, quinta feira às 8h00 da manhã, aquando da deslocação do reboque/transporte da embarcação de Olhão para Vila Real de Santo António.
32. O elemento da equipa da Autora que ficou de guarda, de dia também trabalhou na limpeza, manutenção e preparação da embarcação para ser levada para o estaleiro da Nautiber em Vila Real Santo António onde seria reparada (por exigência da sua proprietária e sem oposição da interveniente).
33. Existiram 18 deslocações de mais dois elementos da equipa da Autora de Portimão para Olhão e de Olhão para Portimão, em viatura própria da Autora.
34. No serviço de reboque que foi efetuado de Olhão para Vila Real de Santo António estão incluídas todas as despesas, desde deslocações de viaturas e transporte de lancha de Portimão para Olhão e de Olhão para Vila Real de Santo António e regresso a Portimão, combustíveis, pessoal, utilização de gruas para colocar e retirar a embarcação da Autora na água.
35. Todos os serviços prestados estão elencados e discriminados na “Folha de Obra Salvação Marítima Sinistro Mar da Armona”, remetida à Ré.
36. Pelos serviços prestados foi emitida pela Autora e apresentada à Ré a Fatura n.º 11713/000009, datada de 04.03.2017 e com a mesma data de vencimento, que foi aceite pela Ré.
37. A Ré foi interpelada para efetuar o pagamento do valor faturado, mas nada liquidou à Autora.
38. A Ré dedica-se à indústria da pesca.
39. A Ré é a dona e possuidora da embarcação de pesca denominada "Aurora Boreal", matriculada com o número O-2125-C.
40. A Ré contratou seguro de ramo marítimo/casco relativamente a tal embarcação, titulado pela apólice 88/42560, com a Mútua dos Pescadores, até ao limite de 1.200.000,00 euros, que cobre, entre outros, responsabilidade civil por danos patrimoniais causados a terceiros e é regulado pelas condições gerais, cláusulas particulares e condições particulares que constam dos documentos juntos a fls. 62v/81v que se dão por reproduzidos, com início de vigência em 2 de agosto de 2016.
41. A este contrato de seguro respeita a "ata adicional" junta a fls. 82/82v que se dá por reproduzida.
42. A embarcação "Aurora Boreal" foi inspecionada por ordem da Capitania do Porto de Olhão, tendo sido elaborado relatório dessa perícia e respetivas recomendações, datado de 26 de setembro de 2016.
43. A Capitania declarou que a embarcação Aurora Boreal estava em condições de retomar a sua atividade normal.
44. A Ré determinou suspender a sua faina com a embarcação "Aurora Boreal" a partir de 27 de setembro de 2016, o que comunicou à Mútua Seguradora.
45. Permaneceu acostada, para serem observadas todas as recomendações de verificação do sistema de comando e controlo da caixa redutora que figuram no relatório da vistoria ordenada pela Capitania.
46. A Ré decidiu mudar o sistema de comando.
47. A avaria não foi prevista e nem era esperada.
48. A Ré efetuou a participação do acidente à Mútua Seguradora e fez um aditamento a essa participação inicial, com data de 28 de setembro de 2016, nos termos constantes do documento junto a fls. 83/88 e que se dá por reproduzido, em que solicitou também indicações quanto ao modo de proceder para que a autora fosse paga pelos serviços que prestou, diretamente pela seguradora.
49. Por carta datada de 26 de outubro de 2016, a Ré comunicou à sua seguradora que instalou na embarcação segurada novo sistema de comandos, nos termos constantes do documento junto a fls. 88v/ 89 e que se dá por reproduzido.
50. Com data de 9 de novembro de 2016, a Ré expediu uma carta para a sua seguradora, nos termos constantes do documento junto a fls. 89v/ 90v e que se dá por reproduzido, solicitando-lhe instruções sobre como deveria a Autora A proceder perante a mesma Mútua a fim de ser paga pelos serviços prestados.
51. A Mútua Seguradora não respondeu e, com data de 5 de janeiro de 2017, a Ré enviou-lhe uma carta, nos termos constantes do documento junto a fls. 91 / 92v e que se dá por reproduzido, solicitando que lhe fosse indicado o que estava em falta, para que fosse feito o pagamento aos lesados pelo acidente o mais rápido possível.
52. Por carta datada de 6 de janeiro de 2017, nos termos constantes do documento junto a fls. 93/95v e que se dá por reproduzido, a Ré pediu à Mútua Seguradora que esclarecesse se a afirmação da mesma, via email do dia anterior, de que os serviços (da autora) "devem ser faturados ao armador porque foi este que os solicitou" equivalia a uma rejeição da responsabilidade pelo pagamento dos mesmos.
53. A Mútua Seguradora, em resposta às referidas cartas da Ré, de 5 e 6 de Janeiro de 2017, e à de 9 de Novembro de 2016, respondeu que a fatura a emitir pelos lesados deveria ser "endereçada à entidade que contratou o serviço prestado", que "acresce uma razão adicional relativa ao código do IVA", que não havia qualquer desresponsabilização da sua parte e que "a decisão final de regularização deste processo está assim dependente da apresentação da fatura da A e das conclusões do processo instaurado pela Autoridade Marítima, nos termos constantes do documento junto a fls. 96 e que se dá por reproduzido.
54. Por carta datada de 1 de fevereiro de 2017, a Ré enviou à Mútua Seguradora a notificação das referidas conclusões da Autoridade Marítima, que refere ter-se tratado de um acidente, inexistindo negligência da tripulação, nos termos constantes do documento junto a fls. 96v/101 e que se dá por reproduzido.
55. Nessa carta a Ré questionou a Mútua Seguradora se a Pinguim Sub podia emitir a fatura à Mútua dos Pescadores, pedindo indicação sobre o número de contribuinte desta, ou, caso entendesse ser de faturar à Ré, que confirmasse que se responsabilizaria pelo pagamento.
56. Por carta de 7 de fevereiro de 2017, a Mútua comunicou que a fatura da A deveria ser endereçada à entidade que contratou o serviço prestado, acrescentando que aguardava a fatura da A para análise e decisão final, nos termos constantes do documento junto a fls. 101v e que se dá por reproduzido.
57. Por carta datada de 13 de fevereiro de 2017, a Ré questionou a Mútua sobre se, partindo do princípio que aceitaria assumir a responsabilidade pelo pagamento à A (ora autora), a C faria a esta o pagamento diretamente ou se seria outro o procedimento, e qual, nos termos constantes do documento junto a fls. 102/103 e que se dá por reproduzido.
58. Por carta datada de 9 de março de 2017, a Ré enviou à C a certidão do processo da Capitania/Autoridade Marítima, nos termos constantes do documento junto a fls. 103v/108 e que se dá por reproduzido.
59. A Ré foi dando conhecimento ao representante legal da Autora, João ...., de todas estas respostas e posições da sua seguradora, quando este o questionava quando a Mútua iria pagar os serviços da autora.
60. O representante legal da autora também manteve contactos o perito da C, Eng. José ...., tendo enviado a este, a pedido da Mútua, em 28 de outubro de 2016, uma discriminação dos trabalhos e o preço dos mesmos, que coincide com o valor faturado.
61. Por carta de 4 de março de 2017, a Autora enviou à Ré a fatura com a identificação “1 1713/000009” no valor de 42.004,60 euros, que tem escrito, “Equipa de Resgate Salvação Marítima - Mergulho Profissional”, sem IVA, nos termos constantes do documento junto a fls. 108v/109 e que se dá por reproduzido.
62. Por carta datada de 7 de março de 2017 a Ré, frisando fazê-lo de acordo com as instruções da C, enviou esta fatura à sua seguradora e pediu que o pagamento fosse feito com a brevidade possível, diretamente para a conta a Autora, cujos detalhes forneceu, nos termos constantes do documento junto a fls. 109v/111 e que se dá por reproduzido.
63. A C, através de Miguel ...., enviou um email à Ré acusou a receção da fatura e comunicou que a iria reencaminhar para a peritagem, nos termos constantes do documento junto a fls. 111v/112 e que se dá por reproduzido.
64. A C, por carta datada de 26 de maio de 2017, comunicou à Ré que, apesar das insistências do seu perito, a Autora não lhe tinha apresentado justificação de trabalhos que importassem, no total, em 42.004,60 euros, prontificando-se a indemnizar a Ré em 29.093,00 euros e enviando o recibo desta indemnização, nos termos constantes do documento junto a fls. 112v/113 e que se dá por reproduzido.
65. A C emitiu recibo de indemnização de 55.383,13 euros à proprietária da embarcação embatida, em virtude de despesas com a reparação dos danos materiais causados à mesma pela colisão.
66. Por carta datada de 22 de junho de 2017, a Ré comunicou à C, sua seguradora, que a Autora lhe comunicara que nenhum perito havia feito qualquer averiguação junto da mesma quanto à extinção ou valor dos trabalhos efetuados, nos termos constantes do documento junto a fls. 113v/115 e que se dá por reproduzido.
67. A C respondeu à ré por carta datada de 20 de julho de 2017, comunicando que indemnizará na totalidade o montante que for acordado entre as partes, ou, na falta de acordo, pelo montante a fixar pelo Tribunal, nos termos constantes do documento junto a fls. 115v e que se dá por reproduzido.
68. Por carta datada de 12 de julho de 2017, a C declarou à ré a agravação do prémio do seguro, atribuindo à carteira de seguros da ré o apelido de “problemática”, nos termos constantes do documento junto a fls. 116 e que se dá por reproduzido.
69. A Autora e a Ré não submeteram à aprovação prévia da Interveniente a contratação da Autora e nem qualquer dos trabalhos ou serviços prestados pela Autora.
70. A embarcação “Aurora Boreal” e a respetiva tripulação procederam a trabalhos de salvação e colaboraram na reflutuação da embarcação “Mar da Armona”.
71. A Interveniente nunca propôs pagar qualquer quantia à Autora.
3.1.2. Factos não provados
O Tribunal a quo considerou que “Não se provou qualquer outro facto pertinente para a apreciação da causa e, designadamente, que”
a) O Capitão do Porto e o representante da Docapesca perguntaram ao Mestre do "Aurora Boreal" se conhecia equipa apta a colocar um sistema de flutuação ao "Mar da Armona".
b) O representante legal da Ré apenas sugeriu a empresa da Autora.
c) A equipa de mergulhadores profissionais da autora "A", de Portimão, foi sugerida pela Ré, a pedido do Capitão do Porto e do representante da Docapesca.
d) Depois de colocado o "Mar da Armona" a flutuar, o Capitão do Porto pediu ainda à Ré que indicasse alguém para rebocar aquela embarcação para local mais apropriado, em vista da segurança da navegação.
e) A Ré requisitou os serviços de reboque para a rampa da doca dos estaleiros navais por ordem do Capitão do Porto.
f) A Ré chamou a Autora a pedido do Capitão do Porto e do representante da Docapesca.
g) A C aceitou o evento como acidente, coberto pela apólice de seguro acima mencionada.
h) O representante legal da autora também manteve contactos com a C.
i) A Ré nunca aceitou pagar os serviços prestados pela Autora destinados a colocar a embarcação "Mar da Armona" a flutuar, evitando o seu completo afundamento, e de auxiliar a deslocá-la para a rampa dos estaleiros navais e daí para Vila Real de Santo António, sempre tendo remetido tal pagamento para a Mútua.
j) A C, por carta datada de 26 de maio de 2017, prontificou se a indemnizar a Autora em 29.093,00 euros.
k) Não foi efetuado qualquer serviço de reboque da embarcação "Mar Da Armona" pela Autora.
l) A fatura emitida pela Autora à Ré apresentava um valor total sem que fosse possível estabelecer a sua correspondência com os serviços alegadamente prestados pela Autora à Ré, tornando impossível comparar esses valores com os valores praticados no mercado para idênticos serviços.
3.2. Os factos e o direito
3.2.1. Ponto prévio
A sentença recorrida reporta-se, repetidas vezes, à Mútua dos Pescadores, CRL, designando-a de “interveniente”.
O termo “interveniente”, frequentemente utilizado na prática processual, exprime determinada posição no contexto do incidente de intervenção de terceiros.
Interveniente é aquele que em incidente espontâneo, requer a sua admissão na causa, ou, no caso de intervenção provocada, aquele que uma das partes primitivas pretende que venha a intervir no mesmo pleito. Como sinónimo desta expressão “interveniente” é igualmente comum utilizar-se a expressão “chamado” – vd. art. 320º do CPC.
No caso da intervenção principal, finda a tramitação deste incidente, caso o mesmo seja julgado procedente, o “interveniente” ou chamado passa a assumir a condição de parte principal no processo, ou seja, autor ou réu – arts. 311º, 312º, 316º, 319º, e 320º, todos do CPC.
No caso dos autos, a intervenção principal da “chamada” C foi deduzida pela ré B, que para tanto sustentou que por efeito do contrato de seguro entre ambas celebrado, aquela se constituiu na obrigação de ressarcir os danos decorrentes de sinistros cobertos pelo seguro, alegando igualmente que se tratava de um seguro facultativo, que gerava uma situação de solidariedade na obrigação de indemnizar os lesados por evento coberto pelo contrato de seguro.
Nesta conformidade, concluímos que tendo o incidente de intervenção principal provocada passiva sido julgado procedente, a interveniente passou a assumir nos autos a qualidade de , pelo que como tal passará a ser designada.
3.2.2. Da impugnação da decisão sobre matéria de facto
3.2.2.1. Considerações gerais
Dispõe o art. 662º n.º 1 do CPC que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos por assentes, a prova produzida ou um documento superveniente, impuserem decisão diversa.
Por seu turno estatui o art. 640º n.º 1 do mesmo código que quando seja impugnada a decisão sobre matéria de facto deve o recorrente especificar, sob pena de rejeição, os concretos factos que considera incorretamente julgados; os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
O n.º 2 do mesmo preceito concretiza que, sempre que o recorrente se baseie no teor de depoimentos prestados, incumbe-lhe, sob pena de imediata rejeição, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o recurso. A observância desse ónus pressupõe a indicação do início e fim das passagens dos depoimentos tidas por relevantes, podendo o recorrente, se assim o entender, proceder à transcrição dessas passagens. Tal indicação não tem necessariamente que constar das conclusões, mas deve constar da motivação do recurso. No sentido exposto cfr., entre muitos outros, os acs. RC de 17-12-2017 (Isaías Pádua), proc. 320/15.0T8MGR.C1; e STJ 06-12-2016 (Garcia Calejo), p. 437/11.0TBBGC.G1.S1.
A lei impõe assim ao apelante específicos ónus de impugnação da decisão de facto, sendo o primeiro o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida, o qual implica a análise crítica da valoração da prova feita em primeira instância, tendo como ponto de partida a totalidade da prova produzida em primeira instância.
Sumariando os ónus impostos pelo citado preceito, ensina ABRANTES GERALDES[17]:
“(…) podemos sintetizar da seguinte forma o sistema que agora vigora sempre que o recurso de apelação envolva a impugnação da decisão sobre a matéria de facto:
a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso, e síntese nas conclusões;
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) Relativamente aos pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;
d) (…)
e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente;
f) (…).”
3.2.2.2. O caso dos autos
No caso em apreço, considera este Tribunal que, em geral, a apelante observou os ónus probatórios acima enunciados. Não obstante, não deixaremos de apreciar mais em concreto as situações em que a observância de tais ónus não tenha sido respeitada.
3.2.2.2. Pontos 35., 36., 37., 69. e 71. dos factos provados – conclusões 1-, 2-, 4-, 5-, 6-, e 7-
Os pontos 35., 36., 37., 69., e 71. dos factos provados têm a seguinte redação:
35. Todos os serviços prestados estão elencados e discriminados na “Folha de Obra Salvação Marítima Sinistro Mar da Armona”, remetida à Ré.
36. Pelos serviços prestados foi emitida pela Autora e apresentada à Ré a Fatura n.º 11713/000009, datada de 04.03.2017 e com a mesma data de vencimento, que foi aceite pela Ré.
37. A Ré foi interpelada para efetuar o pagamento do valor faturado, mas nada liquidou à Autora.
69. A Autora e a Ré não submeteram à aprovação prévia da Interveniente a contratação da Autora e nem qualquer dos trabalhos ou serviços prestados pela Autora.
71. A Interveniente nunca propôs pagar qualquer quantia à Autora.
A apelante considera que todos estes factos devem ser considerados não provados, invocando fundamentos distintos.
Nesta conformidade, vamos apreciar separadamente a argumentação da apelante, relativamente a cada facto ou grupo de factos.
No tocante aos pontos 35, 36, e 37 dos factos provados, a convicção do Tribunal foi motivada nos seguintes termos:
“A convicção sobre a verificação dos factos julgados provados sob os pontos 21. a 35. resultou da apreciação, crítica e conjunta, do documento junto a fls. 176 (descriminação, ainda que algo generalizada, dos trabalhos realizados pela Autora e do valor que esta lhes fixou), das declarações de parte de João R... (já referido e que confirmou, com alguma minúcia, os trabalhos desenvolvidos pela Autora na operação de reflutuação da embarcação Mar da Armona, no seu reboque para a rampa em que permaneceu por mais de uma semana, na sua preparação para o reboque até Vila Real de Santo António e na realização deste reboque, conferindo as suas declarações sustentação à factualidade aqui considerada provada e ao que consta do documento junto a fls. 176) e José … (já referido, que deu nota genérica dos trabalhos realizados pela Autora na reflutuação da embarcação Mar da Armona enquanto esta se manteve no porto de Olhão em sentido concordante com a matéria de facto comprovada neste ponto) e dos depoimentos prestados José ... (representante legal da empresa Navaltik, nomeada pela Interveniente para realizar uma perícia ao acidente ocorrido entre a embarcação pesqueira Aurora Boreal e a embarcação Mar da Armona, confirmando ter pedido esclarecimentos à Autora e ter esta enviado o documento junto a fls. 176), Ana ......(na data dos factos colaboradora logística e de operações de resgate na Autora, confirmando os trabalhos por esta realizados no sentido considerado assente), Mafalda .... (na data dos factos trabalhadora da Autora, que prestou assistência às operações realizadas pela Autora, também confirmando genericamente parte da factualidade aqui considerada assente, referente à operação de reflutuação e ao reboque da embarcação Mar da Armona para fora do porto de Olhão), Artur .....(colaborador da Autora, que prestou assistência às operações realizadas pela Autora, confirmando parte da factualidade aqui considerada assente, referente à operação de reflutuação e ao reboque da embarcação Mar da Armona para fora do porto de Olhão) e Rui ..... (já referido, que confirmou a factualidade aqui considerada assente, referente à operação de reflutuação e ao reboque da embarcação Mar da Armona para fora do porto de Olhão, bem como à permanência da mesma embarcação no local para o qual foi inicialmente rebocada - e a insegurança do mesmo, que aconselhava a uma vigilância permanente da embarcação , justificando igualmente o tempo que a embarcação ali ficou "estacionada" com as dificuldades estruturais da embarcação - que necessitava de preparação - e as condições meteorológicas - que não se mostraram favoráveis durante algum tempo a qualquer deslocação da embarcação por mar -, até ser rebocada para Vila Real de Santo António para as instalações do estaleiro indicado pela proprietária da embarcação Mar da Armona).
A convicção sobre a verificação dos factos julgados provados sob os pontos 36. e 37. resultou da apreciação, crítica e conjunta, dos documentos juntos a fls. 111v/116 (troca de correspondência entre a Ré e a Interveniente donde resulta uma clara aceitação da Ré relativamente à factura apresentada pela Autora, junta a fls. 113, no pressuposto de que seria a Interveniente a pagar a mesma), das declarações prestada por João R... (que confirmou o envio da factura e a ausência do pagamento da mesma) e dos depoimentos prestados por José ..... (já referido, confirmando o envio da factura pela Ré e a circunstância de ter pedido esclarecimentos à Autora e ter esta enviado o documento junto a fls. 176) e João ..... (trabalhador da interveniente que geriu o processo de acidente em causa, confirmando que tiveram conhecimento da factura da Autora e que pediram esclarecimentos, sendo-lhes enviado o documento de fls. 176). Acrescenta-se aqui a inferência que se retira da circunstância da remessa à Interveniente da factura apresentada pela Autora à Ré, com a solicitação da Autora proceder ao respectivo pagamento, o que necessariamente só poderia ocorrer no âmbito do contrato de seguro que vigorava entre a Ré e a Interveniente, operando uma transferência do dever de cumprimento de uma obrigação que originalmente teria que onerar a Ré, sendo, por isso, o comportamento da Ré relativamente à factura apresentada pela Ré concludente e inequívoco no sentido da sua aceitação.”
A apelante discorda deste entendimento, por considerar que a prova produzida não permitir considerar demonstrado:
- relativamente ao ponto 35, que a “folha de obra” ali referida lhe tenha sido enviada;
- relativamente ao ponto 36, que tenha aceite tal fatura;
- relativamente ao ponto 37, que a autora a tenha interpelado.
 Para tanto argumenta que os factos constantes dos mencionados pontos 35 e 36 são contraditados pelos factos vertidos nos pontos 59, 60, 63, 64, e 66, bem como pelos depoimentos do representante legal da autora e das testemunhas José ..., Fernando ....., José ...., Artur ...., Mafalda ..., e Ana .........
Mais sustenta que a autora não fez prova nem documental de que tivesse remetido à ré a folha de obra, nem que a fatura foi aceite pela ré, invocando a este propósito os pontos 59 e 60 dos factos provados.
Analisados os documentos juntos aos autos e ouvidos os depoimentos prestados em audiência, de julgamento, cumpre dirimir as apontadas divergências.
Vejamos então.
No que respeita ao ponto 35 dos factos provados, resulta expressamente dos depoimentos do representante legal da autora e da testemunha José ... que a “folha de obra” em apreço é a que consta do documento junto com o requerimento com a refª 128166 / 31887967 apresentado pela autora em 18-03-2019 e que corresponde a fls. 176.
Da análise de tal documento resulta que os trabalhos aí descritos se mostram condizentes com os trabalhos a que se reportam os pontos 22 a 34 dos factos provados, não se descortinando qualquer contradição.
No tocante à execução dos trabalhos descritos na “folha de obra”, cremos que a mesma resultou confirmada pelo teor do depoimento do representante legal da autora, João ..., o qual, como refere o Tribunal a quo descreveu com minúcia os trabalhos executados, bem como, embora de forma mais genérica, pelos depoimentos das testemunhas José ..., Ana ...., Mafalda ..... Artur ..., e Rui ...., pelas razões expostas no trecho da motivação  da decisão sobre matéria de facto supra transcrito, que subscrevemos na íntegra.
Dos depoimentos invocados e resumidos pela apelante não resulta nenhum elemento probatório que infirme a convicção manifestada pelo Tribunal a quo no sentido de que os trabalhos descritos na folha de obra em apreço correspondem efetivamente aos trabalhos executados pela autora. Neste particular, sublinha-se que a testemunha Fernando .... (perito ao serviço da Navaltik, empresa de peritagem que a pedido da ré Mútua dos Pescadores efetuou uma peritagem acerca do acidente dos autos e procedeu à análise crítica dos custos descritos no documento de fls. 176) reconheceu que embora tenha estado no porto de Olhão no dia seguinte ao do “acidente” dos autos, não acompanhou a totalidade dos trabalhos levados a cabo pela autora, nem foi sua preocupação fazê-lo, tendo centrado a sua atenção no apuramento das causas daquele evento e da forma como o mesmo ocorreu.
Resta apenas aferir se a prova produzida permite considerar demonstrado que a autora enviou à ré B a “folha de obra” em questão.
Quanto a este aspeto, importa reconhecer que nenhuma das pessoas inquiridas na audiência final declarou que a mencionada “folha de obra” foi enviada à ré B.
Na verdade, o gerente da autora, João R..., e as testemunhas João .... (funcionário da ré C), e José .... (perito ao serviço da empresa Navaltik), declararam, de forma unânime que este documento foi enviado pela autora à empresa de peritagem Navaltik, o que foi confirmado pela testemunha Fernando ..., perito ao serviço desta empresa, que disse tê-lo recebido do seu “chefe”, a testemunha José .......
É certo que do doc. nº 35 junto pela própria ré B (fls. 113 v – 114) resulta que em 22-06-2017 esta ré enviou à ré Mútua dos Pescadores uma comunicação escrita, na qual refere que a A não aceita o valor proposto uma vez que não cobre os serviços prestados, cuja discriminação consta da nota informativa que vos enviou e de uma folha de trabalhos que vos enviou, datada de 28 de outubro de 2016”; e que este meio de prova confirma que pelo menos nesta data a ré b já tinha conhecimento da existência do mencionado documento.
Contudo, o mesmo não demonstra que a ré B tenha efetivamente recebido a “folha de obra” em apreço.
Note-se que nenhum dos gerentes da ré que depuseram na audiência final declarou ter recebido este documento.
Assim sendo, cremos que inexistem elementos probatórios suficientes para formar convicção segura de que a “folha de obra” a que se reporta o ponto 35 dos factos provados foi recebida pela ré B.
Porém, tal não significa que o ponto 35. dos factos provados deva ser suprimido na sua totalidade, mas apenas que se deve alterar a sua redação, de modo a suprimir o inciso final “, remetido à Ré”.
Consequentemente, deve igualmente aditar-se ao elenco dos factos não provados uma alínea m), com o seguinte teor:
“O documento referido em 35 foi remetido à ré B
No tocante aos pontos 36 e 37 dos factos provados considera a apelante que a fatura emitida pela autora não foi por si aceite, e que antes da propositura da injunção que deu origem à presente ação, a autora nunca a interpelou para pagar tal fatura.
Quanto a estes pontos, para além dos elementos de prova mencionados pelo Tribunal a quo, importa considerar e analisar detalhadamente a prova documental junta aos autos.
Com efeito, a própria ré B juntou aos autos os documentos nºs 28 e 29, constantes de fls. 108 a 110, sendo que:
O documento 28 (fls. 108) é uma missiva datada de 04-03-2017, onde consta como remetente a autora, e destinatário a ré B, na qual a primeira comunica à segunda “Serve a presente carta para enviar a nossa fatura nº 11713/000009, do valor € 42.004.06”. Na mesma missiva, a autora indica uma conta bancária para onde deve ser efetuado o pagamento, o que só pode ser interpretado como interpelação para pagamento.
Por sua vez, a segunda folha do doc. 28, constante de fls. 109 é uma cópia da fatura em discussão nos presentes autos.
Portanto estes documentos que foram juntos pela própria ré B demonstram que a autora lhe enviou a fatura a que se reporta o ponto 36 e que a mesma ré a recebeu.
Donde, não se entende como pode a apelante sustentar que este facto não ficou provado.
Quanto à conformidade entre esta fatura e os serviços prestados pela autora, e à aceitação pela ré Fadáriopesca dos montantes faturados, releva desde logo o doc. 29, constante de fls. 117 v e 118, e junto pela mesma ré. Este documento constitui a cópia de uma carta datada de 07-03-2017, dirigida pela ré B à ré C, na qual a primeira anuncia que “De acordo com as vossas instruções (…) enviamos a fatura relativa aos serviços prestados pela A por causa do acidente entre a embarcação segurada, a Aurora Boreal, e a Mar da Armona”.  O mesmo documento integra ainda uma cópia da fatura em apreço. Acresce ainda o doc. 35 também junto pela própria ré Fadáriopesca (fls. 113 v e 114), documenta que a mesma enviou à ré C uma missiva datada de 22-06-2017, na qual, como já mencionámos, a apelante se refere à “folha de obra” mencionada no ponto 35 dos factos provados, instando a ré C a que “seja revista a proposta indemnizatória” (ou seja a proposta apresentada na missiva de fls. 112), “de modo que satisfaça o crédito da A pelos trabalhos prestados e cuja prontidão, aliás, evitou que os prejuízos totais resultantes do acidente fossem ainda mais elevados (…)”.
O que ressalva de forma inequívoca desta troca de correspondência, é a admissão pela própria ré B, de que:
- recebeu a fatura em apreço, que lhe foi enviada pela autora, e com interpelação para pagamento;
- os trabalhos faturados pela autora foram efetivamente executados;
- a ré Fadáriopesca considerou que o montante faturado era devido à autora.
Finalmente diremos que é pacífico entre todas as partes que a autora não pagou à ré o montante titulado pela fatura em questão.
Donde se conclui que todos os factos vertidos nos pontos 35. a 37. devem considerar-se provados.
Relativamente ao ponto 69 dos factos provados, sustenta a apelante que os factos aqui vertidos devem considerar-se não provados porque “naturalisticamente a aprovação da contratação da autora pela C era materialmente impossível atenta a urgência de conter o afundamento e de conter a extensão dos efeitos danosos do evento.”
Quanto a este ponto, verifica-se que a apelante não cumpriu o ónus que lhe é imposto pelo art. 640º, nº 1, al. b) do CPC, na medida em que não indicou os concretos meios probatórios em que sustenta a sua convicção de que este facto deve ser considerado não provado.
Não obstante, sempre diremos que a sua argumentação carece de fundamento.
Na verdade, este ponto de facto apenas aponta que nem a autora nem a ré submeteram a contratação da autora ou a execução de qualquer dos trabalhos à prévia aprovação da ré C.
Este facto havia sido alegado pela ré C no art. 12º do articulado com a refª 128655 / 32035563, de 01-04-2019 (fls. 181-184).
Ao argumentar que não era possível ter obtido aquela aprovação prévia, atenta a urgência, a apelante está a confirmar que tal aprovação prévia não foi obtida, embora apresentando uma justificação para tal omissão.
Logo, ainda que se considerasse admissível a impugnação da decisão sobre matéria de facto quanto a este ponto, sempre se teria de concluir pela sua improcedência.
Finalmente, e no que respeita ao ponto 71 dos factos provados, entende a apelante que o mesmo deve ser considerado não provado por ser incompatível com o ponto 64 (conclusão 7).
Mais uma vez não lhe assiste razão.
No ponto 71. dos factos provados diz-se que a C nunca se propôs pagar qualquer quantia à autora, ao passo que no ponto 64. refere que a ré C se prontificou “a indemnizar a ré” (B) “em 29.093,00 euros, e enviando o recibo desta indemnização”.
Ora, a prova produzida e a demais factualidade provada revelam que a ré C nunca se propôs efetuar qualquer pagamento à autora, tanto mais que informou a apelante repetidamente, de que a autora deveria emitir a fatura em nome da B. Tal é o que resulta claramente dos pontos 52., 53., e 56. Dos factos provados, que a apelante não impugnou, bem como do próprio ponto 64, e bem assim do documento 17 junto pela ré Fadáriopesca, constante de fls. 96.
Reitera-se que na missiva enviada pela ré Mútua dos Pescadores à ré B constante de fls. 112 v., a primeira formula uma “proposta indemnizatória de 29.093,00”, acompanhada de um recibo, constante de fls. 113, no qual quem figura como “entidade recebedora” é a ré B, e não a autora.
O que sobressai desta troca de correspondência é que a ré C admitiu reembolsar a ré B das despesas decorrentes das operações executadas pela autora que se apurasse terem sido efetivamente levadas a cabo e sempre de acordo com os preços de mercado.
Destes elementos probatórios resulta que os contactos entre a ré C e a autora se destinavam a apurar o valor de mercado dos serviços prestados por esta última, com vista a habilitar a primeira a apresentar à ré B a “proposta de indemnização” acima referida.
Estes elementos probatórios mostram-se em linha com o teor dos depoimentos do representante legal da ré João ......e da testemunha João ....e (funcionário da ré C ) que confirmaram o sentido geral da mesma troca de correspondência.
Da conjugação destes meios de prova resulta por isso, a firme convicção de que que em momento algum a ré C admitiu efetuar qualquer pagamento diretamente à autora ou lhe dirigiu qualquer proposta de indemnização.
Donde se conclui que os factos vertidos no ponto 71. dos factos provados resultaram efetivamente provados, e que a impugnação da decisão sobre matéria de facto também improcede no que respeita a este ponto.
3.2.2.3. Als. i) e j) dos factos não provados – conclusões 112 a 118, e 183 a 193
As als. i) e j) dos factos não provados têm a seguinte redação:
i) A Ré nunca aceitou pagar os serviços prestados pela Autora destinados a colocar a embarcação “Mar da Armona” a flutuar, evitando o seu completo afundamento, e de auxiliar a deslocá--la para a rampa dos estaleiros navais e daí para Vila Real de Santo António, sempre tendo remetido tal pagamento para a C.
j) A C, por carta datada de 26 de maio de 2017, prontificou-se a indemnizar a Autora em 29.093,00 euros.
A apelante conclui que estes factos devem ser considerados provados, como decorrência da procedência da sua impugnação da decisão sobre matéria de facto quanto aos pontos 35 a 37, 69 e 71 dos factos provados (2º parágrafo de fls. 15 da motivação do recurso, e conclusão 3).
Considerando que a impugnação da decisão sobre matéria de facto, no que respeita a estes pontos soçobrou em toda a linha, exceto quanto ao recebimento pela ré B da “folha de obra” referida no ponto 35, o que se revela inócuo quanto à reapreciação da decisão probatória relativa à als. i) e j) dos factos não provados, conclui-se que também nesta parte improcede a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
3.2.2.4 Síntese conclusiva
Face ao supra exposto, conclui-se pela parcial procedência da impugnação da decisão sobre matéria de facto, nos seguintes termos:
1. O ponto 35. dos factos provados, passará a ter o seguinte teor: “Todos os serviços prestados estão elencados e discriminados na “Folha de Obra Salvação Marítima Sinistro Mar da Armona”.
2. Adita-se ao elenco dos factos não provados uma alínea m), com o seguinte teor: “O documento referido em 35 foi remetido à ré B.
3.2.2.5. Factos a considerar
Em consequência do supra decidido, os factos a considerar na reapreciação do mérito da causa, no contexto do presente recurso são os que adiante se indicam.
3.2.2.5.1. Factos provados
1. A Autora é uma empresa que se dedica a atividades turísticas, atividades marítimo turísticas e organização de atividades de animação turística, ações de formação relacionadas com atividades desportivas, náutica, aquáticas e subaquáticas; aluguer de artigos e acessórios recreativos, desportivos, técnicos, profissionais, náuticos, embarcações, motores, atrelados, assistência técnica; aluguer, comercialização e manutenção de embarcações com e sem motor; comercialização de material de mergulho, recreativo e profissional; centro e escola de mergulho profissional e amador; comércio de gases; equipamentos, acessórios, analisadores e células de gases; comércio de vestuário e acessórios, calçado, malas, e outros bens similares; comércio de aprestos marítimos produtos alimentícios; corte ultratérmico e soldadura submarina; consultadoria de mergulho; demolição com uso de explosivos; escola de navegação de recreio; equipamentos de som e vídeo terreste e subaquática; equipamentos de comunicação terreste e subaquática; equipamento fotográfico e de filmar terreste e subaquática; informática e acessórios, equipamentos eletrónicos artigos para decoração, utilidades para o lar, artigos desportivos; instrução e fabrico certificado de misturas gasosas, trimix , heliox, nitrox , O2 , hipoxias e hiperoxias para o mergulho amador, técnico e profissional; mergulho profissional; mergulho amador; mergulho técnico; material de pesca desportiva; mecânica naval e atividades auxiliares dos transportes por água; organização e prestação de serviços relacionados com atividades lúdicas, culturais, de lazer, desportivas, náuticas e subaquáticas, nomeadamente, viagens, eventos recreativos de aventura, eventos desportivos, mergulho subaquático, educação física; prestação de serviços de manutenção de artigos e equipamentos recreativos e profissionais, desportivos, náuticos, aquáticos e subaquáticos; peritagem marítima e subaquática; peritagem aos equipamentos de mergulho recreativo, desportivo , técnico e profissional; salvação marítima; socorro naval e marítimo; reboques terrestes e náuticos, reflutuação e transporte de equipamentos e outros navais; resgate aquático, náutico e subaquático; representação, comercialização, importação e exportação, produtos, equipamentos recreativos e profissionais, desportivos, náuticos, aquático e subaquáticos; bem como outdoor.
2. Em 22 de Setembro de 2016, pelas 23 horas e 20 minutos, a embarcação "Aurora Boreal" embateu na embarcação "Mar da Armona", propriedade de Companhia Pescarias do Algarve.
3. A embarcação “Aurora Boreal” regressava da faina da pesca, e, ao fazer a manobra de acostagem ao cais de combustível da doca de pesca de Olhão, o comando da embraiagem elétrico não correspondeu à ordem de marcha a ré.
4. O que levou a que o Aurora Boreal fosse embater na ré de estibordo do catamarã denominado “Mar da Armona”, de casco em fibra de vidro, que aí se encontrava acostado.
5. Não se encontrava ninguém a bordo da embarcação “Mar da Armona”.
6. O abalroamento deveu-se a uma falha nos comandos da caixa redutora do “Aurora Boreal”, não tendo o sistema propulsor da embarcação engrenado a ré, apesar de acionado o comando para tal.
7. Ao embater no “Mar da Armona”, o “Aurora Boreal” desviou-se para o largo da doca e o Mestre dirigiu a embarcação para a saída da doca, para evitar mais acidentes.
8. E, em simultâneo, ordenou ao motorista, por meio do intercomunicador, que verificasse o que se passava.
9. O motorista atuou de imediato e conseguiu fazer o "reset" do "MicroCommander", executando a manobra de restabelecer novamente a energia ("reset") do "MicroCommander", e foi desta forma restabelecida a operacionalidade dos comandos da caixa redutora.
10. Após este "reset" foi possível manobrar normalmente a embarcação, pelo que a mesma não chegou a deixar a doca.
11. Em ato contínuo, o "Aurora Boreal" atracou ao "Mar da Armona" para abraçar este àquele.
12. Esta manobra de "abraço" foi feita mediante cabos de massa e cabos de aço, por parte da tripulação do "Aurora Boreal", para evitar o afundamento total da embarcação embatida, o que foi conseguido.
13. Terminadas de abraçar as duas embarcações, o sócio gerente da Ré, João ...., cerca das 23 horas e 42 minutos, telefonou para o seu interlocutor habitual da C (delegação em Olhão) e empregado desta.
14. Pretendia o auxílio da sua seguradora e instruções sobre como proceder, mas aquele, Sr. José ...., não atendeu a chamada, feita para o telefone 96 709 60 72.
15. Voltou a telefonar-lhe pelas 8 horas e 9 minutos da manhã do dia seguinte, sem resposta, e enviou-lhe SMS pelas 8 horas e 15 minutos, tendo, a esta mensagem, aquele respondido de imediato com uma chamada telefónica, pedindo desculpa por não ter ouvido as chamadas anteriores.
16. Os bombeiros não conseguiram bombear a água que havia inundado o flutuador de estibordo da embarcação “Mar da Armona”.
17. O Capitão do Porto e o representante da Docapesca queriam evitar o afundamento total da embarcação embatida também por questões de segurança da navegação na doca.
18. O proprietário do “Mar da Armona” e a respetiva seguradora não indicaram quem o fizesse.
19. Um dos representantes legais da Ré contactou a Autora, de modo a que esta interviesse e evitasse o afundamento da embarcação “Mar da Armona”.
20. A Autora recebeu da Ré B  uma chamada para auxílio da embarcação "Mar da Armona", às 00h20 do dia 23 de setembro de 2016.
21. As duas embarcações ficaram abraçadas para evitar o afundamento total do “Mar da Armona” até cerca das 16.30 horas de 23 de setembro de 2016.
22. Por esta hora a equipa de mergulhadores da autora terminou de colocar um sistema que permitiu que o “Mar da Armona” ficasse a flutuar.
23. Esta operação tinha tido início pelas 2 horas de 23 de setembro de 2016.
24. A operação de reflutuação/mergulho teve a duração de cerca de 19h e a mesma incluiu a retirada de aguas residuais de todos os compartimentos da embarcação, limpeza da mesma, realização das respetivas seguranças da embarcação, assistência e orientação dos trabalhos de manutenção realizados aos motores e eletricista naval, formalidades com as autoridades competentes, preparação da embarcação para reboque, tratamento e assistência em todas as vistorias necessárias e exigidas pelas autoridades, transporte da lancha tal como exigido pelas autoridades para assistir e rebocar a embarcação para os estaleiros de Vila Real de Santo António, inclusive reunião de tripulação credenciada para levar a embarcação sinistrada para o estaleiro.
25. Nesta operação foram também utilizados, constantemente, geradores e bombas submersíveis, que fizeram parte do plano de segurança exigido pela Autoridade Marítima, também para a realização do reboque.
26. Esta embarcação foi removida do cais onde estava atracada aquando do acidente, por haver perigo de se voltar a afundar e causar danos à navegação e à entrada do porto de pesca de Olhão.
27. Por sugestão da Ré veio a embarcação "Adélia da Paz" (propriedade de um primo dos sócios da Ré) fazer o reboque, primeiro até à rampa dos estaleiros navais de Olhão, e, depois, com a preia-mar, e com ajuda dos mergulhadores da Autora, mais para cima, na mesma rampa, para maior segurança.
28. Foi colocada na única rampa existente no porto de Olhão, para ficar em segurança, sendo esta uma zona semi deserta e onde ocorrem roubos.
29. Por este motivo, a Autora colocou um elemento da sua equipa de serviço permanente de guarda à embarcação sinistrada, 24h sobre 24h.
