Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2164/10.6TCLRS.L1-2
Relator: TERESA ALBUQUERQUE
Descritores: TRESPASSE
CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
TRANSACÇÃO JUDICIAL
CULPA IN CONTRAHENDO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/06/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I– O regime de responsabilidade plural passiva que melhor quadra à responsabilidade civil pré-contratual advinda da celebração de um contrato de mediação nulo, por objecto legalmente impossível, é o da responsabilidade solidária, sendo esse regime o que resultou consagrado no DL 211/2004 de 20/8 para a mediadora.
II– A transacção que teve lugar nos autos entre os seus autores e a neles a 2ª R. (reconvinte nos mesmos e que no contrato de mediação interveio como cliente), e que se analisa num mero cruzamento da desistência dos pedidos, não evidencia a existência de um negócio que tenha envolvido qualquer dos meios de satisfação do direito do credor mencionados no art 523º CC.
III– Por assim ser, não pode concluir-se, em função dessa transacção, que tenha resultado extinta a dívida também relativamente à 1ª R., mediadora, apesar de ter sido demandada com aquela (2ª R.) em regime de solidariedade.
IV– São irrelevantes para o valor da acção, apurado nos termos do nº 2 do art 299º CPC, vicissitudes posteriores que importem a desistência do pedido reconvencional.
V– No contexto da responsabilidade por culpa “in contrahendo” pela realização de um trespasse nulo em função da impossibilidade legal do seu objecto, o pedido da “devolução” das quantias pagas no âmbito do mesmo, não se assume como efeito da nulidade por decorrência do disposto no art 289º CC, mas como indemnização, em função da ilicitude específica em apreço – estão em causa nessa “devolução” os danos correspondentes ao interesse contratual negativo, ou de confiança, devendo a empresa de mediação colocar os AA. na situação em que eles se encontrariam se não tivessem chegado a ocorrer negociações que culminaram num negócio nulo.
VI– Por isso, a sentença que condenou tal empresa a indemnizar os AA. pelas quantias que estes entregaram à cliente no negócio (a referida 1ª R. que interveio na transacção supra referida), não sofre de nulidade por omissão ou excesso de pronúncia, tão pouco, por condenação em objecto diverso do pedido, acrescendo que a condenação naquela indemnização não pressupunha a declaração da nulidade do trespasse.
VII– A circunstância de ter resultado provado que a 1ª R, empresa de mediação, apenas sabia, à data do trespasse, o que lhe tinha sido referido pela cliente - que tinha sido pedida a licença de exploração do estabelecimento e que se aguardava a sua emissão – não impede a sua condenação pela violação da obrigação que lhe advinha da al b) do art 16º do DL 211/2004 de 20/8, visto que lhe cabia ter-se certificado «por todos os meios ao seu alcance» se essa licença existia, o que não fez, sendo que, se o tivesse feito, teria concluído que essa licença estava pedida, mas não seria concedida sem a realização de obras no imóvel.
VIII– A empresa de mediação violou também os deveres a que se reportam as als d) e e) do art 16º desse diploma legal, ao ter admitido mediar a celebração do contrato de trespasse em separado do de sublocação do espaço em que estava instalado o estabelecimento comercial, por bem saber que tais contratos estavam objectiva e finalisticamente interligados, tanto para o cliente, como para o interessado, com o que pôs em causa a exactidão e clareza do negócio global que se pretendia, e concorreu para que o mesmo, na sua intrínseca globalidade, pudesse não vir a ter lugar, como acabou por suceder.
IX– O que os factos demonstram, sem necessidade da adição de outros, é que não houve recusa dos AA. em celebrar o contrato de sublocação, antes tendo havido a rejeição justificada do contrato de trespasse e, em consequência, a do contrato de sublocação.
X– A mediadora litigou de má fé porque à data da contestação já conhecia o estado da pendência da referida licença - que não permitia aos AA. a exploração legal e imediata do estabelecimento- e, não obstante, defendeu-se proferindo declarações contrárias ao que sabia não ser verdade.

(Sumário elaborado pelo Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.


Relatório:


I–  José e Julieta, em 7/3/2010 instauraram  acção declarativa de condenação com processo comum, sob a forma sumária, contra  “M………., Mediação Imobiliária. Lda” e C………, pedindo que ambas as RR. sejam solidariamente condenadas a:
a)- Ver julgado nulo e de nenhum efeito o contrato de trespasse celebrado por eles  e a 2ª R. e intermediado pela 1ª;
b)- Devolvê-los à situação anterior à outorga do contrato de trespasse, nomeadamente através da devolução de todas as quantias que eles pagaram no âmbito de tal;
c)- Pagar-lhes uma indemnização pelos danos não patrimoniais por eles sofridos em consequência directa, necessária e adequada da suas actuações, e que deverá ser quantificada em sede de execução de sentença, mas que deverá ser arbitrada em quantia nunca inferior a € 25.000,00.
d)- Pagar-lhe  todas as quantias referentes a juros, vencidos e vincendos, à taxa legal.

Alegam que viram um anúncio relativo ao trespasse de um estabelecimento de “snack bar” publicado pela 1ª R., que é mediadora imobiliária, ficaram interessados no negócio e contactaram essa R. O representante da mesma assegurou a excelência do negócio, que tinha um grande aviamento e aptidão legal para o fim a que se destinava. Tendo ocorrido uma reunião que abrangeu a 2ª R. o negócio foi celebrado em 12/1/2010, através de instrumento escrito elaborado pela 1ª. Nesse escrito ficou estabelecido que a 2ª R. trespassava aos AA. o estabelecimento comercial em causa, pelo preço total de € 50.000,00, que seria pago em prestações, a 1ª no montante de 10,000.00 €, que os AA. logo pagaram, e o remanescente em prestações nunca inferiores a 250,00 €/mensais,  das quais os AA. pagaram, entretanto, à 2ª R.,  a quantia total de 1.700,00, em duas prestações de 850,00 € cada. Ficou clausulado que o estabelecimento estava devidamente licenciado pelo CMOdivelas (CMO), tendo sido transmitida a posse do mesmo aos AA. que o passaram a explorar. Porém, logo nos primeiros dias constataram terem sido ludibriados tanto pela 1ª R., como pela 2ª, pois que tendo sido visitados por fiscais da CMO, aperceberam-se que o estabelecimento não tinha licença de utilização e que o aviamento era escasso, tendo pouquíssimos clientes. A isso acresce que a 2ª R. não tinha em relação ao espaço onde estava instalado o estabelecimento qualquer vínculo contratual que possibilitasse aos AA., enquanto novos proprietários do estabelecimento, continuarem a ocupar as instalações em que o mesmo estava instalado, vindo estes a descobrir que a 2ª R. não era mais do que parte num contrato de locação do imóvel em que estava instalado o estabelecimento. Concluem pela nulidade do trespasse em função do disposto no art 280º CC, da qual resultará a devolução aos AA. das quantias por eles entregues à 2ª R., enquanto eles lhe devolverão o estabelecimento que, desde logo, colocaram à disposição desta,  sem prejuízo do disposto no art 290º CC. Invocaram a disciplina do art 227º CC e a circunstância de as RR. terem negociado com eles de má fé, pois bem sabiam que o estabelecimento comercial não estava dotado de licença camarária necessária ao seu funcionamento, não estava dotado de qualquer vinculo fáctico ou jurídico que o ligasse ao imóvel onde estava instalado, e não possuía o movimento publicitado, pelo que são ambas as RR. solidariamente responsáveis pela situação e pelas consequências descritas - danos patrimoniais consubstanciados no preço entregue pelos AA., e danos não patrimoniais, na medida em que tiveram que sair do estabelecimento poucos dias após terem começado a explorar o mesmo, situação que os traumatizou, magoou e ofendeu. 

A R. Carla contestou, invocando a ineptidão da petição inicial, e impugnou o alegado pelos AA., dizendo que desconhece o que a 2ª R. terá dito quanto ao aviamento do estabelecimento, e que quanto a ela os AA. não a questionarem a esse propósito, ou a qualquer outro, tendo muita pressa no negócio, sendo que ela em nada contribuiu para o texto do mesmo, salientando que os AA. sabiam e confirmaram em função da leitura do contrato, que ela era locatária de um contrato de leasing com o BPI. Foi por isso que foi estabelecido que os AA. lhe pagariam todos os meses, num total de 12, € 850,00 a título de quantia fixa e outra variável no valor mínimo de € 250,00, tendo tal quantificação sido aceite, uma vez que até à manifestação de intenção de aquisição, ou não, pelo valor residual da fracção ao BPI, ela, 2ª R., continuaria a ser a única responsável pelas prestações de leasing. Os AA. pagaram duas prestações fixas, uma referente ao mês de Fevereiro e outra ao de Março. O estabelecimento tinha licença para funcionar – e com ela funcionou 9 anos - e a causa da má performance do negócio radica na actuação dos AA., que não souberam gerir o estabelecimento.

Deduziu incidente de intervenção de terceiros com vista a chamar à acção o Banco ….. e a Companhia de Seguros …… e formulou pedido reconvencional, pedindo a condenação de todos os chamados, bem como a 1ª R. e os AA., solidária e conjuntamente, a pagarem -lhe a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais a quantia de € 135.065,00, acrescida dos juros legais vencidos e vincendos, contados a partir da citação até efectivo e integral pagamento. Para fundamentar tal pedido alega que sofreu danos em virtude do não cumprimento do contrato celebrado com os AA. - que, de forma injustificada, decidiram unilateralmente não assinar o contrato de transmissão da posição contratual no leasing, não cumpriram o contrato de trespasse, esvaziaram o estabelecimento, que fecharam no dia 11/2/2010 – sendo pois, responsáveis pelo conteúdo deste, bem como pelos valores não pagos e previstos no contrato de trespasse, e ainda pelos danos não patrimoniais por ela sofridos, visto ter pesadelos constantes e stress em função da situação em causa, pedindo a esse título a quantia de  € 30.000,00.  

A R. “M……” contestou, alegando ter agido dentro das regras que regulam a sua actividade, pois que, através das informações que lhe foram disponibilizadas pela 2ª R., se assegurou que o negócio se encontrava em condições de ser realizado, estando o BPI disponível para autorizar uma eventual cessão da posição no contrato de leasing, sucedendo que mais tarde a 2ª R. pretendeu apenas trespassar o estabelecimento, mantendo a sua qualidade de locatária e subarrendando o locado, referindo-lhe ainda que estava pendente na CMO o pedido de licença de utilização para o referido estabelecimento, dispondo o imóvel de licença de utilização, tendo sido com base nestas informações que publicitou o imóvel e o estabelecimento em causa. A única informação que prestou aos AA. foi a de que se tratava de um estabelecimento com clientela habitual. No negócio mediado estava estabelecida a faculdade de os AA., no prazo de 18 meses, optarem pela aquisição do imóvel pelo preço de € 200.000,00, descontando-se nesse valor as quantias entretanto pagas até à respectiva escritura, sendo que entre os AA. e a 2ª R. seria celebrado um contrato de sublocação, segundo minuta facultada pelo BPI e com autorização do mesmo como locadora, ficando os mesmos a pagar uma renda mensal de € 850,00 enquanto a 2ª R. estivesse a pagar o leasing. Os AA. e a 2ª R. quiseram concluir o negócio rapidamente, em momento em que o BPI ainda não tinha disponibilizado a minuta para a sublocação e, por isso, o contrato de trespasse foi realizado em 12/1/2010, e a dita minuta chegou a 14/1/2010, tendo a mesma sido entregue pela 1ª R. aos AA. já preenchida em função dos intervenientes e estes não o assinaram. Mais refere que os AA. se estarão a aproveitar de um “mero lapso de redacção” da cláusula 3ª do contrato, pois que lhes foi explicado que o imóvel tinha licença de utilização, mas que a necessária para o exercício da actividade de restauração se encontrava em curso, tal como a 2ª R. a tinha informado a ela, 1ª R., e que essa circunstância não impedia a laboração do estabelecimento. Pediu ainda a condenação dos AA. como litigantes de má-fé.

Replicaram os AA., pugnando pela ineptidão do pedido reconvencional por cumulação de pedidos substancialmente incompatíveis, e pela improcedência do mesmo, e pediram a condenação de ambas as RR. como litigantes de má-fé.

Foi proferido despacho a indeferir o incidente de intervenção de terceiros deduzido pela R. Carla.

Mais foi decidido que face à reconvenção apresentada a acção passasse a seguir os termos da forma ordinária de declaração, tendo a acção sido remetida às Varas Mistas de Loures.

Realizou-se a audiência prévia, na qual foi admitido o pedido reconvencional deduzido, mas unicamente na parte em que o mesmo é dirigido aos AA.; julgaram-se improcedentes as excepções dilatórias de ineptidão da petição inicial e da reconvenção; e foram fixados o objecto do litígio e os temas da prova.

Foi junta pelos AA., a fls 191, certidão da CMO.

Designado dia para julgamento, no seu início, os AA. e a R. Carla efectuaram transacção nos seguintes termos:
«Os AA. desistem do pedido quanto à R. Carla;
A R. Carla desiste do pedido reconvencional deduzido contra os AA.
Custas em partes iguais prescindindo-se das de parte»

Tal transacção foi homologada por sentença proferida de imediato, tendo sido ordenado que os autos fossem com vista ao MP para se pronunciar, uma vez que a R. tem apoio judiciário.     

Realizada audiência de julgamento, finda a mesma, foi proferido despacho com o seguinte teor:
«Quando me preparava para elaborar a sentença, constatei o seguinte:
- um dos pedidos formulados nos autos é o de devolução das quantias que os autores alegam que entregaram por via da celebração do contrato (que no caso é a quantia de 11.700€ - cfr. artº 21 da p. i.);
- os autores desistiram do pedido quanto à 2ª ré;
- no entanto nada disseram em consequência dessa desistência, nomeadamente quanto ao facto de terem ou não dela recebido a referida quantia.
Independentemente das várias soluções de direito susceptíveis de serem aplicáveis ao caso dos autos, consideramos que deve ser apurado se os autores receberam ou não tal quantia da 2ª ré e, em caso negativo, porque não a receberam.
Deste modo concedo aos autores o prazo de 10 dias para prestarem os esclarecimentos que entenderem convenientes para a finalidade referida supra, arrolando a competente prova.
A ré tem o prazo de 10 dias para responder e indicar prova.
Após, nos termos do artº 607º/1 do CPC será ordenada a reabertura da audiência para apuramento dos pertinentes factos relativos ao que acima se referiu.
Notifique».

Na sequência do que os AA. vieram referir a fls 264: 
«A desistência do pedido quanto à Ré Carla ……. foi unicamente feita como contrapartida estratégica pela desistência recíproca, por parte desta, do pedido reconvencional entretanto deduzido nos autos.
Desta forma, nenhuma quantia foi pelos Autores recebida, seja a que título for, por qualquer das Rés.
Ora, sendo a responsabilidade de ambas as Rés solidária, a desistência do pedido quanto à Ré Carla …. em nada afecta a responsabilidade da Ré M…………, Ldª nos presentes autos nomeadamente quanto ao pedido que nos mesmos é deduzido.
Com efeito, tal pedido é fundamentalmente constituído pela condenação de ambas as Rés a verem julgado nulo e de nenhum efeito o contrato de trespasse dos autos e, consequentemente, a devolverem os Autores à situação anterior à outorga desse contrato de trespasse, nomeadamente através da devolução de todas as quantias que estes pagaram no seu âmbito, o que constitui o seu prejuízo, sem prejuízo do pagamento aos Autores duma indemnização pelos danos não patrimoniais por estes sofridos.
Assim, e para prova das alegações acima feitas, deverão ser ambas as Rés notificadas para, no prazo estipulado por V. Exª., virem aos autos confirmar tais alegações e, em caso negativo (o que somente por mera e absurda hipótese académica se admite), para virem trazer aos autos prova documental de quaisquer pagamentos eventualmente feitos.
Consequentemente, e no caso previsível de as Rés virem aos autos, no prazo estipulado, confirmarem as afirmações dos Autores ou no caso de, no mesmo prazo, nada virem dizer, deverão prosseguir os autos os seus normais e ulteriores termos.
Contudo, e caso V. Exª. assim o entenda, deverão ser ambos os Autores inquiridos a tais factos, única forma de se fazer prova a factos negativos».

Por sua vez, a R. “M…..” veio, por requerimento a fls 268, dizer o seguinte:
«1.Alegam os AA. que a desistência do pedido quanto à 2.ª Ré foi “unicamente feita como contrapartida estratégica pela desistência do pedido reconvencional entretanto deduzido nos autos” (sublinhado nosso).
2.Como emerge dos referidos autos, o valor do pedido reconvencional deduzido pela 2.ª Ré é muito superior ao valor dos pedidos deduzidos pelos AA.
3.O que significa que o valor do prejuízo invocado pelos AA. foi, objectivamente, satisfeito através da contrapartida (desistência da reconvenção) prestada pela 2.ª Ré.
4.Assim, não se vislumbra qualquer fundamento legal que permita justificar que a 1.ª Ré possa ser responsabilizada pelo ressarcimento de um prejuízo que os próprios AA. admitem expressamente ter negociado com a 2.ª Ré, declarando-se reciprocamente como recompensados.
5.Além disso e salvo sempre o devido respeito, entende a 1.ª Ré que os AA. continuam a confundir as regras e consequências da declaração de nulidade do negócio jurídico com o instituto da responsabilidade civil, que também invocam.
6.Com efeito, se viesse a ser declarada, contra a opinião da 1.ª Ré, a nulidade do negócio jurídico em análise nos autos, tal obrigaria à restituição daquilo que foi prestado pelos AA. e não ao pagamento de qualquer indemnização.
7.Ora, não tendo os AA. pago à 1.ª Ré, reconhecidamente, qualquer importância, jamais esta poderá ser responsabilizada pela restituição do que não recebeu.
8.Assim, entende-se que o esclarecimento ora prestado pelos AA., deverá conduzir, por si só, à absolvição da 1.ª Ré do pedido, não se afigurando necessária a produção de qualquer outra prova adicional, com vista à boa decisão do presente pleito».

Foi ainda, e seguidamente, proferido o seguinte despacho:
«No despacho de fls. 259 foi anunciado que a audiência seria reaberta em face da situação aí exposta. Acontece porém que as partes não indicaram qualquer prova suplementar.
Deste modo, notifique as partes para, querendo e no prazo de 5 dias, dizerem se pretendem a reabertura da audiência para proferirem alegações suplementares, ou se consideram tal desnecessário, sendo que se nada disserem se entende que não consideram necessária a reabertura da audiência».

Nada tendo sido requerido, foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a R. “M…….” a pagar aos AA. a quantia de 11.700€, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, absolvendo-a do pedido quanto ao restante que contra ela vinha peticionado.  E condenou ainda tal R. como litigante de má-fé, na multa de 7 UCs e no pagamento aos AA. da quantia de 500 € a título de indemnização por essa litigância. Estabelecendo, em matéria de custas, que a parte relativa ao acordado na transacção de fls. 251-252 corresponde a 2/3 do total das custas e que os restantes 1/3 ficam a cargo dos autores e da ré Mega na proporção de metade para cada.

II– Do assim decidido, apelou tal R., tendo concluído as respectivas alegações do seguinte modo:

1.– A transacção celebrada entre AA. e 2.ª Ré determinou a extinção da obrigação solidária cujo cumprimento os AA. exigiam da ora recorrente, de harmonia com o disposto nos art.os 522.º e 523.º, ambos do Cód. Civil.
2.– Assim, após o trânsito em julgado da sentença homologatória da referida transacção, deveria o Tribunal recorrido ter declarado a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do art.º 277.º al. e) do CPC.
3.– Não o tendo feito, deveria o Tribunal ter-se considerado incompetente, em razão da hierarquia, para prosseguir com o julgamento da causa.
4.– Pois que, atento o valor da acção proposta pelos AA. contra a 1.ª Ré – 11.700,00 € – era a instância local a competente para realizar esse julgamento.
5.– Pelo que deveria ter sido declarada a incompetência absoluta do Tribunal recorrido e, consequentemente, a remessa do processo ao tribunal competente – cfr. art.os 96.º al a) e 99.º n.º 2, ambos do CPC.
6.- Além disso, essa instância não estava impedida de tomar conhecimento da nulidade do negócio jurídico celebrado entre AA. e 2.ª Ré, ao contrário do sustentado na sentença recorrida.
7.– Pois que se trata de vício que pode ser declarado oficiosamente pelo tribunal, segundo o preceituado no art.º 286.º do Cód. Civil.
8.– A sentença recorrida é nula, por omissão de fundamentação, omissão e excesso de pronúncia, tudo de harmonia com a previsão do art.º 615.º n.º 1 als. b) e d) do CPC.
9.– Além do que a condenação recaiu sobre objecto diverso do peticionado, uma vez que os AA. não pediram qualquer indemnização por danos patrimoniais.
10.– O que é igualmente gerador de nulidade da sentença sob censura – art.º 615.º n.º 1 al. e) do CPC.
11.– A recorrente impugna o julgamento da matéria de facto constante dos pontos 2, 13 e 14 da fundamentação.

12.– As provas que impõem decisão diversa da impugnada são as seguintes:
- Quanto ao ponto 2: documento n.º 3 junto à contestação da 1.ª Ré, conjugado com o depoimento da testemunha Anabela ………., gravado através do sistema integrado de gravação digital, em uso no Tribunal, em 05-03-2015, conforme acta da 2.ª sessão, sob a ref.ª 122542111, do min. 11:00 a 13:13;
- Quanto aos pontos 13 e 14: documento junto pelos AA., a fls. 191 e 192, conjugado com as declarações de parte da Autora, Julieta ……., gravadas através do sistema integrado de gravação digital, em uso no Tribunal, em 05-03-2015, conforme acta da 1.ª sessão, sob a ref.ª 122532659, do min. 10:40 a 10:48 e 15:00 a 16:48, com o depoimento da testemunha José …….., cujo depoimento foi também registado através do sistema integrado de gravação digital, em uso no tribunal, em 05-03-2015, conforme acta da 1.ª sessão, sob a ref.ª 122532659, do 12:30 a 18:22 e 29:26 a 30:20, e do depoimento da já mencionada testemunha Anabela ………., do min. 18:30 a 20:40.

13.– Assim, deverá a referida matéria ser julgada da forma seguinte:
2- Para tal efeito a ré Mega colocou um anúncio num site da internet com o seguinte teor:
Negócio: Venda / Trespasse
Descrição do imóvel: “RESERVADO”. Snack Bar no activo completamente equipado para refeições rápidas, com 24 lugares sentados mais 24 lugares na esplanada com uma renda mensal de 950,00 €. Bom movimento. EXCELENTE NEGÓCIO. Para mais informações ligue 219349080 ou 962066065.
13- O estabelecimento não dispunha de licença de utilização para o exercício da atividade de restauração, mas já havia sido solicitado o respectivo licenciamento, na CMO – proc. n.º 48/ODV/2000 – facto que era do conhecimento dos AA. e das RR.;
14- Não provado.

