Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3867/13.9TTLSB.L1-4
Relator: PAULA SANTOS
Descritores: COMISSÃO DE SERVIÇO
CESSAÇÃO DO CONTRATO
IMPOSSIBILIDADE LIGADA À PESSOA DO EMPREGADOR
CADUCIDADE
PRÉ-AVISO
INDEMNIZAÇÃO
CEDÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO
NULIDADE POR FALTA DE FORMA LEGAL
REMUNERAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/13/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: I– Quando o contrato de trabalho em comissão de serviço cessa por impossibilidade ligada à pessoa do empregador, em consequência de, por via legislativa, ter sido extinto o Departamento onde o trabalhador exercia funções, configura-se a caducidade desse contrato.
II– Na circunstância referida em I, não tem aplicação o disposto no art. 163º nº1 do Código do Trabalho, não havendo lugar à obrigação de formular pré-aviso ou de o trabalhador receber a correspondente indemnização, por a cessação do contrato ser alheia a vontade do empregador.
III– Extinto o contrato de trabalho em comissão de serviço, mas mantendo-se o trabalhador a exercer as mesmas funções que até aí exercia ao serviço do empregador (Turismo de Portugal, IP), ao abrigo de um acordo de cedência de interesse público ferido de nulidade por inobservância de forma e das demais formalidades a que alude o artigo 58º da Lei 12-A/2008 de 27 de Fevereiro, tal contrato produz efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução (cfr. artigo 83º nº1 da Lei 59/2008 de 11 de Setembro – Regime do contrato em funções públicas).
IV– Neste condicionalismo, tem o trabalhador direito a ser remunerado nos precisos termos que vigoravam na data da cessação do contrato de trabalho em comissão de serviço.
V– A cessação do acordo de cedência de interesse público, por iniciativa do empregador, ainda que tal acordo seja nulo, carece de observância do pré-aviso a que se refere o artigo 58º nº8 da Lei 12-A/2008 de 27 de Fevereiro, ou, em caso de incumprimento deste, à correspondente indemnização.
VI– Cessando o acordo de cedência de interesse público com o Turismo de Portugal, IP no dia 31-12-2012, e regressando o trabalhador ao seu lugar de origem, de onde foi requisitado, no dia 01-01-2013, incumbe ao Turismo de Portugal, IP. o pagamento da retribuição das férias vencidas no dia 01-01-2013, e reportadas ao trabalho prestado no ano de 2012 ao seu serviço.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial: Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


I- Relatório:

AA instaurou a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra TURISMO DE PORTUGAL, IP, pedindo, em cumulação, a condenação da Ré no pagamento de € 7.692,92, a título de aviso prévio em falta; € 1.505,72, a título de diferença no salário de Outubro e Novembro; € 2.951,00, a título de diferença no salário de Outubro a Dezembro; € 3.846,46, por conta de 25 dias de férias vencidas a 01/01/2013 e não gozadas; € 20.540,41, a título de indemnização pela extinção do posto de trabalho; € 3.000,00, a título de indemnização por danos morais; e ainda juros de mora vencidos e vincendos desde a citação até ao trânsito em julgado da decisão.

Para tanto, alega que foi admitido ao serviço da “Agência Lusa, SA.” para exercer as funções de Jornalista e que, em Abril de 2007, a Ré o admitiu ao seu serviço ao abrigo de um acordo de “cedência de interesse público”, tendo auferido, em Maio e Junho, o que recebia na “Agência Lusa, SA.”, cerca de € 2.500,00, firmando com a Ré, a 30/07/2007, um contrato de trabalho em regime de comissão de serviço, passando a exercer funções de Director do Departamento de Comunicação a partir de Agosto de 2007, o que se manteve até 15/10/2012, altura a partir da qual foram aprovados os novos estatutos da Ré e extinto o Departamento de Comunicação.

Mais alega que, anteriormente a Julho de 2012, combinou verbalmente com a Administradora do Pelouro da Comunicação ficar na Ré a exercer as mesmas funções embora com a categoria de Coordenador e que, em Dezembro desse ano, o então Presidente da Ré o informou de que iria reunir com a Secretária de Estado do Turismo, donde resultou que o Autor não se iria manter no cargo, vindo a ser informado, por e-mail, no dia 17/12/2012, que o acordo de cedência de interesse público cessava no dia 31/12/2012, pelo que regressou ao organismo de origem no dia 02/01/2013, tendo gozado férias de 24/12/2012 a 01/01/2013; em 17/01/2013 recebeu um mail solicitando que desse o seu acordo na manutenção da sua colaboração com o Ré em regime de acordo de cedência de interesse público no período de 16/10 a 31/12 de 2012 para o período de Outubro a Dezembro de 2012. Entre Julho de 2012 e Dezembro de 2013 nunca foi informado de qualquer pedido de cedência de interesse público, estando convicto de que permanecia no seu posto de coordenador, tal como acordado em Julho de 2010.

Por fim, alega que entre Outubro a Dezembro de 2012 auferiu três vencimentos diferentes, sendo € 3.846,46/€3.866,46 em Outubro, € 2.342,74 em Novembro e € 1.734,65 em Dezembro, sendo que até então sempre recebeu € 3.846,46, e ainda que não gozou um dia de férias.

Conclui que a Ré colocou termo à comissão de serviço sem aviso prévio e por facto que não lhe é imputável, a si Autor.
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Foi realizada audiência de partes, não sendo possível a sua conciliação.
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Contestando, a Ré invoca a incompetência material do Tribunal e alega que o Autor é trabalhador da Lusa por tempo indeterminado, tendo sido requisitado a esta entidade no dia 17/04/2007 para, pelo prazo de 1 ano, exercer o cargo de Assessor em regime de comissão de serviço, mediante o pagamento da retribuição de origem, € 1.544,66 a título de retribuição base acrescida de € 798,08 a título de subsídio de função, € 50,50 a título de subsídio de transporte e € 133,10 a título de subsídio de alimentação, e ainda acrescida de 2 horas de isenção de horário de trabalho, vindo a ser firmado entre as partes, no dia 30/07/2007, contrato de trabalho em regime de comissão de serviço para o exercício pelo Autor das funções de Director do Departamento de Comunicação da Área de Suporte, funções que o Autor cessou no dia 16/10/2012 por terem entrado em vigor os novos estatutos da Ré que extinguiram o Departamento de Comunicação e o cargo dirigente do Autor, pelo que a comissão de serviço cessou ope legis. Entre 16/10/2012 a 31/12/2012, manteve a sua colaboração com o Réu em matéria de assessoria de imprensa e já não da chefia de departamento, ao abrigo do regime de cedência de interesse público.

