Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ONDINA CARMO ALVES | ||
Descritores: | CONTRATO DE GESTÃO RESPONSABILIDADE DO INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/06/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | 1.–Nos termos do n.º 1 do artigo 289.º do Código dos Valores Mobiliários que são actividades de intermediação financeira: a) Os serviços de investimento em valores mobiliários; b) Os serviços auxiliares dos serviços de investimento; c) A gestão de instituições de investimento colectivo e o exercício das funções de depositário dos valores mobiliários que integram o património dessas instituições. 2.–Os serviços de investimento compreendem: a) A recepção e a transmissão de ordens por conta de outrem; b) A execução de ordens por conta de outrem; c) A gestão de carteiras por conta de outrem; d) A colocação em ofertas públicas de distribuição. 3.–O contrato de gestão de carteiras é o contrato pelo qual um intermediário financeiro – o gestor – se obriga perante o cliente a administrar um portfolio de activos financeiros que este último é titular com o objectivo de incrementar a sua rentabilidade, em troca de uma remuneração paga pelo segundo ao primeiro. 4.–Os serviços auxiliares de actividades de investimento englobam, nomeadamente, contratos de assistência, contratos de recolha de intenções de investimento, contratos para registo e depósito, contratos de empréstimo, contratos de consultadoria empresarial e contratos de análise financeira; 5.–O contrato de recolha de intenções de investimento reconduz-se ao negócio pelo qual se visa determinar a viabilidade – sucesso ou insucesso – de determinada oferta pública de distribuição de valores mobiliários. 9.–O investimento no capital de risco (private equity) pode ser efectuado por duas vias, directa ou indirecta. Na primeira não há necessidade de intermediação e os investidores aplicam directamente o capital na empresa visada. O investimento directo contém os contributos principais das Sociedades de Capital de Risco (private equity firms) e dos business angels. É um sector igualmente importante do mercado informal a par com o venture capital num estádio primórdio de capital semente. Ao invés, a via indirecta determina o estabelecimento de uma relação de intermediação entre os investidores institucionais e as empresas a investir, através de fundos de investimento de capital de risco. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.
I.–RELATÓRIO:
ABEL .. E ISABEL ..., residentes na Rua Pinhal Chantre 277, em Leça do Balio, intentaram, por apenso ao processo de liquidação do Banco Privado Português, SA, a presente acção declarativa de condenação, contra: e, formularam os seguintes pedidos:
Subsidiariamente (por efeito da coligação contratos), formulam ainda os seguintes pedidos: Fundamentaram os autores a sua pretensão, essencialmente, da forma seguinte:
Citados, contestaram, por impugnação, os réus, Privado Holding, SGPS, SA, BPP, SA em liquidação e Massa Insolvente do BPP, SA, o BPP Cayman e o Estado Português, e por excepção, os três primeiros réus, peticionando se julgue procedente a excepção dilatória de incompetência material, absolvendo-se os réus da instância. Invocaram ainda os três primeiros réus, a excepção peremptória de prescrição da alegada responsabilidade civil, do BPP, SA na violação do contrato de gestão de carteira, pois, os autores tomaram conhecimento da conclusão do negócio e respectivos termos, pelo menos na data em que foi revogada a licença bancária do BPP, SA.. O BPP Cayman deduziu pedido reconvencional, peticionando a condenação dos autores no pagamento da quantia de €275.384,90, acrescida de juros calculados à taxa contratual, até integral e efetivo pagamento. Os autores responderam às excepções invocadas pelos réus e ampliaram os pedidos inicialmente formulados, peticionando a procedência de abuso de direito da constituição do penhor efectuado pelo BPP, SA ou pelo BPP Cayman a favor do Estado Português, até à concorrência dos créditos dos autores com o 1º réu. Contestaram ainda o pedido reconvencional formulado pelo BPP Cayman, peticionando a improcedência do mesmo. O BPP, SA e a Massa Insolvente requereram a declaração de nulidade parcial da réplica, e subsidiariamente impugnaram a resposta dos AA. às excepções e peticionaram o indeferimento liminar da alegada ampliação do pedido por tal pretensão se encontrar formulada em termos ininteligíveis. O Estado Português apresentou tréplica, na qual peticionou a declaração de nulidade parcial da réplica e a total improcedência no despacho saneador, do pedido contido na ampliação formulada pelos autores, com a absolvição do Estado do mesmo. Foi levada a efeito a audiência prévia, em 28.05.2014, na qual foi proferido o despacho saneador, conhecidas as excepções invocadas pelos réus e, Foi ainda, na audiência prévia, identificado o objecto do litígio e enunciados os Temas da Prova. Na sequência dos despachos proferidos na audiência prévia, os autos prosseguiram apenas contra: 1º.–MASSA INSOLVENTE DO BPP, S.A., 2º.–BPP CAYMAN LTD. 3º.–CREDORES DO INSOLVENTE BPP, SA., para conhecimento dos seguintes pedidos principais: a)- A declaração do incumprimento definitivo do contrato de gestão celebrado entre o 1º A marido e a 1ª R, a que se refere o documento 2 da pi, com referência aos dois momentos de aquisição das ações BCP (que serão contemporâneos das datas de 19.03.2007 e 27.02.2008) e ainda com referência à data da contração do financiamento ilícito junto do J P Morgan e ainda da cobrança ilícita de comissões por parte da 1ª R; b)-A condenação da 1ª R no pagamento aos AA dos danos por estes sofridos que se quantificam em €: 400.000,00, acrescido dos juros remuneratórios e moratórios, imposto de selo e outros encargos suportados com os dois financiamentos contraídos para os fins do contrato de gestão; e dos seguintes pedidos subsidiários (por efeito da coligação contratos): a)-A declaração do incumprimento definitivo do contrato de gestão celebrado entre o 1º A marido e a 1ª R, a que se refere o documento 2 da pi, com referência ao segundo momento de aquisição das ações BCP (contemporâneo da data de 27.02.2008) e ainda com referência à data da contração do financiamento ilícito junto do J P Morgan e ainda da cobrança ilícita de comissões por parte da 1ª R; b)-A condenação da 1ª R no pagamento aos AA os danos por estes sofridos que, neste momento, se quantificam em € 200.000,00, acrescido dos juros remuneratórios e moratórios, imposto de selo e outros encargos suportados com o segundo financiamento contraído para os fins do contrato de gestão; c)-A declaração da coligação entre o contrato de gestão celebrado entre a 1ª R e o A marido e o contrato de abertura de crédito com penhor celebrado entre a 3ª R e os AA e em consequência fazer repercutir na esfera jurídica da 3ª R a obrigação de indemnizar da 1ª R, por força do incumprimento do contrato de gestão. Foi levada a efeito a audiência de discussão e julgamento, em 18.09.2015, 13.10.2015, 14.10.2015 e 30.10.2015, após o que o Tribunal a quo proferiu decisão, em 21.12.2015, constando do Dispositivo da Sentença, o seguinte: Pelo exposto, julgando improcedente por não provada a presente ação intentada por Abel .. e Isabel ... contra a Massa Insolvente do BPP, S.A., o Banco Privado Português Cayman Ltd. e os credores do insolvente BPP, SA, absolvo os RR. do pedido. (…) Inconformados com o assim decidido, os autores interpuseram recurso de apelação, em 08.01.2016, relativamente à sentença prolatada. São as seguintes as CONCLUSÕES dos recorrentes: Pedem, por isso, os apelantes, que o recurso seja julgado procedente, revogando-se a sentença e julgando-se procedente a acção, com a condenação dos recorridos nos pedidos formulados pelos recorrentes, ou, caso assim não se entenda, relegando-se a liquidação dos prejuízos por estes sofridos para liquidação posterior. Os réus BANCO PRIVADO PORTUGUÊS, S.A.—EM LIQUIDAÇÃO ("BPP, SA") E MASSA INSOLVENTE DO BANCO PRIVADO PORTUGUÊS, S.A. ("MASSA INSOLVENTE"), apresentaram contra-alegações, em 29.01.2016, propugnando pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida e, formularam as seguintes CONCLUSÕES:
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II.–ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO. Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação dos recorrentes que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente,apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. Assim, e face ao teor das conclusões formuladas a solução a alcançar pressupõe a análise das seguintes questões: –DA VERIFICAÇÃO DE ERRO DE JULGAMENTO NA SUBSUNÇÃO JURÍDICA ADUZIDA, TENDO EM CONSIDERAÇÃO OS FACTOS APURADOS. O que implica a análise: a)–DA ACTIVIDADE DE INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA. - Os contratos de ordens para a realização de operações sobre instrumentos financeiros; os contratos de colocação; os contratos de gestão de carteiras e os contratos auxiliares de actividades de investimento. b)–O INVESTIMENTO EM CAPITAL DE RISCO. - Os produtos de private equity c)–DOS DEVERES DE INFORMAÇÃO DOS INTERMEDIÁRIOS FINANCEIROS - O investidor não qualificado e o investidor qualificado d)–DOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTES DA ACTUAÇÃO DO BPP, S.A. III.–FUNDAMENTAÇÃO.
“O Cliente confere ainda ao Banco os poderes necessários para, por sua conta e de forma discricionária: (…) h)–realizar operações de alavancagem, ou seja, adquirir para as carteiras ativos financeiros que representem um valor superior ao valor entregue para depósito/gestão, o qual deverá ser financiado. (…)”.
“Mediante aceitação das presentes condições especiais, o cliente confirma a adesão à estratégia em referência, a qual se rege pelas condições infra: Data de Início: 19.03.2007; Montante: € 200.0000,00; Data de vencimento: 19.Março.2010 O Privado Financeiras é um veículo de investimento fechado. O vencimento ocorrerá três anos decorridos desde a Data de Início, com possibilidade de prorrogação por mais dois anos por decisão do gestor. (…) O Privado Financeiras é um Veículo de Investimento em ações cotadas de instituições financeiras, cujo investimento será concentrado num número reduzido de participações. Não se espera que os investimentos confiram ao veículo representatividade nos órgãos das sociedades em que irá investir. O investimento é feito através da aquisição de ações de uma holding belga que por sua vez deterá as ações das empresas financeiras. A carteira será gerida numa perspetiva de avaliação fundamental das empresas financeiras, procurando investir em empresas que sejam consideradas subavaliadas, operacionalmente bem geridas e potenciais candidatas a operações de aquisição. Geograficamente o portfolio estará, pelo menos numa fase inicial, concentrado exclusivamente na Europa. A política de gestão do veículo deverá resultar numa estratégia que envolverá relativamente pouco trading de curto prazo nas ações adquiridas, sem prejuízo de, em determinadas condições, se poderem realizar algumas operações com um horizonte temporal curto. (…) As comissões de comissionamento aplicáveis são as que constam do preçário em vigor. O veículo suportará, direta ou indiretamente, quaisquer encargos que sejam devidos no âmbito do seu funcionamento e/ou ativos que venha a integrar, nomeadamente comissões de estruturação, comissões de gestão, performance fees e demais custos e encargos. (…) O cliente declara aceitar o crédito o montante máximo de € 200.000,00 (duzentos mil euros) que lhe foi concedido nesta data pelo Banco Privado Português, SA sob a forma de uma autorização a descoberto na conta de depósitos à ordem n.º 9513 aberta em seu nome junto do referido Banco, o qual se rege pelos seguintes termos e condições: -O crédito será utilizado única e exclusivamente para participação no investimento supra referido. (…) -para garantia do pontual e integral cumprimento de todas as obrigações assumidas é (i) constituído penhor sobre as ações da Zenith SGPS, SA … registadas na conta nº 6543, junto do Banco Privado Português e (ii) consignado a favor do Banco todo e qualquer montante que o cliente venha a receber pelo desinvestimento efetuado na Zenith SGPS SA até que se mostrem integralmente liquidadas todas as obrigações pecuniárias decorrentes do crédito concedido” (…) A carteira de ativos, poderá sofrer desvalorizações face a variações anormais imprevisíveis dos mercados em que sejam negociados os valores mobiliários e instrumentos financeiros que integram a mesma. As rentabilidades obtidas no passado não constituem garantia de obtenção de rentabilidades no futuro. Concedo/emos deste modo ao Banco autorização para em meu/nosso nome e representação aplicar o montante acima indicado nesta estratégia, praticando todos os atos necessários ao processo de subscrição/compra e venda/ resgate dos ativos que lhes estão associados”.
“Data de Início: 19/03/2007; Montante: € 200.0000,00; Data de vencimento: três anos decorridos desde a Data de Início, com possibilidade de prorrogação por mais dois anos por decisão do gestor. Liquidez:Veículo fechado. Existe a possibilidade de desinvestimentos parciais intermédios, sujeitos à política de gestão do veículo. Comissão de Gestão: 1,5% ao ano, calculada em função do valor dos ativos e cobrada ao Veículo Comissão de performance: 20% da performance obtida acima do equivalente a 10% ao ano, apurada e cobrada ao Veículo em qualquer desinvestimento intermédio ou na liquidação do veículo. Comissão de montagem: 0,50% cobrado ao Veículo, sobre o capital (próprio e alheio) aportado. Garantia de capital: O capital investido não é garantido. Perfil de risco: Elevado”
“Esta apresentação foi elaborada com um objetivo meramente informativo. Na entrega do presente documento, o Banco Privado Português não assume qualquer obrigação de prestar informação adicional sobre a operação como sobre as entidades envolvidas. Este documento não constitui qualquer forma de compromisso ou recomendação da parte do Banco Privado quanto à operação. O Banco Privado não assume qualquer responsabilidade pela exatidão da informação apresentada neste documento. As empresas mencionadas são representativas do setor e universo de empresas podendo ou não fazer parte da carteira do veículo de investimento.” (…) “Estratégia de Investimento: O veículo a criar terá por base uma estratégia de investimento assente nos seguintes pilares: • Procurar exposição ao risco do negócio financeiro. • Minimizar o risco de gestão, através da diversificação do portfolio (embora limitada), sem procurar, obter posições de referência no capital das empresas. (…) Ficha Técnica do Veículo: Tipo de empresas: cotadas Comissão de gestão: 1,50% ao ano Comissão de montagem: 0,50% Comissão de performance: 20% das mais valias geradas em cada investimento (10% de hurdle) Endividamento: A estruturar” (…). ---
“Cláusula 1ª: “1.-O Banco concede, na presente data, ao segundo contraente, que aceita, um crédito até ao limite máximo de Eur. 200.000,00 (duzentos mil euros).” (…) 5.-O crédito concedido ao abrigo do presente contrato destina-se a qualquer finalidade desde que previamente autorizada pelo Banco. (…) Cláusula 2ª “A abertura de crédito em conta corrente terá a forma de uma conta aberta em nome dos segundos contraentes, com o número 1636.” (…).
“Considerando que: A. Nesta data, O Banco (identificação dada no documento ao BPP Cayman) e os segundos outorgantes celebraram um contrato de abertura de crédito sob a forma de conta corrente, segundo o qual o Banco concedeu aos segundos contraentes um financiamento até ao montante máximo de € 200.000,00 (duzentos mil euros); (…) Cláusula 1ª (objeto) 1. Em garantia do integral e tempestivo cumprimento de todas as obrigações assumidas pelos segundos contraentes, perante o Banco, ao abrigo do mencionado contrato (…) os garantes constituem, nesta data, a favor do Banco, nos termos dos artigos 624.º e 626.º do Código Civil, penhor sobre o saldo e todos os ativos financeiros que integram as carteiras (adiante designadas abreviadamente por “carteiras”) compostas pelos ativos que estão ou venham a estar depositados/registados nas contas números 10332 e 13238 abertas, junto do BPP pelos garantes (…).”
“Cláusula 1.º (objeto) 1 – É expressamente modificado o Considerando A e a cláusula 1ª do Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente que passa a ter a seguinte redação: a)-Banco Privado Português S.A., b)-Banco Privado Português (Cayman), Ltd.,
“Desde março de 2007 o setor bancário tem tido um comportamento bastante negativo devido à crise no mercado do crédito e aos problemas de liquidez. (…) Contexto europeu Desde março de 2007 o Santander caiu 14%, o BCP 25%, o Barcklays 40% e a UBS 42% (…) Contexto nacional Desde março de 2007 o BES caiu 16%, o BCP 25% e o BPI 48%. (…) A Privado Financeiras pretende realizar um aumento de capital no montante de € 100 milhões tendo como principais objetivos: 1 – Aproveitar o preço da ação do BCP (atual e previsto após a apresentação de resultados de 2007 no próximo dia 19 de fevereiro) para aumentar a participação da privado financeiras no capital do BCP reduzindo o preço médio de aquisição, de forma a aumentar o potencial de retorno do investimento; 2 – Tirar partido de um eventual aumento de capital no próprio BCP, que permita à privado Financeiras evitar a diluição e reforçar a participação (…) Aumentar a influência e o poder de ação da Privado Financeiras (via banco Privado) entre os restantes acionistas do BPP. (…) Nota – Os valores de rentabilidade esperada são indicativos, uma vez que consideram uma série de pressupostos, entre outros: a Privado Financeiras reforça até 4% do capital do BCP a um preço médio de € 2,00, mantêm-se as condições de financiamento negociadas, etc. (…) Ficha Técnica indicativa: Ativo subjacente: ações Endividamento: veículo alavancado 1rst closing: € 100 milhões em março de 2007 2nd closing: aumento de capital em 100 milhões Emissão: € 0,30 por ação (valor nominal de € 1,00) Comissão de montagem: isenção de comissão de montagem Comissão de gestão: 1,50% ao ano Comissão de performance: 20% das mais valias (10% de hurdle) Nota: O NAV após o registo do aumento de capital poderá ser superior ou inferior ao preço de emissão” (…). ---
“Privado Financeiras Criado em março de 2007, o veículo Privado Financeiras tem por objetivo realizar investimentos no setor financeiro. O veículo angariou, junto de um conjunto de investidores, € 100 milhões de capital. posteriormente e após a decisão de tomada de uma participação de refrência no capital do Millenium BCP, foi negociado junto do Banco JP Morgan um financiamento via Equity Swap de até € 200 milhões. Com estes recursos foi possível adquirir 2,4% o capital do Millenium BCP. A Privado Financeiras detinha todos os direitos económicos sobre as ações do Millenium BCP detidas via o Equity Swap, mas a propriedade legal sobre as mesmas era do JP Morgan, detendo, entre outros, o direito de voto. O JP Morgan concedeu, sempre que solicitado, procuração à Privado Financeiras para votar nas Assembleias Gerais o Millenium BCP. No entanto, foi decidido converter o Equity Swap em contrato de crédito (Nonrecourse Equity Financing), também com o JP Mogan, mantendo a Privado Financeiras todas as condições económicas negociadas no âmbito do Equity Swap, mas passando a deter a propriedade plena das ações do Millenium BCP. Esta operação de liquidação física do Equity Swap, celebrado com o JP Morgan através da conversão do mesmo num contrato de crédito com penhor de ações, foi comunicada ao mercado no dia 30 de novembro, assim como o facto da participação detida no capital do Millenium BCP ser nesta data de 2,3%” (…).
a)-as ações do BES desvalorizaram 79,85%; b)-as ações do BPI desvalorizaram 77,82%; c)-as ações do BCP desvalorizaram 76,70%; d)-as ações do Bankinter desvalorizaram 92,70%; e)-as ações do Sabadell desvalorizaram 91,34%.
B–FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO. a)-DA ACTIVIDADE DE INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA. -Os contratos de ordens para a realização de operações sobre instrumentos financeiros; os contratos de colocação; os contratos de gestão de carteiras e os contratos auxiliares de actividades de investimento. A intermediação financeira, segundo JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, Os Contratos de Intermediação Financeira, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Vol.LXXV, 280, designa o conjunto de actividades destinadas a mediar o encontro entre oferta e procura no mercado de capitais, assegurando o seu regular e eficaz funcionamento. São, pois, contratos de intermediação financeira, os negócios jurídicos celebrados entre um intermediário financeiro e um cliente (investidor) relativos à prestação de actividades de intermediação financeira. E, as designadas actividades de intermediação financeira encontram-se previstas do artigo 289º, nº 1 do CVM, dividindo-se em três tipos fundamentais: i)-Os serviços e actividades de investimento em instrumentos financeiros - alínea a) - que englobam contratos relativos a ordens para realização de operações sobre investimentos, contratos de colocação, contratos de gestão de carteira e contratos de consultadoria para investimento (v. também artigo 290º do CVM); ii)-Os serviços auxiliares de serviços e actividades de investimento - alínea b) – que englobam contratos de assistência, contratos de recolha de intenções de investimento, contratos para registo e depósito, contratos de empréstimo, contratos de consultadoria empresarial e contratos de análise financeira (v. também artigo 291º do CVM); iii)-A gestão de instituições de investimento colectivo, incluindo o exercício de funções de depositário dos respectivos valores - alínea c) -. O Código dos Valores Mobiliários não define intermediação financeira, mas afirma quem são os intermediários financeiros e quais os serviços e atividades de investimento. O artigo 289º, nº 1, a), do CVM estabelece que são atividades de intermediação financeira os serviços e atividades de investimento em instrumentos financeiros. Por sua vez, intermediários são, nos termos do artigo 293º, nº 1, a), do mesmo diploma, as instituições de crédito (e as empresas de investimento) que estejam autorizadas a exercer actividades de intermediação financeira em Portugal. Finalmente, são serviços e actividades de investimento em instrumentos financeiros, segundo o artigo 290º, nº 1, a) e b), do mesmo código, a recepção e a transmissão de ordens por conta de outrem, bem como a execução de ordens por conta de outrem. A actividade de intermediação financeira é passível de ser exercida pelos bancos como resulta previsto nos artigos 4º/1 als e), f), h), i) e r) e 199º-A do Decreto-Lei 298/92 de 31 de Dezembro (Regime Geral das Instituições de Crédito) e dos artigos 289º e 293º do Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei nº 486/99 de 13/11. Os contratos de intermediação financeira encontram-se autonomamente previstos e regulados nos artigos 321º a 343º do CVM. Os aludidos contratos de intermediação financeira têm como objecto mediato valores mobiliários (acções, obrigações, unidades de participação, entre outros), mas também instrumentos monetários, tais como bilhetes do tesouro, papel comercial, obrigações de caixa e também instrumentos derivados, entre eles, futuros, opções, swaps. Reconduzem-se, os contratos de intermediação financeira, a negócios jurídicos celebrados entre um intermediário financeiro e um cliente (investidor) relativos à prestação de actividades de intermediação financeira e pressupõem a existência de um negócio antecedente – designado normalmente como negócio de cobertura – que serve de base à subscrição ou transacção de valores mobiliários, assumindo-se estas operações como negócios de execução da relação de cobertura. Os negócios jurídicos de cobertura, celebrados entre intermediário e cliente, têm por objecto conceder àquele os poderes necessários para celebrar negócios de execução. Mas estes são celebrados igualmente entre o intermediário e um terceiro por conta do cliente, e têm por objecto a aquisição, a alienação ou outros negócios sobre instrumentos financeiros. Assim, e no que concerne à sua natureza jurídica, segundo JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, ob. cit. 289, o negócio jurídico de cobertura traduz-se num contrato de comissão, regido pelas normas do CVM; enquanto que para CARLOS FERREIRA DE ALMEIDA, As Transacções de Conta Alheia no Âmbito da Intermediação no Mercado de Valores Mobiliários, Direitos dos Valores Mobiliários. 296-303, trata-se de um contrato de mandato. Pode considerar-se, em suma, que os contratos de investimento têm como escopo a prestação de serviços na área do investimento em instrumentos financeiros, à luz do artigo 290.º do CVM, e incluindo-se os seguintes subtipos: O contrato de ordens para a realização de operações sobre instrumentos financeiros, segundo JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, ob. cit, 288, consiste em declarações negociais com o objectivo de celebrar contratos que podem ser de comissão, mandato ou mediação, entre um intermediário financeiro legalmente habilitado e um cliente. A execução das ordens que o intermediário recebe a partir do seu cliente que pretende investir, não só constitui o elemento fundamental para o funcionamento de todo o mecanismo legal e financeiro, como pode ser efectuada de duas formas: ou por conta alheia do cliente, com base no artigo 290.º, n.º 1, a) e b) do CVM, ou por conta própria tornando-se na contraparte, nos termos dos artigos 290.º, n.º 1, e) e 346.º do CVM. Se a execução for efectuada por conta alheia do cliente, pode-se falar de negócios de cobertura e negócios de execução, em que, no primeiro caso, o negócio é celebrado entre o intermediário e o cliente para que aquele possa celebrar os negócios de execução. Os aspectos mais relevantes nesse tipo de contrato residem na possibilidade de as ordens poderem ser transmitidas por via oral ou de forma escrita, nos termos do artigo 327.º, n.º 1 do CVM; a existência de um dever de aceitação, por parte do intermediário, das ordens recebidas, não obstante ter ainda o dever de recusar segundo os trâmites do artigo 326.º do CVM; a possibilidade de o cliente poder revogar ou modificar as ordens dadas por si, segundo as regras prescritas pelo art. 329.º do CVM; a existência de uma “obrigação del credere”, em que o intermediário financeiro garante o cumprimento das obrigações assumidas, nos termos do artigo 334.º do CVM; e, por último, o cumprimento das ordens está balizada pelo princípio legal de execução das melhores condições, nos termos dos artigos 330.º a 333.º do CVM Nos contratos de colocação, o intermediário financeiro fica obrigado, perante o cliente, numa oferta pública de distribuição, a colocar específicos instrumentos financeiros. Dentro deste tipo contratual existem três modalidades: a colocação simples, a colocação com garantia, e a colocação com tomada firme. Na colocação simples, o intermediário financeiro apenas assume a obrigação de envidar os melhores esforços de forma a que os valores mobiliários sejam distribuídos, tratando-se apenas de uma obrigação de meios onde o intermediário não tem qualquer tipo de responsabilidade pelo resultado, e regulada pelo artigo 338.º, n.º 1 do CVM. Na colocação com garantia, regulada pelo artigo 340.º do CVM, para além da obrigação de meios da colocação simples, obriga-se a adquirir, para si ou para terceiro, parte ou mesmo a totalidade dos valores mobiliários que o público não tenha subscrito. Já na colocação com tomada firme, regulada pelo artigo 339.º, n.º 1 do CVM, o intermediário financeiro fica obrigado a subscrever e a adquirir os valores mobiliários para que, posteriormente, possa ser ele a colocá-los junto do público. Neste subtipo contratual, a colocação, pelo intermediário, é feita por sua própria conta e risco, nos termos acordados com o emitente. Ademais, obriga-se também a transferir para o último adquirente os direitos de molde patrimonial ligados aos valores mobiliários – v. JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, ob. cit., 293. O contrato de gestão de carteiras surge como um dos contratos nucleares e fundamentais dentro da intermediação financeira. Regulado pelos artigos 335.º e 336.º do CVM, é o contrato pelo qual um intermediário financeiro – o gestor – se obriga perante o cliente a administrar um património financeiro que este último é titular com o objectivo de incrementar a sua rentabilidade, em troca de uma remuneração paga pelo segundo ao primeiro. Com efeito verifica-se no artigo 335º do CVM uma aproximação à definição legal do contrato de Gestão de carteira, sob a perspectiva das obrigações assumidas pelo intermediário financeiro. Nos termos do artigo 332.º, n.º 1, alínea a) do CVM, a obrigação principal do intermediário financeiro, como gestor, é realizar todos os actos necessários com vista à valorização da carteira e, secundariamente, exercer os direitos inerentes aos valores mobiliários que integram a carteira. Aqui o intermediário financeiro obriga-se a gerir, da melhor forma possível, um portfolio de activos financeiros que o cliente, pelas mais variadas razões, se encontra impossibilitado de o fazer. Trata-se, pois, de um contrato de administração de interesses alheios, maxime, dos interesses do investidor. Este contrato encontra fundamento na complexidade técnica própria dos valores mobiliários, que justifica que a sua gestão seja objecto de delegação em profissionais competentes e informados, capazes de analisar um mercado de elevada complexidade, proporcionando a maior rentabilização do investimento efectuado. Resulta dos aspectos mais significativos do regime do contrato de gestão de carteiras que o mesmo deve ser celebrado por escrito, nos termos do artigo 321.º, n.º 1 do CVM, e deve ser celebrado entre um intermediário financeiro e um investidor, sendo este, por regra, não qualificado, e que tem um conjunto de activos financeiros que pretende ver valorizado. O contrato tem como objectivo desenvolver uma actividade de administração de bens alheios, com o intermediário financeiro a desenvolvê-la por conta e no interesse do cliente que, nos termos do artigo 335.º, n.º 1 do CVM, incide sobre uma “carteira individualizada de instrumentos financeiros”. Este contrato tem uma multiplicidade de direitos e deveres que ambas as partes devem respeitar, destacando-se o dever do gestor de uma execução diligente da gestão, nos termos do artigo 335.º, n.º 1 do CVM, sendo uma obrigação de meios; e, do lado do cliente, o dever de pagar a retribuição devida pelo serviço que o gestor presta – cfr. JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, ob. cit., 296-299, que qualifica este contrato como mandato mercantil que, regra geral, terá poderes de representação, actuando o intermediário em nome do cliente. Por outro lado, dentro dos serviços auxiliares de serviços e actividades de investimento, destacam-se os contratos de assistência e os contratos de recolha de intenções de investimentos. O Contrato de Assistência, de acordo com o artigo 337.º do CVM, consiste no negócio celebrado entre o intermediário e um oferente, onde se visa a prestação de serviços de índole técnica, económica e financeira, de molde a preparar, lançar e executar uma oferta pública de instrumentos financeiros. A celebração deste contrato é obrigatória sempre que se pretenda efectuar algum dos serviços constantes do artigo 337.º, n.º 2 do CVM. - Sobre esta figura contratual, vide, JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, ob. cit., 306 e segs. Por seu turno, o Contrato de Recolha de Intenções de Investimento, encontra-se regulado genericamente nos artigos 164.º e segs. do CVM, mas com densificação no artigo 342.º do CVM, o qual se reconduz ao negócio pelo qual se visa determinar a viabilidade – sucesso ou insucesso – de determinada oferta pública de distribuição de valores mobiliários. Essa recolha é efectuada através de sondagens no mercado sobre as intenções dos seus agentes na aquisição dos valores mobiliários em questão - Cfr., JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, ob. cit., 308 e, com mais detalhe, FÁTIMA GOMES, Contratos de Intermediação Financeira, Sumário Alargado, Estudos Dedicados ao Prof. Doutor Mário Júlio Almeida Costa, UCP Editora, Lisboa, 1ª Edição, 2002, 594-595 Segundo JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES estamos perante “(…) uma mera convenção acessória integrante de um contrato de assistência ou de colocação, cuja qualificação e regime jurídico são assim, em último termo, determinados remissivamente por estes últimos.”, ob. cit., 308. Já para FÁTIMA GOMES, ob. cit, 594, estamos perante apenas intenções de adesão e nunca propostas ou aceitações contratuais, sendo que esta recolha de intenções está enquadrada no contrato de assistência e colocação providenciado pelo intermediário financeiro, nos termos do artigo 337.º, n.º 2 do CVM, podendo o segundo contrato ser realizado pelo mesmo intermediário ou por outro diferente, em cumprimento do disposto dos artigos 338.º, n.º 2 e 341.º do CVM. Para esta autora, normalmente não existe um concreto contrato autónomo para a recolha destas informações, figurando como cláusula do contrato de assistência e colocação - ob.cit., 595. No caso vertente, face à matéria dada como provada e, não obstante o nomen juris atribuído aos acordos celebrados entre os autores e o BPP, dos seus termos não resulta que as partes hajam celebrado um contrato de gestão de carteiras, atentas as características subjacentes ao mesmo acima explanadas. No contrato aqui em causa, o BPP, enquanto intermediário financeiro não se obrigou perante os autores a administrar um património financeiro que estes eram titulares com o objectivo de incrementar a sua rentabilidade, em troca de uma remuneração paga pelo segundo ao primeiro. O BPP divulgou pelos seus clientes, incluindo os autores, clientes do BPP desde 1999 e investidores de diversos produtos financeiros comercializados pelo banco, uma apresentação “Veículo de Investimento no Setor Financeiro”, da qual consta que a mesma é apresentada com um objectivo meramente informativo, mais referindo que o documento apresentado não constituía qualquer forma de compromisso ou recomendação da parte do BPP quanto à operação, nem assumia qualquer responsabilidade pela exactidão da informação apresentada nesse documento, aí sendo efectuada uma descrição dos objectivos da criação do veículo de investimento Privado Financeiras – v. Nºs 7 da Fundamentação de Facto. Ora, sucede que os autores investiram nesse veículo de investimento, quer em 2007, quer em 2008 – v. Nºs 8 a 16 da Fundamentação de Facto. b)-O INVESTIMENTO EM CAPITAL DE RISCO. - Os produtos de private equity O investimento realizado pelos autores consubstancia um investimento em Private Equity ou capital de risco. O investimento no capital de risco pode ser efectuado por duas vias, directa ou indirecta. Na primeira não há necessidade de intermediação e os investidores aplicam directamente o capital na empresa visada. O investimento directo contém dois contributos principais das Sociedades de Capital de Risco (private equity firms) e dos business angels. É um sector igualmente importante do mercado informal, a par com o venture capital num estádio primórdio de capital semente. Ao invés, a via indirecta determina o estabelecimento de uma relação de intermediação entre os investidores institucionais e as empresas a investir, através de fundos de investimento de capital de risco. Os Fundos de Capital de Risco são veículos usados para alavancar o capital da empresa visada através de financiamentos dos investidores que variam consoante o seu tamanho e a sua especialização em diferentes tipos de investimento, seja em venture capital, seja em buy-outs, fundos fechados de tempo limitado, de longa duração e de termo certo. Os buyouts (compra do controlo accionista) são o motor das firmas de private equity e diferenciam-se do venture capital pelo foco em empresas estabelecidas (e/ou cotadas) no mercado em vez da actuação em empresas jovens (start-up). São estratégias usadas para a aquisição de uma empresa (target) através do financiamento de dívida e capital próprio providenciado pelas sociedades de private equity. A terminologia de leveraged (alavancagem) é associada às técnicas de financiamento de dívida, usuais na compra de sociedades abertas com a finalidade de a fechar ao mercado de capitais (public-to-private). No caso vertente, face ao que resulta da matéria apurada – v. Nºs 58 a 60 da Fundamentação de Facto – estamos perante investidores em capital de risco que se comportavam como accionistas da sociedade veículo. O regime jurídico do capital de risco em Portugal está regulado no Decreto-Lei nº 375/2007 de 8 de Novembro, que veio alterar a legislação reguladora da actividade previamente consagrada no Decreto-Lei nº 319/2002 de 28 de Dezembro, com o intuito de simplificar e flexibilizar a actividade de capital de risco. A nova legislação permite o exercício do investimento em CR através de veículos determinados, as Sociedades de Capital de Risco (SCR), os Fundos de Capital de Risco (FCR) e de Investidores em Capital de Risco (IRC ou business angels). O artigo 2º do identificado diploma legal considera investimento em capital de risco “a aquisição, por período de tempo limitado, de instrumentos de capital próprio e de instrumentos de capital alheio em sociedades com elevado potencial de desenvolvimento, como forma de beneficiar da respectiva valorização”, não incluindo uma divisão material entre private equity e venture capital, ou seja, no regime português, a terminologia capital de risco engloba todas as situações de investimento protagonizadas pelas duas figuras. Conforme deflui do artigo 290º do CVM e do nº 5 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 375/2007, no direito português o investimento em capital de risco não constituí actividade de intermediação financeira, o que não impede que algumas instituições financeiras exerçam licitamente tal função. Ora, entendeu o Tribunal a quo–e bem–que a situação aqui em apreciação, consistente na relação negocial entre o BPP, S.A. e os autores, se reconduzia a um contrato de recolha de intenções de investimentos, investimentos esses em produtos de private equity. Neste tipo contratual, nominado no artigo 342º do CVM, não estabelece a lei um regime jurídico específico, optando por remeter para a aplicação do regime do contrato de assistência e de colocação, com as adaptações que se tornem necessárias. Como refere FÁTIMA GOMES, ob. cit., 594, a recolha de intenções e investimento tem por finalidade apurar do sucesso de uma eventual oferta pública de distribuição (subscrição ou venda), sondando o mercado sobre as suas intenções de aquisição de valores mobiliários. A recolha de intenções de investimento pressupõe, nos termos do nº 2 do artigo 337º do CVM, a assistência de intermediário financeiro, podendo a colocação, no que respeita à recepção das intenções e apuramento do seu resultado, ser realizada pelo mesmo intermediário, como sucedeu no caso vertente. Resta-nos, então, apurar da eventual responsabilidade contratual da ré BPP, nesta vertente de actuação, de serviços auxiliares de actividades de investimento, posto que actuou como intermediário financeiro encarregado da assistência à oferta pública do aludido investimento em capital de risco. c)-DOS DEVERES DE INFORMAÇÃO DOS INTERMEDIÁRIOS FINANCEIROS - O investidor não qualificado e o investidor qualificado Os intermediários financeiros, enquanto entidades que exercem, a título profissional, actividades de intermediação financeira (artigo 289º do CVM) são também sujeitos a múltiplos deveres de informação, sejam deveres comuns (artigos 304º e 312º a 312º-G), sejam deveres específicos do serviço de investimento/auxiliar que em cada caso concreto esteja em causa (artigos 321º e seguintes do CVM, a propósito da disciplina dos vários contratos de intermediação, 346º e seguintes com respeito à negociação por conta própria e 252º e seguintes). Nos termos do CVM, constitui princípio geral que filtra e molda toda a actividade dos intermediários financeiros, a protecção dos legítimos interesses dos seus clientes, com observância dos ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de lealdade e transparência. A trave mestra dos deveres informativos comuns é a que resulta do artigo 312º nº 1 do CVM: o dever de prestação de toda a informação necessária para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, devendo a extensão e profundidade ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimento e experiência do cliente – v. sobre deveres de informação dos intermediários financeiros, PAULO CÂMARA, Manual dos Valores Mobiliários, 364 e segs, FAZENDA MARTINS, Deveres dos Intermediários Financeiros, em Especial os Deveres para com os Clientes e o Mercado, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, nº 7 e FELIPE CANABARRO TEIXEIRA, Os Deveres de Informação dos Intermediários Financeiros em relação a seus Clientes e sua Responsabilidade Civil, do Mercado de Valores Mobiliários, nº 31. Incumbe ainda ao intermediário financeiro o dever, previsto na sequência da Directiva dos Mercados e Instrumentos Financeiros - Directiva 2004/39/CE, de 21 de Abril (DMIF) - e que se extrai do disposto no artigo 314º nº 2 do CVM e no artigo 314º-A nºs 2 e 3, prevendo-se na primeira destas disposições que “se (...) o intermediário financeiro julgar que a operação considerada não é adequada àquele cliente deve adverti-lo, por escrito, para esse facto.” Ainda que apresentado como um dever de informação sobre os riscos da operação e sobre a relação entre esses riscos e a situação e objectivos do cliente, a verdade é que a definição dos termos dessa relação pressupõe já um juízo de valor do intermediário financeiro – v. Sobre este dever, PAULO CÂMARA, O dever de adequação dos intermediários financeiros, Estudos em Honra do Prof. Dr. José de Oliveira Ascensão, 2008, vol II, 1307 e segs. Resulta, em suma, destas disposições legais que o intermediário financeiro, para além do dever de informação, tem um dever de avaliar a adequação das operações face aos conhecimentos, experiência, situação financeira e objectivos do cliente. Determina, assim, o artigo 304.º do CVM que os intermediários financeiros estão obrigados a orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado (n.º1). Além disso, devem conformar a sua actividade aos ditames da boa fé, agindo de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência (n.º 2). O artigo 304.º-A, aditado ao CVM pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de Outubro, passou a dispor o seguinte: 1–Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação dos deveres respeitantes à organização e ao exercício da sua atividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública. 2–A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação. O artigo 312.º do CVM contém os princípios gerais ao nível dos deveres de informação. «1-O intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efectivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo nomeadamente as respeitantes: (…) d)-Aos instrumentos financeiros e às estratégias de investimento propostas; e)-Aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar». Nos termos do n.º 3 do artigo 312.º do CVM «A circunstância de os elementos informativos serem inseridos na prestação de conselho, dado a qualquer título, ou em mensagem promocional ou publicitária não exime o intermediário financeiro da observância dos requisitos e do regime aplicáveis à informação em geral». Segundo o disposto no artigo 312.º-E, n.º 1 do mesmo Código, O intermediário financeiro deve informar os investidores da natureza e dos riscos dos instrumentos financeiros, explicitando, com um grau suficiente de pormenorização, a natureza e os riscos do tipo de instrumento financeiro em causa» e referindo-se no n.º 2 aos elementos que a descrição dos riscos deve incluir. A informação deve ser prestada com a antecedência suficiente à vinculação a qualquer contrato de intermediação financeira ou, na pendência de uma relação de clientela, antes da prestação da actividade de intermediação financeira proposta ou solicitada (artigo 312.º -B, n.º 1, do CVM). Sucede que a lei não pretende que a informação seja prestada cegamente, em função de um investidor abstracto, mas antes em função das características do investidor concreto, variando a densidade do dever consoante os conhecimentos e experiência desse investidor, aspectos que o intermediário financeiro tem o dever de conhecer. O dever de informação do intermediário financeiro envolve, assim, um dever prévio de conhecimento do investidor, em concreto, das suas habilitações, experiência financeira, situação financeira e objectivos. O Código de Valores Mobiliários contém, todavia, inúmeras normas de protecção ao investidor não qualificado, impondo ao intermediário financeiro o dever de obter informações acerca dos conhecimentos e experiência do cliente, com o objectivo de possibilitar efectivamente a avaliação de que o “cliente compreende os riscos envolvidos”, para então formar seu juízo acerca da adequação do investimento para o cliente, informando-o em conformidade (artigo 314.º). Salienta-se também a imposição de que as informações previstas no n.º 1 do artigo 312.º sejam prestadas por escrito, imposição que se estende à advertência a efectuar ao cliente de que determinada operação não é adequada ao seu perfil (artigo 314.º, n.º 2). d)-DOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTES DA ACTUAÇÃO DO BPP, S.A., ENQUANTO INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO O regime da responsabilidade civil do intermediário financeiro está agora consagrado no artigo 304º-A do CVM (anterior artigo 304º) que, no seu nº 1 estatui : Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua actividade, que lhes seja imposta por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública. O nº 2 do citado normativo estabelece uma presunção de culpa do intermediário financeiro quando aí expressamente se estabelece: ”A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito das relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação”. Em face da natureza particularmente intensa dos deveres legais de informação que impendem sobre o intermediário financeiro, há sempre que apurar se o mesmo actuou com dolo ou culpa grave, nomeadamente, quanto aos riscos especiais nas operações a realizar e quanto à informação prévia a disponibilizar para permitir a tomada de uma decisão consciente. Para definir o que se entende por dolo ou culpa grave há que ponderar nas características da relação entre o banco e o cliente – a confiança especial depositada por este na instituição bancária; e os deveres de informação, lealdade, cuidado com valores alheios e boa fé do Banco em relação ao cliente. A graduação do grau de negligência (grave, leve e levíssima) terá de aferir-se pelo padrão de culpa consagrado no artigo 304.º, n.º 2 do CVM, segundo o qual «nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência». É, de resto, fonte de responsabilidade a violação do dever de informação a que estão obrigados os bancos, definido no artigo 75º, nº 1 do próprio regime jurídico das instituições bancárias, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31-12. Trata-se de uma modalidade de responsabilidade civil que se situa numa zona intermédia entre a responsabilidade contratual e a extracontratual, mas que se poderá reconduzir à responsabilidade contratual, cujos pressupostos estão definidos pelo artigo 798º do Código Civil, presumindo-se a culpa, nos termos do artigo 799.º do CC. Aliás, desde logo o artigo 77.º, n.º 1 do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras dispõe que: «As instituições de crédito devem informar com clareza os clientes sobre a remuneração que oferecem pelo fundos recebidos e os elementos caracterizadores dos produtos oferecidos, bem como sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos a suportar pelos clientes». Assim, sempre que um Banco, na qualidade de intermediário financeiro, haja avançado para a aquisição do produto financeiro, sem observar os deveres de informação, tornar-se-á responsável pelos prejuízos causados ao investidor, nos termos do citado artigo 314.º n.º 1 do Código de Valores Mobiliários, caso evidentemente não lograr ilidir a presunção a que alude o n.º 2 do citado artigo 314.º e que impende sobre o Banco. In casu,considerou o Tribunal a quoque os documentos informativos dos investimentos em causa eram insuficientes e pouco claros, não só quanto à estrutura, fiscalização e composição dos respectivos órgãos do veículo PF, mas também quanto às comissões de gestão e montagem do veículo que iriam ser cobradas e ainda quanto ao endividamento do mesmo e natureza das participações. Todavia, admitindo-se a insuficiência dessas menções nas fichas técnicas, entendemos que no caso concreto, não se pode definir o autor como um investidor não qualificado, pelo que a informação não terá de ser a mesma que teria de ser apresentada a um investidor sem qualquer conhecimento do risco associado à operação em causa. Acresce que no âmbito do investimento “PF” os autores são verdadeiros accionistas, como acima se referenciou com fundamento na factualidade apurada, aderindo à estratégia do investimento apresentado, adquirindo acções da Privado Financeiras e fazendo-se representar nas Assembleias Gerais por esta realizadas. No caso concreto, os pressupostos da responsabilidade contratual não se encontram preenchidos. Senão vejamos. Não está demonstrada a ilicitude, porquanto não se entende que haja ocorrido a violação do dever de informação com os seus requisitos indispensáveis: completude, veracidade, actualidade, clareza, objectividade e licitude. A informação fornecida pelo BPP continha, com efeito, os elementos disponíveis e contextualmente relevantes. Era verdadeira, actual, concisa e suficiente, susceptível de elucidar e de ser apreendida pelo 1º autor, investidor com grande experiência em produtos de private equity, habituado a investimentos de risco e que, atenta essa sua experiência e capacitação no sector financeiro estava perfeitamente ciente dos riscos do investimento “Privado Financeiras”, produto financeiro com alto risco de capital e de rentabilidade – v. Nºs 61 a 92 da Fundamentação de Facto. Foi, pois, transmitida ao autor toda a informação relevante, relativamente aos contornos e objectivos do investimento, à evolução económica e dos mercados, aos riscos a ele inerentes, à previsão de alavancagem do veículo, a qual ampliando embora os ganhos, igualmente amplia as perdas potenciais. E, tal informação foi transmitida ao autor, quer através das apresentações comerciais escritas que foram efectuadas, quer através da sua gestora de conta no BPP, que disponibilizava informações mediante newsletters, tendo com aquelas frequentes reuniões – v. Nºs 93 a 98 da Fundamentação de Facto. Tão pouco se provou que a informação prestada estivesse eivada de falsidade. Cumpriu o BPP o compromisso que assumiu no designado contrato de recolha de intenções de investimento, nomeadamente, prestando toda a informação relevante sobre o investimento em causa e a evolução do mesmo. De resto, mesmo na segunda operação de investimento PF, foi expressamente transmitido aos autores que a carteira da Privado Financeiras era composta apenas por acções do BCP e qual o objectivo do aumento de capital – v. Nºs 25, 50 e 51 da Fundamentação de Facto. Como tem sido entendimento jurisprudencial, o dever de informação encontra-se preenchido sempre que ao investidor informado e conhecedor de produtos financeiros, foi transmitida informação suficiente sobre as características do produto em causa e que o mesmo era um produto não isento de risco, ainda que não lhe haja sido entregue qualquer ficha técnica do mesmo ou ainda que os deveres de informação não visem retirar os riscos do mercado que lhes são inerentes, mas possibilitar ao cliente do intermediário financeiro a possibilidade deste tomar as decisões de investimento consciente das consequência do mesmo – v. nomeadamente Ac. STJ de 06.02.2014 (Pº 1970/09) e Ac. R.C. de 03.03.2015 (Pº 1067/12.4TVLSB.C1), acessíveis em www.dgsi.pt. É certo que, segundo MENEZES CORDEIRO, Direito Bancário, 5.ª Ed. revista a atualizada, Almedina, Coimbra, 2014, 431-432, na presença de um acordo entre o banqueiro e o seu cliente a «falta do resultado normativamente prefigurado implica presunções de culpa, de ilicitude e de causalidade. Defende, pois, este autor que o artigo 799º do CC contem uma dupla presunção de ilicitude e de culpa, ao referir que «Perante a falta de cumprimento, presume-se que: o devedor não cumpriu, violando as normas jurídicas que mandam cumprir – ilicitude; o devedor incorre no correspondente juízo jurídico de censura – culpa”», encontrando-se também abrangido pela presunção, o nexo entre o facto e o dano. Todavia, esta posição não é pacífica na doutrina, ressaltando a dúvida sobre a admissão da existência no nosso ordenamento jurídico de um modelo de presunção de imputação obrigacional em virtude da ilicitude e da culpa serem recebidos pela lei como um macro-pressuposto em que, a verificação do “ilícito-culposo implicaria necessariamente a verificação do pressuposto do nexo causal - v. a propósito e no sentido da não aceitação desse macro-pressuposto, LUÍS MANUEL MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações, Vol. I, 309-310 e GONÇALO ANDRÉ CASTILHO DOS SANTOS, A Responsabilidade Civil do Intermediário Financeiro perante o Cliente, Almedina, 214-225. Ademais, é manifesta a separação dos aludidos pressupostos à luz do citado artigo 314º, nº 2 do CVM (actual artigo 304º-A). No caso em análise, a culpa do banco, intermediário financeiro, mostra-se ilidida, porquanto os réus lograram demonstrar que o BPP prestou toda a informação exigível a um investidor perfeitamente conhecedor do veículo em causa, constando da informação prestada especificamente a situação de risco do investimento. Mas, ainda que se admitisse o incumprimento culposo, por parte do BPP, por insuficiência da informação contida na ficha técnica do produto financeiro, por verificar sempre ficaria o nexo de causalidade. É que, o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação e o dano causado aos autores, nos termos do artigo 563.º do Código Civil, deve ser analisado através da demonstração de que, se não tivesse havido a omissão dos deveres de informação, logo, se os mesmos tivessem sido cumpridos, os autores não teriam investido naquela aplicação, mas noutra que lhe garantisse um retorno seguro. Ora, não resultou provado que o autor haja colocado alguma condição para fazer o investimento em causa, nem tão pouco ficou demonstrado que se tivessem existido outras informações complementares, os autores não teriam efectuado aquele investimento, pois nada se apurou a esse propósito. Estamos perante uma situação em que foi apresentada aos autores, através da gestora de conta do BPP, uma operação financeira, à qual os autores deram a sua anuência. Tratava-se de um produto que, como constava da respectiva informação técnica, era um produto cujas características envolvia, em termos objectivos, um risco elevado, em que o reembolso não estaria acautelado e, sendo o 1º autor um investidor que efectuava consideráveis investimentos de risco, era-lhe exigível deveres de atenção e de acompanhamento desses seus investimentos. Com efeito, a aquisição do produto financeiro concretizou-se e produziu efeitos durante algum tempo, sem que os autores hajam colocado em causa a execução do referido investimento, voltando a aceitar o investimento no aumento de capital da Privado Financeiras. De resto, atenta a natureza do investimento em causa – private equity – a informação prestada pelo BPP de que tal investimento tinha elevados riscos e que não existiam garantias de rentabilidade ou mesmo de recuperação do capital investido, tal risco de perda do valor do investimento corre por conta do investidor – cfr. sobre a distribuição do risco nos contratos de intermediação financeira, MANUEL A. CARNEIRO DA FRADA, Revista da Ordem dos Advogados, ano 69º, vol. III/IV, 656 e segs. Perante a apreciação da factualidade apurada nos autos, concorda-se com o Ac. STJ de 06.06.2013 (Pº 364/11.0TVLSB.L1.S1), quando ali se refere que: “(…) Se é verdade que a qualquer investidor é legítimo esperar que os investimentos realizados produzam os resultados projectados, não pode ser jamais desconsiderado que qualquer investimento, mesmo aqueles que parecem mais seguros, como ocorre com os depósitos bancários, comporta uma determinada margem de risco que, em última instância, será repercutido na esfera do investidor. E se tal ocorre em investimentos tradicionais, é natural que esse risco seja proporcionalmente superior quando se trate de investimentos com maiores riscos potenciais (ainda que eles não se revelem então aparentes), designadamente quando assentem em produtos com elevada dose de especulação, com variabilidade de factores que influem nos resultados, com características que são de difícil apreensão por parte dos investidores não profissionais, com aplicações realizadas noutros mercados financeiros (que nem sequer se encontram sujeitos a regulação credível ou normalizada) ou que surgem com linguagem indecifrável pelo comum investidor. Seja como for, não é correcto eleger como factor decisivo a ocorrência do sinistro e dos prejuízos inerentes, para depois, numa inversão do percurso metodológico, encontrar os responsáveis relativamente aos quais possam ser reclamadas as compensações, antes deve caminhar-se no sentido natural que passa pela apreciação dos factos que, no circunstancialismo atendível, isto é, na ocasião em que é realizado o investimento, importem para terceiros a responsabilidade pelos prejuízos. Se tal não for encontrado, resta concluir que os prejuízos acabarão por ser absorvidos unicamente pelo investidor, como fruto de uma actuação que visando a extracção de proveitos … pode também acarretar prejuízos que potencialmente nela se contém”. Aduz-se também, mais à frente, no aludido aresto que: “(…) Ainda assim, a não ser que se assuma a existência de uma capitis diminutio que recaia sobre todo e qualquer investidor relativamente a toda e qualquer operação, não podem ser descurados paralelamente os deveres de diligência de cada indivíduo, deveres estes que, além do mais, devem ser exercidos na procura da informação que permita tomar uma decisão conscienciosa, em vez de atentar apenas em alguns dos elementos, como a rendibilidade periódica ou a taxa de juro, orientados apenas pela obtenção dos lucros, sem atenção aos riscos (…). Acresce que razão assiste à sentença recorrida quando, não obstante admita a incompletude das fichas técnicas do investimento PF, concluiu, em suma – e bem – que os autores não demonstraram e nem sequer alegaram que o valor que estariam dispostos a investir seria menor ou, seja, qual o valor que estariam dispostos a pagar por tal investimento. Não provaram, portanto, os autores, que com uma mais detalhada informação não teriam investido. Ao invés, e como se concluiu na sentença recorrida – entendimento que aqui se corrobora – “os autores investiram em capital de risco e foram informados que tal investimento tinha riscos elevados e que não existiam garantias de rendibilidade ou de recuperação do capital investido (…). Os autores tinham, em momento anterior à realização do investimento na Privado Financeiras realizado outros investimentos em Private Equity, pelo que eram conhecedores das características de tais investimentos, nomeadamente no que tange aos níveis dos mesmos. A indemnização aos AA. Pelo valor dos investimentos que estes realizaram na Privado Financeiras equivaleria, em termos práticos à transferência do risco de tais investimentos dos AA. para o BPP, SA, sem qualquer suporte contratual ou legal”. Finalmente, entende-se ser de corroborar o voto de vencido explanado no Ac. STJ de 10.01.2013, (Pº 89/10.4TVPRT.P1.S1), ao salientar que “(…) sendo insofismável e do conhecimento geral que no mercado de capitais não existem investimentos de risco nulo, sendo certo que a crise financeira do sub prime que se propagou a todo o sistema financeiro, terão certamente também contribuído para os danos que os autores reclamam e estes teriam porventura procedido ao resgate dos títulos, sem que as eventuais falhas de informação inicial se projectassem negativamente na sua esfera patrimonial. Assim, ainda que tivesse existido algum défice de informação – entendimento a nosso ver duvidoso, atentas as características do investidor – tal não bastaria para sustentar a constituição da obrigação de indemnização correspondente ao reembolso do capital investido, já que sempre faltaria o nexo de causalidade entre o pretenso incumprimento dos deveres inerentes à actividade de intermediação financeira e os prejuízos que os autores invocam terem sofrido, pois não foi essa a causa que despoletou a situação danosa na esfera jurídica dos autores. Não são, consequentemente, indemnizáveis os prejuízos invocados pelos autores, não fazendo qualquer sentido a pretensão expressa na sua alegação de recurso de que o Tribunal deveria ter condenado os réus/recorridos a indemnizá-los pelos prejuízos que se viessem a liquidar.
Os apelantes serão responsáveis pelas custas respectivas nos termos do artigo 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil. IV.–DECISÃO. Pelo exposto, acordam os Juízes desta ...ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida. Condenam-se os apelantes no pagamento das custas respectivas.
Lisboa, 6 de Abril de 2017
Ondina Carmo Alves – Relatora Pedro Martins Lúcia Sousa |