Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6248/15.6T8LSB-A.L1-6
Relator: TERESA SOARES
Descritores: COMUNICAÇÕES ELECTRÓNICAS
NOMEAÇÃO DE PATRONO
APRESENTAÇÃO DE CONTESTAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: -Nos termos do art.º 248.º do CPC, a notificação presume-se feita no 3.º dia posterior ao da certificação da respectiva expedição.
-À notificação de patrono, da sua nomeação para contestar a acção, aplica-se a regra geral do art.º 248.º CPC.
Decisão Texto Parcial: Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


I-Relatório:

           
1.Nos presentes autos de procedimento especial de despejo a requerida, citada, veio apresentar, dentro do prazo da oposição, comprovativo de requerimento de nomeação de patrono, a 12 de Maio de 2015.
Foi nomeada patrona, tendo esta recebido notificação da nomeação pela AO no dia 18 de Junho, sendo essa a mesma data da nomeação (terá sido notificada via e-mail).
           
2.Entretanto, a requerida constituiu mandatário e veio apresentar a sua oposição no dia 9/7, tendo deduzido incidente de justo impedimento e em simultâneo, paga a multa prevista no artigo 139º, nº 5, alínea c) do CPC.

Para fundar o justo impedimento alegou que:

-A requerida recebeu da patrona uma carta a convocá-la para o dia 2/7;
- a requerida constituiu mandatário a 1/7, mandatário este que tentou contactar com a patrona para que lhe fosse indicada a data em que havia sido nomeada, para feitos de poder controlar o prazo da oposição;
- a requerida só recebeu a notificação da  OA a 26/6, embora datada de 18/6;
- depois de e-mails e sms vários, o mandatário da requerente apenas conseguiu, às 22.40 do dia 6/7 receber uma resposta da patrona que indicou ter recebido a nomeação no dia 18/6 , tendo-lhe dado a conhecer que na véspera, dia 17, tinha falecido o seu marido que foi causa da normal desorientação, dispondo de atestado justitificativo de que estava impedida de exercer o patrocínio;
- o mandatário tentou consultar o processo no dia 6/7, mas não conseguiu, assim como não conseguiu redigir a oposição até as 24horas do dia 8/7, daí a sua apresentação apenas a 9/7.

3.Foi então proferido despacho donde consta:

“A 12.05.2015, a requerida juntou comprovativo de requerimento de nomeação de patrono.
(…)

A interrupção do prazo para deduzir oposição (de 15 dias) ocorreu a 12.05.2015. Iniciou-se com a recepção da carta datada de 18.06.2015 (vide fls.272), em que a patrona nomeada foi notificada da sua designação.

Certo é que, de acordo com o documento de fls.286, verso, a patrona nomeada, em 25.06.2015, já havia sido notificada da nomeação e que, em 2 de Julho, esta patrona foi informada de que a requer ida havia constituído mandatário, cessando assim o seu patrocínio.

Tendo a notificação ocorrido a 18.06.2015, o prazo de 15 dias terminou no dia 6.07.2015.

Pelo menos desde 1 de Julho, a requerida e o seu Mandatário sabiam que o prazo se encontrava a correr pelo menos em 25.06.2015, não obstante não saberem desde quando, pelo que não nos parece que saber ao certo quando é que o mesmo se havia iniciado impedisse o Mandatário de apresentar oposição até dia 6.07.2015, acautelando dessa forma que o prazo não decorresse completamente.

A oposição foi apresentada a 9.07.2015, ou seja, 3 dias depois do termo do prazo, pelo que apenas – inexistindo justo impedimento, conforme se concluiu – mediante o pagamento da multa, que ocorreu, poderia a oposição ser admitida.
(…)

Atento o exposto, julgo não verificado qualquer justo impedimento na apresentação atempada da oposição.

Admito a oposição apresentada porque se mostra paga a multa prevista no art.º139º, nº5, c) do CPC”

4.Deste despacho recorrem os requerentes, a título principal e a requerida a título subordinado, tendo apresentado alegações, com as conclusões seguintes:
 
    4.1.Recurso principal.

