Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1491/14.8T2SNT.L1-4
Relator: EDUARDO AZEVEDO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
EXAME POR JUNTA MÉDICA
VALOR PROBATÓRIO
ESCLARECIMENTOS
ELEMENTOS AUXILIARES DE DIAGNÓSTICO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/13/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A SENTENÇA
Sumário: 1- O exame por junta médica está sujeito à livre apreciação do julgador (artº 389º do CC e 489º do CPC).
2- Esse exame colegial tem como pressuposto a aproximação máxima à inequivocidade da situação do sinistrado.
3- Sendo livremente apreciada pelo juiz, em princípio leigo nas matérias observadas, deve reunir-se das mais variadas cautelas de modo a que essa inequivocidade seja tangível.
4- Para isso a lei prevê a solicitação de esclarecimentos aos senhores peritos por eficiência, obscuridade ou contradição do relatório pericial como modo de superação de dúvidas suscitáveis pelo mesmo (artºs 1º, nºs 1 e 2, alª a), do CT e 413º e 485º do CPC).
5- E podem ser requisitados elementos auxiliares de diagnóstico (artº 105º do CPT), determinar-se a realização de exames complementares e requisitados pareceres técnicos (artº 139º do CPT). Entre estes avultam os realizáveis nos termos dos artºs 21º, nº 4, da Lei nº 98/2009 de 04.09 e 2º do DL nº 352/2007, de 23.10.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


Relatório:

Este processo emergente de acidente de trabalho foi instaurado pela ocorrência de sinistro em 15.01.2013 de que foi vitima AA, nascida em 11.01.1969, quando prestava serviços de ajudante à BB, participado por CC, Companhia de Seguros, Sa, enquanto seguradora.

A seguradora considerou a sinistrada curada a partir de 03.02.2014, com uma IPP de 6%.

Foi solicitado exame médico ao IML que determinou esta última data como a de consolidação médico-legal das suas lesões e a IPP de igual percentagem e mediante esclarecimento solicitado foi declarado que não era de atribuir IPATH.

Na tentativa de conciliação as partes aceitaram a existência do acidente, a sua caracterização como de trabalho, o nexo causal entre o acidente e as lesões e ainda, a assunção pela seguradora da responsabilidade infortunística em função da totalidade da retribuição anual, pelo que não se conciliaram quanto ao grau de desvalorização.

A sinistrada requereu a realização de junta médica, nos termos conjugados dos artºs 117º, nº 1, alª  b) e 138º do CPT.

Decidiu aquela atribuir por unanimidade à sinistrada o mesmo grau de desvalorização.

Pela sinistrada foi então requerido nestes termos:
“(…)
Nos termos do artigo 587 do CPC antigo e 485 do CPC novo assiste às partes o direito a reclamar da perícia.

ARTIGO 587.º
(Reclamações contra o relatório pericial)
1.A apresentação do relatório pericial é notificada às partes.
2.Se as partes entenderem que há qualquer deficiência, obscuridade ou contradição no relatório pericial, ou que as conclusões não se mostram devidamente fundamentadas, podem formular as suas reclamações.
3.Se as reclamações forem atendidas, o juiz ordena que o perito complete, esclareça ou fundamente, por escrito, o relatório apresentado.
4.O juiz pode, mesmo na falta de reclamações, determinar oficiosamente a prestação dos esclarecimentos ou aditamentos previstos nos números anteriores.

Artigo 485.º
Reclamações contra o relatório pericial.
1-A apresentação do relatório pericial é notificada às partes.
2-Se as partes entenderem que há qualquer deficiência, obscuridade ou contradição no relatório pericial, ou que as conclusões não se mostram devidamente fundamentadas, podem formular as suas reclamações.
3-Se as reclamações forem atendidas, o juiz ordena que o perito complete, esclareça ou fundamente, por escrito, o relatório apresentado.
4-O juiz pode, mesmo na falta de reclamações, determinar oficiosamente a prestação dos esclarecimentos ou aditamentos previstos nos números anteriores.
De facto, a sinistrada entende que há deficiência no relatório pericial, pois não responde devidamente à possibilidade de as lesões causarem uma IPATH.