Mais alega que em Outubro de 2012 pagou ao Autor a remuneração correspondente ao cargo de Director; que em Novembro de 2012 pagou a remuneração de origem, comunicada pela Lusa em 2007, deduzida do valor pago em excesso no mês anterior para o período de 16 a 31 de Outubro de 2012; que em Dezembro de 2012 foram feitos acertos na remuneração do Autor em consequência do valor do salário então comunicado pela Lusa ser inferior. Não se formalizou o acordo de cedência de interesse público para o período de 16/10/2012 a 31/12/2012 por o Autor se ter recusado a dar o seu consentimento por o valor da remuneração a perceber ser inferior ao valor da que auferiu enquanto Director; e por fim, que informou a Lusa de que o Autor tinha 1 dia de férias para gozar, vencido no ano 2012.

Conclui pela procedência da excepção dilatória de incompetência em razão da matéria ou, caso assim se não entenda, pela improcedência da acção.
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Respondendo, o Autor pugna pela improcedência da excepção de incompetência material do Tribunal.
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Foi dispensada a realização de audiência prévia.
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Foi proferido despacho saneador, que julgou válida e regular a instância e improcedente a excepção de incompetência material invocada pela Ré.          
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Foi realizado julgamento com observância do legal formalismo.
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Foi proferida sentença que julgou a “acção parcialmente procedente e, em consequência, decide:

1. Condenar «TURISMO DE PORTUGAL, IP» a pagar a «AA» a quantia de € 5.772,69 a título de indemnização pela inobservância do período de 45 dias de aviso prévio, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a citação até integral e efectivo pagamento.
2. Condenar «TURISMO DE PORTUGAL, IP» a pagar a «AA» a quantia de € 5.193,31 por conta de diferenciais na retribuição de Novembro e Dezembro de 2012, sobre o que devem ser efectuadas as deduções e descontos respectivos, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a citação até integral e efectivo pagamento.
3. Condenar «TURISMO DE PORTUGAL, IP» a pagar a «AA» a quantia de € 3.848,46 por conta da retribuição de férias vencida a 31/12/2012, sobre o que devem ser efectuadas as deduções e descontos respectivos, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a citação até integral e efectivo
pagamento.
4. Absolver «TURISMO DE PORTUGAL, IP» do demais peticionado por «AA».
5. Condenar «AA» e «TURISMO DE PORTUGAL, IP» a pagarem as custas, na proporção do decaimento.” (sic)
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Inconformada, a Ré interpôs recurso, concluindo que “(…)

NESTES TERMOS, e nos mais de direito que os Venerandos Desembargadores doutamente suprirão, requer-se que seja dado provimento ao presente recurso de apelação, com efeito suspensivo, alterando-se os pontos 1), 9) 11) e 12) da matéria assente e aditando-se os pontos 24) e 25), revogando-se a decisão recorrida na parte que decidiu que a comissão de serviço do recorrido se manteve até 31.12.2012, bem como na parte em que, consequentemente, decidiu que o recorrente incumpriu o aviso prévio de cessação da comissão de serviço e que devia ter pago ao recorrido a remuneração de diretor até 31.12.2012, e na parte em que decidiu condenar o recorrente no pagamento de € 3.848,46 a título de retribuição de férias vencidas e não gozadas à data da cessação da comissão de serviço, 31.12.2012, porquanto apenas existia um dia de férias a pagar, e substituindo-se por outra que, nos termos melhor alegados supra, julgue a ação improcedente, por não provada, e absolva o ora Recorrente dos pedidos, com todas as demais consequências legais, ASSIM SE FARÁ A COSTUMADA JUSTIÇA!”
***

O recorrido contra alegou, concluindo que.
(…)

NESTES TERMOS, e nos mais de direito que os Venerandos Desembargadores doutamente suprirão, requer-se que seja dado provimento às presentes contra alegações, considerando o Recurso apresentado pelo Recorrente sem qualquer provimento e a decisão do Tribunal a quo seja mantida na integra condenando-se o requerido ao pagamento do período correspondente ao período de aviso prévio em falta, computado em € 5.772,69 (€3.848,36+€1.924,18).

E ainda deverá o Recorrente pagar ao Recorrido as devidas as diferenças salariais relativas à retribuição paga em Novembro e Dezembro/2012 posto que auferiu menos do que deveria ter auferido, tendo sido efectuadas deduções não justificadas, pelo valor de € 5.193,31 [(€3.848,46-€1.505,62+€752,86=€2.258,58) (€3.848,46-€2.113,81+
€820,92=€2.934,73)], assim como a retribuição de férias vencidas na data da cessação da comissão de serviço, 31/12/2012, o correspondente à quantia de € 3.848,46, sobre o que deverão incidir, naturalmente, os descontos e deduções legais.
Com o que assim se fará A Costumada Justiça.” (sic)
***

A Exma Procuradora-Geral Adjunta, junto deste Tribunal da Relação, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
***

Os autos foram aos vistos aos Exmos Desembargadores Adjuntos.

Cumpre apreciar e decidir
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II– Objecto.

Sendo pacífico que o âmbito do recurso é limitado pelas questões suscitadas pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (arts. 635º nº 4 e 639º do CPC, ex vi do nº 1 do artigo 87º do CPT), sem prejuízo da apreciação das questões que são de conhecimento oficioso (art.608º nº 2 do CPC), nos presentes autos importa decidir se o tribunal a quo errou na apreciação da matéria de facto vertida nos pontos 1., 9., 11. e 12 dos factos provados;
-se devem ser aditados dois factos, referidos nas conclusões;
-se a comissão de serviço que vinculava o Autor ao Réu se manteve até 31-12-2012;
-se o Réu incumpriu o aviso prévio ao denunciar o contrato com o Autor;
-qual a retribuição devida ao Autor durante o período que mediou entre 16-10-2012 e 31-12-2012;
-se é devida pelo Réu ao Autor a quantia de 3.848,46€, a título de retribuição de férias vencidas e não gozadas.
***

III– Fundamentação de Facto.

1. Matéria de Facto Provada.
São os seguintes os factos considerados provados pela primeira instância:
1. O Autor, em data não concretamente apurada, foi admitido ao serviço da “Lusa – Agência de Notícias de Portugal, SA” mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado, para, sob a sua autoridade, direcção, fiscalização, exercer as funções inerentes à categoria profissional de Jornalista, mediante o pagamento, em Abril de 2007, de € 1.544,66 a título de retribuição base, € 133,10 a título de subsídio de alimentação, € 50,50 a título de subsídio de transporte e € 798,08 a título de subsídio de função – alterado conforme decisão infra.
2. Por ofício datado de 17/04/2007, inserto a fls. 91 dos autos, o Réu solicitou à “Lusa – Agência de Notícias de Portugal, SA.”: “(…) a requisição do Sr. AA, pelo prazo, renovável, de um ano, nos termos do disposto no art.º 6º do DL 308/99, de 10 de Agosto.” “(…) por forma a produzir efeitos a partir de 23 de Abril f.p. ou em data mais próxima possível.”.
3. Por deliberação datada de 21/06/2007, o Conselho Directivo do Réu nomeou o Autor para, em comissão de serviço, desempenhar funções de Assessoria no Conselho Directivo do Réu, com efeitos desde 02/05/2007, atribuindo-lhe, a título de acréscimo à sua remuneração de origem, duas horas de isenção de horário de trabalho.
4. Em consequência, Autor e Réu subscreveram o escrito de fls. 94-95 dos autos, datado de 02/07/2007, intitulado “ACORDO RELATIVO AO EXERCÍCIO DE CARGO EM REGIME DE COMISSÃO DE SERVIÇO”, com o seguinte teor:

Considerando:
A. Que, de acordo com os Estatutos do Turismo de Portugal, I.P., aprovados pela Portaria 539/2007 de 30 de Abril, os trabalhadores que exercem funções públicas podem ser chamados a desempenhar funções de Assessoria ao Conselho Directivo em regime de comissão de serviço;
B. Que o Turismo de Portugal, I.P., convidou o Trabalhador para desempenhar as funções de Assessoria ao Conselho Directivo em comissão de serviço e este aceitou o convite;
(…)
Cláusula Primeira.
1. O Trabalhador, por nomeação do Turismo de Portugal, I.P., que aquele aceitou, desempenha o cargo de Assessor do Conselho Directivo do Turismo de Portugal, IP.
2. O cargo a que se refere o número anterior é exercido em regime de comissão de serviço.
3. O termo inicial do prazo de comissão de serviço é o dia 2 de Maio de 2007.
(…)
Cláusula Terceira.
No termo da presente comissão de serviço o trabalhador regressará ao lugar de origem, sem prejuízo de eventuais promoções ou progressões na carreira que entretanto ocorram.
Cláusula Quarta.
À data da assinatura do presente acordo o Trabalhador tem a categoria de Jornalista Grupo V Esc.2, do quadro de pessoal da Lusa – Agência de Notícias de Portugal.
5. Por deliberação datada de 12/07/2007, melhor descrita na acta de fls. 105-106 dos autos, o Conselho Directivo do Réu nomeou o Autor Director do Departamento de Comunicação do Réu, a partir de 01/08/2007, pelo período de três anos.
6. Em consequência, Autor e Réu subscreveram o escrito de fls. 107-109 dos autos, datado de 30/07/2007, intitulado “CONTRATO DE TRABALHO EM REGIME DE COMISSÃO DE SERVIÇO”, com o seguinte teor:

Cláusula 1ª.
1- O Turismo de Portugal, I.P reconhece ao cargo de Director, cargo directivo criado na estrutura orgânica interna do primeiro contraente, nos termos dos respectivos Estatutos, aprovados pela Portaria n.º 539/2007, de 30 de Abril, (…).
2- (…)
3- O Turismo de Portugal, I.P., investe, pelo presente contrato o Trabalhador no cargo de Director do Departamento de Comunicação, em regime de comissão de serviço, pelo período de três anos, regulada nos termos previstos no Código do Trabalho.

Cláusula 2ª.
1- O presente contrato tem início e produz efeitos a partir do dia um de Agosto de dois mil e sete.
2- Sem prejuízo do disposto na cláusula anterior, o presente contrato tem natureza transitória, sendo o seu clausulado aplicado até à aprovação do novo Regulamento de Pessoal e Carreiras do Turismo de Portugal, I.P.
3- A entrada em vigor do Regulamento mencionado no número anterior determinará a alteração do clausulado do presente contrato, em conformidade com as normas daquele Regulamento em matéria de constituição, organização e desenvolvimento da relação de trabalho do pessoal que exerce cargos directivos no Turismo de Portugal, I.P., bem como as relativas ao respectivo regime e estrutura remuneratória.
(…)

Cláusula 4ª.
1-O regime remuneratório aplicado ao Trabalhador, transitoriamente e até à entrada em vigor do Regulamento de Pessoal e Carreiras do Turismo de Portugal, I.P., é o constante do artigo 6º do Regulamento das Funções Específicas ou de Enquadramento (Chefias), aprovado pelo despacho n.º 210/2000/SET, de 5/04/2000, do Secretário de Estado do Turismo, actualmente vigente no Instituto do Turismo de Portugal, considerando-se, para este efeito específico, que o cargo de Director Adjunto está equiparado ao de Director.
(…)

Cláusula 5ª.
O Trabalhador mantém os direitos inerentes ao seu lugar de origem, incluindo a contagem de tempo de serviço para todos os efeitos em que a mesma seja relevante.

Cláusula 6ª.
Em tudo omisso no presente contrato, aplica-se o disposto na Lei Orgânica do Turismo de Portugal, I.P., aprovada pelo Decreto-Lei n.º 141/2007, de 27 de Abril, nos respectivos Estatutos e no Código do Trabalho.
Feito em duplicado, aos trinta dias do mês de Julho de dois mil e sete, ficando um exemplar na posse de cada um dos contraentes.”

7. Por escrito datado de 01/08/2009, intitulado “ADITAMENTO AO CONTRATO DE TRABALHO EM REGIME DE COMISSÃO DE SERVIÇO”, subscrito pelo Autor e pelo Réu, ambos acordaram celebrar:
“(…) o presente ADITAMENTO AO CONTRATO DE TRABALHO EM REGIME DE COMISSÃO DE SERVIÇO, celebrado entre as partes (…)
O presente ADITAMENTO (…) produz efeitos a 1 de Julho de 2009, mantendo-se em vigor todo o restante clausulado do CONTRATO DE TRABALHO EM REGIME DE COMISSÃO DE SERVIÇO.
Feito em duplicado, aos 01 de Agosto de dois mil e nove, ficando um exemplar na posse de cada um dos contraentes.”.

8. O Departamento de Comunicação a que o Autor estava afecto foi extinto pela Portaria n.º 321/2012 de 15/10, entrada em vigor no dia 16/10/2012.
9. Pese embora o descrito em 8), o Autor manteve-se na Ré até 31/12/2012, desenvolvendo o trabalho que até então lhe estava afecto.
10. Em data anterior a 16/10/2012, o Presidente do Conselho Directivo do Réu, BB, comunicou ao Autor que se perspectivava a extinção do Departamento de Comunicação do Réu.
11. Após a extinção do Departamento de Comunicação do Réu, o Presidente do Conselho Directivo deste, BB, comunicou ao Autor que, dentro do que estivesse ao seu alcance, tudo faria para que o mesmo continuasse a desenvolver o trabalho que até então vinha realizando no Réu.
12. Com vista a alcançar o desiderato que antecede, o Presidente do Conselho Directivo do Réu, BB, em data não concretamente apurada mas anterior a 22/11/2012, remeteu o ofício de fls. 115-116 dos autos ao Chefe de Gabinete da Secretária de Estado do Turismo, com o seguinte teor:

“(…)
Com a entrada em vigor, no passado dia 1 de Julho de 2012, da nova lei orgânica do Turismo de Portugal, e tendo igualmente presente que se encontra em fase de aprovação a nova orgânica do instituto, a qual implicará necessariamente reajustamentos nas várias áreas de actividade, pretende o Conselho Directivo manter a colaboração com este trabalhador, face às suas competências e habilitações em matéria de assessoria de imprensa e tendo em consideração os especiais conhecimentos adquiridos junto dos media do setor, conforme resulta do Curriculum Vitae em anexo.
Considerando que a LUSA – Agência de Notícias de Portugal, S.A.. é uma entidade excluída do âmbito de aplicação objectivo da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, o regime em que o trabalhador AA poderá continuar a exercer funções neste instituto será o regime de mobilidade geral na figura de acordo de cedência de interesse público, nos termos previstos no artigo 58º do mencionado diploma, sendo que este acordo depende, nos termos previstos no artigo 40º n.º 1 da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2012), de parecer prévio favorável dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública, para além da concordância escrita da Senhora Secretária de Estado do Turismo.
O valor da remuneração a processar será de € 2.342,74, encargo que se encontra devidamente orçamentado no orçamento de custos com o pessoal do Turismo de Portugal para o ano de 2012.
Pelo exposto, solicita-se a V. Exa. que seja obtida a concordância da Senhora Secretária de Estado do Turismo à celebração do acordo de cedência de interesse público, considerando a formação e a experiência que o mesmo apresenta, submetendo-se posteriormente o processo para obtenção de parecer prévio favorável dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública (…).
Em caso de concordância, será posteriormente outorgado entre as partes o respectivo documento de Acordo de Cedência de Interesse Público, pretendendo-se que este Acordo possa produzir efeitos a partir da data da entrada em vigor dos novos Estatutos do Turismo de Portugal, I.P.
(…)”.

13. Solicitou ainda à “Lusa – Agência de Notícias de Portugal, SA.” que informasse a remuneração de origem do Autor, comunicando-lhe o que consta de fls. 121-122 dos autos, com o seguinte teor:

“(…)
Neste sentido, o Turismo de Portugal, I.P, iniciou já o processo de obter a necessária autorização prévia da Tutela e da Secretaria de Estado da Administração Pública para que possa vir a ser celebrado, caso exista igualmente a anuência dessa Agência, um acordo de cedência de interesse público, por um período de 2 meses e meio, para o desempenho de funções neste instituto, com efeitos à data da entrada em vigor dos novos Estatutos do instituto.
Para esse efeito, e por forma a instruir todo este processo, muito agradecíamos que nos fosse indicada qual a remuneração de origem actualizada de AA.”.

14. Em resposta ao descrito em 13), a “Lusa – Agência de Notícias de Portugal, SA.” informou que: “a remuneração de origem actualizada de AA é de 1.734,65 euros.”.
15. Por ofício datado de 18/12/2012, a Direcção Geral da Administração Pública e do Emprego Público, por determinação do Secretário de Estado da Administração Pública, devolveu ao Réu o processo destinado a obter a autorização ao “acordo de cedência de interesse público” do Autor, por o pedido não ter sido formulado de forma correcta e por não ter sido remetido o acordo do Autor e do serviço de origem.
16. Em consequência, no dia 17/01/2013, pelas 12h10, o Réu remeteu ao Autor o e-mail de fls. 149-150 dos autos, com o seguinte teor:

“(…)
Neste enquadramento, venho solicitar que nos confirme por esta via o acordo na manutenção da sua colaboração no Turismo de Portugal em regime de acordo de cedência de interesse público, no período de 16 de Outubro a 31 de Dezembro de 2013.”.

17. O Autor não respondeu ao e-mail a que supra se alude em 16).
18. Por ofício datado de 14/12/2012, o Réu comunicou à “Lusa – Agência de Notícias de Portugal, SA.”, conforme fls. 130 dos autos, que:

“(…) confirmamos que cessa o acordo de cedência de interesse público do vosso colaborador, AA, com este Instituto, no próximo dia 31 de dezembro do presente ano, pelo que o mesmo regressará ao seu organismo de origem a 1 de janeiro de 2013.
Mais se informa que relativamente às férias do ano de 2012, ficou 1 dia por gozar, tendo o trabalhador informado da sua pretensão de o gozar no dia 2 de janeiro de 2013.

19. No dia 17/12/2012, pelas 14h35, o Réu remeteu ao Autor o e-mail de fls. 131 dos autos, comunicando-lhe que:

Serve o presente para confirmar que o acordo de cedência de interesse público, celebrado com o Turismo de Portugal I.P., cessa em 31 de dezembro de 2012, pelo que em 1 de janeiro de 2013 regressará ao seu organismo de origem, que já foi oficiado sobre esta matéria.”

20. Em Outubro de 2012, o Réu pagou ao Autor a quantia de € 3.848,46 a título de retribuição base, correspondente à categoria profissional de Director do Departamento de Comunicação.
21. Em Novembro de 2012, o Réu pagou ao Autor a quantia de € 2.342,74, a título de retribuição base, o correspondente à soma do valor da retribuição base com o subsídio de função supra identificados em 1) [€ 1.544,66+€798,08], ao que deduziu € 752,86.
22. Em Dezembro de 2012, o Réu pagou ao Autor a quantia de € 1.734,65, a título de retribuição base, o correspondente à quantia a que supra se alude em 14), ao que deduziu a quantia de € 820,92.
23. Em Janeiro de 2013, a “Lusa – Agência de Notícias de Portugal, SA.” pagou ao Autor a quantia de € 1.750,40 a título de retribuição base, € 4,27 por cada dia efectivo de trabalho, a título de subsídio de alimentação, € 53,15, a título de subsídio de transporte e € 350,08, a título de subsídio de adaptabilidade.
***

IV- Apreciação do Recurso.

1. Impugnação da matéria de facto.
(…)
***

2. Enquadramento jurídico.
A primeira questão a decidir prende-se com o enquadramento jurídico da situação laboral do Autor entre 16-10-2012 e 31-12-2012.
A sentença recorrida decidiu que “[P]onderado o regime legal descrito com a factualidade provada, temos que o lugar que o Autor ocupava na comissão de serviço foi extinto por via legislativa a partir de 16/10/2012.
O Departamento de Comunicação, do qual o Autor era Director, deixou de integrar a área de actuação de apoio e suporte antes consagrada na estrutura orgânica do Réu (cfr. artigos 2º, alínea c), 14º, n.º 3, alínea c), da Portaria n.º 539/2007 de 30/04, revogada, como dito, pela Portaria n.º 321/2012 de 15/10).
Pelo que se a estrutura orgânica do Réu deixou de contemplar o Departamento de Comunicação e nenhum outro com semelhantes atribuições o substituiu, não podia o Autor ali continuar a exercer as funções que até então exerceu, dirigindo departamento que, por via de lei, foi extinto.
Justificava-se, por conseguinte, a imediata cessação da comissão de serviço, que como vimos se caracteriza pela transitoriedade e provisoriedade do lugar (reclamada, justamente, pelo tipo de funções desempenhadas), não podendo ser assacada ao Réu, se assim tivesse sido, qualquer responsabilidade pela inobservância do período de aviso prévio posto que tal resultou de acto decorrente da via legislativa.
Cabia ao Réu, neste cenário, diligenciar nos termos prescritos no artigo 40º da Lei n.º 64-B/2011 de 30/12, ou seja, pela formalização válida do acordo de cedência de interesse público, só então, depois de conseguida, determinante da prestação do trabalho do Autor.
Porém, no caso em apreço, nada disso sucedeu. O Réu não aguardou a válida formalização do acordo de cedência de interesse público nem obstou à prestação de trabalho pelo Autor, ainda que tenha deixado de dispor na sua orgânica do Departamento que o mesmo dirigia.
O Autor, como se provou, continuou no Réu até 31/12/2012, desenvolvendo o mesmo trabalho que até então ali havia desenvolvido.
E assim, tem que afirmar-se que a comissão de serviço não cessou.
Não cessou porque o Réu nunca comunicou tal facto ao Autor e o Autor, pese embora a formal extinção do departamento que dirigia, continuou, na verdade, a desenvolver o mesmo trabalho que até então ali desenvolveu, o inerente às funções de Director, tendo regressado ao lugar de origem, a “Lusa – Agência de Notícias de Portugal, SA.”, apenas no dia 01/01/2013, ou seja, cerca de dois meses e meio depois da formal extinção daquele lugar na orgânica do Réu.
Conforme resulta do facto supra elencado em 19), o Réu, só no dia 17/12/2012, é que comunicou ao Autor que a relação contratual firmada entre ambos, intitulando-a então de “acordo de cedência de interesse público”, cessava no dia 31/12/2012.
Donde, porque o acordo de cedência de interesse público não foi reduzido a escrito nem assinado/autorizado por quem tinha que o ser (cfr. artigo 58º da Lei n.º 12º-A/2008, de 27/02), forçoso se torna concluir que a comissão de serviço apenas cessou no dia 31/12/2012 (cfr. permissão prevista no artigo 44º, n.º 1, da Lei n.º 64-B/2011 de 30/12) e, por conseguinte, que o Réu, ao assim actuar, a fez cessar sem observar a totalidade do período de 60 dias de aviso prévio, estando em falta o período de 45 dias posto que comunicou a cessação da relação contratual ao Autor apenas no dia 17/10/2012 (60 dias-15 dias, decorridos entre 17 a 31/12/2012).” (sic)
O Réu defende que, “não tendo sido formalizado o acordo de cedência de interesse público (…) a consequência é a nulidade da relação jurídica entre o Recorrente e o Recorrido após 16.10.2012 e até 31-12-2012, por violação do artigo 58º nº2 da Lei dos Vínculos, Carreiras e Remunerações (LVCR), aprovada pela Lei nº 12-A/2008 de 27 de fevereiro (entretanto revogada pela Lei 35/2014, de 20 de Junho, Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, LGTFP), 40º nº1 e 4 da Lei nº 64-B/2011, de 30 de Dezembro, relação que nessa data apenas poderia ser de emprego público, a qual não produz quaisquer efeitos, além do direito ao pagamento da retribuição de origem, que, caso o acordo de cedência de interesse público fosse válido, seria devida ao Recorrido pelo exercício de funções no Turismo de Portugal, I.P., conforme resulta dos artigos 294.º do Código Civil e 83.º/1 da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro. Aliás, sendo essa relação jurídica de 16.10.2012 a 31.12.2012 nula por violação das mencionadas normas legais imperativas, porque não formalizada, nunca a mesma poderia ter sido somada à comissão de serviço validamente constituída entre as partes até 16.10.2012.” (sic)

Com relevo para a caracterização do vínculo jurídico do Autor ao Réu, resultou provado que, em 17/04/2007, o Réu solicitou à “Lusa – Agência de Notícias de Portugal, SA” a requisição do Autor pelo prazo, renovável, de um ano; por deliberação datada de 21/06/2007, o Conselho Directivo do Réu nomeou o Autor para, em comissão de serviço, desempenhar funções de Assessoria no Conselho Directivo do Réu, com efeitos desde 02/05/2007, atribuindo-lhe, a título de acréscimo à sua remuneração de origem, duas horas de isenção de horário de trabalho; por deliberação datada de 12/07/2007, o Conselho Directivo do Réu nomeou o Autor Director do Departamento de Comunicação do Réu, a partir de 01/08/2007, pelo período de três anos; o Departamento de Comunicação a que o Autor estava afecto foi extinto pela Portaria n.º 321/2012 de 15/10, entrada em vigor no dia 16/10/2012, no entanto, o Autor manteve-se na Ré até 31/12/2012, desenvolvendo o trabalho que até então lhe estava afecto.

Daqui resulta, e não foi posto em causa, que, até ao dia 16-10-2012, o Autor trabalhou para a Ré em regime de comissão de serviço.

Uma vez que, quando o Departamento de Comunicação da Ré foi extinto – 16 de Outubro de 2012 - estava em vigor o Código do Trabalho aprovado pela Lei 7/2009 de 12 de Fevereiro (CT/2009), que entrou em vigor em 17 de Fevereiro de 2009, é este o regime legal aplicável, face ao disposto no art. 7º da lei preambular. [1]

O artigo 163º do Código do Trabalho, que prescreve acerca da cessação da comissão de serviço, determina que “1 - Qualquer das partes pode pôr termo à comissão de serviço, mediante aviso prévio por escrito, com a antecedência mínima de 30 ou 60 dias, consoante aquela tenha durado, respectivamente, até dois anos ou período superior.
2- A falta de aviso prévio não obsta à cessação da comissão de serviço, constituindo a parte faltosa na obrigação de indemnizar a contraparte nos termos do artigo 401º.

O artigo 164º do mesmo diploma acerca dos efeitos da cessação da comissão de serviço, determina que “1 - Cessando a comissão de serviço, o trabalhador tem direito:
a) Caso se mantenha ao serviço da empresa, a exercer a actividade desempenhada antes da comissão de serviço, ou a correspondente à categoria a que tenha sido promovido ou, ainda, a actividade prevista no acordo a que se refere a alínea c) ou d) do n.º 3 do artigo 162.º;
b) A resolver o contrato de trabalho nos 30 dias seguintes à decisão do empregador que ponha termo à comissão de serviço, com direito a indemnização calculada nos termos do artigo 366.º;
c) Tendo sido admitido para trabalhar em comissão de serviço e esta cesse por iniciativa do empregador que não corresponda a despedimento por facto imputável ao trabalhador, a indemnização calculada nos termos do artigo 366.º
2- Os prazos previstos no artigo anterior e o valor da indemnização a que se referem as alíneas b) e c) do n.º 1 podem ser aumentados por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou contrato de trabalho.

Estes preceitos legais regulam os termos da denúncia do contrato de comissão de serviço, mas esta não constitui a única forma de cessação deste contrato, aplicando-se-lhe também as demais modalidades de cessação do contrato de trabalho. Entre essas causas pode ocorrer a impossibilidade de o trabalhador exercer o trabalho objecto da comissão de serviço. Essa impossibilidade tanto pode traduzir-se numa impossibilidade ligada à pessoa do trabalhador (por exemplo se, nomeadamente por questões de saúde, está impossibilitado de executar as tarefas que executava) ou por razões afectas à pessoa do empregador. É o que se passa no presente caso, em que o Departamento de Comunicação que o Autor chefiava foi extinto por intervenção legislativa, ficando este impossibilitado de prestar as funções que prestava até então, por causa alheia à vontade do Réu empregador. E essa causa configura, em relação ao contrato de comissão de serviço, a caducidade do mesmo. De facto, por via legislativa, ao extinguir o Departamento chefiado pelo Autor, com efeitos a partir de 16-10-2012, em data anterior à do terminus previsto para a comissão de serviço, extinguiu-se automaticamente o contrato, resolveu-se ipso iure, sem necessidade de qualquer manifestação de vontade de qualquer das partes.

Extinguindo-se por caducidade, não tem aplicação o regime previsto nos citados preceitos legais, não havendo lugar à obrigação de formular pré-aviso ou de o trabalhador receber qualquer compensação, pois a comissão de serviço não terminou por um acto de vontade do empregador.

Tratando-se de uma comissão de serviço externa, sem garantia de emprego, pois nada foi estipulado pelas partes nesse sentido, mantendo o Autor o seu vínculo laboral à LUSA, e sendo certo que carecia no Réu de enquadramento legal que lhe possibilitasse o exercício das funções que até aí vinha ocupando, extinguiu-se o vínculo laboral que o ligava a este. De notar que o Autor estava ciente de que o seu contrato com o Réu terminara, como se retira dos pontos 10. e 11. dos factos provados. Não obstante, a verdade é que o Autor se manteve em exercício de funções, das mesmas que até 16-10-2012 exercera, o que aconteceu até 31-12-2012. E fê-lo sem que tenha sido formalizado qualquer contrato, mormente o de cedência de interesse público a que se refere o art. 58º da Lei 12-A/2008 de 27 de Fevereiro[2] [3] e artigo 40º da Lei 64-B/2011 de 30 de Dezembro[4].

O acordo e contrato de comissão de serviço celebrados com o Autor, e a que se referem os pontos 4. e 6. da matéria de facto, foram-no ao abrigo dos Estatutos do Réu, então em vigor e aprovados pela Portaria 539/2007, de 30 de Abril, que previam, no seu artigo 6º , sob a epígrafe “Estrutura dirigente”, que “São cargos directivos do Turismo de  Portugal, I. P., os de Director Coordenador e de Director, exercidos em regime de comissão de serviço, nos termos previstos no Código do Trabalho.” (sublinhado nosso).

Foram entretanto aprovados os novos Estatutos do Réu, pela Portaria 321/2012 de 15 de Outubro, que deixaram de prever a existência de um Departamento de Comunicação, não estando prevista norma similar à do artigo 6º dos Estatutos revogados, estatuindo-se antes que “1 — As direções são dirigidas por diretores coordenadores, cargos de direção intermédia de 1.º grau, não podendo estar posicionados no nível I, em cada momento, mais de 8 dirigentes.
2— Os departamentos são dirigidos por diretores, cargos de direção intermédia de 2.º grau, não podendo estar posicionados no nível I, em cada momento, mais de 15 dirigentes, incluindo, para o efeito, os chefes de equipas multidisciplinares.”[5]
Daqui resulta, numa clara intenção de controlo de custos[6], espelhada em vários preceitos do diploma[7], a abolição da contratação externa (ou mesmo interna) sob a forma de comissão de serviço.
Cumpre não esquecer que o Réu “é um instituto público de regime especial, nos termos da lei, integrado na administração indireta do Estado, dotado de autonomia administrativa e financeira e património próprio.”[8], prosseguindo “atribuições do Ministério da Economia e do Emprego, (…) sob superintendência e tutela do respetivo ministro.”[9]Ainda nos termos do mesmo preceito legal, “3 — O Turismo de Portugal, I.P., rege-se pelo disposto no regime jurídico aplicável às entidades públicas empresariais em matéria de:
a) Realização de despesas públicas, incluindo a delimitação da competência para a autorização de despesas;
b) Contratação pública, abrangendo a não sujeição ao regime das entidades compradoras vinculadas ao sistema nacional de compras públicas (… sic)

Assim sendo, e não prevendo a lei o recurso à contratação sob a forma de comissão de serviço, nos termos previstos no Código do Trabalho, e pertencendo o Autor ao quadro da Lusa – Agência de Notícias de Portugal, SA., empresa excluída do âmbito de aplicação objectivo da Lei 12-A/2008 de 27 de Fevereiro, como resulta a contrario do disposto no seu artigo 3º [10](como se refere na missiva a que alude o ponto 12. dos factos provados), o enquadramento possível da sua prestação funcional no Réu, onde, entre 16-10-2012 e 31-12-2012, manteve as mesmas funções que exercia até então, passava pela cedência de interesse público, figura prevista no artigo 58º deste diploma legal, a que já supra nos referimos e que recordamos agora, nos termos do qual “1 — Há lugar à celebração de acordo de cedência de interesse público quando um trabalhador de entidade excluída do âmbito de aplicação objectivo da presente lei
deva exercer funções, ainda que a tempo parcial, em órgão ou serviço a que a presente lei é aplicável e, inversamente, quando um trabalhador de órgão ou serviço deva exercer funções, ainda que no mesmo regime, em entidade excluída daquele âmbito de aplicação.” (sic)

A lei, no entanto, para a celebração deste acordo impõe a forma escrita, acompanhada de um conjunto de outras formalidades, a saber “2 — O acordo pressupõe a concordância escrita do órgão ou serviço, do membro do Governo respectivo, da entidade e do trabalhador e implica, na falta de disposição em contrário, a suspensão do estatuto de origem deste.
(…)
12— Quando as funções correspondam a um cargo dirigente, o acordo de cedência de interesse público é precedido da observância dos requisitos e procedimentos legais de recrutamento.
13— O acordo de cedência de interesse público para o exercício de funções em órgão ou serviço a que a presente lei é aplicável tem a duração máxima de um ano, excepto quando tenha sido celebrado para o exercício de um cargo ou esteja em causa órgão ou serviço, designadamente temporário, que não possa constituir relações jurídicas de emprego público por tempo indeterminado, casos em que a sua duração é indeterminada.” (sic)

Por sua vez, determina a Lei 64-B/2011 de 30 de Outubro – Orçamento do Estado para 2012 – no seu artigo 40º, a propósito da cedência de interesse público, que “1 — A celebração de acordo de cedência de interesse público com trabalhador de entidade excluída do âmbito de aplicação objectivo da Lei n.º 12 -A/2008, de 27 de Fevereiro, alterada pelas Leis nºs 64 -A/2008, de 31 de Dezembro, 3 -B/2010, de 28 de Abril, 34/2010, de 2 de Setembro, e 55 -A/2010, de 31 de Dezembro, e pela presente lei, para o exercício de funções em órgão ou serviço a que a mesma lei é aplicável, previsto na primeira parte do n.º 1 do artigo 58.º daquela lei, depende de parecer prévio favorável dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública, excepto nos casos a que se refere o n.º 12 do mesmo artigo” (sic)

Não restam dúvidas, face aos factos provados, que era pretensão do Réu, expressamente manifestada, que o Autor, após a extinção do Departamento de Comunicação, ainda assim, continuasse a exercer funções ao abrigo da figura do acordo de cedência de interesse público. Era também interesse do Autor manter-se ao serviço do Réu, interesse que, embora não resulte dos factos provados que tenha sido manifestado expressamente, porém, deriva do próprio facto de, conhecedor da extinção do departamento que dirigia, ainda assim se manter em funções por mais dois meses e meio. Não importa ao caso saber se e em que momento a Ré propôs formalmente tal solução ao Autor, em data anterior a 17 de Janeiro de 2013. O que é certo é que esse acordo não foi formalizado e, portanto, está ferido de nulidade.

Tem aplicação ao caso o disposto na Lei 59/2008 de 11 de Setembro[11], face ao disposto no art. 1º desse diploma legal, que determina que “O âmbito de aplicação objectivo da presente lei é o que se encontra definido no artigo 3.º da Lei n.º 12 -A/2008, de 27 de Fevereiro, com as especialidades constantes dos números seguintes.” (sic
)
De acordo com o disposto no art. 83º desse diploma legal, sob a epígrafe, “Efeitos da invalidade do contrato, 1 — O contrato declarado nulo ou anulado produz efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução.” (sic)

Vejamos.

Relativamente aos diferenciais da retribuição.

A nulidade pressupõe o dever de restituição de tudo o que tiver sido prestado ou do valor correspondente.
No entanto, no presente caso existe uma situação de facto a tutelar, já que o Autor prestou funções junto do Réu, nos mesmos termos em que o havia feito até ao dia 15-10-2012. Essa tutela, que aliás resulta do disposto no referido artigo 83º da Lei 59/2008, em matéria de remuneração não pode deixar de ter em consideração o disposto no nº3 do artigo 58º da Lei  Lei 12-A/2008 de 27 de Fevereiro, a saber “[A] cedência de interesse público sujeita o trabalhador às ordens e instruções do órgão ou serviço ou da entidade onde vai prestar funções, sendo remunerado por estes com respeito pelas disposições normativas aplicáveis ao exercício daquelas funções.” (sic).

Sendo o conteúdo da relação contratual vigente entre as partes durante o período que mediou entre 16-10-2012 e 31-12-2012, constituído por direitos e deveres incidentes sobre prestações, tendo o Autor cumprido a prestação a que estava obrigado, nos mesmos moldes em que o vinha fazendo até à primeira quinzena de Outubro, deve ser remunerado nos mesmos termos, a saber, de acordo com o que resulta do ponto 20. dos factos provados. Assim o impõe, ademais, o princípio da boa fé.

Em face do exposto, nesta parte, embora com outros fundamentos, confirma-se a sentença recorrida, que condenou a Ré a pagar ao Autor as diferenças salariais relativas à retribuição paga em Novembro e Dezembro de 2012, no valor de 5.193,31€.

Relativamente ao pré-aviso.

Não se estando em presença de uma comissão de serviço, não há lugar ao pré aviso a que se refere o art. 163º nº1 do CT. Contudo, e face ao disposto no artigo 83º da 59/2008 de 11 de Setembro, que acabamos de citar, e ao art. 58º nº8 da Lei 12-A/2012 de 27 de Fevereiro, que determina que “[O] acordo pode ser feito cessar, a todo o tempo, por iniciativa de qualquer das partes que nele tenham intervindo, com aviso prévio de 30 dias.”, uma vez que o acordo cessou em 31-21-2012, por iniciativa da Ré, que comunicou tal cessação ao Autor em 17-12-2012, como resulta da matéria de facto [12], cumpre concluir que não foi cumprido o pré-aviso a que se refere este normativo legal. Note-se que, embora o mail enviado se refira a uma confirmação da cessação do contrato, em lado algum dos factos resulta que tenha sido feita qualquer outra comunicação.

Assim sendo, tem o Autor direito a 16 dias de retribuição, no valor de 2.052,48€ (3.848,46€ : 30 = 128,28 x 16 =).

Relativamente ao pagamento de férias vencidas e não gozadas.

Insurge-se o Réu da condenação no pagamento da quantia de 3.848,46€ referente a férias vencidas e não gozadas em 31-12-2012. Alega que, a essa data, o Autor tinha apenas um dia de férias vencidas e não gozadas, referentes às férias vencidas a 01-01-2012. Sem razão porém. O que o Autor peticiona é o valor das férias vencidas em 1 de Janeiro de 2013, referentes ao trabalho prestado para o Réu em 2012, férias essas não gozadas.
O direito a férias vence-se a 1 de Janeiro e reporta-se ao trabalho realizado no ano civil anterior. É o que resulta do disposto nos artigos 237º nº1 e 2 do CT e 171º nº1 e 4º da Lei 59/2008 de 11 de Setembro.
Reportando-se ao trabalho prestado no ano de 2012 ao serviço do Réu, a este incumbe o seu pagamento, nada havendo que censurar, a este propósito, à sentença recorrida.
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V– Decisão.

Face a todo o exposto, acorda-se na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar parcialmente procedente o recurso interposto por TURISMO DE PORTUGAL, IP, e, em consequência
1.Altera-se parcialmente a matéria de facto provada.
2.Condena-se o Réu a pagar ao Autor a quantia de 2.052,48€, correspondente ao período aviso prévio em falta, absolvendo-se do remanescente em que, a este propósito, foi condenado.
3.Mantém-se a sentença no demais.
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Custas a cargo de Autor e Réu na proporção do decaimento.
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Lisboa, 13-07-2016


Paula de Jesus Jorge dos Santos
1º adjunto – Claudino Seara Paixão
2ª adjunta – Maria João Romba
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[1]Artigo 7º - Aplicação no tempo – 1 – Sem prejuízo do disposto no presente artigo e nos seguintes, ficam sujeitos ao regime do Código do Trabalho aprovado pela presente lei os contratos de trabalho e os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho celebrados ou adoptados antes da entrada em vigor da referida lei, salvo quanto a condições de validade e a efeitos de factos ou situações totalmente passados anteriormente àquele momento.” (sic)
[2]Estabelece os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem  funções públicas.
[3]Artigo 58º - Cedência de interesse público 1 — Há lugar à celebração de acordo de cedência de interesse público quando um trabalhador de entidade excluída do âmbito de aplicação objectivo da presente lei deva exercer funções, ainda que a tempo parcial, em órgão ou serviço a que a presente lei é aplicável e, inversamente, quando um trabalhador de órgão ou serviço deva exercer funções, ainda que no mesmo regime, em entidade excluída daquele âmbito de aplicação. 2 — O acordo pressupõe a concordância escrita do órgão ou serviço, do membro do Governo respectivo, da entidade e do trabalhador e implica, na falta de disposição em contrário, a suspensão do estatuto de origem deste
[4]Artigo 40º - Cedência de interesse público - 1 — A celebração de acordo de cedência de interesse público com trabalhador de entidade excluída do âmbito de aplicação objectivo da Lei nº 12 -A/2008, de 27 de Fevereiro, alterada pelas Leis nºs 64 -A/2008, de 31 de Dezembro, 3 -B/2010, de 28 de Abril, 34/2010, de 2 de Setembro, e 55 -A/2010, de 31 de Dezembro, e pela presente lei, para o exercício de funções em órgão ou serviço a que a mesma lei é aplicável, previsto na primeira parte do nº 1 do artigo 58.º daquela lei, depende de parecer prévio favorável dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública, excepto nos casos a que se refere o n.º 12 do mesmo artigo.” (sic)
[5]Artigo 2º - Cargos dirigentes intermédios.
[6]No âmbito do Plano de Redução e Melhoria da Administração Central (PREMAC) do XIX Governo Constitucional, como referido no preâmbulo do Dec.Lei 129/2012 de 22 de Junho, que aprovou a Lei Orgânica do Instituto do Turismo de Portugal, I. P. Afirma-se aí que “No âmbito do Compromisso Eficiência, o XIX Governo Constitucional determinou as linhas gerais do Plano de Redução e Melhoria da Administração Central (PREMAC), afirmando que o primeiro e mais importante impulso do Plano deveria, desde logo, ser dado no processo de preparação das leis orgânicas dos ministérios e dos respetivos serviços.
Trata -se de algo absolutamente estruturante, por um lado, para o início de uma nova fase da reforma da Administração Pública, no sentido de a tornar eficiente e racional na utilização dos recursos públicos e, por outro, para o cumprimento dos objetivos de redução da despesa pública a que o país está vinculado. Com efeito, mais do que nunca, a concretização simultânea dos objetivos de racionalização das estruturas do Estado e de melhor utilização dos seus recursos humanos é crucial no processo de modernização e de otimização do funcionamento da Administração Pública.
Importava decididamente repensar e reorganizar a estrutura do Estado, no sentido de lhe dar uma maior coerência e capacidade de resposta no desempenho das funções que deverá assegurar, eliminando redundâncias e reduzindo substancialmente os seus custos de funcionamento” (sic)
[7]Veja-se : art. 1º(Estrutura orgânica) – “(..) 5 — O número de unidades orgânicas de 2.º grau não pode exceder, em cada momento, o limite máximo de 48, incluindo as referidas no número anterior e no n.º 9 do presente artigo.
6— Para o desenvolvimento e acompanhamento de projetos e ações temporárias de carácter tático e estratégico, em função de objetivos que envolvam um carácter transversal às diversas áreas de atuação do Turismo de Portugal, I. P., podem ser criadas por deliberação do conselho diretivo, a publicar no Diário da República, até 15 equipas multidisciplinares, as quais se contabilizam para efeitos do limite máximo previsto no número anterior” (sic), o próprio artigo 2º, citado no texto, o artigo 6º (Direção de apoio à venda) “ (…) 2 — Os membros das equipas de turismo no estrangeiro devem ser recrutados, preferencialmente, de entre os trabalhadores do Turismo de Portugal, I. P., ou, a título excecional e devidamente  fundamentado, de entre outro pessoal recrutado em Portugal ou no estrangeiro, nos termos da legislação aplicável.” (sic)
[8]Cfr. artigo 1º nº1 do Dec.Lei 129/2012 de 22 de Junho.
[9]Cfr. nº2 citado preceito legal.
[10]De acordo com o artigo 3º “Âmbito de aplicação objectivo - 1 — A presente lei é aplicável aos serviços da administração directa e indirecta do Estado.
2— A presente lei é também aplicável, com as necessárias adaptações, designadamente no que respeita às competências em matéria administrativa dos correspondentes órgãos de governo próprio, aos serviços das administrações regionais e autárquicas.
3— A presente lei é ainda aplicável, com as adaptações impostas pela observância das correspondentes competências, aos órgãos e serviços de apoio do Presidente da República, da Assembleia da República, dos tribunais e do Ministério Público e respectivos órgãos de gestão e de outros órgãos independentes.
4— (…)
5— Sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo anterior, a presente lei não é aplicável às entidades públicas empresariais nem aos gabinetes de apoio quer dos membros do Governo quer dos titulares dos órgãos referidos nos n.ºs 2 e 3.” (sic)
[11]Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas.
[12]“No dia 17/12/2012, pelas 14h35, o Réu remeteu ao Autor o e-mail de fls. 131 dos autos, comunicando-lhe que:
Serve o presente para confirmar que o acordo de cedência de interesse público, celebrado com o Turismo de Portugal I.P., cessa em 31 de dezembro de 2012, pelo que em 1 de janeiro de 2013 regressará ao seu organismo de origem, que já foi oficiado sobre esta matéria.”


Decisão Texto Integral: