Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3817/16.0T8BRR.L2-4
Relator: ALBERTINA PEREIRA
Descritores: EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
COMPENSAÇÃO
ACEITAÇÃO DO DESPEDIMENTO
PRESUNÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/18/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: 1.– Não se verifica a presunção de aceitação do despedimento por extinção do posto de trabalho decorrente do art.º 366.º n.º 4 do Código do Trabalho, no caso, como o presente, em que a entidade patronal paga ao trabalhador, a título de compensação por despedimento, quantia inferior à totalidade da compensação, tendo em conta a retribuição base efectivamente auferida por aquele.

2.– No contexto em que a relação laboral se desenrolou e perdurou - em que a retribuição “declarada” não correspondia à verdadeiramente percebida pelo autor - não podia a ré legitimamente ignorar, que o valor pago a título de compensação pelo despedimento, era abaixo do legal, não correspondendo, assim, à totalidade da compensação devida.


(Elaborado pela relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa


1.–Relatório


1.-1.– AAA,  apresentou formulário de oposição ao despedimento por extinção do posto de trabalho promovido por BBB.

Teve lugar a audiência de partes, sem conciliação.

A ré presentou articulado de motivação de despedimento por extinção do posto de trabalho do autor, pedindo se decida pela licitude do despedimento do trabalhador.

Alega, para tanto, que por questões de gestão, extinguiu o posto de trabalho do A., cumprindo todos os formalismos, e colocando à disposição do A. todas as quantias a que o mesmo tinha direito, por força da extinção do contrato. À cautela, opõe-se à reintegração do A., por não ter qualquer posto de trabalho compatível com as suas funções.

O A. apresentou contestação excepcionando a ilicitude do despedimento e impugnando a versão dos factos alegada pela R.; deduziu pedido reconvencional, reclamando a ilicitude do despedimento, com a consequente reintegração, e condenação da R. no pagamento dos seus créditos laborais.

Concluiu no sentido da procedência da contestação/reconvenção e se decida pela ilicitude do despedimento e que, em consequência:

- na eventualidade se ser excluída a reintegração, condene a R. a pagar ao A. uma indemnização que deve ser fixada em 60 dias de remuneração base por cada ano completo de antiguidade ou fracção e que, na presente data, atinge o montante de 16.200,00 €;

- condene a R. a pagar ao A. as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento, no montante mensal de 1.350,00 € e que nesta data totaliza a quantia de 2.700,00 € (Janeiro e Fevereiro de 2016);

- condene a R. a pagar ao A. a retribuição referente aos diferenciais retributivos dos vencimentos de Novembro e Dezembro de 2016, os quais se contabiliza o montante de 779,00 € referente a Novembro e 133,03 referente a Dezembro, o que totaliza a quantia de 912,03 € líquida;

- condene a R. a pagar ao A. a quantia de 779,00 € a título de diferencial de subsídio de férias de 2016;

- condene a R. a pagar ao A. a quantia de 779,00 € a título de diferencial de subsídio de Natal de 2016;

- condene a R. a pagar ao A. a retribuição referente a trabalho suplementar, referente ao trabalho prestado nos anos de 2013 a 2016, o que totaliza a quantia de 6.436,93 € líquidos;

- condene a R. a pagar ao A. a retribuição referente ao descanso compensatório por trabalho suplementar prestado em dia de descanso semanal e feriados, nos anos de 2013 a 2016, o que totaliza a quantia de 1.260,00 € líquidos;

- condene a R. a a pagar ao A. a retribuição referente a número mínimo anual de horas de formação, o que totaliza a quantia de 1.913,00 € líquida;

- condene a R. a entregar junto da Segurança Social os descontos e quotizações, correspondentes ao salário auferido pelo A., com início a 01 de Setembro de 2011;

- condene a R. a pagar à A. a quantia de 7.000,00 € a título de danos morais;

- condene a R. a pagar os juros de mora à taxa legal de 4 % ao ano até integral pagamento.

Foi proferido despacho saneador que fixou o objecto da acção, dispensando-se a selecção dos temas da prova.

Foi junta transacção parcial por A. e R., versando os créditos referidos nos arts. 146° a 168°, da Reconvenção, devidamente homologada por sentença, datada de 19-05-2017, e que abarca os pedidos mencionados em c) a h).

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento.

Proferida sentença nela se finalizou com  seguinte dispositivo:

Julgo procedente a oposição apresentada pelo trabalhador ao despedimento, e parcialmente procedente a sua reconvenção e, em consequência:

a)- declaro ilícito o despedimento do A., decidido pela R., por extinção do posto de trabalho;
b)- condeno a R. a reintegrar o A. na empresa, com a categoria, antiguidade e retribuição que teria se não tivesse sido despedido e que, à data do despedimento era de 1.350,00 € ilíquidos;
c)- condeno a R. a pagar ao A. as retribuições, férias, subsídio de férias e de Natal vencidos desde 24/12/2016 - data do despedimento - até ao trânsito em julgado da presente sentença, fixando-se o valor da retribuição base em 1.350,00 €/mês, com as deduções a que se refere o artigo 390° n° 2 a) e c), do CT, as obrigações fiscais e para a Segurança Social inerentes a tais pagamentos, devem incidir sobre cada uma das quantias vencidas e correspondentes a cada mês, e não sobre a totalidade da quantia em dívida, sendo a dedução reportada à data em que a retribuição deveria ter sido paga e não à data em que efectivamente o foi; a estas quantias acrescem os juros de mora a incidir sobre as quantias líquidas a pagar ao trabalhador, ou seja, após feitas as deduções fiscais e para a Segurança Social, e não sobre as quantias ilíquidas;
d)- condeno a R. a pagar ao A. quantia de 3.500,00 €, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida dos juros de mora, contados à taxa supletiva legal, desde a data da sentença e até integral e efectivo pagamento.
e)- absolvo a R. do demais peticionado, contra si, pelo A.

Inconformada com esta decisão dela recorre a ré, arguindo a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, e rematando a sua alegação com as seguintes conclusões:

(…)

1.2.– Não consta que tenham sido apresentadas contra-alegações.

1.3.– O Mmo. Juiz pronunciou-se no sentido de não ocorrer a arguida nulidade da sentença.

1.4.– A Exma. Procuradora Geral Adjunta emitiu parecer com vista ao não provimento do recurso.

1.5.– Notificadas as partes, nenhuma delas se pronunciou sobre tal parecer.

1.6.– Foram colhidos os vistos e realizada a conferência.

Cumpre apreciar e decidir

2.–Objecto do recurso

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso e das não apreciadas pela solução dadas a outras, ainda não decididas com trânsito em julgado - artigos 635.º, números 3 e 4, 639.º, n.º 1, 608.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil (CPC). Assim, as questões, a apreciar no âmbito do presente recurso, consistem na nulidade da sentença por omissão de pronúncia; na impugnação da matéria de facto; se é de presumir que o autor aceitou o despedimento; se inexistiam dois postos de trabalho ocupados pelo autor; se o autor agiu em abuso de direito; e se a indemnização por danos não patrimoniais deve ser fixada em 500,00 euros.

3.–Fundamentação de facto

3.1.–Na primeira instância foram considerados provados os seguintes factos:

A)- 02/06/2014, a R. - primeira contraente - e o A. - segundo contraente - subscreveram um documento denominado “contrato de trabalho a termo certo”, do qual consta, entre o mais:

“Cláusula Primeira
Objecto do contrato/Funções e Categoria

-A Primeira contraente admite ao seu serviço a segunda contraente para exercer as funções de Técnico de Qualidade.
- Incluem-se no objecto do contrato tarefas conexas com as acima mencionadas, bem como, eventuais substituições imediatas por razões de urgência, ou transitórias, no uso do poder de direcção da primeira contraente.

Cláusula Segunda
O local de prestação de trabalho da segunda contraente será nas instalações da primeira contraente ou em todos os locais onde esta preste a sua actividade.
(...)

Cláusula Quinta
O período normal de trabalho será de 40 horas semanais e a segunda contraente observará o seguinte horário de trabalho: das 09 h às 13 h e das 14h às 18 h.

Cláusula Sexta
Como contrapartida do trabalho prestado será pago à segunda contraente a retribuição mensal ilíquida de Eur: 700,00, até ao final do presente contrato, passível dos descontos legais, liquidados no último dia de cada mês.

Cláusula Sétima
A segunda contraente gozará o dia de descanso semanal aos sábados e Domingos.” 

B.– Por notificação de 7 de Novembro de 2016, a aqui R. comunicou ao A. a sua intenção de proceder ao seu despedimento por extinção do seu posto de trabalho.

C.– Da comunicação da intenção de despedimento, remetida ao A, a R. fez constar: “O início do contrato verificou-se em 2 de Junho de 2014, por contrato a termo certo, tendo o mesmo sido convolado em contrato sem termo. Face à actual conjuntura do mercado, mormente quanto à necessidade de rentabilizar os recursos afectos à área da qualidade, torna-se imperioso a reorganização, concentração e racionalização desses serviços por forma a manter a competitividade da empresa. Pelo que é necessário, sob pena de rutura ou colapso económico, a redução de custos não sendo possível à empresa suportar os custos decorrentes do seu contrato de trabalho, pelo que se torna impossível a subsistência da relação laboral. Não subsiste a necessidade de manutenção do posto de trabalho inerente às tarefas desempenhadas por V. Ex.a, daí que se decidiu que é inevitável a extinção do posto de trabalho correspondente à categoria que detém, até porque as tarefas para as quais foi contratado se encontram obsoletas e desnecessárias à empresa face à forte concorrência existente, às novas necessidades, bem como às exigências de mercado e exigências legais no sector da qualidade.(...). A necessidade da extinção do posto de trabalho espelhada nos factos descritos são devidos a factores de mercado, estruturais e de globalização, para os quais em nada contribuíram a entidade empregadora e o trabalhador.”

D.– A R. tem ao seu serviço trabalhadores e colaboradores externos para executar cada uma das funções para que foi contratado o A.

E.– Sendo o A. apenas técnico e necessitando a R. de um Engenheiro Alimentar que pudesse assinar as certificações e classificação de HCCT e dar formação, não tinha alternativa a R. do que solicitar tais serviços a entidades externas.

F.– Sendo também a R. obrigada a cumprir as questões de natureza ambiental, de certificação de segurança, higiene e saúde no trabalho, cumprindo ainda todas as questões relacionadas com qualidade, viu-se obrigada a contratar todos os serviços necessários a tal efeito.

G.– Não existe qualquer outro posto de trabalho compatível ou similar com a categoria profissional do A. como Técnico de Qualidade.

H.– Para a extinção do posto de trabalho em nada contribuíram quer o A. quer a R..

I.– A R. não tem ao seu serviço nenhum trabalhador para as tarefas correspondentes ao extinto posto de trabalho do A.

J.– Mesmo antes de iniciar o processo tendente à extinção do posto de trabalho, R. e A. encetaram negociações tendentes à extinção por mútuo acordo.

L.– Na impossibilidade de acordo, requereu o A. a intervenção da ACT.

M.– Após averiguações e inspecções feitas pela ACT, esta emitiu relatório sobre a verificação dos requisitos de extinção do posto de trabalho, do qual consta entre o mais:
- não existem, na empresa, contratos de trabalho a termo para tarefas correspondentes às do posto de trabalho extinto, uma vez que o trabalhador é o único que desempenha as funções de Técnico de Qualidade, como o próprio confirma no seu requerimento, passando estas a ser exclusivamente asseguradas por empresa externa à qual se adjudicaram;
- não é aplicável a esta situação o procedimento do despedimento colectivo, por se abranger apenas um único trabalhador;
- não existindo, por conseguinte, em toda a empresa, outros postos de trabalho com conteúdo funcional idêntico, não há que observar a ordem de critérios prevista no n.° 2 do art. 368°, do CT.
Deste modo, não se verificam irregularidades nos requisitos sujeitos à verificação deste organismo.”

N.– A R. comunicou em 24 de Novembro de 2016 ao A. a decisão de o despedir por extinção do seu posto de trabalho.

O.– Da decisão de despedimentos do A consta, entre o mais:
“Como ficou dito na comunicação de intenção de despedimentos por extinção de posto de trabalho face à actual conjuntura de mercado, mormente quanto à necessidade de rentabilizar os recursos afectos à área da qualidade, torna-se imperioso a reorganização, concentração e racionalização desses serviços por forma a manter a competitividade da empresa.
Pelo que é necessária sob pena de rutura ou colapso económico, a redução de custos não sendo possível à empresa suportar os custos decorrentes do seu contrato de trabalho, pelo que torna impossível a subsistência da relação labora.
Não subsiste assim a necessidade de manutenção do posto de trabalho inerente às tarefas desempenhadas por V. Ex. a daí que se decidiu que é inevitável a extinção do posto de trabalho correspondente à categoria que detém, até porque as tarefas para as quais foi contratado se encontram obsoletas e desnecessárias à empresa face à forte concorrência existente, às novas necessidades, bem como às exigências de mercado e exigências legais no sector da qualidade.
Por outro lado, extinguindo-se a categoria profissional de V.Ex.a, não possui a entidade empregadora outro posto de trabalho compatível ou similar com a categoria profissional de V. Ex.a, conforme asseverado pela ACT no seu parecer.
(...)
Cumpridos que estão os requisitos da presente comunicação nos termos do n.° 2, do artigo 371°, do CT, cumpre apenas informar que terá a receber as quantias referentes a vencimento e subsídio de Natal no montante de 1.205,05 €, acrescido do valor da indemnização nos termos do artigo 366°, do CT, ou seja, 12 dias por cada ano de trabalho, num total de 30 dias, num total de 717,97 €.”

P.– O A. era o único trabalhador que desempenhava funções de Técnico de Qualidade que estão asseguradas por empresa externa.

Q.– Todas as questões relacionadas com área da qualidade são tratadas pela empresa externa (…)

R.– Também as questões relacionadas com resíduos, auditorias às quintas onde a R. exerce a actividade, todas as questões relacionadas com higiene e segurança no trabalho e medicina no trabalho são executadas por empresas externas, a (…) e a (…).

S.–  Pela extinção do posto de trabalho do A. foram pagas pela R. ao A. as quantias de 1.234,94 €, por conta do vencimento, subsídio de férias e subsídio de alimentação referente a Novembro; 1.866,44 €, a título de compensação.

T.–  O R. recebeu aquelas quantias, a 04/01/2017.

U.– O A., à data da celebração do contrato de trabalho com a BBB., residia na (…), em Mafra.

X.– Com a celebração do contrato de trabalho transferiu a residência para a (…)

Z.– Em Setembro de 2011, a R. contratou o A. na qualidade de Técnico de Qualidade, para que este executasse as tarefas necessárias ao controlo da qualidade, segurança e higiene dos seus serviços.

AA.–  Para tanto, o A. realizaria as suas funções, nas instalações da R., duas vezes por semana, e receberia a quantia mensal global de 250,00 €/mês, mediante emissão de recibo.

BB.–  Decorridos cerca de dois meses, já em Dezembro de 2011, o A., para além das funções próprios de Técnico de Qualidade, passou a realizar actividades diversas, como: encomenda de produtos; contactos com fornecedores; recepção de catálogos e preçários.

CC.– O A. realizava aquelas tarefas nas instalações da R., no escritório da Quinta da (…) e demais lugares onde aquela prestava a sua actividade.

DD.– O A. realizava aquela actividade, de segunda-feira a sexta-feira, com o seguinte horário de trabalho: das 09:00 h às 13:00 h e das 14:00 horas às 18:00 horas.

EE.– Por conta da realização daquelas tarefas, a R. pagava ao A. a quantia mensal líquida de 1.100,00 €.

FF.– Em data não concretamente apurada, a R. passou a pagar ao A. a retribuição mensal líquida de 1.350,00 €, a qual se manteve até ao despedimento.

GG.– A retribuição era paga em numerário.

