Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
41/19.4SHLSB-A.L1-5
Relator: ARTUR VARGUES
Descritores: FALTA DO ARGUIDO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/26/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: - Há que distinguir os casos em que o arguido está física e processualmente ausente da audiência, daqueles em que esteve presente, mas entretanto ausentou-se, só no primeiro caso sendo exigível a notificação pessoal da sentença, entendimento conforme à nossa constituição.
- A aceitar-se a orientação, de exigir a notificação pessoal da sentença ao arguido, em caso em que ele esteve presente ao julgamento, mas que falta à leitura da sentença, tendo o seu mandatário sido notificado da data da leitura e faltando também, estaria a abrir-se caminho ao uso abusivo deste expediente como forma de alargamento do prazo de recurso, quando a salvaguarda das garantias de defesa não o justificam, em nítido beneficio injustificado do infractor.
- Não se mostra inconstitucional a interpretação das normas dos artigos 373.º, n.º 3, e 113.º, n.º 9, (actual nº 10, diga-se), do Código de Processo Penal, quando interpretadas no sentido de que, tendo estado o arguido presente na primeira audiência de julgamento, onde tomou conhecimento da data da realização da segunda, na qual, na sua ausência e na presença do primitivo defensor, foi designado dia para a leitura da sentença, deve considerar-se que a sentença foi notificada ao arguido no dia da sua leitura, na pessoa do defensor então nomeado.”
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I - RELATÓRIO
1. Nos autos com o NUIPC 41/19.4SHLSB, do Tribunal Judicial da Comarca de ....... – Juízo Local Criminal de ......– Juiz ......, foi proferido despacho, aos 21/04/2021, que decidiu considerar regularmente notificado o arguido AA da sentença condenatória.
2. O arguido não se conformou com o teor da decisão e dela interpôs recurso.
I) Primeiramente, o presente recurso vem interposto do despacho proferido pelo Tribunal Singular correspondente ao Juízo Local Criminal de ....... - Juiz ......, pertencente ao Tribunal Judicial da Comarca de ........., que considerou o Arguido regularmente notificado da sentença na pessoa do ilustre defensor nomeado para o acto de leitura de sentença, tendo dispensado a notificação pessoal da mesma ao Arguido e aplicado o disposto no artigo 373.º, nº 3 do C.P.P.
II) Neste sentido, entendeu o Tribunal a quo que o Arguido deve considerar-se regularmente notificado da sentença e não se impondo a sua notificação pessoal, por o Arguido ter estado presente na audiência de julgamento e ter faltado à leitura da sentença proferida nos presentes autos, o que, salvo o devido respeito por opinião contrária, não pode o merecer o acompanhamento e o aplauso do Recorrente em qualquer medida.
III) Desde logo a norma do artigo 113.º, n 10 do C.P.P. é muito clara quando determina que a sentença tem de ser notificada pessoalmente ao arguido, sem estabelecer quaisquer excepções, seja a de ter estado presente na sessão anterior de audiência de julgamento e se ter entretanto ausentado na sessão em que se proceda à leitura da sentença, seja qualquer outra.
IV) Em prol da verdade, quer o mandatário do Arguido, quer este, ficaram convictos que a sessão de julgamento para leitura de sentença havia sido designada para o dia 31/01/2020 e não para o dia anterior, ou seja, dia 30/01/2020, daí ambos não terem comparecido nas instalações do Tribunal recorrido no dia 30/01/2020, mas, outrossim, no dia 31/01/2020.
V) Nesta medida, o Arguido apenas esteve presente na primeira sessão de audiência de julgamento, realizada no dia 21/01/2020, acabando por faltar à segunda e última sessão de julgamento designada para leitura da sentença, na qual acabou também por não comparecer o seu mandatário judicial.
VI) Por outro lado, é de sublinhar que o Tribunal a quo não fez constar da acta da audiência de julgamento datada de 30/01/2020 e destinada à leitura de sentença que o Arguido se tenha considerado notificado da sentença na pessoa do seu mandatário judicial ou do ilustre defensor nomeado ad hoc, para assegurar a defesa do Arguido em tal sessão de julgamento, nem nada sendo consignado que o Arguido tivesse sido notificado nos termos do disposto no artigo 373.º, n 3 do C.P.P.
VII) Em bom rigor, a norma do artigo 373.º, n.º 3 do C.P.P. tem de ser interpretada de forma restricta face ao disposto no artigo 113.º n.º 10 do mesmo diploma legal, na medida em que esta norma ordena a notificação da sentença ao arguido, para além da notificação ao seu defensor.
VIII) Neste sentido, com as devidas adaptações ao actual n 10 do artigo 113 do C.P.P., veja-se como se decidiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12/04/2007, referente ao Proc. n 4680/06, relatado pelo Exmo. Conselheiro Maia Costa, constando do respectivo sumário, disponível in www.dgsi.pt, o seguinte:
"I- O n.º 9 do art. 113.º do CPP versa sobre os destinatários das notificações em processo penal. Estabelece ele que, em princípio, as notificações às partes (arguido, assistente e partes civis) são feitas ao respectivo defensor ou advogado.
II - No entanto, há notificações que, sendo também feitas aos mandatários forenses, são necessariamente efectuadas na pessoa dos sujeitos processuais. São elas, segundo o texto do mesmo preceito, as «respeitantes à acusação, à decisão instrutória, à designação de dia para julgamento e à sentença, bem como as relativas à aplicação das medidas de coacção e de garantia patrimonial e à dedução do pedido de indemnização civil».
III - Trata-se, como é facilmente constatável, de uma enumeração exaustiva, ou seja: só nestes casos é que é obrigatória a notificação pessoal dos sujeitos processuais. Nos restantes, é suficiente a notificação do mandatário forense.
IV - É lógica e natural esta opção legislativa. O mandato forense, fundando-se numa relação de confiança entre mandante e mandatário, confere a este a plena representação em juízo do mandante, acrescendo que, na generalidade das situações, só o mandatário, devido aos seus conhecimentos técnicos, está em condições de interpretar e saber reagir aos actos e despachos transmitidos pelas notificações.
V- Há, no entanto, momentos e actos decisivos do processo, com repercussões na decisão da causa oü afectando directamente as partes, de que estas não podem deixar de ter conhecimento pessoal. São precisamente os enumerados naquele n.º 9 do art. 113.º.
Constituem eles os passos cruciais do processo, cujo conhecimento directo e pessoal permite à parte ter o domínio da evolução do procedimento, participando no patrocínio da sua posição no processo, dando eventualmente ao seu mandatário as informações e até instruções que entenda, inclusivamente revogando o mandato se perder a confiança no mandatário. Desta forma, o direito ao recurso está directamente garantido através da notificação pessoal da sentença. (...)."
IX) Por conseguinte, em anotação ao artigo 373do C.P.P., na obra Código de Processo Penal Comentado, 2014, Almedina, pág. 1164, António Henriques Gaspar e outros, escrevem o seguinte:
"(...) O art. 113.º ao fixar as regras gerais sobre notificações, conquanto estabeleça que as notificações do arguido podem ser feitas ao respectivo defensor, impõe o seu nº 9 que a sentença seja notificada, quer ao arguido quer ao seu defensor. Trata-se de imposição que encontra a sua justificação, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 Maio 2010, publicado na CJ (STJ) XVIII, II, pág. 190, na circunstância de a sentença constituir acto processual através do qual conhece afinal do objecto do processo. Assim, o n.º 3 do presente artigo ao estabelecer que o arguido ausente considera-se notificado da sentença depois de esta ser lida perante o seu defensor nomeado ou constituído, entre em colisão com a regra geral."
X) No caso dos autos, não ocorreu uma notificação eficaz do Arguido para a sessão designada para a leitura da sentença, não tendo este ficado com pleno conhecimento pessoal da data em que iria ocorrer a leitura da sentença.
XI) Por seu turno, diga-se ainda que a presença do ilustre defensor na sessão de leitura de sentença, na sequência da sua chamada e nomeação para o acto, face à ausência de qualquer contacto posterior que o mesmo tenha estabelecido com o Arguido e à falta de informação minimamente consciente e esclarecida do teor da sentença condenatória, não podem constituir de modo algum uma garantia suficiente da salvaguarda dos direitos e das garantias constitucionais de defesa do Arguido.
XII) Não se justificando, assim, que o Arguido se considere notificado da sentença condenatória nos termos do disposto no artigo 373.º, n.º 3 do C.P.P., tendo esta sido meramente lida apenas perante um defensor nomeado pelo Tribunal recorrido para o acto em apreço, o qual não chegou a estabelecer qualquer contacto com o Arguido e não o informou minimamente do teor da sentença proferida nos autos.
XIII) Ou seja, no caso concreto justifica-se claramente a aplicação, não da regra da parte inicial do n 10 do artigo 113.º do C.P.P., mas das ressalvas do segundo período desse mesmo n.º 10, que contemplam diversos actos, em que, a par da notificação do defensor, se exige a notificação do arguido, contando-se o prazo para a prática do acto processual subsequente a partir da notificação efectuada em último lugar.
XIV) Em bom rigor, todas essas situações que se possam integrar no âmbito do n 3 do artigo 373 do C.P.P. pressupõem que a sentença tenha sido lida perante o defensor primitivo do arguido ou advogado que o tenha representado ou defendido nas sessões de audiência de julgamento anteriores e não seja a sentença meramente lida perante um defensor presente apenas no acto apenas e tão-só para assegurar minimamente a defesa do arguido e evitar que ocorra a nulidade a que alude o artigo 119.º  alínea c) do C.P.P.
XV) Efectivamente, o legislador quis assegurar que o Arguido, enquanto principal interessado, tenha pleno conhecimento da sentença, dos seus termos e dos seus efeitos, sendo, assim, a notificação pessoal da sentença ao arguido uma garantia de que o mesmo teve conhecimento da sentença condenatória e que tem a liberdade de decidir que seja interposto recurso ou não da mesma, se motivos ou fundamentos para tal houverem.
