Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2430/2006-9
Relator: ANA BRITO
Descritores: LENOCÍNIO
MEDIDAS DE COACÇÃO
PRISÃO PREVENTIVA
JULGAMENTO
FUGA
PRISÃO EFECTIVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/30/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I – No decurso do julgamento, o arguido e ora recorrente, em liberdade, mas com a proibição de contactar os menores testemunhas, incumpriu essa obrigação, em plena fase de produção de prova, tendo estabelecido contactos com algumas das testemunhas.

II – Nesse mesmo período o arguido manifestou a intenção de se instalar em Inglaterra, país onde já trabalhou.

III – Deve manter-se, assim, o despacho que determinou a medida de coacção de prisão preventiva pelo restante período de decurso do julgamento, tanto mais que, posteriormente ao referido despacho veio a ser proferido acórdão condenando o arguido na pena de oito anos de prisão.
Decisão Texto Integral:
1. No processo nº1193/04.3TDLSB da 6ªVC de Lisboa 3ªS, o arguido A. interpôs recurso do despacho que determinou que aquele aguardasse ulteriores termos do processo em prisão preventiva, por considerar verificados as condições gerais da aplicação de qualquer medida de coacção e os pressupostos específicos da prisão preventiva.
Concluiu as suas motivações da forma seguinte:
“O recorrente não tem antecedentes criminais.
O recorrente está preso preventivamente pela terceira vez no âmbito do presente processo.
Foi o arguido, no passado dia 9 de Janeiro de 2006, confrontado com um fax da instituição "C…" que alberga a testemunha B., cujo conteúdo retrata alegadas tentativas de contacto nos primeiros dias de Janeiro, efectuados por alguém que se intitulava chamar A… à testemunha supra referida.
Sem rigor de prova, este fax não consegue em concreto, afirmar se era efectivamente o arguido nos autos, ou se outra pessoa a fazer se passar por ele, que desejava entrar em contacto com o Sr. B..
Na verdade, o contacto propriamente dito nunca se efectivou e o arguido refuta as afirmações constantes do fax remetido ao presente processo.
Na sequência do interrogatório, foi questionado o arguido pelo facto de numa das sessões de julgamento, uma das testemunhas ter dito que recebeu uma chamada do arguido A., ao que o arguido terá dito, ao menor que na sessão anterior "tinha-se atrapalhado todo", e que "contasse a verdade". Efectivamente o menor, na la sessão que depôs, não foi tão esclarecedor como foi na segunda sessão. Aliás, o arguido não foi sequer visado nesse depoimento.
No entanto, esta questão pertence única e exclusivamente à produção de prova e não a este interrogatório judicial efectuado depois de toda a prova ter sido produzida, na verdade só após terem terminado as alegações finais de todos os Srs. Advogados, é que por ordem judicial foi o arguido detido.


Quanto ao referido "historial" de contactos, há que dizer que o Tribunal da Relação de Lisboa, por duas vezes deu provimento ao requerido pelo arguido determinando que este aguardasse os ulteriores termos do processo em Liberdade em detrimento da prisão preventiva sempre aplicada por despacho de 1ª instância.
Com efeito, o arguido recorreu do 1° despacho de prisão preventiva, ficando, por decisão do Douto Acórdão do T.R.L. n° 5388/04, com a obrigação de não se ausentar para fora do País, a obrigação de não contactar o então menor B. e a proibição de permanecia no parque Eduardo VII medidas estas que o arguido cumpriu escrupulosamente.
Mais tarde, e por ter contactado o menor D., foi lhe imposto a proibição de contactos com menores de 16 anos. Posteriormente a esta decisão, o arguido cruzou-se com o menor Fábio Santos e com ele entabulou uma informal, na presença do educador do menor.
Por este facto e sem nunca se apurar quais os intentos do contacto e se efectivamente este contacto prejudicou de que forma fosse o bom funcionamento processual dos presentes autos, determinou-se novamente a aplicação da prisão preventiva.
Um ano após e depois de requerida a alteração da medida de coacção por atenuação das circunstancias que determinaram a prisão preventiva ao arguido, dado que o menor deixou de o ser por ter celebrado 16 anos de idade, o mesmo foi indeferido e objecto de nova recurso para o T.R.L.
