Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
693/16.7T9PTM.L1-5
Relator: VIEIRA LAMIM
Descritores: CONTRAFACÇÃO
PROPRIEDADE INDUSTRIAL
PUBLICITAÇÃO DA DECISÃO
Data do Acordão: 04/17/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REJEITADO QUANTO AO PEDIDO CIVIL E NÃO PROVIDO NO SEGMENTO PENAL
Sumário: A fabricação e detenção dos produtos contrafeitos apreendidos ao arguido, que na altura exercia a actividade de vendedor ambulante, é um dano para o titular da marca, pelo risco de ser posta em causa a qualidade do seu produto, ao chegar ao consumidor produto contrafeito sem a qualidade anunciada pela marca, o que justifica a publicação da sentença, nos termos do art.338-O, do CPI, procedimento este adequado à reparação daquele dano.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa:
Iº 1. No Processo Comum (Tribunal Singular) nº693/16.7T9PTM, da Comarca de Lisboa Oeste (Juízo Local Criminal da Amadora – J2), foi julgado B., acusado da prática de um crime de contrafacção, imitação e uso ilegal de marca, p. e p. pelo artigo 323°, alíneas a) e d), do Código da Propriedade Industrial (aprovado pelo Decreto-Lei n° 36/2003, de 5 de Março).
A ofendida NIKE Innovate, CV deduziu pedido de indemnização cível contra o arguido, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia total de 2 000,00 € (dois mil euros) a título de danos não patrimoniais, ou, subsidiariamente a mesma quantia, fixa, à luz do disposto no artigo 338°-L, n°s 5 e 7, do C. Propriedade Industrial, em todo o caso com o acréscimo de juros de mora legais, vencidos e vincendos, desde a notificação do pedido, com publicitação da sentença no Boletim da Propriedade Industrial

O Tribunal, após julgamento, por sentença de 30Out.17, decidiu:

“...Pelo exposto, julga-se a acusação pública procedente, por provada e, em consequência:
Condena-se o arguido B., pela prática, em autoria material, de um crime de contrafacção, imitação e uso ilegal de marca, p. e p. pelo artigo 323°, alíneas a) e d), do Código da Propriedade Industrial (aprovado pelo Decreto-Lei n° 36/2003, de 5 de Março), na pena de 1 (um) ano e 7 (sete) meses de prisão;
Nos termos do disposto nos artigos 50°, 53° e 54°, todos do C. Penal, suspende-se a execução da pena de prisão supra pelo mesmo período de tempo, sujeita ao cumprimento, pelo arguido, de plano individual de readaptação social, em termos a definir pela DGRSP;
...
Declaram-se ainda perdidos a favor do Estado os objectos apreendidos nestes autos e determina-se desde já a sua oportuna destruição, após trânsito da presente decisão.
Determina-se ainda a publicação da presente sentença, após trânsito em julgado, a expensas do arguido, em publicação periódica semanal - cfr. artigo 338°-O do CPI.
Julga-se ainda parcialmente procedente o pedido de indemnização cível deduzido pela demandante e, em consequência, condena-se o demandado a pagar à mesma a quantia total de 1 800,00 € (mil e oitocentos euros), a titulo de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, contados a partir da notificação daquele para contestar e até integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado.

...”.

2. Desta decisão recorre o arguido B., tendo apresentado motivações, das quais extraiu as seguintes conclusões:
1ª Da prova produzida em audiência de julgamento, bem como dos elementos carreados para o processo, com o devido respeito pela opinião em contrário, não resulta que o arguido tenha cometido o crime de que vinha acusado, pelo que deveria ter sido absolvido da prática do mesmo.
2ª A única testemunha do M.P. ouvida referiu não saber a quem pertenciam as sapatilhas apreendidas, apenas sabia que era a residência do arguido e da sua família, nada mais;
3ª O arguido referiu não serem suas e explicou ao tribunal que aquele quarto tinha sido ocupado pelo seu genro, com quem se desentendeu e que este se tinha ido embora e posteriormente apresentou queixa contra si e que nada do que foi apreendido era seu. Assim,
4ª Prevalecendo em processo penal o principio “in dúbio pro reu” deveria este ter sido absolvido. Assim se não entendendo,
5ª Sendo o crime pelo qual o arguido foi condenado punido em alternativa com pena de prisão até três anos ou com pena de multa até 360 dias, com o devido respeito pela opinião em contrário, ao arguido deveria ter sido aplicada uma pena de multa, uma vez que as necessidades de prevenção geral, quer especial não são elevadas. Pois,
6ª O arguido encontra-se social, económica e familiarmente inserido, sendo chefe de uma família numerosa.
7ª No que respeita à determinação concreta da pena de multa, a mesma apresenta uma moldura penal abstrata de 10 a 360 dias.
8ª Na determinação da medida concreta da pena, o tribunal atende mais uma vez às necessidades de prevenção geral e especial, as quais conforme já se referiu são no presente caso extremamente diminutas, no nosso modesto entender.
9ª No que respeita às necessidades de prevenção geral, conforme refere e bem o tribunal “a quo” o arguido já não se dedica à actividade de comerciante de feira e denota inserção social e familiar, pelo que tal facto é suficiente para afirmar que inexistem necessidades de prevenção geral. Para além disso,
10ª Por se tratar de um crime que não visa tutelar qualquer bem imediato da pessoa humana nem qualquer bem que se encontre constitucionalmente consagrado, o mesmo não provoca qualquer tipo de alarme social, o que leva a concluir-se inevitavelmente que inexistem necessidades de prevenção geral. Por último,
11ª Não nos parece que haja assim um número tão elevado de crimes desta natureza, uma vez que a venda em feiras está a cair em desuso, os cidadãos sabem que os produtos de marca que ali estão à venda são falsos e as políticas de prevenção das marcas são muito rigorosas, pelo que estamos aqui perante um crime pontual que pouco se verifica no ordenamento português.
12ª No que respeita às necessidades de prevenção especial, abona a favor do arguido o facto de estar social, familiar e economicamente e ainda o facto de nunca ter sido condenado por crime de idêntica natureza.
13ª O registo criminal do arguido ainda que extenso respeita a crimes estradais (condução sem habilitação legal) e crimes contra a integridade física. Acresce a isto que,
14ª As condenações anteriores do arguido respeitam a factos praticados com bastante distancia temporal, o que também diminui as necessidades de prevenção geral. Pois,
15ª A maioria dos crimes foi cometida há mais de 10 anos, não se concluindo, com o devido respeito pela opinião em contrário, que o arguido tem propensão para a prática de crimes. Assim,
16ª A pena de multa é mais do que suficiente para satisfazer as necessidades de prevenção geral e especial e a sua medida concreta terá de se cifrar abaixo do quarto da pena, logo abaixo dos 80 dias.
17ª Considerando, com o devido respeito pela opinião em contrário, que se dará como não provado os factos respeitantes à prática do crime em causa, inexiste qualquer facto que fundamente a responsabilidade civil e consequente obrigação de indemnizar.
18ª Para haver obrigação de indemnizar é condição essencial que haja um dano, ou seja, que o facto ilícito e culposo tenha causado efectivamente um prejuízo ao demandante e não se trate apenas de uma expectativa ou probabilidade de vir a sofrer um prejuízo.
