Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
482/16.9GACSC.L1-5
Relator: JOÃO CARROLA
Descritores: INJÚRIAS GRAVES
FUTEBOL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/24/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSOS PENAIS
Decisão: UNANIMIDADE
Sumário: - Independentemente de estarmos perante uma situação em que os intervenientes em confronto são membros da “tribo do futebol”, não podemos deixar de considerar que, não tanto pelo contexto em que as verbalizações são proferidas de desagrado e contestação pelas decisões do árbitro ou de decepção pela situação de se encontrar em desvantagem no resultado do jogo que se encontrava disputar, o modo como as expressões «filho da puta, vai para o caralho» foram ditas pelo arguido ao destinatário – olhos nos olhos e tendo cuspido na sua direção, embora não o tenha atingido - a carga ofensiva mostra-se muito para lá do que se possa entender como um mero verbalizar de toda a frustração que o arguido poderia sentir.
- A atribuição do epíteto de filho da puta, dizendo-lho na cara e em voz alta, ao árbitro do encontro, enquanto interveniente no espectáculo com responsabilidades acrescidas pela tomada de decisões que nem sempre merecerão o acordo dos demais intervenientes ou espectadores com a leitura que fazem do desenrolar do jogo e das jogadas, não deixa de trazer uma inerente desvalorização da sua pessoa enquanto ser humano e decisor do espectáculo desportivo e, assim, atingir o mesmo na sua personalidade.
Na norma do artigo 184.º do Código Penal, as consequências jurídico-penais da conduta injuriosa são agravadas sempre que o alvo do comportamento típico seja uma das pessoas referidas no artigo 132.º, n.º 2, alínea l), do Código Penal (designadamente, e no que para o caso releva, árbitro desportivo sob a jurisdição das federações desportivas) e o ilícito base seja cometido enquanto a vítima está no exercício das suas funções ou por causa das mesmas.
Assim, neste tipo legal de crime agravado, a honra, reputação e consideração protegidas pela norma do artigo 181.º, n.º 1, do Código Penal são protegidas de forma qualificada face ao estatuto funcional da vítima cuja ofensa no exercício de funções, como se compreende, representa um maior desvalor para a ordem de bens jurídicos da comunidade.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I.
No processo comum n.º 482/16.9GACSC do Juízo Local Criminal de Cascais, Comarca de Lisboa Oeste, os arguidos CA, DR  e FA  foram submetidos a julgamento, após terem sido acusados pela prática, em autoria material e na forma consumada, de, respectivamente:
- em concurso efectivo, de um crime de injúria agravada e um crime de ameaça agravada, p. e p., respectivamente, pelos artigos 181.°, n.º 1 e 184.°, com referência ao artigo 132.°, n.º 2, alínea l) e pelos artigos 153.°, n.º 1 e 155.°, n.º 1, alíneas a) e c), todos do Código Penal;  
- em concurso efectivo, de um crime de injúria agravada e de dois crimes de ofensa à integridade física qualificada, na forma tentada, p. e p., respectivamente, pelos artigos 181.°, n.º 1 e 184.°, com referência ao artigo 132.°, n.º 2, alínea l), e pelos artigos 22.°, 23.°, 73.°, 143.°, n.º 1, 145.°, n.º 1, alínea a), e n.º 2, com referência ao artigo 132.°, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal;
- em concurso efetivo, de um crime de injúria agravada e de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p., respetivamente, pelos artigos 181.°, n.º 1 e 184.°, com referência ao artigo 132.°, n.º 2, alínea l), e pelos artigos 143.°, n.º 1, 145.°, n.º 1, alínea a), e n.º 2, com referência ao artigo 132.°, n.º 2, al. l), todos do Código Penal.
Foi deduzido pedido de indemnização cível pela sociedade Lusíadas Parcerias Cascais, S.A., sociedade gestora do Hospital de Cascais, contra o Arguido FA , no montante de 85,91€, correspondente aos custos dos tratamentos hospitalares prestados ao Ofendido MG , na senda dos factos descritos na acusação e juntou um documento.
MG , ofendido, apresentou pedido de indemnização civil contra os três Arguidos, pedindo, a título de danos morais para compensação do medo, receio, desconforto e inquietude que alega ter sentido em consequência da narrada conduta dos Arguidos os valores de (i) 400,00€, quanto ao Arguido CA, (ii) 600,00€ quanto ao Arguido DR  e (iii) 1.000,00€ quanto ao Arguido FA .
Realizada a audiência, foi decidido, na parte agora relevante:
“1) Condenar o arguido FA  pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos artigos 181.°, n.º 1 e 184.°, com referência ao artigo 132.°, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal, numa pena de 100 dias de multa à taxa diária de 6,50 € (seis euros e cinquenta cêntimos), num total de 650,00 € (seiscentos e cinquenta euros);
2) Condenar o arguido FA  pela prática, em autoria material e de forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelos artigos 143.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, numa pena de 1 ano e 3 meses de prisão.
3) Suspender, nos termos dos artigos 50.º e 51.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal, a pena de 1 ano e 3 meses de prisão aplicada ao Arguido FA  pelo período de 1 ano e 3 meses, sendo esta suspensão subordinada ao cumprimento, pelo Arguido, do dever de pagar, ao longo deste período, a quantia de 700,00€ (parte da indemnização civil a que será condenado) ao ofendido MG ;
4) Absolver o arguido CA, da prática em autoria material e na forma consumada de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.°, n.º 1 e 155.°, n.º 1, alíneas a) e c), todos do Código Penal;
5) Condenar o arguido CA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos artigos 181.°, n.º 1 e 184.°, com referência ao artigo 132.°, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal, numa pena de 120 dias de multa à taxa diária de 7,00 € (sete euros), num total de 840,00 € (oitocentos e quarenta euros);
6) Condenar o arguido DR  pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos artigos 181.°, n.º 1 e 184.°, com referência ao artigo 132.°, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal, numa pena de 100 dias de multa à taxa diária de 8,00 € (oito euros), num total de 800,00 € (oitocentos euros);
7) Absolver o arguido DR  da prática em autoria material e na forma tentada, na pessoa de TS , de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelos artigos 143.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal.
8) Condenar o arguido DR  pela prática em autoria material e na forma tentada, na pessoa de MG , de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelos artigos 143.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, numa pena de 9 meses de prisão.
9) Suspender, nos termos dos artigos 50.º e 51.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal, a pena de 9 meses de prisão aplicada ao Arguido DR  pelo período de 1 ano, sendo esta suspensão subordinada ao cumprimento, pelo Arguido, do dever de pagar, ao longo deste período, a quantia de 400,00€ (parte da indemnização civil a que será condenado) ao ofendido MG ;
10) Julgar procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pelo Demandante MG contra o Arguido FA  e, em consequência, condenar este Arguido a pagar ao Demandante a quantia de 1.000,00€ (mil euros), acrescida de juros de mora, desde a data de notificação deste Arguido para contestar o pedido de indemnização civil do ofendido e até efetivo e integral pagamento, à taxa legal de juros civis sucessivamente em vigor, a qual se encontra atualmente fixada em 4% ao ano;
11) Julgar procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pela Demandante MG contra o Arguido DR  e, em consequência, condenar este Arguido a pagar ao Demandante a quantia de 600,00€ (seiscentos euros), acrescida de juros de mora, desde a data de notificação deste Arguido para contestar o pedido de indemnização civil do ofendido e até efetivo e integral pagamento, à taxa legal de juros civis sucessivamente em vigor, a qual se encontra atualmente fixada em 4% ao ano;
12) Julgar procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pela Demandante MG contra o Arguido CA e, em consequência, condenar este Arguido a pagar ao Demandante a quantia de 400,00€ (quatrocentos euros), acrescida de juros de mora, desde a data de notificação deste Arguido para contestar o pedido de indemnização civil do ofendido e até efetivo e integral pagamento, à taxa legal de juros civis sucessivamente em vigor, a qual se encontra atualmente fixada em 4% ao ano.
13) Julgar procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pela Demandante Lusíadas Parcerias Cascais, S.A. contra o Arguido FA  e, em consequência, condenar este Arguido a pagar a esta Demandante a quantia de 85,91€ (oitenta e cinco euros e noventa e um cêntimos) acrescida de juros de mora, desde a data de notificação para contestar o pedido de indemnização civil e até efetivo e integral pagamento, à taxa legal de juros civis sucessivamente em vigor, a qual se encontra atualmente fixada em 4% ao ano.”
Dessa decisão condenatória, vieram interpor recurso, com os fundamentos constantes da respectiva motivação que aqui se dá por reproduzida e as seguintes conclusões:
1. O arguido CA:
“A. O Recorrente vinha acusado pela prática de um crime de injúria agravada e um crime de ameaça agravada, p. e p., respectivamente, pelos artigos 181º, n.º 1 e 184º, com referência ao artigo 132°, n. ° 2, alínea l) e pelos artigos 153°, n.º 1 e 155°, n. ° 1, alíneas a) e c), todos do Código Penal.
B. O Demandante apresentou contra o Recorrente apresentou pedido de indemnização cível, com base na prática dos referidos 2 crimes, tendo invocado, nomeadamente, ter temido pela vida.
C. Em douta Sentença, decidiu a Mma. Juiz a quo:
• “Absolver o arguido CA, da prática em autoria material e na forma consumada de um crime de ameaça agravada previsto e punido pelos artigos 153°, n.º 1 e 155°, n. ° 1, alínea a) e c), todos do Código Penal";
• “Condenar o arguido CA, pela prática em autoria material e na forma consumada de um crime de injúria agravada p. e p. pelos artigos 181°, n. ° 1 e 184°, com referência ao artigo 132°, n. ° 2, alínea l), todos do Código Penal, numa pena de 120 dias de multa à taxa diária de 7,00€ (sete euros), num total de 840,00€ (oitocentos e quarenta euros)".
• “Julgar procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pela Demandante MG contra o Arguido CA e, em consequência, condenar este Arguido a pagar ao Demandante a quantia de 400,00€ (quatrocentos euros), acrescida de juros de mora...""
D. Chegou o Tribunal a quo a esta decisão, após ter considerado como provado, essencialmente, os pontos 3, 4 e 5 dos Factos da acusação:
• “No decorrer da primeira parte do aludido jogo, estando a equipa do Estoril Praia a vencer por 4 (quatro) a 0 (zero) a equipa Fonte Santense, o Arguido CA, jogador do Fonte Santense, por ter ficado desagradado com uma decisão do árbitro MG , aproximou-se do mesmo e disse-lhe: “Foda-se, Caralho ”.
• “O ofendido MG , ao ouvir tais expressões, decidiu admoestar o arguido com a exibição do cartão vermelho, expulsando-o do jogo”
• “Então, o arguido CA, ainda mais desagradado com a atitude do árbitro, disse-lhe em voz alta e com foros de seriedade, “filho da puta, vai para o caralho” e cuspiu na sua direcção, embora não o tenha atingido”
E. Não pode o Recorrente conformar-se com a douta Sentença Condenatória, por várias ordens de razões, entendendo-se que, pelo menos, o Tribunal a quo fez incorrecta interpretação e aplicação dos artigos 181°, 184°, 132°, 47°, 129°, 40°, 70°, 71°, 72° do Código Penal.
F. As expressões atribuídas ao Recorrente “Foda-se, Caralho” e “filho da puta, vai para o caralho”, podem ser consideradas grosseiras, rudes, deselegantes, palavras que ferem o civismo exigível na convivência social, sendo socialmente reprováveis, mas não constituem a prática do crime de injúria.
G. Tais expressões não integram objectiva ou subjectivamente a prática do crime de injúria, podendo pela sua grosseria ou falta de educação ferir a susceptibilidade do demandante, mas não assumem relevância penal nos termos que lhes foram atribuídos, não podendo confundir-se a linguagem grosseira e mal educada, com o crime de injúria.
H. O Direito Penal, sendo a última “ratio”, só deve ser chamado a intervir quando os factos mereçam tutela penal, o que não sucede in casu.
I. Segundo Beleza dos Santos que a honra “é aquele mínimo de condições, especialmente de natureza moral, que são razoavelmente essenciais para que um indivíduo possa com legitimidade ter estima por si, pelo que é e pelo que vale”, sendo a consideração “aquele conjunto de requisitos que razoavelmente se deve julgar necessário a qualquer pessoa, de tal modo que a falta de algum desses requisitos possa expor essa pessoa à falta de consideração ou ao desprezo público”.
J. Assim considerando o conceito de honra, forçoso será concluir que não basta um mero linguajar grosseiro, para que se ofenda, de forma penalmente censurável, a honra e a consideração, in casu, do demandante.
K. Neste sentido o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 27/04/2016, Processo n.° 427/13.8GAARC.P1: “Para que se verifique um crime de injúria é necessário que as expressões consistam numa imputação de factos, mesmo sob a forma de suspeita, com um conteúdo ofensivo da honra ou consideração do visado, ou que as palavras dirigidas ao visado tenham esse mesmo cariz ofensivo da honra ou da consideração. Contudo, nem todos os insultos ou palavras depreciativas são suscetíveis de integrar o crime de injúria... entendemos que a expressão “vai para o caralho” não preenche a previsão normativa do estatuído no art° 181° do C. Penal... Com efeito, a mesma, de forma clara, evidente e linear, não imputa à assistente qualquer facto ou juízo de valor. Como se escreveu no Ac. R Évora de 28.05.2013[5], a respeito de idêntica expressão, «sendo indiscutivelmente rudes, assumidamente ordinárias, claramente grosseiras, e obviamente deselegantes, que qualificam negativamente quem as profere e que ofendem as normas de convivência social e aquele mínimo de respeito comunitário que é suposto existir, não atingem, contudo, aquele núcleo essencial do conceito de honra e consideração de forma a merecer a tutela penal... Ao proferir a expressão “vai para o caralho”, o arguido não emitiu qualquer juízo de valor em relação à pessoa da assistente, nem lhe imputou qualquer facto, ainda que sob a forma de suspeita, e as palavras que lhe dirigiu não são suscetíveis de ofender a honra ou consideração da assistente, pese embora se reconheça (à referida expressão), como se disse, a forma grosseira, rude, boçal até, de transmitir a sua indignação...
L. Como se escreveu em Acórdão desta Relação [Ac. TRP de 12/06/2002, Recurso 332/02] “o direito não pode intervir sempre que a linguagem utilizada incomoda ou fere suscetibilidades do visado. Só o pode fazer quando é atingido o núcleo essencial de qualidades morais que devem existir para que a pessoa tenha apreço por si própria e não se sinta desprezada pelos outros. Se assim não fosse a vida em sociedade seria impossível. E o direito seria fonte de conflitos, em vez de garantir a paz social, que é a sua função”.
M. No caso concreto, as expressões atribuídas ao Recorrente, não obstante ferirem as regras de boa-educação e civismo socialmente exigíveis, não são susceptíveis de ofender a honra e consideração do Demandante, porque com tais expressões não foi atingido o núcleo essencial de qualidades morais do Demandante.
N. Conclui-se que as expressões atribuídas ao Recorrente desabonam o próprio declarante delas, mas não são merecedoras de dignidade penal, sob pena de violação pelo Julgador dos princípios constitucionais da necessidade, da adequação e da proporcionalidade stricto sensu do art 18°, n.º 2 da CRP, uma vez que não se pode nem deve confundir o âmbito do insulto, com o âmbito da injúria - crime.
O. No mesmo sentido o Acórdão da Relação do Porto proferido em 12/06/2002 no processo n.º 332/02: “É próprio da vida em sociedade haver alguma conflitualidade entre as pessoas... E é normal que essa animosidade tenha expressão ao nível da linguagem E o direito não pode intervir sempre que a linguagem utilizada incomoda ou fere susceptibilidades do visado. Só o pode fazer quando é atingido o núcleo essencial de qualidades morais que devem existir para que a pessoa tenha apreço por si própria e não se sinta desprezada pelos outros. Se assim não fosse, a vida em sociedade seria impossível. E o direito seria fonte de conflitos, em vez de garantir a paz social, que é a sua função ”.
P. No mesmo sentido, também o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17/05/2017, Proc. 3730/15.9T9STB.S3: “Dito isto, deve ainda também ter-se presente o ensinamento de Faria Costa quando assinala que o cerne da determinação dos elementos objectivos do crime se tem de fazer sempre com recurso a um horizonte de contextualização em que fica inelutavelmente implicado um direito fundamental como é o da liberdade de expressão na vertente de liberdade de opinião. ”...Mais se diz no referido Acórdão do STJ: “Por isso é que a criminalização da ofensa do direito à honra vem sendo alvo de expressiva oposição por poder contender com esse outro direito fundamental que é o da liberdade de expressão. ”
Q. Conclui-se ainda como no supra referido Acórdão STJ: “Parece ser neste sentido, por exemplo, o ensinamento de Costa Andrade quando recorda que a «vida comunitária - e não há vida pessoal sem vida comunitária - é fundamentalmente comunicação» propondo que em caso de dúvida sobre a prevalência entre a honra e a liberdade de expressão «nada seguramente mais prudente (e mais consentâneo com os ditames constitucionais) do que a redução da mancha do punível - in dubio pro libertate» com interpretação tanto quanto possível compressiva dos sentidos da incriminação.”... Acrescenta ainda o referido Acórdão: “Reconhecendo-se embora que a liberdade de expressão e a honra têm o mesmo valor jurídico - cfr art. 26° CRP e arts. 12° e 19° da Declaração Universal dos Direitos do Homem - sendo inviável qualquer princípio de hierarquização é hoje, porém, incontornável que há uma clara influência na jurisprudência nacional da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem"...
R. Por último, em matéria de Jurisprudência, conclui-se como no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12/09/2019, proferido no âmbito do processo n.° 288/18.0T9LRS.L1-9 : “No crime de injúrias, o direito penal não pode intervir sempre que a linguagem utilizada incomoda ou fere susceptibilidade do visado. Só o pode fazer quando é atingido o núcleo essencial de qualidade morais que devem existir para que a pessoa possa ter apreço por si própria e não se sinta desprezada pelos outros, sendo ainda de frisar que na avaliação do preenchimento do tipo de crime de injúria não basta a consideração das palavras e expressões proferidas: é preciso situá-las no enquadramento preciso em que foram ditas; No mundo do desposto e, em particular, do futebol, estão instituídas determinadas práticas que a generalidade das pessoas valora de uma forma mais permissiva, desde que tais condutas se desenvolvam no âmbito restrito do sub-sistema desportivo, sucedendo tal com as injúrias;
S. Conclui-se ainda como no referido Acórdão: “se no decurso de um jogo de futebol, ... ocorreu uma troca de palavras e uma discussão entre o assistente e o arguido no decurso da qual este dirigindo-se aquele disse “Vá lá p’ra barraca, vai mas é pó caralho seu filho da puta”, tais expressões feitas no seio do “mundo do futebol” não se _podem considerar que tenham atingido um _patamar de obscenidade e grosseria de linguagem, nem que aquelas expressões tenham colidido com o conteúdo moral da personalidade do visado nem atingido valores ética e socialmente relevantes do ponto de vista do direito penal”; (sublinhado nosso)
T. Conclui-se, pois, que o Recorrente ter sido absolvido da prática dos crimes de que vinha acusado.
U. Mais se conclui que mal andou o Tribunal a quo, quanto à qualificação do tipo de crime de injúria agravada.
V. Conclui-se que não resulta de forma automática - discordando-se da Mma. Juiz a quo, a fls. 19 da douta Sentença de que se recorre, quando diz - que “as consequências jurídico-penais da conduta injuriosa são agravadas sempre que o alvo do comportamento típico seja uma das pessoas referidas no artigo 132°, n. ° 2, alínea l) do Código Penal...”
W. Conclui-se que o agravamento do tipo de ilícito, de forma automática, não resulta da doutrina, nem da jurisprudência. Nesse sentido o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 09/05/2005, Processo 319/05-1: “O agravamento da pena é resultante, pois, do juízo que se faça à conduta do agente no sentido de se concluir que aquela revela especial censurabilidade ou perversidade do agente.... Elemento fundamental do tipo é, conforme de lê no n.º 2 do citado preceito, e antes se referiu, o juízo que se faça à conduta do agente no sentido de se concluir que as ofensas foram produzidas em circunstâncias que revelam especial censurabilidade ou perversidade do agente.... Assim ficou consagrado no Ac. do TRP de 31.10.2001, onde se pode ler que “Para se afirmar a existência de especial censurabilidade ou perversidade no comportamento do agente, impõe-se a análise das circunstâncias concretas que rodearam a prática do facto e a conclusão de que elas são tais que exprimem inequívoca e concretamente uma especial perversidade do agente ou que são merecedoras de um severo juízo de censura ”.
X. Conclui-se que, ainda que se considerasse a prática do crime de injúrias por parte do Recorrente, sempre se trataria de crime de injúrias simples, caso em que - tratando-se de crime particular - o procedimento ficaria dependente da prévia constituição como assistente (do Demandante) e da oportuna dedução da acusação particular, o que não sucedeu.
Y. Conclui-se, pois, que tal falha processual, implicaria a extinção do procedimento criminal, com as legais consequências, nomeadamente, ser declarado extinto o procedimento criminal.
Z. Sem conceder, conclui-se ainda, por dever de patrocínio, que ainda que se admitisse a prática do crime de injúria, por parte do Recorrente, a douta Sentença recorrida também merece reparos no que à medida da pena diz respeito, por se considerar gravosa e desproporcionada.
AA. O crime de injúria agravada, de que vinha o Recorrente acusado é punível com pena de multa de 15 a 180 dias.
BB. A Mma. Juiz a quo considerou pesarem a favor do Recorrente a sua “inserção familiar, responsabilidade que revela relativamente aos filhos e família e a sua inserção laboral", bem como a circunstância de não ter averbada qualquer condenação no registo criminal.