Com efeito, por douto acórdão do T.R.L. n° 8512/05, decidiu-se julgar procedente o recurso interposto, substituindo-se a prisão preventiva pela medida de coacção TIR. Refere o douto acórdão quanto ao crime de actos homossexuais com adolescentes que, e passo a citar, "entende-se não dever atender-se a estes ilícitos pelos quais o ora recorrente se encontra, em nosso muito modesto entender, indevidamente pronunciado" (fim de citação). Mais refere, quanto ao crime de lenocínio, art° 176° n° 1 e 3 por que vinha pronunciado que, "confessamos não vislumbrar qualquer suporte fáctico que permite integrar tal conduta no n° 3 o citado artigo 76°, como se, faz. ". Mais se pronuncia dizendo ainda quanto ao crime de lenocínio " Finalmente, sempre se dirá ainda e também que neste domínio é ainda e também de duvidosa constitucionalidade esta incriminação, como bem explana Anabela Miranda Rodrigues. ".
Por fim refere ainda o douto acórdão que " os crimes pelos quais o recorrente se mostra pronunciado são, como se disse, de muito duvidosa constitucionalidade, sobretudo e em particular, os dozes crimes do artigo 175° do C.P., tal como decidiu, repetidamente já, o nosso, Tribunal Constitucional. 0 crime de lenocínio supra referido, por total ausência de factos bastantes, não assumem a gravidade constante da douta pronúncia .
No que se refere ao perigo de fuga, há que esclarecer que o relatório social com que se baseou o meritíssimo Juiz de Direito, foi colhido, ainda estava o arguido preso preventivamente. Com efeito, o arguido manifestou à assistente social que, finalizado o processo, depois de cumprir o que houvesse a cumprir, caso o acórdão fosse condenatório, refazer a sua vida no estrangeiro onde já trabalhou como empregado de mesa, factos estes que constavam do processo.
Inadmissível é imputar ao arguido a tentativa de se eximir acção da justiça, baseando-se num relatório social que serve exclusivamente para se aferir da personalidade do arguido, muitas das vezes beneficiando-o. O que significa que todo o tempo em que o arguido esteve em liberdade, na pendência do processo, em nada o favoreceu. Note-se que o arguido não faltou a uma única sessão de julgamento (e foram muitas as sessões de julgamento), podendo faze-lo. Mais, durante o curto tempo que esteve em liberdade, após 1ª decisão do T.R.L., o mesmo não fugiu e a prova disso foi ter sido facilmente encontrado para ser levado, de livre vontade, aos interrogatórios judiciais.


Quanto ao perigo de conservação ou veracidade da prova, este não existe nem nunca poderia existir face à fase processual em que nos encontramos, com a produção de prova há muito finda e à espera de decisão final, condenatória ou absolutória. Há que realçar que o adolescente B., quarta testemunha na ordem da acusação foi ouvida no mês de Dezembro do ano passado, tendo toda a prova sido gravada através dos meios técnicos para esse efeito, incluindo o seu depoimento. Relembra-se e consta dos autos que a testemunha depôs contra o arguido (factos estes que constavam nos autos pelo depoimento em sede de inquérito) e nada de novo trouxe ao processo. De que forma pode o arguido perturbar a conservação ou veracidade do depoimento da testemunha B.? Nem se diga que será suficiente para se dizer que concretamente subsiste este perigo, o facto, e legítimo, de o ofendido desistir da queixa apresentada contra o arguido. Mais, perguntado em sede de audiência de julgamento a testemunha B., referiu, com toda a clareza que não queria desistir da queixa contra o recorrente. Certamente, se o disse em sede de audiência de julgamento, não seria agora que voltaria atrás.
Por ultimo, importa deixar bem realçado que, desde o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12/10/05 no processo n° 8512/05 da 3a Secção, ficou decidido e transitado em julgado a sua libertação, tendo o TIR como única e exclusiva obrigação. Desde a publicação deste Acórdão, o que quer que lhe seja imputado agora não será nunca o incumprimento de qualquer obrigação.
Assim sendo e achando-se finda a produção de toda a prova em julgamento torna-se caricato considerar sequer a existência ou não de perigo de conservação ou veracidade da prova, já produzida.
O aproveitamento da manifestada intenção de o arguido ir trabalhar para Inglaterra não pode colher porquanto o arguido, em liberdade nunca faltou a nenhuma audiência o que espelha bem a sua determinação, isso sim, em ver resolvidos todos os seus problemas judiciais pendentes, antes de satisfazer a aludida intenção. Aliás, o arguido de qualquer que seja a decisão final transitada em julgado, já tem cumpridos 19 meses de prisão, o que constitui um "crédito" a ter em conta em eventual pena a sofrer.”
O Magistrado do MP apresentou a sua contra-motivação pugnando pela manutenção do despacho recorrido e concluindo, por seu turno:
“O despacho, proferido em 9 de Janeiro de 2006, por intermédio do qual foi imposta ao arguido A. a medida de coacção da Prisão Preventiva, não violou qualquer norma legal atinente ao caso;
Nomeadamente as contidas nos artigos 193°, 202° e 204° do Código de Processo Penal;
Por seu intermédio, não foi efectuada qualquer interpretação contrária à Lei, pelo que,
Mantendo-o, nos seus precisos termos, farão Vossas Excelências, como sempre, justiça.”
Neste Tribunal o Sr. Procurador-geral adjunto pronunciou-se no sentido da procedência do recurso, posição novamente sufragada pelo recorrente.
Foram colhidos os vistos.

2. O Sr. Juiz de Instrução criminal fundamentou a sua decisão da seguinte forma:
“A detenção mostra-se válida porquanto efectuada ao abrigo do disposto nos arts 254 n°1 al. a) e 2 e 257 nº 1 ambos do C.P.Penal, não tendo sido excedido o prazo a que alude o primeiro preceito legal citado.
Indiciam fortemente os autos a prática pelo arguido A. para além do mais, de um crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176 n°1 do C. Penal. Aliás, nas sucessivas decisões judiciais que ao longo deste processo têm sido proferidas sobre tal matéria, sempre se tem considerado verificado tal indiciação do referido crime, sendo que a divergência entre o decidido no despacho de fls. 575 a 580 face ao segundo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que apreciou a aplicação ao arguido A. da medida de coação de prisão preventiva versa apenas sobre as circunstâncias de se verificarem ou não os pressupostos do nº 3 do referido art. 176 do C. Penal. A este propósito, cumpre ainda referir que ao contrário do que alega o ilustre defensor do arguido A., no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10/10/2005, quando aí se faz menção a "total ausência de factos bastantes", não se pretende afirmar a ausência dos pressupostos do nº 1 do art. 176 do C. Penal, mas sim a falta de verificação da previsão do nº 3 do mesmo dispositivo legal.
O arguido A. começou por ser sujeito à medida coação de prisão preventiva em 24/04/2004, por se ter entendido que se verificavam quanto ao mesmo os perigos de fuga, da continuação da actividade perigosa e de perturbação do inquérito, tendo-se ainda considerado existir perigo da perturbação da ordem e tranquilidade públicas "cfr 576 a 577". Por acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 15/06/2004 na sequência do recurso interposto da decisão que ao arguido António Nogueira aplicou a mencionada prisão preventiva decidiu-se substituir essa medida de coação pelas da obrigação do arguido não se ausentar para o estrangeiro, de não frequentar o Parque Eduardo VII, de não contactar com o menor B. e da apresentação semanal no posto policial da área da sua residência.
Após a prolação deste acórdão mostrou-se indiciada nos autos, o que foi confirmado pelo arguido em interrogatório judicial, que o mesmo contactou com o menor D.. Nesta sequência para além de se decidir manter as medidas impostas no aludido acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, foi ainda o arguido proibido de contactar com menores de 16 anos (cf. 1462 a 1467).