19ª No caso concreto não se verificou qualquer dano real na esfera jurídica do demandado, uma vez que não se verificou uma diminuição ou supressão na sua esfera jurídica, tanto mais que os artigos foram encontrados numa habitação e não numa feira ou outro ponto de venda.
20ª Acresce a isto que o arguido no momento em que lhe foram apreendidos os objectos não se dedicava à actividade comercial, pelo que nunca iria vender tais objectos, o que naturalmente invalida que se verifique um dano efectivo para a demandante.
21ª Entendeu o tribunal que a condenação deveria ser por via dos danos morais ou não patrimoniais, ou seja, aqueles que não são susceptíveis de avaliação pecuniária.
22ª No que respeita a estes danos refere Antunes Varela que: “Ao lado destes danos pecuniariamente avaliáveis, há outros prejuízos (como as dores físicas, os desgostos morais, os vexames, a perda de prestígio ou de reputação, os complexos de ordem estética) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a perfeição física, a honra ou o bom nome) que não integram o património do lesado, apesar podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo estar mais uma satisfação do que uma indemnização” (in Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol I).
23ª Conforme resulta claro da explicação deste ilustre professor de direito civil, o dano moral está inerente e directamente ligado à pessoa humana enquanto tal uma vez que pressupõe a existências de sentimentos ou dores negativas ligadas a pessoa.
24ª Quando falamos em danos morais estamos a referir-nos a compensação por prejuízos de ordem intima e directamente ligada à inteligência e sentimento humano, falamos nomeadamente em dor, desgosto, medo, complexo estético ou inquietação.
25ª Ora, a pessoa colectiva enquanto tal é insusceptível de danos morais uma vez que esta no seu fundamento axiológico visa a obtenção de lucro e todos os seus elementos são elementos patrimoniais ou seja susceptíveis de avaliação pecuniária.
26ª As pessoas colectivas são insusceptíveis de ter sentimentos, dores, repulsas ou outro tipo de complexos que determinem a existência de danos morais.
27ª A esfera jurídica das pessoas colectivas é composta única e exclusivamente por bens patrimoniais sejam eles corpóreos ou incorpóreos uma vez que todos os elementos que compõem essa pessoa colectiva são e devem ser susceptíveis de avaliação pecuniária, tanto mais que tais elementos constam do balanço da referida sociedade, sendo necessário nos termos da lei atribuir-lhe um valor para esse mesmo efeito contabilístico.
28ª Da indemnização por danos morais não pode resultar a intenção de “facultar o comércio com valores de ordem moral” (in Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I).
29ª A gravidade mede-se por um padrão objectivo, devendo ter-se em linha de conta as circunstancias concretas do caso, devendo o dano ser de tal modo acentuado que justifique a indemnização pecuniária à vítima.
30ª O artigo 496º Código Civil tem como elemento teleológico a compensação das vítimas por danos não avaliáveis em dinheiro que estejam directamente ligados a pessoa enquanto ser humano e que sejam efectivamente graves, ou seja, que merecem tutela efectiva do direito.
31ª Quando se fala em danos morais ou não patrimoniais apela-se a dores e sentimentos sofridos pela pessoa humana tais como vergonha, medo, inquietação, complexos estéticos, desgosto ou perda de reputação pessoal, logo não se incluem no âmbito do artigo 496º Código Civil os danos emergentes da utilização de marca ou patente, tanto mais que essa marca tem um valor patrimonial.
32ª “O simples incómodos não justificam a indemnização por dano não patrimonial” (Ac. STJ de 12 de Outubro de 1973). Assim,
33ª No caso, tendo em conta que o arguido não se dedicava à venda de calçado, não seria expectável que o mesmo introduzisse aqueles produtos no mercado, pelo que, como é evidente não se verificou efectivamente um dano real, mas sim um mero incómodo ou probabilidade de dano para a demandante, pelo que não há aqui lugar a qualquer indemnização.
34ª Cumpre ainda atentar na norma do artigo 338º-L do Código da Propriedade Industrial, e dizer que no caso concreto não resulta provado qualquer facto demonstrativo da obtenção de qualquer receita por parte do arguido uma vez que os objectos apreendidos se encontravam guardados numa divisão da casa que não era frequentada pelo arguido e o mesmo não se dedica ao comércio nem desses de quaisquer outros objectos.