4.– Relativamente ao enquadramento jurídico dos factos, ao contrário do que se entendeu na sentença recorrida, a recorrente não violou as obrigações consignadas nos art.os 16.º e 22.º do DL n.º 211/2004, de 20 de Agosto.
15.– Tanto mais que o art.º 23.º do DL 234/2007, de 19 de Junho, prevê um regime legal transitório que permite a laboração dos estabelecimentos de restauração ou de bebidas, mesmo antes da emissão da respectiva licença de utilização.
16.– O pagamento das quantias realizado pelos AA. à 2.ª Ré e cuja devolução reclamaram não constituem danos patrimoniais, antes configurando uma obrigação de restituição, tal como decorre do regime da nulidade do negócio jurídico, previsto no art.º 289.º n.º 1 do Cód. Civil.
17.– Além do que não se verificam in casu os pressupostos da responsabilidade civil – facto ilícito, culpa, dano e nexo de imputação do facto ao dano – que possam fundamentar a condenação da recorrente.
18.– O Tribunal recorrido equivocou-se, manifestamente, ao sancionar a recorrente como litigante de má fé, uma vez que, como se sustentou na impugnação da matéria provada, foi dado conhecimento aos AA. de que o estabelecimento em causa não dispunha ainda  de licenciamento aprovado.
19.– Além do que nunca a recorrente negou ter conhecimento desse facto, pelo que um eventual insucesso da prova por banda da recorrente, relativamente ao conhecimento dos AA. de tal factualidade, nunca seria susceptível de a fazer incorrer em litigância de má fé.
20.– Acresce que a elaboração da Réplica pelos AA. também nunca poderia fundamentar a quantificação da multa por que a recorrente foi sancionada.
21.– Pois que a recorrente não é sequer parte na acção cruzada que a 2.ª Ré, por via reconvencional, moveu contra os AA..
22.– Nem a mesma deve ser responsabilizada pelas custas da reconvenção, como se decidiu na sentença recorrida.

Não foram produzidas contra alegações.

O Exmo Juiz a quo proferiu despacho para o efeito do disposto no art 641º/1 CPC, concluindo pela inexistência das apontadas nulidades da sentença.

III– O tribunal da 1ª instância julgou provados os seguintes factos:
1- A ré Mega celebrou com a ré Carla um acordo pelo qual aceitou mediar o trespasse de um estabelecimento de café/snack bar propriedade desta.
2- Para tal efeito a ré Mega colocou um anúncio num site da internet com o seguinte teor: “Café Snack Bar para trespasse situado numa zona residencial, completamente equipado, bom movimento, excelente negócio. Para mais informações ligue 21…… ou 96……….”.
3- Os autores viram o anúncio, ficaram interessados no negócio assim publicitado e entraram em contacto com a 1ª Ré através do seu funcionário e representante Carlos …………., com o qual tiveram reuniões com vista à conclusão do negócio de trespasse.
4- No seguimento desses contactos tidos com a ré Mega, os autores e a ré Carla celebraram, em 12.01.2010, o acordo denominado “contrato de trespasse”, nos termos constantes do documento de fls. 24 a 26, onde a ré Carla declarou ser proprietária de um estabelecimento comercial onde se exerce a atividade de pastelaria / snack bar, sito na Av. 25 de Abril, nº ….., Jardim da Radial, Ramada, Odivelas, e com o nome de “Comidinha da Avó”, o qual funciona numa fração relativamente à qual foi celebrado um contrato de locação financeira imobiliária celebrado entre a ré Carla e o banco BPI, SA, declarando ainda que por via do acordo trespassa esse estabelecimento aos autores.
5- Nesse acordo ficou estabelecido o preço de 50.000€ pelo trespasse a pagar pelos autores do seguinte modo: 10.000€ no momento da celebração do acordo e o restante em parcelas mensais de valor não inferior a 250€.
6- Os autores obrigaram-se ainda ao pagamento da quantia mensal de 850€ a título de renda mensal que a ré Carla estava obrigada a pagar ao banco BPI.
7- No acordo ficou ainda declarado que o estabelecimento está devidamente licenciado através do alvará de licença de utilização nº 210, emitido pela Câmara Municipal de Odivelas em 22.09.2000, documento entregue aos autores, mais se declarando que o mesmo possuía as habilitações e título bastante para a exploração de estabelecimento de pastelaria / snack bar.
8- O acordo foi integralmente redigido por funcionários da ré Mega.
9- No momento da celebração do acordo os autores pagaram à ré Carla a quantia de 11.700€, corresponde a 10.000€ do preço acordado e 1700€ à renda relativa a 2 meses.
10- Os autores passaram a explorar o estabelecimento em 12.01.2010.
12- A intervenção da ré Mega não ficou a constar do acordo acima mencionado.
13- O estabelecimento não possuía autorização camarária para o exercício de qualquer tipo de atividade de restauração, o que era do conhecimento da ré Mega.
14- Em virtude do referido em 13 os autores encerraram os estabelecimento no dia 21 de janeiro e não o voltaram a abrir, tendo o mesmo sido entregue à ré Carla.

O tribunal da 1ª instância referiu relativamente à matéria de facto não provada:
Nada mais se provou com interesse para a causa do que foi alegado na p. i., nomeadamente o alegado nos artºs 9, 47, 48, e na contestação da ré Mega (quanto a esta nada se provou com relevância para a causa para além do que consta nos factos provados).

IV– São as seguintes as questões que as conclusões das alegações, no confronto com a decisão recorrida, colocam para apreciação:
1- Se em consequência da transacção efectuada entre os AA. e a R. Carla, a instância deveria ter sido declarada extinta também relativamente à R “Mega Exemplo”, por inutilidade superveniente da lide; 
2- Se em virtude da desistência do pedido reconvencional, o tribunal se deveria ter considerado incompetente em razão do valor e ter remetido o processo ao tribunal competente. 
3- Se a sentença proferida é nula por omissão e excesso de pronúncia e ainda por ter condenado em objecto diverso do peticionado.
4- Se a decisão da matéria de facto relativamente aos respectivos pontos 2, 13 e 14 deveria ter sido diferente, devendo ser alterada por este Tribunal.
5- Se a R. “Mega” não deveria ter sido condenada no pagamento de uma indemnização quer porque, em face do art 23º do DL 234/2007 de 19/6 o estabelecimento estava em condições de laborar, quer porque, quando muito, estaria em causa uma obrigação de restituição que lhe não assiste.
6- Se a R. “Mega” não deveria ter sido condenada como litigante de má fé e muito menos em indemnização aos AA. em função da réplica destes.
7- Se a R. “Mega” não devia ser condenada em custas pela reconvenção.

Apesar de a apelante não o referir, é evidente que uma e outra das questões enunciadas em 1) e 2) se mostram, em princípio, sucessivamente prejudicantes pelo menos das 3ª, 4ª e 5ª questões.
Quer dizer: se se entendesse que a transacção homologada implicaria a extinção da instância relativamente à R. aqui apelante por inutilidade superveniente da lide, deixaria de ser logicamente necessário que se ponderasse a questão da competência do tribunal em razão do valor, como deixaria de ser necessária a apreciação das arguidas nulidades da sentença, bem como a pretendida impugnação da matéria de facto e da decisão de direito, e até da decisão de custas, apenas subsistindo interesse na reapreciação da questão da litigância de má fé. Igualmente, se, ao contrário do pretendido pela recorrente, se entendesse que a transacção não implicaria a extinção da instância, mas que a circunstância de, por efeito da mesma, o valor do processo (re)implicar a incompetência do tribunal em razão do valor, também, como é manifesto, a decisão relativamente às acima referidas questões deixaria de importar.

1-Feito este reparo, passa-se a analisar a primeira questão, a qual  implica que se pondere minimamente o objecto do processo.
Os AA. propuseram a acção contra a mediadora do negócio cuja nulidade pretendem ver reconhecida, bem como contra a cliente dessa mediadora que, por efeito dessa angariação, veio a realizar o negócio em causa, com eles, AA. E pretendem que uma e outra das RR. os ludibriaram, levando-os os «comprar gato por lebre» (art 31º e 103º da petição), noutro passo falando de «conto do vigário» (art 49º da petição), referindo que ambas lhes «divulgaram» que o estabelecimento comercial objecto do trespasse tinha determinadas características (art 76º), «induzindo-osconjuntamente», art 41º) «num lamentável e grosseiro erro» (art 77, 103), negociando, uma e outra,  com eles, de má fé (art 89º), pois ambas sabiam que «o estabelecimento comercial não estava dotado de licença camarária necessária e essencial ao seu funcionamento, não estava dotado de qualquer vinculo fáctico ou jurídico que o ligasse ao imóvel onde aparentemente estava instalado, para além de que, nem de perto nem de longe possuía o movimento comercial e o aviamento que dele publicitou». E em consequência destas alegações, pretendendo que «ambas as RR. são solidariamente responsáveis pela situação», nos termos do art 227º CC, e que, por isso, «ambas deverão responder pelos danos que culposamente causaram aos AA.» (art 109º), devem as duas ser «solidariamente responsáveis pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por eles sofridos» (arts 120º e 121º), terminando pela enunciação solidária dos pedidos que supra se referiram.

Da exposição dos factos a que procedem resulta manifesto que o que pretendem na acção é fazer valer a responsabilização de ambas as RR. em função da culpa “in contrahendo”.

Como se sabe, a sistematização da responsabilidade por “culpa in contrahendo” resultou da elaboração da doutrina e da jurisprudência alemãs a partir dos trabalhos de  Ihering que os desenvolveu, justamente, a partir da responsabilidade que entendeu  autonomizar em função da celebração de um contrato nulo.

Com efeito, a celebração de contratos inválidos ou ineficazes por violação das regras da boa fé na formação dos contratos constitui uma das situações típicas da “culpa in contrahendo”, ao lado da celebração de contratos válidos e eficazes, mas anuláveis, e que, apesar de convalidados, se mostrem desequilibrados nas suas prestações, e dos contratos não concluídos, hipótese esta da “culpa in contrahendo” que mais tem sido desenvolvida e aplicada.
Em todas essas situações a responsabilidade civil assenta no reconhecimento de que iniciadas negociações para a celebração de um contrato, se cria entre as partes, em maior ou menor grau, uma relação de confiança, que gera autonomamente diversos deveres, mais ou menos intensos (e de que é uso destacarem-se os de segurança, sigilo, veracidade, e de sobremaneira, os de informação e de lealdade…), sendo que é em função da violação destes deveres - e não propriamente em função das negociações poderem ou não conduzir à celebração do contrato, válido ou não  - que a parte que os violou, sem razão justificativa, se constitui em responsabilidade  em relação à outra.

Refere a este respeito Almeida e Costa [1]: «Através da responsabilidade pré-contratual, o que directamente se tutela é a confiança recíproca de cada uma das partes em que a outra conduza as negociações num plano de probidade, lealdade e seriedade de propósitos, podendo chegar-se à formação de uma legítima expectativa da conclusão de um contrato válido e eficaz e da consequente obtenção futura dos proveitos ao mesmo ligados».
E Menezes Leitão [2]: «A lei impõe a observância das regras de boa fé durante todo o processo de formação do contrato, entendendo que o mero facto de se entrar em negociações é susceptível de criar uma situação de confiança na outra parte, confiança essa que é imediatamente tutelada pelo Direito, mesmo antes de ter surgido qualquer contrato. Assim, caso essa situação de confiança venha a ser lesada, com violação das regras de boa fé, verifica-se um facto ilícito, que constitui o lesante no dever de indemnizar os danos sofridos pelo lesado. Naturalmente que a ilicitude do facto deriva da violação de deveres acessórios de conduta, que neste caso surgem antes da constituição do dever de prestar principal».

Referindo ainda Ferreira Almeida[3] que «a imputação de responsabilidade justifica-se quando o factor de invalidade, de ineficácia ou de inexistência seja consequência da violação de deveres de lealdade e de desrespeito, por acção, ou omissão, de deveres de informação ou de diligência», situando-se, pois, a ilicitude na responsabilidade civil pré-contratual na violação de algum dos deveres de boa fé contratual. Sendo que «para merecer a protecção do regime do art 227º deve o lesado ter confiado e investido na confiança justificadamente criada: «conforme os casos, deverá ter confiado na validade e na eficácia do contrato que se mostra afinal inválido ou ineficaz, ou ter confiado na conclusão do contrato, que afinal não se chegou a formar, ou ter confiado no equilíbrio de um contrato que é afinal desequilibrado».