30. Este serviço de guarda à embarcação pela Autora teve a duração de 12 dias, e teve início em 23.09.2016, sexta feira, cerca das 20h00 da noite, após o término dos trabalhos de reflutuação.
31. O serviço de guarda teve o seu termo no dia 06.10.2016, quinta feira às 8h00 da manhã, aquando da deslocação do reboque/transporte da embarcação de Olhão para Vila Real de Santo António.
32. O elemento da equipa da Autora que ficou de guarda, de dia também trabalhou na limpeza, manutenção e preparação da embarcação para ser levada para o estaleiro da Nautiber em Vila Real Santo António onde seria reparada (por exigência da sua proprietária e sem oposição da interveniente).
33. Existiram 18 deslocações de mais dois elementos da equipa da Autora de Portimão para Olhão e de Olhão para Portimão, em viatura própria da Autora.
34. No serviço de reboque que foi efetuado de Olhão para Vila Real de Santo António estão incluídas todas as despesas, desde deslocações de viaturas e transporte de lancha de Portimão para Olhão e de Olhão para Vila Real de Santo António e regresso a Portimão, combustíveis, pessoal, utilização de gruas para colocar e retirar a embarcação da Autora na água.
35. Todos os serviços prestados estão elencados e discriminados na “Folha de Obra Salvação Marítima Sinistro Mar da Armona”.
36. Pelos serviços prestados foi emitida pela Autora e apresentada à Ré a Fatura n.º 11713/000009, datada de 04.03.2017 e com a mesma data de vencimento, que foi aceite pela Ré.
37. A Ré foi interpelada para efetuar o pagamento do valor faturado, mas nada liquidou à Autora.
38. A Ré dedica-se à indústria da pesca.
39. A Ré é a dona e possuidora da embarcação de pesca denominada "Aurora Boreal", matriculada com o número O-2125-C.
40. A Ré contratou seguro de ramo marítimo/casco relativamente a tal embarcação, titulado pela apólice 88/42560, com a C, até ao limite de 1.200.000,00 euros, que cobre, entre outros, responsabilidade civil por danos patrimoniais causados a terceiros e é regulado pelas condições gerais, cláusulas particulares e condições particulares que constam dos documentos juntos a fls. 62v/81v que se dão por reproduzidos, com início de vigência em 2 de agosto de 2016.
41. A este contrato de seguro respeita a "ata adicional" junta a fls. 82/82v que se dá por reproduzida.
42. A embarcação "Aurora Boreal" foi inspecionada por ordem da Capitania do Porto de Olhão, tendo sido elaborado relatório dessa perícia e respetivas recomendações, datado de 26 de setembro de 2016.
43. A Capitania declarou que a embarcação Aurora Boreal estava em condições de retomar a sua atividade normal.
44. A Ré determinou suspender a sua faina com a embarcação "Aurora Boreal" a partir de 27 de setembro de 2016, o que comunicou à Mútua Seguradora.
45. Permaneceu acostada, para serem observadas todas as recomendações de verificação do sistema de comando e controlo da caixa redutora que figuram no relatório da vistoria ordenada pela Capitania.
46. A Ré decidiu mudar o sistema de comando.
47. A avaria não foi prevista e nem era esperada.
48. A Ré efetuou a participação do acidente à C e fez um aditamento a essa participação inicial, com data de 28 de setembro de 2016, nos termos constantes do documento junto a fls. 83/88 e que se dá por reproduzido, em que solicitou também indicações quanto ao modo de proceder para que a autora fosse paga pelos serviços que prestou, diretamente pela seguradora.
49. Por carta datada de 26 de outubro de 2016, a Ré comunicou à sua seguradora que instalou na embarcação segurada novo sistema de comandos, nos termos constantes do documento junto a fls. 88v/ 89 e que se dá por reproduzido.
50. Com data de 9 de novembro de 2016, a Ré expediu uma carta para a sua seguradora, nos termos constantes do documento junto a fls. 89v/ 90v e que se dá por reproduzido, solicitando-lhe instruções sobre como deveria a Autora A proceder perante a mesma C a fim de ser paga pelos serviços prestados.
51. A Mútua Seguradora não respondeu e, com data de 5 de janeiro de 2017, a Ré enviou-lhe uma carta, nos termos constantes do documento junto a fls. 91 / 92v e que se dá por reproduzido, solicitando que lhe fosse indicado o que estava em falta, para que fosse feito o pagamento aos lesados pelo acidente o mais rápido possível.
52. Por carta datada de 6 de janeiro de 2017, nos termos constantes do documento junto a fls. 93/95v e que se dá por reproduzido, a Ré pediu à C que esclarecesse se a afirmação da mesma, via email do dia anterior, de que os serviços (da autora) "devem ser faturados ao armador porque foi este que os solicitou" equivalia a uma rejeição da responsabilidade pelo pagamento dos mesmos.
53. A C, em resposta às referidas cartas da Ré, de 5 e 6 de Janeiro de 2017, e à de 9 de Novembro de 2016, respondeu que a fatura a emitir pelos lesados deveria ser "endereçada à entidade que contratou o serviço prestado", que "acresce uma razão adicional relativa ao código do IVA", que não havia qualquer desresponsabilização da sua parte e que "a decisão final de regularização deste processo está assim dependente da apresentação da fatura da A e das conclusões do processo instaurado pela Autoridade Marítima, nos termos constantes do documento junto a fls. 96 e que se dá por reproduzido.
54. Por carta datada de 1 de fevereiro de 2017, a Ré enviou à Mútua Seguradora a notificação das referidas conclusões da Autoridade Marítima, que refere ter-se tratado de um acidente, inexistindo negligência da tripulação, nos termos constantes do documento junto a fls. 96v/101 e que se dá por reproduzido.
55. Nessa carta a Ré questionou a C se a A podia emitir a fatura à C, pedindo indicação sobre o número de contribuinte desta, ou, caso entendesse ser de faturar à Ré, que confirmasse que se responsabilizaria pelo pagamento.
56. Por carta de 7 de fevereiro de 2017, a C comunicou que a fatura da A deveria ser endereçada à entidade que contratou o serviço prestado, acrescentando que aguardava a fatura da A para análise e decisão final, nos termos constantes do documento junto a fls. 101v e que se dá por reproduzido.
57. Por carta datada de 13 de fevereiro de 2017, a Ré questionou a C sobre se, partindo do princípio que aceitaria assumir a responsabilidade pelo pagamento à A (ora autora), a C a esta o pagamento diretamente ou se seria outro o procedimento, e qual, nos termos constantes do documento junto a fls. 102/103 e que se dá por reproduzido.
58. Por carta datada de 9 de março de 2017, a Ré enviou à C a certidão do processo da Capitania/Autoridade Marítima, nos termos constantes do documento junto a fls. 103v/108 e que se dá por reproduzido.
59. A Ré foi dando conhecimento ao representante legal da Autora, João ..., de todas estas respostas e posições da sua seguradora, quando este o questionava quando a C iria pagar os serviços da autora.
60. O representante legal da autora também manteve contactos o perito da C, Eng. José ...., tendo enviado a este, a pedido da C, em 28 de outubro de 2016, uma discriminação dos trabalhos e o preço dos mesmos, que coincide com o valor faturado.
61. Por carta de 4 de março de 2017, a Autora enviou à Ré a fatura com a identificação “1 1713/000009” no valor de 42.004,60 euros, que tem escrito, “Equipa de Resgate Salvação Marítima - Mergulho Profissional”, sem IVA, nos termos constantes do documento junto a fls. 108v/109 e que se dá por reproduzido.
62. Por carta datada de 7 de março de 2017 a Ré, frisando fazê-lo de acordo com as instruções da C, enviou esta fatura à sua seguradora e pediu que o pagamento fosse feito com a brevidade possível, diretamente para a conta a Autora, cujos detalhes forneceu, nos termos constantes do documento junto a fls. 109v/111 e que se dá por reproduzido.
63. A C, através de Miguel ...., enviou um email à Ré acusou a receção da fatura e comunicou que a iria reencaminhar para a peritagem, nos termos constantes do documento junto a fls. 111v/112 e que se dá por reproduzido.
64. A C, por carta datada de 26 de maio de 2017, comunicou à Ré que, apesar das insistências do seu perito, a Autora não lhe tinha apresentado justificação de trabalhos que importassem, no total, em 42.004,60 euros, prontificando-se a indemnizar a Ré em 29.093,00 euros e enviando o recibo desta indemnização, nos termos constantes do documento junto a fls. 112v/113 e que se dá por reproduzido.
65. A C emitiu recibo de indemnização de 55.383,13 euros à proprietária da embarcação embatida, em virtude de despesas com a reparação dos danos materiais causados à mesma pela colisão.
66. Por carta datada de 22 de junho de 2017, a Ré comunicou à C, sua seguradora, que a Autora lhe comunicara que nenhum perito havia feito qualquer averiguação junto da mesma quanto à extinção ou valor dos trabalhos efetuados, nos termos constantes do documento junto a fls. 113v/115 e que se dá por reproduzido.
67. A  C respondeu à ré por carta datada de 20 de julho de 2017, comunicando que indemnizará na totalidade o montante que for acordado entre as partes, ou, na falta de acordo, pelo montante a fixar pelo Tribunal, nos termos constantes do documento junto a fls. 115v e que se dá por reproduzido.
68. Por carta datada de 12 de julho de 2017, a C declarou à ré a agravação do prémio do seguro, atribuindo à carteira de seguros da ré o apelido de “problemática”, nos termos constantes do documento junto a fls. 116 e que se dá por reproduzido.
69. A Autora e a Ré não submeteram à aprovação prévia da Interveniente a contratação da Autora e nem qualquer dos trabalhos ou serviços prestados pela Autora.
70. A embarcação “Aurora Boreal” e a respetiva tripulação procederam a trabalhos de salvação e colaboraram na reflutuação da embarcação “Mar da Armona”.
71. A Interveniente nunca propôs pagar qualquer quantia à Autora.
3.2.2.5.2. Factos não provados
a) O Capitão do Porto e o representante da Docapesca perguntaram ao Mestre do "Aurora Boreal" se conhecia equipa apta a colocar um sistema de flutuação ao "Mar da Armona".
b) O representante legal da Ré apenas sugeriu a empresa da Autora.
c) A equipa de mergulhadores profissionais da autora "A, de Portimão, foi sugerida pela Ré, a pedido do Capitão do Porto e do representante da Docapesca.
d) Depois de colocado o "Mar da Armona" a flutuar, o Capitão do Porto pediu ainda à Ré que indicasse alguém para rebocar aquela embarcação para local mais apropriado, em vista da segurança da navegação.
e) A Ré requisitou os serviços de reboque para a rampa da doca dos estaleiros navais por ordem do Capitão do Porto.
f) A Ré chamou a Autora a pedido do Capitão do Porto e do representante da Docapesca.
g) A C aceitou o evento como acidente, coberto pela apólice de seguro acima mencionada.
h) O representante legal da autora também manteve contactos com a C.
i) A Ré nunca aceitou pagar os serviços prestados pela Autora destinados a colocar a embarcação "Mar da Armona" a flutuar, evitando o seu completo afundamento, e de auxiliar a deslocá-la para a rampa dos estaleiros navais e daí para Vila Real de Santo António, sempre tendo remetido tal pagamento para a C.
j) A C, por carta datada de 26 de maio de 2017, prontificou se a indemnizar a Autora em 29.093,00 euros.
k) Não foi efetuado qualquer serviço de reboque da embarcação "Mar Da Armona" pela Autora.
l) A fatura emitida pela Autora à Ré apresentava um valor total sem que fosse possível estabelecer a sua correspondência com os serviços alegadamente prestados pela Autora à Ré, tornando impossível comparar esses valores com os valores praticados no mercado para idênticos serviços.
m) O documento referido em 35 foi remetido à ré B.
3.2.3. Do mérito da causa
3.2.3.1. Da responsabilidade da ré Fadáriopesca, Lda
3.2.3.1.1. Enquadramento prévio
Analisando caso dos autos, e procurando proceder ao seu enquadramento jurídico, sustentou a sentença recorrida que “Não identificando a Autora o fundamento do pedido que aqui formulou, à luz da factualidade que alegou e que se apreciou na presente acção, parece-nos que o mesmo só poderá ser encontrado no âmbito da responsabilidade civil extracontratual ou, se aqui não lograr acolhimento, no plano da responsabilização contratual.”
Não é esse o nosso entendimento.
Com efeito, a presente ação declarativa de condenação iniciou-se com a propositura de um procedimento de injunção intentado pela autora contra a ré B, nos termos previstos no regime dos procedimentos para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, aprovado pelo DL nº 269/98, de 01-09[18].
Tal procedimento estava igualmente sujeito ao disposto no DL 62/2013, de 10-05, cujo art. 10º confere ao credor numa transação comercial que não envolva consumidores (vd. art. 2º, nº 1 e 2 deste diploma) a faculdade de recorrer à injunção independentemente co valor do crédito, ou seja, ainda que o montante deste seja superior a € 15.000,00, sendo que este último constitui o limite no regime geral da injunção (vd. arts. 7º do RPCOPEC, e art. 1º do diploma preambular).
No caso vertente, quer a autora, quer a ré B são sociedades comerciais, e da leitura do requerimento de injunção resulta que a requerente invocou a outorga entre ambas de um contrato de prestação de serviços, tendo ainda alegado que a requerida não lhe pagou o preço correspondente aos serviços prestados.
Por força da dedução, pela então requerida B, de oposição à injunção, e porque o valor da injunção excedia metade da alçada da Relação, ou seja, era superior a € 15.000,00[19], nos termos previstos nos arts. 16º e 17º do RECOPEC e 10º, nº 2 do DL62/2013, o processo passou a seguir a forma de processo comum de declaração.
A convolação do procedimento de injunção em ação declarativa de condenação com processo comum não viabilizou a alteração da causa de pedir, que permaneceu necessariamente a mesma, ou seja, o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato.
Assim sendo, e no que respeita à responsabilidade da ré B perante a autora, não se justifica mencionada convolação da causa de pedir para o instituto da responsabilidade civil.
