Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
661/18.4YRLSB-2
Relator: ARLINDO CRUA
Descritores: ACÇÃO DE ANULAÇÃO DE DECISÃO ARBITRAL
PRAZO DE CADUCIDADE
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/23/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDÊNCIA
Sumário: - O termo a quo de contagem do prazo de 60 dias para a dedução de acção de impugnação/anulação de sentença arbitral, previsto no nº. 6, do artº. 46º, da Lei da Arbitragem Voluntária – aprovada pela Lei nº. 63/2011, de 14/12 - é sempre a notificação duma decisão dos árbitros, seja ela a sentença que decidiu o litígio arbitral, seja a decisão (despacho) de rectificação, esclarecimento, aclaração ou completamento daquela, proferida a requerimento de uma parte, nos termos do artº. 45º, do mesmo diploma ;
- estando-se perante um prazo directamente relacionado com outra acção, cujo decurso tem fundamentalmente um efeito de natureza processual, in casu a impossibilidade de questionar a integridade do decidido quanto ao tribunal arbitral, processo por este adoptado e a integridade da decisão por ele proferida, em confronto com os princípios, regras e valores fundamentais do ordenamento jurídico, e não o efeito extintivo de um direito material, tal prazo deve considerar-se de natureza processual ou judicial ;
- caso ocorresse falta de poderes do mandatário da ora Requerente na outorga da Segunda Convenção de Arbitragem, bem como ausência de ratificação do processado, o que era do conhecimento daquela, o que eventualmente colidiria com a competência do Tribunal Arbitral, enquanto constituído por árbitro único, para conhecer acerca do litígio que lhe foi submetido, tinha a ora Requerente, ali Demandada no Segundo Processo Arbitral, o ónus de arguição de tal incompetência de submissão do litígio àquele ;
- não o fazendo, a que acresce igual omissão relativamente à invocada falta de junção de procuração por parte da ora Requerida, ali Demandante, antes tendo prosseguido com a arbitragem sem nunca ter levantado tal questão, necessariamente que ter-se-ia de concluir pela sua renúncia ao direito de impugnar a sentença arbitral, com base ou fundamento na incapacidade das partes em se vincularem na convenção de arbitragem, nos termos conjugados dos artigos 18º, nº. 4 e 46º, nº. 4, ambos da Lei da Arbitragem Voluntária ; 
- a Requerente teve efectivo conhecimento do teor das circunstâncias reveladas pelo Sr. Árbitro, pelo menos desde data não determinada do Primeiro Processo Arbitral, não tendo levantado qualquer objecção às mesmas, pelo que, mesmo a equacionar-se que estaríamos perante circunstâncias que poderiam suscitar fundadas dúvidas sobre a imparcialidade e independência do Árbitro, que constituíssem, inclusive, fundamentos da sua recusa, nos termos equacionados no artº. 13º, da LAV, a ora Requerente, e ali Demandada, nem durante o Primeiro Processo Arbitral, nem no decurso do Segundo Processo Arbitral, ora em equação, para além de não ter levantado qualquer objecção ao teor daquelas circunstâncias, não iniciou igualmente qualquer processo de recusa do Árbitro, nos termos do artº. 14º, da LAV ;
- apesar daquele conhecimento, veio apenas a levantar tal questão através do presente pedido de anulação da sentença arbitral, pelo que necessariamente se terá que concluir, nos quadros do citado nº. 4, do artº. 46º, da Lei da Arbitragem Voluntária, pela existência de efectiva preclusão ou renúncia, decorrente do comportamento da ora Requerente, em impugnar, com tal fundamento – concretamente que tenha existido grave irregularidade na composição do tribunal arbitral, em virtude do árbitro designado não preencher os requisitos da independência e imparcialidade -, a sentença arbitral em equação ;
- confrontando a natureza das informações/circunstâncias feitas constar pelo Árbitro nomeado, na revelação pelo mesmo efectuada nos dois Acordos de Arbitragem, em concatenação com as situações elencadas nas citadas listagens do IBA Guidelines, constata-se que aquelas circunstâncias reveladas, quando muito e no limite, figurariam na Lista Laranja, tudo dependendo da temporalidade em que foram exercidas as funções de advogado feitas constar nas circunstâncias reveladas ;
- pelo que, devidamente comunicadas e nenhuma objecção tendo sido feita, conclui-se pela devida aceitação do Árbitro nomeado, sendo certo, ainda, que aquelas não constituem e nem traduzem, por si só, causa automática ou imediata da real verificação de um conflito de interesses ;
- concluindo-se, deste modo, pela inexistência de qualquer situação de comprometimento da independência e imparcialidade do Árbitro nomeado, o que determina o consequente não preenchimento do invocado fundamento de anulação e das invocadas causas de anulabilidade da sentença arbitral ;
- ao alegar que o Árbitro nomeado era recorrentemente nomeado como árbitro pela sociedade de advogados de que fazem parte os mandatários da ora Requerida, fundando tal alegação em rumores e no que alegadamente um dos seus administradores ouviu falar a “outros advogados”, de forma genérica, não tendo tido a Requerente o cuidado de, previamente, averiguar acerca da veracidade de tais factos - vindo-se antes a provar o contrário -, agiu de forma claramente temerária, ao invocar factualidade, com clara relevância, sem previamente se ter assegurado da sua veracidade, o que lhe era manifestamente exigível e justifica, por si só, o enquadramento da sua conduta a título de litigância de má-fé.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]:
               
I – RELATÓRIO
1 – BOGARVE – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., com sede na Rua Ferreira da Lapa, nº. 16-B, Lisboa, intentou acção de anulação (impugnação) de sentença arbitral, contra VILAMOURA LUSOTUR – S.A., com sede na Rua Lusotur, s/n, Vilamoura, Quarteira, deduzindo o seguinte petitório:
- que seja anulado o Acordo de Arbitragem, celebrado em 24/02/2017, junto aos presentes autos ;
- bem como os demais actos subsequentemente praticados no processo arbitral, maxime a decisão arbitral prolatada pelo árbitro nomeado em 27/11/2017, mas objecto de um pedido de aclaração, o qual veio a ser julgado improcedente por decisão prolatada em 22/01/2018, com as respectivas consequências legais.
Para tanto, alegou, em resumo, o seguinte:
· a sentença arbitral, para além do mais:
1. Declarou a resolução do contrato celebrado em 31 de dezembro de 2003 entre a Requerida e a Requerente por escritura pública intitulada "Permuta";
2. Ordenou o cancelamento das inscrições registais feitas com base na sobredita escritura, nomeadamente a de aquisição a favor da ora Requerente e de reserva de propriedade a favor da ora Requerida, e,
3. Condenou a ora Requerente a restituir à Requerida, a quantia de €498.798,00 referida na escritura em causa como estando já pagos na data da mesma, em execução de obrigações contratuais ;
· Tal sentença foi prolatada, em 27/11/2017, no âmbito do Processo Arbitrai n.° …/2017/ADHOC/…, que correu trâmites junto do Centro de Arbitragem da Associação de Lisboa, pela qual a ora Requerente foi condenada nos termos supra já sintetizados ;
· A mesma sentença foi objeto de um pedido de aclaração, o qual veio a ser julgado improcedente por decisão prolatada em 22.01.2018 ;
· Tal processo arbitral surgiu em decorrência de um anterior processo arbitral, o qual correu os seus trâmites sob o n.° …/ADHOC/2016, junto do Concórdia - Centro de Conciliação, Mediação de Conflitos e Arbitragem, na qual a ora Requerente foi Demandada e a aqui Requerida foi igualmente Demandante e pelo qual foi decidido, para além do mais, a fixação judicial de prazo contra a aqui Requerente para designadamente cumprir com quanto se comprometeu com a Requerida à luz do sobredito "contrato de permuta" (designadamente a feitura de demolição do prédio melhor identificado no aludido contrato e o pagamento à ora Requerida de determinado montante) ;
· chegou ao recente conhecimento da aqui Requerente, após ter compulsados os respetivos autos, que em 24 de fevereiro de 2017 veio a ser apresentado junto do Tribunal Arbitral, um documento denominado "Acordo de Arbitragem", assinado na mesma data pelo Árbitro ali designado e dos alegados mandatários da ali Demandante (aqui Requerida) e da Demandada (aqui Requerente) ;
· resulta da cláusula 3ª de tal Acordo de Arbitragem que "[o] árbitro signatário declara aceitar exercer as funções em causa e não conhecer factos que possam levantar dúvidas sobre a sua imparcialidade e independência, para além dos que foram comunicados às partes em anterior arbitragem" ;
· confrontada com tal novidade, totalmente desconhecida da Requerente, compulsou esta os autos da alegada anterior arbitragem mencionada no documento em apreço, tendo constatado que na sua Cláusula Terceira reza o seguinte: "o árbitro signatário declara aceitar exercer as funções em causa e não conhecer factos que possam levantar dúvidas sobre a sua imparcialidade e independência, tendo, por mera cautela,  informado previamente a Demandante e a Demandada ter sido advogado da Garveprasa, SGPS, S.A. e da Grupo Pra, S.R., empresas que integram um grupo empresarial que deteve a Demandante durante alguns anos, num processo arbitral relacionado com a compra que tal grupo empresarial fez,  em 2004, de participações representativas de 100% do capital social da Demandante." ;
· todavia, ao contrário do que vem mencionado na sobredita cláusula, nunca a ora Requerente veio por alquma forma ou meio e fosse por quem fosse, a ser alguma vez informada da factualidade ali  mencionada pelo respetivo árbitro, quer aquando da primeira arbitragem, e muito menos na segunda arbitragem ;
· o qual se afigura de uma enorme relevância, atenta a circunstância de ter sido fixada, quer na primeira arbitragem, quer na segunda, a nomeação de um árbitro único, não obstante a convenção de arbitragem acordada com a ora Requerida e prevista em escritura pública de compra e venda e de permuta de bens futuros celebrada em 31.12.2013 prever na sua cláusula nona -b) que o Tribunal Arbitrai seria composto por três árbitros, e para além disso, se encontrar liminarmente afastado o direito a recurso de tal decisão ;
· chegou também agora ao conhecimento da Requerente que o árbitro único nomeado na primeira e segunda arbitragens — o Professor Doutor RP… - é, com bastante frequência, o árbitro indicado pelas partes patrocinadas pelos advogados pertencentes à sociedade de advogados Unia Menendez Proença de Carvalho, onde se inserem os mandatários que patrocinaram a ora Requerida quer na primeira, quer na segunda arbitragens ;
· Donde, caso os representantes legais da ora Requerente tivessem sido informados (previamente, como se impunha), sobre o conteúdo da já supra mencionada Cláusula Terceira do Acordo de Arbitragem (apenas junto com a primeira arbitragem e para a qual o segundo Acordo de Arbitragem apenas remete sinteticamente) ou até mesmo do Acordo de Arbitragem efetuado por ocasião da segunda arbitragem- ou seja, que o árbitro a nomear havia sido advogado de determinadas entidades que detiveram a Demandante aqui Requerida durante alguns anos - não teriam certamente admitido como possível tal árbitro ser nomeado e, pior do que isso, constituir árbitro único num processo que não admitiria recurso e cuja importância era e é de enorme significado económico para a Requerente ;
· Por outro lado, o segundo Acordo de Arbitragem foi outorgado pelo alegado mandatário constituído pela ali Demandada (aqui Requerente) o I. M. Dr, JA…, mas a verdade é que à data da sua outorga nem sequer ao mesmo tinha a ora Requerente lhe atribuído quaisquer poderes forenses, os quais só lhe foram atribuídos somente por procuração outorgada em 5 de maio de 2017 e a qual não veio a prever qualquer ratificação do anteriormente processado ;
· Ademais, a respeito do mandatário da ali Demandante (aqui Requerida), compulsados os respetivos autos por via telemática fornecida pelo respetivo Centro de Arbitragem também não se vislumbrou que a Requerida, à data da outorga do respetivo segundo Acordo de Arbitragem pelo mandatário, lhe tivesse sequer conferido os necessários poderes forenses para outorgar o sobredito acordo ;
· em bom rigor, nem sequer a ora Requerente encontrou nos respetivos autos físicos da arbitragem ora em apreço a respetiva procuração forense a emitir pela Requerida a favor dos seus mandatários, a qual se encontra, pois, omissa nos mesmos como bem se alcança da declaração emitida pela respetiva secretária de processos junto do Centro de Arbitragem em apreço ;
· a factualidade supra descrita constituirá em causas diversas de pedido de anulação do processo arbitrai onde se inclui, pois, a sentença arbitral em apreço ;
· nomeadamente por enquadramento no disposto na alínea a), ponto i) do n.° 3 do art.° 46.° da Lei n.° 63/2011, de 14 de dezembro, denominada Lei da Arbitragem Voluntária, que refere que a sentença arbitral pode ser anulada pelo tribunal estadual competente se a parte que faz o pedido demonstrar que uma das partes da convenção de arbitragem estava afetada por uma incapacidade; ou que essa convenção de arbitragem não é válida nos termos da lei a que as partes a sujeitaram ou, na falta de qualquer indicação a este respeito, nos termos da presente lei (...) ;
· tanto o EOA como a Lei n.° 49/2004, relativamente ao mandato forense, mandam aplicar o regime previsto na Lei Processual Civil ;
· decorre do legal enquadramento que a simples junção da procuração sanará a falta de mandato, mas não valida o processado que, entretanto, se desenvolveu e que necessita necessariamente de ratificação ;
· Volvendo à procuração forense relativa ao mandatário da Demandada (aqui Requerente), constata-se que a mesma foi outorgada pela ora Requerente apenas em 05.05.2017, entrou nos respetivos autos em 16.05.2017 (conforme se constata do DOC. 4 junto) e não prevê expressamente a ratificação dos atos já anteriormente praticados pelo causídico ali mandatado, onde se inclui a outorga da Convenção da Arbitragem celebrada pelo mesmo em nome e representação da ora Requerente e cujo conteúdo o mesmo não deu sequer conhecimento a esta última, maxime sobre factos que podiam colocar em questão a independência e imparcialidade do árbitro nomeado ;
· E, semelhante problema se encontrará ao nível da aqui Requerida, visto que quanto a esta, dos autos de processo arbitral em apreço, nem sequer consta a função a estes de qualquer procuração forense, seja pretérita à outorga da Convenção de Arbitragem, seja posterior à sua assinatura ;
· Pelo que o(s) mandatário(s) da Demandante aqui Requerida agiram em nome desta com absoluta falta de poderes para tal ;
· O que determina que conhecendo este Tribunal oficiosamente de tais circunstâncias (falta de procuração, por banda da Requerida e de falta de ratificação do processado, por banda da Requerente), deverá declarar a anulação do Acordo de Arbitragem celebrado em nome das partes e todos os atos ao mesmo subsequentes, qual seja a respetiva decisão arbitral, por manifesta falta de poderes dos respetivos mandatários ;
· E, tomando em linha de conta que tais faltas de poderes são pretéritos à celebração do Acordo de Arbitragem o qual veio constituir o próprio Tribunal Arbitral, o qual deverá ser declarado nulo, s. m. o. tudo terá de regressar a tal origem, ou seja, ao momento anterior à constituição do respetivo Tribunal Arbitral ;
· Por seu lado, o art.° 46, n.° 3, al, a), ponto ii ou iv), e al. b), ponto ii),da LAV,prevê a possibilidade da anulação da sentença arbitral com fundamento na falta de independência ou imparcialidade do(s) árbitro(s) ;
· Os árbitros têm, assim, um dever de independência e de imparcialidade equivalente aos dos juízes, sendo o seu escrutínio transparente, sério e objetivo peça fundamental da credibilidade da arbitragem enquanto meio adjudicatório e definitivo de resolução de litígios ;
· um árbitro nomeado pela parte está tão obrigado aos deveres de independência e imparcialidade como um árbitro nomeado pela instituição arbitral, pelo tribunal judicial, pelas duas partes ou pelos dois árbitros ;
· a declaração de independência do árbitro deverá ser de molde a que as partes sejam totalmente informadas quanto aos factos ou circunstâncias de que o árbitro entendeu revelar ;
· Quanto à forma que deve assumir a obrigação de revelação, esta tem de ser por escrito e na forma de uma declaração de independência, sendo esta a regra consagrada no Código Deontológico do Árbitro (art.° 4,°, n.° 3) e em alguns regulamentos de centros de arbitragem nacionais ;
· à Requerente, quer na primeira arbitragem, quer na segunda arbitragem, não lhe foi dado a conhecer a informação fornecida pelo árbitro nomeado, a qual tem de ser qualificada como muito relevante, de molde a permitir-lhe decidir acerca do acordo sobre sua nomeação ou se, pelo contrário, a devia desde logo afastar ;
· deste modo, a Requerente encontrava-se em erro quanto às qualidades do árbitro e que conduziram à nomeação do árbitro designado como árbitro único ;
. pelo que tal circunstância, por ser absolutamente relevante na escolha de árbitro e a qual - repete-se a mesma nunca foi por qualquer meio ou forma informada - implicará a nulidade do Acordo de Arbitragem e consequentemente do todo o processo arbitral que lhe sucedeu ;
. por outro lado, afigura-se ainda à Requerente que em face da factualidade que só agora também lhe chegou ao conhecimento — acerca da circunstância do árbitro único nomeado constituir árbitro recorrentemente indicado pela sociedade de advogados que patrocinou ao ora Requerida, jamais ter sido sequer revelada — constituir também fundamento para anulação da decisão arbitral ;
. afigurando.se, assim, justificável que a parte questione esses atributos perante uma reiterada nomeação do mesmo árbitro pelos mandatários de uma das partes, sobretudo quando o árbitro não cumpriu o dever de revelação a que se encontra obrigado ;
. estamos perante uma circunstância que não veio a ser sequer revelada antes da constituição do Tribunal Arbitrai ou durante o decurso do respetivo processo, a qual assume particular relevância quando estamos perante um caso particular de Acordo de Arbitragem de Árbitro Único e que é, também ela, fundamento legítimo de anulação da sentença arbitral, e a qual pode e deve ser admitida conhecer após prolação da respetiva sentença arbitral.
A Requerente juntou documentos, tendo a acção sido instaurada, aparentemente, em 04/04/2018.
2 – Em cumprimento do nosso despacho de fls. 132, foi a Requerida devidamente citada, tendo vindo deduzir oposição, conforme fls. 200 a 227, alegando, em súmula, o seguinte:
Por excepção:
  • verifica-se a caducidade do direito de pedir a anulação da sentença arbitral  ;
  • com efeito, tendo sido a acção proposta em 04/04/2018, o prazo de 60 dias previsto no nº. 6. do artº. 46º, da Lei da Arbitragem Voluntária já se encontrava esgotada em tal data ;
  • efectivamente, o despacho de esclarecimento da sentença arbitral data de 22/01/2018, sendo esta a data a ter em conta para o início da contagem daquele prazo, independentemente da data da notificação dessa decisão ;
  • pelo que o prazo para requerer a anulação terminou em 23/03/2018 ;
  • tendo a Requerente deixado caducar o seu direito de pedir a anulação da decisão arbitral ;
  • ademais, ainda que se considerasse que a data relevante para o começo daquele prazo de 60 dias seria a data em que a parte  tomou conhecimento do despacho de esclarecimento, tal ocorreu no próprio dia 22/01/2018, pelo que o prazo para requerer a anulação terminava igualmente no dia 23/03/2018 ;
  • ademais, ainda que se considerasse que a notificação havia sido efectuada em 23/01/2018, e que o primeiro dia para a propositura da acção fosse o 24/01/2018, o prazo terminaria no dia 26/03/2018 (termina a 24/03/2018, sábado, pelo que se transferia para o primeiro dia útil seguinte) ;
  • com efeito, o período entre 25/03 e 02/04/2018 correspondeu a férias judiciais, mas aquele prazo de 60 dias não suspendeu durante aquele período, pois trata-se de um prazo substantivo de caducidade, e não um prazo processual ;
  • por outro lado, a tal prazo não acrescem os dias de multa previstos no nº. 5, do artº. 139º, do Cód. de Processo Civil ;
  • ademais, ainda que se considerasse tal prazo interrompido naquele período de férias judiciais, , tal prazo terminaria no dia 03/04/2018 ;
  • donde, a propositura da acção em 04/04/2018 surge como extemporânea, devendo a Requerida ser absolvida do pedido ;
    Por impugnação:
  • em 28 de Janeiro de 2016 foi outorgado entre a Lusotur e a Bogarve um acordo de arbitragem, o denominado Primeiro Acordo de Arbitragem ;
  • da parte da Lusotur, Ora Requerida, tal 1º acordo foi subscrito por parte do seu Mandatário NS…, ao abrigo de procuração outorgada em 23/11/2015 ;
  • enquanto por parte da Bogarve, ora Requerente, foi subscrito pelo mandatário JA.., ao abrigo de procuração outorgada em 27/01/2016 ;
  • já consta do Primeiro Acordo de Arbitragem (cláusula 3ª) a declaração do árbitro que a ora Requerente alega desconhecer ;
  • todavia, apesar de tal alegação de desconhecimento, a simples assinatura de tal Acordo de Arbitragem por parte do mandatário da Requerente determina que a Requerente adquiriu conhecimento da mesma ;
  • pois, o conhecimento da Requerente, enquanto pessoa colectiva, é formado não apenas pelas pessoas singulares que compõem a sua administração, mas também pelas pessoas singulares mandatadas pela administração para praticar actos em sua representação ;
  • por outro lado, as circunstâncias reveladas pelo Árbitro nomeado foram-no cautelarmente, pois nada na lei, regulamentos ou soft law obrigava sequer à sua revelação ;
  • pois, tais circunstâncias em nada inquinam a independência ou a imparcialidade do Árbitro ;
  • sendo irrelevantes, pelo que o Sr. Árbitro poderia até nunca ter revelado tais factos, tendo-o feito apenas pela sua preocupação em ser absolutamente transparente ;
  • ademais, a Primeira Decisão Arbitral transcrevia na íntegra, e logo na sua segunda página, as circunstâncias anteriormente reveladas pelo Árbitro no Primeiro Acordo de Arbitragem ;
  • pelo que os administradores da Requerente não terão deixado de consultar tal processo e de ler o teor daquela decisão arbitral, atenta a confessada importância que o processo tinha para a mesma ;
  • nada tendo feito ou dito a ora Requerente, pois a Primeira Decisão Arbitral foi-lhe favorável ao considera improcedentes os pedidos da Lusotur ;
  • tendo sido evidente a satisfação das partes com a prestação do Árbitro RP… naquela Primeira Arbitragem ;
  • donde, contrariamente ao que alega,  a Requerente sempre conheceu acerca das circunstâncias reveladas pelo Árbitro ;
  • não passando a presente acção de uma tentativa oportunista de reverter a Segunda Decisão Arbitral, por esta lhe ter sido desfavorável ;
  • o Segundo Acordo de Arbitragem foi celebrado em 24 de Fevereiro de 2017, pelos mandatários que já haviam subscrito o Primeiro Acordo de Arbitragem ;
  • tendo sido subscrito ao abrigo das procurações outorgadas pela Bogarve e Lusotur antes da Primeira Arbitragem , que se encontravam plenamente em vigor, pois não haviam sido revogadas ;
  • tendo-se, ainda, clausulado no nº. 4, da Cláusula 6ª do Segundo Acordo de Arbitragem não ser necessário juntar aos autos documentos que já se encontrem juntos na Primeira Arbitragem ;
  • o que incluía, obviamente, as procurações que haviam sido juntas aos autos na Primeira Arbitragem ;
  • mais, uma vez, após as partes terem escolhido o Professor RP… como Árbitro, atenta a ponderação e imparcialidade demonstrada, por cautela, este após a mesma declaração no Segundo Acordo de Arbitragem ;
  • sendo evidente que os administradores da ora Requerente sempre estiveram a par da celebração deste Acordo e do litígio existente ;
  • embora tal não fosse necessário, nos termos já explicitados, em 05/05/2017, a Bogarve, ora Requerente, outorgou a favor do seu Mandatário nova procuração ;
  • vindo a apresentar contestação em 08/05/2017 ;
  • sendo que todos os actos processuais praticados pela Bogarve foram-no sempre ao abrigo de todos os poderes necessários para o efeito ;
  • pelo que nenhum acto praticado pelo Advogado JA… carecia de ratificação ;
  • ademais, ainda que assim não fosse, e caso inexistisse sequer qualquer convenção arbitral, aquando da apresentação da sua contestação, em 08/05/2017, a Requerente teria logo que ter suscitado a incompetência do tribunal arbitral, sob pena de não mais o poder fazer ;
  • a Requerente sempre esteve a par da Segunda Arbitragem e vicissitudes desta, não só pelo facto de ter estado devidamente representada em juízo pelo indicado Advogado, como ainda pelo facto do seu administrador CJ… ter estado presente em todas as diligências probatórias da Segunda Arbitragem ;
    Do Direito:
  • nos termos do artº. 14º da Lei da Arbitragem Voluntária, o Árbitro teria que ser recusado pela Requerente no prazo de 15 dias a contar do conhecimento do facto, ou seja, 15 dias após 28/01/2016, data em que foi assinado o 1º Acordo de Arbitragem ;
  • por outro lado, o estatuído na cláusula 9ª do Contrato outorgado entre partes, que constitui uma cláusula compromissória, era perfeitamente modificável pelas partes mediante documento particular, conforme decorre do nº. 2, do artº. 221º, do Cód. Civil ;
  • pelo que, respeitados os requisitos enunciados no artº. 2º da Lei da Arbitragem Voluntária, nada obstava a que as partes determinassem regras de composição e funcionamento do tribunal arbitral distintas das previstas na cláusula 9ª do Contrato ;
  • assim, a partir do momento em que a cláusula compromissória foi alterada aquando do Primeiro Acordo de Arbitragem, a mesma passou a vigorar para posteriores demandas relativas ao mesmo litígio ;
  • acresce que existiu renúncia da Requerente à impugnação da Segunda Decisão Arbitral, nos termos do nº. 4, do artº. 18º e nº. 4, do artº. 46º,ambos da LAV ;
  • com efeito, nunca poderia a Requerente vir, neste momento, impugnar a Segunda Decisão Arbitral, com fundamento na ausência de acordo arbitral, ou com base num pretenso desrespeito pela cláusula compromissória do Contrato  ;
  • pois, a fazê-lo, tal teria que ter ocorrido com a apresentação da contestação, em 08/05/2017, na qual poderia então invocar a incompetência do tribunal arbitral ou o incumprimento da convenção de arbitragem ;
  • destinando-se o nº. 4, do artº. 46º, da LAV, precisamente, a evitar comportamentos como o da Requerente, a qual participa na arbitragem aguardando um resultado favorável e, depois de conhecer a decisão final, impugna-a com base em facto que teve conhecimento no decurso do processo e que poderia ter suscitado atempadamente ;
  • o Segundo Acordo de Arbitragem foi assinado pelas pessoas possuidoras de todos os poderes de representação da Requerente e Requerida, em consequência das procurações outorgadas, nos termos supra descritos ;
  • mas, ademais, ainda que não existisse qualquer acordo arbitral, ainda assim a incompetência do tribunal teria que ser suscitada na contestação, sob pena de renúncia ;
  • subsidiariamente, ainda que o subscritor do Segundo Acordo de Arbitragem, por conta da ora Requerente, não estivesse munido dos devidos poderes para o subscrever em sua representação, e ainda que não existisse a norma prevista no nº. 4 do artº. 18º e nº. 4, do artº. 46º,ambos da LAV, ainda assim se teria que concluir que a Requerente sempre teria ratificado o Segundo Acordo de Arbitragem ;
  • com efeito, a convenção de arbitragem não constitui um acto processual, mas sim um negócio jurídico de natureza contratual, não sendo aplicáveis as regras de ratificação do Cód. de Processo Civil, mas sim as regras gerais do Cód. Civil ;
  • ora, é patente que a Requerente ratificou o Segundo Acordo de Arbitragem, pois, por um lado, em 05/05/2017, conferiu mandato forense para que o Advogado JA… interviesse em sua representação na Segunda Arbitragem e, por outro lado, a própria Requerente fez-se representar nas diligências probatórias da Segunda Arbitragem pelo seu administrador CJ… ;
  • pelo que, afirmar que não teria ratificado o Segundo Acordo de Arbitragem constitui manifesto abuso de direito, na vertente de venire contra factum proprium ;
  • por outro lado, a procuração outorgada pela ora Requerente ao Advogado JA… data de 05/05/2017, sendo a contestação da Bogarve de 08/05/2017, pelo que o 1º acto processual foi praticado ao abrigo dos poderes expressos conferidos para o efeito, pelo que nada havia a ratificar ;
  • por via do mecanismo da imputação normativa do conhecimento às sociedades comerciais, a Requerente sempre conheceu e aceitou as circunstâncias reveladas pelo Árbitro ;
  • com efeito, o conhecimento e percepção da Requerente, enquanto pessoa colectiva, é também formado pelas pessoas singulares mandatadas pela administração para praticar actos em sua representação (conhecimento normativo) ;
  • e, para além de tal conhecimento normativo, acresce o seu dever de não ignorar a existência e conteúdo do Primeiro Acordo de Arbitragem, da Primeira Decisão Arbitral e do 2ª Acordo de Arbitragem ;
  • Inexiste, igualmente, qualquer erro da Requerente relativamente às qualidades do Árbitro ;
  • Em primeiro lugar, é falsa a alegação de que o Árbitro seria recorrentemente indicado pela sociedade de advogados que representou a Lusotur, ora Requerida, na Primeira e Segunda Arbitragens ;
  • Pelo que inexiste qualquer erro da Requerente quanto a esta pseudo-circunstância ;
  • Por outro lado, inexiste qualquer fundamento para considerar a Requerente em erro quanto ao árbitro da Primeira e Segunda arbitragens ;
  • Ademais, nos termos do artº. 259º, do Cód. Civil, tendo determinado a Requerente, na procuração outorgada, que a escolha do árbitro caberia ao seu representante – sem especificar as características relevantes desse árbitro -, qualquer hipotético erro respeitante às qualidades do árbitro único teria de se verificar na pessoa do represente da Requerente, ou seja, o Advogado JA… ;
  • É total a independência e imparcialidade do Árbitro nomeado ;
  • As circunstâncias reveladas pelo Árbitro são imprestáveis para sustentar um pedido de anulação da Segunda Decisão Arbitral ;
  • Tais circunstâncias nem sequer se enquadram naquelas que devem obrigatoriamente ser reveladas às partes numa arbitragem ;
  • Sendo evidente que tais circunstâncias reveladas pelo Árbitro no Primeiro Acordo de Arbitragem, reiteradas na Primeira Decisão Arbitral e referidas no Segundo Acordo de Arbitragem não constituem qualquer reconhecimento da existência de um conflito de interesses ;
  • Acresce que os Códigos Deontológicos da APA e do CAC não consideram as circunstâncias reveladas pelo Árbitro no Primeiro Acordo de Arbitragem, reiteradas na Primeira Decisão Arbitral e referidas no Segundo Acordo de Arbitragem como inquinadoras da independência e imparcialidade de um árbitro ;
  • E, segundo a IBA Guidelines, as circunstâncias reveladas pelo árbitro estão até excluídas das situações em que poderia eventualmente verificar-se um conflito de interesses ;
  • A Requerente litiga com má-fé, ao ter distorcido, deturpado e omitido vários factos relevantes, os quais eram do seu pessoal conhecimento, não podendo invocar o desconhecimento dos mesmos ;
  • Litiga, ainda, de má-fé, ao saber que a sua pretensão carece de qualquer fundamento jurídico, deduzindo pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar ;
  • Pelo que, nos termos dos artigos 542º, nº. 1 e 543º, nº. 1, ali. a), ambos do Cód. de Processo Civil, deve a Requerente ser condenada no reembolso das despesas a que obrigou a Requerida, nomeadamente no valor dos honorários dos seus mandatários, a apurar em incidente próprio ;
  • O indicado valor da causa é manifestamente inadequado como valor da presente demanda ;
  • Pelo que, nos termos do nº. 2, do artº. 297º, do Cód. de Processo Civil, o valor da presente causa deverá ser fixado em € 12.523.001,51.