Como é sabido também, tem vindo a ser discutido o enquadramento sistemático da responsabilidade pré contratual  – uns encaram-na com natureza contratual, outros,  com natureza extra contratual, e outros ainda, como um terceiro género relativamente àqueles dois tipos de responsabilidade.

A respeito desses enquadramentos reflecte Ferreira de Almeida: «As teses obrigacionais não resistem à observação de que as regras da boa fé na formação do contrato não são geradoras de obrigações em sentido próprio, porque não envolvem prestações. As teses extra-obrigacioanis não se adaptam ao ambiente relacional gerado pelo contacto entre potenciais contraentes que mutuamente se escolheram para negociar, em acentuado contraste com os deveres de comportamento erga omnes cuja violação justifica a responsabilidade delitual».
Observações que aconselham, consoante prossegue o autor em causa, «a que se tenha por preferível, num sistema jurídico como o português, reconhecer a autonomia institucional da responsabilidade pré-contratual (…)», sem que esse entendimento obste, porém, «à aplicação analógica de um outro regime de responsabilidade civil para preencher lacunas de regime», advertindo, no entanto, que «a escolha não deve, contudo, resultar de uma qualificação genérica e a priori. Deve recair na responsabilidade obrigacional ou na responsabilidade extra–obrigacional, conforme o grau de proximidade que a previsão das normas potencialmente aplicáveis apresente com cada uma das diferentes situações típicas de culpa in contrahendo».

O que se veio de reflectir destina-se a compreender a utilização pelos AA. do regime da responsabilidade solidária na demanda das RR.

Com efeito, na pluralidade passiva que respeite à responsabilidade obrigacional, a regra é a da conjunção (excepto quando a própria obrigação violada for solidária por assim ter sido convencionada, cfr art 513º CC). Já na responsabilidade extra obrigacional a regra é a da solidariedade, com direito de regresso, como resulta do disposto no art 497º CC, cujo nº 1 estatui que «se forem várias as pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade», advindo do nº 2 que «o direito de regresso entre os responsáveis existe na medida das respectivas culpas e das consequências que delas advierem, presumindo-se iguais as culpas das pessoas responsáveis».

Se a ilicitude na responsabilidade civil pré contratual, como acima se reflectiu, consiste na «violação de algum dos deveres de boa fé contratual»[4] – com especial relevo para os deveres de informação, lealdade e  diligência  – e se a violação desses deveres ocorre num negócio, em função de condutas, em parte articuladas, de uma “empresa de mediação” e do respectivo “cliente”, em termos tais que pode não transparecer para o  “interessado”[5] qual daqueles dois violou os referidos deveres ou os violou mais acentuadamente, sabendo apenas que os mesmos, em função da sua específica e anterior relação contratual, concorreram culposamente para a referida ilicitude, está bem de ver que o regime de responsabilidade que quadra é, efectivamente, o da responsabilidade solidária.

Para quem entenda, como Menezes Cordeiro, que a violação do art. 227º/1 CC gera indiscutivelmente responsabilidade obrigacional é, por seu lado, obrigatório  concluir que «as dividas ocasionadas pelo funcionamento da “culpa in contrahendo” na celebração de contratos comerciais têm, elas próprias, natureza comercial».[6]

Estabelecendo o art 100º C Com a regra supletiva da solidariedade passiva nas obrigações comerciais, também desta forma se justificaria o recurso dos AA. ao regime dessa solidariedade.

De todo o modo, a questão da solidariedade da responsabilidade da 1ª R. como mediadora está expressamente prevista no DL 211/2004 de 20/8 (que ao tempo da celebração do contrato dos autos regulava o exercício das actividades de mediação imobiliária e de angariação imobiliária), como à frente melhor se verá.   

Compreende-se por isso que os AA. tenham demandado em termos solidários as aqui RR.

Mas, para melhor se entenderem as consequências da demanda solidária das RR., cumpre fazer notar também que, como decorre das noções de litisconsórcio necessário e voluntário e dos termos em que se expressa o art 35º CPC, as mesmas foram   demandadas em litisconsórcio voluntário – situação em que «há uma simples acumulação de acções, conservando cada litigante uma posição de independência em relação aos seus compartes» - como, aliás, sucede genericamente nas situações de responsabilidade solidária (activa e passiva) [7].

Por assim ser, e como dispõe o art 288º/1 CPC, a transacção que os AA. realizaram apenas com a 2ª R. é passível de eficácia - embora estringida ao interesse desta R. na acção - ao contrário do que sucederia se estivesse em causa litisconsórcio necessário, em que a transacção (só) teria eficácia se abrangesse ambas as RR., sem o que apenas produziria efeito quanto a custas. 

Lebre de Freitas refere a respeito do anterior art 298º CPC, correspondente ao actual art 288º: «Sendo o litisconsórcio voluntário (art 27º) a solução está em circunscrever o efeito do acto ao interesse do seu autor. A cindibilidade do efeito é corolário do conceito de litisconsórcio voluntário, visto que o efeito útil normal da decisão pode nele, por definição, produzir-se sem a presença de todos aqueles pelos quais ou contra os quais o pedido foi deduzido (art 28º/2), tanto assim que nos encontramos perante uma situação de acumulação de acções, em que cada litigante conserva posição de  independência relativamente aos seus compartes (art 29º)». 

A questão que está em causa resolver não é, porém, decorrente da demanda das RR. em  litisconsórcio voluntário – a 1ª R., aqui apelante, nem invoca tal questão – mas antes a de saber se a transacção celebrada entre os AA. e a 2.ª R. implicou a extinção da obrigação solidária cujo cumprimento os AA. exigiam da 1ª , ora recorrente, em função do disposto nos arts 522º e 523º do CC.
As obrigações solidárias do lado passivo caracterizam-se pelo facto de nelas qualquer dos devedores estar obrigado perante o credor a realizar a prestação integral, e também pela circunstância da realização da prestação integral por um dos devedores liberar todos os outros em relação ao credor (adquirindo depois este devedor um direito de regresso  sobre os outros para exigir a parte que lhes compete na obrigação, art 524º), como resulta da 1ª parte  do nº 1 do art 512º -  «a obrigação é solidária quando cada um dos devedores responde pela prestação integral  e esta a todos libera».

Evidencia Menezes Leitão a propósito das relações externas no regime da solidariedade passiva [8]: «No âmbito das relações externas, em relação ao credor, a solidariedade caracteriza-se, em primeiro lugar, por uma maior eficácia do seu direito, que se pode exercer integralmente contra qualquer um dos devedores (arts 512º/1 e 519º/1) não podendo estes, uma vez demandados pela totalidade da dívida, vir invocar o beneficio da divisão (art 518º), tendo assim de satisfazer a prestação integral». Mas acrescenta: «Essa maior eficácia não se traduz, porém, na possibilidade do credor repetir sucessivamente a pretensão perante os vários devedores, uma vez que a exigência da totalidade ou de parte da prestação a um dos devedores, impede o credor de exercer nessa parte o seu direito contra os restantes, excepto se houver razão atendível, como a insolvência ou o risco de insolvência do demandado – art 519º/1 in fine».  De tal modo que, como resulta do art 523º, «a satisfação do direito do credor, por cumprimento, dação em cumprimento, novação, consignação em depósito ou compensação, mesmo que desencadeada apenas por um dos devedores, exonera igualmente os restantes».

Desde o momento em que os AA. negam que tenham recebido o que quer que seja da 2ª R. para com ela terem transigido, como o fizeram, e que nenhuma das RR. afirmou, e menos ainda demonstrou o contrário, resta saber se das cláusulas em que se analisa a transacção pode resultar que os AA. obtiveram, através de algum dos meios referidos no mencionado art 523º a satisfação, total ou parcial, dos direitos de que se arrogam na acção.

Dispõe o art 1248º/1 CC que a «transacção é o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões», explicitando o art 1250º que «a transacção preventiva ou extrajudicial constará de escritura pública quando dela possa derivar algum efeito para o qual a escritura seja exigida, e constará de documento escrito nos casos restantes».

Na situação dos autos a transacção que foi alcançada constitui, obviamente, uma transacção obtida na pendência do litígio – por isso não preventiva - e que obedeceu à forma escrita, resultando formalizada na acta da audiência de julgamento como resultado de conciliação obtida pelo juiz – art 290º/4 CPC. Este, em obediência ao disposto neste preceito, tendo examinado se pelo seu objecto e pela qualidade das pessoas que nela intervieram a transacção era válida, e concluindo pela positiva, homologou-a «por sentença ditada para a acta, condenando nos respectivos termos».

A transacção constitui um negócio jurídico privado, com cujo intrínseco conteúdo material o juiz nada tem a ver, limitando-se, para conceder a respectiva homologação à verificação de determinadas condições que se mostram extrínsecas àquele conteúdo. Assim, a sentença homologatória só pode ser concedida se o objecto do litígio estiver na disponibilidade das partes - art 289º CPC -, tiver idoneidade negocial – 280º e 281º CC-, se as pessoas que intervêm na transacção tiverem capacidade e legitimidade para se ocuparem desse objecto – art 287º CPC -, devendo o juiz, no caso de transacção, «verificar também a pertinência do objecto do negócio para o processo, isto é, a sua coincidência com o pedido deduzido», sem prejuízo de ter em conta que «a transacção pode envolver a constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do direito controvertido» – cfr referido art 1248º/2 CC- podendo estas finalidades fazerem intervir terceiro para assegurar a disponibilidade subjectiva do direito [9] .

Vejamos então se das cláusulas em que se analisa a transacção efectuada nos autos, se evidencia que o conteúdo do negócio jurídico em que a mesma se traduziu poderá implicar, ainda que subjacentemente, alguma das formas de extinção do interesse do credor mencionadas no referido art 523º CC.

Ora na cláusula 1ª os AA. referem desistir do pedido quanto à R. Carla - o que significa, por um lado, que reconhecem que a pretensão que formularam contra tal R. é infundada [10], por outro,  que têm como  extinto o direito  que pretendiam fazer valer na acção quanto àquela R. (art 285º CPC). Na cláusula 2ª é, por sua vez, a R. Carla, quem refere desistir do pedido reconvencional que deduziu contra os AA. – o que igualmente, significando que reconhece que toda a pretensão que contra eles formulou é infundada, tem como extinto o direito que contra os mesmos formulou.

Como foi no mesmo momento e acto, que uma e outra das partes, formularam as suas totais desistências dos respectivos pedidos formulados, tendo-o feito na própria acta do julgamento, e nela referindo-se antecedentemente, que «chegaram a acordo nos seguintes termos», há que concluir que acordaram em concessões recíprocas para porem termo ao litígio entre ambas, tanto bastando para se poder falar em transacção.

E, efectivamente, os AA. no seu requerimento de fls 264 confirmam essas concessões recíprocas, ao referirem que «a desistência do pedido quanto à R. Carla foi unicamente feita como contrapartida estratégica pela desistência recíproca, por parte desta, do pedido reconvencional entretanto deduzido nos autos».

Não há elementos nos autos que, salvo melhor opinião,  permitam que se conclua no sentido da verificação de qualquer dos meios de satisfação do direito do credor enunciados na referida norma do art 523º CC, nem sequer a compensação.

O mais que as referidas cláusulas podiam levar a concluir, seria no sentido da existência de remissão relativamente à 2ª R..

A remissão é uma forma de satisfação do interesse do credor que mereceu do legislador, no tocante ao aspecto em apreço - da solidariedade passiva -, um tratamento especial relativamente ao geral contido no mencionado art 523º, como resulta dos nº 1 e 2 do art 864º CC, onde se dispõe: «1. A remissão concedida a um devedor solidário libera os outros na parte do devedor exonerado. 2 Se o credor, neste caso, reservar o seu direito, por inteiro, contra os outros devedores, conservam estes, por inteiro também, o direito de regresso contra o devedor exonerado» .

Mas, na verdade, o conteúdo da desistência do pedido dos AA., implicando o reconhecimento que a pretensão que formularam contra a R. é infundada, não coincide, sequer, com a remissão que, sendo um negócio jurídico bilateral (pois, “invito non datur beneficium”), se traduz num perdão.

Com efeito, como o evidenciam Pires de Lima e Antunes Varela [11], «a remissão não se confunde com o reconhecimento negativo da dívida, que é o negócio declarativo pelo qual o possível ou aparente credor reconhece vinculativamente perante a contraparte que certa obrigação não existe, ou porque nunca existiu ou porque foi extinta entretanto. A remissão envolve, pelo contrário, tal como a dação em cumprimento ou a compensação, um acto de disposição sobre a pretensão do credor que pressupõe a existência do crédito».

Ora, a desistência do pedido está seguramente mais perto do reconhecimento negativo da dívida, do que da remissão.

De todo o modo, se de remissão se pudesse falar relativamente ao cruzamento das desistências dos pedidos entre os AA. e a 2ª R. na aludida transacção, ter-se-ia de concluir que a posição daqueles, sobretudo a que acabam por transmitir, sem oposição desta, no requerimento de fls 264, sempre implicaria a situação prevista no acima referido nº 2 do art 864º, isto é, que os AA., apesar de remitirem a obrigação da 2ª R., haviam reservado o seu direito por inteiro relativamente à 1ª, situação que se analisa, afinal, como o refere Antunes Varela[12], numa “espécie de pactum de non petendo”.

Conclui-se assim que, ao contrário do perspectivado pela apelante, a transacção realizada no decurso da acção entre os AA. e a 2ª R, demandada como devedora solidária, ainda que abarcando todo o pedido inicialmente formulado, porque não evidencia que corresponda a um negócio que tenha envolvido qualquer dos meios de satisfação do direito do credor mencionados no art 523º CC, não extinguiu a dívida, nem total nem parcialmente em relação à 1ª R, igualmente devedora solidária, não havendo lugar, consequentemente, à extinção da instância relativamente a esta R. por inutilidade superveniente da lide.

2- Não tem também razão a apelante quando pretende que por virtude da homologação da transacção, da qual resultou a insubsistência da reconvenção por dela ter desistido a 2ª R., o tribunal até então competente em razão do valor tivesse deixado de o ser, e que, por isso, lhe fosse exigido que, declarando a sua incompetência, remetesse o processo para o tribunal que fosse competente em função do “novo” valor da acção.

É que, não é consequência da desistência do pedido reconvencional que o processo regresse ao valor que teria antes de a ele se ter somado, em obediência ao disposto no art 299º/2 CPC, o valor da reconvenção.
 
Com efeito, o nº 1 desta norma refere que «na determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a acção é proposta», e apenas exceptua dessa regra, no respectivo nº 2, o caso de o réu deduzir reconvenção ou de haver intervenção principal.

Trata-se de uma regra que exprime a necessidade de estabilidade do valor da causa, pois que é em função deste que se atende para determinar a competência do tribunal, a forma do processo e a relação da causa com a alçada do tribunal.

Não há, assim, que admitir outras excepções à mesma, para lá da que foi expressamente prevista.

Refere Jacinto Bastos [13]  que a regra formulada pelo (então) art 308º prevalece, mesmo nos casos de ser alterada a relação jurídica processual.

Também se pronuncia nesse sentido Lebre de Freitas [14], em anotação ao anterior art 308º, equivalente ao actual art 299º, referindo que «são irrelevantes para o valor da acção, apurado nos termos do nº 2, vicissitudes posteriores que importem a redução do objecto do processo, a desistência do pedido reconvencional (Ac STJ de 22/3/74, BMJ 235- 226),  ou a transacção sobre a acção inicial com subsistência da intervenção principal (Ac STJ 8/11/79, BMJ 291-403)». Acrescentando: «Deste modo, mantém-se para os efeitos fixados no art 305º2, o valor fixado após a reconvenção ou a intervenção principal».

3- Entendem os apelantes que a sentença é nula por omissão de pronúncia, na medida em que não teriam sido “dilucidadas” na mesma várias questões colocadas pelas partes nos respectivos articulados, estando nessa situação, as seguintes: o conhecimento que as partes tinham da situação jurídica do imóvel e do estabelecimento; a recusa, por parte dos AA. em celebrar o contrato de sublocação ou de transmissão da posição contratual da locação financeira; a existência de um processo de licenciamento do estabelecimento para o exercício da actividade de restauração/pastelaria/snack-bar em curso, e o conhecimento que os AA. tinham do mesmo; o incumprimento por parte da 2.ª R. do contrato de leasing relativo ao imóvel, e as causas e as consequências desse incumprimento. Além da questão, colocada no acima referido despacho de 24/3/2015, de saber se os AA. receberam ou não da 2ª R. em virtude da transacção, a quantia pedida nos autos de 11.700,00 €  e, em caso negativo, porque não a receberam.
Cabe a este respeito referir, antes de mais, que a omissão de pronúncia, enquanto causa de nulidade da sentença, se verifica apenas em relação às «questões» que as partes tenham submetido à apreciação do juiz  - e ainda aqui exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras - por ser em relação àquelas que o art 608º/2 impõe tal dever ao juiz.
Vale dizer que a omissão de pronúncia não se deve confundir com a omissão em sede de decisão da matéria de facto, isto é, não é por o juiz omitir na decisão da matéria de facto a referência à prova (ou não prova) de determinados factos que se verifica omissão de pronúncia. 

Nesta matéria tem que ter presente o conteúdo de «questão» – Lebre de Freitas  fá-lo coincidir com «os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas  e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe (ao juiz) conhecer»[15].

Por outro lado, e como é manifesto, a circunstância da instância se ter extinto relativamente à 2ª R. por força da realizada transacção, implica que as (eventuais) questões colocadas por esta R. na respectiva defesa deixem de ter de ser apreciadas na sentença, a menos que se tratem de questões de carácter oficioso.
Dentro destas coordenadas, vejamos, pois, em que se analisa a causa de pedir na acção e se a 1ª R. invocou excepções na sua contestação.

Já acima se evidenciou estar em causa na acção a responsabilidade - e agora, apenas  da 1ª R. - em função da violação pela mesma de deveres que haveria de ter  observado  no âmbito das negociações que conduziram à celebração do trespasse, em que avultam os de informação, e cuja inobservância conduziu, do ponto de vista dos AA., a que viessem a realizar o trespasse sem estarem devidamente informados que  «o estabelecimento comercial não estava dotado de licença camarária necessária e essencial ao seu funcionamento, não estava dotado de qualquer vinculo fáctico ou jurídico que o ligasse ao imóvel onde aparentemente estava instalado, e que possuía o movimento comercial e o aviamento que dele publicitou».

Esta causa de pedir, agora centrada na actuação da 1ª R. na qualidade de mediadora do negócio, analisar-se-á, pois, nas questões de saber se a 1ª R. incumpriu, no âmbito daqueles três aspectos deveres de informação, e se esse incumprimento foi causa do correspondente erro dos AA. relativamente ao objecto do contrato de trespasse.

Por sua vez, a 1ª R. defendeu-se apenas por impugnação – ela própria assim caracteriza a sua atitude defensiva no requerimento de fls 125.

Com efeito, limitou-se a contrariar a inobservância dos deveres de informação que os AA. lhe imputam, mesmo quando refere que estes estão na acção a camuflar o que verdadeiramente sucedeu, que terá sido o seu arrependimento relativamente à totalidade do negócio mediado -pois que, por um lado, a licença de exploração que existia ter-lhes-ia permitido explorar o estabelecimento, e por outro, o negócio em causa não se restringia ao trespasse, antes englobava a sublocação para eles do espaço em que estava instalado o estabelecimento em função de contrato de locação financeira que a 2ª R. mantinha com o Banco BPI SA, sublocação essa já autorizada por este banco, tendo sido eles que, tendo querido concretizar o trespasse antes da obtenção da minuta que haveria de ser fornecida pelo banco para a realização dessa sublocação, vieram depois a recusar-se a assinar o contrato de sublocação.

Na medida em que não retira da alegação desta matéria qualquer efeito extintivo ou mesmo modificativo relativamente à pretensão dos AA. – apenas pretendendo que se conclua que ela não inobservou os deveres de cuidado e informação que se lhe impunham na negociação - é de se concluir que se defenderam apenas por impugnação.

Feita esta análise das questões sobre as quais se impunha pronúncia pelo juiz, vejamos se se verificam as imputadas omissões de pronúncia. 

Relativamente ao incumprimento por parte da 2ª R. do contrato de leasing relativo ao imóvel, suas causas e consequências, como é evidente, não há que falar de omissão de pronúncia, pois que essa questão era apenas relevante em sede de pedido reconvencional  e este  mostra-se  extinto. 

A questão da existência em curso de um processo de licenciamento do estabelecimento para o exercício da actividade de restauração/pastelaria/snack-bar, e o conhecimento que os AA. tinham do mesmo foi questão na qual se centrou a sentença, como resulta das seguintes observações: «No acordo ficou declarado que o estabelecimento está devidamente licenciado através do alvará de licença de utilização nº 210, emitido pela Câmara Municipal de Odivelas em 22.09.2000, documento entregue aos autores, mais se declarando que o mesmo possuía as habilitações e título bastante para a exploração de estabelecimento de pastelaria / snack bar. O acordo foi integralmente redigido por funcionários da ré Mega. (…) O estabelecimento não possuía autorização camarária para o exercício de qualquer tipo de atividade de restauração, o que era do conhecimento da ré Mega. Em virtude do referido em 13 os autores encerraram os estabelecimento no dia 21 de janeiro e não o voltaram a abrir, tendo o mesmo sido entregue à ré Carla. Consideramos que destes factos resulta que a ré Mega violou, e de forma grosseira, os deveres a que estava vinculada, nomeadamente os que constam das als. d) e e) do artº 16.º/1 do DL nº 211/2004. A ré Mega, bem sabendo que o estabelecimento não tinha autorização para o exercício da atividade de restauração, convenceu os autores disso mesmo, fazendo até constar expressamente do contrato de trespasse a existência dessa autorização, o que fez nos seguintes termos “mais se declarando que o mesmo possuía as habilitações e título bastante para a exploração de estabelecimento de pastelaria / snack bar”. E foi exatamente por causa da falta de licenciamento que os autores tiveram de encerrar o estabelecimento».

Não houve pois, manifestamente, omissão de pronúncia relativamente ao aspecto em apreço.

Já relativamente ao conhecimento que as partes tinham da situação jurídica do imóvel e do estabelecimento, e à recusa, por parte dos AA., em celebrar o contrato de sublocação, a partir do momento em que a invocação destes factos não constitui na contestação da 1ª R. matéria exceptiva – mas de mera impugnação, nos termos acima referidos – ainda que se venha a concluir que, efectivamente, se verificou omissão de factos no que respeita a tais matérias,  não se verifica omissão de pronúncia.

Igualmente não há omissão de pronuncia relativamente a saber se os AA.  receberam ou não da 2ª R. em virtude da transacção a quantia pedida nos autos de 11.700,00 €.

Por um lado porque, como acima referido, não há omissão de pronúncia relativamente a factos, mas a questões. Por outro, porque a existência ou não de pagamento não foi colocada pelas partes, mas pelo Exmo Juiz a quo. E este não deixou de ponderar a questão em relação à qual poderia relevar a existência do eventual recebimento pelos AA. dessa  quantia, como resulta dos seus despachos de fls  259 e 271, e da própria sentença, quando nela refere: «Com a desistência do pedido que os autores levaram a efeito quanto à ré Carla, consideramos que tal prejudica a apreciação do pedido quanto à declaração de nulidade do contrato. Isto porque essa declaração exigia que a ré se mantivesse na ação pois foi com ela que o contrato foi celebrado (artº 30º/3 do CPC). Quanto aos restantes pedidos, nomeadamente de indemnização pelos danos sofridos com a celebração do contrato, a desistência já não afeta, pois a responsabilidade da ré Mega pelo seu ressarcimento resulta de regras próprias da sua atividade e da relação que no caso dos autos tiveram com os autores e não está dependente da relação jurídica que existiu entre os autores e a ré Carla. Aliás a ação podia ser intentada apenas contra a ré Mega».