CC. Quanto às condições pessoais do Recorrente, deu a Mma. Juiz a quo como provado que o Recorrente tem o 9° ano de escolaridade; trabalha num restaurante, auferindo o salário mensal de €600,00; vive com a companheira e com a filha de ambos, de 3 anos de idade, numa casa dos pais daquela, contribuindo com €230,00 mensais para as despesas domésticas e de condomínio; tem um filho com 6 anos de idade, para o sustento do qual contribui com 100,00€ mensais, dividindo com a progenitora do mesmo as despesas escolares; paga 250,00€ por mês a título de prestação de um crédito pessoal; paga 58,00€ no âmbito de um plano de regularização de dívida à Segurança Social.
DD. Tudo isto considerado, decidiu a Mma. Juiz a quo: “decide aplicar-se aos Arguidos, pela prática do crime de injúria agravada, penas entre o meio da moldura penal e os 2/3"
EE.O Recorrente foi condenado numa pena de multa de 120 dias de multa à taxa diária de €7,00, perfazendo €840,00, o que se não entende.
FF. Conclui-se que, no caso concreto, face às circunstâncias pessoais do Recorrente, seria suficiente, adequada e proporcional, a aplicação de pena no mínimo legal, o que não sucedeu.
GG. Conclui-se que a escolha da pena terá de ser perspectivada em função da adequação, proporção e potencialidade para atingir os objectivos estipulados no art. 40° CP, tendo o Recorrente por justa e adequada a aplicação de uma pena igual ou muito próxima do mínimo legal.
HH. Concluindo-se que, decidindo dessa forma, a sentença seria mais justa e sempre preencheria os fins das penas.
II. Conclui-se, por fim, que a douta Sentença recorrida merece reparos no que se refere ao pedido de indemnização civil.
JJ. O Demandante deduziu - contra o ora Recorrente - PIC no valor de €400,00, tendo por base a prática dos factos que lhe eram imputados na acusação de 2 crimes: ameaça e injúria agravada.
KK. O Demandante justificou o PIC alegando, entre outras coisas, ter temido pela sua vida.
LL. O Recorrente foi absolvido da prática do crime de ameaça de que vinha acusado!
MM. Não obstante a absolvição, a Mma. Juiz a quo decidiu entendeu condenar o Recorrente na totalidade do PIC.
NN. Conclui-se, face ao exposto, e salvo o devido respeito por melhor opinião, que tal decisão não só não é juridicamente defensável, como é injusta.
OO. Conclui-se ainda que, quanto muito, haveria justificação - que não houve - para que Recorrente fosse condenado em metade do PIC contra si peticionado.”
Termina no sentido de a sentença condenatória “ser revogada, substituindo-se por outra que absolva o Recorrente da prática do crime de injúria agravada pelo qual foi condenado.
Assim não se entendendo, sempre deverá julgar-se estar em causa o crime de injúria simples, devendo ser declarada a extinção do procedimento criminal.
Sem prescindir, assim não entendendo, sempre a pena aplicada ao ora Recorrente deverá ser no mínimo legal, bem como deverá julgar-se não provado o PIC deduzido contra o Recorrente ou, em último caso, ser o valor do mesmo substancialmente reduzido, face à absolvição do crime de ameaça de que era acusado”.
2. O arguido DR :
“1. A Douta Decisão merece-nos reparos por nela se ter feito erro de julgamento e incorrecta interpretação e aplicação da Lei ao caso concreto.
2. A prova produzida encontra-se documentada do seguinte modo: FA  (12.11.2019): Início da gravação: 09:25; CA (12.11.2019): Início da gravação: 09:42; DR  (12.11.2019): Início da gravação: 09:50; MG (12.11.2019): Início da gravação: 10:24; TS (12.11.2019): Início da gravação: 10:47; FAA (12.11.2019): Início da gravação: 11:03; TS (12.11.2019): Início da gravação: 13:37.
3. Percorrendo a documentação da audiência, verifica-se que, mal andou o Tribunal a quo ao concluir como o fez na fundamentação da decisão de facto porque a prova produzida em sede de julgamento - declarações do recorrente, e depoimento das testemunhas -, imporia ao Tribunal a quo concluísse de modo diametralmente inverso,
4. Produzida a prova em sede de audiência de discussão e julgamento, vejamos o que dela resultou, através da transcrição das declarações do Recorrente:
Arguido: O que eu confirmo é que disse aquelas palavras ao árbitro e não à equipa de arbitragem. (...) O que eu lhe disse foi esses palavrões.
Queria pedir desculpa ao ofendido Miguel, queria pedir porque eu hoje em dia sou pai, se a minha família estivesse na bancada exactamente sinto-me arrependido, sinto-me envergonhado, quando contei isto ao meu pai (...), chamou-me à razão e esse é o meu arrependimento.
Em relação ao lançamento da garrafa isso não corresponde à verdade. Não fiz tentativa de arremesso de garrafa nenhuma. O que aconteceu como disse o CA  o lançamento foi feito por um colega nosso, que era o N.  que estava ao meu lado no banco de suplentes contra o chão. E foi aí que ele foi advertido com um cartão amarelo, tanto que eu não fui admoestado com cartões amarelos, com nada, eu admoestado com um vermelho directo na ficha de jogo no final.
Tribunal: Vamos por partes.
Arguido: Sim, senhora.
Tribunal: O sr. o que diz é que nunca se dirigiu à senhora TS ? (...)
Arguido: Não.
Tribunal: Que disse em voz alta "filhos da puta” o senhor confirma?
Arguido: Disse, estava de costas para o árbitro quando mencionei isso. (...)
Tribunal: Mas disse no singular ou disse no plural?
Arguido: Disse no plural, "filhos da puta”, foi assim.
Tribunal: E diz que não arremessou nenhuma garrafa?
Arguido: Não, isso é completamente falso.
Tribunal: Questão da garrafa, fez referência que foi o N.  que foi advertido com um cartão amarelo e que tinha arremessado a garrafa como já disse o seu co-arguido?
Arguido: Sim.
Tribunal: Mas isso aconteceu, esse arremesso de garrafa do senhor N. , foi nesse momento?
Arguido: Não, foi no momento antes no banco. Aquilo foi tudo tão rápido que logo a seguir que o N.  faz isso quando sofremos o segundo golo, e nós sofremos em 30 segundos 2 golos, e depois acontece a expulsão do CA  e é quando começa a confusão toda .
(...) 
Tribunal: E o senhor diz, se bem percebi que, o senhor não levou nenhum vermelho no jogo, só na ficha é que apareceu um vermelho.
Arguido: Exactamente. (...) Só no fim o nosso director que costuma ir à cabine do árbitro recolher a ficha e os cartões me diz "DR foste expulso”. Fui expulso? Então estava de costas para o senhor. ...
27
(...)
M.P.: Se quando dirigiu esta expressão se tinha algum objecto nas mãos?
Arguido: Não.
5. E do depoimento do demandante civil com relevância para o presente recurso:
Tribunal: Pode-nos relatar um bocadinho o que é que aconteceu neste dia? (...)
Demandante civil: Depois há dois jogadores que estavam na zona dos bancos, houve um que proferiu também as palavras do filho da puta, quando eu ia a passar, eu olhei, vi os dois. Depois deu-me um click olhei novamente quando estou a olhar novamente há um jogador que arremessa uma garrafa de água, felizmente não me acertou.
Tribunal: Vamos com calma. O jogador que lhe chama “filho da puta” outra vez é quem, está aqui hoje ou não?
Demandante civil: Foi o FA  (e identificou-o).
Tribunal: E depois?
Demandante civil: Depois estavam os dois juntos, depois o FA  proferiu aquilo.
Tribunal: Os dois juntos quem?
Demandante civil: O FA  e o DR . Estavam os dois juntos, naquele momento após as palavras quando olho para trás vejo o DR a lançar a garrafa de água que me passou ao lado, nós vamos para a zona do meio campo (...) então dirigi-me para junto dos dois a uma ainda distância considerável com receio que isto acontecesse, (...) exibo o cartão vermelho aos dois é quando veio o FA  na minha direcção e faz ali um golpe astuto.
(...) 
Tribunal: (...) essa garrafa é lançada só na sua direcção ou na direcção de mais alguém?
Demandante civil: Nós íamos os dois juntos.
Tribunal: Nós quem?
Demandante civil: Eu e a minha colega, a TS . Mas supostamente pelo lado que ela passa seria para mim, porque ela passa-me ao lado, a minha colega ia do lado oposto (...)
Eu é que era o visado em tudo, né.
Tribunal: E quando o senhor DR atira a garrafa o que é que ele diz?
Demandante civil: (...) Sinceramente já não me consigo recordar se ele proferiu alguma coisa ou não, se o fez ou não.
M.P.: A que distância estava do arguido DR quando o viu a arremessar a garrafa.
Demandante civil: Do DR pouco mais, 5 metros, por aí.
6. Confrontando os factos pelos quais o recorrente vinha acusado, a prova produzida em julgamento, a disposição legal em causa e a decisão do Tribunal, repetindo-nos, parece evidente o erro manifesto de julgamento porquanto, a expressão “filhos da puta” dita no plural - recorde-se que se encontra demonstrado no ponto 8. dos factos provados - não tem a virtualidade de preencher o elemento objectivo do tipo ilícito aqui em causa.
7. Com efeito, tal expressão revela que o recorrente agiu sem intenção de ofender a honra do demandante civil, apenas pretendendo expressar descontentamento perante o circunstancialismo em que se encontrava - confusão no jogo.
8. Desta forma, os factos descritos em 14. e 18. não poderiam resultar provados. 
9. Tudo o que agora ficou dito seria o bastante para o recorrente ser absolvido do crime de que vem acusado e, concomitantemente, do pedido de indemnização cível no que a esta parte concerne.
No entanto, caso assim não se entenda, sem conceder e apenas por mera cautela de patrocínio, merece-nos reparos o facto provado em 2.
10. O ponto 2 resultou provado com o seguinte teor: O queixoso MG , que é árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol -, foi nomeado como árbitro principal do referido jogo, sendo auxiliado por TS , como 2.° (segundo) árbitro, e por FAA, como cronometrista.
11. Todavia, da prova produzida não resultou demonstrada a integralidade da qualidade do demandante civil tal como vem descrito no referido ponto 2.
12. In casu, a integralidade da qualidade de árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol do demandante civil não é questão de somenos importância pois, foi por força dessa alegada qualidade que o recorrente veio a ser acusado e condenado de ter cometido um crime de injúria agravada e um crime de ofensa à integridade física qualificada com as repercussões em matéria de molduras penais e de determinação da pena a aplicar.
13. Assim sendo, como é, impõe-se proceder à transcrição da prova produzida em sede de audiência de julgamento, de modo a que o Tribunal ad quem possa fazer o melhor julgamento: Aos costumes, o demandante civil esclareceu que é agente da PSP. O Mmo. Juiz a quo perguntou: é árbitro também? E o demandante civil respondeu singelamente sou. A testemunha TS afirmou, por referência à questão colocada pelo Tribunal a quo sobre se conhecia o ofendido, foi meu colega de equipa de arbitragem em várias épocas. A testemunha FAA referiu que conheço como árbitro, relação só profissional da arbitragem. Em idêntico sentido, do relatório de jogo de fls. 77 a 81 e 83 não consta qualquer referência à Federação Portuguesa de Futebol.
14. Confrontando a prova produzida acima transcrita e a ausência de qualquer referência ao órgão dirigente do futebol nacional não se pode, atento o princípio da legalidade subjacente ao Direito Penal, inferir que o demandante é árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol.
15. Para o recorrente, apenas resultou provado que o demandante civil é árbitro.
16. A ser assim, como foi, não se encontrando demonstrado por qualquer forma que é árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol -, foi nomeado como árbitro principal do referido jogo, sendo auxiliado por TS , como 2.° (segundo) árbitro, e por FAA, como cronometrista
17. O ponto 2 deveria ter sido dado provado com o seguinte teor: Provado apenas que o queixoso MG é árbitro, que TS foi colega de equipa na arbitragem e FAA exerceu a função de árbitro assistente cronomestrista.
18. Sem prejuízo de se aceitar que a agravação do crime de injúria é automática se a vítima for uma das pessoas referidas na alínea l) do n.º 2 do artigo 132.°, certo é que o tipo legal de crime de injúrias agravado prescreve que o visado dessas ofensas esteja no pleno e efectivo desempenho de uma das funções assinaladas na alínea l) do n.º 2 do artigo 132.°, do CP ou, então que seja por motivo das mesmas que tais ofensas ocorreram.
19. Ficou bastamente demonstrado no presente recurso que não resultou provada a integralidade da qualidade do demandante civil invocada em sede de acusação por manifesta insuficiência da prova produzida neste sentido, pelo que, a consequência será que as expressões que o recorrente confessou ter proferido terão de se ficar pelo da previsão do artigo 181.°, do CP - injúria simples. 
20. A realização do processo penal quando está em causa um ilícito de natureza particular como o é o crime de injúria está sempre dependente de queixa, da constituição de assistente por parte do visado, bem como da existência de uma acusação particular que aqui não ocorreu, nos termos das disposições conjugadas nos artigos 188.°, n.° 1, do CP e artigos 50.°, n.º 1, 52.°, 68.°, n.º 2 e 285.°, do CPP.
21. Atenta a natureza particular do crime de injúrias, o Ministério Público não tinha legitimidade para deduzir a acusação que formulou contra o recorrente, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 48.°, do CPP.
22. A correcta interpretação e aplicação da Lei ao caso concreto impõe que o recorrente seja absolvido pela prática do facto típico e ilícito de injúria agravada com as correspondentes repercussões no pedido de indemnização cível que foi formulado pelo demandante civil e, em que aquele veio a ser condenado.
23. Merece também reparos a decisão de condenar o recorrente pelo crime de ofensa à integridade física qualificada na forma tentada.
24. É jurisprudência dominante que a qualificação do crime de ofensa à integridade física não é automática, antes deriva da verificação de um tipo de culpa agravado o que obriga a que os elementos apurados revelem uma imagem global do facto agravada correspondente ao especial conteúdo de culpa tido em conta, in Ac. TRP de 30.04.2014, disponível no endereço do ITIJ.
25. Da mesma maneira, é entendimento jurisprudencial dominante que [n]ão pode considerar-se, até por exigências do respeito pelo princípio da legalidade, o crime de ofensa à integridade física qualificado apenas pelo facto de as circunstâncias em que foi praticado serem reveladoras de especial censurabilidade ou perversidade, independentemente da verificação de alguma das circunstâncias indicadas, como exemplos- padrão, no n° 2 do artigo 132° do Código Penal. Se não se verificar alguma dessas circunstâncias, terá de verificar-se outra, também reveladora de especial censurabilidade ou perversidade, que seja equiparável a alguma dessas circunstâncias, no plano da estrutura valorativa e gravidade. E não basta uma equiparação genérica á estrutura valorativa da globalidade das circunstâncias previstas no n° 2 do artigo 132° do Código Penal como exemplos-padrão, desde logo porque não há uma estrutura valorativa comum a todas elas, in Ac. TRP, de 30.07.2015, disponível no endereço do ITIJ.
26. Já acima nos pronunciámos pela insuficiência da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento da integralidade da qualidade do demandante civil que, a ter ficado demonstrada, sem conceder, o incluiria na alínea l) do n.º 2 do artigo 132.°, do CP, pelo que, sem mais considerações, remetemos na íntegra para as considerações oportunamente apresentadas sobre esta matéria.
27. Quanto às circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade do agente de que depende o preenchimento do facto típico e ilícito que determina a qualificativa, percorrendo o elenco dos factos provados não logramos encontrar alegadas, quanto mais verificadas, tais circunstâncias.
28. Não resulta vertido na acusação, nos elementos probatórios referidos no despacho de acusação, nem da prova produzida em julgamento, os factos necessários à qualificação da ofensa à integridade física do demandante civil, mormente quaisquer circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade do agente.
29. Socorrendo-nos do bastamente referido princípio da legalidade subjacente ao Direito Penal, não se pode aceitar que o recorrente seja condenado, não por factos concretos que revelem especial censurabilidade ou perversidade, mas por juízos manifestamente conclusivos que o Tribunal a quo entendeu acarrear para a Douta Sentença recorrida.
30. Com efeito, mesmo que se entendesse que a qualidade do demandante civil ficou demonstrada, sem conceder, e está protegida pelo artigo 132.°, n.º 2, alínea l), do CP, certo é que é preciso uma certa parcimónia na qualificação da ofensa à integridade física, sob pena de se qualificar uma conduta que pode não ter essa especial censurabilidade e perversidade, apenas pela circunstância de a vítima ter uma das qualidades específicas daquele normativo.
31. Neste sentido, parece resultar da Douta Sentença recorrida que aí se qualificou a ofensa, sem cuidar de confirmar se estavam efectivamente preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do tipo.
32. Pelo que, a omissão de quaisquer circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade do agente deve, na dúvida favorecer o recorrente, conforme tem sido uniformemente entendido, de modo a desqualificar a ofensa à integridade física.
33. A ser assim como é, a conduta do arguido apenas pode integrar o crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.°, n.º 1, do CP.
34. Trata-se de um crime de natureza semi-pública na medida em que o artigo 49.°, do CP, exige a queixa para legitimar o impulso processual penal.
35. A queixa por parte do titular do direito respectivo, constitui conditio sine qua non da legitimidade do Ministério Público para promover o processo penal, nos termos do artigo 49.°, n.º 1, do CPP.
36. Ensina a melhor doutrina pela palavra dos Senhores Professores Figueiredo Dias e Germano Marques da Silva (Curso de Processo Penal, III, 2.a ed., págs. 55 a 59) que a queixa é o requerimento feito segundo a forma e no prazo prescritos, através do qual o titular do respectivo direito (em regra, o ofendido) exprime a sua vontade de que se verifique o procedimento penal por um crime cometido contra ele ou contra pessoa com ele relacionada (vide, entre outros, ac. Relação do Porto de 28.10.2009 e 21.03.2012 e da Relação de Coimbra de 15.03.2006, todos consultados no endereço electrónico do ITIJ).
37. Pese embora, a queixa não esteja sujeita a forma especial, é sempre exigível que nela conste uma qualquer referência, simples que seja, de expressão de vontade de agir processualmente.
38. Nos termos do disposto no artigo 115.°, n.° 1, do CP “o direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (...)”
39. Dito isto, e no caso dos presentes autos, verifica-se que não foi apresentada queixa por quem de direito, ou seja, por MG e, há muito se esgotou o prazo para a apresentar.
40. Pelo que, a correcta interpretação e aplicação da Lei ao caso concreto imporia que o recorrente, fosse absolvido da prática do facto típico e ilícito de ofensa à integridade física qualificada e, concomitantemente, com as correspondentes repercussões no pedido de indemnização cível que foi formulado pelo demandante civil e, em que aquele veio a ser condenado.
41. No entanto, caso assim V. Exas. não entendam, sem conceder e apenas por mera cautela de patrocínio, mantendo este Tribunal o elenco dos factos provados, tomamos a liberdade de citar parcialmente o Ac. do TRL, de 12.09.2019, cujos factos são muito semelhantes aos dos presentes autos.
42. Aí se lê que: I. No crime de injúrias, o direito penal não pode intervir sempre que a linguagem utilizada incomoda ou fere susceptibilidade do visado. Só o pode fazer quando é atingido o núcleo essencial de qualidades morais que devem existir para que a pessoa possa ter apreço por si própria e não se sinta desprezada pelos outros, sendo ainda de frisar que na avaliação do preenchimento do tipo de crime de injúria não basta a consideração das palavras e expressões proferidas: é preciso situá-las no enquadramento preciso em que foram ditas; II. No mundo do desporto, e, em particular, do futebol, estão instituídas determinadas práticas que a generalidade das pessoas valora de uma forma mais permissiva, desde que tais condutas se desenvolvam no âmbito do restrito sub-sistema desportivo, sucedendo tal com as injúrias; III. Assim se no decurso de um jogo de futebol (...), ocorreu uma troca de palavras e uma discussão entre o assistente e o arguido no decurso da qual este dirigindo-se àquele disse: “Vá lá p’ra barraca, vai mas é pó caralho seu filho da puta”, tais expressões feitas no seio do “mundo do futebol”, não se podem considerar que tenham atingido um patamar de obscenidade e grosseria de linguagem, nem que aquelas expressões tenham colidido com o conteúdo moral da personalidade do visado nem atingido valores ética e socialmente relevantes do ponto de vista do direito penal; IV. No contexto de acesa discussão, numa envolvência futebolística, em que foram proferidas, aquelas palavras não têm outro significado que não seja a mera verbalização das palavras obscenas, sendo absolutamente incapazes de pôr em causa o carácter, o bom nome ou a reputação do visado. Traduzem sim um comportamento revelador de falta de educação e de baixeza moral e contra as regras da ética desportiva; contudo, esse tipo de comportamento, socialmente desconsiderado, é também ele, de alguma forma tolerado nos bastidores da cena futebolística. Eventualmente, deverá ser sancionado disciplinarmente, mas daí a sê-lo penalmente a resposta terá de ser negativa (sublinhados nossos).
43. Em face do que antecede e feita uma ponderação entre a expressão proferida no plural, o contexto em que o foi, o circunstancialismo concreto - muito sumariamente, uma situação deveras confusa após a expulsão de um jogador da equipa do recorrente quando estavam a perder 0-4, num jogo de tudo ou nada -, o demandante civil afirmou que o recorrente a ele não dirigiu qualquer expressão e a jurisprudência que se espera dominante nesta matéria, parece evidente que o recorrente deveria ter sido absolvido da prática do crime de injúria agravada e na parte que lhe corresponde no pedido de indemnização cível.
44. No entanto, caso assim não se entenda, sem conceder e apenas por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que a Douta sentença recorrida merece reparos também, no que à medida das penas concerne, por se considerarem gravosas e desproporcionadas.
45. Efectivamente, as penas em que o recorrente foi condenado não se mostram adequadas, suficientes e proporcionais aos factos praticados, atendendo à culpa do agente, ao bem jurídico violado, às circunstâncias da sua prática, às suas repercussões sociais, tempo decorrido, ausência de antecedentes criminais, juventude do agente, e as exigências de prevenção geral e especial.
46. O crime de injúria agravada de que vinha o recorrente acusado prevê pena de multa de 15 a 180 dias, nos termos das disposições conjugadas nos artigos 47.°, n.° 1, 181.°, n.º 1, 184.°, ambos do CP.