XVI) Nesta conformidade, é exigida a notificação pessoal da sentença condenatória ao Arguido como salvaguarda das suas garantias constitucionais de defesa, não podendo o Arguido considerar-se regularmente notificado da sentença proferida nos presentes autos.
XVII) Deste modo, não tem aplicação no caso dos autos o artigo 373.º, n 3 da Lei Processual Penal, pelo que o despacho recorrido é ilegal, por violação do preceituado no artigo 113.º, n 10 do C.P.P., cumprindo declarar-se o Arguido como não notificado da sentença condenatória e ordenar-se a sua notificação pessoal através de O.P.C.
Sem conceder, o que só por dever de patrocínio forense se equaciona, note-se ainda,
XVIII) Ademais, a notificação da sentença ao Arguido deve ser pessoal e a sua falta configura a preterição de uma formalidade essencial, prevista no artigo 61.º, n 1 alínea b) do C.P.P., sendo geradora da nulidade insanável e absoluta a que se reporta o artigo 119.º, alínea c) do mesmo diploma legal.
XIX) Com efeito, a sentença condenatória integra-se no elenco taxativo do artigo 113.º, n 10 2.ª parte do C.P.P., devendo ser notificada pessoalmente ao Arguido, sob pena de ocorrência da nulidade insanável acima indicada.
XX) Desta feita, a omissão da notificação pessoal da sentença condenatória ao Arguido traduz-se na nulidade insanável prevista no artigo 119.º, alínea c) do C.P.P., a qual desde já se argui para todos os efeitos legais e que deve ser declarada, tornando inválida a referida notificação da sentença ao Arguido na pessoa do ilustre defensor nomeado para o acto de leitura de sentença, bem como todos os ulteriores actos processuais dela dependentes, conforme dispõe o artigo 122.º daquele diploma legal.
XXI) Devendo tal notificação ser efectuada não só ao defensor do Arguido, como também ao próprio Arguido, mais não restando do que concluir que estamos perante a nulidade insanável em apreço, a qual, podendo ser oficiosamente declarada em qualquer fase do processo penal por força do disposto no artigo 122.º do C.P.P., importa declarar nulo todo o processado a partir da leitura de sentença que teve lugar no dia 30/01/2020.
XXII) Sempre sem conceder, caso esse não seja o venerando entendimento de V. Exas., sempre se dirá,
XXIII) Por outra banda, ausente na sessão de julgamento em que se procedeu à leitura da sentença, o Arguido, ora Recorrente, não tomou conhecimento pessoal em momento algum da censura resultante da condenação em 1ª Instância.
XXIV) Na realidade, por terem ficado convictos de que a sessão de julgamento destinada à leitura de sentença tinha sido agendada para o dia 31/01/2020, o Arguido e o seu mandatário judicial não compareceram em tal audiência, tendo o Arguido sido colocado numa situação arbitrária e de desigualdade no que toca ao exercício do seu direito ao recurso, vendo correr contra si o prazo de interposição de recurso de cujo início não teve sequer conhecimento.
XXV) De facto, não obstante o seu mandatário judicial tenha interposto recurso da sentença condenatória, a sua interposição não resultou de uma decisão tomada pelo Arguido, com inteira liberdade e sem estar pressionado por qualquer urgência, não podendo a interposição de tal recurso de ter tido lugar para evitar a prisão efectiva do Arguido.
XXVI) Não tendo, assim, o mandatário constituído, nos dias que se seguiram à leitura da sentença condenatória, tido a possibilidade de a reler, repensar, reflectir, ponderar e decidir conjuntamente com o Arguido, sobre a conveniência de interpor recurso da mesma, não se tendo revelado o presente processo como um "due process of law" ou um “fair process".
XXVII) Por sua vez, a melhor interpretação do artigo 373.º n.º 3 do C.P.P. e a que está em consonância com os princípios e direitos constitucionais sempre será uma interpretação que postule o conhecimento pessoal das decisões que afectem a liberdade de qualquer cidadão e que o obriguem a cumprir pena de prisão.
XXVIII) Na realidade, salvo o devido respeito por opinião contrária, seria uma incongruência legislativa e interpretativa do artigo 373.º n.º 3 e do artigo 113.º, n.º 10, ambos do C.P.P., se fosse legalmente permitido que uma decisão condenatória não fosse necessariamente notificada pessoalmente ao Arguido, por a mesma colidir com os seus direitos, liberdades e garantias e impor-lhe o cumprimento de pena de prisão efectiva.
XXIX) Nesta conformidade, em nome das garantias de defesa do arguido constitucionalmente consagradas, a Lei Ordinária deve prescrever a notificação pessoal ao condenado das decisões condenatórias que o afectem (ou nesse sentido devem ser interpretadas as normas nela já existentes).
XXX) Destarte, tendo a sentença condenatória por efeito directo a privação da liberdade do condenado, surge como mais consentâneo com as garantias de defesa constitucionalmente asseguradas ao arguido, o entendimento de que se impõe a notificação da sentença ao arguido e não apenas ao seu defensor, muito menos ainda que tal sentença seja meramente lida perante um defensor ad hoc, nomeado apenas para tal sessão de julgamento e acto de leitura de sentença.