Posteriormente, e porque houve notícia no processo de que o arguido contactou o menor E., o que o primeiro admitiu em sede de interrogatório judicial, foi de novo imposta ao arguido a medida de coação de prisão preventiva em 08/07/2004 "cf. 1576 a 1580"
Resulta do depoimento da testemunha do D. prestado já em sede de audiência de discussão e julgamento que no decurso da mesma o arguido A. entrou em contacto consigo. Na verdade, a mencionada testemunha D. prestou depoimento ao longo de duas sessões de audiência de julgamento e na segunda dessas sessões referiu que no dia em que anteriormente havia prestado depoimento o arguido telefonou-lhe e comentou a forma como depôs, tendo-lhe nomeadamente dito atrapalhaste-te todo. De acordo com o fax remetido a este Tribunal no passado dia 6, pela “C…”, onde a testemunha B. se encontra acolhido, o arguido A. tentou contactar aquele, mais concretamente já durante o período em que decorreu a audiência de discussão e julgamento.
No passado dia 04/11/2005, o instituto de reinserção social elaborou relatório social sobre as condições de vida do arguido A. assente, para além do mais, em entrevistas com o mesmo, de onde se extrai, que o arguido tem intenção de se instalar em Inglaterra "cf. 3560".
Tendo em atenção todo o historial de contactos com as testemunhas deste processo mantidos pelo arguido A., havendo a realçar a circunstância do mesmo depois de lhe terem sido imposta a referida medida de coação o mesmo não se ter coibido de contactar com a testemunha D. e de ter tentado entrar em contacto com a testemunha B., ainda para mais durante o período em que decorreu a audiência de discussão e julgamento, considero que existe em concreto o perigo para a conservação ou a veracidade da prova a que alude o art. 204 al. b) do C.P.Penal.
Na verdade, apesar de já ter terminado a produção de prova, qualquer tomada de posição que as testemunhas D. e B. viessem a ser manifestar no processo nunca poderia ser desprezada pelo Tribunal até à prolação da decisão final. A este propósito, cabe ainda lembrar que a testemunha B. foi expressamente confrontada pela defesa do arguido A. com a possibilidade de poder exercer desistência da queixa relativamente aos crimes de actos homossexuais com adolescentes por que aquele foi pronunciado.
Atendendo ainda ao desejo manifestado pelo arguido de se vir a instalar em Inglaterra, renovado recentemente, conforme consta do relatório social acima citado elaborado com base em declarações do próprio, o que representa factualidade nova face aos fundamentos que estiveram na base da aplicação ao arguido da medida de coação de prisão preventiva da primeira vez, considero verificar-se, em concreto, perigo de fuga daquele - art. 204 al. a) do C.P.Penal.
Perante a verificação deste perigo, deve ser imposta ao arguido A. uma medida de coação que responda de forma adequada ao mesmo e que seja proporcional à gravidade do crime de Lenocínio fortemente indiciado, sendo certo que só é de aplicar a prisão preventiva se todas as outras medidas de coação se mostrarem insuficientes.
No caso concreto, tendo em atenção o desrespeito demonstrado pelo arguido por decisão que o proibiu de contactar com menores, a que acresce a circunstância de o arguido já ter trabalho em Inglaterra, país onde se pretende instalar (cf. 557), o que facilita a sua ida para aquele país, entendo que nenhuma outra medida de coação para além da prisão preventiva pode impedir a fuga e a verificação do aludido perigo para a conservação ou veracidade da prova e que, dada a gravidade do crime fortemente indiciado, ela não representa uma medida excessiva.
Assim, e por que no caso se verificam as condições gerais da aplicação de qualquer medida de coação e os pressupostos específicos da prisão preventiva mencionadas nos arts 202 nº 1 al. c) do C.P.Penal, determino que o arguido A. aguarde os ulteriores termos do processo em prisão preventiva”

3. Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente (cf. AC. STJ 16-11-1995, 31-01-96 e 24-03-99 BMJ 451-279, 453-338 e CJ VII-I-247, e arts. 403º e 421º, nº1 do CPP), a questão a decidir limita-se à da verificação dos pressupostos da prisão preventiva, mais concretamente à existência dos dois perigos que suportaram, in casu, a decisão.
São eles o perigo de fuga e o perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova.
Não se encontra em discussão, neste momento processual, a suficiência dos indícios, desde logo por ter sido entretanto proferida decisão final em 1ª instância.
Com efeito, posteriormente à prolação do despacho recorrido foi proferido acórdão que condenou o recorrente numa pena única de oito anos de prisão, resultante do cúmulo jurídico das penas correspondentes a um crime de lenocínio de menor qualificado do art. 176º, nºs 1 e 3 do CP (quatro anos de prisão) e de nove crimes de actos sexuais com adolescentes do art. 175º do CP (um ano de prisão por cada um deles).
A suficiência dos indícios relativamente aos crimes da condenação (não transitada em julgado) não pode ser, nem é, questionada em sede deste recurso.
Verificado assim o condicionalismo previsto no art. 202º, nº1, al. a) do CPP (“fortes indícios da prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a três anos”, cumpre saber se ocorrem in casu, também, os demais pressupostos legitimadores da prisão.
E passamos assim à análise dos “perigos” que fundamentaram a decisão, partindo da disciplina legal.
Assim, dispõe o art. 204º do CPP que “nenhuma medida de coacção à excepção da que se contém no art. 196º, pode ser aplicada se, em concreto, se não verificar: a) fuga ou perigo de fuga; b) perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; c) ou perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de perturbação da ordem e da tranquilidade públicas ou de continuação da actividade criminosa”.
Enumeram-se as situações que consubstanciam exigências cautelares processuais e extra processuais (como a necessidade de protecção da comunidade e da própria vítima) consideradas com relevo bastante para justificar a aplicação de medida de coacção para além do termo de identidade e residência.
Especificamente no que respeita à prisão preventiva dispõe o art. 193º do CPP no seu nº 2 que esta “só pode ser aplicada quando se revelarem inadequadas ou insuficientes as outras medidas de coacção”.
No art. 202º, nº 1, do mesmo diploma estabelece-se também que “se considerar inadequadas ou insuficientes, no caso, as medidas referidas nos artigos anteriores, o juiz pode impor ao arguido a prisão preventiva quando houver fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a três anos”.
De tudo resulta inequivocamente que a prisão preventiva é uma medida excepcional e subsidiária em relação às demais medidas de coacção, a impor apenas quando nenhuma outra seja bastante para satisfazer as exigências cautelares do caso.
Adiantamos ser precisamente este o caso.
E regressamos à análise dos perigos que justificaram a decisão recorrida, concretamente, o perigo de fuga e o perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova.
Começando por este, há que reconhecer que o desenrolar do processo, maxime o encerramento da fase de produção da prova e por último a prolação de decisão final – sentença/acórdão – ultrapassa a análise da questão.
Este perigo existiu de facto, em momento processual anterior, como exaustivamente se fundamenta na decisão, supratranscrita e para qual (para este efeito) se remete.
Mas já não ocorre neste momento processual.
Por isso, nenhum efeito pode ter no campo da limitação das liberdades do arguido, por pior que tenha sido o seu comportamento processual neste aspecto (de perturbação da produção, conservação ou veracidade da prova).
É que da marcha do processo pode resultar a atenuação das exigências cautelares que determinaram a aplicação da medida de coacção, o que, por imperativo legal, determina a sua substituição por outra menos grave (art.212º, nº3 do CPP).
Mas também pode resultar a sua agravação (a agravação das exigências cautelares que determinaram a aplicação da medida).
É o que se verifica relativamente ao primeiro dos perigos ora mencionados: o perigo de fuga.
Com efeito, do decurso do processo resultou inequívoca agravação das exigências cautelares, adquirido o conhecimento de que o arguido se pretende ausentar do país, podendo fazê-lo assumidamente para Inglaterra, arguido que sofreu entretanto condenação em pena de oito anos de prisão.
Tudo ponderado, e da forma como o fez, quanto a este perigo, a decisão recorrida, sufraga-se o entendimento de que só a prisão preventiva oferece garantias de prossecução dos fins visados pelas medidas de coacção.
Em conclusão, estas medida foi fixada de acordo com o princípio da adequação e proporcionalidade, sendo adequadas às exigências cautelares que o caso requer, e proporcionais à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas.
Não houve violação das normas que o recorrente aponta.

4. Em face do exposto, nega-se provimento ao recurso, e confirma-se a decisão recorrida.
Pagará o recorrente 5 UCC.
Lisboa, 30 de Março de 2006-06-02
Ana Brito
Francisco Caramelo
Fernando Estrela