Pretende ainda a apelante que a sentença recorrida é nula por omissão e excesso de pronúncia e que, além disso, a condenação recaiu sobre objecto diverso do peticionado, porque a sentença a condenou em danos patrimoniais, quando os AA. não pediram qualquer indemnização por tais danos, mas a “devolução” das quantias que pagaram e esse pagamento não foi feito a ela, mas à que foi 2ª R., Carla Falcão.

Já acima se viu que os AA., tendo demandado em termos solidários as aqui RR., pediram a condenação solidária de ambas a ver declarado nulo o contrato de trespasse, e a devolverem-lhes todas as quantias que pagaram no âmbito de tal contrato, bem como a pagarem-lhes uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência directa, necessária e adequada das suas actuações.

Como é evidente, no contexto da causa de pedir a que acima já se fez referência – que se subsume à culpa “in contrahendo” pela realização de um contrato nulo - o pedido da «devolução» das quantias pagas no âmbito do contrato de trespasse não se assume especificamente como efeito da nulidade do contrato por decorrência do disposto no art 289º CC, mas como indemnização em função da ilicitude especifica em que nos movemos - estão em causa nessa “devolução” os danos correspondentes ao interesse contratual negativo, ou de confiança, visto que o faltoso deverá colocar a outra parte negocial na situação em que ela se encontraria se não tivessem chegado a ocorrer negociações que culminaram num negócio nulo.

Consequentemente, estarão em causa as perdas sofridas pelos AA. com a celebração do contrato e os danos não patrimoniais directamente advindos para os mesmos com essa celebração.

O que implica, naturalmente, que também a 1ª R. pudesse ser responsabilizada em termos solidários pelas quantias pagas pelos AA. no âmbito do contrato de trespasse, sem que essa conclusão – que foi a da sentença de 1ª instância – colocasse a mesma em situação de excesso ou omissão de pronúncia e tão pouco em condenação em objecto diverso do pedido.

Com efeito, a condenação da 1ª R. no pagamento aos AA. da quantia de  € 11.700 € (e respectivos juros) na lógica da sentença recorrida constituí uma verdadeira indemnização e não uma restituição em função da nulidade do trespasse. E é por se tratar de uma indemnização e não de uma restituição, que não constituía pressuposto daquela a declaração de nulidade do trespasse, questão que a sentença entendeu – e bem –, estar prejudicada pela ausência da 2ª R. nos autos, tendo invocado a norma do art 30º/3 CPC (quando mais indicado teria sido, e porventura terá sido esse o objectivo do Exmo Julgador, invocar o disposto no nº 2 do art 33º, e a existência nesse particular de litisconsórcio necessário natural).

Conclui-se, pois, pela inexistência das causas de nulidade arguidas pela apelante.

4– Em sede impugnação da matéria de facto, pretende a apelante mostrarem-se incorrectamente julgados os pontos 2, 13 e 14 da mesma, respectivamente do seguinte teor:
«2- Para tal efeito a ré Mega colocou um anúncio num site da internet com o seguinte teor: “Café Snack Bar para trespasse situado numa zona residencial, completamente equipado, bom movimento, excelente negócio. Para mais informações ligue 219349080 ou 962066065”.
13- O estabelecimento não possuía autorização camarária para o exercício de qualquer tipo de atividade de restauração, o que era do conhecimento da ré Mega.
14- Em virtude do referido em 13 os autores encerraram os estabelecimento no dia 21 de janeiro e não o voltaram a abrir, tendo o mesmo sido entregue à ré Carla»
Pretende que a adequada ponderação da prova produzida implica que se dê como não provada a matéria de facto constante do referido ponto 14, e o seguinte, respectivamente,  relativamente à matéria em apreço nos pontos 2 e 13:
2- Para tal efeito a ré Mega colocou um anúncio num site da internet com o seguinte teor: Negócio: Venda / Trespasse Descrição do imóvel: “RESERVADO”. Snack Bar no activo completamente equipado para refeições rápidas, com 24 lugares sentados mais 24 lugares na esplanada com uma renda mensal de 950,00 €. Bom movimento. EXCELENTE NEGÓCIO. Para mais informações ligue 219349080 ou 962066065.
13- O estabelecimento não dispunha de licença de utilização para o exercício da atividade e restauração, mas já havia sido solicitado o respectivo licenciamento, na CMO – proc. n.º 48/ODV/2000 – facto que era do conhecimento dos AA. e das RR..
No que respeita à matéria do ponto 2, deve, sem grandes considerações, dar-se razão à apelante.
Efectivamente, a mesma impugnou na contestação (respectivo art 16º) que o texto do anúncio que os AA. juntaram aos autos fosse o respeitante ao concreto negócio neles em causa, tendo junto o anúncio que do seu ponto de vista dizia respeito à publicitação desse -  cfr fls  73 dos autos .
A testemunha Anabela Caldeira, escriturária/secretária na 1ª R., confrontada que foi com o teor do anúncio de fls 23, junto aos autos pelos AA., logo se apercebeu que o mesmo não respeitava ao imóvel “5040”, antes lhe dizendo respeito o anúncio junto a fls 73.
Por isso, altera-se o ponto 2 da matéria de facto, que passará a ter o seguinte teor:
«2- Para tal efeito a ré Mega colocou um anúncio num site da internet com o seguinte teor: Negócio: Venda / Trespasse Descrição do imóvel: “RESERVADO”. Snack Bar no activo completamente equipado para refeições rápidas, com 24 lugares sentados mais 24 lugares na esplanada com uma renda mensal de 950,00 €. Bom movimento. EXCELENTE NEGÓCIO. Para mais informações ligue 219349080 ou 962066065».

Mas a concordância com a apelante em matéria de impugnação da matéria de facto, no essencial, fica por aqui.

Porque, e, resumindo desde já o ponto de vista deste tribunal que adiante se justificará, sendo verdade que o estabelecimento não dispunha de licença de utilização para o exercício da actividade de restauração, mas já havia sido solicitado o respectivo licenciamento na CMO no âmbito do proc. n.º 48/ODV/2000, facto que era do conhecimento dos AA. e das RR.- o licenciamento em causa, no estado em que se encontrava no momento do negócio a que os autos se referem, e tal como ficou a constar  do ponto 13 da matéria de facto agora em apreciação, não permitia o exercício de qualquer tipo de actividade de restauração.

Vejamos porquê.

No aspecto em apreço há, em primeiro lugar, que relevar o conteúdo da certidão da CMO que os AA. juntaram aos autos a fls 190, e da qual consta o histórico do processo de licenciamento em referência.

Diz-se nessa certidão:
« (…) foi instruído nos serviços supra identificados, em 3/11/2000, o processo de licenciamento nº 48/ODV/2000, a partir do pedido desenvolvido por Paula …Rebelo de Sousa, requerendo a emissão de Alvará de Licença de Utilização para a actividade de restauração e bebidas  a exercer no estabelecimento sito na Av 25 de Abril, Lote 67, Loja C, Freguesia da Ramada. Foi o mesmo formulado nos termos do DL 168/97 de 4/7, entretanto revogado.
Em 11/3/2005, foi apresentado nestes serviços um pedido para que o processo de licenciamento passasse a seguir a sua tramitação em nome de Carla C...D...F..., com contrato de arrendamento a seu favor.
No âmbito da sua instrução e perspectivando a emissão do título, foram realizadas duas vistorias ao estabelecimento, nomeadamente em 26/11/2001 e 21/7/2006, sendo prestado, em ambas, parecer condicionado, por parte da Comissão de Vistorias.
Do último parecer e em 8/9/2006, foi dado conhecimento à exploradora do estabelecimento, Sra Carla F..., mantendo-se  o procedimento pendente a aguardar que fosse requerida a necessária vistoria camarária, para prossecução do pedido.
Não tendo sido dada resposta ao solicitado, não foi possível dar continuidade ao processo de licenciamento nº 48/ODV/2000, nos termos da legislação então em vigor, impossibilitando a emissão de qualquer titulo, por parte desta divisão (…) ».

Era nesta situação que se encontrava o pedido de licenciamento à data do trespasse em causa nos autos. 

Sobre o assunto referiu a A., em declarações de parte, no que foi secundada pela testemunha José V..., que, poucos dias depois de ter iniciado a exploração do estabelecimento - mais propriamente no 9º dia -  o seu companheiro -  o A. nos autos, José M...C... – e um amigo deste, que explora um café em Lisboa - a referida testemunha José V...-  deslocaram-se à Junta de Freguesia para tratar  da esplanada do estabelecimento, vindo aí a tomar conhecimento que, para além de que estava por pagar o valor referente à exploração da mesma há cerca de 4/5 anos, o estabelecimento  não tinha licença de exploração. Tendo-lhes sido dito que fossem averiguar à Câmara, vieram nela a saber o que consta da certidão atrás referida – que o procedimento necessário para emissão da licença se mostrava pendente desde 2006 a aguardar que fosse requerida a necessária vistoria camarária, depois de feitas obras no estabelecimento, porque o mesmo não tinha saída para fumos. “O estabelecimento não tinha saída de fumos e que ia ser difícil”,tinha que fazer obras todas de novo para ficar legal. Mandaram fazer isso à senhora em 2006 e ela nunca fez”, referiu textualmente a A.. Mais lhes foi dito que a exploração do estabelecimento naquelas condições era ilegal e que se arriscavam a ser fiscalizados, terem que pagar uma multa e… terem que fechar o estabelecimento. Tendo sido informados ainda que Carla F... devia a fornecedores, e devia água e luz. Perante estas notícias, a A., como a mesma referiu,  “entrou em pânico” – “como vou pagar rendas de 850 € mais multas ? .. – e tendo sido aconselhada pela Câmara a fechar, sendo da mesma opinião a testemunha José V...-  “pagar multas , fazer obras, pedir nova vistoria, e tudo isto se paga, mais vale fechar…” - fechou-o nesse mesmo dia. Nas declarações que prestou, a A. revelou que as quantias que entregou em função do negócio dos autos eram todas as suas poupanças, que ela e o companheiro estavam desempregados, que ela tem dois filhos, de 12 e 2 anos de idade, sendo o A. pai deste último, que se tratava de um “projecto de vida que teve que abandonar”, e que voltou a fazer limpezas como servente no Hospital de Santa Maria. Nas palavras da testemunha José V..., “tiveram que abandonar o nível de vida que pretendiam, ficaram os dois sem emprego, ela ficou muito revoltada”. A A. esclareceu que “quis dar a chave à D. Carla, mas ela não quis”, porque “já não tinha aquele dinheiro” e “não podia voltar atrás”. Referiu que não tem ideia se lhe foi entregue alguma coisa para assinar, apenas se lembrando que “foi lá o Carlos Z... entregar as plantas, com muita dificuldade, foi a única coisa que nos deu”. Tendo sido perguntada a respeito do “tipo de negócio” que havia feito, referiu que “o que foi combinado é o que está no papel - pagava 850 €, e se ao fim de um ano quisesse ficar com o estabelecimento, era abatido no preço tudo o que tinha pago, e o preço era 130.000 €”. Referiu que a D. Carla pagava renda ao Banco, mas que “era ela a senhoria”. Especificou que “era € 50.000 de trespasse, € 850,00 mensais eram também para o trespasse, 250 € eram para abater nos 50.000 €, e ao fim de um ano, via-se”. 

A testemunha Anabela C..., depois de esclarecer que se tratava de um trespasse com sublocação - “o trespasse era 50.000 €, iria pagar 250 € até aos 50,000,00 e a sublocação implicava uma renda mensal de 850,000 €” - bem como, que a “D. Carla tinha um contrato de locação financeira do imóvel com o BPI a quem pediram autorização para a sublocação”, referiu que, porque esta autorização “estava a demorar um bocado de tempo”, e porque o estabelecimento entretanto perdia clientela, as partes quiseram fazer logo o trespasse. Que nessa altura já havia autorização verbal do BPI para a sublocação e que a minuta para tal contrato chegou dois dias depois do da realização do trespasse. Que ela “completou a minuta com os dados” e não sabe “se o Carlos a entregou aos AA., ou se eles ficaram de passar lá”. E que entretanto receberem um telefonema do advogado dos AA. “que queriam anular o contrato”. Afirmou que o que sabiam a respeito da licença de exploração do estabelecimento “foi o que a D. Carla lhes tinha dito” – que estava pedida e que estava a aguardar a decisão. E que a mesma nada referiu relativamente à necessidade de fazer obras no estabelecimento. Porque os “licenciamentos em Odivelas são muito morosos” e “a maior parte dos estabelecimentos estão a laborar apenas com os pedidos”, não estranharam, e que, “pelo menos, no dia da assinatura do trespasse, estando presente a D. Carla, foi referida esta situação aos AA.”  Salientou ainda que, depois do que sucedeu, ela foi à Câmara, vindo a saber que “o processo de licenciamento estava a decorrer e que tinham sido feitas algumas exigências à D. Carla, e se se cumprissem aquelas exigências, ainda podia ser aproveitado”. Explicou ainda que os cheques de 850 € eram para a sublocação, que “não sabe porque é que um está em branco”, e que a comissão da imobiliária era de 2.500 € pelo trespasse e 850.00 € pelo arrendamento, sendo que não receberam qualquer comissão.

Entende a apelante que as declarações da A. e as da testemunha José V... não são críveis – «é destituído de lógica e sentido que os AA. encerrassem o estabelecimento no próprio dia em que, alegadamente, teriam tomado conhecimento da falta de licenciamento do mesmo», por ser «do conhecimento geral que grande parte dos estabelecimentos funcionam e podem funcionar apenas com base em pedidos de licenciamento já apresentados» – e que essa falta de verosimilidade resulta confirmada pelo facto da aludida certidão da CMO referir que «a 22/2/2010 apresenta o Sr. José M...S...C...  contrato de trespasse concretizado entre si e a anterior exploradora, Sra Carla F...», significando que, afinal, o A. só se teria deslocado à Câmara no dia 11/2/2010, e não na altura referida pela A. e pela testemunha José V.... Acrescendo que, «a não existência de licenciamento já aprovada é apenas apontada pela A. como uma, de entre várias, causas que a levaram a encerrar o estabelecimento».

Tanto quanto o permitem os meios de percepção deste Tribunal relativamente aos depoimentos prestados, os três acima referidos depoimentos afiguraram-se credíveis e compatíveis entre si, apesar de se reportarem a ângulos diversos da situação de facto.
O depoimento da A. revelou-a como pessoa muito ansiosa, admitindo-se que essa ansiedade e a revolta que sofreu, a tenham, porventura, levado a esquecer alguns pormenores da negociação no seu todo – lembre-se que os factos são do princípio de 2010 e o julgamento teve lugar em 2015 – mas admite-se também que a mesma, logo na altura da negociação, não tenha absorvido alguns  por inteiro, como seja a diferença entre o trespasse e a sublocação do espaço em que estava instalado o estabelecimento.
O depoimento de José V... pareceu sincero, calmo e seguro, sendo que o mesmo só conhecia o teor do negócio em função do que dele lhe referiram à época os AA., e que no mais em que participou o relatou com objectividade e coerência.

Pareceu também sincero, ainda que algo cauteloso, o depoimento da testemunha Anabela.

Por outro lado, e como é evidente, a circunstância de a mencionada certidão da Câmara fazer referência específica à data de 11/2/2010 como aquela em que o A. apresentou nela o contrato de trespasse, não afasta que o mesmo e a testemunha José V... se tenham deslocado, ainda em Janeiro de 2010, à mesma, e dela tenham obtido em termos genéricos e verbais as informações atrás referidas.

Quanto à circunstância dos AA. terem encerrado o estabelecimento em função de um conjunto de circunstâncias, que não apenas a de o estabelecimento não dispor de licença para exploração, ficou claro da prova produzida e acima relatada que foi esta circunstância que despoletou tal encerramento.

De todo o modo, registe-se que  a A. se queixou no julgamento, que nos nove dias em que manteve o estabelecimento aberto não teve clientela, e a testemunha José V... confirmou que no dia em que lá esteve só apareceram pessoas para “café”.

E que, pese embora a 1ª R. – que foi quem redigiu o contrato de trespasse, como o admitiu Anabela C... - não tenha escamoteado no mesmo a existência de um contrato de locação financeira imobiliária celebrado entre a 1ª outorgante (Carla  F...) e o Banco BPI -cfr respectiva cláusula 1ª, mencionando-se algo equivocamente, na cláusula 8ª, a possibilidade de opção de compra do imóvel – e por isso, não se possa dizer que os AA. não teriam sido informados da existência daquele contrato e das suas implicações em termos de renda, bem como da necessidade de ser contratada a sublocação do espaço pela 2ª R, a verdade é que a 1ª, enquanto mediadora, não deveria ter admitido a celebração do trespasse sem a concomitante celebração do subarrendamento do espaço em que o estabelecimento estava instalado, por bem saber que a celebração apenas do trespasse não regularia devidamente a situação jurídica global, como veio a suceder.

Pelo que se veio de reflectir, entende este tribunal alterar a matéria de facto do ponto 13 e 14 do seguinte modo:
13- O estabelecimento não dispunha de licença de utilização para o exercício da actividade de restauração, pois, apesar de ter sido solicitada por Carla F..., dando origem ao proc. n.º 48/ODV/2000, esta não fez as obras de que dependia tal licença, sendo que, à data do trespasse, os AA. e a 1ª R. apenas tinham conhecimento de que a licença estava pedida e se aguardava a sua emissão, por apenas tal ter sido referido por Carla F....
14- Em virtude do estabelecimento não possuir autorização camarária para o exercício da actividade de restauração, os AA. encerraram o estabelecimento no dia 21 de Janeiro e não o voltaram a abrir, tendo-o posto à disposição de Carla F..., contra a devolução da quantia de 11.700 a que se refere o ponto 9.
Impõe-se, ainda em sede de impugnação da matéria de facto, aludir à circunstância, acima relevada pela apelante, do tribunal de 1ª instância não ter incluído na matéria de facto qualquer referência à recusa dos AA. em celebrar o contrato de sublocação (e subsequentemente não ter feito referência em sede de aplicação de direito a essa circunstância). 

Note-se, como resulta do acima referido, que a matéria de facto não é omissa relativamente ao conhecimento pelos AA. da situação jurídica do imóvel, pois que lhe faz referência o ponto 4 que, ao aludir  ao conteúdo do contrato  de trespasse, refere que «o estabelecimento comercial onde se exerce a actividade de pastelaria/snack bar, sito na Av. 25 de Abril, nº 3 D, Jardim da Radial, Ramada, Odivelas, e com o nome de “Comidinha da Avó”, (…) funciona numa fracção relativamente à qual foi celebrado um contrato de locação financeira imobiliária celebrado entre a ré Carla e o banco BPI», SA, e ainda no ponto  6, onde  menciona que «os AA. obrigaram-se ainda ao pagamento da quantia mensal de 850€ a título de renda mensal que a ré Carla estava obrigada a pagar ao banco BPI».

Relativamente à omissão daquela “recusa”, há que referir que a circunstância da mesma não ter sido configurada pela 1ª R. como facto extintivo ou modificativo do direito dos AA., e por isso não constituir nos autos facto essencial, sempre obstaria a que se anulasse parcialmente o julgamento para ampliação da matéria de facto no que se reporta aos factos atinentes  à mesma, sabido como é, que tal anulação apenas deve ocorrer relativamente à omissão de factos essenciais, e ainda aí apenas quando o tribunal ad quem não tenha acesso a todos os elementos  de prova [16].

Ora, não estando em causa facto essencial e estando acessíveis a este tribunal  todos os elementos probatórios relevantes, nenhum motivo haveria para tal anulação.

Sendo muito evidente que, estando em causa dois contratos interligados e que deveriam ter sido realizados e formalizados no mesmo momento e acto, a rejeição pelos AA. do contrato de trespasse feito em separado do de sublocação, implica, naturalmente, a rejeição deste. Não está, pois, em causa uma recusa em celebrar o contrato de sublocação, está em causa a rejeição dos dois contratos, por, do ponto de vista dos AA., terem sido enganados relativamente ao objecto nuclear dos dois, que era o estabelecimento comercial e a possibilidade legal e imediata de o explorarem.

5– Pretende no entanto a apelante, agora em sede de aplicação do direito aos factos, que não induziu em erro os AA., nem omitiu qualquer dos deveres a que se encontrava vinculada, referindo que enquanto sociedade de imediação imobiliária lhe incumbia apenas informar os intervenientes de que o processo de licenciamento não se encontrava concluído, o que fez; e que não havia motivo para que o tribunal tivesse considerado ilegal o negócio gizado entre os AA. e a 2ª R., na medida em que resulta do art 23º do DL 234/2007 de 19 de Junho que os estabelecimentos relativamente aos quais os respectivos processos de licenciamento estivessem pendentes à data de entrada em vigor desse diploma legal, podiam laborar sem tal licença; que, como já referido em sede de nulidades de sentença, não se podia ter concluído que os valores pagos pelos AA. à 2ª R., por conta do preço do trespasse e de duas rendas do contrato de sub-locação, constituíssem danos patrimoniais, por tais pagamentos terem a natureza de prestações de natureza contratual feitas à 2ª R., sendo que o sujeito da obrigação de restituição seria necessariamente esta; e que o tribunal não ponderou a questão dos próprios AA. se terem recusado a outorgar o contrato de sub-locação a que se fazia menção na cláusula 1.ª do denominado contrato de trespasse, o que referem, conduziria a soluções jurídicas «bem diferentes daquelas a que se chegou» (sem que indique quais).

O tribunal a quo, ponderando os deveres que decorriam para a 1ª R. do DL 211/2004 de 20/08 (já acima referido e que na altura regulava a actividade de mediação imobiliária), entendeu que a mesma «violou, e de forma grosseira, os deveres a que estava vinculada, nomeadamente os que constam das als. d) e e) do artº 16.º/1 do DL nº 211/2004» («propor com exactidão e clareza os negócios de que forem encarregadas, procedendo de modo a não induzir em erro os interessados» -al d) - e «comunicar imediatamente aos interessados qualquer facto que ponha em causa a concretização do negócio visado» -al e). E referiu após: «A ré Mega, bem sabendo que o estabelecimento não tinha autorização para o exercício da actividade de restauração, convenceu os autores disso mesmo, fazendo até constar expressamente do contrato de trespasse a existência dessa autorização, o que fez nos seguintes termos, “mais se declarando que o mesmo possuía as habilitações e título bastante para a exploração de estabelecimento de pastelaria / snack bar”».

A alteração da matéria de facto a que se procedeu relativamente ao ponto 13, não permite já, no entanto, que se conclua que a R. omitiu o dever de comunicação referido na al e) do mencionado art 16º do DL 211/2004, pois que, a mesma não sabia, à data do trespasse, que a licença de exploração do estabelecimento, estando pendente, não poderia ser concedida sem que os AA. fizessem obras no imóvel. Segundo o entendeu este Tribunal, confiou no que Carla F... lhe disse a respeito da referida licença -  que apenas esperava a sua emissão.

Sucede que, como é evidente, uma empresa de mediação não pode confiar no que lhe é dito pelo cliente relativamente ao aspecto em apreço, como resulta claramente do então disposto na al b) do nº 1 desse art 16º, aí se referindo que lhe compete «certificar-se, no momento da celebração do (mesmo) contrato, por todos os meios ao seu alcance, da correspondência entre as características do imóvel objecto do contrato de mediação e as fornecidas pelos interessados contratantes, bem como se sobre o mesmo recaem quaisquer ónus ou encargos».

Ora, a licença de exploração relativamente a um estabelecimento comercial que se pretende trespassar, configura-se como uma «característica do imóvel» objecto do contrato de trespasse.

Consequentemente, a 1ª R. violou o dever de cuidado/protecção que lhe advém desta norma. 

Mas violou também os deveres a que se reportam as já referidas als d) e e) do mesmo art 16º ao admitir mediar a celebração do contrato de trespasse em separado do contrato de sublocação do espaço em que estava instalado o estabelecimento comercial, bem sabendo que tais contratos estavam objectiva e finalisticamente interligados, tanto para o cliente, como para o interessado, desse modo pondo em causa a exactidão e clareza do negócio global que estava em causa e concorrendo para que o mesmo, nessa intrínseca globalidade, pudesse a não vir a ter lugar como, efectivamente, acabou por suceder, não em função de uma recusa dos AA. na sua celebração, mas na rejeição justificada dessa celebração.
 
Por outro lado, não diga a apelante que do art 23º do DL 234/2007 de 19 de Junho resulta que os estabelecimentos relativamente aos quais os respectivos processos de licenciamento estivessem pendentes à data de entrada em vigor desse diploma legal podiam laborar sem tal licença, pois que a leitura nesses termos desse preceito subverte todo o espírito do diploma em causa.

Pretendeu-se com o DL 234/2007 e com a aprovação do novo regime de instalação e funcionamento dos estabelecimentos de restauração e bebidas a que o mesmo procedeu, agilizar os procedimentos de licenciamento dos estabelecimentos, «possibilitando a abertura regular dos estabelecimento de restauração ou de bebidas uma vez concluída a obra ou, na ausência desta, sempre que o estabelecimento se encontre equipado e apto a entrar em funcionamento», como se refere no respectivo preâmbulo, mas, não mais do que isso. Por isso, se diz, ainda nesse preâmbulo que, «nos casos em que os prazos previstos para a realização da vistoria ou para a emissão de licença ou autorização para estabelecimento de restauração ou de bebidas  não sejam cumpridos pelas entidades competentes, admite-se a possibilidade de abertura ao público do estabelecimento mediante a responsabilização do promotor, do director técnico da obra, dos autores dos projectos de estabilidade  e do autor do projecto de segurança contra incêndios, atestando que a edificação respeita ao projecto aprovado, bem como as normas legais e regulamentares aplicáveis, tendo em conta o uso a que se destina, assegurando-se, deste modo, a salvaguarda do interesse público»[17].

E o que se referia no seu art 23º, sob a epígrafe, “Processos pendentes”, insere-se nesta lógica, aí constando, concretamente: «Nos processos de licenciamentos de estabelecimentos de restauração ou de bebidas que à data da entrada em vigor do presente decreto-lei estejam pendentes, aplica-se o regime previsto no presente decreto lei, devendo o titular da exploração proceder ao envio da declaração prévia, nos termos dos arts 10º ou 11º, consoante os casos».

Ora nenhuma das situações previstas nesses art 10º e 11º corresponde à dos autos, em que pura e simplesmente havia obras a fazer – pelo menos a tal saída de fumos – sem as quais a licença não seria emitida.

Refere Menezes Cordeiro, a respeito dos deveres de protecção em sede de responsabilidade por culpa “in contrahendo”: «Nos preliminares contratuais, as partes devem abster-se de atitudes que provoquem danos nos hemisférios pessoais e patrimoniais umas das outras; quando não, há responsabilidade». E a respeito dos deveres de informação: «Num processo destinado à procura do consenso contratual, as partes devem, mutuamente, prestar-se todos os esclarecimentos e informações necessários à celebração de um contrato idóneo; ficam em especial abarcados todos os elementos com relevo directo e indirecto para o conhecimento da temática relevante para o contrato, sendo vedada quer a omissão do esclarecimento, quer a prestação de esclarecimentos falsos, incompletos ou inexactos».

Ora, se assim é para qualquer contratante em sede de responsabilidade pré-contratual, muito mais o é para empresas de mediação, a quem se exige capacidade profissional para acesso e permanência na actividade, que têm obrigatoriamente seguro de responsabilidade civil, e que geram, por isso, maior confiança por parte de quem a elas recorre, seja na posição de cliente, seja na de interessado, não sendo mais do que a expressão dessas exigências a enumeração dos deveres para com os interessados que se continham no referido art 16º do citado DL.

Como também é expressão dessa maior exigência a norma do art 22º/3 desse diploma legal, ao referir que «as empresas de mediação são responsáveis ainda solidariamente pelos danos causados a terceiros, para além das situações já previstas na lei, quando se demonstre que actuaram, aquando da celebração ou execução do contrato de mediação imobiliária, em violação do disposto nas alíneas a) a e) do nº 1 e nas alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo 16.º», considerando «terceiros», o nº 4 dessa norma, «todos os que, em resultado de um acto de mediação, venham a sofrer danos patrimoniais, ainda que não tenham sido parte de um contrato de mediação imobiliária».

Por isso, a 1ª R. é responsável pelos danos patrimoniais sofridos pelos AA., os quais, em função dos elementos dos autos, correspondem às quantias entregues por causa do contrato a Carla F... - € 11.700,00 e respectivos juros – não procedendo as objecções da apelante a esse nível como já se referiu a propósito das nulidades de sentença, sob pena de nenhum sentido se poder atribuir à expressamente prevista solidariedade da empresa de mediação.

Confirma-se assim a condenação da apelante na indemnização aos AA. da quantia de 11.700,00 € e dos respectivos juros desde a citação para a acção.

6– E confirma-se também a condenação da apelante por litigância de má fé porque, se apenas se provou que a 1ª R., à data do trespasse, não sabia senão o que a respectiva cliente Carla Falcão lhe teria referido relativamente à licença de exploração do estabelecimento, a verdade é que, como o admitiu Anabela C...  - e resulta do própria certidão da CMO a que atrás se fez referência («a 16/4/2010 foi formulado pedido de consulta ao processo pela sociedade “Mega Exemplo – Mediação Imobiliária Lda, pedido esse atendido mediante comprovativo de contrato de mediação imobiliária»)- quando contestou, em 20/4/2010, sabia já o estado da pendência da referida licença, que não permitia aos AA. a exploração legal e imediata do estabelecimento, e, não obstante, defendeu-se proferindo declarações contrárias ao que subjectivamente sabia não ser verdade.

Por isso se repete aqui o referido na 1ª instância: «Tendo em consideração os limites mínimo e máximo da condenação que são 2 UCs a 100 Ucs (art 27º/3 do RCP), a intensidade do dolo, que é directo e intenso e o valor em causa nos autos», considera-se adequada a multa em 7 UCs.

Por outro lado, apesar da fundamentação da 1ª instância não ser inteiramente  adequada – pois que a réplica dos AA. constituiu resposta ao pedido reconvencional que foi deduzido pela então 2ª R.. Carla F..., e não pela 1ª R. que nem sequer se defendeu por excepção – a verdade é que a má fé da 1ª R. obrigou  necessariamente os AA. a despesas processuais que não teriam tido, não se afigurando que a quantia fixada para tal indemnização, de 500 €, possa ser desajustada para tais despesas.

7– Relativamente às custas, entende-se que assiste razão à apelante.
Na altura em que foi homologada a sentença de transacção e tendo as partes nela intervenientes acordado  na divisão das custas em partes iguais, prescindindo das custas de parte, o Exmo Juiz a quo  sobreestou a pronúncia a respeito desse acordo, na medida em que se tornava necessário ouvir o M P, visto que a 2ª R. litigava com apoio judiciário, e veio apenas na sentença final a fixar as custas, fazendo-o nos seguintes termos: «A parte relativa ao acordado na transacção de fls 251-252 corresponde a 2/3 do total das custas; os restantes 1/3 ficam a cargo dos AA e da R Mega na proporção de metade para cada».

Ora, a proporção utilizada pelo Exmo Juiz a quo relativamente ao pedido dos AA. e ao da 2ª R. - 1/3, 2/3, respectivamente - não exprime  a distância que vai entre um pedido de € 11.700,00 e uma reconvenção de € 135.065,00, sendo que a  1ª R. nada teve a ver com a reconvenção.

Por isso, se revoga nesse aspecto o decidido na 1ª instância, e se condenam os AA. e a 2ª R. nas custas da reconvenção, em ½ para cada, e a aqui apelante nas custas da acção na 1ª instância, e nas custas da apelação.

V– Pelo exposto, acorda este tribunal em julgar a apelação apenas procedente no que nela se reporta às custas, confirmando-se a sentença recorrida em tudo o que não lhes respeita, condenando-se os AA. e a 2ª R., em função da transacção de fls  251/251, nas custas da reconvenção , em ½ para cada, e a 1ª R, aqui apelante, nas custas da acção na 1ª instância e nas custas da apelação, nesta.


Lisboa, 6 de Dezembro de 2017


Maria Teresa Albuquerque
Vaz Gomes                                             
Jorge Leal


[1]Direito das Obrigações», 3ª ed, p 54
[2]Direito das Obrigações», 8ª ed, 335 e ss
[3]Contratos I –Conceito, Fontes, Formação», 4ª ed, p 206
[4]-Ainda Ferreira de Almeida, obra citada, p 221; no mesmo sentido, Menezes Cordeiro, «Manual de Direito Comercial», 2ª ed, 2007, p 491
[5]-Está se a utilizar a terminologia adoptada no art 2º do DL 211/2004 de 20/8 – que regulava, ao tempo, o exercício das actividades de mediação mobiliária e de angariação imobiliária- e que a respeito da actividade de mediação imobiliária, no nº 4 daquela norma define «interessado», como «o terceiro angariado pela empresa de mediação, desde que esse terceiro venha a concretizar o negócio visado pelo contrato de mediação», e «cliente» como «a pessoa singular ou colectiva que celebra o contrato de mediação imobiliária com a empresa»
[6]-Obra acima referida, p 492.
Este autor acrescenta: «Desde logo, elas terão natureza comercial subjectiva, sempre que provenham de comerciantes no exercício da sua profissão. Mas além disso, teremos de lhes emprestar o regime comercial próprio das obrigações definitivas, por se verificar precisamente o mesmo conjunto de razões que, a estas, conecta aquele. Será um bom exemplo de situação jurídica comercial por analogia».[6] 
[7]-Neste sentido, Anselmo de Castro, «Direito Processual Civil Declaratório», II, 211
[8]Direito das Obrigações, Introdução da Constituição das Obrigações», Vol I, 5ª ed, p 169
[9]Código de Processo Civil Anotado», Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, Vol I, 3ª ed, p 571
[10]- Lebre de Freitas, obra acima referida, p 522
[11]- «Das Obrigações em Geral», 6º ed II, p 249 
Diz-se no Ac STJ 24/6/2014 (Fernandes do Vale): «O contrato de remissão consiste no acordo entre o credor e o devedor pelo qual aquele prescinde de receber deste a prestação devida, de existência indiscutível, podendo a remissão assumir natureza donativa ou puramente abdicativa»
[12]-Obra referida, vol I,  4ª ed p 682
[13]Notas ao Código de Processo Civil», na anotação ao art 108º
[14]-«Código de Processo Civil Anotado», vol I, p 548
[15]-Obra que vem sendo referida, em anotação ao art 688º do Código anterior 
[16]-Assinala Abrantes Geraldes, «Recursos no Novo Código de Processo Civil», 2013, p 240, que apenas deve ocorrer anulação quando «por falta de acesso a todos os elementos de prova que foram especificamente ponderados, não possam ser sanadas aquelas nulidades que afectem factos essenciais». .
[17]-Sobre o assunto, cfr Ac desta Relação e ecção proferido no
Proc 7918/10.0TBOER.L1 (Vaz Gomes)