Aliás, e em bom rigor, tal nem sequer seria possível.
Com efeito, conforme dispõe o art. 7º, nº 1 do RCOPEC, considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento:
- das obrigações a que se refere o art. 1º do diploma preambular, ou seja, das “obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a (euro) 15000”; ou
- “das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei nº 32/2003, de 17 de fevereiro”.
Este diploma foi revogado pelo DL 62/2013, devendo as remissões legais feitas para aquele considerar-se efetuadas para este. Assim, atendendo ao disposto nos arts. 2º, nºs 1 e 2, al. a), e 3º, al. b) da referida lei, estarão em causa os créditos emergentes de transações comerciais, em que não seja parte um consumidor, nomeadamente os emergentes de transações comerciais entre empresas.
Como explica PAULO DUARTE TEIXEIRA[20], a delimitação do âmbito de aplicação do procedimento de injunção faz-se através do estabelecimento de pressupostos objetivos e subjetivos.
Quanto aos pressupostos objetivos, releva a densificação dos conceitos de obrigação pecuniária emergente de contrato (art. 1º do DL 269/98) e transação comercial (art. 3º, al. b) da L 62/2013); ao passo que no tocante aos pressupostos subjetivos avulta a concretização dos conceitos de consumidor (art. 2º, nº 2 da L 62/2013), entidade pública (art. 3º, al. c) da L 62/2013) e empresa (art. 3º, al. d) da L 62/2013).
O mesmo autor, seguindo o entendimento de SALVADOR DA COSTA[21] sustenta que o não preenchimento de algum dos referidos pressupostos pode configurar uma exceção dilatória inominada de conhecimento oficioso[22].
Na verdade, como refere PAULO DUARTE TEIXEIRA[23], o conceito de obrigação pecuniária subjacente ao DL 269/98 deve interpretar-se de modo estrito, pelo que “quando o dinheiro funcionar como substituto do valor económico de um bem ou da reintegração do património, não estará preenchido o pressuposto objetivo da admissibilidade do procedimento de injunção. Será este o caso, por exemplo, das situações de enriquecimento sem causa, indemnização por benfeitorias, obrigação e restituir o valor da coisa como consequência da nulidade ou resolução (art. 289º do CC), e as obrigações de restituição as quantias recebidas em virtude do contrato de mandato.
Podemos assim desde logo demarcar, negativamente, a pretensão substancial que pode ser processualizada nesta acção, ou seja: apenas aquelas que se baseiam em relações contratuais cujo objecto da prestação seja directamente a referência numérica a uma determinada quantidade monetária.
Daqui resulta que só pode ser objeto do pedido de injunção o cumprimento de obrigações pecuniárias diretamente emergentes de contrato, mas já não pode ser peticionado naquela forma processual obrigações com outra fonte, nomeadamente derivada de responsabilidade civil. O pedido processualmente admissível será, assim, a prestação contratual estabelecida entre as partes cujo objecto seja em si mesmo uma soma de dinheiro e não um valor representado em dinheiro.”
E não é a dedução de oposição e posterior convolação do procedimento de injunção em ação declarativa de condenação com processo comum que altera tal estado de coisas.
Por outro lado, considerando que, de acordo com o alegado pela autora, o crédito invocado no requerimento de injunção emerge de contrato celebrado entre duas sociedades comerciais, no âmbito das respetivas atividades, é de concluir que ao prestar os serviços que alega ter prestado à requerida, a requerente atuou no âmbito do seu objeto comercial. Consequentemente, não temos qualquer dúvida em considerar preenchido o pressuposto objetivo da transação comercial e o pressuposto subjetivo do estatuto de empresa previstos respetivamente, nas als. b) e d) do art. 3º da L 62/2013.
Note-se que a primeira alínea citada qualifica como transação comercial aquela que tem por objeto o fornecimento de bens ou serviços contra remuneração (em dinheiro).
3.2.3.1.2. Do contrato de prestação de serviços celebrado entre a autora e a ré Fadáriopesca e dos créditos dele emergentes
Vejamos então se entre autora e ré B foi celebrado um contrato de prestação de serviços.
Como é sabido, este tipo contratual encontra-se previsto e regulado no art. 1154º do Código Civil, que o define como “aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição”.
No caso em apreço, resultou provado que por solicitação expressa da ré B [24], a autora executou os trabalhos necessários à manutenção das condições de flutuação do navio “Mar da Armona”, que incluíram a colocação de dispositivos de flutuação, por mergulhadores, implicando a remoção de águas de todos os compartimentos da mencionada embarcação, limpeza da mesma, realização de seguranças, assistência e orientação dos trabalhos de manutenção dos motores, eletricista naval, formalidades com as autoridades competentes, preparação da embarcação para reboque, tratamento e assistência em todas as vistorias necessárias e exigidas pelas autoridades, transporte da lancha tal como exigido pelas autoridades para assistir e rebocar a embarcação da doca de pesca de Olhão para os estaleiros em Vila Real de Santo António, reunião de tripulação credenciada para transportar a embarcação acidentada para o estaleiro, com utilização de geradores e bombas submersíveis, e ainda serviços de guarda e vigilância à embarcação acidentada. [25]
Sendo a autora uma empresa comercial, e estando os trabalhos efetuados inseridos no âmbito do seu objeto social o qual compreende, entre outras, as atividades de assistência técnica, aluguer, comercialização e manutenção de embarcações com e sem motor, mergulho técnico e profissional, mecânica naval e atividades auxiliares dos transportes por água, salvação marítima, socorro naval e marítimo, reboques terrestres e náuticos, reflutuação e transporte de equipamentos e outros navais, resgate aquático náutico, e subaquático[26], e sendo a ré igualmente uma empresa comercial, forçoso é concluir que o contrato firmado entre as partes tinha natureza onerosa – art. 1158º, nº 1 do CC, aplicável ex vi do art. 1156º do mesmo código.
Nos termos do disposto no art. 1158º, nº 2 do mesmo código, também aplicável ex vi do art. 1156º, quando o contrato de prestação de serviços seja oneroso, a determinação do preço faz-se por acordo das partes e na falta deste, por aplicação das tarifas profissionais, ou quando as mesmas não existam, pelos usos.  Inexistindo usos aplicáveis, deverá o preço ser fixado de acordo com a equidade.
No caso vertente, resultou provado que pelos serviços prestados em 04-03-2017 a autora emitiu e enviou à ré a fatura nº 11713/000009, no valor de € 42.004,60, e que esta a recebeu e aceitou[27], o que significa que o preço dos serviços prestados ficou fixado por acordo.
Porém, apurou-se igualmente que a ré B não pagou o preço ajustado[28].
Por outro lado, com a interpelação a ré B[29] constituiu-se em mora – art. 804º, nº 1 do CPC.
A simples mora constitui o devedor na obrigação de indemnizar (art. 804º, nº 1 do CC), que consubstancia no pagamento de juros de mora sobre o montante em falta (art. 806º, nº 1 do CC). Na falta de convenção das partes em sentido diverso, tais juros correspondem aos juros legais (arts. 806º, nº 2, e 559º, nº 1 do CC).
Sendo a autora uma empresa comercial, tais juros são os fixados na Portaria que regula os juros de que são credoras as empresas comerciais (arts. 2º, 13º, 102º e 230º do Código Comercial). Tal taxa é revista semestralmente, sendo fixada por Portaria (cfr. Portaria nº 1105/2004, de 16-10).
Consequentemente, para além do preço ajustado e não pago, tem a ré direito a ser indemnizada pela mora, correspondendo a indemnização aos juros de mora, à taxa legal aplicável aos créditos comerciais que, no ano de 2017 foi de 7% ao ano (cfr. Avisos do Ministério das Finanças nºs 2583/2017, de 14-03, e 8544/2017, de 01-08).
3.2.3.2. Da responsabilidade da ré C
Pretende a ré B que estando os custos do salvamento cobertos pelo contrato de seguro que firmou com a ré C, deve o Tribunal condenar apenas esta, e absolvê-la a si.
Tal afirmação assenta em duas premissas:
1.ª Que os custos da operação que constituem o objeto do contrato de prestação de serviços celebrado entre a autora e a ré B se acham abrangidos pela cobertura do contrato de seguro firmado entre as rés;
2.ª Que por efeito de tal contrato de seguro apenas a ré C  é responsável pela despesa decorrente do contrato dos autos, razão pela qual apenas esta deve ser condenada a pagar à autora o respetivo preço.
3.2.3.2.1. Da solidariedade na obrigação e indemnizar
Comecemos pela segunda questão enunciada, visto que a própria apelante já lhe deu resposta negativa.
Com efeito, nos arts. 97 a 99 do articulado de oposição, a ora apelante referiu assertivamente:
“(…) atenta a natureza do contrato de seguro de responsabilidade civil, assumidamente concebido como um contrato a favor de terceiro (art. 444º, do Código Civil), a seguradora obriga-se, também, para com o lesado a satisfazer a indemnização devida, ficando aquele com o direito de demandar directamente a seguradora, ou o segurado, ou ambos, em litisconsórcio voluntário (considerando que o contrato de seguro de responsabilidade civil consubstancia um contrato a favor de terceiro podem ver-se, entre outros, os Acs. do STJ de 16.01.1970, BMJ, nº 193, pág. 359, e de 30.03.1989, BMJ, nº 385, pág. 563, e o Acs. da RL de 07.11.2006, proc. 7576/2206-7, e da RP de 06.07.2009, proc. 721/08.0TVPRT-A.P1, ambos disponíveis in www.dgsi.pt; na doutrina cfr. Vaz Serra, RLJ, ano 99º, pág. 56, nota 1; Diogo Leite de Campos, Contrato a favor de terceiro, 1991, págs 13 a 16, Antunes Varela, Das Obrigações em geral, vol. I, 6ª ed., pág. 372 e segs.; José Vasques, Contrato de Seguro, pág. 258 e 259)
(…)
E isto sucede, mesmo quando o seguro for facultativo, uma vez que o terceiro que sofreu a lesão e exige a responsabilidade do lesante-segurado ainda pode e está em condições de receber da seguradora deste a prestação devida pelo lesante, sendo assim evidente também aqui a existência de uma forte componente do contrato a favor de terceiro, apesar de se tratar de contrato a favor de terceiro impróprio, por não existir aquisição de um crédito autónomo pelo terceiro-lesado.
(…)
Assim, pelo contrato de seguro apenas se transferiu o pagamento do quantum indemnizatório para a seguradora, mas não a responsabilidade jurídica pelo evento, sendo que, perante o lesado, segurado e seguradora são solidariamente responsáveis, nos termos do artº 497º, do Código Civil, pelo que o segurado não fica desonerado perante o terceiro lesado por virtude da existência de um contrato de seguro. Cfr. Ac. STA de 01.02.2000, Acórdãos Doutrinais, 466º-1231”[30]
Como bem referiu a apelante no trecho citado, e reafirmou nos arts. 103 e 105 do mesmo articulado, por força da outorga do contrato de seguro, a obrigação de suportar os custos decorrentes do sinistro dos autos cobertos pelo contrato de seguro firmado entre as rés é uma obrigação solidária.
Por isso, como a própria apelante igualmente referiu nos arts. 108 e 109 do mesmo articulado, cujo teor agora parece ter esquecido, “se a seguradora se obrigou a garantir a um terceiro (…), até determinada quantia, o cumprimento das obrigações do segurado, a prestação a exigir pelo beneficiário é só uma, embora por força do contrato possa ser exigida tanto do segurado como da seguradora”, pelo que “(…) o terceiro lesado tem sempre a possibilidade de demandar o lesante e a sua seguradora (…)”. [31]
Assim sendo, em caso algum haverá que absolver a ré B do pedido. Quando muito, caso se demonstre que a despesa decorrente do contrato de prestação e serviços celebrado entre a ré apelante e a autora se acha coberta pelo contrato de seguros celebrado entre as rés, haverá lugar à condenação de ambas, em regime de solidariedade.
Não obstante, poder-se-á questionar se uma tal solidariedade tutela os créditos de que é titular uma entidade que nem é parte no contrato de seguro, nem tem a qualidade de lesado.
Com efeito, a autora não outorgou o contrato de seguros firmado entre as rés, nem é a lesada pelo evento a que se reportam os presentes autos, que como sabemos consistiu numa colisão que envolveu dois navios, não sendo a autora proprietária, possuidora ou detentora de qualquer deles.
Ora, se certo que a doutrina e jurisprudência atribuem ao contrato de seguro de responsabilidade civil a natureza de contrato a favor de terceiro, não menos certo será que pelo menos em princípio, tal terceiro é o lesado[32].
A pretensão de que um tal contrato constitui a seguradora na obrigação de ressarcir terceiros que não são titulares do crédito indemnizatório emergente da responsabilidade civil, e no âmbito da cobertura prevista no contrato de seguro é algo que carece de demonstração.
A tal questão voltaremos, se concluirmos que o sinistro dos autos se acha coberto pela apólice do contrato de seguro celebrado entre as rés.
3.2.3.2.2. Do objeto do contrato de seguro, e do abalroamento
Passemos então à análise da primeira questão.
Conforme resulta da factualidade provada, a ré B, que se dedica à “indústria” da pesca, e é proprietária da embarcação denominada “Aurora Boreal”, celebrou com a ré C um contrato de seguro do ramo “marítimo/casco” relativamente a esta embarcação, cobrindo, entre outros, os riscos de “responsabilidade civil por danos patrimoniais causados a terceiros”, até ao limite de € 1.200.00,00.[33]
Da análise da respetiva apólice, condições gerais, e ata adicional resulta com clareza que se trata de um seguro que cobre tanto os danos sofridos no próprio navio, como os causados por este a terceiros – vd. cláusulas 2ª e 34ª das Condições Gerais, e 47 das Condições Especiais, esta expressamente mencionada na apólice[34].
No caso em apreço releva a cláusula 47 das condições especiais da apólice, que expressamente prevê a cobertura de “4/4” (ou seja, a totalidade) “dos prejuízos que sejam imputados ao Segurado por danos patrimoniais causados a terceiros por abalroamento com outros navios ou embarcações”.
Conforme resulta da factualidade provada, no dia 22-09-2016, pelas 23h20 minutos, o “Aurora Boreal” embateu na embarcação “Mar da Armona”, navio de que à data era proprietária a Companhia de Pescas do Algarve[35].
Mais se apurou que tal embate ocorreu quando o “Aurora Boreal” regressava da faina da pesca, durante uma manobra de acostagem deste navio na doca de pesca de Olhão, estando o “Mar da Armona” aí acostado e sem ninguém a bordo[36].
Como bem se refere na sentença recorrida, a matéria da responsabilidade civil emergente da colisão de navios, vulgarmente designada por abalroação ou abalroamento é objeto de inúmeras convenções internacionais, nomeadamente as mencionadas na mesma sentença.
Contudo, quando ocorra em águas territoriais portuguesas e envolva navios de pavilhão português, a mesma matéria regula-se pelo Direito interno, mais precisamente pelos arts. 664º a 675º do CCom - Neste sentido cfr. ac. RL 19-04-2007 (Ana Luísa Geraldes), p. 922/2007-6.
Uma simples leitura destas disposições legais permite apreender que o legislador nacional não consagrou qualquer definição legal de abalroação ou abalroamento, pelo que uma tal tarefa terá que assentar na interpretação do regime legal, à luz dos ensinamentos da doutrina e jurisprudência.
A este propósito sustenta VASCONCELOS ESTEVES[37] que “o abalroamento é o choque entre navios”, fundamentando tal definição na circunstância de “o art. 664º do CCom, embora não definindo o abalroamento, diz tratar-se da ocorrência entre navios, seguindo portanto o critério de só considerar abalroamento o embate entre estes.”
Por seu turno MANUEL JANUÁRIO DA COSTA GOMES[38] reporta-se à mesma questão nos seguintes termos:
“1.  Do artigo 664 e ss. do Código Comercial não resulta uma noção de abalroação; parece depreender-se, porém, dos mesmos que, para o Código, a abalroação será um choque ou colisão de navios. Assim parece resultar do artigo 664 (“abalroação de navios”), do artigo 665 (“culpa de um dos navios”), do artigo 666 (“culpa da parte de ambos os navios”), do artigo 667 (“falta de um terceiro navio”), do artigo 668 (“dúvida sobre qual dos navios deu causa à abalroação”), do artigo 674/2° (“entre navios da mesma nacionalidade”) e do artigo 674/3° (“entre navios de nacionalidades diferentes”).
Há que reconhecer, porém, que as expressões citadas apenas fazem presumir a necessidade de colisão - o que corresponde, de resto, ao sentido gramatical - mas não são inequívocas nesse sentido, num prisma jurídico, deixando, assim, campo aberto para o relevo, mesmo face ao Código Comercial, da “abalroação sem colisão”. Na verdade, a única exigência segura que podemos associar à abalroação, face às disposições do Código Comercial, é que a mesma envolva dois ou mais navios.
(…)
A abalroação é independente de os navios em causa estarem em movimento: pode um estar fundeado e o outro em movimento.”
O código Comercial distingue três tipos de abalroamento: fortuito ou devido a força maior (art. 664º), culposo (art. 665º), e duvidoso (art. 668º).
Nos termos do disposto no art. 664º do CCom, “Ocorrendo abalroação de navios por acidente puramente fortuito ou devido a força maior, não haverá direito a indemnização”.
Mais uma vez verificamos que o preceito em apreço contém conceitos indeterminados, inexistindo disposição legal que os defina.
Para VASCONCELOS ESTEVES[39] abalroamento fortuito ou devido a força maior será o que for provocado por “acontecimento inevitável e imprevisível”. Para este autor, “Para que possa ser considerado fortuito, é pois necessário que o abalroamento tenha sido causado por um acidente de força maior, imprevisível ou que se revista de características anormais, como por exemplo algumas tempestades ou nevoeiro, no caso de terem sido observados os regulamentos gerais de navegação e especiais para cada porto, bem como todas as precauções aconselháveis nessas circunstâncias.”
Por outro lado, nos termos do disposto no art. 669º do CCom “A abalroação presume-se fortuita, salvo quando não tiverem sido observados os regulamentos gerais de navegação e os especiais do porto”.
A primeira parte do preceito citado preceito consagra uma clara presunção de fortuitidade. Daí que a doutrina sustente que em matéria de abalroamento de navios não operam presunções de culpa. Compreende-se que assim seja, na medida em que nenhuma disposição legal as prevê e porque as mesmas seriam incompatíveis com esta regra especial de presunção de fortuitidade, ou seja de falta de culpa do lesante.
Já a segunda parte do mesmo preceito se afigura redundante, na medida em que os regulamentos gerais de navegação e especiais do porto configuram regras de cuidado, pelo que a sua inobservância constitui um comportamento negligente, quando não seja intencional, e doloso quando seja deliberado. Logo, nestes casos o abalroamento é culposo.
Quanto ao abalroamento culposo pode o mesmo ser definido como aquele que se deve a comportamento negligente ou doloso do comandante, da tripulação, ou do armador do navio. O comportamento negligente pode decorrer da violação das regras de navegação, dos usos em matéria de navegação que configurem regras de cuidado, ou da obrigação de conservação do navio (que impende, sobretudo, sobre o armador).[40]
O art. 666º do CCom alude a abalroamento por culpa comum. Não se trata aqui de um tertium genus, mas antes de uma regra sobre concurso de culpas. Não é por isso de estranhar que o preceito contenha uma regra salomónica: “Dando-se culpa da parte de ambos os navios, forma-se um capital dos prejuízos sofridos, que será indemnizado pelos respectivos navios em proporção à gravidade da culpa de cada um”.
Por seu turno estabelece o art. 667º do CCom que “quando a abalroação é motivada por falta de um terceiro navio e não pode prevenir-se, é este que responde”. Neste caso é considerado responsável um navio que não embateu nem foi embatido por outro, mas que, por qualquer meio, praticou o ato ou omissão culposos que deram causa ao acidente.
Finalmente, dispõe o art. 668º do CCom que “havendo dúvida sobre qual dos navios deu causa à abalroação, suporta cada um deles os prejuízos que sofreu, mas todos respondem pelos prejuízos causados às cargas e pelas indemnizações devidas às pessoas”.
Embora a doutrina classifique estas situações como de abalroamento duvidoso, o certo é que no tocante à regulação das responsabilidades entre os navios, esta disposição constitui apenas uma decorrência da presunção de fortuitidade, e da inerente regra de repartição de ónus da prova. Com efeito, se o abalroamento se presume fortuito, compete ao lesado que invoca o direito a ser indemnizado alegar e provar os factos que demonstrem a culpa do lesante, pelo que em caso de dúvida a questão se tem de resolver em desfavor da parte onerada com o ónus da prova (arts. 342º, nºs 1 e 3 do CC). Diversamente, no tocante à responsabilidade para com pessoas e titulares dos direitos sobre as cargas, o preceito parece consagrar uma regra de responsabilidade solidária de ambos os navios[41].
No caso vertente, apurou-se que o abalroamento do “Mar da Armona” pelo “Aurora Boreal” se deveu a uma falha nos comandos da caixa redutora deste último,[42] o que significa que teve como causa uma avaria sofrida pelo navio abalroante.
A decisão recorrida considerou que se tratava de um abalroamento fortuito.
Não partilhamos do mesmo entendimento.
Na verdade, como já referimos, será fortuito o abalroamento cuja causa não seja possível de apurar, ou não seja evitável.
Ora, um abalroamento causado por um navio em movimento que vai embater num navio amarrado e sem qualquer tripulação, e devido a avaria no navio abalroante não se enquadra, em nosso entender, nessa categoria.
Com efeito, e por um lado, como refere VASCONCELOS ESTEVES[43] citando JULIEN LE CLÈRE, muito embora a lei nacional não contenha presunções de culpa, “existem, de facto, presunções de culpa contra o navio que navega em relação ao outro que está amarado, (…)”.
Por seu turno refere MANUEL JANUÁRIO DA COSTA GOMES[44] que “A jurisprudência dos tribunais foi formando várias categorias hipotéticas de presunções baseadas em pressupostos iuris tantum de causalidade na produção do dano“ dando como exemplo “o caso de um navio em movimento abalroando um navio fundeado”.
Cremos que as situações referidas pelos citados autores não traduzem presunções de culpa, mas antes a constatação de que navegar em direção a um navio fundeado ou amarrado com embate no mesmo traduz a violação de uma regra de cuidado e, portanto, nessas situações o abalroamento deve-se a comportamento negligente do comandante ou tripulação do navio e, consequentemente, é de qualificar como culposo.
Tal asserção permite, a nosso ver considerar que quando o abalroamento consiste no embate de um navio em movimento num outro que está amarrado ou fundeado, a presunção de fortuitidade prevista no art. 669º do CCom é de considerar elidida.
Ora, elidida esta presunção, deve o abalroamento considerar-se culposo, a menos que o armador ou proprietário do navio abalroante demostre que o abalroamento se deveu a causa que não pode evitar, e que cumpriu todas as regras de cuidado a que estava obrigado[45].
Por outro lado, o capitão do navio tem a obrigação de zelar pelo bom estado de funcionamento do navio e pela ausência de avarias – art. 6º, al. n) do DL 384/99, de 23-09. E por seu turno, o armador e o proprietário respondem, independentemente de culpa, perante terceiros pelos danos decorrentes dos atos e omissões do capitão e da tripulação – arts. 4º a 6º do DL 202/98, de 10-07.
Na verdade, como refere MANUEL JANUÁRIO DA COSTA GOMES[46], «A doutrina vem aludindo, quer face ao Código Comercial, quer face à CB 1910, a presunções de facto, baseadas na experiência, lendo-se em AZEVEDO MATOS[47]:“O vício próprio do navio abalroador, a falta de luzes, a amarragem em local proibido, a ausência de sinais indicando o rumo, a omissão de sinais fónicos, a velocidade excessiva em nevoeiro, a falta de assistência em seguida ao choque, etc., são presunções de culpa”» (sublinhado nosso).
Porém, como acentua o referido Mestre[48], trata-se de “presunções naturais, simples ou hominis, a que o art. 351º do Código Civil chama judiciais”, sendo que as mesmas geram uma prova prima facie cuja neutralização passa pela contraprova, ou seja, pela prova de factos que tornem incertos os factos presumidos.
E mais adiante, citando FRANCISCO FARIÑA[49] e AZEVEDO MATOS[50] refere aquele que “O carácter culposo da abalroação pode decorrer do mau estado de navegabilidade do navio. Ou seja, ainda que não haja culpa do capitão, se o navio estiver em mau estado de navegabilidade (por exemplo, não obedece rapidamente aos comandos, pelo mau estado das máquinas e aparelhos, etc.) tal situação pode conduzir, em concreto, a um juízo de culpa.”[51].
 Como já referimos, cremos que estas situações não traduzem presunções de culpa, mas antes a violação de regras de cuidado que qualificam como negligente a navegação do navio abalroante.
Ocorrendo avaria no navio abalroante, e sendo esta a causa do abalroamento, não cremos que impenda sobre o lesado o ónus de alegar e provar qual a concreta causa da avaria e que a mesma se deveu a comportamento culposo do armador, comandante, ou tripulação.
Em nosso entender, em tais situações, mostra-se elidida a presunção de fortuitidade, cabendo ao armador / proprietário do navio demonstrar que tal avaria não se deveu ao mau estado do equipamento da embarcação.
Admitir que em caso de avaria competiria ao lesado provar por que razão tal avaria ocorreu significaria impor-lhe a averiguação do estado anterior do mecanismo avariado e das rotinas de manutenção do navio abalroante, o que temos por manifestamente desproporcionado.
Ora, no caso dos autos, resulta da factualidade provada que o acidente se deu quando o “Aurora Boreal”, navio de que é proprietária a ré Fadáriopesca, Lda se encontrava a executar uma manobra de acostagem na doca de pesca de Olhão, tendo ido embater no “Mar da Armona”, que aí se encontrava acostado e sem qualquer pessoa a bordo[52], e que tal abalroamento se deveu a uma falha nos comandos da caixa redutora do “Aurora Boreal”, que fez com que o sistema propulsor não tivesse engrenado a ré[53].
A circunstância de o abalroamento ter sido causado pelo embate de um navio em movimento num navio amarrado, e o facto de o abalroamento se ter devido a avaria no navio abalroante permitem, a nosso ver, e pelas razões supra expostas, considerar elidida a presunção de fortuitidade prevista no art. 669º do CCom e qualificar o abalroamento como culposo, nos termos previstos no art. 665º do mesmo código.
A tal não obsta a circunstância de se ter apurado que a avaria não foi prevista nem era esperada[54], porque tal facto não demonstra que tivesse sido observado o dever de manutenção do navio abalroante.
Em face do exposto, concluímos que o abalroamento dos autos se deve considerar culposo, nos termos previstos no art. 665º do CCom.
Considerando-se verificada a aplicação do regime do abalroamento culposo, não é aplicável o regime da assistência ou salvação marítima, porquanto este regime é subsidiário daquele.
Na verdade, o regime legal da salvação marítima, constante do DL nº 203/98, de 10-07 pressupõe que a atividade de “salvação marítima” é desenvolvida por navio estranho às dificuldades sentidas pelos bens que são objeto das operações de socorro. Só assim se entende que o referido diploma consagre um direito do salvador a ser remunerado pela atividade de salvação (art. 5º a 11º do mencionado diploma).
Dito isto, não deixamos de salientar que tal não significa que em caso de abalroamento culposo o navio abalroante não tenha o dever de socorrer o navio abalroado. Simplesmente a fonte de tal dever é diversa: ela reside na responsabilidade civil do abalroante.