HH.– Desde Dezembro de 2011, a R. incumbiu o A. das seguintes tarefas, para além das tarefas própria do técnico de qualidade que vinha desenvolvendo desde Setembro de 2011:

Técnico de qualidade, assegurando o cumprimento de todas as boas práticas inerentes à produção alimentar da R., refiram-se boas práticas de higiene, boas práticas de fabrico, boas práticas de armazenamento e boas práticas de transporte de alimentos;

Desenvolvimento, Implementação e Gestão de Sistema de Qualidade e Segurança Alimentar (baseado em (…)(…)(…));

Responsável pela implementação de metodologias para assegurar o cumprimento da legislação aplicável à produção alimentar levada a cabo pela R;

Avaliação e selecção da qualidade e do valor de cada produto e serviço comprados pela empresa;

Contacto com fornecedores, pedido, avaliação e negociação de orçamentos relativos aos produtos e serviços;

Recepção, controlo e armazenamento de mercadorias;

Aquisição e distribuição, pelos diferentes departamentos, das mercadorias e artigos necessários ao seu funcionamento;

Coordenação e organização dos diversos armazéns dos produtos alimentares (armazém de bebidas, de mercearia, câmaras de refrigeração, câmaras de congelação);

Manutenção de equipamentos, materiais e utensílios da confecção, armazenamento e preparação de alimentos.

Verificação manutenção e reparação de todos os equipamentos e instalações da empresa.

Supervisão e coordenação de subcontratados adstritos aos serviços técnicos, prestando-lhes toda a assistência técnica necessária, em ordem a aumentar a sua eficiência, designadamente no que respeita à prevenção de acidentes, combate a incêndios e paralisação de equipamentos.

Programação dos trabalhos de manutenção e reparação, tanto internos como externos, de modo a fornecer indicações precisas sobre o estado de conservação e utilização do equipamento e instalações.

II.– As funções eram executadas mediante ordens dadas pelo gerente da R., (...) e da esposa, (...), Directora da R. e (...), responsável pela manutenção e logística.

JJ.– No dia 02/06/2014, a R. entregou ao A., para este assinar, o contrato de trabalho.

LL.– O A., em Julho de 2014, gozou 13 dias de licença de parentalidade.

MM.– Após o despedimento do A., as funções que até aí lhe estavam atribuídas passaram a ser exercidas por outros funcionários e por (...) e (...), para além das confiadas a empresas externas.

NN.– A R. não dispõe de laboratório nas suas instalações e terá sempre de contratar o serviço de controlo analítico, o que acontecia com a empresa (…).

OO.– O A. sempre foi o elo de ligação da R. à (…), acompanhando os procedimentos e remetendo para essa empresa todos os elementos para avaliação e análises laboratoriais, quando, e se, necessário.

PP.– A R. tem de efectuar controlo diário dos parâmetros da qualidade e segurança alimentar, quer na manipulação dos alimentos, quer nos equipamentos de preparação e conservação, quer no transporte de alimentos.

QQ.–Tais funções têm de ser atribuídas internamente, ou a assessoria para garantia dos referidos parâmetros, tem de prever a presença diária de um funcionário competente para o efeito, nas instalações da R.

RR.– Os elementos assim coligidos são tratados, avaliados e certificados pela (…),

SS.– No exercício da sua actividade a R. dedica-se à organização de eventos, casamentos, baptizados e festas, em espaços próprios ou contratados para o efeito.

TT.– A actividade da R. regista desde 2013 grande crescimento económico e estrutural, angariando sucessivamente novos clientes, principalmente no que respeita ao sector dos eventos para empresas, nacionais e internacionais.

UU.– No final do ano de 2015 a R. investiu num projecto que visou a construção de uma nova cozinha industrial, para a unidade da sede, sita na (…).

VV.– Também no ano de 2016, implementou um novo armazém, arrendado, sito na Rua (…), para as operações das equipas de decoração, vendas e logística.

XX.– Em 2016, a empresa criou 10 (dez) novos postos de trabalho, e contratou outros tantos funcionários novos.

ZZ.– A R. em 2015 tinha 33 trabalhadores.

AAA.– Em 2016, a R. celebrou novo contrato, de catering exclusivo, com o Palácio do Correio Mor, em Loures.

BBB.– Após o dia 07/10/2016, o A. foi gozar um período de férias previamente agendadas, as quais foram prolongadas por mensagem da Sr.a (…), no dia 18/10/2016, até ao dia 30/10/2016.

CCC.– No dia 31/10/2016, aquando do regresso de férias, o A. foi informado pelo gerente da R., Sr. (...), que esta queria rescindir o contrato por mútuo acordo.

DDD.– Nessa altura o gerente da R. propôs ao A. pagar-lhe uma quantia em dinheiro, acrescido do modelo para o subsídio de desemprego, o que não foi aceite pelo mesmo.

EEE.– O A. não aceitou o acordo para a extinção do posto de trabalho.

FFF.– Com o seu despedimento, o A. ficou profundamente triste, deprimido, perturbado, angustiado, não conseguindo descansar e sempre temendo pela sua situação financeira - tendo fundado receio de perder o posto de trabalho o que se verificou.

GGG.– O A. tem dois filhos e vive maritalmente, sendo que a companheira se encontra desempregada.

HHH.– Aquando do despedimento, o salário do A. era a única fonte de rendimento do agregado familiar, para além do subsídio de desemprego da sua companheira.

A R. impediu o A. de aceder ao seu posto de trabalho, após o início do procedimento de extinção do posto de trabalho.

JJJ.– A R. barrou ao A. o acesso ao sistema informático, seu endereço de email e ao posto de trabalho.

LLL.– A R. emitiu e entregou ao A. uma declaração datada de 08/11/2016, da qual consta:
“Declara-se que AAA, não tem de se apresentar no seu posto de trabalho na qualidade de técnico de qualidade, de dia 8 de Novembro de 2016 a 17 de Novembro 2016, não perdendo qualquer tipo de remuneração.”

A R. emitiu e entregou ao A. uma declaração datada de 18/11/2016, da qual consta:
“Declara-se que AAA (...) não tem de se apresentar no seu posto de trabalho na qualidade de técnico de qualidade, de dia 18 de Novembro de 2016 a 24 de Novembro 2016, não perdendo qualquer tipo de remuneração.”

MMM.– Os fornecedores, colegas de trabalho e amigos, inquiriram o A acerca das circunstâncias que determinaram o afastamento da empresa.

OOO.– Já em Outubro de 2015, a R. tentou implementar um programa informático para gestão da empresa e optimização e controlo dos recursos, bens, mercadorias e clientes.

PPP.– Antes da assinatura do contrato de prestação de serviços em 2014, pela (…), esta fazia auditorias pontuais das quais realizava relatórios.

QQQ.– O controlo analítico é sempre feito por uma empresa externa e que desde 2008 tal função foi atribuída à empresa (…).

RRR.– O controlo diário é efectuado por cada uma das secções, sendo que os chefes de cada uma das secções verifica se está tudo conforme uma segunda vez, como já acontecia antes da extinção do posto de trabalho do A.

SSS.– De 15 em 15 dias, a empresa (…) faz as vistorias e os relatórios de controlo.

TTT.– Todas as pessoas contratadas foram para a área comercial, da cozinha ou pastelaria, nunca tendo sido contratada qualquer pessoa para a área da qualidade.

3.2.– Na primeira instância foram considerados não provados os seguintes factos:
1)– A R. ainda tentou manter o contrato de trabalho do A. tentando que este auxiliasse outros trabalhadores noutras tarefas, apesar de fora do âmbito do seu contrato de trabalho.
2)– O A. foi admitido ao serviço da R., sob as suas ordens, direcção e fiscalização, no dia 1 de Setembro de 2011.
3)– O A. foi contratado para exercer não apenas as funções de técnico de qualidade, mas também as funções de responsável pelo aprovisionamento e pela manutenção de equipamentos afectos à actividade comercial da R.

4)– Desde Dezembro de 2011, a R. incumbiu o A. das seguintes tarefas:
- Assistente de F&B (comidas e bebidas), com segmentária responsabilidade a nível de desenvolvimento de novos menus e total responsabilidade a nível de selecção de bebidas e cocktails;
- Responsável de Aprovisionamento encarregado pela selecção dos fornecedores de cada produto ou serviço empregue no processo produtivo, e não só, assegurando o regular abastecimento da empresa, face aos eventos a realizar e número de participantes;
- Negociação do valor de cada produto e serviço comprados pela empresa, bem como, controlo de preço unitário de cada artigo ou serviço facturados à empresa;
- Responsável da manutenção de equipamentos, materiais e utensílios da confecção, armazenamento e preparação de alimentos.
- Supervisão e coordenação da verificação manutenção e reparação de todos os equipamentos e instalações da empresa.

5)– A assessoria prestada pela (…) à R. não dispensa a realização das funções de um técnico de qualidade, ou de alguém com as suas competências, atendendo à estrutura e dimensão da empresa.

6)– O móbil da extinção do posto de trabalho assentou em conduta culposa por parte do gerente da R., Sr. (...).

7)– No dia 07/10/2016, cerca das 11horas, o gerente da R. Sr. (...), humilhou o A., ofendendo-o na sua honra e consideração, durante o período normal de trabalho, e no local de trabalho, nas instalações da sede, sita na Quinta (…).

8)– A conduta do gerente da Ré Sr. (...), foi levada a cabo, diante dos colegas de trabalho do A., Sr. (…) e Sr.a (…).

9)– Na verdade, no referido dia 04/11/2016, o funcionário da (…),(…), estabeleceu contato telefónico com o gerente da R, o qual impediu o acesso do A. às imagens.

10)– A R. procedeu à admissão de diversos Trabalhadores a termo certo no ano de 2016, e, bem assim já após o despedimento do A., como são exemplo o Sr. (…), Sr.a (…)e o Sr. (…).

11)– Os fornecedores, colegas de trabalho e amigos, diariamente inquiriram o A acerca das circunstâncias que determinaram o afastamento da empresa, sem que o mesmo conseguisse explicar a motivação da R.

12)– Sentiu-se ainda o A. triste, deprimido, injustiçado e perturbado pelo facto de ter sido impedido de aceder ao seu posto de trabalho, pois perante os colegas de trabalho e fornecedores, chegou a informação que ia ser despedido, o que contribuiu para a convicção de que teria cometido alguma infracção muito grave, quando tinham já decorrido 6 anos de trabalho para a R., sem que houvesse qualquer infracção a apontar.

13)– Ainda hoje, o A. não consegue convencer ninguém que foi despedido por alegada extinção do posto de trabalho, pois todos com quem lida conhecem a R. e a implantação comercial da mesma, e não acreditam.

4.–Fundamentação de Direito

4.1.-Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia

Sustenta a ré, conforme acima descrito, que a sentença é nula por não ter a mesma decidido se a prova documental produzida, nomeadamente e-mails, foi validamente junta aos autos. Não existindo qualquer menção na sentença quanto à admissibilidade ou não da documentação da ré, é nula a sentença por omissão de pronúncia.

Nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, normativo aplicável à 2ª instância por força do art.º 666.º, n.º 1 do mesmo compêndio normativo;

“ É nula a sentença quando:
(…)

«O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».

Relaciona-se este dispositivo com o preceituado no art.º  608.º do mesmo Código, nos termos do qual «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras», prevendo ainda aquele dispositivo que o juiz não «pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras».

Ora, como tem vindo a ser reiteradamente entendido pela jurisprudência e pela doutrina, o que o compete ao juiz apreciar e decidir são as questões e não os argumentos ou as teses apresentados pelas partes, não estando o mesmo, para além do mais, sujeito às alegações das partes no tocante à indagação e aplicação das regras de direito (art.º 5.º n.º 3 do CPC).  E as questões são os temas, as matérias decorrentes do pedido e da causa de pedir  e das excepções invocadas pelas partes. Nos termos assinalados pelo Acórdão do STJ de 03.06.2015, processo n.º 297/12.3TTCTB.C1.S1, citando Cardona Ferreira, «O juiz não tem que esgotar a análise da argumentação das partes, mas apenas que apreciar todas as questões que devam ser conhecidas, ponderando os argumentos na medida do necessário e suficiente.» Mais aí se aduzindo que, conforme refere também Alberto dos Reis «[s]ão, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão».
No presente caso, a ré (a fls. 490 a 492 verso) veio requerer que os documentos juntos aos autos pelo autor após a apresentação da sua resposta, porque obtidos de forma ilícita, fossem desentranhados dos autos.

Compulsando os autos, verifica-se que relativamente ao requerido desentranhamento se pronunciou expressamente o tribunal por despacho de fls. 509 e, posteriormente, na sequência do acórdão desta Relação que anulou a decisão proferida a fls. 712, por despacho (também) a admitir esses documentos, despachos estes não impugnados pela ré.

Desta feita, não se vislumbra que a sentença recorrida tenha incorrido em (qualquer) omissão de pronúncia. Todavia, ainda que assim não entendesse, sempre seria se considerar estar a ré carecida de razão. Efectivamente, não somente se não demonstra terem sido tais documentos obtidos por meios ilegais, como do conjunto de tal documentação apenas relativamente a uma pequena parcela da mesma foram as testemunhas ouvidas em audiência confrontadas e dessa pequena parcela somente uma parte esteve na base da fundamentação da matéria de facto (fls. 764 a 780), sendo que esta também dizia respeito ao autor e/ou lhe era dirigida.

Com efeito, os documentos a que a mesma ré se referirá (face ao seu anterior requerimento), visto em sede de recurso os não ter especificamente indicado, serão os documentos apresentados pelo autor sob os n.ºs 1, 1.1., 2, 4, 5, 7 e 8 (fls. 408 a 487).

Analisando tais documentos, verifica-se que os documentos n.º 1 e 1.1. são e-mails dos anos de 2014 e 2015 enviados por (…) (funcionária da ré) dirigidos a (...), directora da ré, e a outros funcionários, e concernentes a eventos realizados pela ré – fls. 403 a 415; o documento n.º 2 é o e-mail da referida funcionária (...), referente a aniversário de cliente da ré e à ordem de serviço atinente a esse evento – fls. 416-422), foi também dirigido ao autor. O doc. n.º 4 é o e-mail de (…), funcionária da ré, remetendo a listagem do pessoal da ré constante de fls. 437, listagem onde também consta o nome do autor e a data da sua admissão; o documento n.º 5 são os e-mails, de (…)e de (…), referente a ordens de serviço da ré – fls. 444 verso a 453, foram dirigidos várias funcionários da ré, entre as quais o autor;  o doc. n.º 7 são e-mails de (…),(…),(…),(…) e de (…), funcionários da ré, que foram dirigidos também ao autor – fls. 455-458; o doc. n.º 8 (conta informática em nome do autor e da ré, onde constam indicados, nomeadamente, fornecedores, as listas de compras e de encomendas – fls. 460 a 484).

Relativamente a esses documentos, conforma já assinalado, apenas quanto a alguns deles foram inquiridas testemunhas ouvidas em audiência de discussão e julgamento, como resulta das respectivas actas (fls. 740-741 verso, 749-751, 757-757 verso) e se passa a enunciar. 

Assim, quanto aos documentos de fls. 436 e 437 (e-mail dirigido ao autor e listagem de funcionários onde ele também consta) foi ouvida, (…); quanto ao de fls. 437, listagem, foi confrontada (…); quanto ao de fls. 458 (e-mail também dirigido ao autor), foram inquiridas (…) e (...) e sobre o de fls. 480 (e-mail igualmente dirigido ao autor), a dita (...).

Nesta conformidade, não tendo a sentença recorrida incorrido em omissão de pronúncia (nem se vislumbrando a ilicitude da prova), desatende-se a arguida nulidade, improcedendo, como tal, a presente questão.

4.2.Da impugnação da matéria de facto

(…)

- Sustenta a ré que o facto provado FFF (“FFF. Com o seu despedimento, o A. ficou profundamente triste, deprimido, perturbado, angustiado, não conseguindo descansar e sempre temendo pela sua situação financeira - tendo fundado receio de perder o posto de trabalho o que se verificou”), deve ser dado como não provado, por o mesmo conter em si uma contradição e em face aos depoimentos de (…) e de (…). O autor ficou revoltado e com raiva, mas em Dezembro de 2016 já tinha arranjado outro emprego. Ponderando a prova produzida e este respeito, entendemos ser de manter o essencial da versão contida em FFF, embora com corrigida redacção. Na verdade, resulta dessa prova que o autor com o despedimento ficou muito “triste, desanimado, frustrado, por ter sido apanhado desprevenido, e perdido um emprego perto de casa” (depoimento de (…)); o despedimento para o seu filho foi “um abismo”, “ficou deprimido” (depoimento de (…)), emergindo do depoimento de (…), conjugado com as próprias declarações do autor, que o mesmo, em consequência do despedimento ficou “muito preocupado”, “triste”, “revoltado”, “sentindo-se injustiçado”, não conseguia descansar, temendo pela sua situação financeira e pelo seu futuro face aos encargos que tinha. Ainda a este propósito não vemos que o facto de as testemunhas (…) e (…) terem referido que autor em 2017 arranjou outro emprego, ponha em causa ou anule os sentimentos vividos por este em virtude da ruptura laboral ocorrida com a ré, visto nada mais se ter apurado a esse propósito.

Com base no exposto, altera-se a redacção de FFF, nos seguintes termo: Provado apenas que: “FFF. Com o seu despedimento, o A. ficou profundamente triste, deprimido, perturbado, angustiado, não conseguindo descansar e temendo pela sua situação financeira.”

(…)

Posto isto, e sem necessidade de outras considerações, apenas nos resta concluir, nos termos exposto, pela procedência parcial da presente questão.

4.3.Da presunção de aceitação do despedimento

Pretende a ré que tendo o autor recebido as verbas referentes à compensação pela cessação do contrato, se presume que aceitou o despedimento, não sendo lícito vir impugná-lo.

Antes de se abordar a presente questão importa recordar que a decisão inicialmente proferida pelo tribunal a quo, foi anulada para se apurar em audiência de discussão e julgamento, o valor da retribuição-base auferida pelo autor e a sua antiguidade, face ao que o mesmo alegara no seu articulado. É ainda de salientar, conforme resulta do decidido quanto à antecedente questão, que a factualidade contida na decisão, ora recorrida, foi mantida, no seu essencial. Isto é, consoante emerge da factualidade provada, o autor auferia na ré valor superior ao invocado por esta, resultando, igualmente, dessa factualidade, que a sua antiguidade retroagia a data anterior à referida pela empregadora e que consta do contrato de trabalho a termo, posteriormente celebrado entre o autor e aquela. Em resumo, as variáveis a considerar em termos de compensação devida ao autor são diversas das que a ré invocou.

Posto isto, enquadremos, no demais, a questão.

O autor viu cessado o contrato de trabalho que mantinha com a ré na sequência do despedimento por extinção do posto de trabalho promovido por esta, despedimento esse comunicado ao autor em Novembro de 2016.

Como é sabido, o despedimento por extinção do posto de trabalho está previsto nos artigos 367.º, 368.º, 369.º a 371.º 372.º e 384.º do Código de Trabalho.

Ao caso aplica-se o Código de Trabalho, aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, na versão decorrente da Lei 27/2014, de 8 de Maio (entrada em vigor em 1-06-2014), no que concerne aos artigos 368.º e 375.º.

Com base nesse regime legal, assinala-se o seguinte:

A noção de “despedimento por extinção do posto de trabalho” é a resultante do art.º 367.º, onde se diz, “Considera-se despedimento por extinção de posto de trabalho a cessação de contrato de trabalho promovida pelo empregador e fundamentada nessa extinção, quando esta seja devida a motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, relativos à empresa (n.º 1). Entende-se por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos os como tal referidos no n.º 2 do artigo 359.º (n.º2).

Sendo que por via do prescrito em tais normativos consideram-se:

a.- Motivos de mercado - redução da atividade da empresa provocada pela diminuição previsível da procura de bens ou serviços ou impossibilidade superveniente, prática ou legal, de colocar esses bens ou serviços no mercado;

b.- Motivos estruturais - desequilíbrio económico-financeiro, mudança de atividade, reestruturação da organização produtiva ou substituição de produtos dominantes;

c.- Motivos tecnológicos - alterações nas técnicas ou processos de fabrico, automatização de instrumentos de produção, de controlo ou de movimentação de cargas, bem como informatização de serviços ou automatização de meios de comunicação.

Por seu turno, os requisitos para o despedimento por extinção do posto de trabalho são os constantes do art.º 368.º, aí se prescrevendo:

“1O despedimento por extinção de posto de trabalho só pode ter lugar desde que se verifiquem os seguintes requisitos:
a)- Os motivos indicados não sejam devidos a conduta culposa do empregador ou do trabalhador;
b)- Seja praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho;
c)- Não existam, na empresa, contratos de trabalho a termo para tarefas correspondentes às do posto de trabalho extinto;
d)- Não seja aplicável o despedimento colectivo.
2 – Havendo na secção ou estrutura equivalente uma pluralidade de postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico, para determinação do posto de trabalho a extinguir, a decisão do empregador deve observar, por referência aos respetivos titulares, a seguinte ordem de critérios relevantes e não discriminatórios:
a)- Pior avaliação de desempenho, com parâmetros previamente conhecidos pelo trabalhador;
b)- Menores habilitações académicas e profissionais;
c)- Maior onerosidade pela manutenção do vínculo laboral do trabalhador para a empresa;
d)- Menor experiência na função;
e)- Menor antiguidade na empresa.
3 O trabalhador que, nos três meses anteriores ao início do procedimento para despedimento, tenha sido transferido para posto de trabalho que venha a ser extinto, tem direito a ser reafectado ao posto de trabalho anterior caso ainda exista, com a mesma retribuição base.
4 Para efeito da alínea b) do n.º 1, uma vez extinto o posto de trabalho, considera-se que a subsistência da relação de trabalho é praticamente impossível quando o empregador não disponha de outro compatível com a categoria profissional do trabalhador.
5 O despedimento por extinção do posto de trabalho só pode ter lugar desde que, até ao termo do prazo de aviso prévio, seja posta à disposição do trabalhador a compensação devida, bem como os créditos vencidos e os exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho.
(…)”.
O procedimento a observar pelo empregador, em caso de despedimento por extinção do posto de trabalho, é o previsto nos artigos 369.º, 370.º e 371.º, do mesmo diploma legal, resultando do art.º 372.º, que os direitos do trabalhador em caso de despedimento por extinção do posto de trabalho são os mesmos dos trabalhadores despedidos no âmbito do despedimento colectivo ao remeter, expressamente, para o n.º 4 e primeira parte do n.º 5 do art.º 363.º e para os artigos 364.º a 366.º.
Como resumidamente bem se assinalou no Ac. do STJ de 6-04-2017, proc. 1950/14.2TTLSB.L1, in www.dgsi.pt:
 “Assim:
- Não sendo observado o prazo mínimo de aviso prévio, o contrato cessa decorrido o período de aviso prévio em falta a contar da comunicação de despedimento, devendo o empregador pagar a retribuição correspondente a este período;
- O pagamento da compensação, dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho deve ser efetuado até ao termo do prazo de aviso prévio;
- Durante o prazo de aviso prévio, o trabalhador pode denunciar o contrato de trabalho, mediante declaração com a antecedência mínima de três dias úteis, mantendo o direito a compensação;
- Em caso de despedimento por extinção do posto de trabalho, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, a determinar de acordo com o n.º 2.”

O despedimento por extinção do posto de trabalho é ilícito, por força do disposto no artigo 384º, alínea a), “se o empregador não cumprir os requisitos do n.º 1, do artigo 368º. Requisitos estes cumulativos e cujo ónus da prova incumbe ao empregador.

Deste modo, como também referido no citado acórdão, “para além da verificação de tais requisitos, a lei condiciona o despedimento por extinção do posto de trabalho também com diversas exigências formais [comunicações e consultas – artigos 369º e 370º] que visam assegurar o esclarecimento do trabalhador abrangido, garantir o exercício do contraditório e tutelar a segurança jurídica, bem como permitir o posterior controlo jurisdicional desses fundamentos.
Para isso, quer nas comunicações previstas no artigo 369º, quer na decisão final do processo, consagrada no artigo 371º, devem estar devidamente especificados os fundamentos da cessação do posto de trabalho, bem como figurar todas as circunstâncias e factos concretos que integram esses motivos. Na verdade, sem a alegação destes elementos, o trabalhador fica sem saber e sem conhecer os factos que determinam a extinção do seu posto de trabalho e, por isso, não podendo pronunciar-se sobre os mesmos, ficando prejudicado o exercício do contraditório e o seu direito de defesa. Também, o tribunal fica sem possibilidade de exercer qualquer controlo jurisdicional sobre a verificação dos motivos da extinção e sobre as razões que levaram o empregador a concluir pela impossibilidade prática da subsistência da relação contratual laboral.
Neste sentido, o acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 18 de junho de 2014, ao afirmar que “[e]sta comunicação tem de conter, obrigatoriamente, os elementos a que se refere o nº 3 do referido preceito, devendo nela o empregador invocar factos tendentes a demonstrar o nexo de causalidade entre a extinção daquele posto de trabalho e a cessação do contrato do trabalhador atingido, sendo nesta comunicação que terá que concretizar os motivos que nortearam a escolha deste trabalhador e não de outro, pois só assim lhe será possível controlar e rebater essas razões e dar um sentido útil à fase seguinte” .

Retornemos, agora, ao presente caso.

Pugna a ré no sentido de que tendo o autor recebido a quantia que a ré lhe pagou por cheque, por via da presunção contida no art.º 366.º, do Código do Trabalho (onde se dispõe que: “ Presume-se que o trabalhador quando recebe do empregador a totalidade da compensação prevista neste artigo (n.º4). A presunção referida no número anterior pode ser ilidida desde que, em simultâneo, o trabalhador entregue ou ponha, por qualquer forma, a totalidade da compensação paga pelo empregador à disposição deste último (n.º5), aceitou o despedimento, não sendo legítimo proceder à sua impugnação.

Importa desde já dizer que se não se desconhece o posicionamento dos nossos tribunais relativamente às diversas questões suscitadas a propósito do “funcionamento” da referida presunção e que assentam, sobretudo e resumidamente, no entendimento de que para afastar a presunção (que tem natureza relativa - juris tantum), deve o trabalhador entregar ou colocar à disposição do empregador a totalidade da compensação recebida.

Sendo inúmeros os arestos que se têm pronunciado sobre esta matéria, indicam-se, a título de exemplo, os acórdãos do STJ de 19.11.2015, proc. 568/10.3TTVNG.P1.S1 e de 17.03.16, proc. 1274/12.0TTPRT.P1.SI, do TRL de 21.09.2011, proc. 4983/07.1TTLSB.L1 e de 27.06.2012, proc. 54/10.1TTALM.L1, do TRP de 19-01-2015, proc. 804/13.4TTBRG.P1 e do TRC de 21.03.2013, proc. 1169/12.7TTCBR-A.C1, do TRL de 20.03.2002, proc. 6871/2007-4, do TRP de 9.05.2007, proc. 0647182, todos in ww.dgsi.pt.

Tão pouco se ignoram as vozes críticas de alguns autores a propósito da iniquidade (e até do despropósito) da referida presunção, como sucede, nomeadamente, com Leal Amado, “Contrato de Trabalho”, Coimbra Editora, pág. 256 e segs., Monteiro Fernandes, “Direito do Trabalho”, Almedina pág. 644, Pedro Furtado Martins, “Cessação do Contrato de Trabalho”, Principia, 4.ª Edição pág. 392 e segs. e Bernardo Lobo Xavier “Compensação por Despedimento”, in RDES, 2012, n.º 1-2, pág. 65 a 98, quando é certo, segundo assinalam, quer o despedimento seja julgado lícito ou ilícito, assistirá ao trabalhador direito a receber a compensação, parecendo configurar o recebimento da compensação “condição suficiente para a respectiva licitude do despedimento, como que sanando quaisquer vícios procedimentais ou substanciais de que este enferme” (Leal Amado, Ob Cit. pág. 258).

Sucede, porém, que o presente caso se reporta a situação diversa e que consiste, em nosso entender, na não verificação da base da presunção (o facto conhecido).

Não se deve olvidar que “Presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido” (art.º 349.º do Código Civil).

“Quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz” (art.º 350.º n.º1 do Código Civil).

Com efeito, como acima se deixou expresso, o legislador determina que se presume a aceitação do despedimento quando o trabalhador recebe a totalidade da compensação, correspondente, actualmente, “a 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade”, nos termos do n.º 1 do citado art.º 366.º, na redacção dada pela Lei 69/2013, de 30 de Agosto. 

E compreende-se que assim seja, pois, não somente a compensação é o elemento central no regime da cessação do contrato de trabalho, como é o recebimento por banda do trabalhador da compensação (total e devida) pelo despedimento por extinção do posto de trabalho que permite à dita figura alcançar a sua dupla função que é a de ressarcir e “reparar a perda do posto de trabalho pelo trabalhador  e de servir de contrapartida pelo facto de o trabalhador não impugnar o despedimento”, assim se obtendo a “paz jurídica” (Cfr. Lobo Xavier, Ob. Cit. pág. 78).

O legislador determina, por isso, efectividade da compensação, fulminando, com a ilicitude, o despedimento em que a mesma não ocorra.

Nesta linha, o empregador deve entregar ao trabalhador a integralidade da compensação devida.

Ora, no presente caso, o autor auferia à data do despedimento a título de retribuição (base) a quantia de 1.350,00 euros, reportando-se a sua antiguidade a Dezembro de 2011, por via da relação estabelecida com a ré desde 2011, que nos termos dos artigos 11.º e 12.º do Código de Trabalho, e à semelhança do entendido na sentença recorrida, se configura como uma relação laboral.

Na verdade, como aí se fez constar “ (…) a R. pugnou pela existência de um contrato de prestação de serviços celebrado entre ambos em Setembro de 2011 e até ao dia 02/06/2014. O que é certo, também, é que o A. logrou demostrar que depois dos dois primeiros meses, e até porque tinha disponibilidade para isso (facto que, pela R., não é posto em causa) passou a realizar outras actividades na empresa, que levavam a que ficasse nas suas instalações para além dos dois dias por semana integrados no pacote, a que se referiu (...), e que nada tinham que ver com a área de qualidade e segurança alimentar. De facto, decorridos cerca de dois meses (período que, aliás, corresponde aos recibos que (...) mencionou terem sido os únicos emitidos pelo A.), aquele passou a dedicar-se, em permanência, à prospecção de mercado; recepção e análise dos catálogos dos produtos, com os preços; fazer encomendas, conforme listas dos produtos que lhe eram entregues pelo chefe de pastelaria e pela chefe de cozinha; recepção e distribuição dos bens, pelos vários departamentos; contactos pessoais com os fornecedores. Fazia-o nos escritórios da R., na que a compensação deve ser; cumprindo um horário das 09:00 h às 18:00 h, com uma hora de almoço; usava, para tanto, os instrumentos de trabalho da R. (telefone, telemóvel, computador, portátil e fixo). Era aí que podia ser encontrado e que era contactado, no exercício das suas funções, quer pela entidade empregadora, quer por colegas, quer, ainda, por fornecedores da R.

Nos termos do disposto no art. 11.° do Código do Trabalho:

Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas.

Acrescenta o art. 12.° n.° 1 do mesmo código:

1- Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma actividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características:

A actividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;

Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da actividade;

O prestador de actividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma;

Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de actividade, como contrapartida da mesma;

O prestador de actividade desempenhe funções de direcção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.

Resulta da factualidade provada que o A. desde Dezembro de 2011 exercia as suas funções em local pertencente à R., de acordo com horário por esta estipulado e mediante a contrapartida de uma quantia monetária (em valor e periodicidade certa), usando os seus instrumentos de trabalho.

Resulta igualmente que a aquela actividade é desenvolvida no interesse e em proveito da R.

Estão, pois, preenchidos quatro dos indícios consagrados naquele art. 12°,n.° 1, do CT.

Nos termos aí previstos, a verificação de apenas duas das situações previstas nas alíneas a) a e) do n.° 1, do art. 12°, do CT, é condição suficiente para presumir a existência de contrato de trabalho (Ac. da Rel. de Lisboa, de 05/12/2018 - Dr.a Paula Santos: A presunção de laboralidade prevista no artigo 12° do Código do Trabalho assenta no preenchimento de, pelo menos, duas das cinco características aí elencadas).

A presunção referida é relativa, ou seja, é ilidível, podendo ser afastada mediante prova em contrário, conforme preceitua o art. 350°, n.° 2, do CC.

Esta inversão do ónus da prova, associada à presunção iuris tantum, faz recair sobre a R. a prova do contrário do facto que serve de base à presunção ou do próprio facto presumido.

In casu, essa prova não foi feita, conforme competia à R., atento o disposto no art. 344°, n.° 1, do CC.

Concluindo: os factos subsumem-se na norma vertida no art. 11.° supra citado, verificando-se, em concreto, quatro dos cinco indícios da existência de um contrato de trabalho, verificando-se, in casu, a subordinação do A. à R”.

Como também se expressou na sentença recorrida, em 02.06.2014, “A. e R. subscreveram um acordo a que chamaram contrato de trabalho a termo certo, pelo período de seis meses. (…) No caso em análise, a celebração de um contrato de trabalho a termo quando o mesmo trabalhador dispunha de um contrato de trabalho sem termo e sem qualquer justificação, sequer para que a entidade patronal invoque a alteração da situação jurídica do trabalhador, não passa de um meio de praticar a fraude à lei.

A fraude é tão mais sentida, quanto é certo que, mesmo no pressuposto da validade do contrato a termo, este acabou por se transmutar em contrato de trabalho sem termo, conforme aceita a R. no seu articulado.

Ora, face a este iter contratual verificamos que existia um contrato sem termo antes de 02/06/2014, e passámos a ter um contrato sem termo depois de 02/06/2014, sendo aquela celebração uma verdadeira máscara que pretende esconder a verdadeira realidade dos factos, com prejuízo para o A. que, no pressuposto de um contrato de trabalho a termo válido e eficaz, vê os seus direitos laborais - no que tange a antiguidade, anuidades, categoria, compensações em caso de despedimento substancialmente reduzidos prejudicados, desconsiderando-se tudo o que estava para trás.

Assim, o putativo contrato de trabalho a termo, celebrado entre A e R., deve ser desconsiderado, pois mais não foi do que um escrito sem qualquer materialidade subjacente que lhe desse corpo, nomeadamente com conteúdo jus-laboral, atenta a inexistência (face a um princípio da primazia da materialidade subjacente) da circunstâncias excepcionais e temporárias que justificassem o recurso ao mesmo.

(…)

Esta relação laboral entre A. e R. manteve-se, pois, desde Dezembro de 2011 e até à data do despedimento, como uma só.
Ora, mesmo que considerássemos como verdadeira a retribuição de 700,00 €, fácil é concluir que, contabilizando a R., no cômputo da compensação que arbitrou em consequência do despedimento, apenas a antiguidade do A. reportada a 02/06/2014, deixou de fora todo o período que se situa entre Dezembro de 2011 e aquela data.

Não reflectindo aquela compensação a totalidade da antiguidade do A., enquanto trabalhador da R., não foi por esta disponibilizada àquele a totalidade da compensação a que o mesmo tem direito por força do despedimento por extinção do posto de trabalho.

Nesta medida, acolhendo a doutrina plasmada no Ac. da Relação proferido no recurso intercalar interposto nestes autos, não podemos concluir que o A., ao ficar com aqueles cheques, aceitou (por se presumir tal facto) o seu despedimento por extinção do posto de trabalho”.

Face ao supra descrito, a circunstância de a ré ter pago quantia a título de compensação pelo despedimento por extinção do posto de trabalho, quantia essa que o autor recebeu, não nos permite afirmar, como já dito, ter o autor recebido a compensação, uma vez que, pura e simplesmente, a ré não lhe entregou ou pôs à sua disposição, a totalidade da compensação devida pelo despedimento por extinção do seu posto de trabalho.

Realça-se a tal propósito, que a ré, no contexto em que a relação laboral com o autor se processou e perdurou (em que o retribuição “declarada” não correspondia à efectivamente auferida pelo trabalhador), não poderia legitimamente ignorar que o valor pago a título de compensação, era inferior ao legal.

Tudo isto para se concluir, que se não mostra observado um dos requisitos exigidos para a validade do despedimento por extinção do posto de trabalho (art.º 368.º, n.º 5), o que implica a ilicitude do despedimento (art.º 384.º alínea d)), tudo conforme assinalado supra. Termos em que improcede, sem mais, presente questão.

4.4.Da inexistência de dois postos de trabalho ocupados pelo autor.

Consoante também se assinalou na sentença recorrida a propósito desta questão “Enquanto realidade organizativa, o posto de trabalho é exterior ao contrato de trabalho, está a montante deste, ou seja, nas palavras do mesmo Autor (e aqui refere-se a António Nunes de Carvalho, no seu estudo “Reflexões sobre o conceito legal de posto de trabalho”, 2014, pág. 119 e ss.), «pré-existe em termos lógicos, ainda que não necessariamente cronológicos, ao contrato de trabalho». Mas embora o posto de trabalho não seja uma realidade contratual nem se confunda com a actividade laboral que é objecto da prestação devida pelo trabalhador, há uma conexão entre as duas.

(...) A ligação entre posto de trabalho enquanto realidade organizacional e a viabilização do vínculo laboral é referenciada a propósito de diversas vicissitudes, começando pela admissão de trabalhadores, ou seja, em relação à criação de emprego. Nesta perspectiva, a ideia de posto de trabalho surge associada à celebração do contrato de trabalho e à concretização da prestação de actividade a que o trabalhador se obriga.

(...)

Esta última ideia tem implícita a relação entre os conceitos de posto de trabalho e categoria.

(...) NUNES DE CARVALHO propõe a seguinte noção: «O sentido juridicamente relevante do posto de trabalho corresponde, genericamente, a uma posição numa concreta organização, que é desenhada pelo titular desta e está sujeita às suas opções de gestão, posição que implica um certo conteúdo funcional, requer determinada qualificação profissional e/ou aptidão, envolve certos meios, equipamentos e riscos, pode ter associado um conjunto de condições de trabalho (designadamente em termos de esquema temporal da realização da prestação) e à qual o trabalhador é afecto pelo empregador no quadro da execução de um contrato de trabalho».

(...)

No contexto aqui relevante, julgamos que o conceito de posto de trabalho coincide com a função ou conjunto de tarefas localizado organizacionalmente - isto é, uma concreta organização produtiva, que é fruto do modo como o respectivo titular organiza e divide o trabalho necessário ao funcionamento da mesma - de cuja execução é encarregado o trabalhador.”

Ora, a ser assim, como é, afigura-se-nos que um mesmo trabalhador pode ocupar diferentes postos de trabalho.

E, no caso em análise, afigura-se-nos que foi isso que aconteceu. Efectivamente, o A., no desenvolvimento da relação de trabalho “tocava dois instrumentos” completamente distintos: por um lado, era o técnico de qualidade da R., executando todo um conjunto e tarefas que se prendiam com a qualidade, higiene e segurança alimentar (e onde poderíamos, ainda, integrar as tarefas relativas ao armazenamento dos bens, aquando da sua recepção e distribuição, altura em que poderia proceder aos rastreio da sua qualidade); por outro lado, e numa actividade totalmente autonomizada daquela outra, diligenciava pelos contactos com os fornecedores (para além dos realizados no âmbito das reclamações da qualidade dos produtos); recepção dos catálogos com os preços, sua comparação e proposta a quem tinha poder de decisão; realizava as encomendas conforme listas elaborados pelos chefes de cada um dos sectores da R. (pastelaria, cozinha e, também, logística).

Em bom rigor, cada uma daquelas funções podiam ser desempenhadas por duas pessoas diferentes, certo sendo que delas estava incumbido o A., concentrando-as, assim, numa única pessoa: a sua pessoa.

Por esta razão, entendemos que, em bom rigor, o A., na organização da empresa R., ocupa dois postos de trabalho. Isto mesmo que se entenda, como entendemos, que “A categoria profissional a considerar, para este efeito, é a categoria interna ou normativa e não a categoria funcional” (neste sentido. V. Ac. da Rel. de Lisboa, de 25/10/2017 - Dr.a Filomena Manso).

Todavia, todo o processo de despedimento por extinção do posto de trabalho tem por objecto a actividade desenvolvida por aquele enquanto Técnico de Qualidade.

Independentemente, do conteúdo vago ou genérico das expressões aí utilizadas, é patente que todo o despedimento assenta na desnecessidade do trabalho do A., na organização da empresa, enquanto técnico de qualidade e funções a ele associadas.

Nenhuma palavra é dita quanto à outra actividade ou função por si desenvolvida no seio da R. por incumbência dos seus gestores (superiores hierárquicos).

(…)

Assim, não abrangendo a decisão de despedimento também este conteúdo funcional que, no seio da organização da R., corresponde a um posto de trabalho (aliás, o posto de trabalho predominante, uma vez que, com as tarefas de qualidade, o A. não despenderia mais do duas horas por dia, na sua realização, num conjunto de oito horas de trabalho diário contratado), estamos em crer que a R. ao pôr termo à relação laboral que a unia ao A., violou o disposto naqueles art. 367°, n.° 1, e art. 368°, n.° 1, b), do CT.

A idêntica conclusão chegaríamos mesmo que entendêssemos que o A ocupava um posto de trabalho único embora com um conteúdo funcional complexo. De facto, a R., como se disse, não menciona uma única vez as funções que o A. desempenhava para além daquelas que lhe incumbia no âmbito profissional de Técnico de Qualidade.

(…)

Se dúvidas houvesse, elas seriam dissipadas pelo articulado motivador, que ilustra a desnecessidade da manutenção do posto de trabalho do A. na externalização das mesmas: agora desempenhadas por duas empresas da área do controlo de qualidade e segurança alimentar e controlo analítico, auxiliadas no dia a dia pelos funcionários de cada um dos departamentos e secções da R.

Concluindo, nenhuma análise é feita quanto à necessidade do A. e do seu posto de trabalha na perspectiva daquelas outras funções alheias às de um técnico de qualidade.

Não sendo feita essa análise, não podia a R. concluir como concluiu pela extinção do posto de trabalho do A.

Aliás, por falta de suporte factual, nunca seria possível à mesma afirmar a impossibilidade de manutenção do vínculo laboral.

Não tendo sido feita qualquer referência a estas outras actividades que se compreendem num posto de trabalho autónomo, também ocupado pelo A., ou, se se quiser, que compreendem parte (a maior parte) do conteúdo funcional complexo do posto de trabalho do A., não foram realizadas, pela R., as comunicações a que alude o art. 369°, n° 1, a) e b), do CT, quando manda comunicar ao trabalhador e às entidades representativas do trabalhador:

A necessidade de extinguir o posto de trabalho, indicando os motivos justificativos e a secção ou unidade equivalente a que respeita;

A necessidade de despedir o trabalhador afecto ao posto de trabalho a extinguir e a sua categoria profissional.

De facto, a omissão àquelas outras funções, adultera a verdade dos factos, não permitindo quer àquelas instâncias, quer ao trabalhador, proceder à sua avaliação e sindicância.

Veja-se, aliás, que a falta de referência àquelas actividades fez com que a ACT sobre elas não tomasse posição. De facto, da análise do parecer da ACT verificamos que toda a questão foi analisada na perspectiva de que o A. era apenas e só técnico de qualidade e que as funções que lhe estavam confiadas estavam relacionadas com essa qualidade, e que agora seriam desenvolvidas por empresas terceiras, externas.

Tudo visto, estamos em crer que o despedimento do A. promovido pela R., por extinção do posto de trabalho, é ilícito, nos termos do disposto no art. 386°, n. 1, a), c) e d), do CT.

Subscreve-se o entendimento vertido na sentença recorrida, pelo que sempre seria de concluir, também por aqui, pela ilicitude do despedimento. Ilicitude esta com as consequências decorrentes do art.º 389.º do Código do Trabalho (“1- Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado: a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais; b) Na reintegração do trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, salvo nos casos previstos nos artigos 391.° e 392.°”).

Tendo o autor optado pela reintegração deve a ré reintegrá-lo na empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade. Devendo referir-se que o propugnado pela ré, em termos subsidiários, a propósito desta matéria, porque não foi suscitado oportunamente, em fase dos articulados (a ré opôs-se à reintegração – fls. 37 verso), não pode agora ser apreciado por se traduzir em questão nova que a este tribunal de recurso não cabe conhecer (os recursos para a 2.ª instância, por regra, visam apenas a reapreciação das decisões tomadas na 1ª instância, como aliás se retira do art.º 627.º n.º 1, do CPC, e também esclarece Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, 2.ª Ed., LEX, 1997, a pág. 395).

Para além do exposto, como decorre do art.º 390.º do CT, assiste ainda direito ao autor a receber às chamadas retribuições intercalares, tendo em conta retribuição base efectivamente por si auferida. Deduzindo-se dessas retribuições os valores recebidos; as verbas a que aludem as alíneas a) a c) do referido dispositivo legal, conforme também mencionado na sentença recorrida.Improcede, assim, igualmente a presente questão.

4.5.Do abuso de direito do autor

Sustenta a ré que o autor ao receber os valores decorrentes do despedimento sem os contestar, assumiu uma posição de aceitação do despedimento (pelo menos aparente) que gerou na Ré a confiança de que a situação estaria resolvida face à aceitação do A. dos valores pagos, sendo que afinal havia dado entrada da impugnação do despedimento, frustrando na R. a confiança gerada, o que o faz incorrer em má-fé por abuso de direito.

Nos termos do art.º 334.º do Código Civil:

“É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
O abuso do direito visa impedir actuações não razoáveis, imponderadas e, na responsabilidade contratual, exige que as partes, na execução do contrato, se conduzam pelo princípio da boa-fé, cumprindo e estimulando o cumprimento por banda da parte contrária.
O instituto funciona também como válvula de escape do sistema, por forma a que nas situações em que a aplicação de uma norma conduza a resultados não razoáveis relativamente aos valores vigentes na ordem jurídica, se possa impedir o seu funcionamento. Nesses casos se o legislador tivesse previsto o resultado a que a norma conduziu, ter-se-ia abstido de a editar, dados os clamorosos resultados decorrentes da sua aplicação. A figura do abuso de direito cobre ainda as situações em que o sujeito adopta determinada conduta baseada no direito, mas simultaneamente adopta outra conduta, contraditória com a primeira, reveladora de que a invocação e aplicação da lei visou valores não condizentes com os estabelecidos pela ordem jurídica, vulgarmente designado como venire contra factum proprium. Tendo sido adoptada na referida norma a tese objectiva não é necessária a invocação e a prova da consciência e intenção de exceder os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito (Vd., o Ac. do STJ de 30.03.2006 proc. 3921/05, 4.ª Secção).
Ora, no presente caso, se é facto que o autor recebeu as verbas que a ré lhe disponibilizou a titulo de compensação pelo despedimento por extinção do posto de trabalho e demais verbas decorrentes da cessação do contrato, tendo o autor previamente impugnado o despedimento  também é certo, consoante acima se frisou, serem tais valores inferiores aos que o autor tinha direito a receber, o que a ré não podia ignorar, visto ao longo do tempo ter declarado  valores abaixo dos que, na realidade, o autor auferia.

Nesse contexto, de manifesto incumprimento por banda da ré, e de natural e pressuposta necessidade do autor, tal recebimento não podia legitimamente levar a ré a “confiar” que o autor não colocaria (jamais) em causa o despedimento (ilícito) de que foi alvo, com óbvio prejuízo dos seus direitos. Termos em que improcede, sem mais, a presente questão.

4.6.Da indemnização por danos não patrimoniais

Quanto a esta questão, a sentença recorrida fixou a indemnização pelo aludidos danos não patrimoniais em 3.500,00 euros, a ré pretende se fixe a mesma em 500,00 euros.

Verificando-se, no presente caso, os requisitos da obrigação de indemnizar  (art.º 483.º do Código Civil) e tendo em conta o disposto no art.º 496.º do mesmo diploma, à luz do que vem sendo o entendimento jurisprudencial sobe esta matéria (Vg. Ac. do STJ de 22.02.2017, 5808/12.TALM.L1.S1), subscrevendo-se, no essencial, as considerações vertidas na sentença, onde se fez constar “ … no presente caso, o A. tem dois filhos e vive maritalmente, sendo que a companheira se encontra desempregada. Aquando do despedimento, o salário do A. era a única fonte de rendimento do agregado familiar, para além do subsídio de desemprego da sua companheira. Assim, estamos em crer que no caso em análise, face à circunstância em que se encontrava o A. e todo o seu agregado familiar, os danos provocados pela R. no A. revestem gravidade suficiente para merecer a tutela do Direito”.

Deste modo, ponderando todo o apontado quadro circunstancial, a duração do contrato e a situação laboral do autor, considera-se justo e adequado fixar a indemnização a título de danos não patrimoniais em 2.500,00 euros (dois mil e quinhentos euros) procedendo, em parte, a presente questão.

5.–Decisão

Em face do exposto concede-se parcial provimento ao recurso na sua vertente da impugnação da matéria de facto.

Concede-se parcial provimento ao recurso na sua vertente jurídica, condenando-se a ré a pagar ao autor, a título de indemnização por danos não patrimoniais,  na quantia de euros 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros).

Mantem-se no mais a sentença recorrida.

Custas pela ré e pelo autor na proporção.



Lisboa, 2019.12.18



Albertina Pereira
Leopoldo Soares
Eduardo Sapateiro