35ª Também no que respeita aos custos suportados com a demandante com a investigação e cessação da conduta deste arguido, os mesmos não foram provados pela demandante, conforme se refere e bem na sentença recorrida: “Não se tendo provado factos demonstrativos da obtenção de qualquer receita por parte do arguido, ou quais os custos (que a demandante não provou)  suportados com a investigação e cessação da conduta do arguido” (sublinhado nosso).
36ª Ora, não se tendo provado que o arguido tivesse uma receita efectiva nem se tendo provado não poderá haver lugar a determinação de qualquer indemnização sob pena de se estarem a violar os mais elementares princípios de direito civil em matéria de responsabilidade civil extra-contratual.
37ª O facto de não se ter individualizado um dano impede que o arguido seja condenado ao pagamento de qualquer indemnização, e muito menos a título de danos não patrimoniais, uma vez que, como já vimos, este tipo de danos jamais se reconduzem a essa categoria. Assim,
38ª Deverá o pedido de indemnização cível formulado pelos demandantes ser julgado totalmente improcedente, devendo o arguido ser absolvido do mesmo, só assim se aplicando correctamente o direito instituído e fazendo-se a tão costumada justiça.
39ª No que respeita à obrigação de juros de mora legais sobre a condenação do pedido de indemnização cível, os mesmos devem contar-se desde a data do transito em julgado da sentença, nos termos do arts. 805º e 806º do C.C. e não desde a data em que foi proferida a sentença de primeira instancia.
40ª Dispõe o nº 1 do artigo 338º-O do Código da Propriedade Indústrial que: “A pedido do lesado e a expensas do infractor, pode o tribunal ordenar a publicitação da decisão final”.
41ª Uma vez que a lei é pouco clara nos requisitos de admissibilidade desta pretensão e sendo certo que para a sua determinação não poderá bastar exclusivamente o pedido do lesado, cumpre recorrer à concretização doutrinal e jurisprudencial.
42ª Conforme refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Novembro de 2011, já citado na sentença recorrida, a aplicação deste preceito legal está dependente de “provar-se a existência de dano, que a publicidade da sentença condenatória visaria reparar ou pelo menos atenuar, sendo ainda necessário averiguar se tal publicidade era ou não adequada, no caso concreto, à aludida reparação ou atenuação”
43ª A jurisprudência do STJ concretizou a norma do artigo 338º-O, nº 1 do Código da Propriedade Indústrial, afirmando que para se determinar a publicitação da sentença tem de se verificar cumulativamente os seguintes requisitos: i) provar-se a existência de dano; ii) a publicidade da sentença vise a reparação ou pelo menos a atenuação desses danos; iii) a publicidade da sentença seja adequada à reparação dos danos.
44ª Ora, no que respeita ao primeiro requisito, pode ler-se na sentença recorrida que: “Não se tendo provado factos demonstrativos da obtenção de qualquer receita por parte do arguido, ou quais os custos (que a demandante não provou) suportados com a investigação e cessação da conduta do arguido” (sublinhado nosso).
45ª A demandante não conseguiu provar a existência de quaisquer danos quer mediante a prova da receita por parte do arguido quer mediante a prova das despesas em que incorreu, pelo que, com o devido respeito pela opinião em contrário, não se verifica um dos requisitos essenciais para a determinação da publicação da sentença, pelo que, sendo estes requisitos cumulativos, com o devido respeito pela opinião em contrário, não se deveria ter determinado a publicação da mesma.
46ª Também não se provou nem resulta da sentença que a sua publicidade vise a reparação ou atenuação do dano, tanto mais que estamos a falar de produtos apreendidos há mais de um ano e que não foram postos nem vão ser postos em circulação no mercado.
47ª Também não se justificou que a publicação da sentença fosse adequada para a reparação ou atenuação dos danos, termos em que se deverá julgar improcedente tal pretensão.