47. Ao recorrente foi aplicada uma pena de multa de 100 dias à taxa diária de 8,00€, perfazendo 800,00€.
48. Entendeu o Tribunal a quo que o dolo é directo e intenso e a seu favor consignou a sua inserção familiar, responsabilidade que revelam relativamente aos filhos e famílias e sua inserção laboral. Mais consignou que a ausência de condenações nos registos criminais é ponderada favoravelmente. E, conclui que, tudo compulsado decide aplicar (...) penas entre o meio da moldura penal e os 2/3.
49. Com o devido respeito, não alcançamos esta conclusão porquanto o recorrente é primário e decorreram mais de 3 anos e meio sobre os factos aqui em causa.
50. A moldura penal já se encontra elevada por força da agravação do artigo 132.°, n.º 2, alínea l), do CP.
51. Assim, in casu, face às circunstâncias do recorrente, sempre seria suficiente, adequada e proporcional, a aplicação de pena situada no primeiro terço da moldura penal.
52. Na verdade, a escolha da pena terá de ser perspectivada em função da adequação, proporção e potencialidade para atingir os objectivos estipulados no artigo 40.°, do CP.
53. Pelo exposto considera a recorrente terem sido violados, salvo melhor opinião, os preceitos legais invocados nas presentes alegações de recurso, tendo por justa e adequada a aplicação ao recorrente de uma pena situada no primeiro terço da moldura penal.
54. Decidindo, dessa forma, entendemos que a decisão aplicável seria mais justa e sempre preencheria os fins das penas. 
55. Também o quantum diário - 8,00€ (oito euros) - nos parece desajustado e, violador do disposto no artigo 47.°, do CP, o qual determina o artigo 47.°, do CP que 1 - A pena de multa é fixada em dias, de acordo com os critérios estabelecidos no n.° 1 do artigo 71.°, sendo, em regra, o limite mínimo de 10 dias e o máximo de 360. 2 - Cada dia de multa corresponde a uma quantia entre (euro) 5 e (euro) 500, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais.
56. Resultaram provados os seguintes factos relativos às condições pessoais do recorrente: tem o 9.° ano de escolaridade, trabalha na Junta de Freguesia de Alcântara e ganha 830,00€ mensais, vive com os pais e com 2 irmãos, em casa dos primeiros, contribuindo com 250,00€ mensais para as despesas domésticas e pagando as telecomunicações, no valor de 79,00€, tem um filho de 3 anos, para o sustento do qual contribui com 150,00€ mensais.
57. Ensina a melhor Jurisprudência que I. Na fixação do montante da multa ter-se-á em consideração, para além do mais, que esta não é uma pena «menor», devendo, antes, representar para o delinquente um sofrimento análogo ao da prisão correspondente, embora dentro de condições mais humanas. II. Ponderando os critérios estabelecidos no art° 47° do CP, o montante de 5,00 euros apenas deverá ser aplicável às pessoas que vivam no mínimo existencial, ou abaixo dele. II. In casu, auferindo o arguido quase quatro vezes o salário mínimo (mais de 60,00 euros por dia) e não tendo pessoas a seu cargo (a sua mulher trabalha e não é referida a existência de outras pessoas no seu agregado familiar) é justa e adequada a fixação da taxa diária de multa em 10 Euros, cfr. Ac. TRG de 18.10.2010 1. A operação definitória do valor quantitativo da taxa diária da pena de multa a cominar à localizável no intervalo compreendido entre 5,00 e 500,00 euros pressupõe a prévia indagação, tendencialmente precisa, da real/contemporânea situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais, cfr. Ac. TRC de 21.05.2014. 
XIV. Na aferição do quantitativo diário da pena de multa, o julgador deve não só ter em conta os rendimentos mensais do arguido, sejam próprios ou do que o mesmo beneficie, mas toda a situação económica e financeira de que o mesmo disponha, designadamente o património que se lhe apresente disponível e os seus encargos. XV. Assim, pode servir como factor de ponderação o facto de o arguido viver em casa própria, assim como se deverá fazer uma consideração diferenciada dos encargos, distinguindo aqueles que revelam custos indispensáveis para a sustentação do condenado e dos seus familiares dependentes, os quais devem ser deduzidos no rendimento, daqueles que revelam alguma prodigalidade ou luxúria e que não devem beneficiar da mesma ponderação dedutiva, antes pelo contrário, o que tudo aconselha a que os quantitativos mínimos sejam reservados para aquelas pessoas que vivem abaixo ou no limiar da subsistência, escalonando-se a partir daí todos os demais, cfr. Ac. TRC de 14.01.2015.
58. Em face do que antecede, entendemos o quantum diário de 8,00€ (oito euros) em que o recorrente foi condenado, demasiado gravoso, tendo em conta a sua situação económica e financeira e que ficou demonstrada nos factos provados.
59. Se é certo que na fixação do quantum indemnizatório segundo a equidade, só se justifica a intervenção do tribunal de recurso quando ocorra manifesta violação das regras da boa prudência, do bem senso, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida, certo é também que in casu nos parece evidente que se justifica a intervenção deste Tribunal de recurso para invalidar a Douta Decisão do Tribunal a quo por se verificar violação das regras da boa prudência, do bem senso, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida.
60. No caso da condenação em pena de prisão de 9 meses, suspensa na sua execução por 1 ano, mas sujeita a regime de prova mediante o pagamento da quantia de 400,00€ ao lesado, a Douta Sentença recorrida novamente decidiu de forma manifestamente gravosa, desproporcional e desajustada. 
61. Para além de remetermos integralmente para as considerações supra relativas às condições do recorrente, cremos que estavam preenchidos os requisitos de que a Lei faz depender a substituição da pena de prisão por trabalho a favor da comunidade que, asseguraria as finalidades das penas e revelaria muito mais a ressocialização de que se fala na Douta Sentença recorrida do que esta mão pesada com espada sobre a cabeça que é a pena de prisão de 9 meses, suspensa na sua execução por 1 ano, mas sujeita a regime de prova mediante o pagamento da quantia de 400,00€ ao lesado.
62. Decidindo, dessa forma, entendemos que a decisão aplicável seria mais justa e sempre preencheria os fins das penas.”
Termina no sentido de a decisão recorrida ser revogada, substituindo-se por outra que absolva o arguido, ora recorrente, da prática dos crimes de injúria agravada e ofensa à integridade física qualificada e do pedido de indemnização cível, conforme resulta das presentes alegações de recurso.
Caso assim não se entenda, as penas a aplicar deverão ser reduzida no caso do crime de injúria agravada e substituída por trabalho a favor da comunidade no caso do crime de ofensa à integridade física qualificada.
3. O arguido FA .
“1. A Douta Sentença recorrida merece-nos reparos de facto e de Direito porquanto nela se fez incorrecto julgamento da matéria de facto e errada interpretação e aplicação da Lei.
2. A prova produzida encontra-se documentada do seguinte modo:
— FA  (12.11.2019): Início da gravação: 09:25;
— CA (12.11.2019): Início da gravação: 09:42;
— DR  (12.11.2019): Início da gravação: 09:50;
— MG (12.11.2019): Início da gravação: 10:24;
— TS (12.11.2019): Início da gravação: 10:47;
— FAA (12.11.2019): Início da gravação: 11:03;
— TS (12.11.2019): Início da gravação: 13:37;
3. Com interesse para a boa apreciação do recurso diz-se, na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto que [a] convicção do tribunal sobre os factos provados assentou, fundamentalmente, na confissão integral e sem reservas do arguido FA  e nos depoimentos do demandante civil e das testemunhas TS  , FAA, TF  e TM , conjugados com o auto de notícia junto a fls. 3 a 9, com o relatório de jogo de fls. 77 a 81 e 83, com os elementos clínicos juntos a fls. 23 e 24 e 82 e com o certificado de registo criminal dos arguidos juntos de fls. 211 a 213 do suporte físico dos autos (sublinhado nosso).
O tribunal teve ainda em conta as declarações dos arguidos CA e DR , na parte em que, no contexto da restante prova produzida e de acordo com as regras da experiência comum, se afiguraram verosímeis.
Assim, e mais concretamente:
Para a prova dos factos referidos no ponto 1 da factualidade dada por provada, o Tribunal atendeu, fundamentalmente, ao relatório de jogo de fls. 77 a 81 e 83, do qual resulta que no dia e hora indicados neste ponto da matéria de facto teve início um jogo de futsal no âmbito do Campeonato Distrital da I Divisão de Honra, no Complexo Desportivo de Alcabideche, sito nessa localidade, entre as equipas aí mencionadas.
Deste relatório resulta ainda que o jogo se iniciou às 18h00m, tendo sido declarado interrompido ao minuto 13,30 e dado por terminado por agressão ao árbitro.
Mais atendeu o Tribunal ao auto de notícia junto a fls. 3 a 9, do qual resulta a concreta morada do pavilhão, que constava da acusação.
No que tange à factualidade referida em 2., atendeu o Tribunal às declarações do demandante civil MG , conjugadas com os depoimentos das testemunhas TS e FAA, e com o relatório de _jogo de_fls. 77 a 81 e 83 (sublinhado nosso).
(...)
Quanto à matéria constante dos factos elencados sob os n. °s 7, 10, 16, 17, o Tribunal deu a mesma por provada com base na confissão integral e sem reservas que o arguido FA  produziu relativamente aos _ factos que lhe diziam respeito, tendo ainda atendido à mesma  para considerar demonstrada a factualidade elencada em 9, 11 e 18 na parte em que concerne a este arguido (sublinhado nosso).
Para a prova do concreto local do corpo do ofendido que foi alvo da agressão de FA  referida em 10 dos factos provados, o Tribunal atendeu ainda ao relatório hospitalar de urgência de fls. 23 e 24 e ao resumo de urgência de fls. 82.
4. A prova produzida em sede de julgamento - declarações do recorrente, e depoimento das testemunhas -, imporia ao Tribunal a quo concluísse de modo diametralmente inverso, isto porque, da transcrição das declarações do arguido, ora recorrente, e depoimento das testemunhas não resulta, perdoe-se a expressão mais coloquial, um “copy paste” dos factos constantes da acusação, pelo que, entendemos que o Tribunal a quo laborou em manifesto erro de julgamento.
5. Desde logo, e sem prejuízo de o recorrente, ter confessado a prática dos factos, certo é que espontaneamente descreveu o circunstancialismo em que tais factos ocorreram - [é] verdade, não nego. Foi uma coisa que aconteceu no calor do momento. Aquilo era uma fase a eliminar, o jogo não estava a correr bem e nós estávamos todos de cabeça perdida, ainda mais quando o CA  foi expulso. E acho que foi mais isso que levou aos actos e não o querer e a vontade. É só - pelo que, não podia o Tribunal a quo ter concluído, sem mais, pela existência de dolo, e menos ainda, dolo directo!
6. O ponto 2 resultou provado com o seguinte teor: O queixoso MG , que é árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol -, foi nomeado como árbitro principal do referido jogo, sendo auxiliado por TS , como 2. ° (segundo) árbitro, e por FAA, como cronometrista.
7. A fundamentação de facto do ponto 2 encontra-se motivada do seguinte modo:
No que tange à factualidade referida em 2., atendeu o Tribunal às declarações do demandante civil MG , conjugadas com os depoimentos das testemunhas TS e FAA, e com o relatório de jogo de fls. 77 a 81 e 83.
Todavia,
8. Da prova produzida não resultou demonstrada a integralidade da qualidade do demandante civil tal como vem descrito no referido ponto 2 porquanto, aos costumes, o demandante civil esclareceu que é agente da PSP, o Mmo. Juiz a quo perguntou: é árbitro também? E o demandante civil respondeu singelamente sou.
9. A testemunha TS afirmou, por referência à questão colocada pelo Tribunal a quo sobre se conhecia o ofendido, foi meu colega de equipa de arbitragem em várias épocas. 
10. A testemunha FAA referiu que conheço como árbitro, relação só profissional da arbitragem.
11. Em idêntico sentido, do relatório de jogo de fls. 77 a 81 e 83 não consta qualquer referência à Federação Portuguesa de Futebol.
12. Confrontando a prova produzida acima transcrita e a ausência de qualquer referência ao órgão dirigente do futebol nacional não se pode, atento o princípio da legalidade subjacente ao Direito Penal, inferir que o demandante é árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol.
13. Para o recorrente, apenas resultou provado que o demandante civil é árbitro.
14. O ponto 2 deveria ter sido dado provado com o seguinte teor: Provado apenas que o queixoso MG é árbitro, que TS foi colega de equipa na arbitragem e FAA exerceu a função de árbitro assistente cronomestrista.
15. Os pontos 16, 17 e 18 resultaram provados com o seguinte teor:
16 - O arguido FA  agiu deliberada, livre e conscientemente, querendo, ao agir da forma supra descrita em 7. (proferindo as expressões “filho da puta”, “vai para o caralho”), ofender MG na sua honra e consideração, o que conseguiu, bem sabendo que o mesmo era árbitro desportivo sob a jurisdição de federação desportiva e que se encontrava no exercício da suas funções.
17 - O arguido FA  agiu deliberada, livre e conscientemente, querendo, ao agir da forma supra descrita em 10., provocar lesões no corpo e na saúde do queixoso MG , o que conseguiu, bem sabendo que o mesmo era árbitro desportivo sob a jurisdição de federação desportiva e que se encontrava no exercício da suas funções.
18 - Os arguidos CA, DR  e FA  sabiam que as suas condutas eram e são proibidas e punidas por lei penal.
Com a seguinte fundamentação Quanto à matéria constante dos factos elencados sob os n. °s 7, 10, 16, 17, o Tribunal deu a mesma por provada com base na confissão integral e sem reservas que o arguido FA  produziu relativamente aos factos que lhe diziam respeito, tendo ainda atendido à mesma para considerar demonstrada a factualidade elencada em 9, 11 e 18 na parte em que concerne a este arguido.
16. O recorrente confessou a prática dos factos do modo que se transcreve:
Tribunal: Então esta factualidade que eu lhe li, relativamente a si, e eventualmente relativamente aos demais é verdade ou não é verdade?
Arguido: Eu vou falar em relação a mim. É verdade, não nego. Foi uma coisa que aconteceu no calor do momento. Aquilo era uma fase a eliminar, o jogo não estava a correr bem e nós estávamos todos de cabeça perdida, ainda mais quando o CA  foi expulso. E acho que foi mais isso que levou aos actos e não o querer e a vontade. É só. 
Tribunal: Aqui em concreto. Essas expressões que aqui eu referi o senhor disse-as todas ao senhor MG , é isso?
Arguido: Sim. Foi só no calor do jogo. Estou arrependido. É normal. Foi uma coisa que aconteceu no momento. Tanto que depois já tive, já fui arbitrado novamente pelo Sr. MG e nada aconteceu, foi tudo tranquilo. Foi mesmo só coisa daquele jogo.
(...)
Tribunal: E também esta questão, a parte que aqui se diz na acusação que o senhor saltou para o ar, desferiu um pontapé, atingiu-o no abdómen, confirma tudo isso, é isso?
Arguido: Sim.
17. Confrontando a confissão do recorrente, é evidente que o Tribunal a quo não poderia ter dado como provado os pontos 16, 17 e 18 nos termos em que o fez, mormente se atentarmos à espontaneidade das suas palavras quando afirmou [f]oi uma coisa que aconteceu no calor do momento. Aquilo era uma fase a eliminar, o jogo não estava a correr bem e nós estávamos todos de cabeça perdida, ainda mais quando o CA  foi expulso. E acho que foi mais isso que levou aos actos e não o querer e a vontade. É só e [f]oi só no calor do jogo. Menos ainda poderia ter sido dado como provada a parte final do ponto 16 e 17 e o 18, mercê de não ter sido feita prova nesse sentido.
18. Assim, os pontos 16, 17 e 18 deveriam ter sido dados provados com o seguinte teor:
16 - Provado que o arguido FA  agiu no calor do momento e estava de cabeça perdida quando proferiu as as expressões “filho da puta”, “vai para o caralho”, mas não quis nem teve vontade de ofender MG na sua honra e consideração.
17 - Provado que o arguido FA  agiu no calor do momento e estava de cabeça perdida quando saltou para o ar, desferiu um pontapé e atingiu MG no abdómen mas não quis nem teve vontade de ofender a integridade física deste.
18 - Provado que o arguido FA  não realizou que a conduta era proibida e punida por lei.
19. Ensina Germano Marques da Silva “As decisões judiciais, com efeito, não podem impor- se apenas em razão da autoridade de quem as profere, mas antes pela razão que lhes subjaz”, razão essa que está em falta na decisão de que se recorre.
20. Ao considerar demonstrada a qualidade do demandante civil exigida para o preenchimento da alínea l) do n.º 2 do artigo 132.°, do CP, a especial censurabilidade ou perversidade do recorrente e que este actuou com dolo directo, pese embora a prova produzida, o Tribunal a quo laborou em manifesto erro de julgamento.
21. Pese embora se admita que a agravação do crime de injúria é automática se a vítima for uma das pessoas referidas na alínea l) do n.º 2 do artigo 132. °, certo é que o tipo legal de crime de injúrias agravado prescreve que o visado dessas ofensas esteja no pleno e efectivo desempenho de uma das funções assinaladas na alínea l) do n.° 2 do artigo 132.°, do CP ou, então que seja por motivo das mesmas que tais ofensas ocorreram.
22. Ficou bastamente demonstrado no presente recurso que não resultou provada a integralidade da qualidade do demandante civil invocada em sede de acusação por manifesta insuficiência da prova produzida neste sentido, pelo que, a consequência será que as expressões que o recorrente confessou ter proferido terão de se ficar pelo da previsão do artigo 181.°, do CP - injúria simples.
23. A realização do processo penal quando está em causa um ilícito de natureza particular como o é o crime de injúria está sempre dependente de queixa, da constituição de assistente por parte do visado, bem como da existência de uma acusação particular que aqui não ocorreu, nos termos das disposições conjugadas nos artigos 188.°, n.° 1, do CP e artigos 50.°, n.º 1, 52.°, 68.°, n.º 2 e 285.°, do CPP.
24. Acresce que, atenta a natureza particular do crime de injúrias, o Ministério Público não tinha legitimidade para deduzir a acusação que formulou contra o recorrente, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 48.°, do CPP.
25. A correcta interpretação e aplicação da Lei ao caso concreto impõe que o recorrente seja absolvido pela prática do facto típico e ilícito de injúria agravada com as correspondentes repercussões no pedido de indemnização cível que foi formulado pelo demandante civil e, em que aquele veio a ser condenado.
26. É jurisprudência dominante que a qualificação do crime de ofensa à integridade física não é automática, antes deriva da verificação de um tipo de culpa agravado o que obriga a que os elementos apurados revelem uma imagem global do facto agravada correspondente ao especial conteúdo de culpa tido em conta, in Ac. TRP de 30.04.2014, disponível no endereço do ITIJ.
27. Da mesma maneira, é entendimento jurisprudencial dominante que [n] ão pode considerar-se, até por exigências do respeito pelo princípio da legalidade, o crime de ofensa à integridade física qualificado apenas pelo facto de as circunstâncias em que foi praticado serem reveladoras de especial censurabilidade ou perversidade, independentemente da verificação de alguma das circunstâncias indicadas, como exemplos-padrão, no n° 2 do artigo 132° do Código Penal. Se não se verificar alguma dessas circunstâncias, terá de verificar-se outra, também reveladora de especial censurabilidade ou perversidade, que seja equiparável a alguma dessas circunstâncias, no plano da estrutura valorativa e gravidade. E não basta uma equiparação genérica á estrutura valorativa da globalidade das circunstâncias previstas no n° 2 do artigo 132° do Código Penal como exemplos-padrão, desde logo porque não há uma estrutura valorativa comum a todas elas, in Ac. TRP, de 30.07.2015, disponível no endereço do ITIJ. 
28. Já acima nos pronunciámos pela insuficiência da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento da integralidade da qualidade do demandante civil que, a ter ficado demonstrada, sem conceder, o incluiria na alínea l) do n.° 2 do artigo 132.°, do CP, pelo que, sem mais considerações, remetemos na íntegra para as considerações oportunamente apresentadas sobre esta matéria.
29. Quanto às circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade do agente de que depende o preenchimento do facto típico e ilícito que determina a qualificativa, percorrendo o elenco dos factos provados não logramos encontrar alegadas, quanto mais verificadas, tais circunstâncias.
30. Não resulta vertido na acusação, nos elementos probatórios referidos no despacho de acusação, nem da prova produzida em julgamento, os factos necessários à qualificação da ofensa à integridade física do demandante civil, mormente quaisquer circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade do agente.
31. Socorrendo-nos do bastamente referido princípio da legalidade subjacente ao Direito Penal, não se pode aceitar que o recorrente seja condenado, não por factos concretos que revelem especial censurabilidade ou perversidade, mas por juízos manifestamente conclusivos que o Tribunal a quo entendeu acarrear para a Douta Sentença recorrida.
32. Com efeito, mesmo que se entendesse que a qualidade do demandante civil ficou demonstrada, sem conceder, e está protegida pelo artigo 132.°, n.º 2, alínea l), do CP, certo é que é preciso uma certa parcimónia na qualificação da ofensa à integridade física, sob pena de se qualificar uma conduta que pode não ter essa especial censurabilidade e perversidade, apenas pela circunstância de a vítima ter uma das qualidades específicas daquele normativo.
33. Neste sentido, parece resultar da Douta Sentença recorrida que aí se qualificou a ofensa, sem cuidar de confirmar se estavam efectivamente preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do tipo.
34. Pelo que, a omissão de quaisquer circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade do agente deve, na dúvida favorecer o recorrente, conforme tem sido uniformemente entendido, de modo a desqualificar a ofensa à integridade física.
35. A ser assim como é, a conduta do arguido apenas pode integrar o crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.°, n.º 1, do CP.