    Conclui, no seguinte sentido:
    I) Que o pedido de anulação do Segundo Acordo de Arbitragem, dos actos praticados na Segunda Arbitragem e da Segunda Decisão Arbitral seja julgado improcedente, por caducidade do prazo para a sua apresentação ;
    Caso assim não se entenda,
    II) Deve o pedido de anulação do Segundo Acordo de Arbitragem, dos actos praticados na Segunda Arbitragem e da Segunda Decisão Arbitral ser julgado improcedente, por não provado ;
    III) Deve a Requerente ser condenada como litigante de má-fé e, como tal, condenada a indemnizar a Requerida pelas despesas que a sua má-fé obrigou ;
    IV) Deve o valor da causa ser fixado em € 12.523.001,51 (doze milhões, quinhentos e vinte e três mil e um euros e cinquenta e um cêntimos).
    A Requerida juntou 12 documentos, tendo a oposição sido apresentada em 08/06/2018.
    3 – Conforme despacho datado de 11/09/2018 – cf., fls. 346 -, determinou-se a notificação da Requerente para, querendo, responder às excepções invocadas e pronunciar-se sobre a imputada litigância de má-fé e incidente de verificação do valor da causa.
    4 – Em resposta, veio a Requerente apresentar o articulado de fls. 349 a 359, alegando, em súmula, o seguinte:
    Da excepção de caducidade do direito à anulação da sentença arbitral
    § O pedido de anulação da sentença arbitral deu entrada na secretaria do tribunal no dia 03/04/2018 ;
    § O prazo de 60 dias para apresentar o pedido de anulação conta-se a partir da data de notificação da decisão sobre o pedido de rectificação, aclaração, modificação ou liquidação, efectuado nos termos do artº. 45º ;
    § Mesmo admitindo-se como boa e válida a notificação operada pela secretaria no dia 22/01/2018, nos termos da alínea bb) das regras processuais que constituem anexo ao Acordo de Arbitragem, tem de considerar-se notificada a Requerente no dia 23/01/2018, iniciando-se a contagem do prazo no dia 24/01/2018 ;
    § O prazo de anulação de acção arbitral trata-se de um prazo processual, ao qual é aplicável as regras de contagem de prazos previstas nos artigos 138º e segs., do Cód. de Processo Civil, suspendendo-se durante as férias judiciais ;
    § Mesmo a entender-se que o prazo de 60 dias é um prazo de caducidade, tendo natureza substantiva, sempre o mesmo teria que ser contado nos termos da alínea e), in fine, do artº. 279º, do Cód. Civil, conforme o artº. 296º, do mesmo diploma ;
    § Devendo-se, ainda, abranger o dia de sábado como dia não útil, tal como o domingo e os dias feriados ;
    § Pelo que, mesmo assim, o prazo de 60 dias, terminando em dia não útil (sábado), e sendo tal acto (propositura da acção) que ser forçosamente praticado em juízo, aplicar-se-á, no limite, a alínea e), do artº. 279º, transferindo-se para o primeiro dia em que efectivamente os tribunais abriram, ou seja, 03/04/2018 ;
    § Pelo que deve a acção ser considerada tempestiva e julgada improcedente a excepção de caducidade arguida pela Requerida ;
    Da litigância de má-fé
    § Mais não faz a Requerente do que defender aqueles que entende serem os seus legítimos interesses, pelo que não deve ser atendido o seu pedido de condenação como litigante de má-fé ;
    Do valor da causa 
    § No âmbito da acção de anulação de sentença arbitral, o valor da causa deve ser equivalente ao do valor da condenação imposta pela sentença arbitral que se pretende anular, tendo em vista a utilidade económica imediata do pedido, tal como previsto no artº. 296º, nº. 1, do Cód. Civil.
    Conclui, no sentido da improcedência do peticionado pela Requerida, com as legais consequências.
    5 – Conforme despacho de fls. 400, nos termos do artº. 46º, nº. 2, alín. d), da Lei da Arbitragem Voluntária, foi designada data para a produção da prova arrolada, o que veio a concretizar-se em 07/03/2019, conforme acta de fls. 1057-A e 1057-B.
    6 – Após a produção de outras diligências instrutórias e colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir.
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    II – ÂMBITO DAS QUESTÕES DECIDENDAS
    No âmbito da presente acção de impugnação da sentença arbitral, sob a forma de pedido de anulação, na consideração do âmbito da pretensão inicial deduzida pela Requerente Bogarve, S.A., urge apurar acerca:
    I) Da manifesta falta de poderes do(s) mandatário(s) para outorgar convenção de arbitragem e ausência de ratificação pelo(s) mesmo(s) do anteriormente processado – cf., artº. 46º, nº. 3, alín. a), ponto i), da Lei da Arbitragem Voluntária [2] ;
    II) Da imparcialidade e independência do árbitro nomeado – cf., artº. 46º, nº. 3, alín. a), pontos ii) ou iv), e alín. b), ponto ii).
    Para além do exposto, na ponderação da natureza, amplitude e âmbito da oposição apresentada relativamente à pretensão de demandante Requerente, as questões apreciandas enunciam-se nos seguintes termos:
    Ø Da caducidade do direito de pedir a anulação da sentença arbitral ;
    Ø Do eventual preenchimento das causas de anulação aduzidas na petição inicial ;
    Ø Do eventual incumprimento do prazo de recusa do árbitro nomeado, nos termos do nº. 2, do artº. 14º ;
    Ø Da possibilidade/admissibilidade de modificação da cláusula compromissória ;
    Ø Da alegada renúncia da Requerente à impugnação da decisão arbitral, nos termos dos artigos 18º, nº. 4 e 46º, nº. 4 ;
    Ø Dos poderes dos mandatários e da (des)necessidade de ratificação do Segundo Acordo de Arbitragem e do processado na Segunda Arbitragem ;
    Ø Do conhecimento, pela Requerente, das circunstâncias reveladas pelo Árbitro ;
    Ø Da (in)existência de erro da Requerente relativamente às qualidades do Árbitro nomeado ;
    Ø Da independência e imparcialidade do Árbitro ;
    Ø Da imputada litigância de má-fé da Requerente.
    Aprioristicamente, e a título incidental, urge, ainda, conhecer acerca do valor da causa
    QUESTÃO PRÉVIA: do valor da causa
    No âmbito da oposição apresentada, alega a Requerida que o valor da causa indicado pela Requerente - € 498.798,00 – não pode ser considerado, pois é manifestamente inadequado como valor da presente demanda.
    Com efeito, e de acordo com o nº. 1, do artº. 297º, do Cód. de Processo Civil, o benefício a obter com a Requerente com a eventual anulação do Segundo Acordo de Arbitragem, do processado na Segunda Arbitragem e da Segunda Decisão Arbitral, pelo que, caso tal pedido viesse a ser julgado procedente, as partes voltariam á “estaca zero” no que concerne ao litígio relativo ao contrato que a Segunda Arbitragem dirimiu, voltando as partes a recorrer à arbitragem para solucioná-lo.
    Ora, o somatório dos pedidos económicos formulados por ambas as partes corresponde ao montante de € 12.523.001,51, valor que deve ser considerado, nos termos do nº. 2, do artº. 297º, do Cód. de Processo Civil.
    Na resposta apresentada, refere a Requerente que no âmbito da acção de anulação de sentença arbitral, o valor da causa deve ser equivalente ao do valor da condenação imposta pela sentença arbitral que se pretende anular, tendo em vista a utilidade económica imediata do pedido, tal como previsto no artº. 296º, nº. 1, do Cód. Civil.
    Decidindo:
    Prescreve o nº. 1, do artº. 296º, do Cód. de Processo Civil, prevendo acerca da atribuição e valor à causa e sua influência, que “a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”.
    Acrescentam os nºs. 1 e 2 do normativo seguinte – 297º -, que define os critérios gerais para a fixação do valor, que “se pela ação se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; se pela ação se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício.
    2 - Cumulando-se na mesma ação vários pedidos, o valor é a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles; mas quando, como acessório do pedido principal, se pedirem juros, rendas e rendimentos já vencidos e os que se vencerem durante a pendência da causa, na fixação do valor atende-se somente aos interesses já vencidos”.
    Estatuindo acerca do valor da acção determinado pelo valor do acto jurídico, prescrevem os nºs. 1 e 2, do artº. 301º, do mesmo diploma, que “quando a ação tiver por objeto a apreciação da existência, validade, cumprimento, modificação ou resolução de um ato jurídico, atende-se ao valor do ato determinado pelo preço ou estipulado pelas partes.
    2 - Se não houver preço nem valor estipulado, o valor do ato determina-se em harmonia com as regras gerais”.
    Formulando pedido de anulação da sentença arbitral, ao qual subjaz a pretensão de anulação do Acordo de Arbitragem datado de 24/02/2017 e demais actos praticados no âmbito do processo arbitral, a Requerente indicou como valor da acção a quantia de 498.798,00 €.
    No âmbito do processo arbitral fonte do presente pedido de anulação, que tramitou sob o nº. …/2017/AHC/…, em que figuraram como demandante a Vilamoura Lusotur S.A., ora Requerida, e como demandada a Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., foi decidido:
    1º declarar “a resolução do contrato celebrado entre Vilamoura Lusotur, S.A. (então denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A.) e Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., por meio de escritura pública intitulada «Permuta» lavrada em 31 de Dezembro de 2003 no cartório notarial de Loulé, a fls. 33 e seguintes do livro 383-C, determinando-se, em consequência da resolução:
    a) o cancelamento das inscrições registrais feitas com base em tal escritura, nomeadamente a de aquisição a favor da Bogarve - Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A. e de reserva de propriedade a favor da Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A. (denominação anterior da Vilamoura Lusotur S.A.), identificadas pela apresentação 55 de 2004/10/19 ;
    b) A condenação da Vilamoura Lusotur, S.A. a restituir à Bogarve - Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A. a quantia de 498.798,00 € referida na escritura em causa como estando já pagos na data da mesma, em execução das obrigações contratuais” ;
    2º julgar “improcedente o pedido da Demandante de condenação da Demandada a pagar-lhe € 570.698,51, acrescido de juros” ;
    3º  julgar “improcedentes todos os pedidos da Demandada”.
    Estes pedidos da Demandada, formulados reconvencionalmente no aludido processo Arbitral, consubstanciavam-se no seguinte:
    - ser a demandante/reconvinda “condenada a entregar à Demandada e Reconvinte o prédio do Antigo Casino de Vilamoura, livre de pessoas e coisas, no prazo de seis meses, contados da data da notificação da sentença ;
    - ser a Reconvinda condenada a pagar à Reconvinte uma sanção pecuniária compulsória, de 1.000,00 €, por cada dia em que o prédio não lhe tiver sido entregue, totalmente devoluto, a contra do prazo de seis meses, contados da notificação da sentença.
    Ser a Reconvinda condenada a pagar à Reconvinte, a título de indemnização, a quantia de 11.702.333,00 € (onze milhões setecentos e dois mil trezentos e três euros), a que acrescerá o equivalente a 5%, ao ano, sobre 7.702.303,00 €, pelo tempo que decorrer, desde 1 de Janeiro de 2017, até à entrega à Reconvinte do prédio livre e devoluto de pessoas e coisas ;
    - ser declarado extinto, por compensação, o crédito da Demandante e Reconvinda sobre a Demandada e Reconvinte, relativo à 2ª prestação prevista no Contrato de Permuta ;
    - ser a Demandante condenada a reembolsar a Reconvinte do que esta tiver que despender com a actualização dos projectos de arquitetura e de especialidades.
    - ser a Demandante condenada, como litigante de má-fé, a indemnizar a Demandada no montante de 250.000,00 €, por causa do incómodo causado, e reembolsá-la das despesas que ela realizar por causa deste processo, incluindo com peritos, advogados e outros mandatários, a liquidar em execução de sentença” – cf., o teor de fls. 27 da Decisão Arbitral, correspondente a fls. 40 dos presentes autos.  
    Inexiste qualquer norma específica a atribuir valor à presente acção de anulação de decisão arbitral.
    Estando em equação a anulação de decisão arbitral, que constitui acto jurídico, parece tal situação ser enquadrável na norma especial prevista no transcrito artº. 301º, pelo que seria de atender ao valor do ato determinado pelo preço ou estipulado pelas partes, sendo que, caso inexista preço ou valor estipulado, o que sucede no caso sub júdice, o valor do ato determina-se em harmonia com as regras gerais.
    O que, consequentemente, nos faz apelar aos critérios gerais enunciados nos transcritos artºs. 296º e 297º, ambos do Cód. de Processo Civil, pelo o valor da causa deverá ser determinado pelo benefício que se pretende obter, tendo em atenção que o mesmo representa a utilidade económica imediata do pedido.
    Nas palavras do douto Acórdão desta Relação e Secção, de 20/01/2011 [3], a pretendida declaração de anulação da sentença arbitral “é uma forma de invalidade com valorização negativa, ou seja, reprovação que a lei faz do acto jurídico e “o acto jurídico é a manifestação de vontade voluntária e conscientemente formada de uma pessoa ou órgão capaz de segundo a valorização que a lei faz, de produzir efeitos jurídicos: As sentenças incluindo os acórdãos, são actos jurídicos.” [4].
    Acrescenta, citando o mesmo aresto que “quando uma sentença proferida em dado processo constitui ela própria o acto jurídico anulando, temos que o valor da acção de anulação, para efeitos processuais, isto é, para determinação do valor da acção cujo objecto é a apreciação da validade da sentença, coincide com o valor do processo em que essa sentença foi proferida.”
    Esta afirmação, do modo como é feita, quase com valor axiomático só pode, todavia, entender-se no contexto do acórdão proferido, muito particularmente se conjugado com o parágrafo que se lhe segue e que é do seguinte teor: “Isto é assim porque o valor, ou seja, nos termos do disposto no art.º 305, n.º 1, do Código do Processo Civil, a utilidade económica imediata da sentença coincide com a própria utilidade económica do pedido formulado na acção em que aquele acto jurídico foi prolatado, quer por essa sentença a acção seja julgada procedente, quer seja julgada improcedente.”
    Há que levar em linha de conta que no acórdão de 25/5/1995 citado, a autora da acção de anulação da decisão arbitral era a mesma autora da acção arbitral, na qual foi pela mesma autora indicado o valor de 7.813.701.000$00, correspondente ao pedido de condenação da “J”, decisão arbitral aquela que julgou a acção totalmente improcedente. Compreende-se que a utilidade económica para a autora da acção de anulação da decisão arbitral tivesse necessariamente de coincidir com o valor que na arbitral pedira e que lhe fora recusado. De igual modo, se a decisão arbitral julgasse totalmente procedente a acção arbitral, a utilidade económica para a parte que tivesse sido condenada, na consequente acção de anulação da mesma decisão arbitral, coincidiria, forçosamente, com o valor da decisão arbitral que, por sua vez, coincidiria com o valor do pedido dessa acção. Todavia, se a decisão arbitral fosse no sentido de julgar parcialmente procedente a acção, com condenação parcial, já a utilidade económica da sentença arbitral não poderia coincidir com a própria utilidade económica do pedido formulado na acção respectiva, na medida em que para o autor ficou aquém da utilidade económica pretendida e para o réu que pretendesse a sua absolvição total ficou também aquém da sua pretensão na medida em que o condenou embora em valor inferior ao pretendido.
    Julgando-se favoravelmente a acção da anulação como pretendido pelos aqui autores (réus na acção arbitral), o que ocorre é que volta a não estar acertado que os aqui autores e ali réus tenham de pagar à aqui ré e ali autora as quantias em que foram condenados na sentença arbitral (acompanha-se de perto o parágrafo 4.º do acórdão do STJ de 25/5/95, na publicação mencionada). Verdadeiramente, ao invés do afirmado na decisão recorrida, o conflito não volta ao ponto inicial, ou seja não volta ao ponto da convenção de arbitragem e renovação do conflito arbitral, o que ocorre na procedência da acção de anulação da decisão arbitral é que as partes ficam livres para recorrer aos tribunais comuns afim de discutirem o seu conflito.
    Conclui-se, assim, que a utilidade económica para os autores desta acção de anulação de decisão arbitral coincide com o valor da condenação arbitral (o valor que a excede, do qual os aqui autores foram absolvidos e que conjugado com o da condenação corresponde ao valor total do pedido na acção arbitral, não traduz nenhuma utilidade económica para os aqui autores)” (sublinhado nosso).
    Ora, nos autos de processo arbitral figurou como Demandante a ora Requerida e como Demandada a ora Requerente.
    Relativamente ao pedido ali apresentado pela Demandante, foi julgado procedente o pedido de resolução do contrato, intitulado Permuta, e improcedente o demais pedido de condenação da Demandada a pagar-lhe a quantia de 570.698,51 €. E, na sequência da procedência daquele pedido de resolução, foi determinada a condenação da Demandante, ora Requerida, a restituir à Demandada, ora Requerente, a quantia já entregue de 498.798,00 €, na execução das obrigações contratuais.
    Pelo que, na adopção do entendimento exposto, afigura-se-nos que a utilidade económica a considerar, para a Requerente da presente acção, deve ser coincidir com o valor da condenação arbitral, decorrente da procedência do pedido de resolução contratual.
    O que determina, nos presentes autos, juízo de improcedência da oposição apresentada, devendo manter-se, como valor da causa, o indicado pela Requerente no requerimento inicial apresentado - € 498.798,00.