Tratando-se de abalroamento culposo, daqui resulta para a ré B a obrigação de indemnizar a lesada pelos danos causados no navio abalroado.
Tal indemnização é norteada antes de mais pelo princípio da reconstituição natural, de acordo com o qual a indemnização visa “reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação” – art. 562º do Código Civil.
No caso vertente, a despesa decorrente da contratação da autora pela ré B destinou-se a evitar o afundamento do navio abalroado[55], e implicou a reposição das inerentes condições de flutuabilidade e navegabilidade, bem como a sua remoção para cais , reboque, e preparação para a mesma ser enviada para estaleiro, bem como outras tarefas acessórias, como a guarda da embarcação, e o transporte da mesma embarcação para o estaleiro onde veio a ser reparada.[56]
Trata-se, portanto, de tarefas e despesas destinadas à reparação natural do dano, pelo que as mesmas se acham cobertas pelo contrato de seguro celebrado entre as rés, cujo objeto já analisámos.
3.2.3.2.3. Da possibilidade da demanda da seguradora por entidade diversa do segurado e do lesado
Aqui chegados, cumpre aferir se sendo o contrato de seguro de responsabilidade civil um contrato a favor de terceiro, pode a seguradora ser responsabilizada, por efeito do mesmo contrato, pelo pagamento de despesas cujo credor é entidade diversa do lesado.
Cremos que a resposta não deve deixar de ser positiva.
Com efeito, como se lê no sumário do ac. RE 08-07-2010 (Mário Serrano), p. 1190/08.0TBSTC.E1 “é  possível a demanda de segurado contra seguradora para obter condenação desta no pagamento de indemnização suportada por aquele e coberta pelo seguro, sendo possível essa condenação desde que fique assente a ocorrência, em concreto, de responsabilidade civil do segurado perante terceiro lesado”.
Como bem se aponta neste aresto que se debruçou sobre a questão à luz do Regime Jurídico do Contrato de Seguro[57] “nada parece impedir que o lesante segurado pague extrajudicialmente ao lesado a indemnização que considera devida. E também parece seguro que nada obrigaria o lesado, caso não fosse paga voluntariamente a indemnização pelo lesante, a demandar directamente a seguradora. Fora dos casos de seguro obrigatório, em que «o lesado tem o direito de exigir o pagamento da indemnização directamente ao segurador» (artº 146º, nº 1), o regime comum do seguro de responsabilidade civil (não obrigatório) admite como regra que a indemnização seja pedida ao lesante, mesmo em acção judicial, prevendo apenas a intervenção processual da seguradora (entenda-se, através de incidente de intervenção de terceiros) a título facultativo (artº 140º, nº 1, que usa a expressão «pode»), sem prejuízo de ser convencionada a demanda directa da seguradora, isoladamente ou em conjunto com o segurado (artº 140º, nº 2). E o certo é que o presente contrato não integra cláusula deste tipo.
Se o lesante segurado pagou voluntariamente a indemnização, como se afigura possível, seria incompreensível que a seguradora ficasse, só por isso, exonerada da sua responsabilidade de cobertura da obrigação de indemnizar. Desde que se demonstre que essa indemnização era, em concreto, devida pelo lesante, não se vislumbra qualquer razão para que a seguradora não suporte essa indemnização, pagando ao lesante o que este despendeu. Aliás, podendo haver acção judicial em que o lesado apenas demandasse o lesante segurado para obter a condenação naquela indemnização, sem a intervenção da seguradora, não se entenderia que o segurado não pudesse obter da sua seguradora o pagamento da quantia paga nesse contexto, desde que fique demonstrada a responsabilidade daquele. Haverá aqui, na prática, como que um direito de regresso do segurado contra a seguradora – mas perfeitamente compatível com o regime geral do contrato de seguro.”
Ora, é nossa convicção que este entendimento se aplica mutatis mutandis às situações em que o lesante contrata com terceiro a prestação e serviços destinados a minimizar os danos cobertos pelo contrato de seguro e, sendo por este demandado, requeira a intervenção principal da seguradora.
3.2.3.2.4. Da barataria
Aqui chegados, cumpre averiguar se a responsabilidade da ré C deve considerar-se excluída, nos termos previstos no art. 604º § 1º do CCom.
Com efeito, estabelece esta disposição legal, na parte que ora interessa que tendo sido celebrado “seguro contra riscos de mar” (cfr. epígrafe do Título II da Secção I do Livro III do Código Comercial) “são a cargo do segurador, salvo estipulação contrária, todas as perdas e danos que acontecerem durante o tempo dos riscos aos objetos segurados por (…) abalroação (…) e em geral por todas as demais fortunas do mar, salvo nos casos em que pela natureza da coisa, pela lei ou por cláusula expressa na apólice do segurador deixa de ser responsável.
§ 1.º O segurador não responde pela barataria do capitão, salvo convenção em contrário, a qual, contudo, será sem efeito, se, sendo o capitão nominalmente designado foi depois mudado sem audiência e consentimento do segurador.”
O conceito de barataria não consta do Código Comercial, nem de qualquer outro instrumento legislativo interno ou internacional, pelo que a sua delimitação terá que ser operada por via interpretativa.
A origem do termo barataria remonta ao étimo barat, palavra do idioma provençal arcaico que significa erro, engano, fraude, ou mentira.
Nessa medida, tradicionalmente considerava-se que o conceito de barataria compreendida apenas atos ou omissões dolosos ou fraudulentos do capitão, nomeadamente os tendentes a obter da seguradora, de forma obviamente ilícita, uma indemnização.
Simplesmente, como veremos, a dado momento parte da doutrina nacional e a jurisprudência dominante passaram a entender que a barataria do capitão compreendia também os comportamentos meramente negligentes.
Esta tem sido a tese consagrada pelo Supremo Tribunal de Justiça nos últimos cem anos, expressa nos seguintes arestos (entre outros):
- STJ 17-01-1928, publicado na Gazeta da Relação de Lisboa, nº 10
- STJ 01-11-1949, BMJ 16, 1950, pp. 340-342
- STJ 05-01-1968 (Ludovico da Costa), BMJ 173, 1968, pp. 300-304
- STJ 29-02-1972, BMJ 214, 1972, pp. 153-159
- STJ 30-03-1973 (Acácio Carvalho), BMJ 225, 1973, pp. 272-285
- STJ 06-12-1974 (Acácio Carvalho), BMJ 242, 1975, pp. 309-315
- STJ 07-07-1999 (Quirino Soares), p. 99B557
- STJ 27-01-2004 (Nuno Cameira), p. 03A2827
- STJ 29-01-2008 (Salvador da Costa), p. 07B4805
- STJ 21-02-2008, revista nº 1091/07, da 7ª Secção
- STJ 02-10-2008, revista nº 942/08, da 2ª Secção
- STJ 15-01-2008 (Serra Baptista), p. 08B3326
- STJ 29-01-2008 (Salvador da Costa), p. 07B4805
Muito embora a jurisprudência dominante tenha considerado, de forma senão unânime, pelo menos largamente maioritária, o entendimento de que a barataria engloba tanto os atos e omissões dolosos do capitão, como os “meramente” negligentes[58], a doutrina tem evidenciado uma postura distinta, perfilando-se essencialmente duas teses: o entendimento amplo do conceito, consagrado na jurisprudência, e um entendimento restrito, limitando o âmbito da barataria aos comportamentos dolosos.
FERREIRA BORGES[59] considerava que o conceito de barataria abrangia “(...) toda a especie de dolo, de maldade ou prevaricações commetidas pelo capitão ou pela gente da tripulação. O Cod. do Comm. de França dá-lhe um significado mais extenso (art. 353); faz-lhes comprehender não só as prevaricações mas tãobem as faltas, as culpas. E hoje, em matéria de seguros marítimos, é igualmente essa a nossa intelligencia, porque o art. 24 do Reg. da Casa de Seguros diz: - “As prevaricações e faltas do capitão, officiaes e equipagens de um navio conhecidas pelo nome da barataria ou rebeldia de patrão, são riscos como qualquer outro; e por isso se comprehendem na responsabilidade do segurador, quando expressamente se não exceituarem no contracto.” (...) Quando os seguradores respondem por barataria quer dizer que se responsabilisão a indemnizar todos os damnos, que podem resultar do facto do capitão e sua tripulação por imperícia, imprudencia, malicia, deviação, latrocinio, ou d'outra sorte, ficando salvo aos seguradores o recurso contra o capitão em todos os casos, em que os proprietários ou os carregadores podessem ter contra elle acção para reparação dos damnos (...)”.
Por seu turno, ADRIANO ANTERO[60] ensinava que o significado etimológico da palavra barataria era sinónimo de fraude ou ribalderia; e que no domínio da navegação marítima, quando reportada a atos do capitão, tal termo se empregou inicialmente no tocante a condutas intencionais ou dolosas. O mesmo autor nota que o sentido da expressão se foi ampliando, vindo a abranger também as faltas não intencionais, como a simples imprudência e a negligência. Assim, apesar de sustentar que no Código Comercial de 1833 a barataria apenas se referia à fraude do capitão, este autor dava nota de que “(...) a jurisprudencia actual vai mais longe, porque o segurador não responde, nem mesmo pelas faltas não intencionaes do capitão. É que a lei presume que, no caso d'essas faltas, o armador erro, na escolha do capitão, e, portanto, fica sujeito ás consequencias do seu erro (...)”.
Reportando-se ao mesmo conceito, CUNHA GONÇALVES[61] sustentou que “(...) tendo ao princípio significado somente os actos fraudulentos ou dolosos do capitão como tal, isto é, como encarregado do governo do navio, mais tarde passou a abranger também os actos meramente culposos e os estranhos a este governo e praticados como mandatário do armador”.
BARBOSA DE MAGALHÃES[62], louvando-se do entendimento de FERREIRA BORGES equiparou o conceito de barataria ao de prevaricação, concluindo que o mesmo compreendia faltas e culpas dos capitães e das tripulações dos navios, compreendendo a imperícia, a imprudência, e a malícia.
Finalmente AZEVEDO MATOS[63] sustentou que o conceito de barataria compreendia não só os atos dolosos, mas também os negligentes, praticados pelo capitão ou qualquer outro membro da equipagem, na qualidade de mandatário do armador.
A esta corrente doutrinária se opôs (ou sucedeu) uma outra, que procurou recuperar a interpretação inicial mais restritiva, restringindo o conceito de barataria aos comportamentos dolosos.
 VAZ SERRA[64] invocou em abono desta tese os seguintes argumentos:
- O art. 604.º, § 1.º, do CCom não define "barataria", deixando o intérprete livre de a entender como for mais razoável.
- O termo barataria vem de barat, velha palavra do Sul de França, que significa engano, fraude, mentira.
- O Código Comercial português não reproduz a expressão criticável do art. 353.º do Código Comercial francês, que define a barataria por referência a prévarications e fautes do capitão e da equipagem (o que leva a opinião francesa dominante – embora não isente de crítica – a entender que a palavra fautes, oposta a prévarications, compreende as faltas não intencionais, as imprudências e negligências).
- É mais razoável que o segurador responda pelas negligências ou imprudências do capitão ou da equipagem, só não respondendo pelo dolo ou fraude dos mesmos, dada a maior probabilidade da ocorrência de tais comportamentos negligentes ou imprudentes numa viagem marítima, e a dificuldade de os distinguir dos casos fortuitos ou de força maior, o que significa que o armador ou segurado não tem, em regra, a possibilidade de vigiar e dar instruções ao capitão ou equipagem, sendo certo que a finalidade do seguro é cobrir todos os riscos que, sem dolo ou fraude, se verificarem.
- As legislações mais recentes – como a alemã, inglesa, belga e italiana – colocam a barataria a cargo dos seguradores.
- Tornou-se usual inserir nas apólices de seguro marítimo uma cláusula a excluir a responsabilidade do segurador apenas nos casos de dolo ou fraude do capitão, ou quando ocorram determinadas faltas graves, admitindo essa responsabilidade pelos danos causados por faltas involuntárias do capitão.
JOÃO MATA[65] argumentou que a barataria do capitão referida no § 1.º do art. 604.º do CCom incluía qualquer dano deliberadamente praticado pelo capitão ou equipagem do navio com intenção de prejudicar o armador ou carregador.
MÁRIO RAPOSO[66] sustentou que a barataria estava para o direito marítimo como a pirataria e, nessa medida, pressupunha sempre e tão-somente um ato doloso e fraudulento.
JOSÉ ALVES DE BRITO[67], aderindo aos argumentos avançados por Vaz Serra, concluiu que, na tensão entre o dolo e a negligência, deve optar-se pela tese mais favorável aos interesses dos segurados.
Fazendo o balanço da resenha doutrinária e jurisprudencial supra gizada, cumpre evidenciar três aspetos.
Em primeiro lugar e no tocante ao ac STJ 17-01-1928, verificamos que no mesmo se referiu que “(...) a negligência, imperícia e imprudência do capitão são factos que implicam a existência da categoria jurídica barataria”, sem que o Supremo tenha explicado como chegou a tal conclusão. Ora, a conclusão alcançada parece contradizer a afirmação que a antecede, no sentido de que “(...) a barataria é constituída por actos cometidos ilicitamente e com dano, no intuito de se receber uma indemnização da companhia seguradora, e que, se não existisse seguro, não teriam sido praticados”. Esta antinomia não é clarificada em passo algum do referido aresto.
Em segundo lugar, é de salientar que a jurisprudência que sucedeu ao mencionado aresto seguiu os entendimentos de Cunha Gonçalves, Azevedo Matos e Adriano Antero, embora as teses sustentadas por estes evidenciem as mesmas fragilidades acima apontadas.
Com efeito CUNHA GONÇALVES, em aparente conflito com a posição que sustentou, também afirmou que “(...) especialmente pelo que toca ao seguro, é barataria todo o acto ilícito e danoso cometido no intuito de receber uma indemnização do segurador, ou que, se não existisse seguro, não teria sido praticado”[68].