36. Trata-se de um crime de natureza semi-pública na medida em que o artigo 49.°, do CP, exige a queixa para legitimar o impulso processual penal. A queixa por parte do titular do direito respectivo, constitui conditio sine qua non da legitimidade do Ministério Público para promover o processo penal, nos termos do artigo 49.°, n.º 1, do CPP. 
37. Ensina a melhor doutrina pela palavra dos Senhores Professores Figueiredo Dias e Germano Marques da Silva (Curso de Processo Penal, III, 2.a ed., págs. 55 a 59) que a queixa é o requerimento feito segundo a forma e no prazo prescritos, através do qual o titular do respectivo direito (em regra, o ofendido) exprime a sua vontade de que se verifique o procedimento penal por um crime cometido contra ele ou contra pessoa com ele relacionada (vide, entre outros, ac. Relação do Porto de 28.10.2009 e 21.03.2012 e da Relação de Coimbra de 15.03.2006, todos consultados no endereço electrónico do ITIJ).
38. Pese embora, a queixa não esteja sujeita a forma especial, é sempre exigível que nela conste uma qualquer referência, simples que seja, de expressão de vontade de agir processualmente.
39. Nos termos do disposto no artigo 115.°, n.º 1, do CP “o direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (...)”
40. In casu, verifica-se que não foi apresentada queixa por quem de direito, ou seja, por MG e, há muito se esgotou o prazo para a apresentar.
41. Pelo que, a correcta interpretação e aplicação da Lei ao caso concreto imporia que o recorrente, fosse absolvido da prática do facto típico e ilícito de ofensa à integridade física qualificada e, concomitantemente, com as correspondentes repercussões no pedido de indemnização cível que foi formulado pelo demandante civil e, em que aquele veio a ser condenado.
42. Ainda que este Tribunal de recurso decida manter o elenco dos factos provados, tomamos a liberdade de citar parcialmente o Ac. do TRL, de 12.09.2019, cujos factos são muito semelhantes aos dos presentes autos: I. No crime de injúrias, o direito penal não pode intervir sempre que a linguagem utilizada incomoda ou fere susceptibilidade do visado. Só o pode fazer quando é atingido o núcleo essencial de qualidades morais que devem existir para que a pessoa possa ter apreço por si própria e não se sinta desprezada pelos outros, sendo ainda de frisar que na avaliação do preenchimento do tipo de crime de injúria não basta a consideração das palavras e expressões proferidas: é preciso situá- las no enquadramento preciso em que foram ditas; II. No mundo do desporto, e, em particular, do futebol, estão instituídas determinadas práticas que a generalidade das pessoas valora de uma _forma mais permissiva, desde que tais condutas se desenvolvam no âmbito do restrito sub-sistema desportivo, sucedendo tal com as injúrias; III. Assim se no decurso de um jogo de futebol (...), ocorreu uma troca de palavras e uma discussão entre o assistente e o arguido no decurso da qual este dirigindo-se àquele disse: “Vá lá p’ra barraca, vai mas é pó caralho seu filho da puta ”, tais expressões feitas no seio do “mundo do futebol”, não se podem considerar que tenham atingido um patamar de obscenidade e grosseria de linguagem, nem que aquelas expressões tenham colidido com o conteúdo moral da personalidade do visado nem atingido valores ética e socialmente relevantes do ponto de vista do direito penal; IV. No contexto de acesa discussão, numa envolvência futebolística, em que foram proferidas, aquelas palavras não têm outro significado que não seja a mera verbalização das palavras obscenas, sendo absolutamente incapazes de pôr em causa o carácter, o bom nome ou a reputação do visado. Traduzem sim um comportamento revelador de falta de educação e de baixeza moral e contra as regras da ética desportiva; contudo, esse tipo de comportamento, socialmente desconsiderado, é também ele, de alguma forma tolerado nos bastidores da cena futebolística. Eventualmente, deverá ser sancionado disciplinarmente, mas daí a sê- lo penalmente a resposta terá de ser negativa (sublinhados nossos).
43. O depoimento do demandante civil também parece ir no sentido do que se transcreveu: Tribunal: Como é que se sentiu quando ele disse estas expressões?
Demandante civil: Aquilo que qualquer pessoa sente. Acho que todos nós temos essa consciência, como ele deveria sentir se lhe chamasse. Nos deixa, além de tristes, transtornados, e deixa-nos completamente ofendidos. Primeiro porque estão a invocar outras pessoas que não têm nada a ver com a situação e são palavreados que não se usam no dia-a-dia, pelo menos comigo não se usa. Acho que o sentimento é recíproco a toda a gente.
44. Em face do que antecede e feita uma ponderação entre as expressões proferidas, o contexto em que o foram, o circunstancialismo concreto - muito sumariamente, uma situação deveras confusa após a expulsão de um jogador da equipa do recorrente quando estavam a perder 0-4, num jogo de tudo ou nada -, o sentimento do demandante civil e a jurisprudência que se espera dominante nesta matéria, parece evidente que o recorrente deveria ter sido absolvido da prática do crime de injúria agravada e na parte que lhe corresponde no pedido de indemnização cível.
45. Efectivamente, as penas em que o recorrente foi condenado não se mostram adequadas, suficientes e proporcionais aos factos praticados, atendendo à culpa do agente, ao bem jurídico violado, às circunstâncias da sua prática, às suas repercussões sociais, tempo decorrido, ausência de antecedentes criminais, juventude do agente, e as exigências de prevenção geral e especial.
46. Ao recorrente foi aplicada uma pena de multa de 100 dias à taxa diária de 6,50€, perfazendo 650,00€ por o Tribunal a quo ter entendido que o dolo é directo e intenso e a seu favor consignou a confissão integral e sem reservas, o seu arrependimento, a idade à data dos factos (apenas 20 anos) e a sua inserção familiar, educacional e social e a ausência de condenações nos registos criminais é ponderada favoravelmente, tendo concluído que tudo compulsado decide aplicar (...) penas entre o meio da moldura penal e os 2/3. 
47. Com o devido respeito, não alcançamos esta conclusão porquanto o recorrente é um jovem integrado social e familiarmente, que se encontra a estudar, vive com os pais e um irmão, a única fonte de rendimento que tem decorre da frequência do curso e ainda contribui para as despesas do agregado familiar com 50,00€, confessou a prática dos factos, colaborou com a Justiça, demonstrou arrependimento sincero, é primário, decorreram mais de 3 anos e meio sobre os factos aqui em causa e a moldura penal já se encontra elevada por força da agravação do artigo 132.°, n.º 2, alínea l), do CP.
48. Face às circunstâncias do recorrente, sempre seria suficiente, adequada e proporcional, a aplicação de pena situada no primeiro terço da moldura penal, nos termos do artigo 40.°, n.º 1, do CP.
49. Também o quantum diário - 6,50€ (seis euros e cinquenta cêntimos) - nos parece desajustado e, violador do disposto no artigo 47.°, do CP.
50. Ensina a melhor Jurisprudência que:
I. Na fixação do montante da multa ter-se-á em consideração, para além do mais, que esta não é uma pena «menor», devendo, antes, representar para o delinquente um sofrimento análogo ao da prisão correspondente, embora dentro de condições mais humanas. II. Ponderando os critérios estabelecidos no art°47°do CP, o montante de 5,00 euros apenas deverá ser aplicável às pessoas que vivam no mínimo existencial, ou abaixo dele. II. In casu, auferindo o arguido quase quatro vezes o salário mínimo (mais de 60,00 euros por dia) e não tendo pessoas a seu cargo (a sua mulher trabalha e não é referida a existência de outras pessoas no seu agregado familiar) é justa e adequada a fixação da taxa diária de multa em 10 Euros, cfr. Ac. TRG de 18.10.2010
1. A operação definitória do valor quantitativo da taxa diária da pena de multa a cominar à localizável no intervalo compreendido entre 5,00 e 500,00 euros pressupõe a prévia indagação, tendencialmente precisa, da real/contemporânea situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais, cfr. Ac. TRC de 21.05.2014.
XIV. Na aferição do quantitativo diário da pena de multa, o julgador deve não só ter em conta os rendimentos mensais do arguido, sejam próprios ou do que o mesmo beneficie, mas toda a situação económica e financeira de que o mesmo disponha, designadamente o património que se lhe apresente disponível e os seus encargos. XV. Assim, pode servir como factor de ponderação o facto de o arguido viver em casa própria, assim como se deverá fazer uma consideração diferenciada dos encargos, distinguindo aqueles que revelam custos indispensáveis para a sustentação do condenado e dos seus familiares dependentes, os quais devem ser deduzidos no rendimento, daqueles que revelam alguma prodigalidade ou luxúria e que não devem beneficiar da mesma ponderação dedutiva, antes pelo contrário, o que tudo aconselha a que os quantitativos mínimos sejam reservados para aquelas pessoas que vivem abaixo ou no limiar da subsistência, escalonando-se a partir daí todos os demais, cfr. Ac. TRC de 14.01.2015. 
51. Em face do que antecede, entendemos o quantum diário de 6,50€ (seis euros, cinquenta cêntimos) em que o recorrente foi condenado, demasiado gravoso, tendo em conta a sua situação económica e financeira.
52. Sem prejuízo de o recorrente, depois de contribuir para as despesas do agregado familiar não ter outras despesas ou encargos fixos, certo é também que a quantia de 230,00€ (duzentos e trinta euros) que lhe sobejam para a sua vida, incluindo-se aqui naturalmente as deslocações para o curso, alimentação e vestuário, parece-nos mais próximo do limiar da subsistência do que de uma disponibilidade económica e financeira que parece resultar da Douta Decisão Recorrida.
53. No caso da condenação em pena de prisão de 1 ano e 3 meses, suspensa na sua execução por igual período, mas sujeita a regime de prova mediante o pagamento da quantia de 700,00€ ao lesado, a Douta Sentença recorrida novamente decidiu de forma manifestamente gravosa, desproporcional e desajustada.
54. Para além de remetermos integralmente para as considerações supra relativas às condições do recorrente, acresce ainda a circunstância de o Tribunal a quo ter aplicado o regime especial para jovens deliquentes.
55. Cremos que estavam preenchidos os requisitos de que a Lei faz depender a substituição da pena de prisão por trabalho a favor da comunidade que, asseguraria as finalidades das penas e revelaria muito mais a ressocialização de que se fala na Douta Sentença recorrida do que esta mão pesada com espada sobre a cabeça que é a pena de prisão de 1 ano e 3 meses, suspensa na sua execução por igual período, mas sujeita a regime de prova mediante o pagamento da quantia de 700,00€ ao lesado.
56. Decidindo, dessa forma, entendemos que a decisão aplicável seria mais justa e sempre preencheria os fins das penas.”
Termina no sentido de a decisão recorrida ser revogada, substituindo-se por outra que absolva o arguido, ora recorrente, da prática dos crimes de injúria agravada e ofensa à integridade física qualificada e do pedido de indemnização cível, conforme resulta das presentes alegações de recurso.
Sem prescindir, sempre deverão ser considerados não provados os pontos 2, 16, 17 e 18 da sentença recorrida, absolvendo-se o recorrente, da prática dos crimes de injúria agravada e ofensa à integridade física qualificada e do pedido de indemnização cível. 
Caso assim não se entenda, as penas a aplicar deverão ser reduzida no caso do crime de injúria agravada e substituída por trabalho a favor da comunidade no caso do crime de ofensa à integridade física qualificada.
A estes recursos veio responder o M.º P.º, respectivamente, com as seguintes conclusões, respectivamente:
1. Ao do recorrente CA:
“1. CA interpõe recurso da sentença proferida nos presentes autos na qual foi condenado pela prática, em autoria material, de um crime de injúria agravada, previsto e punido pelos artigos 181.º, n.º1 e 184.º, com referência ao art.132.º, n.º2, alínea l) todos do Código Penal, na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de € 7,00.
2. As expressões em causa - «foda-se, Caralho» e «filho da puta, vai para o caralho» proferidas pelo recorrente, jogador de futsal, durante um jogo de futsal sénior e dirigidas a MG , que é árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol, e que era o árbitro principal do referido jogo, são objectivamente atentatórias da honra e da consideração pessoal e profissional do ofendido, pelo que bem andou o tribunal a quo ao condenar o recorrente pela prática de um crime de injúria agravada.
3. As expressões proferidas pelo recorrente não são, ressalvando o merecido respeito por diferente entendimento, expressões meramente grosseiras ou deselegantes mas são, outrossim, expressões que ofendem a honra do visado e que integram a prática de um crime contra a honra.
4. Tem sido entendido pela Doutrina e pela Jurisprudência que para que opere o agravamento da injúria não se torna também necessária a «especial censurabilidade ou perversidade» prevista no artigo 132.º, n.º 1, do Código Penal, número para o qual, efetivamente, o artigo 184.º do Código Penal não remete.
5. A pena de multa concretamente aplicada ao recorrente, situada um pouco acima do limite intermédio da moldura penal abstracta prevista para o crime de injúria agravada, é adequada, justa e proporcional.
6. A conduta do recorrente, dada como provada na sentença condenatória, é objectivamente grave, sobretudo, se atentarmos no facto de ter sido acompanhada do acto de cuspir ao ofendido.
7. Se é certo que, no caso concreto, as exigências de prevenção especial são reduzidas, já as exigências de prevenção geral são elevadíssimas, atenta a frequência com que este tipo de condutas, lamentavelmente, é praticado, sobretudo, em contexto desportivo.
8. O tribunal a quo ponderou assertivamente o grau de ilicitude da conduta do recorrente, o facto de ter actuado com dolo directo, a sua inserção familiar e profissional e a ausência de antecedentes criminais, fazendo-o através de uma correcta aplicação dos comandos normativos ínsitos nos artigos 40.º, 70.º e 71.º do Código Penal.
9. Deve manter-se a sentença recorrida.”
2. Ao do recorrente DR :
“1. DR  interpõe recurso da sentença proferida nos presentes autos na qual foi condenado pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de injúria agravada, previsto e punido pelos artigos 181.°, n.º 1 e 184.°, com referência ao artigo 132.°, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal, numa pena de 100 dias de multa à taxa diária de 8,00 €,
2. e pela prática em autoria material e na forma tentada, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelos artigos 143.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, numa pena de 9 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, subordinada ao cumprimento do dever de pagar, ao longo deste período, a quantia de 400,00 ao ofendido MG .
3. A apreciação que o tribunal a quo efectuou quer das declarações dos arguidos e em especial do ora recorrente, quer das declarações do demandante e dos depoimentos das testemunhas inquiridas e de toda a prova produzida e analisada em julgamento, não nos merece qualquer reparo.
4. Bem andou o tribunal a quo ao dar como provada a factualidade constante dos pontos 2., 14. e 18. da matéria de facto provada, em face de toda a prova produzida e analisada em audiência de julgamento e conjugada com as regras da experiência comum e do normal acontecer.
5. Para prova da qualidade do ofendido de árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol (1.º segmento da factualidade dada como provada no ponto 2. da sentença recorrida) para além das declarações do ofendido e demandante civil MG e do depoimento das testemunhas, o tribunal a quo atendeu ao teor dos documentos juntos a fls. 77 a 81 e 83 do processo.
6. Para prova da factualidade dada como provada nos pontos 14. e 18. da matéria assente, o tribunal a quo assentou a sua convicção nas declarações dos arguidos (na parte em que confessaram os factos) e da concatenação dos factos provados com as regras de experiência comum, uma vez que a atuação (intrinsecamente externa) dos mesmos que se deu por provada é apenas condicente com a existência subjetiva dos propósitos, intentos e representações elencados nestes pontos da matéria de facto.
7. As expressões em causa, proferidas pelo recorrente, são objectivamente atentatórias da honra e da consideração pessoal e profissional do ofendido, pelo que bem andou o tribunal a quo ao condenar o recorrente pela prática de um crime de injúria agravada.
8. A sentença recorrida efectuou uma análise correcta da prova constante dos autos e da prova analisada e produzida em julgamento, não existindo qualquer erro, como alega o recorrente, nem padecendo de qualquer dos vícios a que alude o artigo 410.º do Código de Processo Penal.
9. A pena de multa concretamente aplicada ao recorrente é adequada, justa e proporcional.
10. O quantitativo diário fixado pelo tribunal a quo para os dias de multa é justo e adequado, em face dos factos dados como provados na sentença quanto à situação sócio-económica do recorrente.
11. Após fixar a medida concreta da pena de prisão em 9 meses, o tribunal a quo justificou porque não substituiu essa pena por nenhuma outra alternativa não detentiva e porque suspendeu a execução dessa pena de prisão: por entender, dada a gravidade da conduta, que uma pena de multa ou de trabalho substitutivas não seriam suficientes para, de forma adequada e suficiente, reafirmar a validade da norma violada e intimidar o recorrente à abstenção da repetição do comportamento criminoso, juízo com o qual se concorda inteiramente.
12. O tribunal a quo ponderou assertivamente o grau de ilicitude da conduta do recorrente, o facto de ter actuado com dolo directo e a ausência de antecedentes criminais e a sua inserção, fazendo-o através de uma correcta aplicação dos comandos normativos ínsitos nos artigos 40.º, 70.º e 71.º do Código Penal.
13. Deve manter-se a sentença recorrida.”
3. Ao do recorrente FA :
“1. FA  interpõe recurso da sentença proferida nos presentes autos na qual foi condenado pela prática, em autoria material, de um crime de injúria agravada, previsto e punido pelos artigos 181.º, n.º1 e 184.º, com referência ao art.132.º, n.º2, alínea l) todos do Código Penal, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 6,50, e
2. pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelos artigos 143.º, n.º1 e 145.º, n.º1, alínea a) do Código Penal, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, subordinada ao dever de pagar, nesse período, ao ofendido MG , a quantia de € 700,00.
3. A apreciação que o tribunal a quo efectuou quer das declarações dos arguidos e em especial do ora recorrente, quer das declarações do demandante e dos depoimentos das testemunhas inquiridas e de toda a prova produzida e analisada em julgamento, não nos merece qualquer reparo.
4. Em face de toda a prova produzida e analisada em audiência de julgamento, conjugada com as regras da experiência comum e do normal acontecer, bem andou o tribunal a quo ao dar como provada a factualidade constante dos pontos 2., 16., 17. e 18. da matéria de facto provada,
5. O recorrente confessou de modo integral e sem reservas os factos que lhe eram imputados no despacho de acusação, que lhe foi integralmente lido.
6. Para prova da qualidade do ofendido de árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol, para além das declarações do ofendido e demandante civil MG e do depoimento das testemunhas, o tribunal a quo atendeu ao teor dos documentos juntos a fls. 77 a 81 e 83 do processo.
7. Para prova da factualidade dada como provada nos pontos n.ºs 16. e 17, resulta da sentença que o tribunal a quo deu a mesma por provada com base na confissão integral e sem reservas que o aqui recorrente produziu relativamente aos factos que lhe diziam respeito, tendo ainda atendido à mesma para considerar demonstrada a factualidade elencada em 18. na parte em que concerne ao mesmo, acrescentando-se que, para prova da factualidade constantes dos pontos 13. a 18. da matéria assente, o tribunal a quo valeu-se das declarações dos arguidos (na parte em que confessaram os factos) e da concatenação dos factos provados com as regras da experiência comum.
8. A sentença recorrida efectuou uma análise correcta da prova constante dos autos e da prova analisada e produzida em julgamento, não existindo qualquer erro, como alega o recorrente, nem padecendo de qualquer dos vícios a que alude o artigo 410.º do Código de Processo Penal.
9. A pena de multa concretamente aplicada ao recorrente é adequada, justa e proporcional.
10. O quantitativo diário fixado pelo tribunal a quo para os dias de multa é justo e adequado, em face dos factos dados como provados na sentença quanto à situação sócio-económica do recorrente.
11. Após fixar a medida concreta da pena de prisão em 1 ano e 3 meses, o tribunal a quo justificou porque não substituiu essa pena por nenhuma outra alternativa não detentiva e porque suspendeu a execução dessa pena de prisão: por entender, dada a gravidade da conduta, que uma pena de multa ou de trabalho substitutivas não seriam suficientes para, de forma adequada e suficiente, reafirmar a validade da norma violada e intimidar o recorrente à abstenção da repetição do comportamento criminoso, juízo com o qual se concorda inteiramente.
12. O tribunal a quo ponderou assertivamente o grau de ilicitude da conduta do recorrente, o facto de ter actuado com dolo directo, a confissão que fez, a ausência de antecedentes criminais e a sua inserção, fazendo-o através de uma correcta aplicação dos comandos normativos ínsitos nos artigos 40.º, 70.º e 71.º do Código Penal.
13. Deve manter-se a sentença recorrida.”
Neste Tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta teve vista nos autos, elaborando parecer em que defende a improcedência dos recursos.
Foi dado cumprimento ao artigo 417.º n.º 2 do CPP, não tendo sido oferecida qualquer resposta.
II.
Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir.
Da sentença recorrida consta o seguinte:
“FACTOS PROVADOS
Analisada a prova produzida, o Tribunal considera provada a seguinte factualidade:
A1. Factos da acusação
1. No dia 15 de Maio de 2016, às 18h00, iniciou-se, no complexo desportivo de Alcabideche, sito na Rua do Pombal, n.º 350, em Alcabideche, um jogo de futsal sénior entre as equipas do Estoril Praia e do Sporting União Fonte Santense.
2. O queixoso MG , que é árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol -, foi nomeado como árbitro principal do referido jogo, sendo auxiliado por TS , como 2.° (segundo) árbitro, e por FAA, como cronometrista.
3. No decurso da primeira parte do aludido jogo, estando a equipa do Estoril Praia a vencer por 4 (quatro) a 0 (zero) a equipa do Fonte Santense, o Arguido CA, jogador da equipa do Fonte Santense, por ter ficado desagradado com uma decisão do árbitro MG , aproximou-se do mesmo e disse-lhe: «Foda-se, Caralho».
4. O ofendido MG , ao ouvir tais expressões, decidiu admoestar o arguido com a exibição do cartão vermelho, expulsando-o do jogo.
5. Então, o arguido CA, ainda mais desagradado com a atitude do árbitro, disse-lhe, em voz alta e com foros de seriedade, «filho da puta, vai para o caralho» e cuspiu na sua direção, embora não o tenha atingido.
6. De seguida, e de forma não concretamente apurada, o arguido CA abandonou o recinto de jogo.
7. Enquanto os outros jogadores da equipa do Sporting União Fonte Santense tentavam serenar os ânimos, o arguido FA , dirigindo-se a MG , disse-lhe, em voz alta, «filho da puta, vai para o caralho, vou-te foder».
8. Também nesse momento, o arguido DR , dirigindo-se a MG , disse-lhe, em voz alta: «filhos da puta», ao mesmo tempo que arremessou uma garrafa de água na direção daquele, que não chegou a atingi-lo.
9. Perante tal comportamento dos arguidos FA  e DR , o árbitro MG admoestou-os com o cartão vermelho, expulsando-os do jogo.
10. Então, o arguido FA  dirigiu-se ao queixoso MG , em passo de corrida, e, ao chegar junto daquele, saltou para o ar e desferiu um pontapé, que atingiu o queixoso no abdómen, ao nível da fossa ilíaca direita.
11. Nessa sequência, os militares da GNR que ali se encontravam intervieram, afastando o arguido FA  do queixoso MG , que de imediato pôs termo ao jogo, após o que se deslocou ao Hospital de Cascais.
12. Em consequência direta e necessária da conduta do arguido FA , o queixoso MG sofreu dores.
13. O arguido CA agiu deliberada, livre e conscientemente, querendo, ao agir da forma supra descrita em 5. (proferindo as expressões "filho da puta", "vai para o caralho"), ofender MG na sua honra e consideração, o que conseguiu, bem sabendo que o mesmo era árbitro desportivo sob a jurisdição de federação desportiva e que se encontrava no exercício das suas funções.
14. O arguido DR  agiu deliberada, livre e conscientemente, querendo, ao agir da forma supra descrita em 8. (proferindo a expressão «filhos da puta»), ofender MG na sua honra e consideração, o que conseguiu, bem sabendo que o mesmo era árbitro desportivo sob a jurisdição de federação desportiva e que se encontrava no exercício das suas funções.
15. O arguido DR  agiu deliberada, livre e conscientemente, querendo, ao agir da forma supra descrita em 8., provocar lesões no corpo e na saúde de MG , bem sabendo que o mesmo era árbitro desportivo sob a jurisdição de federação desportiva e que se encontrava no exercício das suas funções, o que apenas não conseguiu por razões alheias à sua vontade.
16. O arguido FA  agiu deliberada, livre e conscientemente, querendo, ao agir da forma supra descrita em 7. (proferindo as expressões "filho da puta", "vai para o caralho"), ofender MG na sua honra e consideração, o que conseguiu, bem sabendo que o mesmo era árbitro desportivo sob a jurisdição de federação desportiva e que se encontrava no exercício das suas funções.
17. O arguido FA  agiu deliberada, livre e conscientemente, querendo, ao agir da forma supra descrita em 10., provocar lesões no corpo e na saúde do queixoso MG , o que conseguiu, bem sabendo que o mesmo era árbitro desportivo sob a jurisdição de federação desportiva e que se encontrava no exercício das suas funções.
18. Os arguidos CA, DR  e FA  sabiam que as suas condutas eram e são proibidas e punidas por lei penal.
A2. Factos relativos aos pedidos de indemnização civil
19. Como consequência direta dos factos acima elencados, MG sentiu medo e receio pela sua integridade física.
20. Sentiu-se triste, deprimido, publicamente humilhado e vexado,
21. Inseguro e com medo de, nos meses seguintes, arbitrar outros jogos de futsal.
22. Na sequência do referido em 10 e 11 dos factos provados, o ofendido MG recebeu assistência hospitalar no serviço de urgência do Hospital de Cascais,
23. E foram-lhe prestados tratamentos hospitalares no valor de 85,91€ por aquela entidade hospitalar.
A3. Factos relativos às condições pessoais dos Arguidos
24. O Arguido FA  estuda num curso de sistemas do IEFP, com equivalência ao 12.º ano.
25. Recebe, por frequentar esse curso, a quantia de 280,00€ mensais.
26. Vive com a mãe, pai e irmão, em casa daqueles
27. E contribui com a quantia mensal de 50,00€ para as despesas de casa.
28. Não tem outras despesas ou encargos fixos.
29. O Arguido FA  mostrou arrependimento.
30. O Arguido CA tem o 9.º ano de escolaridade.
31. Trabalha num restaurante, recebendo o rendimento mensal mínimo garantido (600,00€).
32. Vive com a companheira e com a filha de ambos, de 3 anos de idade, numa casa dos pais daquela, contribuindo com 230,00€ mensais para as despesas domésticas e de condomínio.
33. Tem um filho com 6 anos de idade, para o sustento do qual contribui com 100,00€ mensais, dividindo com a progenitora do mesmo as despesas escolares.
34. Paga 250,00€ por mês a título de prestação de um crédito pessoal
35. E 58,00€ no âmbito de um plano de regularização de dívida à Segurança Social.
36. O Arguido DR  tem o 9.º ano de escolaridade.
37. Trabalha na junta de freguesia de Alcântara e ganha 830,00€ mensais.
38. Vive com os pais e com dois irmãos, em casa dos primeiros, contribuindo com 250,00€ mensais para as despesas domésticas e pagando as telecomunicações, no valor de 79,00€.
39. Tem um filho de 3 anos, para o sustento do qual contribui com 150,00€ mensais.
40. O Arguido CA não tem qualquer condenação averbada no seu registo criminal.
41. O Arguido FA  não tem qualquer condenação averbada no seu registo criminal.
42. O Arguido DR  não tem qualquer condenação averbada no seu registo criminal.
B) FACTOS NÃO PROVADOS:
a) Que o jogo referido em 1 dos factos provados tenha decorrido entre as 18h00 e as 20h00
b) Que no momento referido em 5 dos factos provados o Arguido CA  tenha dito a MG «eu mato-te».
c) Que, ao ouvir tal afirmação, o árbitro MG tenha sentido receio e inquietação, acreditando que o arguido CA viesse a cumprir o mal prometido.
d) Que o Arguido CA tenha sido rodeado pelos restantes jogadores da equipa do Sporting União Fonte Santense, que o fizeram cessar a sua conduta e o retiraram do recinto de jogo.
e) Que o Arguido DR  tenha dirigido a expressão referida em 8 a TS e que tenha arremessado a garrafa de água referida naquele ponto dos factos provados também na direção desta.
f) Que o arguido CA tenha agido de forma livre, deliberada, e consciente, querendo proferir a expressão referida em b) dos factos não provados, e que soubesse que a mesma era adequada a produzir receio, medo e inquietação ao ofendido, prejudicando-lhe a sua liberdade de determinação.
g) Que o arguido DR  tenha querido, com a conduta descrita em 8 dos factos provados, provocar lesões no corpo e na saúde de TS .
h) Que o ofendido MG tenha sentido receio pela sua vida.
C) FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO:
(…)
As questões suscitadas nos recursos interpostos, a extrair das conclusões formuladas nos mesmos, são as seguintes:
1. Pelo recorrente CA:
- Se as expressões verbalizadas, inseridas nos factos provados 3 e 5, integram o tipo objectivo e subjectivo do crime de injuria;
- Se se encontra preenchida a qualificativa do tipo de ilícito injuria;
- Se a medida da pena aplicada se mostra excessiva;
- Se o montante indemnizatório fixado na condenação no pedido cível se mostra excessivo.
2. Pelo recorrente DR :
- Se os factos provados 2, 8, 14 e 18 se mostram correctamente fixados face à prova produzida;
- Se se encontra preenchida a qualificativa do tipo legal do crime de ofensa à integridade física;
- Se se mostra exercido o direito de queixa pelo ofendido;
- Se as penas em que foi condenado se mostram gravosas e desproporcionadas.
3. Pelo recorrente FA :
- Se os factos provados 2, 16 a 18 se mostram correctamente fixados face à prova produzida
- Se se encontra preenchida a qualificativa do tipo de ilícito injuria;
- Se se encontra preenchida a qualificativa do tipo legal do crime de ofensa à integridade física;
- Se a medida das penas em que foi condenado se mostram gravosas e desproporcionadas;
- Se lhe deveria ser aplicada a pena substitutiva de prestação de trabalho a favor da comunidade.
Passando a apreciar.
Recurso do arguido CA:
A primeira das questões suscitadas mostra-se dirigida à subsunção jurídica dos factos provados 3 e 5 no sentido de saber se as expressões verbalizadas pelo arguido, ali inseridas, são susceptíveis de integrar o tipo objectivo e subjectivo do crime de injúria pelo qual veio a ser condenado.
Não negando o recorrente que verbalizou tais expressões, cita o recorrente em apoio da sua tese diversa jurisprudência de que aquelas expressões - «Foda-se, Caralho» e «filho da puta, vai para o caralho», aquela primeira, dirigida ao árbitro, dita depois de se aproximar do mesmo e, a segunda, dirigida ao mesmo, dita em voz alta e com foros de seriedade sendo ainda acompanhada de uma cuspidela visando tal destinatário – não têm dignidade penal em termos de as expressões atribuídas ao Recorrente, não obstante ferirem as regras de boa-educação e civismo socialmente exigíveis, não são susceptíveis de ofender a honra e consideração do Demandante, porque com tais expressões não foi atingido o núcleo essencial de qualidades morais do Demandante.
No aspecto da relevância penal das expressões em causa manifestou o tribunal o seguinte entendimento:
“No que tange ao crime de injúria, a sua tipificação criminal, como o evidencia a respetiva inserção sistemática, visa a defesa do bem jurídico honra e consideração, entendendo-se como tal a pretensão de respeito que cada um tem, inerente à sua qualidade e dignidade de pessoa, por um lado, e à sua reputação exterior (enquanto opinião objetiva sobre as suas qualidades morais e sociais), por outro.
A proteção jurídico-penal deste bem jurídico funda-se na previsão constitucional do direito ao bom nome e reputação, previsto no artigo 26.º, n.º 1, da nossa Lei Fundamental.
A conduta objetiva típica consiste na imputação de factos a outrem, mesmo sob a forma de suspeita, ou na prolação de palavras, que, em qualquer dos casos, sejam ofensivos da honra ou consideração do visado.
Na interpretação da forma de realização do tipo que interessará particularmente à análise do caso concreto, qual seja a densificação do conceito de «palavras ofensivas da honra ou consideração do visado» caberá afastar uma qualquer exegese que sufrague uma ideia de dolus in re ipsa, de onde resulta, pois, que mesmo as palavras obscenas não são, per se, ofensivas, cabendo sempre analisar o contexto em que são usadas que poderá revelar diferentes intencionalidades.
Todavia, em determinados contextos, de cariz público, uma palavra de índole obscena (vulgo «palavrão»), dirigida a alguém, independentemente do contexto sociocultural do agente e do visado, ou do tipo de linguajar habitual de cada um, será sempre ofensiva da honra e consideração deste último.
Na norma do artigo 184.º do Código Penal, as consequências jurídico-penais da conduta injuriosa são agravadas sempre que o alvo do comportamento típico seja uma das pessoas referidas no artigo 132.º, n.º 2, alínea l), do Código Penal (designadamente, e no que para o caso releva, árbitro desportivo sob a jurisdição das federações desportivas) e o ilícito base seja cometido enquanto a vítima está no exercício das suas funções ou por causa das mesmas.
Assim, neste tipo legal de crime agravado, a honra, reputação e consideração protegidas pela norma do artigo 181.º, n.º 1, do Código Penal são protegidas de forma qualificada face ao estatuto funcional da vítima cuja ofensa no exercício de funções, como se compreende, representa um maior desvalor para a ordem de bens jurídicos da comunidade.
Tem sido entendido pela Doutrina e pela Jurisprudência (pelo menos maioritária) que para que opere o agravamento da injúria não se torna também necessária a «especial censurabilidade ou perversidade» prevista no artigo 132.º, n.º 1, do Código Penal, número para o qual, efetivamente, o artigo 184 do Código Penal não remete.
Quanto ao tipo subjetivo, o crime em causa é doloso, admitindo qualquer modalidade de dolo, incluindo eventual, pelo que bastará que o agente admita o teor ofensivo da imputação ou palavra e atue conformando-se com ele, sendo pacífico que não é exigível um qualquer dolo específico traduzido num putativo propósito especial de atingir o visado na sua honra e consideração (um animus injuriandi).
*
Da subsunção do comportamento apurado dos três Arguidos resulta que os três, no contexto de jogo oficial de futsal que se apurou, dirigiram a MG , 1.º árbitro em exercício de funções e por causa das decisões por ele tomadas no decurso do jogo, expressões objetivamente ofensivas da sua honra e consideração (vulgar e apropriadamente designadas de «impropérios» ou «palavrões»).
Concreta e individualmente, apurou-se que CA se dirigiu a MG dizendo as expressões elencadas em 5 dos factos provados («filho da puta, vai para o caralho»), tendo ainda cuspido na sua direção (atuação suscetível de configurar a prática um crime de injúria ); que FA  lhe disse «filho da puta, vai para o caralho, vou-te foder» (cf. facto provado n.º 7) e que DR  disse ao lesado «filhos da puta» (cf. facto provado n.º 8).
Ora, como bem se observa no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12-09-2019 (citado pela Defesa do Arguido FA  nas suas alegações) o Direito Penal reveste uma natureza de ultima ratio, sendo conformado por princípios de intervenção mínima e proporcionalidade, pelo que só deverá interferir na correção dos comportamentos que ponham em causa bens jurídicos essenciais e fundamentais, e na medida em que a ofensa a tais bens seja suficientemente gravosa para invocar o arsenal de reação próprio deste ramo do Direito.
Por este motivo se entende que nem todas as palavras grosseiras ou mal-educadas integrarão os tipos criminais que protegem a honra, não cabendo ao Direito Penal intervir em todas as situações de desconsideração pessoal, embaraço ou humilhação que melindrem o seu alvo.
A aplicação do tipo exige, assim, uma especial análise do caso concreto, do contexto e intencionalidade em que as palavras são ditas, para determinar se têm intensidade suficiente e/ou se as circunstâncias em que foram utilizadas conduziram a que atingissem a pessoa visada em moldes que mereçam a tutela penal.
Assim, caberá analisar se e em que medida a circunstância de tais expressões objetivamente soezes serem utilizadas em contexto de competições desportivas (designadamente futebolísticas) lhes retira o caráter ofensivo que, à partida, lhes é inerente.
Com efeito, é público e notório e decorrência do sentir social que «… em contexto de prática desportiva (de futebol), existe alguma tolerância social para uma certa margem de aspereza de linguagem. E estes excessos de linguagem têm de conviver, logicamente, com um correspondente poder de encaixe por parte de quem frequenta esses mesmos espaços e lugares. Assim, e de acordo com os princípios da fragmentariedade, da intervenção mínima e da proporcionalidade do direito penal, mas também da insignificância e da adequação social, resulta que determinados comportamentos “insultuosos” em contexto de prática de futebol possam não contrariar o sentido social de valor contido no tipo da injúria (ou da difamação) e, por isso, possam não realizar materialmente crime (embora formalmente o possam preencher).»
Sucede porém que a circunstância de, no ambiente de um jogo de futebol, se ouvir linguagem grosseira ou obscena, proferida por jogadores, espectadores ou elementos dos bancos de cada equipa, não é, por si só, suficiente para que qualquer tipo de expressão dirigida a outrem se considere socialmente adequada e, como tal penalmente insignificante, ou para que se considere que há por parte de todos os participantes em tais atividades desportivas uma espécie de aceitação tácita de potenciais ofensas.
É que, como bem expressaram as testemunhas TS e TF, naquilo que é a expressão do sentimento que se entende ser generalizado no contexto da nossa sociedade, uma coisa são os desabafos entre jogadores ou para si mesmos, ou mesmo as ofensas vindas das bancadas de adeptos, que, quantas vezes as lançam, sem sequer conhecer o nome ou ver a facies do árbitro, numa pessoalização da decisão, objeto último de uma crítica veemente e apaixonada de quem vive as competições desportivas com grande emoção.
Outra realidade completamente diferente e incomparável é a das situações em que tais expressões brotam de um jogador que - conhecendo o árbitro, sabendo quem é, sendo seu interlocutor no campo de jogo, tendo a responsabilidade de ser um dos protagonistas de um espetáculo que se pretende aproximador e até familiar - o ofende de forma absolutamente direta e pessoalizada, com palavras ou cuspindo-lhe, mas «olhando-o nos olhos».
Esse tipo de ofensa ultrapassa qualquer esfera (por mais liberal e permissiva que seja) de adequação social, não podendo a eventual repetição estatística destas situações ser interpretada como uma normalidade normativa. Nas palavras do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 20-12-2018 «O direito penal não tem de “aceitar” uma propalada normalidade (seria um “ser” a ditar o “dever ser”), a qual, mesmo a existir, traduziria uma normalidade “estatística” e nunca “valorativa”. Trata-se, aqui, de uma conduta censurável, devendo antes o direito penal ser claro nessa censura, assegurando a tutela do bem jurídico.».
Como é por demais evidente, os árbitros têm que ser livres na tomada das suas decisões, para que as competições desportivas (onde para além da vitória moral estão tantas vezes em causa ganhos económicos para clubes e atletas) sejam o resultado do esforço honesto das equipas e da propalada «verdade desportiva» e não de decisões coartadas na sua imparcialidade e retidão.
Garantir a imparcialidade do decisor das partidas passa por lhe dar a necessária segurança para que possa decidir sem medo de ser ofendido ou desconsiderado, e por isso a ordem jurídica tem de reagir mais ativamente quando essa segurança, garante da boa decisão, é posta em causa.
Em suma e em face do que antecede, o Tribunal não tem dúvidas em enquadrar as expressões e gestos dos Arguidos para com o ofendido que se apuraram, no conceito de ofensas da honra e consideração do mesmo e, por esse motivo, considerar preenchidos os elementos objetivos do crime de injúria agravada.”
Com o devido respeito pela tese seguida pelo recorrente e independentemente de estarmos perante uma situação em que os intervenientes em confronto são membros da “tribo do futebol”, não podemos deixar de considerar que, não tanto pelo contexto em que as verbalizações são proferidas de desagrado e contestação pelas decisões do árbitro ou de decepção pela situação de se encontrar em desvantagem no resultado do jogo que se encontrava disputar, o modo como as expressões referidas no facto provado 5 foram ditas ao destinatário – olhos nos olhos, como se refere na sentença recorrida, e acompanhadas de uma cuspidela visando o mesmo destinatário - a carga ofensiva se mostra muito para lá do que se possa entender como um mero verbalizar de toda a frustração que o arguido poderia sentir. Na verdade, a atribuição do epíteto de filho da puta, dizendo-lho na cara e em voz alta, ao árbitro do encontro, enquanto interveniente no espectáculo com responsabilidades acrescidas pela tomada de decisões que nem sempre merecerão o acordo dos demais intervenientes ou espectadores com a leitura que fazem do desenrolar do jogo e das jogadas, não deixa de trazer uma inerente desvalorização da sua pessoa enquanto ser humano e decisor do espectáculo desportivo e, assim, atingir o mesmo na sua personalidade.
Admitir, como o recorrente pretende com a invocação da jurisprudência que entendeu ter como relevante, que no espectáculo desportivo e na “tribo do futebol” tudo é permitido e pode ser dito significa tão só que se criam ilhas de impunidade onde o direito não intervém e as pessoas, mormente os intervenientes directos, não têm personalidade, honra ou estima que importe proteger.
De resto e no caso concreto de que nos ocupamos podemos relevar a primeira das expressões verbalizadas – facto 3 – como sendo uma descarga de frustração por ter ficado desagradado com uma decisão do árbitro MG , já a segunda, na medida em que como proferida em retaliação da exibição do cartão vermelho e consequente expulsão do jogo, retaliação essa dirigida à pessoa concreta do árbitro, terá sempre, na nossa perspectiva, dignidade penal enquanto elemento objectivo do tipo de ilícito com que o arguido se mostra responsabilizado.
Na verdade e por contraposição à jurisprudência que o recorrente cita, trazemos a esta discussão o teor do acórdão da Relação de Guimarães de 3.11.2014, disponível em www.gde.mj.pt que na sua argumentação discorreu:
“… num contexto de desavença, e dirigida ao ofendido a expressão «filho da puta», o arguido atingiu «o património pessoal» deste, enxovalhando-o e humilhando-o como pessoa, sabido que tal expressão comporta uma carga pejorativa para a comunidade em geral por se lhe atribuir o significado de que a mãe do visado não se porta bem e que ele (visado) nem sabe quem é o pai.
É certo que o recorrente argumenta que a expressão em causa «resultou do estado de espírito que dominava o arguido e que em desabafo corrente de um minhoto, a expressão saiu-lhe com o hábito, que podemos criticar a linguagem, mas ela não exprime e carrega consigo o peso de ofensa, não se podendo invocar o facto de o assistente, por tal expressão, ter sido injuriado».
Ora, a propósito de tal argumentação, não podemos deixar de chamar à colação a notável lição de Faria Costa, constante a fls 630/631, do Tomo I, do Comentário Conimbricense do Código Penal.
Escreve este autor:
“Observe-se, antes de outras apreciações posteriores, que temos para nós, mesmo quanto perante palavras comunitariamente tidas como obscenas ou soezes, não ser possível defender uma qualquer compreensão sustentadas na ideia de um dolus in re ipsa. Consideramos que o significado das palavras, quando mais nos movemos no mundo da razão prática, tem um valor de uso. Valor que se aprecia, justamente, no contexto situacional, e que ao deixar intocado o significante ganha ou adquire intencionalidades bem diversas, no momento em que apreciamos o significado. Todavia, defender-se a posição doutrinária que se acaba de enunciar, não quer significar, nem por sombras, que não haja palavras cujo sentido primeiro e último seja tido, por toda a comunidade falante, como ofensivo da honra e consideração. Na verdade, se, em uma reunião pública, mesmo que restrita, um dos intervenientes (A) chama a outro (B) “cabrão” ou outro epíteto de igual jaez, é evidente que não tem sentido invocar o facto de, no contexto sócio-cultural de A, aquela palavra não ter a carga pejorativa que normalmente se lhe atribui. Sem dúvida que pode não ter a significação ofensiva naquele contexto. Só que a palavra foi proferida em um outro quadro situacional da vivência humana e nesse, dúvidas não há: ela exprime e carrega consigo um indesmentível desvalor objectivamente ofensivo. No entanto, coisa bem diversa é a observação da utilização quotidiana de uma linguagem desbragada – por exemplo, no seio da família ou só entre os cônjuges -, e depois vir defender-se que a palavra ou as palavras obscenas, milhares de vezes anteriormente empregadas, foram ofensivas da honra de quem delas foi objecto. Vale por afirmar: se A empregou durante anos a fio uma linguagem sustentada em bordões sugestivos de obscenidades e se aceitou também durante esse tempo, comunicar, recebendo sempre no diálogo a mesma carga de ofensividade, é evidente que não pode em um determinado e posterior momento vir invocar o facto de ter sido injuriado. O contexto sócio-cultural que A ajudou a construir e onde o facto tido por injurioso teve lugar que se não possa sustentar o sentido ofensivo daquela ou daquelas obscenidades. Admitir a relevância do facto ofensivo por último referido seria descontextualizá-lo de maneira insustentável e seria mesmo, em bom rigor, sufragar a aceitação da concretização de insustentável admissibilidade de um venire contra factum proprium.».
Pois bem, presente este ensinamento é evidente que chamar «filho da puta» a outrem é dirigir-lhe uma expressão obscena ou soez, com uma carga manifestamente injuriosa.”
Já por relação ao elemento subjectivo, sendo certo que as expressões foram proferidas durante um confronto, face à decisão do ofendido em “punir” o recorrente com um cartão vermelho e a consequente expulsão do jogo, desse facto apenas é possível concluir que quem as proferiu não poderia deixar de visar igualmente a sua honra. É isso que indica as «regras da experiência comum».
Concordamos, por esta via, com a posição assumida na sentença recorrida quanto ao preenchimento do tipo objectivo e subjectivo do ilícito em questão.
A segunda das questões suscitadas pelo recorrente dirige-se à qualificativa agravativa que a sentença entende por preenchida, quanto ao tipo do crime de injúria, constante do art.º 184º por referência à alínea l) do n.º 2 do artigo 132.º, ambos do Código Penal, no exercício das suas funções ou por causa delas.
Defende o recorrente que tal agravativa não se pode dar como verificada porquanto o agravamento do tipo de ilícito, de forma automática, não resulta da doutrina, nem da jurisprudência, citando alguma desta, tudo para concluir que se trataria de crime de injúrias simples, caso em que - tratando-se de crime particular - o procedimento ficaria dependente da prévia constituição como assistente (do Demandante) e da oportuna dedução da acusação particular, o que não sucedeu.
Deixando este último aspecto consequencial para posterior tratamento, vejamos o que o tribunal manifestou acerca da verificação da circunstância agravativa posta na questão: “Na norma do artigo 184.º do Código Penal, as consequências jurídico-penais da conduta injuriosa são agravadas sempre que o alvo do comportamento típico seja uma das pessoas referidas no artigo 132.º, n.º 2, alínea l), do Código Penal (designadamente, e no que para o caso releva, árbitro desportivo sob a jurisdição das federações desportivas) e o ilícito base seja cometido enquanto a vítima está no exercício das suas funções ou por causa das mesmas.
Assim, neste tipo legal de crime agravado, a honra, reputação e consideração protegidas pela norma do artigo 181.º, n.º 1, do Código Penal são protegidas de forma qualificada face ao estatuto funcional da vítima cuja ofensa no exercício de funções, como se compreende, representa um maior desvalor para a ordem de bens jurídicos da comunidade.
Tem sido entendido pela Doutrina e pela Jurisprudência (pelo menos maioritária) que para que opere o agravamento da injúria não se torna também necessária a «especial censurabilidade ou perversidade» prevista no artigo 132.º, n.º 1, do Código Penal, número para o qual, efetivamente, o artigo 184 do Código Penal não remete.”.
Se o acento tónico dado pelo recorrente se mostra dirigida apenas quanto à consideração, melhor dizendo, à necessidade de afirmação e demonstração de que a conduta do recorrente revelava “especial censurabilidade ou perversidade” referida no n.º 1 do art.º 132º CP, certo é que a remissão expressamente feita pelo art.º 184º CP se mostra directamente feita para a qualidade da vítima “referidas na alínea l) do n.º 2 do artigo 132.º”, embora acompanhada da exigência relacional com o “exercício das suas funções ou por causa delas”. Dessa remissão directa resulta que o tipo legal do crime de injúria agravada, do art.º 181º e 184º, do CP, não exige que a conduta típica revele “especial censurabilidade ou perversidade”, como esclarecidamente se mostra decidido no ac. Relação do Porto de 18/04/2012, disponível em www.gde.mj.pt.
Nenhuma censura merece pois a sentença no aspecto da integração jurídica dos factos.
E dada a inalterada subsunção jurídica dos factos provados no tipo legal do crime de injuria agravada como acima se decidiu, as questões relativas ao exercício do direito de queixa, pedido de constituição do ofendido como assistente e necessidade de acusação particular trazidas ao recurso na conclusão X mostram-se prejudicadas, bastando-se, atenta a natureza semipública do crime com que o arguido se mostra confrontado no presente procedimento, a existência de queixa ou a participação para assegurar a legitimidade do M.º P.º para a prossecução da acção penal como claramente decorre do disposto no art.º 188 n.º 1 CP, queixa essa consubstanciada no auto de noticia de fls. 3 e seguintes dos autos.
Não assiste razão ao recorrente.
Insurge-se o recorrente quanto à medida da pena em que foi condenado, qualificando-a de excessiva na medida em que, alega, tendo sido pesadas a favor do Recorrente a sua “inserção familiar, responsabilidade que revela relativamente aos filhos e família e a sua inserção laboral", bem como a circunstância de não ter averbada qualquer condenação no registo criminal, as provadas condições pessoais do recorrente – com o 9° ano de escolaridade; trabalha num restaurante, auferindo o salário mensal de €600,00; vive com a companheira e com a filha de ambos, de 3 anos de idade, numa casa dos pais daquela, contribuindo com €230,00 mensais para as despesas domésticas e de condomínio; tem um filho com 6 anos de idade, para o sustento do qual contribui com 100,00€ mensais, dividindo com a progenitora do mesmo as despesas escolares; paga 250,00€ por mês a título de prestação de um crédito pessoal; paga 58,00€ no âmbito de um plano de regularização de dívida à Segurança Social – se mostraria suficiente, adequada e proporcional, a aplicação de pena no mínimo legal.
  O tribunal fundou do seguinte modo a medida da pena aplicada ao recorrente:
“… caberá escolher a pena aplicável aos crimes de injúria, uma vez que os mesmos são puníveis com multa ou prisão (cf. artigos 181.º, n.º 1 e 184.º do Código Penal).
Recorde-se que, nos termos do disposto no artigo 40.°, n.º 1, do Código Penal, as finalidades da punição consistem na prevenção geral, ou seja na necessidade de estabilização das expectativas comunitárias quanto à validade da norma violada e à tutela do bem jurídico lesado, e na prevenção especial, ou seja a necessidade de socialização que o Arguido demonstra. Não caberá, nesta primeira operação da determinação da pena, proceder a qualquer ponderação da culpa.
Nesta operação, tem-se entendido que o conteúdo mínimo desta escolha é o da prevenção geral positiva que atua como limite às exigências de prevenção especial e, em caso de conflito, sobre elas prevalece, pelo que haverá que garantir que a pena escolhida realiza de forma adequada e suficiente a finalidade de proteção do bem jurídico violado com a prática do crime. Só no caso de ambas as penas serem adequadas e suficientes a realizar as finalidades de prevenção geral, é que o tribunal poderá escolher a pena que melhor satisfará a finalidade de reintegração do agente na sociedade.
*
Olhando conjuntamente para a forma como os três Arguidos injuriaram o ofendido, dir-se-á que o contexto geral de gravidade é em tudo semelhante (um jogo do campeonato de futsal, em que os Arguidos usam as palavras obscenas que se deram por provadas como arma de retaliação relativamente às decisões que, legitimamente, o ofendido tomou na qualidade de árbitro que era da partida).
Ainda que seja possível encontrar diferentes intensidades no desvalor da conduta de cada Arguido (considerando-se que as injúrias perpetradas por CA são mais graves e acintosas porque acompanhadas de uma cuspidela, ao passo que as de DR  se resumem a uma única expressão, ficando a conduta injuriosa de FA  algures no meio do espectro de gravidade das três), no essencial, os três crimes revelam exigências médias de prevenção geral, na medida em que o alarme gerado pela sua conduta (dentro do tipo) é já relevante.
Contudo, valora-se positivamente:
(i) …
(ii) no caso de CA e DR , a sua inserção familiar, sendo que ambos são já pais, revelando-se fontes de sustento das respetivas famílias e cidadãos profissionalmente ativos e com autonomia financeira.
(iii) nenhum dos Arguidos tem averbadas condenações aos respetivos registos criminais.
Tudo ponderado, conclui-se que a aplicação de uma pena não privativa da liberdade realizará ainda de forma adequada e suficiente as necessidades de prevenção, razão pela qual se opta pela condenação de todos os Arguidos numa pena de multa, relativamente aos crimes de injúria agravada por que serão condenados.”, isto no tocante à opção por pena não privativa de liberdade, em cumprimento do disposto no art.º 70º CP.
E continuou o tribunal quanto à medida concreta:
“Estando determinado que aos Arguidos serão aplicadas penas de multa pelos crimes de injúria agravada, caberá determinar, dentro da respetiva moldura legal, a medida concreta da pena, tendo em consideração, nos termos do artigo 71.º, n.º 1, do Código Penal, as finalidades de prevenção que a infração criminal do arguido demanda – finalidades essas que, como resulta do disposto no artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal, são de prevenção geral e especial, mais concretamente, a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
Por outro lado, e também nos termos do artigo 71.º, n.º 1, do Código Penal, a pena não pode, em caso algum, ultrapassar a medida da culpa que, neste ponto, e como impressivamente refere Figueiredo Dias, tem uma função de «incondicional proibição de excesso» ao marcar «o limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações ou exigências preventivas».
Seguindo de perto a denominada teoria da «moldura da prevenção», dir-se-á que a medida concreta da pena haverá de ser encontrada numa espécie de submoldura (contida, claro está, dentro da moldura legal) que o julgador deverá obter para cada caso, de acordo com os circunstancialismos que o caracterizam.
Tal espectro é definido pelos critérios de prevenção geral, conhecendo como limite máximo a pena que seria ótima para o mais profundo cumprimento da necessidade de tutela dos bens jurídicos e como limite mínimo aquele abaixo do qual a pena deixaria de cumprir a função de tutela do bem jurídico violado, frustrando as expectativas mínimas da comunidade na manutenção da norma criminal violada.
O critério de prevenção especial de socialização atuará fixando, dentro da submoldura da prevenção geral, a medida concreta da pena, sendo certo que neste exercício haverá que considerar que a culpa concreta do agente é sempre limite inultrapassável da pena encontrada através do fiel da prevenção especial.
Feita esta exposição, e tendo presente que o crime de injúria agravada é punível com pena de multa de 15 a 180 dias (cf. artigo 47.º, n.º 1, 181.º, n.º 1 e 184.º, todos do Código Penal) caberá recolher nas circunstâncias do caso os fatores da medida da pena que o artigo 71.º, n.º 2, do Código Penal enuncia, tendo presente o princípio da proibição da dupla valoração ínsito no proémio deste normativo.
Vejamos:
*
No que concerne grau de ilicitude do facto, o mesmo é diferente para cada um dos Arguidos, na medida em que, como se adiantou já, a conduta de CA, por se fazer acompanhar do ato de cuspir ao ofendido, se revela de um maior desvalor e censurabilidade do que a dos restantes, sendo as ofensas de FA  mais graves do que as proferidas por DR .
Quanto ao modo de execução do crime, o mesmo reclama um agravamento da pena para todos os arguidos pois todos eles eram jogadores de uma equipa participante num torneio oficial, e dirigiram-se a um árbitro de futebol (a quem deviam particular respeito atenta a posição de interlocutores de jogo que relativamente ao mesmo ocupavam) num momento de tensão já instalada (pelas palavras iniciais de CA), provocando e promovendo o empolar da desordem que se instalara.
A conduta dos Arguidos não foi inconsequente, uma vez que conduziu a uma confusão que levaria à interrupção do jogo que a equipa dos Arguidos estava a perder, ainda na primeira parte, e deixou o ofendido, para além do mais, num estado de consternação e tristeza, e de relutância a continuar o exercício da atividade de árbitro.
O dolo de todos os Arguidos é direto e intenso.
No que concerne à personalidade dos Arguidos manifestada no facto caberá salientar que não se apuraram contendas anteriores que pudessem explicar a sua reação abruta e desajustada, tendo os impropérios que dirigiram ao árbitro (a quem deveriam mais respeito atenta a sua qualidade de jogadores federados) sido absolutamente gratuitos, movidos tão-somente por uma primária reação por estarem a perder e em face de um lance desfavorável.
A favor do Arguido FA  pendem a sua confissão integral e sem reservas, o seu arrependimento, a idade à data dos factos (apenas 20 anos) e a sua inserção familiar, educacional e social.
A favor de CA e DR  pesam a sua inserção familiar, responsabilidade que revelam relativamente aos filhos e famílias e sua inserção laboral.
A ausência de condenações nos registos criminais é ponderada favoravelmente para todos os Arguidos.
Tudo compulsado decide aplicar-se aos Arguidos, pela prática dos crimes de injúria agravada, penas entre o meio da moldura penal e os 2/3:
(i) ao Arguido CA, uma pena de 120 dias de multa;” (sublinhados nossos)
Ora, analisados os elementos que o tribunal pôs em campo para a fixação da medida da pena, podemos dizer que não só a fixação da pena em 2/3 do ponto máximo da respectiva moldura se mostra proporcional à culpa evidenciada pelo arguido na sua conduta, como também se mostra adequada à situação concreta vivenciada, em termos de consequências, na pessoa do ofendido e no espectáculo desportivo em que foram cometidos os factos.
Por outro lado, e agora já no aspecto da fixação da taxa diária de multa, o tribunal encontrou-a com os seguintes argumentos:
“Nos termos do artigo 47.º, n.º 2, do Código Penal, o montante diário da multa deverá ser determinado numa quantia entre 5€ e 500€, que o tribunal fixará de acordo com a situação económica e financeira do condenado e seus encargos pessoais.

O Arguido CA tem um rendimento mais modesto e despesas fixas mais elevadas do que o Arguido DR .
Feita a ponderação, absoluta e relativa, das condições de cada um dos Arguidos, fixa-se o quantitativo diário:
i) para o Arguido CA, nos 7,00€;”
Segundo o art. 47.º, n.º 1, a pena de multa será “… fixada em dias, de acordo com os critérios estabelecidos no art. 71.º, …”, em que, com base no subsequente n.º 2 “Cada dia de multa corresponde a uma quantia entre € 5 e € 500, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais”.
Naquele art. 71.º, que fixa os demais critérios legais para a determinação judicial da pena, estabelece-se, numa primeira fase, que a pena seja encontrada em função da culpa do arguido e das exigências de prevenção, atendendo ainda, numa segunda fase, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, rodearam o mesmo, antes ou depois do seu cometimento, quer resultem a favor ou contra o agente.
Assim, na determinação judicial da pena de multa temos uma primeira ponderação dos dias de multa, responsabilizando-se o agente em função do bem jurídico a proteger, proporcional à sua culpa, temperada por necessidades de prevenção especial e geral.
Passando depois para a aferição desse quantitativo diário, temos uma segunda ponderação de cariz essencialmente económica, que deve não só ter em conta os rendimentos mensais do arguido, sejam eles próprios ou do que o mesmo beneficie, mas toda a sua situação financeira, designadamente o património que se lhe apresente disponível e os seus encargos.
Neste apuramento deve-se atender igualmente que a multa é uma verdadeira reacção criminal de índole económica, não sendo nem “um crédito jurídico-público a favor do Estado”, sendo, por isso, insusceptível de compensação ou de transmissão contratual ou sucessória, face à sua natureza estritamente pessoal, nem um laxante com repercussões económicas, pelo que a sua aplicação deve ser submetida a critérios de igualdade de sacrifícios e ónus, originando uma agravação da situação económica do condenado.
No que concerne aos encargos e perante o mesmo princípio da igualdade de ónus e sacrifícios, deverá fazer-se uma avaliação diferenciada dos mesmos, distinguindo-se aqueles que revelam custos indispensáveis para a sustentação do condenado e dos seus familiares dependentes, os quais devem ser deduzidos no rendimento, daqueles que revelam alguma prodigalidade ou luxúria e que não devem beneficiar da mesma ponderação dedutiva, antes pelo contrário.
Tudo isto leva a que se reservem os quantitativos mínimos para aquelas pessoas que vivem abaixo ou no limiar da subsistência, designadamente por carência de rendimentos próprios ou de quaisquer outros, escalonando-se a partir daí todos os demais.
No que concerne ao quantitativo diário, temos de ponderar que o arguido aufere um rendimento decorrente do seu salário que, face às despesas cujo pagamento enfrenta matematicamente se mostra insuficiente em pelo menos 58 euros.
Ora se para quem não tem proventos ou para quem tem rendimentos para que possa beneficiar do rendimento social de inserção se mostra proporcional uma taxa diária a partir dos € 5 e se para quem aufere uma retribuição mensal superior ao salário mínimo, como é o caso do recorrente, não vemos como possa ser inferior à taxa diária de € 7, a que foi sentenciado.
Na realidade, a aplicação dessa pena com a expressão pecuniária que tem não pode deixar de constituir para o condenado num concreto e real sacrifício. 
Tais fundamentos de recurso, são por isso, de improceder.
Finalmente, insurge-se o recorrente quanto ao montante indemnizatório em cujo pagamento foi condenado, argumentando que tal pedido de indemnização civil formulado pelo demandante tinha por base a prática dos factos que lhe eram imputados na acusação de 2 crimes - ameaça e injúria agravada – e que no mesmo o demandante alegava, entre outras coisas, ter temido pela sua vida.
Ora, tendo sido o recorrente absolvido da prática do crime de ameaça de que vinha acusado, a condenação na totalidade do pedido não só não é juridicamente defensável, como é injusta, propugnando que, quanto muito, haveria justificação para que Recorrente fosse condenado em metade do pedido contra si peticionado.
Conforme dispõe o art.º 400º n.º 2 CPP, “Sem prejuízo do disposto nos artigos 427.º e 432.º, o recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil só é admissível desde que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade desta alçada.”
Encontrando-se a alçada do tribunal da primeira instância fixada em € 5 000,00 por força do artigo 44.º n.º 1 da Lei da Organização do Sistema Judiciário (Lei n.º 62/2013 de 26-08-2013) e o montante do pedido de indemnização civil formulado contra o agora recorrente e em que decaiu se mostra inferior àquela alçada, nesta parte mostra-se o recurso de rejeita por inadmissível, o que se declara.
Decai, assim e na íntegra, o recurso do arguido CA.
Recurso do arguido DR .
 A primeira das questões suscitadas pelo recorrente diz respeito à matéria de facto provada descrita sob os n.ºs 2, 8, 14 e 18 argumentando, resumidamente, que a prova produzida em audiência não permite que aqueles factos sejam dados como provados, ou dados como provados na extensão em que se mostram consignados na sentença.
Assim, por ordem de inserção cronológica de tais factos, manifesta o recorrente que o ponto provado 2 [O queixoso MG , que é árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol -, foi nomeado como árbitro principal do referido jogo, sendo auxiliado por TS , como 2.° (segundo) árbitro, e por FAA, como cronometrista.] deveria ser limitado pois não se pode, atento o princípio da legalidade subjacente ao Direito Penal, inferir que o demandante é árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol. Invoca para tanto que na prova produzida acima por ele transcrita se verifica a ausência de qualquer referência ao órgão dirigente do futebol nacional e tal questão tem reflexo na qualificação dos crimes pelos quais veio a ser condenando.
Sendo certo que da prova transcrita pelo recorrente – depoimentos prestados pelas testemunhas TS  , FAA e TM , pelos arguidos e declarações do demandante civil - nenhuma referência existe quanto ao órgão máximo do futebol português (Federação Portuguesa de Futebol) a afirmação contida no facto não necessita de uma prova directa dessa referência pelos intervenientes na audiência, isto seja por relação à integração do demandante, enquanto árbitro, na Associação de Futebol de Lisboa seja quanto à relação de subordinação desta associação à federação mencionada.
Na realidade, retira-se do relatório de jogo de fls. 77 a 81 e 83 elaborado pelo ofendido/demandante que o mesmo era o árbitro nomeado para o evento desportivo (jogo de futsal sénior entre as equipas do Estoril Praia e do Sporting União Fonte Santense) integrado no Campeonato Distrital da I Divisão de Honra, organizado pela mencionada Associação, sendo-lhe atribuído o código filiado n.º 110050 como resulta de fls. 78.
 Por sua vez, a subordinação da referida Associação na Federação Portuguesa de Futebol é do conhecimento geral, público e notório não necessitando de uma prova directa bastando-se uma consulta do site da Associação para a obtenção essa concreta informação e como resulta do respectivo estatuto – art.º 1º n.º 4.
Impugna ainda o recorrente o facto provado 8 [Também nesse momento, o arguido DR , dirigindo-se a MG , disse-lhe, em voz alta: «filhos da puta», ao mesmo tempo que arremessou uma garrafa de água na direção daquele, que não chegou a atingi-lo.] apelidando de insuficiente a prova para tal, trazendo para esta discussão toda a prova testemunha e declarativa produzida em audiência.
Da transcrição a que o recorrente se deu ao trabalho de fazer, limita-se o mesmo a pôr em confronto, de um lado, as suas próprias declarações – negando o arremesso da garrafa de água e atribuindo o mesmo a outro colega de equipa – e, do outro, a versão trazida pelo ofendido demandante que não teve dúvidas em relatar esse arremesso e na identificação do arguido como o seu autor.
Tal confronto mostra-se decidido na sentença recorrida pelo acolhimento da versão do ofendido com os seguintes argumentos: “No que concerne à matéria constante do ponto 8 dos factos provados, o Tribunal assentou a sua convicção nas declarações do próprio Arguido DR  (na parte em que assumiu ter dito «palavrões» e, em concreto, a expressão aí referida). Este Arguido não admitiu, contudo, que tivesse pretendido dirigir a expressão aos árbitros ou que tivesse arremessado a garrafa de água.
Contudo, a versão dos factos que DR  apresentou em Tribunal foi frontalmente contrariada quer pelas declarações do ofendido e pelo depoimento de FAA, quer pelo depoimento de TS , os quais confirmaram ter visto o arremesso da garrafa e, esta última, a utilização das expressões em causa dirigidas ao árbitro MG .
O sentido destes depoimentos é também corroborado pelo relatório de jogo, mais concretamente de fls. 83, onde resulta a expulsão deste jogador e o motivo da mesma.
Note-se que, não tendo resultado evidenciado dos depoimentos prestados a este propósito que os árbitros em causa sequer conhecessem DR de outras circunstâncias, não se alcança – à luz das regras de experiência e de juízos de normalidade – por que razão seria o mesmo (de entre os vários outros jogadores da equipa Fonte Santense) o escolhido para ser sancionado com cartão vermelho apesar de não estar a jogar, não fora a circunstância de ter tido os comportamentos em causa.”
Ora a postura do tribunal só revela que o facto provado se mostra assente em prova legalmente permitida e como decorrência da aplicação do princípio da livre apreciação da prova constante do art.º 127º CPP.
Em suma, a menção feita pelo ofendido e que se mostra reflectida no relatório do jogo pelos membros da equipa de arbitragem habilita o tribunal a formar a convicção do facto provado tal como o foi e não impõe decisão diversa da tomada.
Quanto aos factos provados 14 [O arguido DR  agiu deliberada, livre e conscientemente, querendo, ao agir da forma supra descrita em 8. (proferindo a expressão «filhos da puta»), ofender MG na sua honra e consideração, o que conseguiu, bem sabendo que o mesmo era árbitro desportivo sob a jurisdição de federação desportiva e que se encontrava no exercício das suas funções.] e 18 [Os arguidos CA, DR  e FA  sabiam que as suas condutas eram e são proibidas e punidas por lei penal] insurge-se o recorrente com a alegação de que a expressão “filhos da puta” dita no plural não tem a virtualidade de preencher o elemento objectivo do tipo ilícito aqui em causa, tal expressão revela que o recorrente agiu sem intenção de ofender a honra do demandante civil, apenas pretendendo expressar descontentamento perante o circunstancialismo em que se encontrava - confusão no jogo.
Admitimos que temos alguma dificuldade em conseguir compreender a linha de raciocínio do recorrente na medida em que o mesmo confessou a provada verbalização dirigida ao árbitro, tal como consta da fundamentação da convicção do tribunal, e não podia ignorar que estava perante o árbitro do encontro pois a reacção que teve deveu-se exactamente às decisões disciplinares, sobre o co-arguido CA, que o ofendido tomou nesse mesmo jogo.
Já tivemos oportunidade de nos referirmos à natureza injuriosa da expressão verbalizada pelo recorrente CA e cujo tratamento se aplica na íntegra à questão agora posta pelo recorrente, pelo que para essas considerações o remetemos.
Por relação ao elemento subjectivo ali inserido naqueles dois factos não podemos deixar de apontar ao recorrente que a melhor e mais evidente manifestação da consciência da capacidade ofensiva da expressão que dirigiu ao ofendido e da consciência de que o seu comportamento não é legalmente sustentável reside na génese da situação de confronto em que a mesma é proferida, decorrente da punição disciplinar que visou o co-arguido CA, pelo que é possível concluir que quem as proferiu não poderia deixar de visar igualmente a honra do árbitro destinatário, qualidade que o recorrente não podia ignoro face às funções e decisões que o ofendido desempenhou em campo, não havendo qualquer possibilidade de confusão com outro interveniente no espectáculo desportivo. Certamente que não foi para elogiar o seu trabalho e o comportamento do recorrente ultrapassa a reacção normal a um descontentamento que podia assaltar o recorrente.
O segundo aspecto que o recorrente apresenta como questão posta no recurso diz respeito à verificação ou preenchimento da qualificativa agravativa que a sentença declarou quanto ao crime de ofensa à integridade física, pretendendo o recorrente que a integração jurídica desses factos se fique pelo crime de ofensa à integridade física simples, tanto mais que, na sua perspectiva, não resultou provada a integralidade da qualidade - árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa - subordinada à Federação Portuguesa de Futebol - do demandante civil invocada em sede de acusação por manifesta insuficiência da prova produzida neste sentido.
Já nos pronunciámos acerca dessa concreta factualidade em termos de demonstrarmos que essa qualidade assiste ao ofendido, seja por relação prova documental extraída do relatório do jogo, mais especificamente de fls. 78, canto inferior esquerdo onde consta a vinheta identificativa, como das declarações das testemunhas integrantes da equipa de arbitragem. De resto, a qualidade de árbitro, em razão das funções que perante o recomente o ofendido desempenhou em campo, não pode deixar de ser tida como sendo do conhecimento do recorrente; só assim se compreende a sua reacção à decisão de punição com cartão vermelho do seu colega de equipa e co-arguido CA.
A qualificação do crime de ofensa à integridade física, na construção dos art.ºs 143º, 145º n.ºs 1 al. a) e 2 e 132.º n.ºs 1 e 2 al. l) do CP, assenta num juízo de especial censurabilidade ou perversidade sobre a conduta do agente, constituindo os exemplos-padrão descritos no n.º 2 do artigo indício dessa culpa agravada. A comprovação, no facto, de circunstâncias que preenchem um dos exemplos-padrão tem um efeito de indício da especial censurabilidade ou perversidade, como sucede no caso face à qualidade funcional do ofendido – árbitro sob a jurisdição das federações desportivas - na circunstância de modo e ambiente em que o comportamento do recorrente foi adoptado por este.
De resto, a sentença recorrida manifestou-se no sentido dessa especial censurabilidade nos seguintes termos: “a atuação deste Arguido, no contexto que se apurou, se revela particularmente censurável, e, como tal, subsumível ao tipo por que vinha acusado, na medida em que DR  também atua em reação às decisões do ofendido MG e por causa de tais decisões, ciente de que no ambiente já vivenciado a sua atuação teria a virtualidade de ser centelha de inflamação dos ânimos contra quem se limitava a exercer as funções que lhe foram cometidas.”, pelo que não tem razão o recorrente quando afirma que a sentença recorrida não cuidou de confirmar se estava efectivamente preenchida a especial censurabilidade ou perversidade do agente.
Mostra-se em conclusão que a integração jurídica dos factos provados quanto ao crime de ofensa à integridade física qualificada, na forma tentada, se mostra correcta nada havendo a alterar nesse tocante.
Como consequência directa do que acabámos de referir mostra-se esvaziada de conteúdo a questão suscitada pelo recorrente acerca do concreto e necessário exercício do direito de queixa, da constituição de assistente por parte do visado, bem como da existência de uma acusação particular por parte do ofendido, pelo que se tem a mesma por prejudicada, bastando-se, atenta a natureza semipública do crime de injúria agravada e pública do crime de ofensa à integridade física qualificada com que o arguido se mostra confrontado no presente procedimento, a existência de queixa ou a participação para assegurar a legitimidade do M.º P.º para a prossecução da acção penal como claramente decorre do disposto no art.º 188º n.º 1 CP e 145º, este por confronto com o n.º 2 do art.º 143º todos do CP, queixa e participação consubstanciadas no auto de noticia de fls. 3 e seguintes dos autos.
Insurge-se ainda o recorrente quanto à medida das penas em que foi condenado, qualificando-as de gravosas e desproporcionadas com a alegação de que é primário e decorreram mais de 3 anos e meio sobre os factos aqui em causa, a moldura penal já se encontra elevada por força da agravação do artigo 132.°, n.º 2, alínea l), do CP e conclui que face às circunstâncias do recorrente, sempre seria suficiente, adequada e proporcional, a aplicação de pena situada no primeiro terço da moldura penal.
Neste aspecto das penas, o inconformismo do recorrente manifesta-se também apontado ao quantitativo diário da pena de multa que se mostra fixado na sentença – € 8,00 – pretendendo vê-lo reduzido para o mínimo legal, atentas as provadas às condições pessoais do recorrente:
“36. O arguido DR  tem o 9.° ano de escolaridade.
37. Trabalha na Junta de Freguesia de Alcântara e ganha 830,00€ mensais.
38. Vive com os pais e com 2 irmãos, em casa dos primeiros, contribuindo com 250,00€ mensais para as despesas domésticas e pagando as telecomunicações, no valor de 79,00€.
39. Tem um filho de 3 anos, para o sustento do qual contribui com 150,00€ mensais.”.
Já anteriormente nos pronunciámos quanto ao modo e argumentação com que o tribunal determinou as medidas concretas das penas, sendo de ressaltar, por especifico do montante diário da multa ao recorrente DR , a referência concreta a:
“A favor de CA e DR  pesam a sua inserção familiar, responsabilidade que revelam relativamente aos filhos e famílias e sua inserção laboral.
A ausência de condenações nos registos criminais é ponderada favoravelmente para todos os Arguidos.”
 “ … pela prática dos crimes de injúria agravada, penas entre o meio da moldura penal e os 2/3:

(iii) ao Arguido DR , uma pena de 100 dias de multa;”
Nos termos do artigo 47.º, n.º 2, do Código Penal, o montante diário da multa deverá ser determinado numa quantia entre 5€ e 500€, que o tribunal fixará de acordo com a situação económica e financeira do condenado e seus encargos pessoais.
No que ao Arguido FA  concerne, este aufere um baixo rendimento, vivendo em casa dos pais e com a ajuda destes. Contudo, contrariamente aos restantes Arguidos, não tem dependentes nem as despesas inerentes.
O Arguido CA tem um rendimento mais modesto e despesas fixas mais elevadas do que o Arguido DR .
Feita a ponderação, absoluta e relativa, das condições de cada um dos Arguidos, fixa-se o quantitativo diário: 

iii) para o Arguido DR , nos 8,00€.”
Ora, analisados os elementos que o tribunal pôs em campo para a fixação da medida da pena, podemos dizer que não só a fixação da pena em 2/3 do ponto máximo da respectiva moldura se mostra proporcional à culpa evidenciada pelo arguido na sua conduta, como também se mostra adequada à situação concreta vivenciada, em termos de consequências, na pessoa do ofendido e no espectáculo desportivo em que foram cometidos os factos.
Segundo o art. 47.º, n.º 1, a pena de multa será “… fixada em dias, de acordo com os critérios estabelecidos no art. 71.º, …”, em que, com base no subsequente n.º 2 “Cada dia de multa corresponde a uma quantia entre € 5 e € 500, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais”.
Naquele art. 71.º, que fixa os demais critérios legais para a determinação judicial da pena, estabelece-se, numa primeira fase, que a pena seja encontrada em função da culpa do arguido e das exigências de prevenção, atendendo ainda, numa segunda fase, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, rodearam o mesmo, antes ou depois do seu cometimento, quer resultem a favor ou contra o agente.
Assim, na determinação judicial da pena de multa temos uma primeira ponderação dos dias de multa, responsabilizando-se o agente em função do bem jurídico a proteger, proporcional à sua culpa, temperada por necessidades de prevenção especial e geral.
Passando depois para a aferição desse quantitativo diário, temos uma segunda ponderação de cariz essencialmente económica, que deve não só ter em conta os rendimentos mensais do arguido, sejam eles próprios ou do que o mesmo beneficie, mas toda a sua situação financeira, designadamente o património que se lhe apresente disponível e os seus encargos.
Neste apuramento deve-se atender igualmente que a multa é uma verdadeira reacção criminal de índole económica, não sendo nem “um crédito jurídico-público a favor do Estado”, sendo, por isso, insusceptível de compensação ou de transmissão contratual ou sucessória, face à sua natureza estritamente pessoal, nem um laxante com repercussões económicas, pelo que a sua aplicação deve ser submetida a critérios de igualdade de sacrifícios e ónus, originando uma agravação da situação económica do condenado.
No que concerne aos encargos e perante o mesmo princípio da igualdade de ónus e sacrifícios, deverá fazer-se uma avaliação diferenciada dos mesmos, distinguindo-se aqueles que revelam custos indispensáveis para a sustentação do condenado e dos seus familiares dependentes, os quais devem ser deduzidos no rendimento, daqueles que revelam alguma prodigalidade ou luxúria e que não devem beneficiar da mesma ponderação dedutiva, antes pelo contrário.
Tudo isto leva a que se reservem os quantitativos mínimos para aquelas pessoas que vivem abaixo ou no limiar da subsistência, designadamente por carência de rendimentos próprios ou de quaisquer outros, escalonando-se a partir daí todos os demais.
No que concerne ao quantitativo diário, temos de ponderar que o arguido aufere um rendimento decorrente do seu salário que, face às despesas cujo pagamento enfrenta, matematicamente fica com mais de metade disponível para si próprio.
Ora se para quem não tem proventos ou para quem tem rendimentos para que possa beneficiar do rendimento social de inserção se mostra proporcional uma taxa diária a partir dos € 5, para quem aufere uma retribuição mensal superior ao salário mínimo e tem mais de metade desse salário disponível, como é o caso do recorrente, não vemos como possa ser inferior à taxa diária de € 8, a que foi sentenciado.
Na realidade, a aplicação dessa pena com a expressão pecuniária que tem não pode deixar de constituir para o condenado num concreto e real sacrifício. 
Já por relação à pena de prisão em que foi condenado pelo crime de ofensa à integridade física qualificada tentada, prisão de 9 meses, suspensa na sua execução por 1 ano, mas sujeita a condição de pagamento da quantia de 400,00€ ao lesado, qualifica o recorrente tal pena como “ manifestamente gravosa, desproporcional e desajustada.”, propugnando como adequada a pena substitutiva de prestação de  trabalho a favor da comunidade que asseguraria as finalidades das penas e revelaria muito mais a sua ressocialização.
Ora, nos termos do artigo 45.º, n.º 1, do Código Penal, a pena de multa aplicada em medida não superior a um ano «é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, exceto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento e futuros crimes».
Mais decorre do artigo 58.º, n.º 1, do Código Penal que a substituição da pena de prisão não superior a 2 anos por prestação de trabalho a favor da comunidade deve ocorrer sempre que o Tribunal concluir, «nomeadamente em razão da idade do condenado, que se realizam, por este meio, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição».
Essa concreta possibilidade de substituição não escapou ao crivo do tribunal que a afastou com a seguinte argumentação:
“Ora, nos termos do artigo 45.º, n.º 1, do Código Penal, a pena de multa aplicada em medida não superior a um ano «é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, exceto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento e futuros crimes».
Mais decorre do artigo 58.º, n.º 1, do Código Penal que a substituição da pena de prisão não superior a 2 anos por prestação de trabalho a favor da comunidade deve ocorrer sempre que o Tribunal concluir, «nomeadamente em razão da idade do condenado, que se realizam, por este meio, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição».
In casu, embora se verifique o pressuposto formal para a substituição da pena de prisão quer por pena de multa (quanto a um dos Arguidos), quer por pena de trabalho a favor da comunidade, tendo até os Arguidos prestado já o seu acordo à mesma, a verdade é que a gravidade das suas condutas leva a que se conclua que uma pena de multa ou de trabalho não seriam suficientes para, de forma adequada e suficiente, reafirmar a validade da norma violada e intimidar os Arguidos à abstenção da repetição do comportamento criminoso.”
A pena de prestação de trabalho a favor da comunidade é, na verdade, uma pena de substituição, na medida em que visa evitar a execução da pena de prisão (não superior a um ano) que, em princípio, deveria caber ao caso. E insere-se no conjunto de providências que os modernos sistemas penais consagram como reacção às penas curtas de prisão, de carácter consabidamente prejudicial.
E é uma pena de substituição em sentido próprio, porquanto, por um lado, tem natureza não detentiva e, por outro, a sua aplicação implica a prévia determinação da medida concreta da pena de prisão que ela há-de substituir e que terá eventualmente de ser cumprida no caso de a pena substitutiva vir a ser revogada – cfr. artigo 59º, nº 2, do C. Penal.
Mas, as penas de substituição são verdadeiras penas autónomas e o tribunal só deve negar a aplicação de uma delas «quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente do que aquelas penas; coisa que só raramente acontecerá se não se perder de vista o já tantas vezes referido carácter criminógeno da prisão, em especial da de curta duração.
Em segundo lugar, sempre que, uma vez recusada pelo tribunal a aplicação efectiva da prisão, reste ao seu dispor mais do que uma espécie de pena de substituição (v. g., multa, prestação de trabalho a favor da comunidade, suspensão da execução da prisão), são ainda considerações de prevenção especial de socialização que devem decidir qual das espécies de penas de substituição abstractamente aplicáveis deve ser a eleita. Neste sentido pode afirmar-se que não existe em abstracto, pelo menos sob a forma rígida e em via de princípio, uma «hierarquia legal das penas de substituição»; só em concreto ela se dá, isto é, em função das exigências de prevenção especial de socialização que na hipótese se façam sentir e da forma mais adequada de as satisfazer». Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 333.
O tribunal suspendeu a execução da pena, considerando que as circunstâncias concretas permitem confiar que é razoável acreditar que a simples ameaça da prisão será suficiente para realizar as finalidades da punição e, consequentemente, a ressocialização, em liberdade, do arguido, assentando na confiança de que este sentirá a presente condenação como uma advertência, que não cometerá, no futuro, outro crime.
Não se demonstra que o trabalho a favor da comunidade satisfaz, de maneira mais completa e eficaz, as necessidades de prevenção, evitando que, no futuro, o arguido, posto perante uma discordância com decisões disciplinares de árbitro noutra competição desportiva, volte a insultar e agredir este inexistindo, assim, razão para dar preferência àquela pena de substituição, em detrimento da decretada suspensão da execução.
Acresce que, face à condições pessoais do arguido relativas à sua situação profissional (Trabalha na junta de freguesia de Alcântara) não vemos que período poderia desenvolver esse trabalho a favor da comunidade que não pode ser confundido com as actividades normais que profissionalmente desenvolve.
Tais fundamentos de recurso, são por isso, de improceder.
Recurso do arguido FA :
As questões suscitadas pelo recorrente mostram-se coincidentes com as do co-arguido DR  no tocante aos factos impugnados 2, 17 e 18, sendo a argumentação desenvolvida acerca dessa matéria similares ao deste recorrente pelo que o remetemos para a decisão anteriormente proferida que desatendeu a alateração pretendida nos factos em apreço.
Acrescenta o recorrente FA  a impugnação do facto provado 16 [O arguido FA  agiu deliberada, livre e conscientemente, querendo, ao agir da forma supra descrita em 7. (proferindo as expressões "filho da puta", "vai para o caralho"), ofender MG na sua honra e consideração, o que conseguiu, bem sabendo que o mesmo era árbitro desportivo sob a jurisdição de federação desportiva e que se encontrava no exercício das suas funções.] alegando que a confissão por si feita admite a verbalização dessas expressões ao árbitro do encontro mas não com a intenção/vontade de ofender nem realizou que a conduta era proibida e punida por lei.
O Código Penal não define o dolo do tipo mas apenas, no artigo 14º, cada uma das formas em que ele se analisa.
A doutrina hoje dominante conceitualiza-o, como conhecimento e vontade de realização do tipo objectivo de ilícito.
Conceitualização do dolo do tipo como conhecimento (momento intelectual) e vontade (momento volitivo) de realização do facto.
Sendo o elemento volitivo, ligado ao elemento intelectual que serve para indicar uma posição ou atitude do agente contrária ou indiferente à norma de comportamento, numa palavra, uma culpa dolosa e a consequente possibilidade de o agente ser punido a título de dolo.
Assim, no momento intelectual do dolo afirma-se a necessidade de que o agente conheça, saiba, represente correctamente ou tenha consciência (consciência psicológica, ou consciência intencional) das circunstâncias do facto que preenche um tipo de ilícito objectivo, visando que o agente conheça tudo quanto é necessário a uma correcta orientação da sua consciência ética para o desvalor jurídico que concretamente se liga à acção intentada, para o seu carácter ilícito.
O elemento volitivo supõe uma decisão de vontade do agente para a realização de um ilícito-típico, por via de uma acção ou omissão, sendo que é, especialmente, através do grau de intensidade desta relação de vontade que se diferenciam as várias formas de dolo.
Consciência e vontade não podem ser vistos isoladamente, pois, só se pode querer aquilo que se conhece.
Em relação às palavras dirigidas, o epiteto utilizado terá de encerrar em si uma potência ofensiva, isto é: terá de ser um significante associável a significados padronizados ou padronizáveis com essência ou núcleo ofensivos. O significante “filho da puta” tem essa potência natural ofensiva porque relacionada a uma característica própria existencial do visado.
Por outro lado, a expressão (conjunto de palavras) em causa não podem deixar de ser entendidos, percebidos, compreendidos, como comportamento gratuito: não existe, na representação dos factos sucedidos (ao contrário da versão alegada pelo recorrente) qualquer contextualização na história vivencial comum do declarante e do declaratário, pontual ou reiterada.
Neste sentido já esta Relação entendeu (cit. Acórdão da R.P de 20.04.2016) que “a ofensa à honra e consideração não pode ser perspectivada em termos estritamente subjetivos, ou seja, não basta que alguém se sinta atingido na sua honra – na perspectiva interior/exterior – para que a ofensa exista. Para concluir se uma expressão é ou não ofensiva da honra e consideração, é necessário enquadrá-la no contexto em que foi proferida, o meio a que pertencem ofendido/arguido, as relações entre eles, entre outros aspectos” e, ainda (cit. Acórdão da R.P. de 11.11.2105, ambos consultáveis em www.dgsi), que “a protecção penal conferida à honra só encontra justificação nos casos em que objectivamente as expressões que são proferidas não têm outro sentido que não seja o de ofender, que inequívoca e em primeira linha visam gratuitamente ferir, achincalhar, rebaixar a honra e o bom nome de alguém.”.
A expressão utilizada é proferida num espectáculo desportivo em que ambos são intervenientes e actores principais, embora com funções distintas no mesmo. Não se consegue perceber o comportamento do recorrente como uma ofensa pura, gratuita, uma vez que a essência desse comportamento assenta na aplicação a um terceiro interveniente de uma sanção disciplinar desportiva que em nada afectava pessoalmente o recorrente.
Por fim, apesar da conclusão que as palavras em causa são susceptíveis de ofender a honra (“mínimo de condições, especialmente de natureza moral, que são razoavelmente consideradas essenciais para que um indivíduo possa com legitimidade ter estima por si, pelo que é e vale ou consideração do recorrente”) ou consideração (“aquele conjunto de requisitos que razoavelmente se deve julgar necessário a qualquer pessoa, de tal modo que a falta de algum desses requisitos possa expor essa pessoa (…) ao desprezo público” – cit. Beleza dos Santos, in “Algumas Considerações Jurídicas sobre Crimes de Difamação e de Injúria”, RLJ ano 92, n.º3152, pág.167/168) do ofendido, chamamos à colação o decidido no acórdão da Relação de Lisboa de 12.09.2019 referido na sentença e com base no qual o tribunal recorrido manifestou:
“Outra realidade completamente diferente e incomparável é a das situações em que tais expressões brotam de um jogador que - conhecendo o árbitro, sabendo quem é, sendo seu interlocutor no campo de jogo, tendo a responsabilidade de ser um dos protagonistas de um espetáculo que se pretende aproximador e até familiar - o ofende de forma absolutamente direta e pessoalizada, com palavras ou cuspindo-lhe, mas «olhando-o nos olhos».
Esse tipo de ofensa ultrapassa qualquer esfera (por mais liberal e permissiva que seja) de adequação social, não podendo a eventual repetição estatística destas situações ser interpretada como uma normalidade normativa. Nas palavras do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 20-12-2018 «O direito penal não tem de “aceitar” uma propalada normalidade (seria um “ser” a ditar o “dever ser”), a qual, mesmo a existir, traduziria uma normalidade “estatística” e nunca “valorativa”. Trata-se, aqui, de uma conduta censurável, devendo antes o direito penal ser claro nessa censura, assegurando a tutela do bem jurídico.» “
É certo que as expressões foram proferidas durante uma situação de conflito e inconformismo com as decisões disciplinares do árbitro, mas desse facto apenas é possível concluir que quem as proferiu, para além de pretender manifestar esse inconformismo, visou igualmente a sua honra. É isso que as «regras da experiência comum» indicam.
Por outro lado, a consciência da ilicitude, elemento intelectual do dolo no crime de injúria, só poderá ser excluída em circunstâncias excepcionais, quando for não censurável (Figueiredo Dias, O Problema da Consciência da Ilicitude em Direito Penal, p. 287 ss). A lei não exige o conhecimento do preceito legal, ipsis verbis, nem a sua pena em concreto. Basta que o agente saiba que o seu comportamento viola as exigências da vida em comunidade, que é proibido pelo direito (Hans Heinrich Jescheck, Tratado de Derecho Penal, parte general, vol.1 pág. 624).
Neste contexto, estando em causa uma conduta violadora de um direito fundamental clássico, quase tão velho quanto a humanidade, não releva, nem pode relevar, qualquer erro sobre a proibição, art.º 17° do Código Penal. Mesmo a relevar, o resultado não pode ser a impunibilidade da conduta.
Como refere o Ac RPorto, de 18-4-2007, proc. 0646052 (www.dgsi.pt), «(...) ter consciência da ilicitude é um estado de espírito que terá de resultar e resulta, segundo as fórmulas de normalidade, da compreensão de toda a acção criminosa, objectivada em outros factos de onde a mesma se retira, com a naturalidade que ela representa (...) se está em causa um facto que todos sabem constituir um crime».
Ou seja, quanto aos tipos de ilícito com dignidade penal histórica, cuja ilicitude de todos é e se presume conhecida, como v.g. o homicídio, as ofensas corporais, o furto, a injúria, o dano, em que é contrário à experiência e à realidade da vida, pôr em duvida se o agente sabe que é proibido, matar, ofender corporalmente, desapropriar, injuriar, etc., não é exigível o conhecimento do preceito, do artigo do Código Penal, a sua pena concreta. Basta que o agente saiba que o seu comportamento viola as exigências da vida comunitária, que é proibido pelo direito [Hans-Heinrich Jescheck, Tratado de Derecho Penal, parte general, vol. I pg.624].
Isso não pode o recorrente invocar como existente à data da verbalização que dirigiu ao ofendido árbitro.
Formula ainda o recorrente FA  como questões no recurso, saber se se encontra preenchida a qualificativa do tipo de ilícito de injúria e de ofensa à integridade física, defendendo que não com a alegação de que da prova produzida não resultou demonstrada a integralidade da qualidade do demandante civil - árbitro de futebol da Associação de Futebol de Lisboa, subordinada à Federação Portuguesa de Futebol - tal como vem descrito no referido ponto 2, o que tem reflexo no preenchimento da qualificativa agravativa do art.º 132º n.º 2 al. j) CP quanto ao crime de injúria agravada e ao crime de ofensa à integridade física qualificada com as repercussões em matéria de molduras penais e de determinação da pena a aplicar.
Esse concreto aspecto factual já se mostra dirimido aquando da apreciação dos recursos interposto pelos demais arguidos em termos de indicação da prova em que essa qualidade se mostra assente pelo que remetemos o recorrente para essas considerações.
Por relação à questão posta quanto à medida das penas - de multa e de prisão - em que foi condenado e que o recorrente manifesta serem gravosas e desproporcionadas, alega o mesmo que é um jovem integrado social e familiarmente, que se encontra a estudar, vive com os pais e um irmão, a única fonte de rendimento que tem decorre da frequência do curso e ainda contribui para as despesas do agregado familiar com 50,00€, confessou a prática dos factos, colaborou com a Justiça e demonstrou arrependimento sincero, é primário e decorreram mais de 3 anos e meio sobre os factos aqui em causa e a moldura penal já se encontra elevada por força da agravação do artigo 132.°, n.º 2, alínea l), do CP, terminando pelo entendimento que, face às circunstâncias do recorrente, sempre seria suficiente, adequada e proporcional, a aplicação de pena situada no primeiro terço da moldura penal, redução que também entende ser devida quanto à taxa diária fixada.
Vejamos o que o tribunal manifestou acerca da medida da pena depois de ter optado pela pena não privativa de liberdade, relativamente aos crimes de injúria agravada:
“Seguindo de perto a denominada teoria da «moldura da prevenção», dir-se-á que a medida concreta da pena haverá de ser encontrada numa espécie de submoldura (contida, claro está, dentro da moldura legal) que o julgador deverá obter para cada caso, de acordo com os circunstancialismos que o caracterizam.
Tal espectro é definido pelos critérios de prevenção geral, conhecendo como limite máximo a pena que seria ótima para o mais profundo cumprimento da necessidade de tutela dos bens jurídicos e como limite mínimo aquele abaixo do qual a pena deixaria de cumprir a função de tutela do bem jurídico violado, frustrando as expectativas mínimas da comunidade na manutenção da norma criminal violada.
O critério de prevenção especial de socialização atuará fixando, dentro da submoldura da prevenção geral, a medida concreta da pena, sendo certo que neste exercício haverá que considerar que a culpa concreta do agente é sempre limite inultrapassável da pena encontrada através do fiel da prevenção especial.
Feita esta exposição, e tendo presente que o crime de injúria agravada é punível com pena de multa de 15 a 180 dias (cf. artigo 47.º, n.º 1, 181.º, n.º 1 e 184.º, todos do Código Penal) caberá recolher nas circunstâncias do caso os fatores da medida da pena que o artigo 71.º, n.º 2, do Código Penal enuncia, tendo presente o princípio da proibição da dupla valoração ínsito no proémio deste normativo.
Vejamos:
*
No que concerne grau de ilicitude do facto, o mesmo é diferente para cada um dos Arguidos, na medida em que, como se adiantou já, a conduta de CA, por se fazer acompanhar do ato de cuspir ao ofendido, se revela de um maior desvalor e censurabilidade do que a dos restantes, sendo as ofensas de FA  mais graves do que as proferidas por DR .
Quanto ao modo de execução do crime, o mesmo reclama um agravamento da pena para todos os arguidos pois todos eles eram jogadores de uma equipa participante num torneio oficial, e dirigiram-se a um árbitro de futebol (a quem deviam particular respeito atenta a posição de interlocutores de jogo que relativamente ao mesmo ocupavam) num momento de tensão já instalada (pelas palavras iniciais de CA), provocando e promovendo o empolar da desordem que se instalara.
A conduta dos Arguidos não foi inconsequente, uma vez que conduziu a uma confusão que levaria à interrupção do jogo que a equipa dos Arguidos estava a perder, ainda na primeira parte, e deixou o ofendido, para além do mais, num estado de consternação e tristeza, e de relutância a continuar o exercício da atividade de árbitro.
O dolo de todos os Arguidos é direto e intenso.
No que concerne à personalidade dos Arguidos manifestada no facto caberá salientar que não se apuraram contendas anteriores que pudessem explicar a sua reação abruta e desajustada, tendo os impropérios que dirigiram ao árbitro (a quem deveriam mais respeito atenta a sua qualidade de jogadores federados) sido absolutamente gratuitos, movidos tão-somente por uma primária reação por estarem a perder e em face de um lance desfavorável.
A favor do Arguido FA  pendem a sua confissão integral e sem reservas, o seu arrependimento, a idade à data dos factos (apenas 20 anos) e a sua inserção familiar, educacional e social.

A ausência de condenações nos registos criminais é ponderada favoravelmente para todos os Arguidos.
Tudo compulsado decide aplicar-se aos Arguidos, pela prática dos crimes de injúria agravada, penas entre o meio da moldura penal e os 2/3:

(ii) ao Arguido FA , uma pena de 100 dias de multa;

Nos termos do artigo 47.º, n.º 2, do Código Penal, o montante diário da multa deverá ser determinado numa quantia entre 5€ e 500€, que o tribunal fixará de acordo com a situação económica e financeira do condenado e seus encargos pessoais.
No que ao Arguido FA  concerne, este aufere um baixo rendimento, vivendo em casa dos pais e com a ajuda destes. Contudo, contrariamente aos restantes Arguidos, não tem dependentes nem as despesas inerentes.
O Arguido CA tem um rendimento mais modesto e despesas fixas mais elevadas do que o Arguido DR .
Feita a ponderação, absoluta e relativa, das condições de cada um dos Arguidos, fixa-se o quantitativo diário:

ii) para o Arguido FA , nos 6,50€;

Em face do exposto, decide-se aplicar, pela prática dos crimes de injúria agravada:

(ii) Ao Arguido FA , uma pena de 100 dias de multa à taxa diária de 6,50 € (seis euros e cinquenta cêntimos), num total de 650,00 € (seiscentos e cinquenta euros);
…”
Ora, analisados os elementos que o tribunal pôs em campo para a fixação da medida da pena, podemos dizer que não só a fixação da pena em 2/3 do ponto máximo da respectiva moldura se mostra proporcional à culpa evidenciada pelo arguido na sua conduta, como também se mostra adequada à situação concreta vivenciada, em termos de consequências, na pessoa do ofendido e no espectáculo desportivo em que foram cometidos os factos.
Segundo o art. 47.º, n.º 1, a pena de multa será “… fixada em dias, de acordo com os critérios estabelecidos no art. 71.º, …”, em que, com base no subsequente n.º 2 “Cada dia de multa corresponde a uma quantia entre € 5 e € 500, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais”.
Naquele art. 71.º, que fixa os demais critérios legais para a determinação judicial da pena, estabelece-se, numa primeira fase, que a pena seja encontrada em função da culpa do arguido e das exigências de prevenção, atendendo ainda, numa segunda fase, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, rodearam o mesmo, antes ou depois do seu cometimento, quer resultem a favor ou contra o agente.
Assim, na determinação judicial da pena de multa temos uma primeira ponderação dos dias de multa, responsabilizando-se o agente em função do bem jurídico a proteger, proporcional à sua culpa, temperada por necessidades de prevenção especial e geral.
Passando depois para a aferição desse quantitativo diário, temos uma segunda ponderação de cariz essencialmente económica, que deve não só ter em conta os rendimentos mensais do arguido, sejam eles próprios ou do que o mesmo beneficie, mas toda a sua situação financeira, designadamente o património que se lhe apresente disponível e os seus encargos.
Neste apuramento deve-se atender igualmente que a multa é uma verdadeira reacção criminal de índole económica, não sendo nem “um crédito jurídico-público a favor do Estado”, sendo, por isso, insusceptível de compensação ou de transmissão contratual ou sucessória, face à sua natureza estritamente pessoal, nem um laxante com repercussões económicas, pelo que a sua aplicação deve ser submetida a critérios de igualdade de sacrifícios e ónus, originando uma agravação da situação económica do condenado.
No que concerne aos encargos e perante o mesmo princípio da igualdade de ónus e sacrifícios, deverá fazer-se uma avaliação diferenciada dos mesmos, distinguindo-se aqueles que revelam custos indispensáveis para a sustentação do condenado e dos seus familiares dependentes, os quais devem ser deduzidos no rendimento, daqueles que revelam alguma prodigalidade ou luxúria e que não devem beneficiar da mesma ponderação dedutiva, antes pelo contrário.
Tudo isto leva a que se reservem os quantitativos mínimos para aquelas pessoas que vivem abaixo ou no limiar da subsistência, designadamente por carência de rendimentos próprios ou de quaisquer outros, escalonando-se a partir daí todos os demais.
No que concerne ao quantitativo diário, temos de ponderar que o arguido aufere um rendimento decorrente do seu salário que, face às despesas cujo pagamento enfrenta, matematicamente fica com mais de metade disponível para si próprio.
Ora se para quem não tem proventos ou para quem tem rendimentos para que possa beneficiar do rendimento social de inserção se mostra proporcional uma taxa diária a partir dos € 5, dispondo o recorrente de um rendimento disponível na ordem dos € 230 mensais para as suas extravagâncias pessoais, ou seja, o equivalente a pouco menos de metade do salário mínimo nacional, não vemos como possa ser inferior à taxa diária de € 6,50 a que foi sentenciado.
Na realidade, a aplicação dessa pena com a expressão pecuniária que tem não pode deixar de constituir para o condenado num concreto e real sacrifício, sob pena de ser vista como não censurável a sua conduta.
Já por relação à pena de prisão, manifesta o recorrente  ser a mesma manifestamente gravosa, desproporcional e desajustada, isto face às considerações  relativas às condições do recorrente, e ainda a  circunstância de o Tribunal a quo ter aplicado o regime especial para jovens delinquentes.
Na sentença recorrida chegou-se á pena concreta relativa ao crime de ofensa à integridade física qualificada com os seguintes argumentos:
“No que concerne aos crimes de ofensa à integridade física qualificada pelos quais os Arguidos FA  e DR  serão condenados, o crime é punível com uma pena de 1 mês a 4 anos (cf. artigos 41.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal).

No caso do Arguido FA , uma vez que o Arguido tinha apenas 20 anos à data dos factos (aplicando-se-lhe o regime especial para jovens previsto no Decreto-lei n.º 401/82, de 23 de setembro - cf. artigo 1.º, n.º s 1 e 2, do diploma) e, dos factos apurados se extrai que existem vantagens para a sua ressocialização na aplicação de uma pena de prisão especialmente atenuada, também se reduz o limite máximo desta para os 2 anos e 6 meses.
Redefinida a moldura do tipo, constata-se que a conduta do Arguido FA  revela uma ilicitude de grau muito mais elevado, sendo valorado negativamente o contexto de jogo e de tensão vivenciado, escolhido pelo Arguido para ofender o árbitro que regulava a partida, bem como a forma como o agrediu (com um pontapé dado enquanto o seu próprio corpo era impulsionado no ar, assim aumentando a violência do impacto), com dolo intenso e direto e as consequências resultantes de tal agressão (interrupção de um jogo que o Arguido estava a perder, condução do ofendido às urgências do Hospital, dores e sequelas psicológicas do ofendido).
Valoram-se em sentido positivo a postura do Arguido em julgamento e as suas atuais condições de vida (familiares e educacionais), concluindo-se, do cotejo de todos estes elementos, que será adequada uma pena de 1 ano e 3 meses de prisão.”
Na verdade, o tribunal pôs o acento tónico na fixação em alta da pena concreta no muito mais elevado grau de ilicitude, traduzido na maior carga ofensiva do seu comportamento lesivo do corpo e da saúde do ofendido pelo que a moldura penal aplicável tinha um limite máximo mais baixo decorrente da atenuação pelo regime especial dos jovens delinquentes que o tribunal entendeu ser de aplicar ao recorrente. Diremos assim que a fixação da pena concreta no meio dessa janela punitiva se mostra proporcional à culpa, adequada às exigências de prevenção especial e geral e necessária à reabilitação do recorrente.
Também nesta parte improcede o recurso.
Finalmente, manifesta o recorrente que lhe deveria ser aplicado uma pena substitutiva de prestação de trabalho a favor da comunidade, discordando assim da opção seguida pelo tribunal com a substituição por pena suspensa na sua execução com condição de pagamento, ao longo do período fixado, da quantia de 700,00€ (parte da indemnização civil a que será condenado) ao ofendido MG .
A dissidência do recorrente revela-se apenas mo entendimento de que a propugnada pena substitutiva asseguraria as finalidades das penas e revelaria muito mais a ressocialização.
Essa concreta possibilidade de substituição não escapou ao crivo do tribunal que a afastou com a seguinte argumentação:
“Ora, nos termos do artigo 45.º, n.º 1, do Código Penal, a pena de multa aplicada em medida não superior a um ano «é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, exceto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento e futuros crimes».
Mais decorre do artigo 58.º, n.º 1, do Código Penal que a substituição da pena de prisão não superior a 2 anos por prestação de trabalho a favor da comunidade deve ocorrer sempre que o Tribunal concluir, «nomeadamente em razão da idade do condenado, que se realizam, por este meio, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição».
In casu, embora se verifique o pressuposto formal para a substituição da pena de prisão quer por pena de multa (quanto a um dos Arguidos), quer por pena de trabalho a favor da comunidade, tendo até os Arguidos prestado já o seu acordo à mesma, a verdade é que a gravidade das suas condutas leva a que se conclua que uma pena de multa ou de trabalho não seriam suficientes para, de forma adequada e suficiente, reafirmar a validade da norma violada e intimidar os Arguidos à abstenção da repetição do comportamento criminoso.”
A pena de prestação de trabalho a favor da comunidade é, na verdade, uma pena de substituição, na medida em que visa evitar a execução da pena de prisão (não superior a um ano) que, em princípio, deveria caber ao caso. E insere-se no conjunto de providências que os modernos sistemas penais consagram como reacção às penas curtas de prisão, de carácter consabidamente prejudicial.
E é uma pena de substituição em sentido próprio, porquanto, por um lado, tem natureza não detentiva e, por outro, a sua aplicação implica a prévia determinação da medida concreta da pena de prisão que ela há-de substituir e que terá eventualmente de ser cumprida no caso de a pena substitutiva vir a ser revogada – cfr. artigo 59º, n.º 2, do C. Penal.
Mas, as penas de substituição são verdadeiras penas autónomas e o tribunal só deve negar a aplicação de uma delas quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente do que aquelas penas; coisa que só raramente acontecerá se não se perder de vista o já tantas vezes referido carácter criminógeno da prisão, em especial da de curta duração.
Em segundo lugar, sempre que, uma vez recusada pelo tribunal a aplicação efectiva da prisão, reste ao seu dispor mais do que uma espécie de pena de substituição (v. g., multa, prestação de trabalho a favor da comunidade, suspensão da execução da prisão), são ainda considerações de prevenção especial de socialização que devem decidir qual das espécies de penas de substituição abstractamente aplicáveis deve ser a eleita. Neste sentido pode afirmar-se que não existe em abstracto, pelo menos sob a forma rígida e em via de princípio, uma «hierarquia legal das penas de substituição»; só em concreto ela se dá, isto é, em função das exigências de prevenção especial de socialização que na hipótese se façam sentir e da forma mais adequada de as satisfazer». Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 333.
O tribunal suspendeu a execução da pena, considerando que as circunstâncias concretas permitem confiar que é razoável acreditar que a simples ameaça da prisão será suficiente para realizar as finalidades da punição e, consequentemente, a ressocialização, em liberdade, do arguido, assentando na confiança de que este sentirá a presente condenação como uma advertência, que não cometerá, no futuro, outro crime.
Não se demonstra que o trabalho a favor da comunidade satisfaz, de maneira mais completa e eficaz, as necessidades de prevenção, evitando que, no futuro, o arguido, posto perante uma discordância com decisões disciplinares de árbitro noutra competição desportiva, volte a insultar e agredir este inexistindo, assim, razão para dar preferência àquela pena de substituição, em detrimento da decretada suspensão da execução.
Acresce que, face à condições pessoais do arguido relativas à sua situação profissional (estuda num curso de sistemas do IEFP, com equivalência ao 12.º ano.) não vemos como se pode compatibilizar temporalmente o desempenho desse trabalho a favor da comunidade e os horários do curso profissional.
Improcede pois a totalidade do recurso.
III.
Pelo exposto, nega-se provimento aos recursos interpostos pelos arguidos CA, DR  e FA , confirmando-se a sentença recorrida.
Custas a cargo dos recorrentes, fixando a taxa de justiça individual em 5 UC.
Feito e revisto pelo 1º signatário.

Lisboa, 24 de Novembro de 2020.
João Carrola
Luís Gominho