Ficamos a saber o seguinte sobre a sinistrada:
• A sinistrada apresenta limitações graves no ombro. Tem dores e não pode fazer força com pacientes “mais pesados e menos colaborantes”.

Assim, requerem-se os seguintes esclarecimentos aos Senhores Peritos:
Seja dada resposta clara aos quesitos 14 a 16, 33 e 34 em termos objectivos e materiais, a fim de se verificar se os mesmos implicam uma IPATH.
Não foi dada resposta aos seguintes quesitos ou foi dada uma resposta formal e não material remetendo para conceitos indeterminados de clientes “mais pesados e menos colaborantes".

Citamos.

Digam os Senhores Peritos se:
4. A A é destra?
4. Refere que sim.
5. A A sofre de diminuição de mobilidade e de força no braço direito?
5. tem rigidez
6. Qual a amplitude de flexão e de extensão?
6. no ombro não há flexão nem extensão, há elevação ou antepulsão e abdução;
7. Qual a amplitude de abdução e de adução?
7. sem limitação na adução e abdução a 90°;
8. Pode fazer uma circundução?
8. está limitada pela rigidez;
9. Qual os graus de rotação interna e externa?
9. não tem limitação na rotação interna e a rotação externa é feita a 60 ,
10. A sinistrada tem limitações na elevação de pesos com o braço direito?
10- admite-se que sim;
11. A sinistrada tem queixas de dormências nas mãos e falta de motricidade fina
nos dedos?
11- não referiu;
12. A sinistrada toma medicamentos para as dores ? Volatrem?
12- desconhece-se, admitindo-se que o poderá fazer quando em dor ?
13. Quais as exigências do trabalho de uma ajudante de acção directa face à postura e força para levantar pesos?
14. A A pode levantar um doente acamado com ambos os braços?
14- sim, ainda que com ajuda em alguns doentes mais pesados e/ou menos colaborantes;
15. A A pode fazer transferências de doentes? Ou seja, pode pegar num doente colocá-lo numa cadeira e voltar a mudá-lo para a cama ?
15- sim, ainda que com ajuda em alguns doentes mais pesados e/ou menos colaborantes;
16. Este movimento exige a utilização de ambos os braços?
16- sim, ainda que com ajuda em alguns doentes mais pesados e/ou menos colaborantes;
17. Pode virar um doente acamado para colocar resguardos e dar banho ao mesmo?
17- sim, ainda que com ajuda em alguns doentes mais pesados e/ou menos colaborantes
18. As limitações comprometem as funções de mobilizar acamados?
19. Para os acamados é adequado e seguro serem tratados/levantados/apoiados por uma sinistrada com as limitações da A?
20. Em termos de segurança do trabalho e do utente a A tem muitas limitações?
21. A sinistrada pode trabalhar de forma intensa?
22. Qual o peso máximo que pode levantar com o braço direito?
22- desconhece-se;
23. Apesar de poder trabalhar, não pode exercer actividades sustentadas que envolvam estar a fazer força com ambos os braços durante 3 horas?
24. A sinistrada tem dores se faz esforços?
24- refere que sim;
25. A entidade patronal da sinistrada tentou dar-lhe outras funções como ajudante de estomatologia?
26. A sinistrada pode exercer estas tarefas?
27. A sinistrada atentas as lesões tem uma dificuldade para a profissão de ajudante de acção directa, devido aos esforços contínuos que esta implica?
28. É aconselhável que a mesma tenha outras funções e seja requalificada e que aprenda outra profissão, que não envolva tantos esforços e força?
29. A sinistrada deixou de poder tratar e mobilizar acamados?
30. As dores justificam desvios na taxa de incapacidade a atribuir?
31. A sinistrada tem recomendações para não puxar, empurrar ou levantar cargas pesadas ?
32. É desaconselhada mobilidade intensa do braço direito como levar o braço acima da cabeça, lançar um objecto ou fazer movimentos bruscos?
32- a sinistrada deve efetuar os movimentos em função da sua limitação, acima descrita;
33. A sinistrada com o braço direito neste estado tem capacidade para em segurança ajudar um doente a movimentar-se, entrar e sair da cama?
33- renova-se resposta ao quesito 14º; (sim, ainda que com ajuda em alguns doentes mais pesados e/ou menos colaborantes)
34. Se o doente se desequilibrar tem desenvoltura e força para o agarrar?
33- renova-se resposta ao quesito 14º; 14°; (sim, ainda que com ajuda em alguns doentes mais pesados e/ou menos colaborantes)
Da leitura da resposta aos quesitos decorre que os próprios peritos declararam a sua impossibilidade de responder, atentos os quesitos sem resposta: face a situações concretas respondem em termos formais e abstractos e remetem para outros médicos.