3. O recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, após o que o Ministério Público respondeu, concluindo pelo seu não provimento.

4. Neste Tribunal, a Exma. Srª. Procuradora-geral Adjunta, em douto parecer, pronunciou-se pelo não provimento do recurso.
5. Colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.
6. O objecto do recurso, tal como se mostra delimitado pelas respectivas conclusões, reconduz-se à apreciação das seguintes questões:
-impugnação da matéria de facto;
-escolha e medida da pena;
-Indemnização civil;
-publicação da sentença;
*     *     *
IIº A decisão recorrida, no que diz respeito aos factos provados, não provados e respectiva fundamentação, é do seguinte teor:
Factos provados:
No dia 22/06/2016, pelas 09h30, na sequência de buscas domiciliárias, efectuadas na residência do arguido, sita na Avenida AG, Amadora, o arguido detinha na sua posse 94 pares de sapatilhas, com a marca "NIKE" aposta, 29 pares de sapatilhas, com a marca "ADIDAS" aposta, 6 pares de sapatilhas com a marca "CONVERSE ALL STAR" aposta, bem como 38 pares de sapatilhas sem qualquer marca.
Mais detinha na sua posse o arguido autocolantes flex, com os logótipos NIKE e ADIDAS, os quais são apostos nas sapatilhas através do contacto com ferro quente.
Na posse de tais autocolantes, com os logótipos acima descritos, o arguido colou tais desenhos nas sapatilhas apreendida, através de contacto com um ferro quente (vulgo ferro de engomar).
Os pares de sapatilhas que o arguido detinha na sua posse correspondem a diferentes números de calçado e não correspondem a produtos fabricados pelas marcas NIKE, ADIDAS e CONVERSE ALL STAR.
O arguido sabia que não podia utilizar, nem tão pouco reproduzir ou apor em sapatilhas sem marca desenhos correspondentes aos logótipos e nomes da NIKE, ADIDAS e CONVERSE ALL STAR, os quais sabia estarem protegidos por lei, por ter patente registada, nomeadamente por serem marcas com clara notoriedade social, o que motivou que quisesse apor tais marcas nas sapatilhas apreendidas e, mesmo assim, agiu da forma supra descrita, querendo-o, bem sabendo que desse modo agia contra a vontade dos criadores e detentores de tais marcas.
O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida criminalmente.
O arguido aufere rendimento social de inserção no valor de 570,00 € mensais, não realizando actualmente qualquer actividade laborai.
Reside em casa de habitação social, suportando para o efeito o pagamento de cerca de 20,00 € mensais.
Reside com uma companheira e quatro filhos do arguido, de 3, 5, 9 e 11 anos de idade.
O arguido tem ainda dois outros filhos, de 17 e 18 anos de idade, os quais seguem vidas independentes.
Tem, como habilitações literárias, a 3a classe.
O arguido possui antecedentes criminais registados, tendo sido condenado:
- por sentença transitada em julgado, no âmbito do processo sumário n° 676/ 98.7SILSB, da la Secção do 1° Juízo de Pequena Instância Criminal de Lisboa, pela prática, em 11/09/1998, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 45 dias de multa, à razão diária de Esc.300$00, posteriormente declarada extinta pelo cumprimento;
- por sentença transitada em julgado em 10/02/2003, no âmbito do processo sumário n°14/03.9PTALM, do 1° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Almada, pela prática, em 15/01/2003, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano, posteriormente declarada extinta por cumprimento;
- por sentença transitada em julgado em 11/12/2003, no âmbito do processo comum singular n° 532/02.6GBMFR, do 2° Juízo do Tribunal Judicial de Mafra, pela prática, em 10/10/2002, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 90 dias de multa, à razão diária de 4,00 €, posteriormente dedarada extinta por cumprimento;
- por acórdão transitado em julgado em 17/12/2007, no âmbito do processo comum colectivo n° 351/06.0PELSB, da 3ª Vara Criminal de Lisboa, pela prática, em 04/2006, de um crime de contrafacção de moeda, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, posteriormente declarada extinta por cumprimento;
- por sentença transitada em julgado em 02/10/2015, no âmbito do processo sumaríssimo n° 147/14.6ECLSB, do Juízo Local Criminal de Mafra, pela prática, em 16/10/2014, de um crime de venda, circulação ou ocultação de produtos ou artigos, na pena de 100 dias de multa, à razão diária de 5,00 €, posteriormente declarada extinta pelo cumprimento; e
- por sentença transitada em julgado em 15/05/2017, no âmbito do processo comum singular n° 104/16.8PAPTM, do Juízo Local Criminal de Portimão, pela prática, em 05/02/2016, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, na pena de 1 ano e 9 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo.
A demandante NIKE Innovate, CV, e respectiva marca estão registadas internacionalmente e em Portugal.
É consabida a notoriedade da marca NIKE quanto ao seu renome e reputação.
É através dessa marca da demandante que os consumidores se identificam com os produtos da mesma, com a sua qualidade e genuinidade.
É por causa dessa marca e do que ela significa que os consumidores adquirem os produtos comercializados pela demandante.
É também nessa marca que a demandante faz grande parte do seu investimento: para garantir que os produtos são inovadores e da mais elevada qualidade possível.
Depois de produzidos tais produtos, a demandante gasta vários milhares de euros anualmente e ao nível mundial, para promover, publicitar, fomentar e desenvolver a imagem das marcas de que é titular.
Em Portugal, a demandante gasta uma média anual de cerca de 100 000,00 € (cem mil euros) para defender a protecção das suas marcas, nomeadamente com acções de formação, fiscalização, deslocações para colaborações com os Tribunais e custos judiciais.
Para garantir que a qualidade das suas marcas não é posta em causa no mercado pela circulação de produtos de má qualidade, emprega um rigoroso controlo de qualidade, substituindo todos os artigos da marca que apresentem imperfeições e defeitos de fabrico.
Com tal cuidado pretende-se garantir que não sejam comercializados produtos que tenham uma qualidade abaixo dos padrões de excelência que a demandante se esforça por conseguir, defendendo assim a imagem e o prestígio internacional das suas marcas, granjeados, ao longo de largos anos, sempre na procura e no cumprimento dos mais elevados padrões de qualidade.
Conseguiu-o, tem-no conseguido, e tem garantido com isso, recompensa do reconhecimento do público em geral, e dos seus competidores mais directos.
Na realidade, o comerciante ou consumidor quando procura artigos das marcas da demandante fá-lo, essencialmente, por ter confiança no seu padrão de qualidade.
A demandante faz a distribuição dos produtos das suas marcas através de distribuidores que compram os produtos à demandante e posteriormente os revendem aos consumidores.
Os consumidores que adquirem os produtos da demandante deixam de comprá-los quando se generaliza a ideia de que as marcas da demandante são comuns e contrafeitas e que toda a gente as usa.
z)       Em virtude de condutas como a do arguido, os consumidores da demandante perdem interesse em adquirir as peças de que a mesma é titular.
aa) Em virtude da conduta do arguido a imagem de confiança, solidez e segurança da demandante foi posta em crise.
bb) A conduta do arguido contribuiu para a banalização da marca da demandante.

2.2. Factos não provados
Não há.

2.3 Motivação da decisão de facto
A convicção do Tribunal sobre a matéria de facto dada como provada alicerçou-se na análise crítica do teor do auto de busca e apreensão de fls. 34-36; fotografias de fls. 37-41; autocolantes "flex" com logotipos de fls. 4247; autos de exame e avaliação de fls. 51-60; exame pericial de fls. 211 e exame pericial de fls. 214-215, bem como nas declarações do arguido, as quais foram, nomeadamente, tidas em conta para a prova das suas actuais condições económicas e sociais mencionadas nos factos provados, uma vez que se mostraram genericamente credíveis nessa parte, pese embora, no mais, não o tenham sido.
Com efeito, o arguido, em audiência, optou por prestar declarações, nas quais, em síntese, reconheceu que, na data dos factos, exercendo a actividade de vendedor ambulante, possuía num dos quartos da sua habitação os produtos que vieram a ser apreendidos nos autos.
Porém, recusou que estes lhe pertencessem, sendo que o seu proprietário era o companheiro de uma das filhas do arguido, de nome P., que, em tal data já havia abandonado a habitação por o arguido não o querer a residir consigo em virtude de agressões que cometia contra a filha deste.
Assim, mais referiu que, no seu entender, a referida apreensão resultou de diligências policiais iniciadas por uma denúncia feita por vingança do referido P., de que o arguido detinha armas proibidas, pretendendo com isso que também fossem encontrados os aludidos produtos de forma a melhor prejudicar o arguido.
Esclareceu ainda que, na data dos factos, tais produtos encontravam-se todos dentro de caixas no referido quarto, no qual pernoitou o referido P., juntamente com os restantes materiais apreendidos nos autos, aí se encontrando já há cerca de 2/3 meses após o aludido indivíduo ter saído da residência e sendo que o arguido desconhecia o conteúdo de tais caixas.
Ora, tais declarações do arguido não se mostraram inteiramente verosímeis, nomeadamente à luz das regras de experiência comum.
Na verdade, considerando o tipo de actividade laboral que o arguido declarou que então realizava - de vendedor ambulante - tal como as características e quantidades dos produtos que vieram a ser encontrados na sua posse, em conjugação com a circunstância de o arguido ter conhecimento da sua existência, pelo menos, durante 2/3 meses antes da data da respectiva apreensão, estas mostraram-se incompatíveis com o seu alegado desconhecimento e com a conclusão de que tais produtos e materiais não lhe pertenciam.
Aliás, perante aquelas circunstâncias, antes seria mais plausível que o arguido, ao longo de tal período de tempo, tomasse as diligências necessárias para que esses produtos saíssem da sua habitação, quer entregando-os ao respectivo proprietário, ou mesmo que tal não fosse exequível, entregando-os às autoridades policiais.
Contudo, o arguido nada fez nesse sentido.
Por conseguinte, tais explicações não se mostraram verosímeis ao Tribunal, antes se denotando seguro que o arguido apenas procurou apresentar uma versão dos factos que lhe fosse favorável, sem aderência à realidade histórica, e, do mesmo passo, que os aludidos produtos eram pertença do arguido, que era o mesmo quem sobre os mesmos actuava de modo a que produzisse produtos comerciais semelhantes aos das marcas NIKE, ADIDAS e CONVERSE ALL STAR, ciente de não estar autorizado para o efeito, visando a respectiva comercialização posterior e consequente obtenção de proveitos e sabendo tal conduta proibida e punida por lei.
Ademais, tal convicção mostrou-se reforçada à luz do depoimento da testemunha F.G., Chefe da PSP, o qual, de modo espontâneo, isento, coerente e detalhado, descreveu as circunstâncias de tempo, modo e lugar em que ocorreu a apreensão dos aludidos produtos e materiais ao arguido, explicitando que o quarto em que o arguido referiu ter pernoitado o companheiro da sua filha e no qual aqueles foram encontrados não apresentava qualquer característica comum de quarto de habitação, não possuindo qualquer cama ou mobiliário associado ao uso do mesmo para pernoita.
Por conseguinte, atento o contexto probatório acima elencado, o Tribunal formou a convicção segura de que o arguido agiu como vinha descrito na acusação pública, motivo pelo qual a respectiva actuação resultou como provada, no sentido em que o foi.
Teve-se ainda em conta o depoimento de C.B., perita de propriedade industrial da firma demandante, a qual, de modo sereno, espontâneo, coerente e objectivo, descreveu as características de implementação da demandante no mercado nacional e internacional, tal como a marca dos produtos que comercializa, designadamente do ponto de vista do nível de exigência estabelecido para os padrões de qualidade de fabrico dos respectivos produtos e as condições de comercialização, preços habitualmente praticados - incluindo para o tipo de produtos encontrados na posse do arguido. De resto, descreveu ainda as diligências praticadas pela demandante com a protecção, desenvolvimento e divulgação de tais produtos e os custos envolvidos, em suma contribuindo para que se desse como provada a factualidade inserta nas alíneas m) a bb) dos factos provados.
E quanto aos registos criminais do arguido, considerou-se o teor do Certificado de Registo Criminal junto aos autos.
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IIIº 1. De acordo com o art.428, nº1, do Código de Processo Penal, “as relações conhecem de facto e de direito”.
No caso, o recorrente considera incorrectamente julgada a matéria de facto na parte em que foi dado como provado que detinha os bens apreendidos e que colocou os autocolantes nas sapatilhas, alegando que a única testemunha ouvida referiu não saber a quem pertenciam esses bens e o arguido declarou em audiência que o quarto onde foram apreendidos tinha sido ocupado pelo seu genro, com quem se desentendeu, tendo este saído de casa e apresentado queixa.
Ouvida a gravação da prova produzida em audiência, a mesma confirma o que consta da fundamentação da sentença recorrida.
A testemunha F.G., confirmou a apreensão dos bens descritos nos factos provados, esclarecendo que a dependência da casa do arguido onde os mesmos foram encontrados não tinha qualquer mobiliário próprio de quarto de dormir, assim contrariando a versão do arguido de se tratar de dependência onde pernoitou o seu genro.
A testemunha C.B., perita de propriedade industrial, descreveu as características dos bens apreendidos, de forma compatível com o considerado provado.
O arguido confirmou a apreensão dos bens, nas circunstâncias de tempo e lugar consideradas como provados, confirmando nessa parte o depoimento da testemunha F.G., esclarecendo, ainda, que então exercia a actividade de vendedor ambulante.
Perante estes elementos de prova, a conclusão do tribunal recorrido de os bens apreendidos pertencerem ao arguido e de ter sido ele a colocar os autocolantes nas sapatilhas, apresenta-se lógica e conforme as regras da experiência comum, na verdade, ele detinha os bens na sua casa e essa detenção é compatível com a actividade que então exercia, não indicando quaisquer provas que imponham decisão diversa da recorrida.
Os juízos dados como assentes na decisão recorrida apresentam-se plenamente legítimos face ao conteúdo do princípio da livre apreciação da prova, sendo a versão dada como provada plenamente plausível face às provas em análise, não revelando ter havido qualquer arbítrio ou discricionariedade na sua apreciação, nem atentando contra a lógica ou contra as regras da experiência comum.
Encontrando-se a decisão do tribunal recorrido, no que diz respeito aos factos impugnados, devidamente motivada e tendo apoio no princípio da livre apreciação da prova, não existindo em relação a eles quaisquer dúvidas, limitando-se o recorrente a querer fazer vingar a sua apreciação pessoal sobre a prova produzida, é manifesto que a sua pretensão de ver alterada a decisão relativa à matéria de facto não pode obter provimento.

2. Os factos provados integram todos os elementos típicos do crime de contrafacção, imitação e uso ilegal de marca, p.p., pelo art.323, als.a, e d, do Código da Propriedade Industrial, com pena de prisão até três anos ou com pena de multa até 360 dias.
Tendo o tribunal recorrido optado pela pena de prisão e graduado esta em 1 ano e 7 meses, suspensa na sua execução, defende o condenado que o tribunal devia ter optado pela pena não detentiva e graduado esta abaixo dos 80 dias.
De acordo com o art.70, do Código Penal, nestes casos, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
O tribunal recorrido, optou pela pena de prisão justificando essa opção com as fortes exigências de prevenção especial “... a pena de multa não as satisfaz, já que se mostra insuficiente para que sejam alcançados os efeitos que se pretendem obter com a reacção criminal, na justificação da prognose social favorável que está na base da opção pela pena não privativa da liberdade.”.
Como ensina o Prof. Figueiredo Dias[1]são finalidades exclusivamente preventivas, de prevenção especial e de prevenção geral, não finalidades de compensação da culpa, que justificam (e impõem) a preferência por uma pena alternativa ou por uma pena de substituição...”.
Ora, considerando os antecedentes criminais do arguido, com seis condenações criminais registadas, três por condução sem habilitação legal, uma por crime de contrafacção de moeda, uma por crime de venda, circulação e ocultação de produtos ou artigos e outra por ofensa à integridade física qualificada, com condenações em pena de multa (3) e pena de prisão suspensa na sua execução (3), a pena de multa apresenta-se insuficiente para uma adequada satisfação das finalidades da punição.
Quanto à medida da pena concreta, como é sabido, a sua determinação faz-se em função da culpa do agente e entrando em linha de conta com as exigências de prevenção de futuros crimes.
A culpa é um referencial que o julgador nunca pode ultrapassar. Até ao máximo consentido pela culpa, é a medida exigida pela tutela dos bens jurídicos que vai determinar a medida da pena, criando-se uma moldura de prevenção geral, cujo limite máximo é a protecção máxima pensada para os bens jurídicos da comunidade e cujo limite mínimo é aquele abaixo do qual já não há protecção suficiente dos bens jurídicos. Dentro destes limites intervêm, para a concretização, a prevenção geral e a ideia de ressocialização.
Quanto às exigências de prevenção geral, dizem as mesmas respeito à confiança da comunidade na ordem jurídica vigente que fica sempre abalada com o cometimento dos crimes, têm a ver com a protecção dos bens jurídicos, com o sentimento de segurança e a contenção da criminalidade, em resumo, visam a defesa da sociedade.
Já as exigências de prevenção especial se prendem com a capacidade do arguido de se deixar influenciar pela pena que lhe é imposta, estão ligadas à reintegração do agente na sociedade.
No caso, considerando o grau de ilicitude (mediano), o grau da culpa (elevado, já que agiu com dolo directo, não assumindo em audiência os factos), as exigências de prevenção geral (prementes, como forma de defender o mercado e a sã concorrência), assim como as exigências de prevenção especial (acentuadas, atentos os antecedentes criminais do arguido), a gradução da pena em 1 ano e 7 meses de prisão (próximo do ponto médio entre os limites mínimo e máximo da pena abstracta), suspensa na sua execução, apresenta-se adequada, proprorcional e revela preocupação com as exigências de reinserção social do agente.

3. A fabricação e detenção dos produtos contrafeitos apreendidos ao arguido, que na altura exercia a actividade de vendedor ambulante, é um dano para o titular da marca, pelo risco de ser posta em causa a qualidade do seu produto, ao chegar ao consumidor produto contrafeito sem a qualidade anunciada pela marca, o que justifica a publicação da sentença, nos termos do art.338-O, do CPI, procedimento este adequado à reparação daquele dano.

4. Condenado a pagar à ofendida a indemnização de €1.800, a título de danos não patrimoniais (na procedência parcial do pedido de €2000 por ela formulado), o recorrente defende a sua absolvição desse pedido.
Contudo, nessa parte o recurso é de rejeitar, por inadmissibilidade, nos termos do disposto nos arts.400, nº2, 414, nº3, 417, nº6 al.b) e 420, nº1 al. b), todos do CPP, na medida em que o valor do pedido (€2.000) é muito inferior à alçada do tribunal recorrido, fixada em €5.000,00 à data da dedução do pedido de indemnização formulado contra o ora recorrente (art.44, nº1, da Lei nº62/13, de 26Ago.).
*     *     *
IVº DECISÃO:
Pelo exposto, os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa, após conferência, acordam:
a) Em rejeitar o recurso em relação ao pedido civil, por inadmissibilidade legal;
b) Em negar provimento ao recurso na parte restante, confirmando a sentença recorrida;
c) Em condenar o recorrente, em três Ucs de taxa de justiça.
                                               
Lisboa, 17-04-2018

Relator: Vieira Lamim

Adjunto: Ricardo Cardoso

[1] As Consequências Jurídicas do Crime, pág.331.