1.ª-Vem a presente apelação do douto despacho, datado de 28 de Julho de 2015, que admitiu a oposição apresentada pela requerida por se mostrar paga a multa prevista no artigo 139º, nº 5, alínea c) do CPC.
2.ª-O douto despacho de que ora se recorre considerou que: Tendo a notificação ocorrido a 18.06.2015, o prazo de 15 dias terminou no dia 6.07.2015.

3.ª-Resulta dos autos o seguinte:

•A requerida foi notificada pelo Balcão Nacional de Arrendamento (BNA), tendo assinado o respectivo aviso de recepção no dia 4 de Maio de 2015.
•No dia 15 de Maio de 2015 a requer ida deu entrada no PED de documento comprovativo de ter requerido o apoio judiciário.
•No dia 18 de Junho de 2015, a Ilustre Colega Drª N.C.C. foi nomeada oficiosamente pela Ordem dos Advogados.
•A oposição foi apresentada no dia 9 de Julho de 2015.
4.ªA contagem do prazo para apresentação da oposição deve ser feita da seguinte forma:
•A requerida foi citada no dia 4 de Maio de 2015 para, em 15 dias, deduzir oposição ao PED. Pelo que, o seu prazo de defesa terminaria no dia 19 de Maio de 2015.
•No entanto, uma vez que a requer ida deu entrada de requerimento informando ter requerido o apoio judiciário, no dia 15 de Maio de 2015, o prazo para apresentação da oposição interrompeu-se.
•Uma vez que a I lustre Colega Drª N.C.C. foi nomeada oficiosamente pela Ordem dos Advogados, no dia 18 de Junho de 2015, o primeiro dia do prazo foi o dia 19 de Junho de 2015.
•Logo, o último dia do prazo é o dia 3 de Julho de 2015 e o terceiro dia após o termo do prazo é o dia 8 de Julho de 2015.
5.ª Uma vez que a oposição foi apresentada no dia 9 de Julho de 2015 é a mesma intempestiva.

Acresce que,
6.ª-Com o devido respeito, as apelantes não alcançam qual foi a forma de contagem do prazo de defesa que esteve subjacente ao douto despacho recorrido, mas, para o caso de ser entendido que à contagem do prazo de defesa se aplica o disposto no artigo 248º do CPC (o que não se aceita) sempre se dirá que esse entendimento carece totalmente de fundamento.
7.ª-O Código de Processo Civil prevê regras de contagem totalmente diferentes para os prazos de defesa e para os prazos decorrentes de notificações.
8.ª-No caso em apreço, o prazo em curso e que foi posteriormente interrompido era um prazo de defesa e, por isso, devem ser respeitadas as regras relativas à contagem dos prazos de defesa.
9.ª-A citação para apresentação da defesa é feita mediante o envio de carta registada com aviso de recepção, conforme resulta do disposto no artigo 15ºD, número 1, alínea a) do NRAU e artigo 228º, número 1 do CPC.
10.ª-Após a citação a requerida tinha o prazo de 15 dias para deduzir a sua oposição ao PED, prazo esse que se iniciou no dia seguinte ao dia da assinatura do aviso de recepção, conforme resulta do disposto no artigo 230º do CPC:
11.ª-Assim, tendo o prazo sido interrompido, deve iniciar-se no dia seguinte ao dia da notificação.
12.ª-Na contagem do prazo de defesa não se aplica a regra do artigo 248º do CPC (a notificação considera-se feita no terceiro dia posterior ao da elaboração ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja) porque está em causa uma citação e não uma notificação.
13.ª-Em conclusão, se o prazo em curso é um prazo de defesa o primeiro dia do prazo será o dia seguinte, se o prazo em curso decorre de uma notificação o primeiro dia do prazo é o dia seguinte ao que se considera feita a notificação.
14.ª-No caso em apreço não pode existir dúvidas de que o prazo em curso era um prazo de defesa, pelo que, o primeiro dia é o dia seguinte ao da notificação do patrono nomeado.
15.ª-O douto despacho recorrido aplicou erradamente o disposto no artigo 24º nº 1 da Lei nº 34/2004 de 29 de Julho (Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais) e violou o disposto nos artigos 228º e 230º do CPC e artigo 15ºD, número 1, alínea a) do NRAU.
16.ª-Deve o despacho ora recorrido ser revogado, devendo a oposição ser considerada intempestiva e por isso, não apresentada, devendo os autos ser remetidos ao BNA para cumprimento do despejo.