    **
    III - FUNDAMENTAÇÃO
    A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
    Produzida a prova, consideram-se PROVADOS os seguintes factos:
    1. No âmbito do Processo Arbitral nº. …/2017/ADHOC/…, que correu trâmites junto do Centro de Arbitragem da Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa, sita em Lisboa, em que figurou como Demandante Vilamoura Lusotur, S.A., e como Demandada Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., foi proferida, em 27 de Novembro de 2017, Decisão Arbitral, a qual consta de fls. 27 a 100 dos presentes autos, e que aqui integralmente se reproduz ;
    2. Tal Decisão (Sentença) Arbitral foi objecto de um pedido de aclaração, o qual veio a ser julgado improcedente, por Despacho prolatado em 22/01/2018, conforme fls. 101 a 103 dos presentes autos, que aqui integralmente se reproduz ;
    3. tendo este Despacho sido notificado, nomeadamente aos Mandatários de Demandante e Demandada, através de e-mail remetido em 22/01/2018 ;
    4. Cuja recepção e leitura não foi acusada pelo Mandatário da Bogarve, S.A., nomeadamente na indicada data de remessa do e-mail ;
    5. Tal processo arbitral surgiu em decorrência de um anterior Processo Arbitral, o qual correu os seus trâmites sob o n.° …/ADHOC/2016, junto do Concórdia - Centro de Conciliação, Mediação de Conflitos e Arbitragem, na qual a ora Requerente foi Demandada (Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A.) e a aqui Requerida foi igualmente Demandante (Vilamoura Lusotur, S.A.) e pelo qual foi decidido, para além do mais, a fixação judicial de prazo contra a aqui Requerente para designadamente cumprir com quanto se comprometeu com a Requerida à luz do sobredito "contrato de permuta" (designadamente a feitura de demolição do prédio melhor identificado no aludido contrato e o pagamento à ora Requerida de determinado montante) ;
    6. Tendo-se ainda decidido condenar a “Demandada a pagar à Demandante € 498.798,00, devidos como segunda pretação da contrapartida pecuniária contratualmente ajustada, considerando-se que o vencimento de tal obrigação se dará por força da notificação desta sentença, na data em que a mesma ocorra”, bem como absolver a Demandada dos demais pedidos ;
    7. Tendo a Demandante Vilamoura Lusotur, S.A., formulado em tal processo os seguintes pedidos:
    “a) Declarar a Resolução do Contrato e, em consequência, ordenar o cancelamento do registo de aquisição a favor da DEMANDANTE efectuado pela apresentação 55 de 2004/10/19 ; e
    b) Condenar a DEMANDADA a pagar € 1.964.121,14 à DEMANDANTE, acrescido de juros legais à taxa comercial até efectivo e integral pagamento ;
     Subsidiariamente, deve o tribunal arbitral:
    a) Condenar a DEMANDADA a pagar imediatamente à DEMANDANTE € 1.664.833,89 sob pena de a DEMANDANTE poder imediatamente resolver o Contrato e exigir à DEMANDADA o pagamento de € 1.964.121,14 ;
    b) Fixar um prazo máximo – não superior a 6 meses – a partir da data da sentença dentro do qual deve ser demolido o Antigo Casino e iniciada a construção do Conjunto, correndo o risco de não obtenção das necessárias licenças e autorizações nesse prazo por conta da DEMANDADA, sob pena de a DEMANDANTE poder imediatamente resolver o Contrato e exigir à DEMANDADA o pagamento de 1.964.121,14 ;
    c) Fixar um prazo – não superior a 18 meses – a partir da data da sentença para que a DEMANDADA (i) conclua a construção do Conjunto e (ii) permute os espaços que, nos termos do Contrato, deverão ser entregues à DEMANDANTE, sob pena de a DEMANDANTE poder imediatamente resolver o Contrato e exigir à DEMANDADA o pagamento de 1.964.121,14 ;
    d) Fixar uma sanção pecuniária compulsória de € 25.000,00 por cada dia de incumprimento das obrigações referidas nas alíneas anteriores” ;
    8. No dia 24/02/2017, foi celebrado entre a Vilamoura Lusotur, S.A., anteriormente denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A., representada por NS…, designada como “Demandante”, e Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., representada por JA…, designada por “Demandada”, e no qual figurou ainda RP…, Advogado, Acordo de Arbitragem (Segundo), o qual se encontra junto aos autos a fls. 104 a 108, e aqui se dá por integralmente reproduzido ;
    9. Consta, nomeadamente, sob os Considerandos D) a H) de tal Acordo, o seguinte:
    “D)
    Que a Demandante e a Demandada designaram como árbitro único o signatário RP… ;
    E)
    Que decorreu uma arbitragem entre a Demandante e a Demandada (“Primeira Arbitragem”), que culminou com a decisão arbitral proferida pelo signatário RP… em 28 de Outubro de 2016 (“Primeira Decisão Arbitral”) ;
    F)
    Que surgiu um novo litígio entre a Demandante e a Demandada relativo ao Contrato ;
    G)
    Que a Demandante e a Demandada estão de acordo em designar novamente como árbitro único o signatário RP… ;
    H)
    Que foram definidas algumas das regras a que a arbitragem obedecerá, além do previsto na cláusula compromissória, e que se mostra conveniente formalizar num único documento essas regras” ;
    10. Constam sob as Cláusulas 1ª, 3ª, 4ª e 5ª do mesmo Acordo de Arbitragem, o seguinte:
    “1ª
    A Demandante e a Demandada reiteram o seu acordo em submeter a arbitragem o litígio que tem por objecto a validade, eficácia, interpretação e o cumprimento do Contrato, designando como árbitro único o signatário RP….

    O árbitro signatário declara aceitar exercer as funções em causa e não conhecer factos que possam levantar dúvidas sobre a sua imparcialidade e independência, para além dos que já foram comunicados às partes em anterior arbitragem.

    Não caberá recurso da decisão arbitral.

    A arbitragem obedecerá às regras constantes do anexo a este acordo e, nos casos omissos, às regras do Regulamento do Centro de Arbitragem da Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa, na versão de 2014” ;
    11. Consta do Anexo referenciado na Cláusula 5ª, denominado “Anexo ao Acordo de Arbitragem Regras processuais” – que aqui integralmente se reproduz -, entre outras, as regras processuais identificadas nas alíneas f), aa), bb) e dd), com o seguinte teor:
    “f) Com excepção dos documentos já juntos na Primeira Arbitragem – os quais não terão que ser juntos novamente -, os documentos para prova dos factos invocados devem ser juntos com a primeira peça processual que refira os factos para cuja prova relevam ; se a parte só tiver acesso ao documento após a junção da peça que o refira, deverá fazer a sua junção no prazo máximo de 10 dias a contar da data em que tenha acesso ao documento, indicando e justificando a data em que teve esse acesso ; o árbitro poderá recusar a junção de documentos feita em infração das regras desta alínea ;
    aa) Os atos do árbitro poderão ser notificados às partes por correio registado, por correio privado (“courier”) e por correio electrónico com aviso de recepção e leitura ;
    bb) As notificações por correio registado consideram-se efectuadas no terceiro dia, que seja útil, posterior ao registo ; as notificações por correio privado consideram-se efectuadas no dia da sua receção ; as notificações por correio electrónico consideram-se efectuadas no dia seguinte ao do seu envio ;
    dd) Os prazos serão contínuos ; aqueles cujo último dia ocorra em sábado, domingo ou feriado terminarão no primeiro dia útil seguinte ; os prazos serão suspensos durante as férias judiciais” ;
    12. No dia 28/01/2016, foi celebrado entre a Vilamoura Lusotur, S.A., anteriormente denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A., representada por NS…, designada como “Demandante”, e Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., representada por JA…, designada por “Demandada”, e no qual figurou ainda RP…, Advogado, Acordo de Arbitragem (Primeiro), o qual se encontra junto aos autos a fls. 234 e 235, e aqui se dá por integralmente reproduzido ;
    13.  Consta, nomeadamente, sob os Considerandos D) e E) de tal Acordo, o seguinte:
    “D)
    Que a Demandante e a Demandada estão de acordo em designar como árbitro único o signatário RP… ;
    E)
    Que, entretanto, foi possível definir algumas das regras a que a arbitragem obedecerá, além do previsto na cláusula compromissória, e que se mostra conveniente formalizar num único documento essas regras” ;
    14. Constam sob as Cláusulas 1ª, 3ª, 4ª e 5ª do mesmo Acordo de Arbitragem, o seguinte:
    “1ª
    A Demandante e a Demandada reiteram o seu acordo em submeter a arbitragem o litígio que tem por objecto a interpretação e o cumprimento do Contrato, designando como árbitro único o signatário RP….

    O árbitro signatário declara aceitar exercer as funções em causa e não conhecer factos que possam levantar dúvidas sobre a sua imparcialidade e independência, tendo, por mera cautela, informado previamente a Demandante e a Demandada ter sido advogado da Garveprasa, SGPS, S.A. e da Grupo Pra, S.A., empresas que integram um grupo empresarial que deteve a Demandante durante alguns anos, num processo arbitral relacionado com a compra que tal grupo empresarial fez, em 2004, de participações representativas de 100% do capital social da Demandante.

    Não caberá recurso da decisão arbitral.

    A arbitragem obedecerá às regras constantes do anexo a este acordo e, nos casos omissos, às regras do Regulamento do Centro de Arbitragem da Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa, na versão de 2014” ;
    15. O mesmo Acordo de Arbitragem (Primeiro) foi subscrito, por parte da Vilamoura Lusotur, S.A., pelo seu mandatário NS…, ao abrigo da procuração forense datada de 23 de Novembro de 2015 ;
    16. Constando desta, entre o mais, que “VILAMOURA LUSOTUR, S.A. (…) confere mandato judicial aos Senhores Drs. DG… e NS… (…), aos quais concede poderes para: (…) outorgar convenções de arbitragem e representar o mandante em processos arbitrais, de mediação, conciliação e em julgados de paz”, conforme procuração junta a fls. 239, que aqui se dá por integralmente reproduzida ;
    17. Nunca tendo tal procuração sido revogada ;
    18. Enquanto que, por parte da Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., foi subscrito pelo seu mandatário JA…, ao abrigo de procuração forense outorgada em 27 de Janeiro de 2016 ;
    19. Constando da mesma, para além do mais, que “BOGARVE – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A. (…) constitui seus bastantes procuradores os Senhores Drs. JA… e CC… (…), a quem, com o de substabelecer, confere poderes forenses gerais e especiais, para confessar, transigir e desistir e, ainda, para concluir e subscrever em sua representação com a sociedade VILAMOURA LUSOTUR, S.A., anteriormente denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A. (…), compromisso arbitral, determinar-lhe a sede, o objecto e o direito aplicável e designar árbitro, que pode ser único, para dirimir o litígio existente entre as duas sociedades relativamente ao cumprimento ou não cumprimento, total ou parcial, por qualquer uma delas, ou por ambas, do contrato de permuta celebrado em 31 de Dezembro de 2003 (….)”, conforme procuração junta a fls. 240, que aqui se dá por integralmente reproduzida ; 
    20. Não constando dos identificados Processos Arbitrais que a mesma tenha sido revogada ;
    21. No dia 29/01/2016, o Árbitro nomeado, RP…, enviou e-mail aos mandatários da Bogarve, S.A., e da Vilamoura Lusotur, S.A., juntando cópias do Primeiro Acordo de Arbitragem, datado de 28/01/2016, do Anexo ao Acordo de Arbitragem Regras processuais, da procuração da Bogarve datada de 27 de Janeiro de 2016 e de Carta enviada à Concórdia datada de 29/01/2016, conforme cópia junta aos autos a fls. 1038 a 1050, que aqui se dá por integralmente reproduzida ;
    22. O administrador da Bogarve, S.A., FC…, emitiu cheque de € 3.075,00, destinado ao pagamento dos custos administrativos com a Primeira Arbitragem ;
    23. Os identificados processos arbitrais tiveram por base o contrato de compra e venda e permuta de bens futuros, celebrado entre a Vilamoura Lusotur, S.A., anteriormente denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A., e a Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., por escritura pública, denominada Permuta, datada de 31/12/2003, e respectivo documento complementar, juntos aos autos a fls. 115 a 124, que se dão por integralmente reproduzidos ;
    24. Constando expressamente sob as alíneas a) e b), da Cláusula nona de tal Documento Complementar que:
    “a) – As partes acordam em submeter todos os litígios emergentes da execução ou interpretação deste contrato ao Tribunal Arbitral, que funcionará em conformidade com o disposto na Lei número trinta e um/oitenta e seis de vinte e nove de Agosto.
    b) – O Tribunal Arbitral será composto por três árbitros, cabendo a cada uma das partes a escolha de um dos árbitros e sendo o Presidente do Tribunal designado por acordo entre as partes ou, na falta deste, pelo Juiz Presidente do Tribunal da Relação de Évora” ;  
    25. Constituindo tal contrato, objecto do litígio, a única actividade exercida pela ora Requerente ;
    26. A ora Requerente Bogarve, S.A., soube que o Segundo Processo Arbitral decorria em moldes distintos dos que haviam sido consagrados na transcrita cláusula nona do Contrato ;
    27. Sabendo, ainda, que o mesmo Processo Arbitral era conduzido por árbitro único, nomeadamente o Professor RP… ;
    28. Ainda no Processo Arbitral identificado em 1. - nº. …/2017/ADHOC/… (Segundo Processo Arbitral) -, a petição foi apresentada pela Lusotur, S.A., em 27/03/2017, tendo a contestação sido apresentada pela Bogarve, S.A. em 08/05/2017 ;
    29. No mesmo Processo foi junta, em 16/05/2017, pela Demandada Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., procuração forense a favor dos Senhores Drs. JA… e CC…
    30. Consta de tal procuração ter sido outorgada em 05 de Maio de 2017, e conferir “poderes forenses gerais e especiais, para confessar, transigir e desistir e, ainda, para concluir e subscrever em sua representação com a sociedade VILAMOURA LUSOTUR, S.A., anteriormente denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A. (…) compromisso arbitral, determinar-lhe a sede, o objecto e o direito aplicável e designar árbitro, que pode ser único, para dirimir o litígio existente entre as duas sociedades, relativamente ao cumprimento ou não cumprimento, total ou parcial, por qualquer uma delas, ou por ambas, do contrato de permuta celebrado em 31 de Dezembro de 2003 (….)” ;
    31. Tal procuração não prevê qualquer ratificação do anteriormente processado ;
    32. Consta a fls. 127 dos presentes autos uma Declaração, datada de 02 de Abril de 2018, emitida por AS…, Secretária de Processos, do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, com o seguinte teor:
    “Declara-se, para os devidos e legais efeitos, que o Senhor Dr. DA…, esteve, na presente data, a consultar a versão em papel do processo ad hoc, registado com o nº. …/2017/AHC/…, e que correu os seus termos neste Centro de Arbitragem Comercial, não tendo sido possível encontrar nos autos – quer em papel, quer em versão digital – a procuração forense da Demandante VILAMOURA LUSOTUR, S.A.” ;
    33. Não tendo a ora Requerente encontrado, nos autos físicos daquele Processo Arbitral, qualquer procuração emitida pela ora Requerida VILAMOURA LUSOTUR, S.A., anteriormente denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A. ;
    34.Os presentes autos de acção especial de anulação de sentença arbitral foram apresentados na secretaria judicial deste Tribunal da Relação no dia 03/04/2018 ;
    35. O Árbitro nomeado em ambos os Processos Arbitrais nunca foi Advogado da Lusotur, S.A. ;
    36. Tendo a assessoria do mesmo à Grupo PRA, S.A., e à Garveprasa, SGPS, S.A., feita constar em ambos os Acordos de Arbitragem, decorrido no âmbito de um único processo arbitral ;
    37. Tal Árbitro não era recorrentemente nomeado como árbitro pela sociedade de advogados de que fazem parte os mandatários da Vilamoura Lusotur, S.A. (ora Requerida) ;
    38. Possuindo o representante (mandatário forense) da Bogarve, S.A., todas as condições para aferir acerca da sua adequação para o desempenho das funções de Árbitro único ;
    39. A afirmação da Requerente Bogarve, S.A., que o Árbitro único nomeado na Primeira e Segunda Arbitragens – o Professor Doutor RP… -, era recorrentemente nomeado pela sociedade de advogados de que fazem parte os mandatários da Requerida Vilamoura Lusotur, S.A., fundou-se em rumores e no que alegadamente um dos seus administradores ouviu falar a “outros advogados”, de forma genérica ;
    40. Não tendo a mesma Requerente tido o cuidado de, previamente, averiguar acerca da veracidade de tais factos ;
    41. Durante o Primeiro Processo Arbitral a Bogarve, S.A., esteve sempre representada pelo seu mandatário, o Advogado JA… ;
    42. Tendo intervindo na Primeira Arbitragem, como testemunhas arroladas pela Bogarve, S.A., FC…, administrador a sócio de tal sociedade, e CM…, sócio da mesma sociedade ;
    43. A Sentença Arbitral (Primeira) foi proferida em 28 de Outubro de 2016, conforme consta do teor da mesma, junto aos autos a fls. 257 a 328, que aqui integralmente se reproduz ;
    44. Tendo sido notificada aos Mandatários de Demandante e Demandada, através de e-mail remetido em 28/10/2016 ; 
    45. Transcrevendo a mesma, na segunda e terceira páginas, as circunstâncias reveladas pelo Árbitro na Cláusula 3ª do Primeiro Acordo de Arbitragem ;
    46. As quais, pelo menos desde data não determinada do Primeiro Processo Arbitral, sempre foram do conhecimento da administração da ora Requerente Bogarve, S.A. ;
    47. Que nunca levantou qualquer objecção às mesmas ;
    48. Tendo, apesar disso, alegado tal desconhecimento nos termos expostos no requerimento inicial ;
    49. À mesma Requerente nunca lhe foi comunicada a declaração de aceitação, disponibilidade, independência e imparcialidade em modelo fornecido pelo Centro de Arbitragem que veio a ser escolhido ;
    50. No âmbito do Primeiro Processo Arbitral foram apresentadas alegações escritas pela Demandada Bogarve, S.A., na qual esta, através do seu Mandatário, refere que “desta arbitragem resultou, antes do mais, demonstrado o acerto da Demandante e da Demandada ao enveredarem pela solução do Árbitro único e, mais, ao escolherem para o cargo e o encargo o Senhor Doutor RP…. Se a ciência do Preclaro Jurista não carecia de demonstração, menos ainda de glosa, importa acrescentar-lhe a exibição, que deleitou, de sentido de equilíbrio e de justiça e a sensatez com que desempenhou o seu cargo” ;
    51. Durante o Segundo Processo Arbitral a Bogarve, S.A., fez-se representar, pelo seu administrador CJ…, nas seguintes diligências de prova:
    - em 04/09/2017, na inspecção do prédio discutido nos autos e inquirição de testemunhas ;
    - em 06/09/2017, à inquirição de testemunhas.
    E consideram-se NÃO PROVADOS os seguintes factos:
    i) Que só após a prolação da Segunda Sentença Arbitral, a ora Requerente Bogarve, S.A., tenha tido conhecimento das circunstâncias reveladas pelo Árbitro na Cláusula 3ª do Primeiro Acordo de Arbitragem, reproduzidas na Primeira Sentença Arbitral e reiteradas no Segundo Acordo de Arbitragem ;
    ii) Sendo até aí absolutamente desconhecidas da mesma ;
    iii) Que, antecedentemente à prolação daquela Segunda Sentença Arbitral, nunca a mesma Requerente tenha sido informada, por qualquer forma ou meio e fosse por quem fosse, quer na Primeira, quer na Segunda Arbitragens, da factualidade revelada pelo Árbitro naquelas circunstâncias, de forma a permitir-lhe decidir acerca do acordo sobre a sua nomeação, ou se, pelo contrário, a devia desde logo afastar ;
    iv) Que o Árbitro único nomeado na Primeira e Segunda Arbitragens – o Professor Doutor RP… -, seja, com bastante frequência, o árbitro indicado pelas partes patrocinadas pelos advogados pertencentes à sociedade de advogados Uria Menendez Proença de Carvalho, onde se inserem os mandatários que patrocinaram a ora Requerida, em ambas as arbitragens ;
    v) Que à data da outorga do Segundo Acordo de Arbitragem a ora Requerente Bogarve, S.A., não tivesse atribuído ao Dr. JA… quaisquer poderes forenses, e que estes apenas lhe tenham sido atribuídos pela procuração referenciada em 30. ;
    vi) Que à data da outorga do mesmo Segundo Acordo de Arbitragem, pelo mandatário da ora Requerida Vilamoura Lusotur, S.A., esta não lhe tivesse conferido os poderes necessários para tal outorga ;
    vii) Que o mandatário da ora Requerente Bogarve, S.A., Dr. JA…, não tenha dada a conhecer a esta o conteúdo do Segundo Acordo de Arbitragem ;
    viii) Que os presentes autos de acção especial de anulação de sentença arbitral tenham sido apresentados na secretaria judicial deste Tribunal da Relação no dia 04/04/2018 ;
    ix) Que a ora Requerente Bogarve, S.A., tenha tomado conhecimento do despacho referenciado em 2. e 3. no dia 22/01/2018 ;
    x) Que as regras referenciadas em 24. tenham sido adaptadas pela Bogarve, S.A., e pela Vilamoura Lusotur, S.A., em virtude destas considerarem tais regras como inadequadas à resolução do referido litígio (desde logo, pelo excessivamente curto prazo de decisão) ;
    xi) Que a assessoria descrita em 36. tenha decorrido durante pouco mais de um ano, nomeadamente de 16/04/2009 a 10/08/2010, cerca de cinco anos e meio antes da assinatura do Primeiro Acordo de Arbitragem ;
    xii) Que o grupo empresarial que integrava as empresas Grupo PRA, S.A., e Garveprasa, SGPS, S.A., tivesse deixado de ter participações na Vilamoura Lusotur, S.A., desde 2010 ;
    xiii) Que o conhecimento da administração da ora Requerente Bogarve, S.A., referenciado em 46., ocorresse, precisamente, desde 28/01/2016, data do Primeiro Acordo de Arbitragem ;
    xiv) Que as circunstâncias referidas pelo Árbitro na Cláusula 3ª do Primeiro Acordo de Arbitragem sempre tivessem sido do conhecimento da ora Requerente Bogarve, S.A. ;
    xv) Que a ora Requerente Bogarve, S.A., soubesse que o Árbitro único nomeado na Primeira e Segunda Arbitragens – o Professor Doutor RP… -, não era recorrentemente nomeado pela sociedade de advogados de que fazem parte os mandatários da Requerida Vilamoura Lusotur, S.A. ;
    xvi) Que a Requerente Bogarve, S.A., tivesse proposto a presente acção, deduzindo o respectivo petitório, bem sabendo que havia renunciado à possibilidade de impugnar a Segunda Sentença Arbitral, com fundamento na incompetência do tribunal ou pretenso desrespeito por disposições derrogáveis da LAV ou condições enunciadas na convenção de arbitragem, por não ter deduzido de imediato a respectiva oposição ;
    xvii) Que, apesar de alegar que não, a mesma Requerente bem soubesse que o advogado a quem outorgou procuração tinha todos os poderes para assinar, em sua representação, o Segundo Acordo de Arbitragem e para a representar no Segundo Processo Arbitral ;
    xviii) Que a mesma Requerente Bogarve, S.A., bem soubesse não estar em erro quanto à alegação de que o Árbitro RP… seria recorrentemente nomeado árbitro de parte pela sociedade de advogados que representou a Lusotur na Primeira e Segunda Arbitragens ;
    xix) Que a Requerente soubesse, igualmente, que os factos vertidos nas Declarações do mesmo Árbitro não constituíam qualquer causa que afectasse a sua independência e imparcialidade.
    **
    MOTIVAÇÃO/FUNDAMENTAÇÃO dos FACTOS PROVADOS e NÃO PROVADOS:
    A convicção do Tribunal foi obtida através da ponderação da globalidade da prova produzida, em articulação com as regras do ónus probatório, do bom senso, do equilíbrio e da livre convicção do julgador, na aferição da mesma panóplia probatória.
    Nomeadamente, o Tribunal ponderou, no que concerne à prova de natureza documental o teor dos documentos juntos a fls.:
    - 26 a 100: certidão da sentença arbitral, datada de 27/11/2017, objecto do pedido de anulação (impugnação) – decisiva para a prova dos factos 1. e 51. ;
    - 101 a 103: certidão do despacho de esclarecimento, prolatado em 22/01/2018, tendo por objecto a sentença arbitral de 27/11/2017 – decisiva para a prova do facto 2. ;
    - 104 a 113 (reproduzido a fls. 1063 a 1067): cópia do Acordo de Arbitragem (Segundo), e respectivo anexo com as Regras Processuais, celebrado entre a ora Requerente e Requerida, no âmbito do Segundo Processo Arbitral, datado de 24/02/2017 – decisiva para a prova dos factos 8. a 11. ;
    - 114 a 124: cópia da escritura pública, e respectivo primeiro documento complementar, de Permuta, datada de 31/12/2003, que esteve na base do litígio fonte dos identificados processos arbitrais – decisiva para a prova dos factos 23. e 24. ;
    - 125 e 126 (reproduzida a fls. 332): certidão do teor da procuração, junta pela ora Requerente Bogarve, S.A., ao Segundo Processo Arbitral, e data da sua junção – decisiva para a prova dos factos 29. a 31. ;
    - 127: declaração emitida pelo Centro de Arbitragem Comercial da Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa, relativa à eventual inexistência de procuração forense junta pela ora Requerida no Segundo Processo Arbitral – decisiva para a prova dos factos 32. e 33. ;
    - 233: teor do e-mail enviado pela secretária do Segundo Processo Arbitral, em 22/01/2018, aos mandatários das ora Requerente e Requerida, contendo o despacho de esclarecimento proferido pelo Árbitro em 22/01/2018 – decisiva para a prova do facto 3.;
    - 234 a 238 (reproduzido a fls. 1068 a 1071): cópia do Acordo de Arbitragem (Primeiro), e respectivo anexo com as Regras Processuais, celebrado entre a ora Requerente e Requerida, no âmbito do Primeiro Processo Arbitral, datado de 28/01/2016 – decisiva para a prova dos factos 12. a 14. ;
    - 239: procuração forense outorgada pela ora Requerida Vilamoura Lusotur, S.A., a favor dos Advogados DG… e NS…, datada de 23/11/2015, junta ao Primeiro Processo Arbitral – decisiva para a prova do facto 15. e 16. ;
    - 240: procuração forense outorgada pela ora Requerente Bogarve, S.A., a favor, nomeadamente, do Advogado JA…, datada de 27/01/2016, junta ao Primeiro Processo Arbitral – decisiva para a prova dos factos 18. e 19. ;
    - 256 (reproduzido a fls. 1049 e 1050): cópia da missiva enviada pelo Árbitro nomeado ao Secretário-Geral da Concórdia – Centro de Conciliação, Mediação de Conflitos e Arbitragens, com conhecimento aos mandatários das ora Requerente e Requerida, datada de 29/01/2016, enviando cópia do Primeiro Acordo de Arbitragem, Regras Processuais anexas a tal acordo, procuração da Bogarve datada de 27/01/2016 e cheque emitido pelo Administrador da ora Requerente, FC…, destinado ao pagamento de metade dos custos administrativos a cargo de tal parte em conflito – decisiva para a prova dos factos 21. e 22. ;
    - 257 a 328: cópia da Primeira Sentença Arbitral, datada de 28/10/2016 – decisiva para a prova dos factos 5. a 7. e 42. a 45. ;
    - 330: cópia do teor parcial das alegações proferidas pela então Demandada Bogarve, S.A., no âmbito do Primeiro Processo Arbitral – decisiva para a prova do facto 50.;
    - 331: cópia do e-mail enviado pelo mandatário forense da então Demandante Vilamoura Lusotur, S.A., datado de 27/03/2017, contendo, em anexo, a petição inicial apresentada no âmbito do Segundo Processo Arbitral – decisiva para a prova do facto 28.;
    - 333: cópia do e-mail enviado pelo mandatário forense da então Demandada Bogarve, S.A., datado de 08/05/2017, contendo, em anexo, a contestação/reconvenção apresentada no âmbito do Segundo Processo Arbitral – decisiva para a prova do facto 28.;
    - 360: cópia da primeira página do requerimento/petição inicial apresentado nos presentes autos, por parte da Requerente Bogarve, S.A., contendo o carimbo da Secretaria Judicial deste Tribunal da Relação, comprovativo da presente acção ter dado entrada neste Tribunal em 03/04/2018 – decisiva para a prova do facto 34.  ;
    - 361: cópia do e-mail enviado pela Secretária de Processos do Centro de Arbitragem Comercial, entre outros, aos mandatários das Demandante e Demandada, em 22/01/2018, procedendo à notificação do teor do despacho de aclaração, da mesma data, não constando nos itens de tais mandatários a referência a qualquer data de entrega e leitura – decisiva para a prova dos factos 3. e 4.  ;
    - 1038 a 1050: cópia do e-mail enviado pelo Árbitro nomeado aos mandatários das ora Requerente e Requerida, datado de 29/01/2016, enviando cópia do Primeiro Acordo de Arbitragem, Regras Processuais anexas a tal acordo, procuração da Bogarve datada de 27/01/2016 e teor da carta enviada à Concórdia, conforme fls. 256 – decisiva para a prova dos factos 21. e 22.;
    - 1061 e 1062: teor da informação prestada pelo Árbitro nomeado, acerca da sua indicação como árbitro, no período entre 28/01/2013 e 27/11/2017, por parte dos advogados da Uría Menéndez – Proença de Carvalho, que patrocinam a ora Requerida – decisiva para a prova do facto 37.;
    - 1087 e 1088: teor da informação prestada pelo Árbitro nomeado, confirmatória do envio do e-mail aos mandatários das ora Requerente e Requerida, datado de 29/01/2016 – decisiva para a prova dos factos 21. e 22.;
    - 1075 e CD-ROM anexo: contendo este o ficheiro electrónico correspondente ao mesmo e-mail, datado de 29/01/2016 – decisiva para a prova dos factos 21. e 22..
    O Tribunal ponderou, igualmente, o teor das declarações de parte prestadas pelos legais representantes da Requerente Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A..
    Nomeadamente, CJ…, administrador da Requerente Bogarve, S.A., desde 2010/2011, confirmou ter estado presente nas sessões de arbitragens, terem delegado a directa intervenção e conhecimento no advogado Dr. JA… e não se recordar do teor do Primeiro Acordo de Arbitragem, tendo delegado o mesmo assunto no identificado advogado.
    Acrescentou que o Dr. JA… há-de ter comunicado quem era o Sr. Árbitro, mas que a Requerente não terá sido consultada, mencionando que o mesmo terá sido sugerido ou induzido pela parte contrária.
    Relativamente ao aduzido no artº. 11º do requerimento inicial, referiu ter-lhe sido comunicado por outros advogados, sem indicar quais, que o mesmo Árbitro tinha sido indicado por aquela sociedade de advogados noutros processos, considerando que terão sido pouco prudentes na aceitação do mesmo árbitro nas duas arbitragens.
    No que respeita ao Dr. JA…, admite ter outorgado, pelo menos, duas procurações, tendo sido consensual a escolha para exercer as funções de patrono da Requerente nas duas arbitragens.
    Referenciou, ainda, que as questões em apreciação nas arbitragens configuravam-se de grande relevância para a Bogarve, pois o prédio em equação constituía a única actividade da empresa, mas mencionou que leu apenas o final das decisões, admitindo ter lido o teor das sentenças, ainda que não com muito detalhe, mas negando ter conhecimento do teor do Primeiro e Segundo Acordo de Arbitragem.
    No decurso das declarações prestadas, acrescentou que já na altura intervinha igualmente noutras empresas do pai (CM…, testemunha inquirida), admitindo a possibilidade que o Dr. JA… falasse, na altura, sobre estes assuntos e que ocorreu posterior corte das relações entre o pai e aquele advogado, igualmente por causa destas arbitragens.
    Por fim, referenciou que eventualmente não teriam avançado para a existência de árbitro único caso soubessem da ressalva aduzida pelo Sr. Árbitro aquando da outorga do Primeiro Acordo de Arbitragem.
    O presente Declarante revelou algum conhecimento factual, mas nem sempre logrou distanciamento exigível para que o seu depoimento fosse totalmente valorizado, insistindo num desconhecimento que não tem lógica, sentido ou razoabilidade e, como tal, não mereceu credibilidade. Nomeadamente quando, conforme confessou, as questões em análise, nomeadamente no Segundo Processo Arbitral, eram de grande relevância para a Bogarve, pois o prédio em equação constituía a única e exclusiva actividade de tal empresa.
    No demais, acabou por esclarecer a efectiva intervenção do Dr. JA…, o consenso da mesma e a forma como foi adquirido o alegado conhecimento das demais nomeações do Sr. Árbitro por parte do mesmo escritório de advogados da Requerida (o que veio a lograr provar-se não corresponder, minimamente, à realidade).
    Ainda no âmbito das declarações de parte, ponderou-se o declarado por FC…, administrador da ora Requerente Bogarve desde 2010/2011, de 71 anos, sendo genro de AG… (infra, indicar-se-á acerca deste).
    Confirmou ter prestado declarações no âmbito da arbitragem, que o advogado JA… foi indicado pelo Sr. CM…, que assinou procurações e que foi pacífico que era este Sr. Advogado que os ia patrocinar nas duas arbitragens, nunca se tendo sentido enganado pelo mesmo.
    Acrescentou que só teve conhecimento dos Acordos ou Convenções de Arbitragem à posteriori, ou seja, após o resultado da Segunda Arbitragem, tendo lido a Segunda Sentença Arbitral e passado os olhos sobre o teor do Acordo ou Convenção de Arbitragem. Reconheceu que tal Acordo de Arbitragem só teve importância quando o resultado do Segundo Processo Arbitral foi desfavorável, não se recordado do Dr. JA… ter falado da possibilidade de três árbitros.
    Mencionou, expressamente, que não tinha qualquer motivo para suspeitar do Sr. Árbitro, que o Dr. JA… afirmou que o mesmo era idóneo e competente, pelo que tinham plena confiança no seu desempenho, desconhecendo donde proveio a indicação do mesmo, nomeadamente se foi indicado pela ora Requerida. Especificamente, no que concerne ao facto do mesmo Árbitro ser, alegadamente, indicado pelas partes patrocinadas pelos advogados pertencentes à sociedade que patrocina a ora Requerida, referiu que tal foi falado pelo Sr. CM…, que referiu que o Sr. Árbitro trabalhava muito com eles, o que foi indicado de forma genérica, ainda que tivesse criado alguma desconfiança.
    Depôs de forma globalmente mais idónea do que o antecedente Declarante, ainda que reiterando um alegado desconhecimento factual, pouco conforme e coadunável com a natureza das funções desempenhadas, ainda que existisse total confiança no desempenho do mandatário escolhido. Pelo com, e exceptuando tal ressalva, as suas declarações forma devidamente ponderadas e consideradas.
    No âmbito da prova de natureza testemunhal, foi ponderado o depoimento de CM…, pai do 1º Declarante, de 60 anos, empresário e sócio/accionista da ora Requerente.
    Referenciou ter adquirido a totalidade do capital social da Bogarve em 2006, por 12 milhões de euros, nunca tendo sido administrador da mesma, mas apenas sócio, tendo cedido, em 2007, metade do capital social ao Sr. G….
    Declarou ter sido o próprio a contratar o Dr. JA…, tendo confiado no mesmo. Este afirmou-lhe que escolheria o Árbitro, pelo que acha que foi o mesmo a proceder a tal escolha.
    Mencionou ter sempre acompanhado o filho e o outro administrador, que desconhecia que podiam ter sido três árbitros e que não teve conhecimento de qualquer acordo de arbitragem, alegando não ter sido informado da decisão de escolher apenas um árbitro, o que considera ter sido proposto pela sociedade de advogados que patrocina a ora Requerida Vilamoura, Lusotur, S.A..
    Interpelado expressamente, referiu ter ouvido falar que o Árbitro já teria desempenhado, por várias vezes, funções para a Requerida, mas sem ter a certeza.
    Confrontado com o alegado desconhecimento pouco convincente, levou-o a aduzir que só depois da aquisição das acções da Bogarve é que leu o Contrato de Permuta, fonte do litígio sujeito a arbitragem, sem ter lido os documentos complementares.
    Apesar da natureza de testemunha, e do supra exposto, o ora depoente assumiu-se como um dos verdadeiros donos da ora Requerente, exercendo, de facto, os poderes de administração.
    Ainda que a confiança no mandatário escolhido pudesse ser de grau elevado, o alegado desconhecimento do teor das convenções de arbitragem e mesmo do teor da primeira decisão arbitral revelou-se pouco convincente ou sério, imerecedor de qualquer ponderação ou credibilidade.
    Com efeito, sendo o imóvel em equação a única actividade da empresa e atento o valor do investimento em equação, não é crível aquele distanciamento perante os processos arbitrais, ao ponto de nem sequer a Primeira Decisão Arbitral ter merecido uma devida leitura ou análise, ainda que aparentemente tenha sido favorável.
    Por fim, a testemunha DS…, de 25 anos, advogado estagiário, referenciou que, no âmbito do estágio realizado no escritório que patrocina a ora Requerente, deslocou-se ao escritório do Sr. Árbitro nomeado, tendo recolhido 3 dossiers do alegado primeiro processo arbitral, que não encontrou nenhuma procuração. Concretizou que o teor de fls. 1038 a 1048 não estava em tais dossiers, mas que nunca pediu certidão do processo nem falou com o Professor RP….
    O presente depoimento não se revelou com qualquer importância para os presentes autos.
    Por um lado, parte do alegado acabou por ser comprovadamente questionado e controvertido por prova superveniente credivelmente produzida, o que aconteceu, nomeadamente, com o teor de fls. 1038 a 1048.
    Por outro lado, a alegação à mera consulta e tiragem de fotocópias não é susceptível de conferir a idoneidade que resultaria da junção de concreta certidão do processo arbitral em equação, nem logra, minimamente, substituir esta.
    Adrede, referencie-se, ainda, que a Declaração de consulta feita constar a fls. 127 (facto provado 32.), reporta-se ao Segundo Processo Arbitral, ora questionado nos presentes autos, e não àquele cuja alegada completa junção foi concretizada nos autos.
    Para além do supra exposto, urge, ainda, referenciar o seguinte:
    Ø O facto provado 20. resulta da análise de ambos os Processos Arbitrais, correspondendo, ainda, a matéria factual incontroversa entre as partes ;
    Ø Os factos provados 25. a 27. resultam da análise da globalidade da prova produzida, nomeadamente do teor dos depoimentos prestados, que não só reconheceram aquela exclusiva actividade da ora Requerente, como ainda a circunstância da arbitragem ir ser desenvolvida por árbitro único ;
    Ø Os factos 35. e 36. resultaram, claramente, do teor da declaração feita constar pelo Árbitro nomeado em ambos os Acordos de Arbitragem – cf., cláusula 3ª destes Acordos -, que não mereceram qualquer prova em contrário, antes sendo reafirmados pela demais prova produzida ;
    Ø O facto provado 38. resulta do efectivo acompanhamento efectuado pelo mandatário da ora Requerente no Processo de Arbitragem, resultando claro que o mesmo tinha perfeito conhecimento careca da aptidão, condições e características do árbitro único nomeando ;
    Ø O facto provado nº. 41. resulta do teor das declarações de parte prestadas, que confirmaram tal real acompanhamento, bem como do concreto teor da procuração aí junta a favor de tal mandatário ;
    Ø Os factos 39. e 40. resultaram do teor das declarações de parte e prova testemunhal supra analisada, resultando claro desta que nenhuma diligências ulteriores foram efectuadas para aferir acerca da veracidade de tais rumores e genérica imputação. Aliás, se tal averiguação tivesse sido efectuada, o que seria de fácil execução e prova, e perante a concludência da não veracidade de tais imputações, certamente que a ora Requerente se teria inibido a sustentá-las ;
    Ø Os factos 46. a 48. resultaram da globalidade da apreciação da prova credivelmente produzida e ponderação daí adveniente. Nomeadamente, atenta a importância das questões em equação para a empresa Requerente, cuja exclusiva actividade se reportava ao imóvel objecto do contrato em aferição na arbitragem, não é minimamente credível e aceitável que a administração de tal sociedade não tivesse tido conhecimento, através dos seus administradores, do teor das circunstâncias reveladas pelo Sr. Árbitro em sede do Primeiro Acordo de Arbitragem.
    Efectivamente, ainda que se equacione que tal administração da Bogarve não teve, à data, directo e imediato conhecimento de tais circunstâncias, por não ter observado, com ou sem detalhe, o teor do Primeiro Acordo de Arbitragem, o que é certo é que não se configura como verosímil que a mesma administração não tivesse observado e analisado o teor da Primeira Sentença Arbitral, da qual constava a transcrição do outorgado Acordo de Arbitragem ;  
    Ø O facto 49. resulta incontroverso nos presentes autos, conforme resulta claramente do confronto entre o teor do artº. 10º da petição inicial e os artigos 289º a 293º da oposição/contestação. Com efeito, a Requerida não questiona a alegação factual da Requerente, feita constar na factualidade provada, mas antes aduz a irrelevância de tal alegação, em consequência da alegada inaplicabilidade da obrigação de assinatura do indicado modelo fornecido pelo Centro de Arbitragem da Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa.
    A factualidade dada como não provada resultou de:
  • total ausência de prova produzida – cf., factos vii) e x) a xii) ;
  • ausência de prova convincentemente produzida ou bastante – cf., factos ix) e xiii) a xix) ;
  • contraditoriedade com a considerada provada – cf., factos i) a vi) e viii).
    Os factos não provados feitos constar sob os nº.s xiii) a xix) reportam-se, basicamente, ao pedido de condenação de litigância de má-fé deduzido pela Requerida relativamente á Requerente, sendo que, relativamente a este, apenas foi possível, com a necessária segurança, considerar assente, fundamentalmente, a matéria factual constante dos factos 37. a 40. e 46. a 48..
    B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
    I) DA CADUCIDADE do DIREITO de PEDIR a ANULAÇÃO da SENTENÇA ARBITRAL
    Defendendo-se por excepção, invoca a Requerida, na oposição/contestação deduzida, que o direito da Requerente a pedir a anulação da sentença arbitral (segunda sentença, ora em equação) caducou, sendo, assim extemporânea a propositura da acção em 04/04/2018.
    O que deve determinar a sua necessária absolvição do pedido.
    Alegou, no essencial, o seguinte:
  • tendo sido a acção proposta em 04/04/2018, o prazo de 60 dias previsto no nº. 6. do artº. 46º, da Lei da Arbitragem Voluntária já se encontrava esgotada em tal data ;
  • efectivamente, o despacho de esclarecimento da sentença arbitral data de 22/01/2018, sendo esta a data a ter em conta para o início da contagem daquele prazo, independentemente da data da notificação dessa decisão ;
  • pelo que o prazo para requerer a anulação terminou em 23/03/2018 ;
  • ademais, ainda que se considerasse que a data relevante para o começo daquele prazo de 60 dias seria a data em que a parte  tomou conhecimento do despacho de esclarecimento, tal ocorreu no próprio dia 22/01/2018, pelo que o prazo para requerer a anulação terminava igualmente no dia 23/03/2018 ;
  • ademais, ainda que se considerasse que a notificação havia sido efectuada em 23/01/2018, e que o primeiro dia para a propositura da acção fosse o 24/01/2018, o prazo terminaria no dia 26/03/2018 (termina a 24/03/2018, sábado, pelo que se transferia para o primeiro dia útil seguinte) ;
  • com efeito, o período entre 25/03 e 02/04/2018 correspondeu a férias judiciais, mas aquele prazo de 60 dias não suspendeu durante aquele período, pois trata-se de um prazo substantivo de caducidade, e não um prazo processual ;
  • por outro lado, a tal prazo não acrescem os dias de multa previstos no nº. 5, do artº. 139º, do Cód. de Processo Civil ;
  • ademais, ainda que se considerasse tal prazo interrompido naquele período de férias judiciais, , tal prazo terminaria no dia 03/04/2018.
    Na resposta a tal excepção, e defendendo a tempestividade da presente acção, aduz, em súmula, a Requerente que:
    § O pedido de anulação da sentença arbitral deu entrada na secretaria do tribunal no dia 03/04/2018 ;
    § O prazo de 60 dias para apresentar o pedido de anulação conta-se a partir da data de notificação da decisão sobre o pedido de rectificação, aclaração, modificação ou liquidação, efectuado nos termos do artº. 45º ;
    § Mesmo admitindo-se como boa e válida a notificação operada pela secretaria no dia 22/01/2018, nos termos da alínea bb) das regras processuais que constituem anexo ao Acordo de Arbitragem, tem de considerar-se notificada a Requerente no dia 23/01/2018, iniciando-se a contagem do prazo no dia 24/01/2018 ;
    § O prazo de anulação de acção arbitral trata-se de um prazo processual, ao qual é aplicável as regras de contagem de prazos previstas nos artigos 138º e segs., do Cód. de Processo Civil, suspendendo-se durante as férias judiciais ;
    § Todavia, mesmo a entender-se que o prazo de 60 dias é um prazo de caducidade, tendo natureza substantiva, sempre o mesmo teria que ser contado nos termos da alínea e), in fine, do artº. 279º, do Cód. Civil, conforme o artº. 296º, do mesmo diploma ;
    § Devendo-se, ainda, abranger o dia de sábado como dia não útil, tal como o domingo e os dias feriados ;
    § Pelo que, mesmo assim, o prazo de 60 dias, terminando em dia não útil (sábado), e sendo tal acto (propositura da acção) que ser forçosamente praticado em juízo, aplicar-se-á, no limite, a alínea e), do artº. 279º, transferindo-se para o primeiro dia em que efectivamente os tribunais abriram, ou seja, 03/04/2018 ;
    § Pelo que deve a acção ser considerada tempestiva e julgada improcedente a excepção de caducidade arguida pela Requerida.
    Da argumentação expedida por ambas as partes, constata-se que a controvérsia existente entre as mesmas reporta-se às questões:
    a) Início da contagem do prazo de caducidade ;
    b) Natureza do prazo.
    Estatuindo acerca do pedido de anulação da sentença arbitral, estatui o nº. 6, do artº. 46º, da Lei da Arbitragem Voluntária que “o pedido de anulação só pode ser apresentado no prazo de 60 dias a contar da data em que a parte que pretenda essa anulação recebeu a notificação da sentença ou, se tiver sido feito um requerimento nos termos do artigo 45º, a partir da data em que o tribunal arbitral tomou uma decisão sobre esse requerimento”.
    In casu, foi apresentado pedido de esclarecimento ou aclaração da sentença arbitral proferida, o qual veio a ser julgado improcedente por despacho prolatado em 22/01/2018, o qual foi notificado aos mandatários de Demandante e Demandada, através de e-mail remetido no mesmo dia 22/01/2018.
    Considera a Requerida que, existindo despacho de aclaração ou rectificação da sentença, o prazo de 60 dias para deduzir o pedido da sua anulação conta-se a partir daquela data de prolação do despacho, e não da sua notificação, contrariamente ao que sucede caso inexista tal pedido de rectificação/aclaração, em que se computa a partir da data de notificação da sentença arbitral.
    Ao invés, a Requerente entende que o início da contagem daquele prazo, mesmo nas situações em que tiver sido apresentado requerimento nos termos do artº. 45º da LAV, deve sempre operar a contar da data em que a parte for notificada do despacho que decidiu acerca de tal requerimento.
    Vejamos.
    Refere José Robin de Andrade [5]que o prazo de 60 dias para apresentar o pedido de anulação deve ser “contado desde a data de notificação da sentença arbitral (art. 42º, nº. 6) ou, no caso de ter havido pedido de retificação, aclaração, modificação ou liquidação nos termos do art. 45º, desde a data da notificação da decisão sobre esse pedido, ou, no caso de vários pedidos, da data da última decisão sobre os mesmos” (sublinhado nosso).
    Em idêntico sentido, defende António Sampaio Caramelo [6] que “apesar de a formulação desta disposição da LAV ser deficiente, deve entender-se que o termo a quo de contagem deste prazo é sempre a notificação duma decisão dos árbitros, seja ela a sentença que decidiu o litígio seja a decisão de retificação, esclarecimento ou completamento daquela, proferida a requerimento de uma parte” (sublinhado nosso) [7]
    Jurisprudencialmente, em idêntico sentido e por todos, atente-se ao exposto no douto Acórdão de 15/09/2017, proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte [8], ao referenciar que “esse prazo será de sessenta dias, e conta-se ou da notificação da sentença ou da notificação dos esclarecimentos prestados” (sublinhado nosso).
    Ora, entendemos que este entendimento merece a nossa adesão.
    Com efeito, posição diversa, nos termos sustentados pela Requerida na oposição apresentada, no sentido do prazo de 60 dias dever decorrer desde a data da prolação da decisão acerca do requerimento apresentado, independentemente da data de notificação desta, deixaria a parte que pretendesse recorrer ao pedido de anulação numa insuportável situação de desconhecimento acerca do cômputo do termo a quo de contagem de tal prazo, pois sempre estaria condicionada a uma maior ou menor dilação temporal na execução da notificação de tal decisão, sendo ainda incapaz de salvaguardar o seu direito à tutela judicial exercida mediante o mecanismo da impugnação da sentença arbitral.
    Para além do exposto, é perfeitamente justificável que tal opere nos termos expostos, pois, o eventual deferimento do requerimento apresentado nos termos do artº. 45º, pode inclusive satisfazer as pretensões da parte, por forma a que a mesma deixe de ter qualquer interesse num eventual pedido de impugnação/anulação da sentença arbitral.
    Ora, a acolher a tese sustentada pela Requerida, a parte dispunha sempre do prazo de 60 dias contados da notificação da sentença arbitral para a impugnar judicialmente e, caso apresentasse requerimento nos termos do citado artº. 45º da LAV, e não fosse notificada do despacho de aclaração naquele prazo de 60 dias contados da notificação da sentença arbitral, deveria sempre, à cautela, impugnar a sentença arbitral, o que levaria à indesejável situação de instauração de acções de impugnação supervenientemente indesejáveis.
    Pelo exposto, conclui-se, o prazo de 60 dias estatuído no transcrito nº. 6, do artº. 46º, da LAV, conta-se a partir da notificação da sentença arbitral, ou a partir da notificação da decisão proferida acerca do requerimento de rectificação/esclarecimento/aclaração, caso este tenha sido apresentado nos quadros do artº. 45º, do mesmo diploma. 
    Ultrapassada a enunciada questão, passemos a apreciar quando é que a decisão/despacho proferido nos presentes autos se deve considerar notificado, de forma a iniciar-se a contagem do indicado prazo de 60 dias.
    Resultou provado, conforme factos 2. a 4., que o despacho que conheceu acerca do pedido de aclaração foi prolatado em 22/01/2018, que foi  notificado, nomeadamente aos Mandatários de Demandante e Demandada, através de e-mail remetido em 22/01/2018. A recepção e leitura de tal e-mail não foi acusada pelo Mandatário da Bogarve, S.A., nomeadamente na indicada data de remessa do e-mail. E não se provou que a ora Requerente Bogarve, S.A., tenha tomado conhecimento do despacho referenciado em 2. e 3. no dia 22/01/2018 – cf., facto ix) não provado.
    Argumenta a Requerida que a Requerente tomou conhecimento do teor de tal despacho no mesmo dia 22/01/2018, pelo que o primeiro dia do prazo de 60 dias é o dia 23/01/2018, terminando no dia 23/03/2018.
    Considera a Requerente que tal leitura é incorrecta, pois inexiste prova da recepção e leitura naquele dia 22/01/2018. Pelo que, a admitir como boa a notificação operada no dia 22/01/2018, a mesma deve considerar-se efectuada no dia seguinte, ou seja, no dia 23/01/2018, iniciando-se a contagem do prazo de 60 dias no dia 24/01/2018.
    Invoca, em sustento da sua posição, a alínea aa) das Regras Processuais anexas ao Acordo de Arbitragem, o artº. 45º do Regulamento de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, aplicável ex vi da Cláusula 5ª do Acordo de Arbitragem e a alínea bb) das mesmas Regras Processuais.
    Vejamos.
    Consta da cláusula 5ª do Segundo Acordo de Arbitragem, outorgado em 24/02/2017, que “a arbitragem obedecerá às regras constantes do anexo a este acordo e, nos casos omissos, às regras do Regulamento do Centro de Arbitragem da Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa, na versão de 2014” – cf., facto 10..
    Em anexo constam as denominadas Regras Processuais, constando sob as alíneas aa) e bb) que:
    “aa) Os atos do árbitro poderão ser notificados às partes por correio registado, por correio privado (“courier”) e por correio electrónico com aviso de recepção e leitura ;
    bb) As notificações por correio registado consideram-se efectuadas no terceiro dia, que seja útil, posterior ao registo ; as notificações por correio privado consideram-se efectuadas no dia da sua receção ; as notificações por correio electrónico consideram-se efectuadas no dia seguinte ao do seu envio” – cf., facto 11..
    Por sua vez, estatui o nº. 1, do artº. 45º, do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, que “a citação, notificações e comunicações são efectuadas por qualquer meio que proporcione prova da recepção, designadamente, por carta registada, entrega por protocolo, telecópia, correio electrónico ou qualquer outro meio electrónico equivalente”.
    Ora, conforme resulta claramente da Cláusula 5ª do Acordo de Arbitragem, esta obedecerá, numa primeira linha, ao convencionado no anexo estipulador das regras processuais e, apenas nos casos aí não previstos, recorrer-se-á às regras do Regulamento do indicado Centro de Arbitragem.
    Assim, de acordo com aquelas regras, o teor da decisão/despacho, datado de 22/01/2018, podia ser notificado às partes através de correio electrónico com aviso de recepção e leitura, caso em que se consideram efectuadas no dia seguinte ao do seu envio.
    Pelo que, tendo as partes, no âmbito da sua liberdade contratual, estatuído tais regras, devem estas ser devidamente observadas, inexistindo necessidade de recorrer à supletiva aplicabilidade do prescrito no transcrito artº. 45º, nº. 1, do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa.
    Donde, a concretizada notificação por correio electrónico, tendo sido remetida no dia 22/01/2018, considera-se efectuada no dia 23/01/2018, independentemente da efectividade de qualquer aviso de recepção ou leitura, iniciando-se o cômputo do prazo de 60 dias no dia 24/01/2018.
    Definido o início do cômputo do prazo de caducidade – 24/01/2018 -, de que forma deve este ser contado ?
    A resposta a tal questão passa pela definição da natureza do prazo, nomeadamente na determinação se estamos perante um prazo processual ou judicial, ou antes perante um prazo substantivo ou de caducidade.
    A doutrina não é unânime acerca da natureza deste prazo.
    Refere António Sampaio Caramelo [9] que “Armindo Ribeiro Mendes defendeu que este prazo é de qualificar como processual, louvando-se no entendimento acolhido, na vigência da anterior LAV, por Luís de Lima Pinheiro que, por sua vez, se apoiava num acórdão do STJ. Pelo contrário, Mariana França Gouveia, opinou que se trata de um prazo substantivo, de caducidade, não se lhe aplicando, por isso, as regras dos prazos processuais, nomeadamente a suspensão nas férias judiciais” [10].
    Acrescenta, aderir a esta última posição – considerando o prazo substantivo ou de caducidade -, “uma vez que a visão contrária implica conceber a ação de anulação (que sucede à arbitragem) como a última fase de um continuum processual cuja natureza essencial se mantém. Ora, a verdade é que a ação de anulação é um meio processual com uma finalidade claramente diferente da arbitragem precedente – nesta busca-se a decisão de um litígio, enquanto aquela tem por objectivo controlar a integridade do tribunal arbitral, a integridade do processo por este adotado e a integridade da decisão por ele proferida, verificando a sua compatibilidade com princípios, regras e valores fundamentais do ordenamento jurídico. Entendemos, por isso, que o prazo para a propositura da ação de anulação de sentença arbitral tem a mesma natureza (substantiva) que o prazo fixado por lei para se impugnar a validade de uma transação privada”.
    Em sentido diferenciado, refere José Robin de Andrade [11] tratar-se “de um prazo processual ou judicial, como decidiu o Supremo Tribunal de Justiça em acórdão de 6 de setembro de 2016 já que está «diretamente, relacionado com uma outra ação (a ação arbitral) e o seu decurso tem um mero efeito de natureza processual e não o de extinção de direito material»”.
    Jurisprudencialmente, enuncia o citado douto Acórdão do STJ de 06/09/2016 [12] que “os prazos judiciais destinam-se a determinar o período de tempo “para se produzir um determinado efeito processual”, ou seja, a “regular a distância entre os actos do processo”, e, dada essa sua função específica, pressupõem, necessariamente, a prévia propositura de uma ação, a existência de um processo”.
    Por sua vez, os prazos substantivos “respeitam ao período de tempo exigido para exercício de direitos materiais, sendo-lhes “aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição”, de acordo com o preceituado pelo artigo 298º, nº 2, do Código Civil, tendo o seu decurso, em princípio, sem prejuízo das regras respeitantes à necessidade da sua invocação em juízo, a consequência da extinção do respetivo direito.
    Por outro lado, a natureza de um prazo, designadamente, para a propositura de uma ação, deve resultar da análise da correspondente norma jurídica e não, simplesmente, da sua inclusão física em determinado diploma, sendo que, se a caducidade é, em regra, prevista na lei substantiva, admite-se que o possa ser, igualmente, na lei processual.
    No que respeita aos prazos de propositura de ação, em particular, por via de regra, qualificados como prazos substantivos de caducidade, ou, excecionalmente, de prescrição, atento o já citado artigo 298º, nº 2, do Código Civil, por estas causas do não exercício do direito se reconduzirem a elemento integrante do regime jurídico da respetiva relação material, os mesmos podem ser, também, prazos judiciais, o que ocorrerá sempre que o prazo esteja, directamente, relacionado com uma outra ação e o seu decurso tenha um mero efeito de natureza processual e não o de extinção de direito material, como será, seguramente, a situação contemplada, entre outros, nos artigos 92º, nº 2, 279º, nº 2, e 840º, nº 2, todos do CPC.
    Reveste, pois, seguramente, natureza judicial, o prazo previsto no citado artigo 382º, nº 1, a), do CPC, uma vez que funciona como simples condição de subsistência da providência cautelar, sem qualquer interferência no direito que constitua o fundamento da respetiva ação.
    Trata-se, pois, de um prazo judicial de propositura de ação, ponto em que, aliás, são conformes os dois acórdãos em causa.
    Assim sendo, a presente ação de anulação de sentença arbitral foi proposta, dentro do prazo de sessenta dias, contados da data em que a requerente teve conhecimento do seu teor, a que se reporta o artigo 46º, nº 6, da LAV, e, portanto, tempestivamente, improcedendo, consequentemente, a exceção perentória da caducidade” (sublinhado nosso).
    Ora, se bem entendemos o aduzido no douto aresto antecedente, e contrariamente ao que resulta da anotação supra exposta, o mesmo não decidiu, de forma concludente e directa, que o prazo em equação tem natureza processual ou judicial, mas antes apenas indicia tal natureza.
    Ademais, conforme resulta da análise e leitura de tal Acórdão, a sentença arbitral foi considerada notificada às partes no dia 20/07/2015 e a acção de anulação deu entrada na Relação em 17/09/2015, ou seja, em prazo inferior a 60 dias, decorrendo a maior parte do mesmo em pleno período de férias judiciais. Pelo que, também por aqui não é possível ajuizar com a concludência exposta naquela anotação.
    No sentido de estarmos perante um prazo de natureza processual ou judicial, acerca de impugnação de decisão arbitral no âmbito da arbitragem tributária, pronunciou-se o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul [13] de 26/06/2014, aí se referenciando que “o prazo para deduzir a presente impugnação de decisão arbitral é um prazo de natureza judicial e aplica-se-lhe o regime do C.P.Civil (cfr.artº.29, nº.1, al.a), do dec.lei 10/2011, de 20/1; artº.20, nº.2, do C.P.P.T.), pelo que ele corre continuamente, mas suspende-se em férias judiciais, mais se transferindo o seu termo para o primeiro dia útil seguinte quando terminar em dia em que os Tribunais estejam encerrados ou seja concedida tolerância de ponto (cfr.artº.138, nºs.1, 2 e 3, do C.P.C.)” [14].
    Aqui chegados, afigura-se-nos que estando-se perante um prazo directamente relacionado com outra acção, cujo decurso tem fundamentalmente um efeito de natureza processual, in casu a impossibilidade de questionar a integridade do decidido quanto ao tribunal arbitral, processo por este adotado e a integridade da decisão por ele proferida, em confronto com os princípios, regras e valores fundamentais do ordenamento jurídico, e não o efeito extintivo de um direito material, tal prazo deve considerar-se de natureza processual ou judicial. E, como tal, o seu decurso suspende-se durante o período de férias judiciais – cf., o nº. 1, do artº. 138º, do Cód. de Processo Civil.
    Adrede, refira-se, ainda, que tal solução compatibiliza-se e corresponde ao que as partes convencionaram na previsão das regras processuais anexas ao Acordo de Arbitragem (Segundo), para vigorar durante o Segundo Processo Arbitral, nomeadamente na alínea dd), onde se refere expressamente que “os prazos serão contínuos ; aqueles cujo último dia ocorra em sábado, domingo ou feriado terminarão no primeiro dia útil seguinte ; os prazos serão suspensos durante as férias judiciais” – cf., fls. 113.
    Desta forma, e repristinando o supra exposto, iniciando-se a contagem do prazo no dia 24/01/2018, o último dia reporta-se à data de 24/03/2018, correspondente a um sábado, dia em que, com excepção da matéria relativa a processos urgentes, os tribunais estão encerrados – cf., o nº. 2, do mesmo artº. 138º.
    Como as férias judiciais tiveram início no dia imediato – 25/03/2018 -, prolongando-se até ao dia 02/04/2018, temos que o 1º. dia útil seguinte, suspenso que está o prazo durante as férias judiciais, corresponde ao dia 03/04/2018, data em que a presente acção foi interposta – cf., facto 34..
    O que determina, consequentemente e sem outras delongas, juízo de improcedência da invocada excepção peremptória de caducidade do direito da acção.  
    Todavia, nos termos sufragados pela Requerente na resposta à excepção apresentada, ainda que se considerasse que o referido prazo de 60 dias tem natureza substantiva, afigura-se-nos que a presente acção teria sido tempestivamente intentada.
    Com efeito, terminando tal prazo no dia 24/03/2018, correspondente a um sábado, e correspondendo o dia útil seguinte a período de férias judiciais, ex vi do artº. 296º, urge aplicar e considerar o estatuído na alínea e), do artº. 279º, ambos do Cód. Civil. Dispôs este que “à fixação do termo são aplicáveis, em caso de dúvida, as seguintes regras:
    e) O prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil ; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo”.
    Sendo inquestionável que, numa visão actualista, o sábado deve ser equiparado ao domingo e dias feriados [15], e na consideração de que os prazos substantivos, diferentemente dos prazos processuais, só admitem suspensão final, temos que, correspondendo o 1º dia útil seguinte (26/03/2018) a dia de férias judiciais e terminando estas apenas em 02/04/2018, pela legal equiparação, o termo final do prazo transferir-se-ia para o dia 03/04/2018, data em que a presente acção foi interposta.
    Donde resulta que, mesmo a considerar-se o citado prazo de 60 dias com natureza substantiva, ainda assim se teria necessariamente que concluir pela tempestividade da propositura da presente acção de impugnação/anulação, conducente, igualmente, a juízo de improcedência da invocada excepção peremptória de caducidade do direito de acção.
    II) DO EVENTUAL PREENCHIMENTO das CAUSAS de ANULAÇÃO ADUZIDAS na PETIÇÃO INICIAL
    - Da manifesta falta de poderes do(s) mandatário(s) para outorgar convenção de arbitragem e ausência de ratificação pelo(s) mesmo(s) do anteriormente processado – cf., artº. 46º, nº. 3, alín. a), ponto i), da Lei da Arbitragem Voluntária
    Estatui o nº. 1, do artº. 46º, da Lei da Arbitragem Voluntária, prevendo acerca do pedido de anulação, que “salvo se as partes tiverem acordado em sentido diferente, ao abrigo do n.º 4 do artigo 39.º, a impugnação de uma sentença arbitral perante um tribunal estadual só pode revestir a forma de pedido de anulação, nos termos do disposto no presente artigo”.
    Acrescenta o ponto i), da alínea a), do nº. 3, do mesmo normativo, que:
    “a sentença arbitral só pode ser anulada pelo tribunal estadual competente se:
    a) A parte que faz o pedido demonstrar que:
    i) Uma das partes da convenção de arbitragem estava afectada por uma incapacidade; ou que essa convenção não é válida nos termos da lei a que as partes a sujeitaram ou, na falta de qualquer indicação a este respeito, nos termos da presente lei”.
    Refere António Sampaio Caramelo [16]que o reconhecimento constitucional “dos tribunais arbitrais como verdadeiros «tribunais», baseia-se no pressuposto de que as decisões por eles proferidas sejam obtidas mediante processo equitativo, como exige o nº. 4 do art. 20º da Lei Fundamental”.
    Todavia, enquanto que aquele requisito ou paradigma é assegurado nos tribunais estaduais pela possibilidade de recurso para um tribunal hierarquicamente superior, “quanto aos tribunais arbitrais, é a possibilidade de controlo pelos tribunais estaduais competentes que assegura o respeito por esse paradigma constitucional, constituindo, por isso, uma implícita condição da inclusão dos tribunais arbitrais no conceito constitucional de «tribunais»”. A observância daquele paradigma constitucional traduz-se, nomeadamente, “no controlo da integridade do tribunal (i.e., da sua composição) e da integridade do processo – a eventual intervenção dos tribunais estaduais, neste contexto, serve ainda para controlar a integridade da sentença, verificando a sua não contrariedade à «ordem pública» do Estado Português, isto é, ao conjunto de valores, princípios e regras do sistema jurídico português, que sendo estabelecidos em função da proteção de interesses sentidos pela comunidade como fundamentais, são inderrogáveis pela vontade dos indivíduos”.
    Desta forma, aduz-se, “a existência de um controlo efetivo dos tribunais arbitrais sobre a composição do tribunal, a sua competência, conferida pelas partes, o processo que antecedeu a sentença e, por fim, a forma e conteúdo desta, é indispensável para preservar a integridade da arbitragem e para a sua caracterização como um meio jurisdicional de resolução de litígios, equiparado pela Constituição Portuguesa à justiça estadual” [17].
    Relativamente ao fundamento de anulação ora em equação – incapacidade de uma parte ou invalidade da convenção de arbitragem -, refere José Robin de Andrade [18] que os fundamentos da alínea a) “carecem de ser invocados e provados pelas partes (correspondem ao art. 34 (2) (a) da Lei-Modelo)”, sendo que o fundamento da subalínea ora em equação – i), da alínea a) – “corresponde literalmente ao fundamento da subalínea (a) (i) da Lei-Modelo. Respeita primeiro a causas subjectivas ou situações de incapacidade de exercício de pessoas singulares, ou falta de poderes do mandatário, mas também a falta de competência dos órgãos de pessoa colectiva interveniente ; refere-se também à falta de autorização legal do ente público para entrar em convenção de arbitragem, quando se trate de direitos públicos, nos termos do art. 1º, nº. 5, da LAV” (sublinhado nosso).
    Relativamente ao mesmo fundamento de anulação, e especificamente no que se refere à falta de capacidade jurídica de uma parte enquanto factor viciante da convenção de arbitragem, refere António Sampaio Caramelo [19] ter o mesmo “reduzida relevância prática”, em virtude de “serem escassas as restrições estabelecidas pela nossa lei a este respeito, nomeadamente, no que concerne a convenções de arbitragem celebradas por pessoas colectivas de direito público”.
    Por sua vez, no que respeita à invalidade da convenção de arbitragem, a previsão legal abarca quer a invalidade formal, por inobservância da forma legalmente exigível, em contravenção do artº. 2º da LAV, quer a invalidade material da convenção. Esta, pode resultar “quer do facto de a vontade das partes (ou de uma delas) se ter formado com algum vício legalmente relevante (e.g. erro ou coação) quer de ter sido celebrada com uma finalidade contrária à lei, à ordem pública ou aos bons costumes (cf. art. 281º do Código Civil)”.
    Alega a Requerente existir falta de poderes do seu mandatário que outorgou a convenção de arbitragem (segunda), bem como falta de ratificação do processado da sua parte.
    Por outro lado, existe falta de procuração por parte da Requerida, pelo que o seu mandatário agiu em seu nome com total falta de poderes para tal.
    Tais omissões devem, assim, determinar, por manifesta falta de poderes dos respectivos mandatários:
    Ø A anulação do Acordo de Arbitragem celebrado em nome das partes ;
    Ø A anulação de todos os actos subsequentes, nomeadamente a decisão arbitral.
    Na oposição apresentada, e conforma já supra exposto, a Requerida defende que o Segundo Acordo de Arbitragem (ora em equação) foi assinado pelas pessoas possuidoras de todos os poderes de representação da Requerente e Requerida, em consequência das procurações outorgadas.
    Acrescenta que, ainda que não existisse qualquer acordo arbitral, ainda assim a incompetência do tribunal teria que ser suscitada na contestação, sob pena de renúncia, o que não sucedeu, nos quadros do nº. 4 do artº. 18º e nº. 4, do artº. 46º,ambos da LAV.
    Subsidiariamente, ainda que o subscritor do Segundo Acordo de Arbitragem, por conta da ora Requerente, não estivesse munido dos devidos poderes para o subscrever em sua representação, e ainda que não existisse a norma prevista no nº. 4 do artº. 18º e nº. 4, do artº. 46º,ambos da LAV, ainda assim se teria que concluir que a Requerente sempre teria ratificado o Segundo Acordo de Arbitragem.
    Efectivamente, a convenção de arbitragem não constitui um acto processual, mas sim um negócio jurídico de natureza contratual, não sendo aplicáveis as regras de ratificação do Cód. de Processo Civil, mas sim as regras gerais do Cód. Civil, sendo patente que a Requerente ratificou o Segundo Acordo de Arbitragem, pois, por um lado, em 05/05/2017, conferiu mandato forense para que o Advogado JA… interviesse em sua representação na Segunda Arbitragem e, por outro lado, a própria Requerente fez-se representar nas diligências probatórias da Segunda Arbitragem pelo seu administrador CJ….
    Donde, afirmar que não teria ratificado o Segundo Acordo de Arbitragem constitui manifesto abuso de direito, na vertente de venire contra factum proprium.
    Por outro lado, a procuração outorgada pela ora Requerente ao Advogado JA… data de 05/05/2017, sendo a contestação da Bogarve de 08/05/2017, pelo que o 1º acto processual foi praticado ao abrigo dos poderes expressos conferidos para o efeito, pelo que nada havia a ratificar.
    Resultou provado ter sido celebrado, em 24/02/2017, Acordo de Arbitragem (Segundo), entre a Vilamoura Lusotur, S.A., anteriormente denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A., representada por NS…, designada como “Demandante”, e Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., representada por JA…, designada por “Demandada”, e no qual figurou ainda RP…, Advogado, que se encontra junto aos autos a fls. 104 a 108.
    Consta do Considerando H) de tal Acordo terem sido definidas “algumas das regras a que a arbitragem obedecerá, além do previsto na cláusula compromissória, e que se mostra conveniente formalizar num único documento essas regras”, e da cláusula 5ª do mesmo Acordo que “a arbitragem obedecerá às regras constantes do anexo a este acordo e, nos casos omissos, às regras do Regulamento do Centro de Arbitragem da Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa, na versão de 2014”.
    Neste anexo, denominado “Anexo ao Acordo de Arbitragem Regras processuais”, consta a regra processual identificada na alínea f), com o seguinte teor:
    “f) Com excepção dos documentos já juntos na Primeira Arbitragem – os quais não terão que ser juntos novamente -, os documentos para prova dos factos invocados devem ser juntos com a primeira peça processual que refira os factos para cuja prova relevam ; se a parte só tiver acesso ao documento após a junção da peça que o refira, deverá fazer a sua junção no prazo máximo de 10 dias a contar da data em que tenha acesso ao documento, indicando e justificando a data em que teve esse acesso ; o árbitro poderá recusar a junção de documentos feita em infração das regras desta alínea” – cf., factos 8. a 11..
    Provou-se, ainda, que anteriormente, em 28/01/2016, foi celebrado entre as mesmas Vilamoura Lusotur, S.A., anteriormente denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A., representada por NS…, designada como “Demandante”, e Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., representada por JA…, designada por “Demandada”, e no qual figurou ainda RP…, Advogado, Acordo de Arbitragem (Primeiro), o qual se encontra junto aos autos a fls. 234 e 235 – cf., facto 12..
    Este Primeiro Acordo de Arbitragem celebrado entre as partes foi subscrito, por parte da Vilamoura Lusotur, S.A., pelo seu mandatário NS…, ao abrigo da procuração forense datada de 23 de Novembro de 2015, constando desta, entre o mais, que “VILAMOURA LUSOTUR, S.A. (…) confere mandato judicial aos Senhores Drs. DG… e NS… (…), aos quais concede poderes para: (…) outorgar convenções de arbitragem e representar o mandante em processos arbitrais, de mediação, conciliação e em julgados de paz”, conforme procuração junta a fls. 239, que aqui se dá por integralmente reproduzida, nunca tendo esta procuração sido revogada – cf., factos 15. a 17..
    Por sua vez, por parte da Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., tal Primeiro Acordo de Arbitragem foi subscrito pelo seu mandatário JA…, ao abrigo de procuração forense outorgada em 27 de Janeiro de 2016, constando desta, para além do mais, que “BOGARVE – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A. (…) constitui seus bastantes procuradores os Senhores Drs. JA… e CC… (…), a quem, com o de substabelecer, confere poderes forenses gerais e especiais, para confessar, transigir e desistir e, ainda, para concluir e subscrever em sua representação com a sociedade VILAMOURA LUSOTUR, S.A., anteriormente denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A. (…), compromisso arbitral, determinar-lhe a sede, o objecto e o direito aplicável e designar árbitro, que pode ser único, para dirimir o litígio existente entre as duas sociedades relativamente ao cumprimento ou não cumprimento, total ou parcial, por qualquer uma delas, ou por ambas, do contrato de permuta celebrado em 31 de Dezembro de 2003 (….)”, não constando dos identificados Processos Arbitrais que a mesma tenha sido revogada – cf., factos 18. a 20..
    Ainda se provou que no Processo Arbitral ora em equação (Segundo) foi junta, em 16/05/2017, pela Demandada Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., procuração forense a favor dos Senhores Drs. JA… e CC…, constando desta ter sido outorgada em 05 de Maio de 2017, e conferir “poderes forenses gerais e especiais, para confessar, transigir e desistir e, ainda, para concluir e subscrever em sua representação com a sociedade VILAMOURA LUSOTUR, S.A., anteriormente denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A. (…) compromisso arbitral, determinar-lhe a sede, o objecto e o direito aplicável e designar árbitro, que pode ser único, para dirimir o litígio existente entre as duas sociedades, relativamente ao cumprimento ou não cumprimento, total ou parcial, por qualquer uma delas, ou por ambas, do contrato de permuta celebrado em 31 de Dezembro de 2003 (….)”, não prevendo esta procuração qualquer ratificação do anteriormente processado – cf., factos 29. a 31..
    Neste mesmo Processo Arbitral, a petição inicial foi apresentada pela Lusotur, S.A., em 27/03/2017, tendo a contestação sido apresentada pela Bogarve, S.A. em 08/05/2017 – cf., facto 28..
    Por fim, provou-se, conforme facto 41., que durante o Primeiro Processo Arbitral a Bogarve, S.A., esteve sempre representada pelo seu mandatário, o Advogado JA….
    Resulta, da articulação de tal factualidade que:
    - o Primeiro Acordo de Arbitragem, datado de 28/01/2016, foi subscrito, por parte da ora Requerente Bogarve, S.A., pelo seu mandatário JA…, ao abrigo da procuração forense outorgada em 27 de Janeiro de 2016 ;
    - o mesmo Primeiro Acordo de Arbitragem foi subscrito, por parte da ora Requerida Vilamoura Lusotur, S.A., pelo seu mandatário NS…, ao abrigo da procuração forense datada de 23 de Novembro de 2015 ;
    - ambas as procurações conferiam poderes expressos para outorgar convenções de arbitragem ou  compromisso arbitral ;
    - não constando de ambos os Processos Arbitrais que tais procurações tenham sido revogadas ;
    - aquando da celebração do Segundo Acordo de Arbitragem, datado de 24/02/2017, que se seguiu ao terminus do Primeiro Processo Arbitral, previu-se expressamente, no Anexo ao Acordo de Arbitragem Regras processuais, que os documentos juntos na Primeira Arbitragem não teriam que ser juntos novamente ;
    - ainda assim, a ora Requerente Bogarve, S.A., veio a juntar procuração forense, no âmbito do Segundo Processo Arbitral, em 16/05/2017, mas outorgada em 05/05/2017, prevendo novamente, para além do mais, poderes para celebrar compromisso arbitral ;
    - ora, tendo as partes previsto a expressa dispensa de junção, no Segundo Processo Arbitral, dos documentos já juntos na Primeira Arbitragem, logicamente que tal dispensa deverá ser entendida como abrangendo as próprias procurações emitidas e já juntas naquela ;
    - passando tais procurações a deverem ser consideradas como integrando o acervo documental do Segundo Processo Arbitral, por força do disposto no Considerando H) e Cláusula 5ª do Segundo Acordo de Arbitragem e alínea f) do Anexo à mesma ;  
    - ademais, ainda que assim não se considerasse, resulta claramente daquelas procurações, datadas de 27/01/2016 e 23/11/2015, que não limitam ou restringem os poderes para a outorga de convenções ou compromissos arbitrais, nomeadamente indicando que apenas concediam poderes para a celebração de um único acordo ou compromisso arbitral, referenciando expressamente a outorgada pela Bogarve que os poderes concedidos para celebrar compromisso arbitral destinavam-se a dirimir o litígio existente entre as duas sociedades relativamente ao cumprimento ou não cumprimento, total ou parcial, por qualquer uma delas, ou por ambas, do contrato de permuta celebrado em 31 de Dezembro de 2003 ;
    - assim, não é minimamente estranho ou assinalável que a ora Requerida Vilamoura Lusotur, S.A., não tenha vindo a juntar qualquer procuração ao Segundo Processo Arbitral, conformei resulta dos factos 32. e 33. ;
    - com efeito, nos termos convencionados, estava dispensada de o fazer, atenta a junção que havia sido efectuada no âmbito do Primeiro Processo Arbitral ;
    - deste modo, necessariamente se conclui que inexiste qualquer falta de poderes do Mandatário da ora Requerente Bogarve, S.A., na outorga do Segundo Acordo de Arbitragem, inexistindo qualquer necessidade de ratificação do processado ;
    - nem existe qualquer falta de procuração por parte da ora Requerida Vilamoura Lusotur, S.A., pois a celebração do Segundo Acordo de Arbitragem foi efectuada pelo seu mandatário com base nos poderes conferidos pela procuração outorgada em 23/11/2015 ;
    - aliás, e conforme a mesma bem refere, tal procuração mantém a sua total validade, sendo inclusive a ainda usada pela ora Requerida nos presentes autos, conforme resulta de fls. 229 ;
    - donde, conclui-se, na outorga do Acordo ou Convenção de Arbitragem ora em equação (segunda) inexistiu qualquer falta de poderes dos respectivos mandatários das partes outorgantes, pelo que não se pode concluir pela existência de qualquer incapacidade das partes na celebração daquela Convenção ou Acordo, assim improcedendo o invocado fundamento de anulação inscrito na subalínea i), da alínea a), do nº. 3, do artº. 46º da LAV.
    Adrede, ainda que assim não se considerasse, e na esteira do alegado pela Requerida, sempre urgia considerar acerca da eventual renúncia da Requerente á invocação de tal fundamento de anulação, nos termos conjugados dos artigos 18º, nº. 4 e 46º, nº. 4, ambos da LAV.
    Efectivamente, estatui aquele normativo que “a incompetência do tribunal arbitral para conhecer da totalidade ou de parte do litígio que lhe foi submetido só pode ser arguida até à apresentação da defesa quanto ao fundo da causa, ou juntamente com esta”.
    Por sua vez, aduz o nº. 4, do artº. 46º, que “se uma parte, sabendo que não foi respeitada uma das disposições da presente lei que as partes podem derrogar ou uma qualquer condição enunciada na convenção de arbitragem, prosseguir apesar disso a arbitragem sem deduzir oposição de imediato ou, se houver prazo para este efeito, nesse prazo, considera-se que renunciou ao direito de impugnar, com tal fundamento, a sentença arbitral”.
    Referem Pedro Siza Vieira e Nuno Ferreira Lousa [20], em anotação àquele artº. 18º, nºs. 4 a 7, abordarem “a matéria da oportunidade e do modo de arguição da incompetência do tribunal arbitral”, impondo o nº. 4 “que a incompetência do tribunal arbitral seja arguida até à apresentação da defesa quanto ao fundo da causa, podendo ser deduzida como defesa separada ou como parte da defesa quanto ao mérito”, acolhendo os números seguintes excepções a tal regra.
    Acrescenta José Robin de Andrade [21], em anotação ao transcrito nº. 4, do artº. 46º, consignar este normativo “um princípio do maior alcance prático, que visa evitar e sancionar comportamentos das partes que violem regras de boa-fé: trata-se de fazer presumir a renúncia à impugnação de comportamentos da parte que não são compatíveis com a vontade de obter mais tarde a anulação da sentença. (…) A solução aumenta também a eficiência dos processos arbitrais e dificulta práticas de tentar a utilização a posterior de questões que na altura oportuna – se tivessem sido invocadas – poderiam ter sido corrigidas”.
    Ora, in casu, caso ocorresse falta de poderes do mandatário da ora Requerente na outorga da Segunda Convenção de Arbitragem, bem como ausência de ratificação do processado, o que era do conhecimento daquela, o que eventualmente colidiria com a competência do Tribunal Arbitral, enquanto constituído por árbitro único, para conhecer acerca do litígio que lhe foi submetido, tinha a ora Requerente, ali Demandada no Segundo Processo Arbitral, o ónus de arguição de tal incompetência de submissão do litígio àquele.
    Não o fazendo, a que acresce igual omissão relativamente à invocada falta de junção de procuração por parte da ora Requerida, ali Demandante, antes tendo prosseguido com a arbitragem sem nunca ter levantado tal questão, necessariamente que ter-se-ia de concluir pela sua renúncia [22] ao direito de impugnar a sentença arbitral, com base ou fundamento na incapacidade das partes em se vincularem na convenção de arbitragem. 
    Efectivamente, entendimento diverso violaria as citadas regras da boa-fé, pois permitiria às partes o posterior suscitar de questões, e numa fase processual que já obstaria á sua sanação ou correcção, conducentes à anulação da sentença. Comportamento que certamente teria o seu campo privilegiado nos casos em que a decisão arbitral fosse contrária aos seus interesses.
    O que sempre determinaria, consequentemente, juízo de improcedência do invocado fundamento de anulação.
    Da imparcialidade e independência do árbitro nomeado – cf., artº. 46º, nº. 3, alín. a), pontos ii) ou iv), e alín. b), ponto ii)
    Prescreve o artº. 46º, nº. 3, alín. a), pontos ii) ou iv), e alín. b), ponto ii), da LAV que:
    “3 - A sentença arbitral só pode ser anulada pelo tribunal estadual competente se:
    a) A parte que faz o pedido demonstrar que:
    (…)
    ii) Houve no processo violação de alguns dos princípios fundamentais referidos no n.º 1 do artigo 30.º com influência decisiva na resolução do litígio; ou
    (…)
    iv) A composição do tribunal arbitral ou o processo arbitral não foram conformes com a convenção das partes, a menos que esta convenção contrarie uma disposição da presente lei que as partes não possam derrogar ou, na falta de uma tal convenção, que não foram conformes com a presente lei e, em qualquer dos casos, que essa desconformidade teve influência decisiva na resolução do litígio;
    (…)
    b) O tribunal verificar que:
    (…)
    ii) O conteúdo da sentença ofende os princípios da ordem pública internacional do Estado português”.
    As causas de anulação da sentença arbitral ora em equação, traduzem-se na:
    Ø Violação de princípios fundamentais do processo arbitral – o ponto ii), da alínea a), do nº. 3 ;
    Ø Grave irregularidade na composição de tribunal arbitral ou no processo arbitral - o ponto iv), da alínea a), do nº. 3 ;
    Ø Ofensa da ordem pública internacional - o ponto ii), da alínea b), do nº. 3.
    Relativamente à primeira causa de anulação enunciada - violação de princípios fundamentais do processo arbitral, por referência ao nº. 1, do artº. 30º da LAV -, impõem estes princípios, nas palavras de António Sampaio Caramelo [23]que:
    - “o demandado seja citado para se defender ;
    - As partes sejam tratadas com igualdade, devendo ser-lhes dada uma oportunidade razoável de fazerem valer os seus direitos, por escrito ou oralmente, antes de ser proferida a sentença final ;
    - Em todas as fases do processo seja garantida a observância do princípio do contraditório, salvas as excepções previstas na presente lei”.
    Acrescenta-se, traduzirem tais princípios “uma densificação do direito que é reconhecido a todas as pessoas pelo art. 20º, nº. 4, da Constituição da República, pelo artigo 6 (1) da Convenção Europeia sobre os Direitos do Homem, pelo artigo 14 (1) da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de verem as suas causas examinadas através de um «processo equitativo», direito este que constitui um desdobramento do direito de acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva, que os referidos preceitos consagram”. 
    Aduz o mesmo Autor que os princípios fundamentais feitos constar na elencagem do nº. 1, do artº. 30º, correspondem, no geral, aos ensinamentos da doutrina portuguesa e jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre esta matéria, “nos quais se identificam, como postulados da garantia do «processo equitativo», a exigência de conhecimento efectivo (pelo demandado) do processo instaurado, o direito de defesa reconhecido a cada parte (i.e., de expor as suas razões de facto ou de direito perante o tribunal, antes que este tome a sua decisão), a necessidade de se assegurar a igualdade de armas e a de se observar o princípio do contraditório ao longo do processo (de modo que cada uma das partes possa exercer uma influência efetiva no desenvolvimento do processo, nos planos da alegação, da prova e do direito aplicável)”.
    Por fim, efectuando uma clara crítica à legal consagração do último segmento do normativo - com influência decisiva na resolução do litígio -, defende que uma sua interpretação literal “pode levar ao esvaziamento da salvaguarda dos princípios fundamentais do processo arbitral que se visou assegurar através da previsão deste fundamento de anulação da sentença arbitral”, defendendo, então, uma sua interpretação restritiva, “de modo a ter o seguinte significado: [“a parte que faz o pedido demonstrar que] ….. presumivelmente tenha afectado a decisão proferida pelo tribunal arbitral””.
    No que concerne à segunda causa de anulabilidade enquadrada pela Requerente - grave irregularidade na composição de tribunal arbitral ou no processo arbitral -, o segmento “respeitante às irregularidades na «composição do tribunal arbitral» compreende não só as hipóteses de, na designação dos árbitros não se haver observado o estabelecido na convenção de arbitragem ou na lei aplicável, mas também aquelas em que os árbitros designados não preenchem os indispensáveis requisitos de independência e imparcialidade, assim como as de ter havido irregularidades praticadas nos procedimentos de recusa de árbitros ou de substituição de árbitros afastados”.
    Acrescenta, citando Miguel Galvão Teles [24], que a exigência de independência e imparcialidade dos árbitros “é uma decorrência do direito a um processo equitativo estabelecido no art. 20º, nº. 4, da Constituição da República Portuguesa, exigência essa que se impõe na arbitragem voluntária, porque esta representa constitucionalmente um modo de exercício do direito de acesso aos tribunais consagrado na CRP”.
    De forma idêntica à pronúncia relativamente á causa de anulabilidade antecedente, critica a exigência legal contida no segmento final da presente alínea, ou seja, a necessidade da parte demonstrar, em qualquer dos casos, que a exposta desconformidade teve influência decisiva na resolução do litígio, pois, “ao inculcar que o impugnante que invoque algum dos fundamentos previstos nesta alínea deve provar a existência de um «nexo causal» entre a desconformidade invocada e a solução dada ao litígio pela sentença impugnada, aquela expressão faz impender sobre a parte impugnante um ónus de prova que – pelo menos, no caso de se tratar de uma infração às regras processuais aplicáveis – será, na maioria das vezes, quase impossível de cumprir, porquanto, ainda que não tivesse ocorrido essa infracção processual, a decisão do litígio poderia ter sido igualmente desfavorável à parte que dela se queixa. Assim, tal fundamento poderá tornar-se, na prática, de utilização impossível, seja qual for a gravidade da infracção processual cometida”.
    Acrescenta, defendendo a intolerabilidade de tal consequência, que a tal expressão seja atribuído o seguinte conteúdo ou significado: “«….em qualquer dos casos, que essa desconformidade tenha presumivelmente afetado a resolução do litígio», tal como preconizámos relativamente á parte final da subalínea a) ii) do nº. 3 do mesmo artigo”.
    Refere, por fim, em observância do prescrito no citado nº. 4, do artº. 46º, da LAV, que o presente fundamento de anulação ficará precludido, “se a parte que pretenda prevalecer-se da irregularidade ocorrida não a tiver suscitado logo que dela tomou conhecimento, durante a arbitragem” [25].
    No que concerne à terceira e última causa de anulabilidade enquadrada pela Requerente - ofensa da ordem pública internacional -, o mesmo Autor, após efectuar a distinção entre ordem pública de direito material e a excepção ou reserva de ordem pública internacional (ou ordem pública de direito internacional privado), e defini-la na primeira acepção enunciada, refere que “quando intervém em sede de controlo de anulação de uma sentença arbitral, esta cláusula funciona como bitola ou padrão segundo o qual se determina a legitimidade/validade da sentença arbitral, correspondente à reconhecibilidade ou tolerabilidade pelo sistema jurídico no âmbito do qual ela foi proferida, cuja falta gerará a sua anulabilidade com efeitos erga omnes. Trata-se apenas de verificar se a sentença arbitral preenche as condições elementares de justiça material que justificam que o Estado a equipare às decisões dos seus tribunais” (sublinhado nosso).
    Relativamente à segunda acepção do conceito, reconhecendo-se que “as ordens jurídicas, através dos seus sistemas de normas de conflitos, se abrem à aplicação de direito estrangeiro ou transnacional e ao reconhecimento de decisões jurisdicionais proferidas no estrangeiro, não obstante a sua enorme diversidade, é indispensável que esse «salto para o desconhecido» (…) seja acompanhado de um dispositivo de segurança que faculte ao juiz nacional um meio de poder recusar a aplicação duma norma de direito estrangeiro ou o reconhecimento duma decisão jurisdicional estrangeira, quando dessa aplicação ou reconhecimento resulte uma intolerável ofensa da harmonia jurídico-material interna ou uma contradição flagrante com os princípios fundamentais que informam a sua ordem jurídica”.
    Seguidamente, após enunciar exemplos ou hipóteses de ofensa à ordem pública por uma sentença arbitral, elenca uma panóplia de princípios avançados por diversos autores como “integrando a «ordem pública internacional» dos respectivos Estados, pelo que a sua violação constitui fundamento de anulação de sentenças proferidas em arbitragens internas ou internacionais neles sedeadas: (i) o princípio pacta sunt servanda ; (ii) o princípio da boa fé ; (iii) a proibição do abuso de direito ; (iv) o princípio da proporcionalidade (v) a proibição das medidas discriminatórias ou espoliadoras ; (vi) a protecção dos civilmente incapazes ; (vii) a proibição das vinculações perpétuas ; (viii) a proibição de indemnizações punitivas em matéria cível ; (ix) as normas legais destinadas a proteger os contratantes mais fracos”. 
    Todavia, adverte, “a invocação da violação de princípios com conteúdo normativo tão amplo ou indeterminado como os referidos em (i), (ii) e (iii) e (iv), como fundamento de anulação de sentença arbitral, terá de ser sujeita a acentuadas restrições, para que, por essa via, não se fomente, perniciosamente, a impugnação de sentenças arbitrais sem justificação bastante, por parte de quem, insatisfeito com a decisão dos árbitros, recorra a este meio processual para tentar obter a reapreciação pelos tribunais estaduais do litígio decidido pelos árbitros”.
    Acresce que, para além da dimensão substantiva da ordem pública, o conceito desta “compreende também princípios e regras de natureza processual”, afigurando-se que o normativo em equação não se reporta á enunciada excepção ou reserva de ordem pública internacional, tendo antes em vista “a ordem pública de direito material acima definida”.
    Por fim conclui que na apreciação da causa de anulabilidade em equação urge assentar “nas seguintes proposições, separando-as apesar de estarem intimamente ligadas: (i) em sede de controlo da sentença arbitral pelo juiz, a «ordem pública» deve ser entendida de modo restritivo ; (ii) o grau de ofensa à ordem pública requerido para se anular uma sentença arbitral deve ser relativamente elevado ; (iii) a intensidade do controlo a efectuar pelo juiz ou, dito de outra maneira, os meios a empregar por ele, para verificar se ocorreu ou não uma ofensa à ordem pública, devem ser adequados ao cabal exercício da função que lhe cabe exercer”.  
    Defende, ainda, a total compatibilidade entre “exigir-se que a gravidade da ofensa à ordem pública seja elevada para conduzir à anulação da sentença arbitral – em ordem a manter um equilíbrio entre a defesa da ordem pública e a eficácia da arbitragem – e, simultaneamente, conferir-se ao juiz meios eficazes para verificar se o requerido grau de gravidade dessa ofensa foi atingido”.
    E que, “embora o controlo da compatibilidade da sentença arbitral com a ordem pública, a cargo do juiz, tenha de ser efetivo, ele deve ser exercido de modo comedido, de modo a não conduzir à revisão do mérito da causa nem à sistemática anulação da decisão do árbitro que cometeu um erro, ao proferi-la”.
    Pelo que, “não basta que tenha existido uma mera violação formal da ordem pública (a mera inobservância das normas de ordem pública aplicáveis ao caso). É necessário que se tenha verificado uma violação efetiva ou concreta de regras ou princípios de ordem pública (i.e., que os seus objectivos específicos tenham sido afrontados), para que se possa anular a sentença arbitral.
    Deve, por isso, ser mantida uma sentença arbitral que, embora ignore formalmente uma regra ou princípio de ordem pública, não venha a consagrar uma situação inconciliável com o que resultaria da correta aplicação de tal norma ou princípio” [26].
    Na causa ora em apreciação, a Requerente invoca a pretensão de anulação da sentença arbitral na falta de independência e ou de imparcialidade do árbitro único nomeado.
    Efectuando uma dissertação acerca do dever dos árbitros em serem independentes e imparciais, à luz do que ocorre com os juízes, aduz a Requerente que, quer na primeira quer na segunda arbitragem, não lhe foi dada a conhecer a informação fornecida pelo Árbitro nomeado, a qual deve ser considerada como muito importante, pois, além do mais, estamos perante uma situação de Árbitro único.
    Deste modo, acrescenta, encontrava-se em situação de erro, quanto às qualidades do árbitro, e que conduziram à sua nomeação como Árbitro único, o que deve determinar a nulidade do Acordo de Arbitragem e de todo o consequente Processo Arbitral.
    Por outro lado, invoca que a circunstância do Árbitro único nomeado constituir árbitro recorrentemente indicado pela sociedade de advogados que patrocinou a ora Requerida, o que nunca foi revelado antes da constituição do tribunal arbitral ou durante o decurso do respectivo processo, constitui também fundamento para anulação da decisão arbitral.
    Conclui que, entendimento contrário, no sentido da parte estar impossibilitada de esgrimir tal argumento em acção de anulação de sentença arbitral, seria inconstitucional, por violação do princípio da proibição da indefesa, ínsito no direito de acesso ao Direito e aos Tribunais, consagrado no artº. 20º, da Constituição da República Portuguesa.
    Na oposição/contestação apresentada, e nos termos já supra enunciados, alega a Requerida que a Requerente sempre conheceu das circunstâncias reveladas pelo Árbitro logo no Primeiro Acordo de Arbitragem e reiteradas na Primeira Sentença Arbitral.
    Acrescenta que o conhecimento e percepção da Requerente, enquanto pessoa colectiva, é também formado pelas pessoas singulares mandatadas pela administração para praticar actos em sua representação (conhecimento normativo). E que, para além deste conhecimento, acresce o dever da ora Requerente de não ignorar a existência e conteúdo do Primeiro Acordo de Arbitragem, da Primeira Decisão Arbitral e do Segundo Acordo de Arbitragem, onde tais circunstâncias são reiteradas.
    Por outro lado, invoca inexistir qualquer erro da Requerente relativamente às qualidades do Árbitro nomeado, pois, por um lado, não é verdade que o mesmo árbitro fosse recorrentemente indicado pela sociedade de advogados que representou a ora Requerida em ambas as arbitragens, inexistindo, assim, erro quanto à alegada “pseudo-circunstância”.
    Por outro, inexiste ainda qualquer situação de erro quanto às circunstâncias reveladas pelo Árbitro no Primeiro Acordo de Arbitragem, reproduzidas na Primeira Sentença Arbitral e reproduzidas no Segundo Acordo de Arbitragem, pois eram do conhecimento da Requerida e, ainda que assim não fosse, um qualquer hipotético erro respeitante às qualidades do Árbitro único, ter-se-iam que verificar na pessoa do representante da Requerente, ou seja, no Advogado JA…, por força dos poderes conferidos pelo mandato forense e em observância do prescrito no artº. 259º, do Cód. Civil.
    Refere, igualmente, que as circunstâncias reveladas pelo Árbitro são imprestáveis para sustentar um pedido de anulação da Segunda Sentença Arbitral, pois tais circunstâncias nem se quer se enquadram naquelas que devem obrigatoriamente ser reveladas às partes numa arbitragem, sendo assim imprestáveis para inquinar a independência e imparcialidade do árbitro.
    Por fim, a Requerida, alega, ainda que por força do artº. 14º, da LAV, o árbitro teria que ser recusado pela Requerente no prazo de 15 dias a contar do conhecimento do facto, ou seja, 15 dias após 28/01/2016, data em que foi assinado o Primeiro Acordo de Arbitragem, o que não fez.
    Analisemos.
    Estatui o artº. 9º, nº. 3, da LAV, acerca dos requisitos do árbitros, que estes “devem ser independentes e imparciais”, acrescentando o artº. 13º, ajuizando acerca dos fundamentos de recusa, que:
    “1 - Quem for convidado para exercer funções de árbitro deve revelar todas as circunstâncias que possam suscitar fundadas dúvidas sobre a sua imparcialidade e independência.
    2 - O árbitro deve, durante todo o processo arbitral, revelar, sem demora, às partes e aos demais árbitros as circunstâncias referidas no número anterior que sejam supervenientes ou de que só tenha tomado conhecimento depois de aceitar o encargo.
    3 - Um árbitro só pode ser recusado se existirem circunstâncias que possam suscitar fundadas dúvidas sobre a sua imparcialidade ou independência ou se não possuir as qualificações que as partes convencionaram. Uma parte só pode recusar um árbitro que haja designado ou em cuja designação haja participado com fundamento numa causa de que só tenha tido conhecimento após essa designação”.
    O processo de recusa vem previsto no normativo seguinte – 14º -, onde se estatui que:
    “1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do presente artigo, as partes podem livremente acordar sobre o processo de recusa de árbitro.
    2 - Na falta de acordo, a parte que pretenda recusar um árbitro deve expor por escrito os motivos da recusa ao tribunal arbitral, no prazo de 15 dias a contar da data em que teve conhecimento da constituição daquele ou da data em que teve conhecimento das circunstâncias referidas no artigo 13.º Se o árbitro recusado não renunciar à função que lhe foi confiada e a parte que o designou insistir em mantê-lo, o tribunal arbitral, com participação do árbitro visado, decide sobre a recusa.
    3 - Se a destituição do árbitro recusado não puder ser obtida segundo o processo convencionado pelas partes ou nos termos do disposto no n.º 2 do presente artigo, a parte que recusa o árbitro pode, no prazo de 15 dias após lhe ter sido comunicada a decisão que rejeita a recusa, pedir ao tribunal estadual competente que tome uma decisão sobre a recusa, sendo aquela insusceptível de recurso. Na pendência desse pedido, o tribunal arbitral, incluindo o árbitro recusado, pode prosseguir o processo arbitral e proferir sentença”.
    Por sua vez, estatui o artº. 12º, nº. 1, do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, de 01/03/2014, prevendo acerca de recusa de árbitro, que “um árbitro só pode ser recusado se existirem circunstâncias que possam objectivamente suscitar fundadas dúvidas sobre a sua independência, imparcialidade ou disponibilidade, ou se não possuir as qualificações convencionadas pelas partes”.
    O artº. 11º do mesmo Regulamento, sob a epígrafe de independência, imparcialidade e disponibilidade dos árbitros, prevê que:
    “1 – Os árbitros devem ser e permanecer independentes, imparciais e disponíveis.
    2 − Qualquer pessoa que aceite integrar um tribunal arbitral deve assinar a declaração prevista no artigo anterior, em que dê a conhecer quaisquer circunstâncias que possam, na perspectiva das partes, originar dúvidas fundadas a respeito da sua independência, imparcialidade ou disponibilidade.
    3 − Enquanto decorrer a arbitragem, o árbitro deve dar a conhecer sem demora qualquer nova circunstância susceptível de originar, na perspectiva das partes, dúvidas fundadas a respeito da sua independência, imparcialidade ou disponibilidade.
    4 – O facto de um árbitro revelar qualquer circunstância ao abrigo dos números anteriores não constitui, em si mesmo, motivo de recusa”.
    Por fim, mencione-se, ainda, o prescrito no artº. 4º do Código Deontológico do Árbitro (aprovado na Assembleia Geral da Associação Portuguesa de Arbitragem, realizada a 11 de Abril de 2014), sob a epígrafe de Dever de Revelação, no sentido de que:
    “1. O árbitro e o árbitro convidado têm o dever de revelar todos os factos e circunstâncias que possam fundadamente justificar dúvidas quanto à sua imparcialidade e independência, mantendo-se tal obrigação até à extinção do seu poder jurisdicional.
    2. Antes de aceitar o encargo, o árbitro convidado deve informar quem o houver proposto quanto ao seguinte:
    a) Qualquer relação profissional ou pessoal com as partes ou com os seus representantes legais que o árbitro convidado considere relevante;
     b) Qualquer interesse económico ou financeiro, direto ou indireto, no objeto da disputa;
    c) Qualquer conhecimento prévio que possa ter tido do objeto da disputa.
    3. Após aceitar o encargo, o árbitro deve informar por escrito as partes e, tratando-se de tribunal arbitral coletivo, os outros árbitros, bem como a instituição responsável pela administração da arbitragem que o tenha nomeado, sobre os factos e circunstâncias previstos no n.º 2, quer preexistentes à aceitação do encargo, quer supervenientes.
    4. Ao aceitar o encargo, o árbitro deve assinar e enviar às partes e aos restantes árbitros a declaração de independência e imparcialidade prevista no anexo único ou outra de teor substancialmente semelhante.
    5. Havendo dúvida sobre a relevância de qualquer facto, circunstância ou relação, prevalecerá sempre o dever de revelação.
    6. Salvo se outra coisa resultar da mesma, a revelação dos factos e circunstâncias previstos no nºs 2 e 3 por parte do árbitro convidado e do árbitro não poderá ser entendida como declaração de que não se considera imparcial e independente e que, consequentemente, não está apto a desempenhar as funções de árbitro”.
    Estipulando acerca do Princípio Geral, prescreve o artº. 1º, do mesmo Código, que
    “1. Os árbitros obrigam-se a ser e permanecer independentes e imparciais, respeitando e fazendo respeitar o prestígio e a eficiência da arbitragem como meio justo de resolução de litígios.
    2. O presente Código Deontológico deve ser interpretado e integrado tendo presentes as melhores práticas internacionais, designadamente as Diretrizes da International Bar Association relativas a Conflitos de Interesses em Arbitragem Internacional.
    3. Salvo quando disposição imperativa da lei outra coisa dispuser, os membros da Associação Portuguesa de Arbitragem devem respeitar os princípios deontológicos previstos no presente código”.
    Conforme resulta do supra exposto, um dos fundamentos em que a Requerente sustenta o preenchimento das aludidas causas de anulabilidade, tem basicamente em ponderação o seguinte lastro factual: o Árbitro Único nomeado constitui árbitro recorrentemente indicado pela sociedade de advogados que patrocina a ora Requerida (e que nos dois processos arbitrais patrocinou a Demandante), o que nunca foi revelado, nem antes da constituição do Tribunal Arbitral, nem durante o decurso do respectivo processo, o que se traduz em concreto e real fundamento para anulação da decisão arbitral.
    Ora, conforme resulta do ponto iv) da factualidade não provada, não se logrou provar que o Árbitro único nomeado na Primeira e Segunda Arbitragens – o Professor Doutor RP… -, seja, com bastante frequência, o árbitro indicado pelas partes patrocinadas pelos advogados pertencentes à sociedade de advogados Uria Menendez Proença de Carvalho, onde se inserem os mandatários que patrocinaram a ora Requerida, em ambas as arbitragens.
    Alias, e conforme facto 37. provado, logrou-se, inclusive, efectuar a prova do contrário, ou seja, que tal Árbitro não era recorrentemente nomeado como árbitro pela sociedade de advogados de que fazem parte os mandatários da Vilamoura Lusotur, S.A. (ora Requerida).
    Pelo que, falecendo a concreta prova daquele lastro factual, nunca o mesmo poderá ser equacionado, in casu, como podendo, de alguma forma, preencher as aludidas causas de anulabilidade invocadas, nomeadamente, que ocorra violação de algum dos princípios fundamentais do processo arbitral, grave irregularidade na composição do tribunal arbitral ou que o teor do decidido traduza, de alguma forma, ofensa às exigências de ordem pública legalmente prescritas.
    Donde, no que concerne ao presente segmento accional, o juízo só pode ser o de improcedência dos invocados fundamentos de anulação.   
    O segundo dos fundamentos invocados, no âmbito das presentes causas de anulabilidade reportadas à imparcialidade e independência do Árbitro nomeado, densifica-se factualmente na alegação da Requerente de que nunca lhe foi dada a conhecer, nem na Primeira, nem na Segunda Arbitragem, a informação fornecida pelo Árbitro nomeado, ou seja, as circunstâncias pelo mesmo reveladas, o que se afigura de assaz relevância, em virtude de estarmos perante situação de Árbitro único.
    Pelo que considera encontrar-se em situação de erro quanto às qualidades do Árbitro nomeado, conducentes à sua nomeação como Árbitro único.
    Vejamos os factos.
    Consta sob o Considerando D) do Primeiro Acordo de Arbitragem, datado de 28/01/2016, “que a Demandante a Demandada estão de acordo em designar como árbitro único o signatário RP…”, reiterando-se na cláusula 1ª daquele Acordo que “a Demandante e a Demandada reiteram o seu acordo em submeter a arbitragem o litígio que tem por objecto a interpretação e o cumprimento do Contrato, designando como árbitro único o signatário RP…”.
    Por sua vez, consta da cláusula 3ª do mesmo Acordo que “o árbitro signatário declara aceitar exercer as funções em causa e não conhecer factos que possam levantar dúvidas sobre a sua imparcialidade e independência, tendo, por mera cautela, informado previamente a Demandante e a Demandada ter sido advogado da Garveprasa, SGPS, S.A. e da Grupo Pra, S.A., empresas que integram um grupo empresarial que deteve a Demandante durante alguns anos, num processo arbitral relacionado com a compra que tal grupo empresarial fez, em 2004, de participações representativas de 100% do capital social da Demandante” – (sublinhado ora aposto) cf., factos 12. a 14..
    Provou-se, ainda, ter sido celebrado posteriormente, em 24/02/2017, o denominado Segundo Acordo de Arbitragem, consignando-se sob os Considerandos D) e G) que “a Demandante e a Demandada designaram como árbitro único o signatário RP…” e que “estão de acordo em designar novamente como árbitro único o signatário RP…", reiterando-se na cláusula 1ª daquele Acordo que “a Demandante e a Demandada reiteram o seu acordo em submeter a arbitragem o litígio que tem por objecto a validade, eficácia, interpretação e o cumprimento do Contrato, designando como árbitro único o signatário RP…”.
    Consta sob a cláusula 3ª do mesmo Acordo que “o árbitro signatário declara aceitar exercer as funções em causa e não conhecer factos que possam levantar dúvidas sobre a sua imparcialidade e independência, para além dos que já foram comunicados às partes em anterior arbitragem” (sublinhado ora aposto) – cf., factos 8. a 10..
    Provou-se, ainda, conforme factos 35. e 36., que o Árbitro nomeado em ambos os Processos Arbitrais nunca foi Advogado da Lusotur, S.A., tendo a assessoria do mesmo à Grupo PRA, S.A., e à Garveprasa, SGPS, S.A., feita constar em ambos os Acordos de Arbitragem, decorrido no âmbito de um único processo arbitral.
    E, conforme factos 43. a 47., ainda se provou que a Sentença Arbitral (Primeira) foi proferida em 28 de Outubro de 2016, tendo sido notificada aos Mandatários de Demandante e Demandada, através de e-mail remetido em 28/10/2016 e transcrevendo a mesma, na segunda e terceira páginas, as circunstâncias reveladas pelo Árbitro na Cláusula 3ª do Primeiro Acordo de Arbitragem. Tais circunstâncias, pelo menos desde data não determinada do Primeiro Processo Arbitral, sempre foram do conhecimento da administração da ora Requerente Bogarve, S.A., que nunca levantou qualquer objecção às mesmas.
    Em contraponto, e conforme factos não provados i) a iii), não se logrou provar que só após a prolação da Segunda Sentença Arbitral, a ora Requerente Bogarve, S.A., tenha tido conhecimento das circunstâncias reveladas pelo Árbitro na Cláusula 3ª do Primeiro Acordo de Arbitragem, reproduzidas na Primeira Sentença Arbitral e reiteradas no Segundo Acordo de Arbitragem, sendo até aí absolutamente desconhecidas da mesma. E que antecedentemente à prolação daquela Segunda Sentença Arbitral, nunca a mesma Requerente tenha sido informada, por qualquer forma ou meio e fosse por quem fosse, quer na Primeira, quer na Segunda Arbitragens, da factualidade revelada pelo Árbitro naquelas circunstâncias, de forma a permitir-lhe decidir acerca do acordo sobre a sua nomeação, ou se, pelo contrário, a devia desde logo afastar.
    Não se provou, ainda, que o mandatário da ora Requerente Bogarve, S.A., Dr. JA…, não tenha dada a conhecer a esta o conteúdo do Segundo Acordo de Arbitragem – cf., facto vii).
    Nem se provou, conforme factos xiii) e xiv), que o conhecimento daquelas circunstâncias reveladas pelo Sr. Árbitro, por parte da administração da ora Requerente Bogarve, S.A., ocorresse, precisamente, desde 28/01/2016, data do Primeiro Acordo de Arbitragem, ou que as mesmas circunstâncias sempre tivessem sido do conhecimento da ora Requerente Bogarve, S.A..
    Resulta, deste modo, claramente, que:
    § O Árbitro nomeado, logo aquando da celebração do Primeiro Acordo de Arbitragem, declarou, em cumprimento do enunciado Dever de Revelação, que, por mera cautela, informou previamente a Demandante e a Demandada ter sido advogado da Garveprasa, SGPS, S.A. e da Grupo Pra, S.A., empresas que integram um grupo empresarial que deteve a Demandante durante alguns anos, num processo arbitral relacionado com a compra que tal grupo empresarial fez, em 2004, de participações representativas de 100% do capital social da Demandante ;
    § Tais circunstâncias voltaram a ser referidas pelo Sr. Árbitro nomeado aquando da celebração do Segundo Acordo de Arbitragem ;
    § As mesmas circunstâncias foram reproduzidas na Primeira Sentença Arbitral, na parte em que esta reproduziu o Primeiro Acordo de Arbitragem ;
    § E que a administração da ora Requerente Bogarve, S.A., teve conhecimento do teor de tais circunstâncias reveladas pelo Sr. Árbitro, pelo menos desde data não determinada do Primeiro Processo Arbitral, não tendo levantado qualquer objecção às mesmas ;
    § Resulta, assim, que o conhecimento de tais circunstâncias por parte da Requerente Bogarve, S.A., foi directo, factual e imediato, independentemente do juízo ou mecanismo da imputação normativa do conhecimento às sociedades comerciais, decorrente da outorga dos Acordos de Arbitragem por parte do Advogado mandatado pela administração daquela para praticar actos em sua representação, nos termos sustentados pela ora Requerida ;
    § Ou seja, inexiste sequer necessidade de recurso a tal conceito de imputação normativa do conhecimento, fundado num alegado conhecimento de direito das aludidas circunstâncias, em que o conhecimento ou percepção da pessoa colectiva também resulta necessariamente formado pelo conhecimento e percepção adquirido pelas pessoas singulares mandatadas pela administração para a prática de actos em sua representação.
    Aqui chegados, e perante a factualidade apurada, afigura-se-nos ser pertinente o regresso ao estatuído no transcrito nº. 4, do artº. 46º, da LAV, já supra apreciado e enquadrado, o qual prescreve que “se uma parte, sabendo que não foi respeitada uma das disposições da presente lei que as partes podem derrogar ou uma qualquer condição enunciada na convenção de arbitragem, prosseguir apesar disso a arbitragem sem deduzir oposição de imediato ou, se houver prazo para este efeito, nesse prazo, considera-se que renunciou ao direito de impugnar, com tal fundamento, a sentença arbitral”.
    Citando doutrina Alemã, refere António Sampaio Caramelo [27] ser função desta norma “acelerar o processo, isolando-o dos efeitos do comportamento oportunístico de uma parte que, perante uma infração de alguma regra processual não imperativa, poderia ficar quieta, esperando pela resolução do litígio, i.e., pela sentença: se esta viesse a ser-lhe favorável, a parte aceitá-la-ia ; se lhe fosse desfavorável, a parte afetada exploraria esse erro processual, impugnando a sentença com vista à anulação”.
    Enquadrando-a no nosso sistema legal, considera ser o princípio da boa fé a justificar tal solução, pois entre os princípios gerais que este expressa ou projecta, “avulta o da proteção da confiança e destes institutos interessa, particularmente, à questão em apreço, o do «abuso do direito», na modalidade de proibição do venire contra factum proprium. Se (…) a razão de ser da relevância jurídica da contraditoriedade da atuação radica na eficácia geradora de confiança do comportamento do sujeito e se a justificação da censura que a ordem jurídica lhe dirige reside no facto de essa contraditoriedade poder frustrar a fundada confiança depositada (por quem interaja com esse sujeito) num determinado proceder futuro do agente, tendo em conta a sua conduta precedente, frustrando também a coordenação de condutas ensaiadas por outros, não existe razão válida para não estender o âmbito de aplicação deste instituto ao direito processual e, consequentemente, ao regime da arbitragem voluntária”.
    Acrescenta, ainda, que a figura prevista no normativo não constitui, em rigor, uma renúncia (ainda que tácita), mas antes uma preclusão, procedendo á definição de ambas as figuras e aduzindo que “é precisamente na «perda duma faculdade» que a parte teria em consequência de um comportamento adotado por ela no processo, que se traduz a figura regulada no nº. 4 do art. 46º. Pelo facto de a parte que porventura pretendesse prevalecer-se de uma infração a uma disposição processual estabelecida nesta lei, com carácter não imperativo, ou estipulada na convenção de arbitragem (…), não deduzir oposição de imediato, ela perde a faculdade de impugnar, com tal fundamento, a sentença arbitral”.
    Ora, para que se possa operar a aludida preclusão ou renúncia, é mister que se preencham três diferenciados requisitos:
    1. em primeiro lugar, configura-se como necessário “que o tribunal arbitral tenha cometido um erro processual, infringindo uma norma relativa ao processo arbitral que as partes pudessem derrogar”, pelo que, quando são “violadas normas legais de carácter imperativo, o direito de impugnação não pode extinguir-se pelo silêncio, porque a obrigatoriedade de tais normas não pode ser neutralizada pela conjugação da atuação dos árbitros com as partes, desrespeitadoras de tais normas” ;
    2. em segundo lugar, exige-se que “a parte afectada tenha tido «conhecimento» da infracção a uma norma legal supletiva ou ao estipulado na convenção de arbitragem” ;
    3. em terceiro lugar, para que se efective a aludida perda do direito de impugnar “é preciso que a parte afetada prossiga na arbitragem, sem deduzir oposição de imediato, ou no prazo fixado para o efeito na lei ou no regulamento para que a convenção de arbitragem haja remetido, ou em decisão ordenadora do processo que o tribunal arbitral haja proferido ao abrigo do artº. 30º, nº. 3, da LAV”.
    Por fim, reafirmando o aludido na doutrina alemã, considera terem efectiva razão os que descortinam no presente normativo “uma manifestação do princípio da boa fé processual”, e que a preclusão deverá estender-se “não só às fases subsequentes do processo arbitral, mas também aos processos que viessem a decorrer perante o tribunal estadual competente, com vista, nomeadamente, à anulação da sentença ou ao seu reconhecimento e execução”.
    Ora, a ora Requerente teve conhecimento do teor das circunstâncias reveladas pelo Sr. Árbitro, pelo menos desde data não determinada do Primeiro Processo Arbitral, não tendo levantado qualquer objecção às mesma.
    Pelo que, mesmo a equacionar-se que estaríamos perante circunstâncias que poderiam suscitar fundadas dúvidas sobre a imparcialidade e independência do Árbitro (o que ainda não concluímos), que constituíssem, inclusive, fundamentos da sua recusa, nos termos equacionados no artº. 13º, da LAV, o que é certo é que a ora Requerente, e ali Demandada, não levantou qualquer objecção ao teor de tais circunstâncias nem iniciou qualquer processo de recusa do Árbitro, nos termos do artº. 14º, do mesmo diploma.
    E, não o fez nem durante o Primeiro Processo Arbitral, nem o fez no decurso do Segundo Processo Arbitral ora em equação, vindo apenas a levantar tal questão, apesar daquele conhecimento, através do presente pedido de anulação da sentença arbitral.
    Aliás, resulta claramente da factualidade provada o agrado demonstrado pela mesma Demandada Bogarve, S.A., e ora Requerente, pelo desempenho do Árbitro nomeado, pois, no âmbito do Primeiro Processo Arbitral foram apresentadas alegações escritas por aquela, nas quais, através do seu Mandatário, refere que “desta arbitragem resultou, antes do mais, demonstrado o acerto da Demandante e da Demandada ao enveredarem pela solução do Árbitro único e, mais, ao escolherem para o cargo e o encargo o Senhor Doutor RP…. Se a ciência do Preclaro Jurista não carecia de demonstração, menos ainda de glosa, importa acrescentar-lhe a exibição, que deleitou, de sentido de equilíbrio e de justiça e a sensatez com que desempenhou o seu cargo” – cf., facto 50..
    Ora, não funcionando aquela recusa de forma necessária, mas antes estando na dependência das partes após o conhecimento das circunstâncias reveladas, que assim devem ponderar acerca da sua eventual relevância, e nada tendo sido objectado, necessariamente se terá que concluir pelo preenchimento da totalidade dos requisitos enunciados, existindo efectiva preclusão ou renúncia, decorrente do comportamento da ora Requerente, em impugnar, com tal fundamento – concretamente que tenha existido grave irregularidade na composição do tribunal arbitral, em virtude do árbitro designado não preencher os requisitos da independência e imparcialidade -, a sentença arbitral em equação.
    Todavia, caso assim não se considerasse, sempre haveria que avaliar acerca da prestabilidade das circunstâncias reveladas pelo Árbitro nomeado para inquinar a sua independência e imparcialidade e, consequentemente, sustentar o deduzido pedido de anulação da sentença arbitral.
    Relembre-se que as circunstâncias reveladas são as de que foi advogado da Garveprasa, SGPS, S.A. e da Grupo Pra, S.A., empresas que integram um grupo empresarial que deteve a Demandante durante alguns anos, num processo arbitral relacionado com a compra que tal grupo empresarial fez, em 2004, de participações representativas de 100% do capital social da Demandante.
    Já constatámos dispor o nº. 2, do artº. 11º do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, de 01/03/2014, que qualquer pessoa que aceite integrar um tribunal arbitral deve dar a conhecer “quaisquer circunstâncias que possam, na perspectiva das partes, originar dúvidas fundadas a respeito da sua independência, imparcialidade ou disponibilidade”, acrescentando o nº. 4, do mesmo normativo, que “o facto de um árbitro revelar qualquer circunstância ao abrigo dos números anteriores não constitui, em si mesmo, motivo de recusa”.
    Tais princípios ou directrizes são reafirmados pelo artº. 4º do Código Deontológico do Árbitro (aprovado na Assembleia Geral da Associação Portuguesa de Arbitragem, realizada a 11 de Abril de 2014), o qual dispõe no seu nº. 1 constituir dever do árbitro a revelação de “todos os factos e circunstâncias que possam fundadamente justificar dúvidas quanto à sua imparcialidade e independência”, acrescentando-se no nº. 3, do mesmo normativo, que após aceitar o cargo, constitui dever do árbitro “informar por escrito as partes e, tratando-se de tribunal arbitral coletivo, os outros árbitros, bem como a instituição responsável pela administração da arbitragem que o tenha nomeado, sobre os factos e circunstâncias previstos no n.º 2”.
    Entre tais circunstâncias, consta a da existência de “qualquer relação profissional ou pessoal com as partes ou com os seus representantes legais que o árbitro convidado considere relevante” – cf., a alínea a), daquele nº. 2 - e, existindo dúvida acerca da relevância de qualquer facto, circunstância ou relação, impõe-se o dever de revelação – cf.,. o nº. 5.
    Por fim, e nos termos já feitos constar do Regulamento de Arbitragem, conclui o nº. 6, ainda do mesmo normativo, que, por princípio, tal revelação dos factos ou circunstâncias por parte do árbitro, “não poderá ser entendida como declaração de que não se considera imparcial e independente e que, consequentemente, não está apto a desempenhar as funções de árbitro”.
    Tais regras ou princípios subjazem ao princípio geral logo enunciado no nº. 2, do artº. 1º de tal Código Deontológico, no sentido de que a interpretação e integração a efectuar na aplicação deste deve observar “ as melhores práticas internacionais, designadamente as Diretrizes da International Bar Association relativas a Conflitos de Interesses em Arbitragem Internacional”.
    Ora, apreciadas as Directrizes da IBA sobre Conflitos de interesse em Arbitragem Internacional, aprovado por Resolução do Conselho IBA de 23/10/2014, actualizado em 10/08/2015 [28], consta que “desde a  sua emissão em 2004, as Diretrizes IBA sobre conflitos de interesse na arbitragem internacional (as Directrizes) 1 ganharam ampla aceitação dentro da comunidade de arbitragem internacional. Os árbitros geralmente usam as Diretrizes quando tomar decisões sobre compromissos em potencial e divulgações. Da mesma forma, as partes e seus advogados considere frequentemente as Directrizes ao avaliar o imparcialidade e independência dos árbitros, e instituições e tribunais arbitrais também consultam Directrizes para considerar desafios aos árbitros”.
    Acrescenta-se, ressalvando, que “o fato de exigir divulgação - ou de um árbitro fazer uma divulgação - não implica a existência de dúvidas quanto à imparcialidade ou independência do árbitro”, mas que presentemente “partes,  árbitros, instituições e tribunais enfrentam decisões complexas sobre as informações que árbitros devem divulgar e os padrões de aplicação à divulgação”.
    Assim, as Directrizes correspondem e reflectem o entendimento do “Comité de Arbitragem do IBA quanto à melhor prática internacional actual, firmemente enraizada nos princípios expressos nas Normas Gerais”, ressalvando-se que “não são disposições legais e não substituem nenhuma lei nacional aplicável ou regras arbitrais escolhidas pelas partes”.
    Por sua vez, de forma a permitir uma prática aplicabilidade, as Directrizes categorizam situações que podem ocorrer, conferindo diferentes cores a determinadas listagens de situações.
    Deste modo, a Lista Vermelha reporta-se a situações que “suscitam dúvidas justificáveis ​​quanto à imparcialidade e independência do árbitro. Ou seja, nessas circunstâncias, um objetivo conflito de interesses existe do ponto de vista de uma terceira pessoa razoável que tenha conhecimento dos fatos e circunstâncias relevantes. (…). A Lista Vermelha inclui situações decorrentes da princípio primordial de que nenhuma pessoa pode ser sua seu próprio juiz. Portanto, a aceitação de tal situação não pode curar o conflito. A renúncia A Lista Vermelha cobre situações graves, mas não tão grave. Por causa de sua seriedade, ao contrário circunstâncias descritas na Lista Laranja, esses situações devem ser consideradas dispensáveis, mas somente se e quando as partes, cientes das situação de conflito de interesses, declarar expressamente vontade de ter essa pessoa como árbitro”.
    Por sua vez, a Lista Laranja configura-se como uma enunciação “não exaustiva de informações específicas, situações que, dependendo dos fatos de um dado caso, possa, aos olhos das partes, suscitar dúvidas quanto à imparcialidade ou independência do árbitro. (…) Consequentemente, o árbitro tem o dever de divulgar tais situações. Em todas essas situações, o considera-se que as partes aceitaram o árbitro se, após a divulgação, nenhuma objeção oportuna for feita”.
    Por fim, a Lista Verde traduz uma listagem “não exaustiva de informações específicas. Situações em que nenhuma aparência e nenhuma real conflito de interesses existe de um ponto objetivo de vista. Assim, o árbitro não tem o dever de divulgar situações que se enquadram na Lista Verde. Como declarado na explicação da norma geral 3 (a), deve haver um limite para a divulgação, com base em razoabilidade; em algumas situações, um objetivo o teste deve prevalecer sobre o teste puramente subjetivo dos 'olhos' das partes”.
    Ora, confrontando a natureza das informações/circunstâncias feitas constar pelo Árbitro nomeado, na revelação pelo mesmo efectuada nos dois Acordos de Arbitragem, em concatenação com as situações elencadas nas citadas listagens do IBA Guidelines, constata-se que aquelas circunstâncias reveladas, quando muito e no limite, figurariam na Lista Laranja – cf., ponto 3.1 -, tudo dependendo da temporalidade em que foram exercidas as funções de advogado feitas constar nas circunstâncias reveladas. Ou nem sequer figurariam em qualquer listagem, caso aquelas funções tenham sido exercidas há mais de três anos, computado desde a outorga do Primeiro Acordo de Arbitragem.
    Relativamente a tal questão, não se logrou provar que a assessoria descrita em 36. tenha decorrido durante pouco mais de um ano, nomeadamente de 16/04/2009 a 10/08/2010, cerca de cinco anos e meio antes da assinatura do Primeiro Acordo de Arbitragem, e que o grupo empresarial que integrava as empresas Grupo PRA, S.A., e Garveprasa, SGPS, S.A., tivesse deixado de ter participações na Vilamoura Lusotur, S.A., desde 2010 – cf., factos xi) e xii).
    Ou seja, desconhece-se a data concreta em que o Árbitro nomeado desempenhou aquelas funções, enquanto advogado, de empresas de um grupo que deteve a Demandante, e ora Requerida, num processo arbitral relacionado com a compra, que aquele mesmo Grupo efectuou, em 2004, de participações representativas de 100% do capital social da Demandante.
    Pelo que, perante tal desconhecimento, e tal como afirmámos, no limite, isto é, mesmos a admitir-se que tais funções foram exercidas nos últimos três anos, por referência à data da celebração do Primeiro Acordo de Arbitragem – 28/01/2016 – ainda assim as circunstâncias ou revelações apenas figurariam na denominada Lista Laranja, pelo que, devidamente comunicadas e nenhuma objecção tendo sido feita, conclui-se pela devida aceitação do Árbitro nomeado, sendo certo, ainda, que aquelas não constituem e nem traduzem, por si só, causa automática ou imediata da real verificação de um conflito de interesses.
    Donde se conclui, concludentemente, pela inexistência de qualquer situação de comprometimento da independência e imparcialidade do Árbitro nomeado, o que determina o consequente não preenchimento do invocado fundamento de anulação e das invocadas causas de anulabilidade da sentença arbitral, inscritas no artº. 46º, nº. 3, alínea a), subalíneas ii) e iv), e alínea b), subalínea ii).
    À latere, referencie-se, ainda, o seguinte:
    Refere a Requerida que nos artigos 9º e 40º do seu articulado inicial, a Requerente Bogarve, S.A., afirma que a modificação do estatuído na cláusula 9ª do Contrato, que constitui Cláusula Compromissória, pelo Segundo Acordo de Arbitragem estaria ferida de invalidade.
    Defende, contudo, a validade da modificação da cláusula compromissória ali inserta, mediante documento particular na decorrência do estipulado no nº. 2, do artº. 221º, do Cód. Civil, pois a estipulação de cláusula compromissória não está sujeita a escritura pública.
    Pelo que, conclui, observadas as regras e requisitos do artº. 2º da LAV, “nada obstava a que as partes determinassem regras de composição e funcionamento do tribunal arbitral distintas das previstas na cláusula 9ª do Contrato”.
    Analisemos.
    Provou-se, conforme factos 23. e 24., que os “processos arbitrais tiveram por base o contrato de compra e venda e permuta de bens futuros, celebrado entre a Vilamoura Lusotur, S.A., anteriormente denominada Lusotur – Empreendimentos Imobiliários e Turísticos, S.A., e a Bogarve – Construção, Gestão e Venda de Imóveis, S.A., por escritura pública, denominada Permuta, datada de 31/12/2003, e respectivo documento complementar, constando expressamente sob as alíneas a) e b), da Cláusula nona deste que:
    “a) – As partes acordam em submeter todos os litígios emergentes da execução ou interpretação deste contrato ao Tribunal Arbitral, que funcionará em conformidade com o disposto na Lei número trinta e um/oitenta e seis de vinte e nove de Agosto.
    b) – O Tribunal Arbitral será composto por três árbitros, cabendo a cada uma das partes a escolha de um dos árbitros e sendo o Presidente do Tribunal designado por acordo entre as partes ou, na falta deste, pelo Juiz Presidente do Tribunal da Relação de Évora”. 
    Provou-se, igualmente, conforme factos 26. e 27., que “a ora Requerente Bogarve, S.A., soube que o Segundo Processo Arbitral decorria em moldes distintos dos que haviam sido consagrados na transcrita cláusula nona do Contrato, sabendo, ainda, que o mesmo Processo Arbitral era conduzido por árbitro único, nomeadamente o Professor RP…”.
    Efectivamente, tal modificação da cláusula compromissória foi operada em sede de Primeiro Acordo Arbitral, datado de 28/01/2016, e posteriormente reiterada no Segundo Acordo Arbitral, datado de 24/02/2017, na execução de total liberdade das partes em procederem àquela alteração, pois tais documentos particulares foram devidamente subscritos por mandatários a quem foram conferidos os necessários poderes para tal outorga, conforme já supra conhecido.
    Pelo que, não se vislumbra qual a invalidade daí decorrente, sendo certo que, tal como bem refere a Requerida, a consumada alteração daquela cláusula compromissória não estava sujeita à forma anteriormente observada para a transmissão ou transferência de propriedade do imóvel, conforme decorre claramente do citado nº. 2, do artº. 221º, do Cód. Civil.
    Reconhecendo-se, deste modo, a sua total validade ou legal admissibilidade.
    Alega a Requerente no artº. 10º do articulado inicial que nunca lhe foi comunicada a declaração de aceitação, disponibilidade, independência e imparcialidade em modelo fornecido pelo Centro de Arbitragem que veio a ser escolhido, em concreto o Centro de Arbitragem Comercial, como decorre da imposição prescrita no artº. 11º do respectivo Regulamento de Arbitragem, de 01/03/2014, aplicável ao caso concreto, na decorrência do previsto no acordo de arbitragem celebrado.  
    Apesar do alegado, não retira especificamente qualquer conclusão de tal aduzida omissão.
    Na resposta apresentada em sede de oposição, a Requerida defende a irrelevância do alegado, na decorrência do previsto no artº. 5º do Segundo Acordo de Arbitragem, não se aplicando aquela obrigação de assinatura do modelo fornecido pelo Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa – cf., artigos 289º a 291º.
    Vejamos.
    A matéria alegada pela Requerente resultou devidamente provada, conforme se extrai do facto 49., ao enunciar que à “Requerente nunca lhe foi comunicada a declaração de aceitação, disponibilidade, independência e imparcialidade em modelo fornecido pelo Centro de Arbitragem que veio a ser escolhido”.
    Ora, conforme resulta da cláusula 5ª do Segundo Acordo de Arbitragem (replicando o que já constava da cláusula 5ª do Primeiro Acordo de Arbitragem), “a arbitragem obedecerá às regras constantes do anexo a este acordo e, nos casos omissos, às regras do Regulamento do Centro de Arbitragem da Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa, na versão de 2014”, sendo certo que na clausula 3ª do mesmo Acordo já constava a declaração de aceitação, independência e imparcialidade do Árbitro nomeado, bem como a revelação das circunstâncias que, cautelarmente, deu conhecimento às Partes.
    Deste modo, resulta claro, que nesta parte, as Partes outorgantes previram regra própria, inexistindo, deste modo, qualquer omissão a integrar com recurso ao Regulamento do Centro de Arbitragem da Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa, na versão de 2014, nomeadamente ao estatuído no seu nº. 3, do artº. 10º, o qual prescreve que “considera-se aceite o encargo através da assinatura, pela pessoa designada, de declaração de aceitação, disponibilidade, independência e imparcialidade em modelo fornecido pelo Centro de Arbitragem, no prazo de vinte dias a contar da notificação para o efeito”.
    Donde, resulta claramente inexistir qualquer omissão, capaz de inquinar a nomeação do Árbitro único, ou questionar a sua imparcialidade ou independência. O que se consigna e decide.
    Da imputada litigância de má-fé da Requerente
    No âmbito da oposição/contestação apresentada, alega a Requerida Vilamoura Lusotur, S.A., que a Requerente litiga com má-fé, ao ter distorcido, deturpado e omitido vários factos relevantes, os quais eram do seu pessoal conhecimento, não podendo invocar o desconhecimento dos mesmos.
    Alega, ainda, que a litigância de má-fé advém de saber que a sua pretensão carece de qualquer fundamento jurídico, deduzindo pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar.
    Pelo que, aduz, nos termos dos artigos 542º, nº. 1 e 543º, nº. 1, ali. a), ambos do Cód. de Processo Civil, deve a Requerente ser condenada no reembolso das despesas a que obrigou a Requerida, nomeadamente no valor dos honorários dos seus mandatários, a apurar em incidente próprio.
    Respondendo a tal pretensão, aduziu a Requerente que mais não fez do que defender aqueles que entende serem os seus legítimos interesses, pelo que não deve ser atendido o seu pedido de condenação como litigante de má-fé.
    Apreciando:
    A litigância de má fé é regulada nos artºs 542.º a 545.º do Código de Processo Civil.
    Traduz o regime constante nestes artigos uma ampliação, substancial, do dever de boa-fé processual ínsito no art. 8º do mesmo diploma, traduzindo-se tal princípio “na imposição de acrescidos deveres de ordem deontológica para todos os intervenientes processuais com vista a produzir, no domínio do processo civil, uma “eticização” análoga à que o direito material há muito logrou realizar em determinadas áreas” [29]. Eticização que se desenvolve em duas vertentes: uma objectiva e outra subjectiva.
    Do ponto de vista subjectivo passam a sancionar-se, quer comportamentos dolosos, quer comportamentos negligentes, conquanto que tal negligência seja grave, quer seja da parte, quer seja do seu mandatário.
    Negligência que será grave se existir a consciência da falta de razão, ideia que subjaz à má fé [30].
    Necessário é ainda que se enquadrem na vertente objectiva, isto é, que se encontrem elencados nas várias alíneas do n.º 2 do mencionado art. 542.º, a saber: a dedução de pretensão ou oposição cuja falta de fundamento a parte não devia ignorar; a alteração da verdade dos factos ou omissão de factos relevantes para a decisão da causa; a prática de grave omissão do dever de cooperação ; o uso manifestamente reprovável do processo.
    Todas as pessoas têm o direito de acção, consagrado no art. 20º da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual quem se arrogue a titularidade de um direito poderá solicitar a intervenção judicial para o ver reconhecido ou para alcançar a sua realização coerciva – idem no art. 2º do Código de Processo Civil. Todavia, a propositura de uma acção é um acto sério, que normalmente acarreta prejuízos e incómodos para os demandados. Há um mínimo de cuidados que o Requerente/Autor não pode deixar de respeitar, como sejam os de não atribuir factos não verdadeiros, ou de contar uma versão tanto quanto possível concreta e completa dos factos. E, embora o direito de acção possa conviver legitimamente com a não existência do direito invocado, situações há em que a manifesta carência de pressupostos de ordem substantiva não pode deixar de ser integrada no instituto da litigância de má-fé.
    A lide deixa de ser justa e legítima quando alguma das partes, a começar pelo Autor/Exequente/Requerente, deixe de agir dentro das regras da boa-fé, colocando ao tribunal pretensões sabendo ou devendo saber que a razão não está do seu lado. São coisas distintas vir-se a juízo no convencimento da justeza de uma pretensão pelas mais variadas razões mais ou menos subjectivadas e, declarada/consciente/assumidamente omitir factos relevantes para a decisão da causa, factos pessoais, demonstradamente praticados pelo próprio, num contexto espácio-temporal precisamente identificado.
    É para este grupo de casos que o art. 542º, n.º 2, do Código de Processo Civil, e na parte que ao caso interessa, prescreve: “diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:
    a) tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
    b) tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; (...)”.
    O normativo em equação sanciona quer a litigância dolosa, quer a litigância temerária, com o objectivo de se atingir uma maior responsabilização das partes, sendo corrente distinguir a má-fé material (ou substancial) e má-fé instrumental. A primeira relaciona-se com o mérito da causa: a parte, não tendo razão, actua no sentido de conseguir uma decisão injusta ; a segunda abstrai da razão que a parte possa ter quanto ao mérito da causa, qualificando um comportamento processualmente assumido em si mesmo. Isto para concluir que só a parte vencida pode incorrer em má-fé substancial, mas ambas as partes podem incorrer em má-fé instrumental, podendo também o vencedor da acção ser condenado como litigante de má-fé.
    Nas palavras do douto Acórdão do STJ de 18/10/2018 [31], citando Lebre de Freitas, a “lei processual «passou a sancionar, ao lado da litigância dolosa, a litigância temerária: quer o dolo, quer a negligência grave, caracterizam hoje a litigância de má-fé, com o intuito, com se lê no preâmbulo do diploma, de atingir uma maior responsabilização das partes».
    A lide temerária ocorre quando se actua com culpa grave ou erro grosseiro. É dolosa quando a violação é intencional ou consciente. Mas será sempre de exigir que a prova de tal culpa ou do dolo seja clara e indiscutível.
    Agora, o incumprimento gravemente culposo ou doloso dos deveres de cooperação e das regras de boa-fé é sancionado civilmente através do instituto da litigância de má-fé previsto no artigo 542º do C.P.C.”.
    Exposto o presente enquadramento jurídico, vejamos os factos.
    Provou-se, conforme factos 26. e 27., que a ora Requerente Bogarve, S.A., soube que o Segundo Processo Arbitral decorria em moldes distintos dos que haviam sido consagrados na transcrita cláusula nona do Contrato, sabendo, ainda, que o mesmo Processo Arbitral era conduzido por árbitro único, nomeadamente o Professor RP….
    Provou-se, ainda, que tal Árbitro não era recorrentemente nomeado como árbitro pela sociedade de advogados de que fazem parte os mandatários da Vilamoura Lusotur, S.A. (ora Requerida) – cf., facto 37. -, e que a afirmação da Requerente Bogarve, S.A., que o Árbitro único nomeado na Primeira e Segunda Arbitragens – o Professor Doutor RP… -, era recorrentemente nomeado pela sociedade de advogados de que fazem parte os mandatários da Requerida Vilamoura Lusotur, S.A., fundou-se em rumores e no que alegadamente um dos seus administradores ouviu falar a “outros advogados”, de forma genérica, não tendo a mesma Requerente tido o cuidado de, previamente, averiguar acerca da veracidade de tais factos – factos 39. e 40..
    Ainda se provou que as circunstâncias reveladas pelo Árbitro na Cláusula 3ª do Primeiro Acordo de Arbitragem, pelo menos desde data não determinada do Primeiro Processo Arbitral, sempre foram do conhecimento da administração da ora Requerente Bogarve, S.A., que nunca levantou qualquer objecção às mesmas, tendo, apesar disso, alegado tal desconhecimento nos termos expostos no requerimento inicial – cf., factos 45. a 48..
    Por outro lado, no que concerne à factualidade imputada como potencialmente traduzindo efectiva litigância de má-fé por parte da Requerente, não se logrou provar que só após a prolação da Segunda Sentença Arbitral, a ora Requerente Bogarve, S.A., tenha tido conhecimento das circunstâncias reveladas pelo Árbitro na Cláusula 3ª do Primeiro Acordo de Arbitragem, reproduzidas na Primeira Sentença Arbitral e reiteradas no Segundo Acordo de Arbitragem, sendo até aí absolutamente desconhecidas da mesma, e que antecedentemente à prolação daquela Segunda Sentença Arbitral, nunca a mesma Requerente tenha sido informada, por qualquer forma ou meio e fosse por quem fosse, quer na Primeira, quer na Segunda Arbitragens, da factualidade revelada pelo Árbitro naquelas circunstâncias, de forma a permitir-lhe decidir acerca do acordo sobre a sua nomeação, ou se, pelo contrário, a devia desde logo afastar – cf., factos i) a iii).
    Não se provou, igualmente, que o Árbitro único nomeado na Primeira e Segunda Arbitragens – o Professor Doutor RP… -, seja, com bastante frequência, o árbitro indicado pelas partes patrocinadas pelos advogados pertencentes à sociedade de advogados Uria Menendez Proença de Carvalho, onde se inserem os mandatários que patrocinaram a ora Requerida, em ambas as arbitragens – cf., facto iv) – e que a ora Requerente Bogarve, S.A., soubesse que aquele Árbitro único nomeado não era recorrentemente nomeado pela sociedade de advogados de que fazem parte os mandatários da Requerida Vilamoura Lusotur, S.A. – cf., facto xv).
    Por fim, e conforme factos xvi) a xix), no que concerne ao fundamento jurídico da presente acção, não se provou que a Requerente Bogarve, S.A., tivesse proposto a presente acção, deduzindo o respectivo petitório, bem sabendo que havia renunciado à possibilidade de impugnar a Segunda Sentença Arbitral, com fundamento na incompetência do tribunal ou pretenso desrespeito por disposições derrogáveis da LAV ou condições enunciadas na convenção de arbitragem, por não ter deduzido de imediato a respectiva oposição ; que apesar de alegar que não, a mesma Requerente bem soubesse que o advogado a quem outorgou procuração tinha todos os poderes para assinar, em sua representação, o Segundo Acordo de Arbitragem e para a representar no Segundo Processo Arbitral ; que a mesma Requerente Bogarve, S.A., bem soubesse não estar em erro quanto à alegação de que o Árbitro RP… seria recorrentemente nomeado árbitro de parte pela sociedade de advogados que representou a Lusotur na Primeira e Segunda Arbitragens ; e que a Requerente soubesse, ainda, que os factos vertidos nas Declarações do mesmo Árbitro não constituíam qualquer causa que afectasse a sua independência e imparcialidade.
    Aferida tal panóplia factual, constata-se que, contrariamente ao alegado pela Requerente:
    § o Árbitro único nomeado não era recorrentemente nomeado como árbitro pela sociedade de advogados de que fazem parte os mandatários da Vilamoura Lusotur, S.A. (ora Requerida) ;
    § e que tal afirmação da Requerente Bogarve, S.A., fundou-se em rumores e no que alegadamente um dos seus administradores ouviu falar a “outros advogados”, de forma genérica, não tendo a mesma Requerente tido o cuidado de, previamente, averiguar acerca da veracidade de tais factos ;
    § as circunstâncias reveladas pelo Árbitro na Cláusula 3ª do Primeiro Acordo de Arbitragem, pelo menos desde data não determinada do Primeiro Processo Arbitral, sempre foram do conhecimento da sua administração, que nunca levantou qualquer objecção às mesmas ;
    § e que, apesar de tal conhecimento, a mesma Requerente alegou no articulado inicial que apenas teve “recente conhecimento” de tal facto, que este era-lhe “absolutamente” desconhecido e que nunca veio “por alguma forma ou meio e fosse por quem fosse, a ser alguma vez informada da factualidade ali mencionada pelo respectivo árbitro, quer aquando da primeira arbitragem, e muito menos na segunda arbitragem” – cf., artigos 5º, 7º e 9º, do requerimento inicial.
    Ora, ao alegar que o Árbitro nomeado era recorrentemente nomeado como árbitro pela sociedade de advogados de que fazem parte os mandatários da Vilamoura Lusotur, S.A. (ora Requerida), fundando tal alegação em rumores e no que alegadamente um dos seus administradores ouviu falar a “outros advogados”, de forma genérica, não tendo tido a Requerente o cuidado de, previamente, averiguar acerca da veracidade de tais factos – vindo-se, antes, a provar o contrário -, agiu de forma claramente temerária, ao invocar factualidade, com clara relevância, sem previamente se ter assegurado da sua veracidade, o que lhe era manifestamente exigível.
    Por outro lado, ao aduzir que nunca teve conhecimento das circunstâncias reveladas pelo Árbitro logo aquando do Primeiro Acordo de Arbitragem, sendo aquele conhecimento recente, pois nunca lhe foi transmitido, nem durante o Primeiro Processo Arbitral, e muito menos no Segundo, e provando-se que tais circunstâncias sempre foram do conhecimento da administração da Requerente, pelo menos desde data não determinada do Primeiro Processo Arbitral, nunca tendo levantado qualquer objecção às mesmas, resulta concludentemente que a Requerente alterou a verdade factual, com implicações na dedução da consequente pretensão cuja falta de fundamento bem conhecia.
    Ora, tal factualidade, tendo natureza pessoal, e, como tal, não sendo desconhecida da Requerente, traduz uma conduta totalmente ausente de lisura processual, justificando plenamente um juízo de censura, a título de litigância de má-fé.
    O que determina, sem outras delongas, a condenação da Requerente Bogarve, S.A., a tal título, em multa e indemnização, tendo sido esta devidamente peticionada pela Requerida Vilamoura, Lusotur, S.A..
    Dispõe o artº. 27º, nºs. 3 e 4, do Regulamento das Custas Processuais, que:
    “3 - Nos casos de condenação por litigância de má fé a multa é fixada entre 2 UC e 100 UC.
    4 - O montante da multa ou penalidade é sempre fixado pelo juiz, tendo em consideração os reflexos da violação da lei na regular tramitação do processo e na correcta decisão da causa, a situação económica do agente e a repercussão da condenação no património deste”.
    Ora, tendo-se em atenção o grau e densificação na violação das regras da litigância de boa-fé, as suas eventuais implicações para uma correcta decisão do presente processo de anulação, a presuntiva condição económica da Requerente e repercussão da condenação para o seu património – constituindo o Contrato, objecto do litígio dirimido arbitralmente, a única actividade exercida pela ora Requerente (cf., facto 25.) -, decide-se fixar a multa no montante de 20 (vinte) UC´s.
    Relativamente à indemnização, dispõem os nºs. 1 a 3, do artº. 543º, do Cód. de Processo Civil, que:
    “1 - A indemnização pode consistir:
    a) No reembolso das despesas a que a má-fé do litigante tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários dos mandatários ou técnicos;
    b) No reembolso dessas despesas e na satisfação dos restantes prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência direta ou indireta da má-fé.
    2 - O juiz opta pela indemnização que julgue mais adequada à conduta do litigante de má-fé, fixando-a sempre em quantia certa.
    3 - Se não houver elementos para se fixar logo na sentença a importância da indemnização, são ouvidas as partes e fixa-se depois, com prudente arbítrio, o que parecer razoável, podendo reduzir-se aos justos limites as verbas de despesas e de honorários apresentadas pela parte”.
    Pretende a Requerida que a Requerente seja condenada no reembolso das despesas a que obrigou a Requerida, nomeadamente no valor dos honorários dos seus mandatários, a apurar em incidente próprio, não tendo indicado qualquer valor liquido a ponderar, nomeadamente o valor dos alegados honorários em ponderação.
    Pelo que, nos termos do nº. 3 deste normativo, determina-se a notificação de Requerente e Requerida para, querendo, no prazo de 10 dias, emitirem a pronúncia ali consignada, no sentido de se proceder, consequentemente, à fixação da requerida indemnização decorrente da provada litigância de má-fé da ora Requerente. 
    Em guisa conclusória, julga-se totalmente improcedente, por não provada, a presente acção especial de impugnação/anulação da sentença arbitral proferida em 27/11/2017, mas objecto de um pedido de aclaração, o qual veio a ser julgado improcedente por decisão prolatada em 22/01/2018, a qual mantém, assim, a sua plena e total validade, bem como o Acordo de Arbitragem que lhe subjaz, celebrado em 24/02/2017.
    Relativamente à tributação, decaindo a Requerente na pretensão deduzida, nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, deverá ser responsabilizada pelo pagamento das custas devidas.
    ***
    IV. DECISÃO
    Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
    - na total improcedência da presente acção especial de impugnação/anulação da sentença arbitral proferida em 27/11/2017 - mas objecto de um pedido de aclaração, o qual veio a ser julgado improcedente por decisão prolatada em 22/01/2018 -, a qual mantém, assim, a sua plena e total validade, bem como o Acordo de Arbitragem que lhe subjaz, celebrado em 24/02/2017 ;
    - em condenar a Requerente Bogarve, S.A., como litigante de má-fé, em multa e indemnização, fixando-se aquela no montante de 20 (vinte) UC´s ;
    - nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, decaindo a  Requerente na pretensão accional deduzida, deverá ser responsabilizada pelo pagamento das custas devidas.
    Nos termos do nº. 3, do artº. 543º, do Cód. de Processo Civil, determina-se a notificação de Requerente e Requerida para, querendo, no prazo de 10 dias, emitirem a pronúncia ali consignada, no sentido de se proceder, consequentemente, à fixação da requerida indemnização decorrente da provada litigância de má-fé da ora Requerente Bogarve, S.A..
                                
    Lisboa, 23 de Janeiro de 2020
    Arlindo Crua
    António Moreira
    Magda Geraldes
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    [1] A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original.
    [2] As referências legais infra, salvo expressa menção em contrário, reportam-se ao presente diploma, aprovado pela Lei nº. 63/2011, de 14/12.
    [3] Relator: Vaz Gomes, Processo nº. 5720/09.1TVLSB-A.L1-2, in www.dgsi.pt .
    [4] Citando o douto Acórdão do STJ de 25/05/1995, in BMJ, nº. 447, pág. 460.
    [5] Lei da Arbitragem Voluntária Anotada, 3ª Edição Revista e Actualizada, Almedina – Associação Portuguesa de Arbitragem, 2018, pág. 152 e 153.
    [6] A Impugnação da Sentença Arbitral, 2ª Edição Revista e Aumentada, Almedina, 2018, pág. 31.
    [7] Acrescenta o mesmo Autor, em nota de rodapé (52), que tal opinião foi adoptada por “Armindo Ribeiro Mendes, argumentando, com razão, que outra solução ofenderia os princípios do contraditório e da proibição da indefesa, consagrados no art. 30º, nº. 1, da LAV”.
    [8] Processo nº. 00003/15.0BCPRT, Relator: Joaquim Cruzeiro, in www.dgsi.pt, citado pela Requerente.
    [9] Ob. cit., pág. 31 e 32.
    [10] Conforme notas de rodapé 54 e 55, o acórdão do STJ data de 18/05/1995 – BMJ, nº. 447, pág. 455. No sentido de estarmos perante um prazo processual, pronunciou-se, igualmente, António Menezes Cordeiro – Tratado de Arbitragem, pág. 457, sendo do entendimento de que será um prazo substantivo os autores da obra colectiva coordenada por Mário Esteves de Oliveira – Lei da Arbitragem Voluntária Comentada, pág. 575.
    [11] Ob. cit., pág. 153.
    [12] Relator: Hélder Roque, Processo nº. 158/15.4YRCBR.S1, in www.dgsi.pt .
    [13] Relator: Joaquim Condesso, Processo nº. 07084/13, in www.dgsi.pt .
    [14] Sumariou-se no douto Acórdão da RP de 15/09/1994 – Relator: Fernandes Magalhães, Processo nº. 9340324 -, que “a acção para anulação de sentença arbitral tem de ser proposta em juízo nos 30 dias subsequentes à notificação da respectiva decisão” e que “terminados os 30 dias em período de férias judiciais, não se verifica a caducidade  da acção se a mesma der entrada em tribunal no 1º dia útil após o termo daquelas”.
    Todavia, da simples análise deste sumário (única parte publicada) não é possível concluir acerca do entendimento deste aresto acerca da natureza do prazo em equação pois, conforme melhor veremos infra, terminando o prazo em férias judiciais, mesmo considerando-o de natureza substantiva, sempre se transferiria para o 1º dia útil após o termo daquelas férias, conforme resulta da alínea e), do artº. 279º, ex vi do artº. 296º, ambos do Cód. Civil.
    [15] Por todos, o sumariado no douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28/11/2007 – Relator: Baeta de Queiroz, Processo nº. 0533/07 -, no sentido de que  - “a disposição da primeira parte da alínea e) do artigo 279º do Código Civil é aplicável ao prazo de prescrição, cujo termo, se cair em domingo ou dia feriado, se transfere para o primeiro dia útil.
    II - O mesmo acontece com o prazo que termine em sábado, por interpretação actualista da norma, já que também este não é, presentemente, dia útil, ao contrário do que sucedia aquando da publicação do Código Civil”.
    [16] Ob. cit., pág. 22.
    [17] Idem, pág. 136 e 137.
    [18] Ob. cit., pág. 148.
    [19] Ob. cit., pág. 43 a 47.
    [20] Lei da Arbitragem Voluntária Anotada, Ob. Cit., pág. 73.
    [21] Idem, pág. 152.
    [22] Conforme melhor veremos infra, e para além da legal previsão, existe o entendimento que a figura em equação é a da preclusão e não a da renúncia.
    [23] Ob. cit., pág. 50 a 52 e 55.
    [24] A independência e imparcialidade dos Árbitros como imposição constitucional, Estudos em Homenagem ao Professor Carlos Ferreira de Almeida, , Vol. III, Almedina, Coimbra, 2011, pág. 251 a 273.
    [25] António Sampaio Caramelo, ob. cit., pág. 61, 62, 65 e 66.
    [26] Idem, págs. 93 a 96, 99, 104, 105, 110, 111 e 143 a 146.
    [27] Ob. cit., pág. 153 a 160.
    [28] Cf, www.ibanet.org , na sua versão traduzida.
    [29] Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Almedina, pp. 212, em anotação ao art. 266.º, norma correspondente na antecedente versão do Cód. de Processo Civil, anterior à introduzida pela Lei nº. 41/2013, de 26/06.
    [30] Neste sentido cf. Ac. R.L. de 18/06/98, CJ, III, pp. 126.
    [31] Relator: Ilídio Sacarrão Martins, Processo nº. 74300/16.1YIPRT.E1-A.S1, in www.dgsi.pt .