AZEVEDO MATOS proclamava que que «(...) o termo “barataria” é sinónimo de ribalderia e de rebeldia (...)», o que pressupunha atos dolosos, mas simultaneamente e sem explicar por que razão o entendia, sustentava igualmente que o mesmo conceito abrangia “(...) também os culposos, praticados pelo capitão ou qualquer outro membro da equipagem, na qualidade de mandatário do armador (...)”[69]».
ADRIANO ANTERO invocava os ensinamentos de ERCOLE VIDARI[70], que por sua vez defendia que o conceito de barataria abrangia não só atos ou omissões dolosos, mas também os aotos ou omissões negligentes do capitão ou da tripulação, argumentando para tal que o art. 618.º do Codice di Commercio de 1882 dispunha que “L'assicuratore non è responsabile delle prevaricazioni e delle colpe del capitano e dell' equipaggio connosciute sotto nome de «baratteria», se non è convenuto il contrario”.
Como se apreende da leitura deste preceito da lei italiana, a mesma acolhia expressamente na delimitação do conceito legal de barataria tanto os atos dolos, como os negligentes, pelo que a transposição deste entendimento para o contexto da lei portuguesa continuava a carecer de justificação adicional, visto que o art. 604.º do CCom nacional não continha qualquer definição.
Por outro lado, o legislador de 1888 havia abandonado a referência à negligência do patrão que o Código Comercial de 1833 qualificava como risco marítimo, o que legitimava a conclusão de que a barataria abrangia apenas os actos dolosos.
Acresce que a doutrina italiana atenuou a rigidez decorrente de uma interpretação literal do art. 618.º do Codice di Commercio de 1882, sustentando que a noção de barataria não podia acolher a negligência[71].
Finalmente, e em terceiro lugar, releva o confronto entre o art. 1752.º do CCom de 1833[72] e o art. 604.º do CCom vigente (1888). Como já se referiu, o primeiro preceito delimitando os riscos marítimo cobertos pelo contrato de seguro, referia-se à “negligência ou barateria do patrão ou da equipagem”, ao passo que o art. 604.º não contém qualquer referência à negligência. Ora, em nosso entender, tal alteração revela uma intenção clara no sentido de restringir a exclusão da obrigação de segurar apenas aos atos dolosos, mantendo os atos negligentes dentro da esfera de proteção conferida pelo contrato de seguro.
Urge concluir, tendo presente que, como refere MÁRIO RAPOSO[73], o direito comparado demonstra que as legislações britânica, francesa, espanhola e italiana consagram atualmente o entendimento restrito do conceito de barataria.
E fazendo-o aderimos resolutamente a este entendimento, por todos os motivos acima expostos aos quais acrescentamos outro: No Direito português não temos conhecimento de qualquer outra disposição legal que seja interpretada no sentido de excluir do âmbito de cobertura de contratos de seguros de danos na modalidade de responsabilidade civil aqueles que sejam provocados por condutas negligentes. Cremos mesmo que uma tal exclusão carece de sentido, visto que a ideia subjacente aos seguros de danos que cobrem sinistros ocorridos no contexto da responsabilidade civil é justamente, permitir a reparação de danos causados por condutas negligentes. Donde, não descortinamos razão suficiente para, em pleno século XXI, e num domínio como a navegação marítima, em que a outorga de contratos de seguro se afigura crucial para a segurança desta atividade, ter por adequada a exclusão da cobertura relativamente a danos causados por condutas negligentes, quando a letra da lei não impõe tal caminho interpretativo.
Termos em que se conclui que no caso dos autos não é aplicável o art. 604º, § 1 do CCom, e que por via da outorga do contrato de seguro a ré Mútua dos Pescadores é responsável pelo pagamento à autora das quantias por esta peticionadas.
3.2.3.3. Síntese conclusiva
Aqui chegados, podemos concluir que as rés respondem solidariamente pelo pagamento à autora da quantia por esta peticionada.
Em consequência, conclui-se igualmente pela parcial procedência do presente recurso, devendo a sentença ser alterada, nos termos supra expostos
3.3. Das custas
Nos termos do disposto no art. 527º, nº 1 do CPC, “A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.”
No caso vertente, verifica-se que em consequência do presente recurso decaíram a apelante e a apelada Mútua dos Pescadores, CRL.
Sendo as rés litisconsortes, suportam as custas do processo, em ambas as instâncias, em partes iguais – art. 528º, nº 1 do CPC.
4. Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes nesta 7ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em:
a) Alterar a decisão sobre matéria de facto, nos termos expostos na fundamentação do presente aresto;
b) Julgar a presente apelação parcialmente procedente e, em consequência, alterar a sentença recorrida, julgando a presente ação procedente, e condenando as rés B e C, solidariamente, a pagar à autora a quantia de € 42.004,60 (quarenta e dois mil e quatro euros e sessenta cêntimos), acrescida de juros de mora, no valor de € 2.231,42 (dois mil, duzentos e trinta e um euros e quarenta e dois cêntimos).
Custas em ambas as instâncias pelas rés, em partes iguais.

Lisboa, 13 de julho de 2021 [74]
Diogo Ravara
Ana Rodrigues da Silva
Micaela Sousa
_______________________________________________________
[1] Cfr. requerimento inicial, refª 5182111 de 19-01-2018, fls. 2-3.
[2] Refª 22020500/ 27798290, fls. 12-52.
[3] Refª 109149720, de 17-04-2018, fls. 148-150.
[4] Refª 5683716/29407513, de 12-06-2018, fls. 152-164.
[5] Refª 111048048, de 30-10-2018. Este despacho apenas consta do suporte digital do processo, não constando do suporte físico.
[6] Despacho com a refª 112086119, de 06-02-2019, fls. 170.
[7] Refª 397276, de 18-02-2019, fls. 174.
[8] Requerimentos com as Refªs 128166/31887967, de 18-03-2019, fls. 175-176 e 128167/31888123, da mesma data, fls. 177-178.
[9] Refª 128655/32035563, de 01-04-2019, fls. 181-184.
[10] Refª 403411, de 01-04-2019, fls. 179-180.
[11] Refª 446239 de 10-09-2020, constante de fls. 236-253.
[12] Refª 143193/37913062, de 02-02-2021, fls. 254-275.
[13] Refª 470611, de 28-04-2021, fls. 276.
[14] Neste sentido cfr. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Ed., Almedina, 2018, pp. 114-117
[15] Vd. Abrantes Geraldes, ob. cit., p. 119
[16] As conclusões 1. a 36. contêm meras referências genéricas à posição manifestada pela apelante, que a mesma desenvolve (aliás de forma prolixa e exageradamente desenvolvida) nas conclusões subsequentes.
[17] “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Edição, Almedina, 2018, pp. 165-166.
[18] Retificado pela D. Retif. 16-A/98, de 30-09, e sucessivamente alterado pelos seguintes diplomas: DL 3889, de 23-09; DL 183/2000, de 10-08; DL 232/2001, de 17-12; DL 32/2003, de 12-02; DL 38/2003, de 08-03; DL 324/2003, de 27-12 (retificado pela D. Retif. 26/2004, de 24-02); DL 107/2005, de 01-07 (retificado pela D. Retif. 63/2005, de 19-08); L 14/2006, de 26-04; DL 303/2007, de 31-12; L 67-A/2007, de 31-12; DL 34/2008, de 26-02; DL 226/2008, de 20-11; e L 117/2019, de 13-09. Passaremos a reportar-nos a este diploma pela sigla “RPCOPEC”.
[19] Vd. art. 44º, nº 1 da Lei de Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei nº 62/2013, de 26-08, retificada pela Decl. Retif. 42/2013, de 24-10; alterada pela Lei 40-A/2016, de 22-12; pela Lei 94/2017, de 23-08; pela Lei Orgânica nº 4/2017, de 25-08; pela Lei 23/2018, de 05-06; pelo DL 110/2018, de 10-12; pela Lei 19/2019, de 19-02; pela Lei 27/2019, de 28-03; pela Lei 55-2019, de 05-08, e pela Lei 107/2019, de 09-09.
[20] “Os pressupostos objetivos e subjetivos do procedimento de injunção” Revista Themis, VII, n.º 13, pp. 169-212.
[21] “A injunção e as conexas ação e declaração”. Cfr. atualmente, a 8ª ed., Almedina, 2021, pp.187-188.
[22] Ob. cit., pp. 204-211.
[23] Ob. cit., pp. 184-185.
[24] Pontos 19. e 20. dos factos provados.
[25] Pontos 22. a 26., e 28. a 35. dos factos provados.
[26] Ponto 1. dos factos provados.
[27] Ponto 36. e 61. dos factos provados.
[28] Ponto 37., 2ª parte, dos factos provados
[29] Ponto 37 dos factos provados.
[30] Sublinhado nosso.
[31] Sublinhado nosso.
[32] Cfr. entre outros os acs. RP 09-11-2017 (Mª Inês Moura), p. 9108/16.0T8PRT-A.P1; e RG 17-12-2019 (Fernando Fernandes Freitas), p. 4289/18.0T8VCT-C.G1. No campo da doutrina cfr. MARGARIDA LIMA REGO, “Contrato de Seguro e Terceiros: Estudo de Direito Civil”, Almedina, 2010.
[33] Ponto 40. e 41. dos factos provados.
[34] Os documentos mencionados constam de fls. 62v. a 82 v.
[35] Ponto 2. dos factos provados.
[36] Pontos 3. a 5. dos factos provados.
[37] “Direito Marítimo”, vol. III, com o subtítulo “Acontecimentos de mar”, Livraria Petrony Editora, 1987, p. 18.
[38] “Direito Marítimo”, vol. IV, com o subtítulo “Acontecimentos de mar”, Almedina, 2008.
[39] Ob. e vol. cits., pp. 19-20.
[40] Cfr. VASCONCELOS ESTEVES, ob. e vol. cits., pp. 22-23. Em sentido idêntico, MANUEL JANUÁRIO DA COSTA GOMES, ob. e vol. cits., p. 143-146.
[41] Vd. JANUÁRIO GOMES, ob. e vol. cits., p. 25.
[42] Ponto 6 dos factos provados,
[43] Ob. e vol. cits., p. 24.
[44] Ob. e vol. cits., p. 155
[45] Em sentido aproximado, sustentando que “a prova da ocorrência do caso fortuito ou de força maior competirá a quem o invocar”, vd. VASCONCELOS ESTEVES, ob. e vol. cits., p. 20.
[46] Ob. e vol. cits., pp. 153-154.
[47] “Princípios de direito marítimo”, III vol. Edições Ática, 1958, p. 112.
[48] Ob. e vol. cits., p. 154
[49] “Derecho comercial marítimo”, vol. III, 2ª Ed., Bosch, pp. 52 ss.
[50] Ob. e vol. cits., p. 105
[51] Ob. e vol. cits., p. 160
[52] Pontos 2 a 5 e 39 dos factos provados.
[53] Ponto 6 dos factos provados.
[54] Ponto 47 dos factos provados.
[55] Ponto 19 dos factos provados
[56] Pontos 22 a 36 dos factos provados.
[57] Aprovado pelo DL 72/2008, de 16-04 e alterado pela Lei nº 147/2015, de 09-09. Este diploma, vulgarmente designado “Lei do Contrato de Seguro” passará a ser designado pela sigla “LCS”.
[58] Alguns destes arestos consideram que o conceito se reporta igualmente a atos ilícitos e culposos da tripulação ou do armador.
[59] “Commentarios sobre a legislação portugueza ácerca de seguros marítimos”, Typographia da Sociedade Propagadora dos Conhecimentos Úteis, 1841, pp. 58-65, e “Diccionario Juridico-commercial”, 2ª ed., Typographia de Sebastião José Pereira, 1856, pp. ,51-52. Esta obra encontra-se disponível em https://purl.pt/298/5/sc-1369-v_PDF/sc-1369-v_PDF_24-C-R0150/sc-1369-v_0000_capa-426_t24-C-R0150.pdf.
[60] “Comentário ao Código Comercial Portuguez”, vol. II, Typographia Artes e Letras, 1915, pp. 488-489.
[61] “Comentário ao Código Comercial”, vol. III, m1918, p. 354
[62] Anotação ao acórdão do STJ de 17-01-1928, “Gazeta da Relação de Lisboa”, nº 10, p. 150.
[63] “Princípios de Direito Marítimo”, vol. IV, Edições Ática, 1955, p. 287.
[64] “Princípios de direito marítimo”, vol. IV, Edições Ática, 1955, p. 287.
[65] Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 106º, nº 3491, pp. 31-32.
[66]“Sobre o conceito de barataria”, ROA, ano 62, vol. III, dezembro de 2002, disponível em https://portal.oa.pt/publicacoes/revista/ano-2002/ano-62-vol-iii-dez-2002/temas-e-referencias/mario-raposo-sobre-o-conceito-de-barataria/
[67] “Seguro marítimo de mercadorias – Descrição e notas ao seu regime jurídico”, Almedina, 2006, pp. 96-99
[68] Ob. cit., p. 354.
[69] Ob. cit., p. 287.
[70] “Il Diritto Maritimo Italiano”, Parte II, ed. Ulrico Hoepli, 1892, pp. 921-922.
[71] Vd., a este propósito, GIORGIO BERLINGIERI, «Sul concetto di “barateria” in diritto marítimo», in “Diritto Marittimo” II, 1943, p. 3.
[72] “São a cargo do segurador todas as perdas e damnos, que acontecem aos objectos segurados por borrascas, naufrágios, varação, mudança forçada de rota, de viagem ou de navio, por alijamento, incêndio, violência injusta, inundação, presa, pilhagem, embargo por ordem de potência, quarentenas supervenientes, declaração de guerra, represálias, negligência ou barateria de patrão ou de equipagem; e geralmente por todas as demais fortunas de mar, salvos os casos em que o segurador deixa de ser responsavel pela natureza da cousa, pela lei ou por convenção expressa na apólice”.
[73] Ob. e lug. cits., pontos 6. a 8.
[74]Acórdão assinado digitalmente – cfr. certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.