4.2.Recurso subordinado.
 
I-O advogado signatário, só em 7 de Julho, soube da doença da Ilustre colega e do falecimento do marido, situação esta que justifica o que aconteceu antes dessa data e a impossibilidade de poder ter previsto prever que o prazo para a Oposição, terminara um dia antes.
II-Não podia ter-se apercebido, antes, da data em que terminava esse prazo e, se não fora a dolorosa situação já descrita, os primeiros contactos que teve com a Colega, seriam suficientes para garantir a apresentação da Oposição dentro do prazo, visto que cumpriu as regras de diligência normais, razoavelmente exigíveis para o cumprimento dos seus deveres processuais, como acontece em situações normais entre Colegas, que se contactam para esse efeito.
III-À luz do actual conceito de justa causa basta que o facto obstaculizador da prática do acto não seja imputável à parte ou ao seu mandatário para que se verifique uma situação de justo impedimento
IV-No caso vertente, os factos alegados e a prova documental produzida provam ou, pelo menos indiciam fortemente que os factos que impediram a prática do acto dentro do prazo legal, não são imputáveis à parte nem ao seu mandatário.
V-A existirem dúvidas sobre a gravidade, complexidade da situação descrita, bem como sobre as dificuldades e impossibilidade com que, até aquela data, se defrontou o advogado signatário, sempre se justificaria, antes de qualquer decisão de indeferimento do justo impedimento, ouvir a Ilustre Colega, arrolada com a testemunha, que se prontificou a depor. Termos em que se conclui pedindo a revogação da douta decisão de indeferimento do justo impedimento e a aceitação da Oposição, sem o pagamento de qualquer multa, que deve ser mandada devolver ao advogado signatário (que a pagou de seu bolso, por não existir qualquer responsabilidade da requerida no atraso de entrega da Oposição)

5.Ambas as partes contra-alegaram.

6.Nada obsta ao conhecimento dos recursos.

7.A matéria a ter em consideração é a que consta supra.

8.Recurso principal.

Questão: saber como se deve contar o prazo de que o patrona dispõe para apresentar oposição.
           
Em face da forma de contagem feita, conclui-se que na decisão recorrida se entendeu que, tendo a notificação sido feita pela AO a 18, o prazo de 15 dias para apresentar a oposição só começou a correr no terceiro dia posterior à notificação.
         
A L. 34/2004, com alterações da lei 47/2007, dispõe no n.º5 do art.º 24.º que “O prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior inicia-se, conforme os casos:
a)A partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação;”

Quando é que se deve considerar o patrono “notificado”?

Dispõe-se no art.29º, da Portaria nº10/2008, de 3/1, (actualizada pela Portaria n.º 654/2010 de 11 de Agosto) que procedeu à regulamentação da Lei nº34/2004, de 29/7 (Acesso ao Direito e aos Tribunais):

«Todas as notificações, pedidos de nomeação e outras comunicações entre a Ordem dos Advogados e os tribunais, as secretarias ou serviços do Ministério Público, os órgãos de polícia criminal, os profissionais forenses participantes no sistema de acesso ao direito, os serviços da segurança social e o IGFIJ, I.P., devem realizar-se por via electrónica, através de sistema gerido pela Ordem dos Advogados».
A dita portaria, dispondo embora quanto à forma de comunicação, nada dispõe quanto à data em que a notificação se presume feita.
Daí se nos afigurar ser de aplicar as regras previstas no CPC para as comunicações electrónicas.
A tramitação electrónica dos processos, imposta pelo art.º 132.º do novo CPC está regulamenta pela portaria 280/2013 de 26/8.  Aí se define o sistema informático de suporte como sendo no endereço “citius”- art.º 5, estabelecendo-se no seu art.º 13.º o seguinte:
O sistema informático de suporte à atividade dos tribunais assegura:
a)A certificação da data e hora de expedição;

b)A disponibilização ao utilizador de cópia da peça processual e dos documentos enviados com a aposição da data e hora de entrega certificada;
c)A disponibilização ao utilizador de mensagem nos casos em que não seja possível a receção, informando da impossibilidade de entrega da peça processual e dos documentos através do sistema informático.”

Por sua vez, o art.º 248.º do CPC prevê uma presunção de notificação a partir da “certificação” que está enunciada na al.a) atrás referida.
A notificação presume-se feita no 3.º dia posterior ao da certificação da elaboração/expedição (sendo actividade simultânea a elaboração e a expedição).
No fundo, manteve-se a mesma regra dos 3 dias que já vigorava e continua a vigorar –art.º 249.º- para  a notificação via postal.

E é neste contexto que julgamos dever ser entendida a notificação feita pela OA à patrona da requerida, tal como o entendeu o tribunal recorrido.
Não colhe aqui, a nosso ver, a distinção que as recorridas fazem entre notificações para “apresentar defesa” e outras.

De qualquer forma sempre se dirá que mesmo na citação para contestar o prazo só não sofre qualquer dilação, apenas nos casos em que se pode garantir que o citando teve contacto com o acto no próprio dia do início do prazo, como seja, a assinatura do A/R pelo próprio cintando, ou o contacto pessoal com ele.
Sempre que a citação é feita noutra pessoa  -art.º 245.º  - acresce uma dilação de 5 dias.

Tendo a notificação da patrona sido feita pela via electrónica e não por contacto pessoal, ou por correio registado com a/r, não é possível aferir qual o exacto dia em que ocorreu o contacto da notificanda com a notificação, daí que se tenha que recorrer à presunção do conhecimento da notificação, pelo menos, no terceiro dia posterior à expedição da notificação certificada pelo sistema. Essa é a presunção que o legislador tem vindo a entender como consentânea com os “tempos” dos operadores judiciários.
 
Dada a importância do acto da notificação da patrona para contestar, não podemos aceitar que lhe seja dado um tratamento mais desfavorável do que aquele que seria se fosse para outro acto menos solene, como seja responder a um qualquer requerimento da parte contrária.

Assim, julgamos ser de defender que à notificação da patrona da sua nomeação para contestar a acção se aplica a regra geral do art.º 248.º CPC.

E assim sendo, está correcta a contagem feita pelo tribunal, ao considerar que o prazo dos 15 dias terminou a 6/7.

Neste mesmo sentido encontramos o acórdão desta relação, datado de 16-4-2013, proferido no processo 1470/11.7TJLSB, acessível na base de dados da DGSI.
 Não merece pois provimento o recurso das requerentes.

9.Recurso subordinado.
- justo impedimento.

Nos termos do disposto no art.º 140º, nº 1, do CPC: “Considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do acto”.
LOPES DO REGO, Comentários ao Código de Processo Civil, 125, (relativo ao código anterior mas que continua válido para o actual) diz que “O que deverá relevar decisivamente para a verificação do «justo impedimento» – mais do que a cabal demonstração da ocorrência de um evento totalmente imprevisível e absolutamente impeditivo da prática atempada do acto – é a inexistência de culpa da parte, seu representante ou mandatário (…) a qual deverá naturalmente ser valorada em consonância com o critério geral estabelecido no nº 2 do art. 487º do CC (…)”

Ora, como bem se salienta na decisão recorrida, “pelo menos desde 1 de Julho, a requerida e o seu Mandatário sabiam que o prazo se encontrava a correr pelo menos em 25.06.2015, não obstante não saberem desde quando, pelo que não nos parece que saber ao certo quando é que o mesmo se havia iniciado impedisse o Mandatário de apresentar oposição até dia 6.07.2015, acautelando dessa forma que o prazo não decorresse completamente”.

Nada obriga a que se esgotem os prazos. Havendo dúvidas sobre o seu termo, impunha-se praticar o acto o mais rápido possível e não ficar à espera de poder obter a confirmação da data do seu terminus junto da  patrona nomeada.

Devendo o acto ser praticado até 6/7 e tendo desde o dia 1/7 conhecimento de que estava a correr prazo para o praticar, não podemos, em consciência, julgar defensável que não foi praticado até esse dia por “causa não imputável à parte ou ao seu mandatário”.

Nestes termos, não merece censura o despacho que indeferiu o justo impedimento e aceitou a práctica do acto com a multa. 

Pelo exposto, acorda-se em julgar ambos os recursos improcedentes, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas de cada recurso por quem nele ficou vencido.



Lx, 2016/4/7


Teresa Soares
Maria de Deus Correia
Nuno Sampaio
Decisão Texto Integral: