Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
22031/21.7T8LSB-A.L1-2
Relator: PEDRO MARTINS
Descritores: PROCEDIMENTO CAUTELAR COMUM
PRESERVAÇÃO DA PROVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/10/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I - Pode ser requerido um procedimento cautelar comum para preservar o estado de coisas – trabalhos realizados pela requerente – que terá de ser submetido a prova, de modo a possibilitar a produção antecipada de prova de pressupostos do direito de crédito ao pagamento dos trabalhos realizados.
II – Isto porque a produção antecipada da prova, sujeita a contraditório, daria conhecimento à requerida da pretensão da requerente e, com isso, a possibilidade de alterar aquele estado de coisas, impossibilitando ou dificultando em muito aquela produção da prova.
III - O tribunal judicial é competente para o conhecimento de tal procedimento cautelar, mesmo que exista uma convenção para resolver por árbitros os litígios que surgissem entre as partes (artigos 7 e 29 da LAV).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo  identificados:

A 24/09/2021, D-SA, veio requerer um procedimento cautelar contra V-SA, pedindo, sem prévia audiência desta, que:
A. Se ordene a notificação da requerida para se abster de realizar qualquer trabalho, obra ou outro acto, de construção, demolição ou outra natureza, na empreitada que constitui o objecto do contrato celebrado entre as partes;
B. Se ordene a notificação da requerida para se abster de alterar a realidade de facto da empreitada executada pela requerente, por si ou por terceiros, abstendo-se de neles fazer entrar maquinas ou equipamentos ou pessoas, bem como de alterar o seu solo ou sobre ele introduzir qualquer construção, plantação ou inovação;
C. Se ordene a notificação da requerida de tudo o que for ordenado, com a cominação de incorrer na prática do crime de desobediência qualificada, no caso de infringir a providência decretada – art. 375 do CPC.
Para tanto alega, em síntese, que: a requerente e a requerida, respectivamente empreiteiro e dona de obra, celebraram entre si um contrato para a execução de uma empreitada; com fundamento em incumprimento contratual, a requerida aplicou multas contratuais, tendo por fundamento, para além do mais, atrasos na obra que foram provocados pela própria requerida; em 11/08/2021, a requerida comunicou à requerente a resolução do contrato por incumprimento e, com fundamento nesse alegado incumprimento, pretende eximir-se a pagar o preço dos trabalhos executados; à data da propositura do presente procedimento, encontram-se executados trabalhos contratuais que a requerida se recusa a medir e/ou pagar no valor de milhares de euros; nesta data, encontram-se já em obra outras empresas a trabalhar directamente para a requerida e a intervir em trabalhos executados inicialmente pela requerente; o contrato celebrado entre as partes prevê a constituição de um tribunal arbitral para dirimir os litígios decorrentes da execução do contrato entre as partes pelo que será este o tribunal competente para decidir da questão da medição e pagamento dos trabalhos executados pela requerente; podendo a requerente em sede arbitral apresentar documentos ou requerer a realização de uma perícia a fim de verificar em obra as quantidades de trabalho executadas, tal só será possível se, no entretanto, a obra se mantiver no exacto estado em que se encontra desde que a requerente foi impedida pela requerida de continuar com a execução da empreitada; uma vez iniciados os trabalhos pelo novo empreiteiro – que tem indicações para iniciar tais trabalhos até final de Setembro de 2021 -, tornar-se-á impossível determinar, com o necessário grau de certeza e segurança, quais foram os trabalhos efectivamente executados pela requerente e aqueles que o serão pelo novo empreiteiro; impossibilitando assim que a requerente consiga, a final, produzir prova bastante para, cumprindo ónus probatório que sob si impende, ver satisfeito o seu crédito; pretende com esta providência conservar inalterada a configuração dos prédios […] obstando a que no decurso da acção principal se introduzam alterações que dificultem ou prejudiquem a produção de prova com vista à determinação, neste caso, dos trabalhos efectivamente executados pela requerente; como se refere no ac. do TRL de Lisboa de 18/01/2007, proc. 9479/2006-2, “o princípio da legalidade das formas processuais – incluídas as formas incidentais – imporá que se não deva requerer providência cautelar não especificada quando se trate de garantir apenas determinados meios de prova irrepetíveis ou insusceptíveis de posterior apresentação ou produção”; Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, III Volume, 2ª ed., Almedina, 2000, pág. 69, ressalva porém, as situações em que a necessária interferência do princípio do contraditório na produção das provas, ainda que antecipada, é susceptível de tornar infrutífera a diligência, permitindo que, de forma ilegítima ou não, se esfumem os vestígios ou as coisas sobre que incide a produção de prova; sustentando tal autor que, em casos que tais, “não deve ser impedido o recurso a uma providência cautelar não especificada, se esta constituir o mecanismo imprescindível à manutenção e posterior aproveitamento das provas.” Veja-se ainda, a este respeito e em situação idêntica, o ac. do TRG de 26/10/2017, proc. 3346/16.2T8GMR-B.G1. No caso em apreço, caso a requerente requeira a antecipação da prova, v. g (perícia ou inspecção ao local) sem anteriormente obter uma ordem judicial que impeça a modificação da realidade actual da obra, corre o risco de tornar infrutífera tal diligência, isto é, há o receio de alterações na obra a muito breve trecho que prejudicarão invariavelmente tal diligência probatória antecipada. Assim e ainda que a requerente, no seguimento da presente providência, vá requerer a produção antecipada de prova nos termos previstos no art. 419 do CPC, o certo é que tal procedimento, tal como previsto na lei, não tem a bondade de impedir a requerida de praticar actos, nomeadamente a continuação da execução da empreitada, que alterem a realidade da obra e, assim, tornem inútil tal antecipação; daí que apenas com o recurso à presente providência é que a requerente conseguirá, em tempo útil, impedir uma lesão grave e irreparável do seu direito a ver serem pagos os trabalhos por si executados para a requerida e que esta última não quer pagar; assim, pelos motivos supra expostos e tendo em atenção o risco que se pretende prevenir, justifica-se que a providência seja decretada sem prévia audiência da requerida, uma vez que a sua audição, poria em risco o fim da providência, na certeza que caso a requerida venha a ser citada para os presentes autos sem que se mostre decretada a providência, a requerida irá diligenciar pela continuação da empreitada por terceiros, perdendo, assim, a providência cautelar todo o efeito útil e desejado,
A 27/09/2021, o tribunal considerou que a requerente não tinha alegado factos bastantes que levassem à conclusão de que a audição da parte contrária possa pôr em causa o fim ou a eficácia da presente providência, pelo que ordenou logo a citação da requerida, o que foi logo cumprido pela secção de processos.
A 13/10/2021, a requerida apresentou oposição dizendo, em síntese da mesma, que: (ii) O meio processual adequado à pretensão da requente não é este procedimento cautelar, mas sim o incidente de produção antecipada de prova, não sendo admissível convolação, atento o princípio da legalidade das formas processuais; (iii) este tribunal judicial é absolutamente incompetente para convolar a providência cautelar requerida e conhecer de um eventual incidente de produção antecipada de prova, atenta a convenção de arbitragem celebrada entre as partes, tendo inclusivamente a requerente já instaurado acção arbitral; (iv) é no foro arbitral que eventuais medidas de preservação da prova têm de ser requeridas, nomeadamente em sede de árbitro de emergência, enquanto o tribunal arbitral não estiver constituído; (v) os fundamentos para decretar a providência cautelar não estão preenchidos porquanto (a) a providência cautelar não é necessária (a prova pode ser feita sem necessidade de parar a obra), (b) não há fumus boni iuris e (c) o prejuízo que o decretar da providência cautelar causaria à requerida é manifestamente desproporcional em relação ao prejuízo que a requerente pretende evitar; (vi) verifica-se a inutilidade do procedimento cautelar, porquanto os trabalhos de conclusão da empreitada e demais trabalhos do aldeamento turístico da requerida e que, na tese da requerente, impactariam os trabalhos por si executados foram já (e continuarão a sê-lo) executados; (vii) a narrativa da requerente não corresponde à realidade dos factos.
A 10/11/2021, foi proferida decisão que julgou procedente a excepção de incompetência absoluta deste tribunal, por preterição de tribunal arbitral voluntário e, consequentemente, absolveu a ré da instância.
A requerente veio recorrer desta decisão – para que seja revogada e para que se julgue o tribunal recorrido como competente para decretar a providência requerida -, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, transcritas na parte minimamente útil e com simplificações:
B. A providência de produção antecipada de prova não tem a natureza de processo conservatório, o que permitiria acautelar o receio da apelante;
C. Perante tal reconhecimento por banda da requerida de que não obstante ter sido citada para se opor à presente providência, continua a executar trabalhos, é impossível tornar-se ainda mais urgente e necessário o decretamento da providência requerida!
D. Assim e uma vez iniciados os trabalhos por banda de novo empreiteiro tornar-se-á impossível determinar, com o necessário grau de certeza e segurança, quais foram os trabalhos efectivamente executados pela requerente e aqueles que o serão pelo novo empreiteiro;
E. Tudo isto, uma vez que pende sobre a requerente o ónus da prova da efectiva execução dos trabalhos cujo pagamento reclama, tornará de todo impossível o cumprimento de tal encargo;
F. Facto que penderá em evidente e desproporcional desfavor da requerente, a qual verá coarctadas as possibilidades de recorrer a todos os meios que a lei lhe confere para fazer valer os seus direitos;
G. O que é motivo suficiente para que a requerente tema a perda do efeito útil que a decisão a proferir na acção arbitral, a que esta providência ficará apensa, venha a repercutir-se na sua esfera jurídica;
H. Impossibilitando-se assim que a requerente consiga, a final – proferida a decisão na acção a instaurar –, produzir prova bastante para, cumprindo ónus probatório que sob si impende, ver satisfeito o seu crédito;
I. O recurso à providência de produção antecipada de prova levará a que, no entretanto, a requerida prossiga com a empreitada e prejudique, a final, o direito de crédito da requerente.
J. e T. É falso o alegado pela requerida quanto ao momento de constituição do tribunal arbitral, já que à data da entrada da presente providência (22/09/2021) não havia ainda a requerente dado início à constituição do tribunal arbitral;
K. Pelo que não corresponde à verdade que o presente procedimento, ou qualquer produção antecipada de prova, poderia/deveria já ter sido requerido no âmbito dessa sede arbitral;
Acresce que,
L. Decorre dos artigos 20 a 28 da Lei da Arbitragem Voluntária (Lei 63/2011, de 14/12) a competência dos tribunais arbitrais para o decretamento de providências cautelares e ordens preliminares;
M. O art. 29 do supracitado diploma legal prevê que “Os tribunais estaduais têm poder para decretar providências cautelares na dependência de processos arbitrais”;
N. Ora, a constituição de um tribunal arbitral é lenta e morosa (sobretudo numa arbitragem ad hoc), o que não se compadece com a natureza urgente de um procedimento cautelar, realçando-se, também, a relutância dos tribunais arbitrais em decretar providências ex parte;
O. Sendo certo que, muitas vezes, essa é a única forma de não defraudar a finalidade pretendida com a providência;
P. Razão pela qual a jurisprudência portuguesa anterior àquela LAV era já unânime no entendimento de que a convenção de arbitragem não impedia o requerimento a um tribunal estadual de uma providência cautelar;
Q. A nova LAV veio já introduzir várias normas inovadoras no ordenamento jurídico português, constando seu no artigo 7 o princípio geral de que “[n]ão é incompatível com uma convenção de arbitragem o requerimento de providências cautelares apresentado a um tribunal estadual, antes ou durante o processo arbitral, nem o decretamento de tais providências por aquele tribunal”;
[…]
U. Não corresponde à verdade que o presente procedimento poderia/deveria já ter sido requerido no âmbito dessa sede arbitral e, consequentemente, estaria ao tribunal a quo vedada a possibilidade de decretar a presente providência;
V. Inexistindo incompatibilidade entre o presente recurso aos tribunais comuns e uma vez que nem sequer havia a requerida dado inicio à constituição do tribunal arbitral, é falso que esta estivesse obrigada a recorrer à figura do árbitro de emergência;
[…]
BB. Destarte, o tribunal a quo é competente para decidir o decretamento da providência cautelar comum requerida;
CC. Sendo que a requerente não deveria ter lançado mão da providência de produção antecipada de prova mas sim do presente expediente processual;
DD. Pelo que deve ser revogada a decisão ora recorrida e julgar-se competente o tribunal a quo para decretar a providência requerida […].
[…]
A requerida contra-alegou, terminando as suas contra-alegações com a seguinte síntese, transcrita na parte que importa e com simplificações:
(3) Com efeito, a causa de pedir deste procedimento cautelar não é assegurar qualquer direito de crédito sobre a recorrida, mas tão só o receio da recorrente de ficar impedida da produção de prova que, na sua narrativa, terá de ser feita quando for atingida a fase da prova na acção principal e que a recorrente pretenderia, impropriamente, acautelar através do presente procedimento.
(4) Consequentemente, os pedidos deduzidos pela recorrente visam suspender todos os trabalhos até à produção de prova na acção arbitral já instaurada, visando tal suspensão tão só assegurar a prova a fazer naqueles autos.
(5) Tal foi, de resto, evidenciado na sentença recorrida […]
(6) Perante tal causa de pedir e tais pedidos, se não existisse convenção de arbitragem – como, de facto, existe -, o incidente de produção antecipada de prova, previsto no art. 419 do CPC, sempre seria o meio processual adequado para a recorrente assegurar a produção de qualquer meio de prova que considere fundamental, mas nunca a instauração da presente providência cautelar, existindo uma nulidade processual, nos termos dos artigos 193/3 e 196 CPC […].
(7) Existindo convenção de arbitragem, este tribunal judicial é incompetente para convolar e/ou conhecer de qualquer incidente de produção antecipada de prova, sendo o tribunal arbitral o competente para ordenar quaisquer diligências de prova.
(8) Sendo que, não estando o tribunal arbitral ainda constituído – como é o caso -, o meio próprio de tutela dos pretensos direitos e interesses de que a recorrente se arroga titular é o árbitro de emergência.
(9) Como resulta do Acórdão de 18/01/2007 do Tribunal da Relação de Lisboa, se o que se pretende é a garantia de direito à prova da situação jurídica que fundamenta os pedidos deduzidos na acção principal, então não existe correspondência directa entre a garantia requerida e a situação para que é peticionada a tutela na ação principal, tratando-se de se acautelar a prova, não o direito.
(10) Aliás, já ALBERTO DOS REIS entendia que a produção antecipada de prova não pode, em rigor, classificar-se como providência cautelar, pois a primeira basta-se com a alegação de que se pretende recolher certas provas e que há justo receio que se houver demora na produção dela, a prova venha a perder ou a dificultar-se muito, não se exigindo a prova sequer indiciária da existência de um direito (o fumus boni iuris) – condition sine qua none do decretamento de uma providência cautelar.
(11) Entendimento este, de igual forma perfilhado pelo tribunal a quo na sentença recorrida […].
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(12) A produção antecipada de prova é uma figura autónoma das providências cautelares e dúvidas não há que a instrução num processo arbitral é da competência exclusiva do tribunal arbitral, nos termos dos artigos 30 e 34 da LAV.
(13) E, para além de as diligências de produção antecipada de prova não terem a natureza de processos conservatórios, os processos cautelares tampouco compreendem as diligências antecipadas de prova, reguladas no artigo 419 CPC.
(14) Dado que o incidente de produção antecipada de prova faz parte da instrução da acção principal e dado que existe convenção de arbitragem celebrada entre as partes, dúvidas não restam de que a acção principal é a arbitragem já instaurada pela recorrente e a respectiva instrução é da competência do tribunal arbitral.
(15) Sendo a instrução do processo arbitral da competência exclusiva do tribunal arbitral, evidentemente qualquer diligência antecipada de prova tem de ser requerida em sede arbitral.
(16) Com o que se confirma a incompetência absoluta deste tribunal judicial para convolar a providência cautelar requerida e conhecer de um eventual incidente de produção antecipada de prova, sob pena de preterição de tribunal arbitral, nos termos do art. 96/-b, o que desde já se alega para os efeitos dos arts. 97/1, 98 e 99/1, todos CPC – tendo o tribunal a quo chegado à mesma conclusão.
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(17) Entre as partes foi celebrada uma convenção de arbitragem no contrato de empreitada em discussão nestes autos, de acordo com a qual “Todos os litígios emergentes deste contrato ou com ele relacionados serão definitivamente resolvidos por arbitragem de acordo com o regulamento de arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (Centro de Arbitragem Comercial), por um ou mais árbitro(s) nomeado(s) nos termos do regulamento.”
(18) A recorrente instaurou o processo arbitral em 24/09/2021, pelo que nos termos do art. 2/3 do regulamento, na ausência de disposição em contrário, é aplicável o regulamento entrado em vigor em 01/04/2021.
(19) Nos casos em que o tribunal arbitral ainda não está constituído e se pretende a preservação da prova – conforme sucede no caso sub judice -, o meio adequado à tutela dessa pretensão é o decretamento de uma providência cautelar urgente ou de ordem preliminar urgente por árbitro de emergência, considerando-se urgente “a providência cautelar ou a ordem preliminar que não possa aguardar pela constituição do tribunal arbitral”, nos termos do art. 5/2 do regulamento.
(20) Como refere a doutrina, a figura do árbitro de emergência visa garantir “(…) o recurso à tutela cautelar arbitral mesmo antes da constituição do tribunal arbitral. (…) As medidas cautelares usualmente requeridas ao árbitro de emergência prendem-se com (…) medidas de preservação de prova.”
(21) Pelo que andou bem o tribunal a quo […].
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(22) Em qualquer caso, sempre se verificaria uma inutilidade do procedimento cautelar, porquanto os trabalhos de conclusão da empreitada e demais trabalhos do aldeamento turístico, que, na tese da recorrente (com a qual se discorda), impactariam os trabalhos por si executados, foram já (e continuarão a ser) executados […]
(23) Ora, a pretensão da requerente […], perdeu, assim, toda a actualidade e utilidade, já não importando qualquer efeito útil a tutelar em sede cautelar.
(24) Evidentemente, tendo resolvido o contrato de empreitada em 11/08/2021, a requerida tinha e tem de dar continuidade aos trabalhos, para não comprometer (ainda mais) a comercialização das unidades do empreendimento e para atenuar os (e, em alguns casos, evitar o agravamento dos) avultadíssimos prejuízos que já decorriam do atraso verificado em obra e que se agravavam com a paragem dos trabalhos subsequentemente à resolução.
(25) Até ao momento, os trabalhos prosseguem diariamente, com o desenrolar normal da obra, não estando a obra no estado em que se encontrava à data da resolução do contrato de empreitada, a requerente fica integralmente desprovida de qualquer interesse processual em agir e prosseguir com os autos, o que sempre tornaria absolutamente inúteis as pretensas providências cautelares nos termos requeridos.
(26) Ressalve-se, que, de resto, não seria nunca necessário proceder-se à paralisação da obra para medir as quantidades de trabalho executadas, encontrando-se tais trabalhos, desde o começo da obra até ao momento da resolução do contrato, devidamente documentados, quer por meio de levantamento fotográfico e em vídeo (incluindo recursos a drones), relatórios, correspondência trocada entre as partes e actas de reunião de obra.
(27) Aliás, note-se que nunca foi sequer necessária a deslocação à obra, muito menos, a paralisação de quaisquer trabalhos para medir elementos no local das obras ou discutir o conteúdo e preço dos respectivos autos de medição. Com efeito, todas as divergências ocorridas ao longo da obra em torno da aprovação dos autos de medição apresentados pela requerente foram resolvidas pelas partes através da análise e tratamento remoto dessa mesma documentação, nomeadamente por meios telemáticos.
(28) O interesse processual e a utilidade da lide são pressupostos processuais cuja falta determina a extinção da instância e a consequente absolvição da requerida, segundo o disposto na alínea e) do art. 277 do CPC […].
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Questão que importa decidir: a incompetência absoluta do tribunal e outras que o tribunal recorrido tiver deixado de conhecer, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, se se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquelas, sempre que se disponha dos elementos necessários e se necessário cumprindo o contraditório (art. 665/2-3 do CPC).
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Os factos que importam para esta decisão são os que estão relatados acima.
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A fundamentação desta decisão foi a seguinte, em síntese:
[…C]om este procedimento, a requerente não pretende assegurar garantias patrimoniais capazes de satisfazer o crédito mas tão só, conservar prova para apresentar em tribunal arbitral […].
Na verdade, e vista a natureza dos procedimentos cautelares a que acima se fez referência, não será por via da propositura de uma tal providência que se asseguram ou conservam meios de prova. Para tal prevê o nosso CPC, o incidente de produção antecipada de prova, previsto no art. 419 do CPC.
Conforme foi decidido no acórdão do TRL de 18/01/2007, proc. 9479/2006-2: “O procedimento cautelar não especificado, ainda que incidental, visa acautelar um direito, ainda que de forma provisória e precária. A produção antecipada de prova, ao invés, constitui incidente destinado tão só a acautelar a produção de prova.”
[…]
Claramente, a requerente pretende acautelar a prova e não o direito.
[Pelo que] havemos de concluir que não estamos perante o requerimento de uma medida que vise acautelar o efeito útil da acção, mediante a composição provisória dos interesses conflituantes, mantendo ou restaurando a situação de facto necessária à eventual realização efectiva do direito. Estamos, apenas, perante um pedido de conservação de provas.
Assim, este tribunal será absolutamente incompetente para tal desiderato, dado que o incidente de produção antecipada de prova faz parte da instrução da acção principal e dado que existe convenção de arbitragem celebrada entre as partes, e que já foi intentada a acção principal, cumprirá a esse tribunal a instrução da causa.
Nos termos do Regulamento de Arbitragem que entrou em vigor em 01/04/2021, “Até à constituição do tribunal arbitral, e salvo expressa convenção em contrário, qualquer das partes da convenção de arbitragem pode requerer, nos termos do regulamento sobre o árbitro de emergência, incluído no anexo I ao presente regulamento, o decretamento de providência cautelar urgente ou de ordem preliminar urgente por um árbitro de emergência nomeado pelo presidente do centro.”
E dispõe o art. 7/1 do regulamento sobre o árbitro de emergência: “Salvo o disposto nos números seguintes, a decisão do árbitro de emergência é proferida no prazo máximo de quinze dias a contar da data em que o procedimento lhe tenha sido transmitido ou da data em que o requerimento de árbitro de emergência tenha sido transmitido ao requerido, caso seja posterior.”
É nestes termos de direito que a pretensão da requerente ficará assegurada.
Assim, sendo, está-se perante uma excepção dilatória de preterição do tribunal arbitral, nos termos do disposto nos arts. 96/-b, 97/1, 98, 99 e 577 e 578 a contrario, todos do CPC.
[…]
Ora, aqui, resulta claramente que o litígio e a produção de prova requerida, situa-se no âmbito do respectivo âmbito de aplicação, conforme se deixou explicado.”
*
Apreciação:
O tribunal recorrido declarou a sua incompetência absoluta por preterição de tribunal arbitral voluntário.
Visto que o que foi pedido foi uma providência cautelar, a declaração de incompetência em causa quer dizer que o tribunal recorrido considera que só o tribunal arbitral pode decretar providências cautelares relativamente a processos que tenham de correr num tribunal arbitral.
O artigo 7 da Lei da Arbitragem Voluntária dispõe que “Não é incompatível com uma convenção de arbitragem o requerimento de providências cautelares apresentado a um tribunal estadual, antes ou durante o processo arbitral, nem o decretamento de tais providências por aquele tribunal.” E o art. 29 da mesma Lei acrescenta que: “Os tribunais estaduais têm poder para decretar providências cautelares na dependência de processos arbitrais, independentemente do lugar em que estes decorram, nos mesmos termos em que o podem fazer relativamente aos processos que corram perante os tribunais estaduais.”
Sendo assim, a decisão recorrida está errada, pois que a lei impõe a conclusão contrária àquela que tirou.
Repare-se, aliás, que a requerida nem sequer punha em causa a competência do tribunal para os pedidos cautelares. O que a requerida dizia é que o tribunal não podia convolar a providência num incidente de antecipação de prova, porque não tinha competência para este. Ora, esta questão só se colocaria depois de o tribunal considerar que devia ser feita uma convolação do que foi pedido para o que devia ter sido pedido.
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Mas, formalmente, a argumentação do tribunal recorrido não é esta, mas sim a seguinte: o que a requerente quer é uma produção antecipada de prova e para esta só o tribunal arbitral é competente.
Só que, como se disse, a incompetência do tribunal aprecia-se perante o pedido dos requerentes e não perante aquilo que o tribunal entende que estes deviam querer.
Ou, de outra perspectiva, o tribunal só poderia dizer que era incompetente depois de convolar o pedido da requerente para um pedido de produção antecipada de prova.
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A requerida dizia, no entanto, também, que “era no foro arbitral que eventuais medidas de preservação da prova têm de ser requeridas, nomeadamente em sede de árbitro de emergência, enquanto o tribunal arbitral não estiver constituído.”
Argumentação que também foi seguida pelo tribunal recorrido, no meio da fundamentação da decisão.
Ou seja, agora, segundo a requerida e o tribunal recorrido o que a requerente queria é um procedimento cautelar (de preservação da prova) e esse tem que ser requerido a um árbitro de emergência no tribunal arbitral.
Isto é triplamente contraditório:
(i) Por um lado, diz-se que o que a requerente quer não é uma providência cautelar mas uma produção antecipada de prova e por isso o tribunal judicial não é competente. Mas para se dizer qual era o procedimento a seguir já se diz que o que a requerente quer é uma providência cautelar;
(ii) por outro lado, já se viu que o tribunal judicial é competente para decretar providências cautelares, pelo que, só vendo a pretensão da requerente como incidente de produção antecipada de prova é que o tribunal judicial pôde dizer que não era competente para se pronunciar sobre a pretensão da requerente;
(iii) terceiro, afinal, para a requerida e para o tribunal judicial a pretensão de conservação de provas consubstancia um procedimento cautelar, quando a tese principal por eles defendida é que a pretensão da requerente é uma produção antecipada de prova.
Pelo que, esta argumentação falha completamente como fundamentação da declaração de incompetência absoluta do tribunal judicial: o tribunal judicial, por força do art. 29 da LAV tem competência para decretar providências cautelares, não sendo essa competência afastada pela regulamentação do árbitro de emergência que não se sobrepõe à lei.
Em suma, não se verifica a incompetência absoluta do tribunal por preterição de tribunal arbitral (art. 96/-b do CPC).
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O tribunal recorrido não conheceu de outras questões porque a incompetência declarada o impedia, logicamente, de o fazer.
Mas, afastada esta excepção, as outras questões ficam por conhecer e este tribunal de recurso tem que se pronunciar sobre elas se o puder fazer, isto é, se tiver elementos suficientes para o efeito (art. 665/2 do CPC).
O que se justifica particularmente no caso visto que foi essencialmente com base na parte II da oposição da requerida que foi tomada a decisão recorrida.
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A questão inicial que a requerida colocava e que era a questão principal, era que o meio processual adequado à pretensão da requente não era este procedimento cautelar, mas sim o incidente de produção antecipada de prova.
O tribunal recorrido também aderiu a esta fundamentação.
Quer isto dizer que a questão principal – já discutida pelas partes e sobre a qual o tribunal recorrido já se pronunciou – era a da inadmissibilidade da utilização da providência cautelar comum porque havia um outro meio processual adequado à pretensão da requerente, ou seja, o incidente de produção antecipada de provas. Este TRL está pois em condições de decidir esta questão e pode-se desde já avançar que também aqui a requerida não tem nenhuma razão, nem a tem a decisão recorrida.
Aliás, como já se viu acima, a requerida diz expressamente que a pretensão da requerente se traduz uma providência cautelar… embora só no âmbito do processo que viesse/estiver a correr termos no tribunal arbitral.
Só por si isto já indicia que a solução correcta não é esta.
Se se ler a norma que prevê os pressupostos do procedimento cautelar comum – art. 362 do CPC – é nítido que, no caso, todos eles estão reunidos, segundo as alegações da requerente. Se estas alegações de facto não se provarem a pretensão improcede, mas essa é outra questão.
O acórdão do TRL de 2007 e a posição de Abrantes Geraldes seguida por esse tribunal apontam no mesmo sentido. E também aponta claramente no mesmo sentido o ac. do TRG invocado pela requerente, relativamente ao qual a requerida diz que “julgou uma situação absolutamente distinta da dos presentes autos, pois estava em causa a prova dos limites do prédio, o prejuízo ao direito à demarcação “e, por via disso, o direito de propriedade sobre uma parcela de terreno”, ou seja, estava em causa acautelar um direito e não apenas um meio de prova do mesmo”, o que é uma evidente petição de princípio pois que um dos pontos que se discute, precisamente, neste caso, é se a requerente não pretende acautelar um direito (pela via da preservação do estado de coisas que possibilite a prova dos pressupostos do direito…).
A requerente quer preservar, não a prova, mas o estado de coisas sobre o qual a produção de prova terá de recair. E isso como única forma de poder vir a provar os pressupostos do seu direito de crédito: se esse estado de coisas desaparecer, ela só dificilmente poderá produzir prova sobre os trabalhos que efectivamente realizou, já que a perícia terá, para o efeito, que destruir as obras que entretanto possam ter sido feitas e mesmo assim sabe-se lá se o que ficar a descoberto permitirá a perícia – e por isso estará muito dificultada a produção de prova sobre os pressupostos do seu direito (sendo que é a ela que cabe o ónus da prova do cumprimento da obrigação correspondente ao direito de crédito ao pagamento: art. 342/1 do CC). E muito naturalmente a possibilidade da alteração desse estado de coisas aumentaria exponencialmente se a requerida tivesse conhecimento de ter sido requerida a providência cautelar. O que é mais um argumento para a necessidade da providência cautelar visto que o regime da produção antecipada da prova, com a observância obrigatória do contraditório – art. 420/2 do CPC – daria esse conhecimento à requerida. E, ao mesmo tempo a demonstração de que outras providências – como a antecipação da prova – não são aplicáveis.
Com o que estão demonstrados os pressupostos do procedimento cautelar comum (art. 362/1 do CPC).
Não se trata, pois, repete-se, de preservar a prova, mas sim de preservar/conservar o estado de coisas que permita a produção de prova, até que seja requerida e possibilitada a produção antecipada de prova, pois que, caso esta fosse requerida antes disso, como ela teria que ser precedida de contraditório, ficaria, muito provavelmente, sem efeito útil.
Daí que a posição de Abrantes Geraldes (nas páginas 61 a 70 da obra citada na edição de 1998), bem sintetizada pela requerente, na passagem do requerimento inicial citada acima, seja o espelho da situação dos autos.
E tanto o é que a requerida também o admite implicitamente, ao dizer que “o entendimento de Abrantes Geraldes, referido [pela requerente], não tem aplicação ao caso concreto, porquanto nas decisões jurisprudenciais mencionadas por esse autor, foi a obrigatoriedade de se fazer cumprir o contraditório em sede de produção antecipada da prova que motivou o juiz a decretar a medida cautelar, por considerar que o contraditório inerente àquele incidente tornaria tal diligência infrutífera, na medida em que se esfumariam os vestígios ou as coisas sobre que incidiria a produção de prova. Sucede que, no caso concreto, tal preocupação não tem acolhimento, atento este tribunal ter bem decidido citar previamente a requerida para efeitos de exercício do direito ao contraditório, que agora se exerce.”
Ou seja, a requerida admite que a posição de Abrantes Geraldes tinha aplicação ao caso quando foi requerido o procedimento cautelar, só deixando de o ter por força do despacho judicial que determinou a observância do contraditório.
Ou seja, a situação dos autos, tal como descrita pela requerente – o que não quer dizer que corresponda forçosamente à realidade – era uma situação típica (embora, perante a extensão do requerimento inicial, se possa ter tornado difícil a percepção disso) em que se justificava um procedimento cautelar comum em substituição da produção antecipada de prova, para evitar que a necessária observância do contraditório retirasse toda a eficácia à pretensão da requerente de produzir prova sobre o cumprimento da obrigação para assegurar o direito de crédito.
O despacho do tribunal, ao determinar a citação da requerida, sem acrescentar que se esperasse pelo trânsito de tal decisão (que poderia prejudicar a pretensão da requerente pelo que esta teria que ter o direito de recorrer dela), poderá ter levado à frustração dessa pretensão.
A requerida entende que assim demonstra que ao caso não é aplicável a providência cautelar. Mas é o contrário que se demonstra: se a providência cautelar se justificava, sendo que o despacho judicial posterior pode ter levado ao desaparecimento da justificação, o que importa é que ela, antes de tal despacho, se justificava.
Em suma, o princípio da legalidade das formas processuais (decorrente de uma interpretação lata do art. 362/3 do CPC, e referido, para além de nos acórdãos acima citados, também no ac. do TRE de 07/06/1990, CJ.1990.III, págs. 283-285) de modo algum implica, no caso, que não pudesse ser requerida a providência cautelar destinada a assegurar o estado de coisas sobre o qual a produção de prova terá que recair.
Pelo que, não há razão para dizer que o réu deve ser absolvido da instância pela verificação de uma excepção dilatória inominada (artigos 362/3 e 576/2 do CPC).
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Diz a requerida que é pressuposto da providência cautelar que o prejuízo que o decretar da providência cautelar causaria à requerida não seja manifestamente desproporcional em relação ao prejuízo que a requerente pretende evitar.
Ora, desde logo a afirmação não é correcta, não tendo sequer sido invocada qualquer doutrina ou jurisprudência que a acompanhe.
A questão da desproporção do prejuízo não é um pressuposto do procedimento cautelar comum, mas sim uma válvula de escape que possibilita ao juiz a não aplicação de uma providência cautelar apesar de estarem verificados os pressupostos dela (art. 368/2 do CPC).
O que, por um lado, quer dizer que a aplicação de tal cláusula dependerá da prévia verificação dos pressupostos das providências pedidas, o que implica, quando houver necessidade disso, a produção de prova sobre os factos alegados pela requerente.
E, por outro lado, que em vez da recusa da aplicação das providências, o juiz utilize outros remédios, como por exemplo a aplicação de uma providência menos gravosa que já não implique aquela desproporção (art. 376/3 do CPC) – por exemplo, no caso, a suspensão das obras até que, num prazo razoável, fosse requerida a produção de prova sobre o estado de realização da prestação da requerente (em muito menor medida, por isso, do que as pedidas pela requerente, que seguiu a posição do ac. do TRG que, esta sim, se pode, talvez, considerar demasiado gravosa e que não parece dever ser seguida por desnecessária: a situação só deve ser mantida até ser produzida prova antecipada, não até ser produzida toda a prova) - ou, noutras situações, que a faça depender da prestação de caução (art. 374/2 do CPC) ou a substitua por caução (art. 368/4 do CPC).
Pelo que não há mais este pressuposto das providências.
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Quanto “à inutilidade do procedimento cautelar, porquanto os trabalhos de conclusão da empreitada e demais trabalhos do aldeamento turístico da requerida e que, na tese da requerente, impactariam os trabalhos por si executados foram já (e continuarão a sê-lo) executados”, é também evidente que não é procedente, nem mesmo sob a vertente, agora invocada no recurso, da perda do interesse processual em agir, e muito menos ainda por já haver prova do estado de coisas (pois que a requerente não é obrigada a confiar na prova produzida unilateralmente pela requerida).
Se for como a requerida diz – o que depende de prova a produzir –, poderá vir a concluir-se pela inutilidade superveniente da providência, o que só por si não quer dizer que ela era inútil desde o início.
Ou também pode ser que elas fossem inúteis antes mesmo de serem requeridas, porque os trabalhos já tinham continuado antes disso (o que, aliás, em parte já se sabe ser o caso, porque a requerente assim o disse). Ou que se tenham apenas tornado inúteis por força do despacho judicial que determinou a citação da requerida, sem ter acautelado a hipótese de recurso por parte da requerente contra tal despacho. Mas também tudo isto depende de prova a produzir.
E todas estas hipóteses podem levar a diferentes consequências, nem que seja a nível da distribuição das custas do procedimento, com óbvio interesse para todas as partes, o que implica que o procedimento não pudesse findar sem antes tal ser discutido.
O mesmo se diga, por fim, quanto ao argumento da “narrativa da requerente não corresponde[r] à realidade dos factos.” Está dependente de prova, pelo que nunca poderia levar à improcedência das providências sem antes se produzir a prova.
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A distinção feita por Alberto dos Reis (lembrada pela requerida através do TRE de 25/05/2018, proc. 242/14.1T9TMR.E1), entre os procedimentos cautelares e a produção antecipada de prova estando, evidentemente, certa, não tem nenhum interesse para a questão dos autos. Ou seja, não interessa, por exemplo, lembrar que a produção antecipada da prova não depende do pressuposto do fumus bonis juris, pois que quando se diz isso se está a explicar que o incidente de produção de prova depende da verificação de menos pressupostos; ora, no caso, não se está a discutir a verificação dos pressupostos da produção antecipada da prova.
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Pelo exposto, julga-se procedente o recurso, revoga-se a decisão recorrida, e declara-se que não se verifica a excepção dilatória inominada da violação do princípio da legalidade dos procedimentos cautelares e que nada obsta a que o procedimento cautelar prossiga os seus termos com produção de prova sobre os factos relevantes para a decisão da procedência ou improcedência das providências cautelares pedidas pela requerente.         
Custas, na vertente de custas de parte, pela requerida (que é quem perde o recurso).

Lisboa, 10/03/2022
Pedro Martins
Inês Moura
Laurinda Gemas