XXXI) Ora, desde logo, com as devidas adaptações ao caso concreto e ao artigo 373.º, n.º 3 do C.P.P., pode ler-se no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 59/99:
"(...) são configuráveis várias hipóteses que apontam para que as garantias de defesa de um arguido só serão plenamente adquiridas se ao mesmo for dado um cabal conhecimento da decisão condenatória que a seu respeito foi tomada.
Mas, entende este Tribunal, esse cabal conhecimento atinge-se, sem violação das garantias de defesa que o processo criminal deve comportar, desde que o seu defensor - constituído ou nomeado oficiosamente - contanto que se trate do primitivo defensor - seja notificado da decisão condenatória tomada pelo tribunal de recurso.
(...) De harmonia com tais deveres, há-de concluir-se que o arguido, por intermédio do conhecimento que lhe é dado pelo seu defensor (aquele primitivo defensor) ficará ciente dos motivos fácticos e jurídicos que o levaram a ser considerado como agente de um ilícito criminal e da reacção, a nível de imposição de pena, que lhe foi aplicada pelo Estado, ao exercitar o seu jus puniendi.
Outrotanto, porém, se não passa se se tratar de um defensor meramente nomeado para a audiência em substituição do defensor que, para ela notificado, não compareceu.
Aqui, esse defensor não estará vinculado a deveres funcionais e deontológicos que lhe imponham a dação de conhecimento ao arguido do resultado do julgamento realizado no tribunal superior, já que a sua intervenção processual se «esgotou» na audiência e somente para tal intervenção foi nomeado.
Numa tal situação, e só nessa, é que este Tribunal perfilha a óptica segundo a qual norma constante do n.º 5 do artigo 113.º do Código de Processo Penal desse jeito interpretada, se revela contrária ao n.º 1 do artigo 32.º da Constituição, por isso assim se não almejam as garantias que o processo criminal deve assegurar ao arguido," (Sublinhados nossos).
XXXII) Assim sendo, in casu, quer o Arguido, quer o seu mandatário judicial, não estiverem presentes na leitura de sentença proferida em l.§ Instância, tendo esta sido meramente lida perante um defensor, nomeado pelo Tribunal recorrido somente para o acto em apreço, o qual não chegou a estabelecer qualquer contacto com o Arguido, nem o informou minimamente do teor da sentença proferida nos autos.
XXXIII) Neste circunstancialismo, sempre o respeito pelas garantias constitucionais de defesa do arguido pressupõe que a sentença condenatória tivesse sido lida perante o defensor primitivo do arguido ou advogado que o tivesse representado ou defendido nas sessões de audiência de julgamento anteriores e não que a sentença seja meramente lida perante um defensor presente no acto apenas e tão-só para assegurar minimamente a defesa do arguido e evitar que ocorra a nulidade a que alude o artigo 119.º alínea c) do C.P.P.
XXXIV) Por seu lado, acompanhamos ainda de perto o voto de vencido que foi aposto a este colendo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 59/99 pelo Exmo. Conselheiro Bravo Serra, no qual foi propugnado e bem o entendimento de ser constitucionalmente imposta a notificação pessoal ao arguido das decisões condenatórias, sejam tomadas em primeira instância ou em recurso, não havendo razão lógica para distinguir entre umas e outras para efeitos da sua comunicação pessoal ao arguido, a fim de lhe possibilitar saber dos motivos da condenação e eventualmente reagir contra ela.
XXXV) Desta feita, o Arguido não teve conhecimento em que data exacta iria ocorrer a leitura da sentença, nem dispôs o mesmo de plena oportunidade para ter acesso à decisão condenatória contra si proferida.
XXXVI) Além disso, no sentido de que a sentença deveria ter sido lida perante o Arguido ou perante o seu mandatário judicial é o que decorre a contrario da decisão perfilhada no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 378/2003, tendo sido adoptado o entendimento de não julgar inconstitucional a norma do artigo 373.º, n.º 3 do C.P.P., interpretada no sentido de a sentença lida perante o primitivo defensor ou perante advogado constituído se considerar notificada ao arguido.
XXXVII) De igual modo, no Acórdão do Tribunal Constitucional de 20/05/2003, publicado no DR., II Série, de 03/06/2003, foi julgado que a norma do artigo 373.º, n.º 3 do C.P.P. deve ser interpretada no sentido de que consagra a necessidade de uma decisão condenatória ser pessoalmente notificada ao arguido, não podendo, enquanto essa notificação não ocorrer, se iniciar o prazo para interposição de recurso, sob pena de inconstitucionalidade, por violação dos n.ºs 1 e 6 do artigo 32.º da C.R.P.
XXXVIII) Ainda neste sentido veja-se o entendimento sufragado pelo Tribunal Constitucional no seu Acórdão n.º 476/2004, no qual julgou inconstitucionais o actual artigo 113.º, n.º 10 e o artigo 411.º, n.º 1 do C.P.P., quando interpretados no sentido de que a notificação de uma decisão condenatória, relevante para a contagem do prazo de interposição de recurso seria a notificação ao defensor, independentemente, em qualquer caso, da notificação pessoal ao arguido, sem exceptuar os casos em que este não tenha obtido conhecimento pessoal da decisão condenatória.
XXXIX) Assim sendo, segundo estes arestos do Colendo Tribunal Constitucional uma garantia efectiva do direito ao recurso pressupõe que ao Arguido seja dado conhecimento da decisão que foi tomada, na medida em que este deve ter oportunidade de organizar eficazmente a sua defesa.
XL) De facto, na linha de uma jurisprudência anterior, o Tribunal Constitucional tem reconhecido um princípio de "oportunidade" de acesso pessoal do arguido ao conteúdo do que foi decidido, em ordem a poder organizar posteriormente a sua defesa.
XL) (como original) Nesta linha decisória, veja-se ainda o entendimento plasmado no Acórdão do Tribunal Constitucional n 199/86, publicado no D.R., II Série, de 25/08/1986, em que se afirmou peremptoriamente:
"Dispensar a notificação de decisões condenatórias ficticiamente publicadas sem que os réus delas tomem conhecimento, fazendo correr o prazo de recurso sem que estes os suspeitassem sequer, eis o que a todas as luzes se afigura incompatível com o princípio geral contido no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, pois os interessados vêem-se assim privados de lançarem mão de uma instância de recurso."
XLI) Destarte, o critério ou entendimento sufragado pelo Tribunal a quo, ao dispensar a notificação pessoal da sentença ao Arguido, considera irrelevante o efectivo conhecimento por este do conteúdo decisório de uma decisão judicial, razão pela qual não pode cumprir plenamente as garantias de defesa do arguido e o seu direito ao recurso, consagrados no artigo 20.º, n.º 1 e 32.º, n.º 1 da C.R.P.
XLII) Não podendo, assim, ser indiferente para a plenitude destas garantias constitucionais que o Recorrente não tenha tido conhecimento pessoal do conteúdo decisório no momento a partir do qual se iniciaria o prazo para ponderar o exercício do seu direito constitucional ao recurso.
XLIII) Em bom rigor, como se sublinha no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 335/95:
"(...) Tratando-se de processos de diferente natureza, por exemplo em processos de natureza penal, as preocupações de evitar que o processo fique parado à espera de localização do arguido levam à consagração de outros mecanismos, sendo perfeitamente compreensível que o grau de exigência quanto a tais mecanismos seja superior, dados os interesses em causa, nomeadamente a regra constitucional de que o processo penal assegura todas as garantias de defesa (veja-se o instituto da contumácia em processo penal)."
XLIV) Face ao supra exposto, o Arguido devia ter sido e deve ser ainda notificado pessoalmente da sentença condenatória proferida nos presentes autos, porquanto o disposto no artigo 373.º, n.º 3 do C.P.P. viola o princípio da igualdade, as garantias constitucionais de defesa em processo criminal e o direito ao recurso do arguido, consagrados nos artigos 13.º e 32.º n.ºs 1 e 6, ambos da C.R.P.
XLV) Desta feita, a norma do artigo 373.º, n.º 3 da Lei Processual Penal deve ser interpretada no sentido de que consagra a necessidade de a decisão condenatória ser pessoalmente notificada ao Arguido que não esteve presente na sessão da audiência de julgamento em que se proceda à leitura de sentença.
XLVI) Efectivamente, ao não promover a notificação pessoal do Arguido da sentença condenatória, o Tribunal recorrido coarctou os direitos e garantias constitucionais de defesa do Arguido, incorrendo na violação dos direitos fundamentais consagrados nos artigos 20.º, n.º 1 e 32.º, n.ºs 1 e 5, ambos da C.R.P.
XLVII) Aqui chegados, a interpretação que o Tribunal o quo fez da norma do artigo 373.º, n.º 3 do C.P.P. padece de inconstitucionalidade material, por violação das garantias constitucionais de defesa do Arguido previstas no artigo 32.º, n.º 1 e do seu direito ao recurso, consagrado no artigo 20.º, n.º 1, ambos da Lei Fundamental, violando ainda o disposto no artigo 6.º, n.º 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, a qual desde já se suscita e invoca para todos os efeitos legais.
  Nestes termos e nos demais de direito, que V. Exas doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente Recurso e, por via dele, ser revogado o douto despacho recorrido, sendo substituído por outro que ordene a notificação pessoal da sentença ao Recorrente, nos termos supra expostos, assim, e como sempre, se fazendo, a necessária e costumada JUSTIÇA!
Por conseguinte, por violação do disposto no artigos 32.º, n.º 1 e 20.º, n.º 1, ambos da C.R.P., e das garantias de defesa do Arguido, desde já se suscita e invoca a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 373.º, n.º 3 do C.P.P., quando interpretada no sentido de que a decisão condenatória proferida por Tribunal de 1.ª Instância, encontrando-se o arguido e o seu mandatário ausentes na sessão de julgamento de leitura de sentença, pode ser notificada apenas ao defensor que ali foi nomeado apenas para o acto para substituir o primitivo defensor, dispensando-se a notificação pessoal da sentença condenatória ao arguido.
3. A Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal a quo respondeu à motivação de recurso, concluindo por não merecer provimento.
4. Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da manutenção da decisão revidenda.
5. Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, nº 2, do CPP, tendo sido apresentada resposta pelo recorrente em que, no essencial, reitera a pretensão recursória.
6. Colhidos os vistos, foram os autos à conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
1.   Âmbito do Recurso
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, havendo ainda que ponderar as questões de conhecimento oficioso – neste sentido, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição, Editorial Verbo, pág. 335; Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª edição, Edições Rei dos Livros, pág. 103, Ac. do STJ de 28/04/1999, CJ/STJ, 1999, tomo 2, pág. 196 e Ac. do Pleno do STJ nº 7/95, de 19/10/1995, DR I Série A, de 28/12/1995.
No caso em apreço, atendendo às conclusões da motivação de recurso, as questões que se suscitam são as seguintes:
Não notificação do arguido e seu mandatário da data designada para a leitura da sentença.
Não notificação ao arguido da sentença condenatória/nulidade prevista no artigo 119º, alínea c), do CPP.
2. Elementos relevantes para a decisão.
2.1 Aos 11/11/2019, foi lavrado despacho que designou o dia 21/01/2020, pelas 09:30 horas, para a realização da audiência de julgamento, deste tendo sido notificado o arguido e o seu Ilustre mandatário.
2.2 No dia 21/01/2020, compareceram na audiência o arguido e seu Ilustre mandatário, sendo que, no final da sessão a Mmª Juíza, na presença dos mesmos, proferiu despacho em que designou o dia 30/01/2020, pelas 14:00 horas, para a leitura da sentença. Deste despacho foram os presentes notificados.
2.3 No dia 30/01/2020, nem o arguido, nem o seu Ilustre mandatário compareceram em tribunal para a leitura da sentença, sem justificação das não presenças, pelo que foi efectuada a nomeação do advogado de escala para assegurar a defesa do arguido na sessão, tendo então a Mmª Juíza procedido à leitura da sentença na sua presença.
2.4 O arguido AA foi condenado na pena de dois anos e seis meses de prisão, pela prática, como reincidente, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelos artigos 21º, nº 1 e 25º, alínea a), do Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01, com referência à tabela I-C anexa e artigos 75º e 76º, do Código Penal.
2.2 O despacho recorrido, proferido em 21/04/2021, apresenta o teor que se transcreve, na parte que releva:
Com Vista nos autos, vem o Ministério promover que se considere que o arguido foi regularmente notificado da sentença proferida, apesar de não ter comparecido na diligência de leitura de sentença, uma vez que se considera notificado na pessoa do seu ilustre defensor.
Decorre da ata de audiência de discussão e julgamento que o arguido esteve presente na referida audiência, apenas tendo faltado à leitura da sentença, diligência para a qual havia sido pessoalmente notificado e em que não compareceu injustificadamente.
O artigo 333.º, n.º 5, do Código de Processo Penal, impõe a notificação pessoal da sentença ao arguido naqueles casos em que a audiência ocorreu na sua ausência.
No entanto, tal como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18/06/2013, disponível em -www.dgsi.pt (e na demais jurisprudência que aí se cita), é necessário distinguir aqueles casos em que o arguido esteve ausente da audiência de julgamento, daqueles outros em que esteve fisicamente presente e faltou à leitura de sentença, estando notificado de tal diligência.
Com efeito, quando o arguido esteve presente no julgamento e apenas faltou à leitura de sentença, aplicação o disposto no artigo 373.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, de acordo com o qual "O arguido que não estiver presente considera-se notificado da sentença depois desta ter sido lida perante o defensor nomeado ou constituído".
É essa a situação que se verifica nos presentes autos.
Tendo o arguido estado presente na audiência de julgamento e apenas tendo faltado – para mais, injustificadamente  –  à leitura da sentença, por força da supra referida norma, devera considerar-se regulamente notificado da mesma, não se impondo a sua notificação pessoal.
Apreciemos.
Não notificação do arguido e seu mandatário da data designada para a leitura da sentença
Sustenta o recorrente que, quer o próprio, quer o seu Ilustre mandatário “ficaram convictos que a sessão de julgamento para leitura da sentença havia sido designada para o dia 31/01/2020 e não para o dia anterior, ou seja, dia 30/01/2020, daí ambos não terem comparecido nas instalações do tribunal no dia 30/01/2020, mas, outrossim, no dia 31/01/2020”.
Ora, esta convicção do recorrente e seu Ilustre mandatário é, para o caso, absolutamente irrelevante, pois a data designada foi efectivamente o dia 30/01/2020 e dela foram os mesmos notificados.
Portanto, se a olvidaram, confundiram ou por qualquer circunstância não tomaram a devida nota, é problemática que só aos mesmos concerne, não influindo na conclusão de que para a data da leitura estavam devidamente notificados.
Improcede o recurso neste segmento.
Não notificação ao arguido da sentença condenatória/nulidade prevista no artigo 119º, alínea c), do CPP
Conforme resulta do despacho recorrido, o tribunal a quo entendeu que o arguido se encontrava regularmente notificado da sentença por força da notificação efectuada ao advogado de escala nomeado seu defensor para o acto, convocando o estabelecido no artigo 373º, nº 3, do CPP.
Corresponde à realidade, como assinala o recorrente, que na acta da audiência do dia 30/01/2020 não se faz menção de que se considerava o arguido notificado da sentença na pessoa do defensor nomeado para o acto, nos termos da disposição legal citada, mas vero é que tal consta do despacho recorrido e o arguido também não arguiu perante o tribunal a quo a eventual irregularidade dessa omissão.
Estabelece-se no artigo 373º, do CPP:
“1 - Quando, atenta a especial complexidade da causa, não for possível proceder imediatamente à elaboração da sentença, o presidente fixa publicamente a data dentro dos 10 dias seguintes para a leitura da sentença.
2 - Na data fixada procede-se publicamente à leitura da sentença e ao seu depósito na secretaria, nos termos do artigo anterior.
3 - O arguido que não estiver presente considera-se notificado da sentença depois de esta ter sido lida perante o defensor nomeado ou constituído.”
Por seu turno, consagra-se no artigo 113º, nº 10, do CPP, que o recorrente chama à colação: “as notificações do arguido, do assistente e das partes civis podem ser feitas ao respectivo defensor ou advogado. Ressalvam-se as notificações respeitantes à acusação, à decisão instrutória, à designação de dia para julgamento e à sentença, bem como as relativas à aplicação de medidas de coacção e de garantia patrimonial e à dedução do pedido de indemnização civil, as quais, porém, devem igualmente ser notificadas ao advogado ou defensor nomeado; neste caso, o prazo para a prática de acto processual subsequente conta-se a partir da data da notificação efectuada em último lugar.”
Pois bem.
Como se pode ler no Ac. R. do Porto de 24/10/2012, Proc. nº 970/10.0PBMTS.P1, consultável em www.dgsi.pt:
“Da articulação dos preceitos legais transcritos pode extrair-se a conclusão de que a disposição legal contida no artº 373º nº 3 do C.P.P. é uma norma especial relativamente à contida no artº 113º nº 9 (actualmente o nº 10) e abrange todas as situações em que o arguido esteve presente em alguma ou em todas as sessões do julgamento mas faltou à leitura da sentença ou acórdão, bem como as situações em que a audiência decorre na ausência do arguido, por sua iniciativa ou com o seu consentimento. Em todos esses casos pode considerar-se que o arguido está processualmente presente (embora fisicamente ausente) desde que representado por defensor, considerando-se por isso suficiente a leitura da sentença perante o defensor nomeado ou constituído.”
Trata-se de situação diferente das a que se referem os artigos 333º, nºs 2, 3 e 5 e 334º, nº 6, do CPP, em que “o arguido está física e processualmente ausente e, por isso, o legislador não prescindiu da comunicação da sentença ao arguido através da sua notificação pessoal”, como se acrescenta no mesmo aresto.
Ou seja, no artigo 113º, estabelecem-se as regras gerais das notificações, regendo a norma do nº 3, do artigo 337º, do CPP, para a situação especial nele prevista.
Elucida, não menos cabalmente, o Ac. R. de Évora de 20/11/2012, Proc. nº 40/09.4GFELV.E1, que pode ser lido no referenciado sítio:
“(…) no que respeita especificamente à notificação da sentença, a lei distingue, claramente, duas situações – a da notificação de arguido julgado na ausência, ou seja, de arguido faltoso e ausente desde o início do julgamento (art. 333º, nº 5 do CPP), e a da notificação de arguido presente em julgamento e que entretanto se tenha ausentado (art. 373º, nº3 do CPP).
Só no primeiro caso se exige a notificação pessoal da sentença ao arguido (“quando este se apresentar ou for detido”) valendo para o segundo a regra da notificação na leitura da sentença (perante o próprio e/ou o seu defensor), sendo que, nesta situação, o prazo para recorrer se contará do depósito da sentença (art. 411º, nº1 - al. a) do CPP).”
Sendo que “a diferença de regimes é axiologicamente compreensível já que apenas nesta segunda situação há a certeza de que o arguido sabe que está a ser julgado, que o julgamento terminará inevitavelmente com a leitura da sentença, sentença da qual ele é o primeiro interessado.”
Mais recentemente, o Ac. deste Tribunal da Relação e Secção de 06/06/2017, Proc. nº 2015/10.1TDLSB.L1-5 (consultável no mesmo sítio), veio densificar este entendimento, apelando para o Ac. de 18/06/2013, Proc. nº 355/04.8TABNV, do mesmo colectivo, nos seguintes termos:
“I - Há que distinguir os casos em que o arguido está física e processualmente ausente da audiência, daqueles em que esteve presente, mas entretanto ausentou-se, só no primeiro caso sendo exigível a notificação pessoal da sentença, entendimento conforme à nossa constituição; II - A aceitar-se a orientação de exigir a notificação pessoal da sentença ao arguido, em caso em que ele esteve presente ao julgamento, mas que falta à leitura da sentença, tendo o seu mandatário sido notificado da data da leitura e faltando também, estaria a abrir-se caminho ao uso abusivo deste expediente como forma de alargamento do prazo de recurso, quando a salvaguarda das garantias de defesa não o justificam, em nítido beneficio injustificado do infractor. ...”
Este é também o entendimento que perfilhamos.
Argumenta ainda o recorrente, insurgindo-se por a sentença ter sido lida perante um defensor nomeado para o acto e não perante o seu mandatário (que, relembremos, igualmente não compareceu em tribunal na data designada para a leitura da sentença) e convocando vários Acórdãos do Tribunal Constitucional.
Quanto a estes, vejamos.
O Acórdão nº 59/99, reporta-se a uma situação no Tribunal da Relação de Lisboa em que à audiência designada neste Tribunal não compareceu o defensor constituído pelo arguido, bem como este, pelo que o Desembargador Presidente da Secção Criminal nomeou como defensora oficiosa do arguido uma funcionária do mesmo órgão de administração de justiça, matéria que nada tem a ver com o caso dos autos.
No Acórdão nº 378/2003, decidiu-se “não julgar inconstitucional a norma do artigo 373º, n.º 3, do Código de Processo Penal, conjugada com a do artigo 113.º, n.º 7, do Código de Processo Penal (actual n.º 9 do artigo 113º), ambos na redacção resultante da Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, interpretada no sentido de a sentença lida perante o primitivo defensor nomeado, ou perante advogado constituído, se considerar notificada ao arguido”, não sendo admissível a interpretação a contrario, como faz o recorrente, no sentido de que a sentença teria de ser lida exclusivamente perante o arguido ou seu mandatário judicial, pois trata-se de questão não colocada àquele tribunal.
O Acórdão nº 476/2004, prende-se com a questão de o acórdão ou decisão condenatória proferida por um tribunal de recurso por notificada aos arguidos apenas através da notificação dirigida à sua defensora (oficiosa), não tendo assim de lhes ser notificada pessoalmente, e [de] que o prazo de interposição do recurso desse acórdão ou decisão condenatória se conta a partir dessa notificação à sua defensora. O que, como é patente, nada tem a ver com a situação aqui sob apreciação.
O Acórdão nº 199/86, reporta-se a matéria relacionada com o anterior Código de Processo Penal, não tendo in casu aplicação.
Quanto ao Acórdão nº 335/95, diz respeito a questão suscitada no âmbito de acção executiva e não à norma contida no artigo 373º, nº 3, do CPP.
Já quanto ao acórdão datado de 20/05/2003, cujo número o recorrente não fez a fineza de nos dar a conhecer, não conseguimos encontrar aresto algum do aludido Tribunal com essa data que decidisse relativamente à norma do artigo 373º, nº 3, do CPP.
Porém, no Acórdão nº 489/2008, do mesmo Tribunal, consultável no sítio respectivo, podemos ler que decidido foi:
“Não julgar inconstitucionais as normas dos artigos 373.º, n.º 3, e 113.º, n.º 9, (actual nº 10, diga-se), do Código de Processo Penal, quando interpretadas no sentido de que tendo estado o arguido presente na primeira audiência de julgamento, onde tomou conhecimento da data da realização da segunda, na qual, na sua ausência e na presença do primitivo defensor, foi designado dia para a leitura da sentença, deve considerar-se que a sentença foi notificada ao arguido no dia da sua leitura, na pessoa do defensor então nomeado.”
E, aconchega esta posição a declaração de voto do Exmº Conselheiro Benjamim Rodrigues no sentido de “o defensor estar obrigado legalmente a comunicar a decisão ao arguido e não estar demonstrado ou sequer alegado não a ter ele cumprido.”
Que é exactamente o que se verifica no caso sub judice.
Assim, importa concluir por o arguido/recorrente se encontrar regularmente notificado da sentença, não ocorrendo a nulidade insanável prevista no artigo 119º, nº 1, alínea c), do CPP, nem aliás qualquer outra e que não merece acolhimento a censura feita ao despacho recorrido.
E, face ao exposto, também inexistiu obliteração dos princípios da igualdade, das garantias constitucionais de defesa em processo criminal, e do direito ao recurso do arguido, consagrados nos artigos 13º, 20º, nº 1 e 32º, nºs 1 e 6, da Constituição da República Portuguesa.
De onde, cumpre negar provimento ao recurso.

III - DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam os Juízes da 5ª Secção desta Relação em negar provimento ao recurso pelo arguido AA interposto e confirmar a decisão recorrida.
Condena-se o recorrente nas custas, fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) UC.

Lisboa, 26 de Outubro de 2021
(Consigna-se que o presente acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário – artigo 94º, nº 2, do CPP).
Artur Vargues
Jorge Gonçalves