Do pedido de relatórios complementares.

O exame, limita-se como é natural, a explicitar com base numa percentagem a incapacidade da sinistrada.

A Junta não respondeu se a A pode ou não realizar as tarefas, sendo que a mesma deixou de poder trabalhar.

O tipo de sequelas existentes, considerando as tarefas e o ambiente de trabalho e tendo presente as restrições que a própria Junta Medica estabeleceu implica a impossibilidade continuar a trabalhar na profissão habitual.

As respostas são obscuras e se reiteram a existência de uma IPP, não dão resposta clara às questões colocadas se há IPATH.

Foram colocadas perguntas concretas face à sua profissão e na resposta há uma obscuridade evidente, pois responde-se em termos formais, reiterando uma conclusão médica e até remetendo para o médico.

A junta não deu resposta não termos materiais indicando se a sinistrada pode ou não trabalhar na sua anterior ocupação.

A sinistrada tem limitações evidentes e não trabalhar como empregada de apoio domiciliário a idosos.

Como é que uma sinistrada com o ombro neste estado e com parestesias (dores) pode trabalhar a lavar e levantar idosos?

Aquilo que caracteriza uma IPA (IPA e IPATH) não é o grau das incapacidades, mas sim um juízo de face a um sinistrado num caso concreto, face à sua profissão e às suas habilitações e a verificação se o mesmo tem a possibilidade de exercer a sua profissão (IPATH) ou qualquer profissão (IPA) para que essa actividade lhe proporcione um rendimento.

A Tabela Nacional de Incapacidades (TNI) tem por objectivo fornecer as bases de avaliação do dano corporal ou prejuízo funcional sofrido em consequência de acidente de trabalho ou de doença profissional, com redução da capacidade de ganho.

Por isso, as situações de IPATH têm um processamento próprio (ver instruções da Tabela), que transcende a avaliação médica.

Apesar de se escrever que o A tem uma IPP de X % e que pode trabalhar, a verdade é que não trabalha e não pode realizar estes trabalhos com uma IPP de 6 %.

Esta situação pode ser verificada por testemunhas e por documentos.

De facto, a sinistrada perdeu a capacidade de trabalhar como empregada de apoio domiciliário a idosos.

É imperioso dar resposta material à IPATH, pelo que para a descoberta da verdade e para se poder determinar a IPP, requer-se seja feito um exame nos termos do artigo 41.º do DL 143/99 - Avaliação da incapacidade.

1- O grau de incapacidade resultante do acidente é expresso em coeficientes determinados em função do disposto na tabela nacional de incapacidades em vigor.
2- Sempre que haja lugar à aplicação do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 17.º e no n.º 1 do artigo 19.º da lei, o juiz pode requisitar o parecer prévio de peritos especializados, designadamente do Ministério do Trabalho e da Solidariedade, que consiste num estudo de funções e num exame de um perito de medicina do trabalho.

Indico desde já o Serviço Oficial onde fazem estes exames:
IEFP - Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P.
(…)

De facto, a sinistrada tem limitações e uma IPP que segundo a sinistrada implica uma IPATH para a sua ocupação de empregada de apoio domiciliário a idosos. A sinistrada entende que os exames médicos deveriam avaliar a incapacidade e IPATH.

Estas questões não são apenas médica, mas também jurídica, daí a necessidade de alertar o Meritíssimo Juiz de Direito para que não deixe de solicitar a realização de exames e pareceres complementares ou requisitar pareceres técnicos, se o considerar necessário (art.º 139.º, n.º 7, do CPT).

O Mm° Juiz pode decidir a existência, ou não, de IPATH discordando da junta médica.

De facto existe o primado da livre apreciação da prova pericial pelo Julgador, fundamentado na lei, prática judicial e em inúmeros arrestos, que nos abstemos de citar.

O Juiz pode e deve solicitar exames, pareceres ou esclarecimentos complementares, nos termos do art. 139º, nº 7 do CPT e mesmo do art. 41º-2 do DL nº 143/99 de 30/4, independentemente do parecer da Junta Médica.

Como se escreveu em Acórdão da Relação de Lisboa nº 119/2005-4 (DURO MATEUS CARDOSO):” o Juiz não está vinculado, nem ao resultado do exame médico singular, nem ao resultado do exame por Junta Médica. Não se pode esquecer que o laudo da Junta Médica não passa de um elemento de prova, cuja força é livremente apreciada pelo tribunal. Isto é, o tribunal aprecia livremente essa prova e valora aquela que em seu entender deve ser valorada (art. 389º do Cód. Civil).

Não estava o Mmº Juiz a quo, deste modo, vinculado ao resultado da Junta Médica que avaliou a incapacidade da sinistrada numa IPP de 36,72%, sem IPATH, nem estava impedido de solicitar o parecer do IEFP e depois de o valorizar devidamente, como fez, considerando existir IPATH.”

Concluindo a sinistrada vem
2. Requerer que sejam requisitados esclarecimentos aos senhores peritos, bem como exames suplementares no IEFP na modalidade de avaliação de funções e exames do médico de trabalho”.

Foi proferido despacho em 23.11.2015:
“FLS.120-126:
Compulsado o teor das respostas prestadas pelos Srs. Peritos não se nos afigura que tais respostas enfermem dos vícios apontados, assim como, ponderados os elementos constantes dos autos, que se justifique a realização de ulteriores diligências de prova.
Por conseguinte, indefere-se o requerido.
Custas de incidente, a cargo da Sinistrada”.

A sinistrada recorreu deste despacho.
Conclusões:
(…)
Termina pretendendo o provimento do recurso, ordenando-se que “sejam pedidos esclarecimentos aos senhores peritos e realizados exames complementares”.

Foi proferida sentença, pela qual se decidiu:
“1.. Fixar em 6% o coeficiente de incapacidade permanente parcial que afeta «AA» desde 04/02/2014.
2.. Condenar «CC COMPANHIA DE SEGUROS, SA.» a pagar a «AA» o capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia de € 386,20, devida desde 04/02/2014, acrescida da quantia devida por conta de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa de 4% ao ano, desde aquela data até integral e efectivo pagamento.
3.. Condenar «CC, COMPANHIA DE SEGUROS, SA.» a pagar a «AA» a quantia de € 10,80 a título de despesas de transporte.
4.. Condenar «AA» e «CC, COMPANHIA DE SEGUROS,, SA..» a pagarem as custas processuais, na proporção do decaimento, que se fixa em 1/8 para a primeira”.

A sinistrada recorreu.
Conclusões:
(…)
Termina pretendendo o provimento do recurso, “ordenando-se sejam pedidos esclarecimentos aos senhores peritos e realizados exames complementares”.

A seguradora contra-alegou.
Concluiu:
(…)
5- Pelo que será de manter a decisão recorrida, …..
Ambos os recursos foram admitidos.
Efectuado o exame preliminar, cumpre decidir.
O Mº Pº deu parecer no sentido da procedência dos recursos.
Indagar-se-á da admissibilidade e justificação de pedido de esclarecimentos aos peritos médicos da junta médica com a realização de exames complementares.

Os factos considerados apurados na sentença foram nestes termos:
Por força do acordo das partes, da documentação junta aos autos e dos laudos periciais de fls. 66-68, 81 e 110-112 dos autos, mostra-se provada a fatualidade constante da ata de fls. 91-93, e ainda, que:
1..A Sinistrada teve alta no dia 03/02/2014 (cfr. fls. 41).
2..Em consequência direta e necessária da lesão sofrida [traumatismo do ombro direito: rotura da coifa dos rotadores], a Sinistrada ficou portadora de limitações na abdução do ombro direito, fazendo 90º, na antepulsão e na rotação externa.
3..A Sinistrada exercia funções de ajudante de ação direta, o que se mantém
4..A Sinistrada nasceu a 11/01/1969 (cfr. fls. 88).
5..A Sinistrada é dextra”.

Dada a natureza e finalidade do primeiro recurso que incide sobre o indeferimento do requerido pela sinistrada de esclarecimentos dos peritos da Junta Médica e exames complementares, nomeadamente ao IEFP na modalidade de avaliação de funções e exames do médico de trabalho, lógico é que a sentença sendo norteada também pelo elemento de prova resultante do exame daquela, certamente o mais importante, que o recurso da mesma tivesse como objecto principal a mesma matéria.

Com efeito, o vencimento do primeiro recurso implicará o reconhecimento que o indeferimento da reclamação da recorrente é susceptível de influir no exame ou decisão da causa. E, por sua vez, a sentença dependendo dessa vicissitude em ordem à justa composição do litígio pelo que necessariamente inidónea perante eventuais efeitos que possa produzir o pretendido em tal requerimento, deverá ser revogada.

Dito isto, vejamos o primeiro recurso.

O que se constata é que os senhores peritos médicos da Junta Médica responderam por unanimidade à matéria para a qual estavam mandatados pelo tribunal.

No entanto, vislumbram-se no respectivo auto lacunas nas respostas aos quesitos colocados pela recorrente no seu requerimento inicial da fase contenciosa do processo de reavaliação por junta médica, por seu turno, quesitos limitados aos determinados no despacho que admitiu essa perícia e definiu o seu objecto.

Reportamo-nos às respostas aos quesitos 5 (porque não se respondeu se havia perda de força?), 8 (a resposta é lacónica e pouco explicativa ou redutora), 10 (resposta de mera admissão não se explicando porque não se consegue a convicção), 11 (se a sinistrada não referiu certamente poderia a sinistrada contribuir para a resposta se lhe perguntassem, também não se esclarecendo se foi questionada para o efeito), 12 (mero comentário, sugerindo que não se perguntou sequer à sinistrada ou que não houve acesso a elementos clínicos que autonomamente levassem á resposta cabal), 14, 15, 17 (a afirmativa cria interrogações sobre a autonomia da sinistrada e não se contextualiza na realidade do trabalho da sinistrada), 22 (cuja resposta a nosso ver não é inteiramente impossível considerando a aproximação aos subjectivos dolorosos que a mesma possa apresentar), 23 (permite uma resposta mais concisa ainda que mediante subjectivos dolorosos), 32 (não se alcança motivo para que a resposta não seja mais direta), 33 e 34 (renovando-se o referido aos quesitos 14, 15 e 17).

E estas respostas assim formuladas não deixam de relativizar qualquer conclusão que se queira delas retirar.

E, pese embora no exame médico do IML mediante esclarecimento solicitado foi declarado que não era de atribuir IPATH, não se compreende porque os membros da Junta não fazem qualquer referência a esse factor, num sentido ou noutro, já que se trata de elemento fulcral para o trabalhador na avaliação do seu percurso profissional que pode abranger até a necessidade da sua reconversão profissional.

Acresce, na sentença, para se vincar a convicção do tribunal apenas se refere que é “Por força do acordo das partes, da documentação junta aos autos e dos laudos periciais de fls. 66-68, 81 e 110-112 dos autos, mostra-se provada a fatualidade constante da ata de fls. 91-93 …”.
(…)

Atenta a natureza das sequelas apresentadas - limitações na abdução do ombro direito, fazendo 90º, na antepulsão (elevação para a frente) e na rotação externa – e a circunstância da Sinistrada não apresentar, ao exame objetivo, quaisquer dismorfia e/ou amiotrofia, assim como limitações na mobilidade do ombro direito obstaculizadoras de levar a mão ao ombro e à região dorsal oposta, não se vislumbra que a Sinistrada tenha ficado impossibilitada de exercer o trabalho que até então executou, ou seja, as tarefas inerentes à categoria de ajudante de ação direta, trabalho, aliás, que continuou a desenvolver desde a data da alta”.
Depois apenas se acrescenta que “Por força das limitações nos movimentos da abdução, antepulsão e rotação externa, a Sinistrada terá, como vincou a junta médica, dificuldades acrescidas na realização do seu trabalho.

Porém, dificuldade não é sinónimo de impossibilidade.”

Obviamente se em abstracto pode ser correta esta avaliação a mesma não deixa de ser ambivalente perante o caso concreto, já que do laudo da perícia colegial não resulta inquestionavelmente que não existe impossibilidade face às exigências da profissão da sinistrada e permite até antes entender que a mesma não pode desempenhar as funções que efectuava com o mesmo grau de eficácia e sem sacrifício pessoal para a sua disponibilidade de vida superior ao exigível.

Ora a perícia consiste na apreensão de factos para apreciação e valoração segundo conhecimentos técnicos ou científicos. O exame colegial como a junta médica é uma perícia que tem como pressuposto a aproximação máxima à inequivocidade da situação do sinistrado.

Sendo livremente apreciada pelo juiz (artº 389º do CC) em princípio leigo nas matérias observadas deve reunir-se das mais variadas cautelas de modo a que essa inequivocidade seja tangível.

Para isso a lei prevê a solicitação de esclarecimentos aos senhores peritos por deficiência, obscuridade ou contradição do relatório pericial como modo de superação de dúvidas suscitáveis pelo mesmo (artºs 1º, nºs 1 e 2, alª a), do CT e 413º e 485º do CPC).

E podem ser requisitados elementos auxiliares de diagnóstico (artº 105º do CPT), determinar-se a realização de exames complementares e requisitados pareceres técnicos (artº 139º do CPT). Entre estes avultam os realizáveis nos termos dos artºs 21º, nº 4, da Lei nº 98/2009 de 04.09 e 2º do DL nº 352/2007, de 23.10.

Neste caso, com o devido respeito por opinião contrária, faz todo o sentido o pedido de esclarecimentos aos senhores peritos para efeito havendo habilitação legal, esta que é extensível à pretensão de igualmente desses esclarecimentos serem formulados após exames suplementares, solicitáveis nomeadamente ao IEFP.

Assim nesse sentido será decidido o primeiro recurso, sendo que nessa sequência será também determinada a revogação da sentença, além do mais considerando ainda o disposto no artº 662º, nº 2, alª c) do CPC.

Nestes termos serão julgados procedentes os recursos.

Decisão.

Acordam os Juízes nesta Relação em julgar procedentes os recursos, pelo que revogando-se as decisões impugnadas, determina-se o prosseguimento dos autos para que se ordene a reabertura da Junta Médica a fim de serem pedidos esclarecimentos aos Senhores Peritos Médicos, mediante a realização exames complementares nos termos acima referidos para averiguação sobre se a sinistrada sofre de IPATH, nomeadamente.
Custas pela recorrida e apenas quanto ao segundo recurso.
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O acórdão compõe-se de 14, com os versos não impressos.
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Lisboa,13.07.2017


Eduardo Azevedo
Celina Nóbrega
Paula Santos



Decisão Texto Integral: