Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4362/16.0T8OER.L1-6
Relator: ANTÓNIO SANTOS
Descritores: EMPREITADA
ELIMINAÇÃO DE EFEITOS
URGÊNCIA NA REPARAÇÃO
NATUREZA DO DIREITO À REPARAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/19/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: O direito de primazia concedido ao empreiteiro e relativo à eliminação dos defeitos não é absoluto, pois que, nos casos de urgência na reparação ou v.g. de incumprimento definitivo da obrigação de eliminação dos defeitos, o princípio da boa fé e da razoabilidade traduzido no equilíbrio das prestações contratuais, determina que seja permitido ao dono da obra executar por si ou por terceiro, a eliminação dos defeitos à custa do empreiteiro.

Sumário:( cfr. artº 663º, nº7,  do CPC).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de LISBOA.


1.Relatório:


A ( …, Unipessoal,Lda ), intentou acção declarativa comum contra B ( … Engenharia, Lda), PEDINDO  que seja  a Ré Condenada a :
A) pagar-lhe a quantia de €11.549,58, correspondente ao valor despendido pela Autora com a contratação da sociedade Leiribrilho,Lda, e com a aquisição de materiais para substituição do pavimento no Parque do Moinho da Anta.

1.1.– Para tanto alegou a Autora,  em síntese, que :
- Sendo a autora uma sociedade que se dedica à comercialização de produtos químicos, celebrou com a Ré em 19 de Agosto de 2015 um contrato de prestação de serviços e de subempreitada, nos termos do qual a Ré  comprometeu-se a executar/aplicar em determinada Obra um pavimento de resina permeável , e sendo o dono da obra a Câmara Municipal de Oeiras;
- Ocorre que, tendo a Ré dado como terminados/concluídos os trabalhos pela autora adjudicados, logo em 22/9/2015 veio a autora a apurar a existência de anomalias e de deficiências na obra pela Ré executada, as quais foram de pronto reclamadas ;
- Prontificando-se a Ré a proceder à reparação das anomalias detectadas, certo é que, após diversas intervenções, novas anomalias e defeitos continuaram a surgir, e , interpelada admonitoriamente a Ré para que procedesse à devida reparação dos aludidos defeitos [ em prazo fixado e com a advertência de que, caso não procedesse à reparação, contrataria outra empresa para executar o trabalho ] , acabou a mesma por declinar a sua responsabilidade , recusando a proceder a quaisquer reparações;
- Consequentemente, viu-se assim a Autora a obrigada em contratar uma terceira sociedade para, no lugar da Ré, resolver a situação, tendo sido retirado o pavimento existente e aplicado um novo, o que custou € 11.549,58, quantia que a Autora suportou.

1.2.– Regularmente Citada para, em prazo, querendo, contestar a acção, veio a Ré a fazê-lo, deduzindo no essencial defesa por impugnação motivada [ aduzindo ser a autora a responsável pelas anomalias surgidas, pois que , não informou a Ré que o pavimento a aplicar se destinava à circulação de veículos automóveis, contribuindo assim para que tivesse sido adjudicado um material inadequado e impróprio para o referido fim ], pugnando portanto pela total improcedência da acção, e consequente absolvição da Ré do pedido.

1.3.– Seguindo-se a prolação de despacho saneador, tabelar, foi de imediato designada uma data para a realização da audiência de discussão e julgamento - iniciada a 10/10/2017  e concluída no mesmo dia  - ,  e conclusos os autos para o efeito, foi proferida a competente sentença, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor:
(…)
V - Decisão
Pelo exposto e decidindo, julga-se a presente acção procedente e, em consequência, condena-se a Ré B a pagar à Autora A a quantia de €11.549,58 ( onze mil quinhentos e quarenta e nove euros e cinquenta e oito cêntimos ).
Registe e notifique.
Oeiras, 5.1.2017 “

1.4.– Inconformada com a sentença do tribunal a quo - identificada em 1.3 -  da mesma discordando, veio de seguida a Ré B, interpor APELAÇÃO,alegando e deduzindo as seguintes CONCLUSÕES :
- Porque a sentença em crise é recorrível, a apelante exerceu tempestivamente tal direito e tem legitimidade para o fazer;
- Porque o Tribunal a quo valorou o depoimento da testemunha Tiago ….., atribuindo-lhe total credibilidade, quando este declarou ter interesse directo na causa em caso de procedência da presente acção, em detrimento das declarações tomadas pelo representante legal da apelante ;
- Porque resulta da prova documental existente nos autos, não impugnada por ambas as partes, que a obra foi adjudicada à apelada com vista a ser executada com uma espessura de 3 cms, para utilização pedonal e automóvel, acrescida da aplicação de resinas reforçadas e a apelada não adjudicou esses mesmos trabalhos à aqui recorrente, mas outros, nomeadamente, com espessura de apenas 2,5 cms para utilização exclusivamente pedonal
- Porque resulta da experiência comum e é facto público e notório que um material concebido para ser objecto de tração pedonal, com o peso a ele inerente, não possui as mesmas características de robustez, resistência, durabilidade iguais às da tração causada pelo uso automóvel.
- Porque o piso aplicado pela apelante foi destinado a circulação automóvel e pedonal e só apareceram as anomalias após tal utilização, não tendo sido este o fim da empreitada convencionada com a recorrente.
- Porque pela simples aplicação de uma fórmula matemática conseguimos concluir que c pavimento final aplicado, em betão poroso, teve de o ser com uma espessura de 6 cms, ou seja, muito superior" à espessura adjudicada [ 2,5 cm ] à recorrente - 759,90m2x0,06m : 45,59 m3 - corroborando que esta última era manifestamente insuficiente para o uso pedonal e automóvel.
- Porque se verifica erro na apreciação da prova na douta decisão proferida sobre a matéria de facto, porquanto dos elementos probatórios constantes dos autos - depoimento da testemunha Tiago …, do representante legal da apelante, registados na gravação áudio, e acima referenciados por expressa indicação do teor das declarações e dos momentos em que foram produzidas e que por brevidade aqui se dão por reproduzidos -apreciados criticamente e de acordo com os documentos existentes nos autos, a própria restante matéria dada como provada, impunha-se, e data vénia impõe-se, decisão diversa que passe por dar como provada, a matéria elencada nos factos constantes dos itens a), b), c) e d) elencados na fundamentação de facto e dar-se como não provada a matéria elencada no ponto 30, ambos da sentença em crise.
- Entre recorrente e recorrida foi outorgado um contrato de subempreitada. Neste, foi fixado o âmbito do mesmo, nomeadamente, quanto à natureza dos trabalhos a serem efectuados, que se revelaram divergentes dos pretendidos quer do dono da obra quer do empreiteiro geral .
- Porque essa divergência apenas e só à recorrida é imputável, não podendo a apelante ser prejudicada pela estrita aplicação do material que lhe foi solicitado e em cumprimento do contrato de subempreitada, não resultando dos factos dados como provados a demonstração do facto ilícito praticado pela apelante, o que se traduz na falta de demonstração de um dos pressupostos de responsabilidade civil contratual.
10ª- Porque a recorrente foi condenada a pagar a quantia de 11.549,58 euros, sendo que os documentos de suporte juntos pela recorrida apenas perfazem 9.294,30 euros, inexistindo na fundamentação encontrada na sentença qualquer elemento [ adicional ] que se possa retirar o primeiro quantitativo .
11ª- Porque das duas testemunhas arroladas pela apelada, nenhuma delas foi inquirida e, consequentemente, não demonstraram qualquer razão de ciência com vista a esclarecerem o Tribunal sobre o teor dos documentos de fls 16 v°- e 17 [ entenda-se, duas facturas que perfazem o valor global de 5.645,70€ ]
12ª- Porque tais documentos revestem a natureza de documentos particulares, devidamente impugnados, carecendo, consequentemente, de qualquer força probatória per si
13ª- Porque competiria à apelada demonstrar ter efectuado tais pagamentos, o que não fez e, aliás, seria de extrema simplicidade, bastando comprovar quais dos dois meios permitidos pela Lei Geral Tributária adoptou para demonstrar ter efectuada essa quitação e se respeitante à empreitada em execução
14ª-  Porque, sem prejuízo do acabado de elencar, dos documentos juntos pela Autora, alegadamente para pagamento dos materiais empregues, está liquidado o I.V.A. pelo fornecedor, no valor de 1.055,70 euros .
15ª- Porque a recorrida, enquanto sociedade comercial, sujeita a contabilidade organizada, deduz o I.V.A. nas aquisições que efectua, não sendo esse valor um valor efectivamente despendido por si, o que não foi relevado na sentença, o que só por si imporia que ao montante mencionado na conclusão 10ª precedente fosse abatida esta quantia, traduzindo-se num resultado final a ser suportado pela apelante de 8.238,60€ [ 9.294,30€ -1.055,70€ ] e nunca no montante elencado na sentença em crise .
16ª- Porque da análise do documento n° 13 junto com a p.i. - fls 16- e, respeitante ao valor pago pela recorrida à empresa Leiribrilho, Lda, se apura que a área por esta intervencionada ascendeu a 759,90 m2, ou seja, numa área superior em mais de 11% da área executada pela recorrente .
17ª- Porque deste facto, dado como provado, ter-se-á de retirar, pelo menos, que o valor proporcional à execução excendentária não poder recair sobre a recorrente, o que fazendo um regra de "três simples" se apura ser de 381,60€ [ ( 680m2x3645,60€/759,50m2 ) 3645,60€ ]. Valor este da responsabilidade, exclusiva, da apelada.
18ª- Porque efectuadas estas operações aritméticas, a apelante apenas poderia ser condenada no valor máximo de 7.857 euros [ 8.238,60€-381,60€], sempre no caso de não ser dado provimento às conclusões precedentes sob os nºs  2 a 8 e a conclusão que se segue.
19ª- Porque sempre caberia à apelante o direito a reparar a obra não assistindo à recorrida tal possibilidade, inexistindo uma interpelação admonitória revestida de eficácia.
Termos em que, pela procedência das conclusões, ser provido o presente recurso, revogando-se a douta sentença proferida, alterando-se a matéria de fado dada como demonstrada, e julgando a acção improcedente ou, se assim não se entender, condenar a recorrente a suportar o pagamento de 7.857 euros, assim se fazendo inteira JUSTIÇA.

1.5.– A recorrida A, veio apresentar contra-alegações, tendo em sede das mesmas deduzido as seguintes conclusões :

I)– A recorrente veio colocar em crise a matéria de facto dada como não provada pelo Tribunal a quo:
"a)- A Ré só tomou conhecimento que o pavimento por si aplicado não se destinava apenas a passagem pedonal mas também a circulação de veículos automóveis, após a primeira reparação:
b)- Até então, a Autora ocultou à Ré que o pavimento se destinava à circulação automóvel:
c)- O pavimento com a espessura adjudicada pela Autora à Ré (de 2,5 cm) não é adequado à circulação de veículos automóveis, o que era do conhecimento da Autora;
d)- A Autora procurou reduzir os custos por metro quadrado adjudicando à Ré o fornecimento e execução de um pavimento com a espessura de 2,5 centímetros:
e)- A desagregação do pavimento aplicado e fornecido pela Ré foi motivada pelo aluimento do sub-piso;
f)- O sub-piso/base aplicado pela Autora cedeu, o que determinou a execução de obras de drenagem em volta da zona adjacente/exterior ao pavimento aplicado pela Ré, procurando evitar a passagem de águas no sub-solo e, consequente, abatimento do pavimento;
g)- Foi aplicada uma nova base efectuada em tout-venant."

II)– A Recorrente invoca, assim, a verificação de insuficiência para a decisão da matéria de facto não provada, bem como erro notório na apreciação da prova, mas não concretiza um único fundamento para a verificação desses vícios decisórios, restringindo a argumentação ao que considera ser uma errada apreciação e valoração pelo tribunal das declarações de parte do representante legal da Recorrente e do depoimento da testemunha Tiago ….;
III)– No que a esta questão concerne, sempre se diga que o julgador tem total liberdade na apreciação da prova testemunhal carreada para os autos pelas partes, tendo o Tribunal a quo valorado o depoimento da testemunha como espontâneo, coerente, sereno e credível, sendo certo que sobre esta matéria nunca poderia o Tribunal alterar a convicção criada no julgador da 1ª instância:
IV)– Sobre esta matéria refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/03/2007 - Processo nº 07P21: " Existe uma incomensurável diferença entre a apreciação da prova em 1ª instância e a efectuada em tribunal de recurso com base nas transcrições dos depoimentos. A sensibilidade à forma como a prova testemunhal se produz, e que se fundamenta num conhecimento das reacções humanas e análise dos comportamentos psicológicos que traçam o perfil da testemunha, só logra obter concretização através do princípio da imediação, considerado este como a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes, de modo a que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá de ter como base da decisão. "
V)– Afigura-se-nos que o Tribunal a quo ponderou todos os elementos de prova disponíveis, com observância do direito probatório, seguindo critérios de lógica do homem médio e as regras de normalidade, ou seja, no pleno uso do princípio da livre apreciação da prova;
VI)– Cabia à Recorrente provar o que alega, ou seja, que desconhecia que o piso teria uma utilização mista e que a espessura aplicada na obra se apresentava inadequada à passagem de veículos, sendo certo que não logrou provar nenhuma destas circunstâncias;
VII)– No que às declarações de parte da Recorrente se refere, reitera-se o já supra explanado quanto à livre apreciação do depoimento da testemunha por parte do julgador, não cabendo, mais uma vez, ao tribunal fazer prova do que quer que seja, mas, sim, à Recorrente, o que manifestamente não se verificou;
VIII)– Era à Recorrente que cabia provar que o seu representante legal só teve conhecimento do destino do piso aquando da primeira reparação, mas ainda que fosse verdade, o que apenas por cautela de patrocínio se admite, muito se estranha que em Novembro de 2015 quando a Recorrente efectuou a segunda intervenção não tenha precisamente invocado tal factualidade;
IX)– Muito pelo contrário, conforme resulta da comunicação enviada pela recorrente à Recorrida, que não foi objecto de impugnação pela Recorrente e consta do ponto 19 dos factos provados.: "Em 27 de Novembro de 2015, a Ré remeteu à Autora a comunicação cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 12 verso, sob o assunto " Problemas em obra”, que aqui se dá por integralmente produzida, nos termos da qual" (.) Na nossa apreciação as ocorrências no pavimento deveu-se a defeito de construção. Trata-se de um preparado feito "in situ" e as variantes decorrentes de cada situação/aplicação/local são múltiplas inclusive a existência de alguma contaminação dos inertes usados como referem. O ideal na construção deste tipo de pavimento será num ambiente o mais controlado possível de humidade, temperatura, melhor controlo da pureza dos inertes, não sujeito a ventos e geadas na sua fase de execução e enquanto o gel não solidificar, o que devido às contingências de cada obra por variadíssimas razões poderão ser difíceis de obter conjuntamente, enquanto noutras situações esses requisitos são mais facilitados. O motivo de não aplicarmos uma "capa nova" completo como foi comentado deveu-se à nossa apreciação do risco, numa superfície que nos parece consolidada, substituir a mesma em princípio renova e aumenta o risco de poder ocorrer outras anomalias. Em resumo, no que está consolidado tentar melhorar pode em último resultar "piorar "pois é uma nova colocação nova em locais já consolidados. A diferença de tonalidade é momentânea e tende a harmonizar com o tempo. Fazemos notar que algumas áreas reparadas foi por abatimento da base o que não pode ser imputado ao pavimento. Pedimos desculpa pelo sucedido e somos os primeiros a lamentar o ocorrido, 2-3 semanas o teste de utilização do pavimento é conclusivo, se não aparecerem mais deficiências no imediato podemos concluir que definitivamente está apto. (...)
X)– O certo é que a Recorrente não logrou provar a relação entre a espessura do piso que lhe fora adjudicado e por esta aplicado, a utilização que dele era feita e a desagregação que se veio a verificar no mesmo;
XI)– O ónus da prova recaia sobre a Recorrente e da prova que carreou não resulta que:
XII)– a)- " a Ré só tomou conhecimento que o pavimento por si aplicado não se destinava a passagem pedonal mas também a circulação de veículos automóveis, após a primeira reparação;
XIII) b)- Até então, a Autora ocultou à Ré que o pavimento se destinava a circulação automóvel ;
XIV)–  c)- O pavimento com a espessura adjudicada pela Autora à Ré (de 2,5 cm) não é adequado à circulação de veículos automóveis, o que era do conhecimento da Autora ;
XV)– Quanto ao valor que a Recorrente vem agora impugnar, sempre se diga que  também não o fez em sede de Contestação, sendo certo que já tinha conhecimento dos documentos juntos aos autos pela Recorrida, nomeadamente, da factura relativa ao pagamento efectuado à Lei…, Lda., sendo certo que sobre a mesma não se pronunciou e muito menos nos termos e com os fundamentos que vem agora invocar em sede de recurso ;
XVI) Mais, a Recorrente nos seus cálculos desconsidera a factura junta em sede de PI pela Recorrida como documento n° 16 no valor de 2.258,28;
XVII)– Ora, a soma dos valores constantes dos documentos 13 a 16 perfaz a quantia reclamada pela Recorrida e na qual a Recorrente foi condenada;
XVIII)– Dúvidas não podem subsistir que os valores constantes dos documentos juntos aos autos pela Recorrente (vide dos 13 a 16 juntos com a PI), foram efectivamente suportados pela mesma na sequência da reparação dos defeitos de obra resultantes da obra adjudicada à Recorrente e que esta, não obstante ter sido interpelada para proceder à sua rectificação, declarou de forma expressa e inequívoca por e-mail enviado à Recorrida em 04/07/2016 que não pretendia proceder em conformidade;
XIX)– Como se sentenciou no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 14.3.1995, in BMJ, 445, 464:
XX)– " ... Se a obra não for executada de harmonia com o convencionado, evidenciando vícios que, pelo menos, reduzam o seu valor e a sua atinente aptidão, o dono da obra pode desencadear, por ordem de prioridade, os seguintes mecanismos legais:
XXI)– a)- Exigir a eliminação dos defeitos, se estes puderem ser suprimidos;
XXII)– b)- Exigir uma nova construção, se os defeitos não puderem ser eliminados;
XXIII)– c)- Exigir a redução do preço ou, em alternativa, a resolução do contrato.
XXIV)– "Note-se que deixou de ser predominante na doutrina c jurisprudência o entendimento de que apenas em situações de urgência poderia o dono da obra proceder como acima se sustentou.
Aliás, no Ac RP atrás referido - 22/1/1996, CJ, I ,206 - que implicou, como dele se infere, o início da viragem da jurisprudência no sentido de que, sendo a eliminação dos defeitos premente ou urgente, o dono da obro poderia levá-la a efeito por terceiro e reclamar o correspondente custo do empreiteiro, ao invés de, tal como sensivelmente até aí a jurisprudência o vinha exigindo, ter de requerer judicialmente a condenação do empreiteiro à prestação desse facto, só depois lhe sendo possível, se o empreiteiro o não prestasse, requerer na execução que o facto lhe fosse prestado por terceiro - já configurava a existência de urgência ou premência, na circunstância de resultar impedido, ou prejudicado gravemente, o «uso ordinário» da coisa objecto da obra, com o recurso sucessivo do dono desta às várias etapas - uma verdadeira "via sacra" - previstas na lei: « 1 ° Denúncia dos defeitos no prazo de 30 dias; 2° Exigência de que o empreiteiro os elimine em prazo razoável; 3 ° Acção declaratória de condenação a eliminar os defeitos, se os não tiver eliminado voluntariamente em face da exigência do dono da obra; 4° Execução de sentença para prestação de facto, eventualmente por terceiro à custa do empreiteiro, se este continuar a não eliminar os defeitos, agora em obediência à sentença que a isso o condenou». ( Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23/02/2012 - Processo n° 132316/10.6YIPRT.L1-2 )
XXV)– O mesmo Acórdão remata ainda dizendo: " Daí que muito naturalmente a jurisprudência tenha evoluído para o entendimento de que havendo imprescindibilidade na reparação - no sentido de «perigo eminente de agravamento drástico do defeito, ou perigo deste provocar danos graves na própria coisa, ou em outros bens do dono da obra ou terceiros» - o dono desta nem tenha de contactar o empreiteiro a solicitar-lhe a eliminação do defeito, podendo-se-lhe, sem mais, substituir nessa eliminação, por estarem em causa situações que «exigem uma intervenção de tal modo rápida que não se compadece com o tempo da interpelação do empreiteiro e da reacção deste “ [14]. E não se tratando da urgência assim entendida, possa proceder de modo a obter o incumprimento definitivo daquele relativamente à eliminação dos defeitos, com o recurso à interpelação admonitória genericamente prevista no artº 808°/1 CC.
XXVI)– É bem verdade o explanado pela Recorrente quando faz referência a douto Acórdão do STJ., de 04-12-2007 que diz que" o dono de obra não pode por  si proceder à reparação, sem dar primeiro ao empreiteiro o conhecimento dos defeitos e a oportunidade de os eliminar",
XXVII)– Resulta inequívoco da prova carreada para os autos que a Recorrente não refutou a existência dos defeitos, dos quais lhe foi dado tempestivo conhecimento, tendo a mesma assumido a responsabilidade sobre os mesmos e se dispôs por duas vezes a proceder à sua reparação;
XXVIII)– A Recorrente foi interpelada admonitoriamente para proceder à reparação dos vícios em 02 de Julho de 2016, tendo sido feita expressa referência a que em caso contrário a Recorrida iria contratar outra empresa para o efeito, o que fez;
XXIX)– Importa frisar, que o prazo referido na interpelação admonitória levada a efeito pela Recorrida não era para conclusão da obra, mas para "entrada em obra", tendo no dia 04 de Julho de 2016 a Recorrente declarado expressamente que não ia proceder à reparação dos defeitos, pelo que esta é uma não questão;
XXX)– Pois que a Recorrida só entregou a obra a terceiros para reparação dos defeitos porque a Recorrente tendo sido eficazmente notificada para proceder em conformidade não o fez;
XXXI)– Por todo o exposto, deve, pois, manter-se a douta sentença recorrida;
Termos em que não deve ser reconhecido provimento ao presente recurso, sendo, em consequência, mantida a douta sentença recorrida com o que V, Exas. farão JUSTIÇA.
*

Thema decidendum
1.6.– Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a decidir  resumem-se às seguintes  :
Primo- Aferir se deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal a quo, na parte respeitante aos concretos pontos indicados nas alegações/conclusões da apelante ;
Secundo- Decidir se, em face das alterações introduzidas ( eventualmente ) por este tribunal na decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, se impõe a alteração do julgado, sendo a acção julgada improcedente e a Ré apelante absolvida do pedido ;
Tertius- Decidir se, em face das alterações introduzidas ( eventualmente ) por este tribunal na decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, se impõe a alteração parcial do julgado, não podendo a condenação da Ré apelante ultrapassar - como sucedeu  - um valor superior a €7.857,00 , porque :
a)- Importava deduzir o valor do IVA pela autora pago; 
b)- A reparação paga pela Autora teve por objecto uma área superior à intervencionada pela Ré ;
Quartus - Aferir se incorre a sentença apelada em error in judicando, ao condenar a Ré no pagamento de montante suportado pela autora na reparação, porque sempre caberia à apelante o direito a reparar a obra .
*** 
     
2.–Motivação de Facto.

Em sede de sentença, fixou o tribunal a quo, a seguinte FACTUALIDADE :

A)– PROVADA

2.1.- A Autora dedica-se à importação, exportação, representação e comercialização de produtos químicos para a construção e todos os seus derivados e de materiais como : Slurry, Slurry Seal coloridos, Resinas Acrílicas para Pavimentos Desportivos, Revestimentos sobre suportes de Aglomerados Asfálticos, Revestimentos sobre suportes de Betão, entre outros;
2.2. - A Ré tem como objecto social a construção e engenharia civil, comércio e indústria de materiais, mercadorias e equipamentos, manutenção, reparação e serviços relacionados;
2.3. - Entre a Autora e a Ré foi celebrado, em 19 de Agosto de 2015, um acordo, nos termos do qual, a solicitação da Autora, a Ré se comprometeu a executar/aplicar pavimento de resina permeável em 680 m2 do Parque do Moinho das Antas, sito em Oeiras, sendo o dono de obra a Câmara Municipal de Oeiras;
2.4. - O preço acordado para o fornecimento e aplicação do pavimento, em inertes naturais, pela Ré, foi de € 21/m2, que a Autora pagou;
2.5. - Os trabalhos prévios necessários à aplicação do pavimento pela Ré, tais como preparação e consolidação do piso, bem como a base, que foi feita em brita, não foram realizados pela Ré;
2.6. - O prazo para conclusão da obra adjudicada pela Autora à Ré terminava em 5 de Setembro de 2015;
2.7. - A Ré executou os trabalhos referidos em 3., que deu por terminados a 10 de Setembro de 2015;
2.8. - Para pagamento dos referidos trabalhos, a Ré emitiu a factura cuja cópia de encontra se junta aos autos a fls. 6 verso, que aqui se dá por integralmente reproduzida, no valor de € 14.280,00;
2.9. - Em 22 de Setembro de 2015, após a abertura do parque do Moinho das Antas, foram detectados pela Câmara Municipal de Oeiras problemas de desagregação do material no pavimento, o que foi comunicado à Ré no mesmo dia;
2.10. - Em resposta, no mesmo dia 22 de Setembro de 2015, a Ré remeteu à Autora a comunicação cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 9 verso, com o assunto " Problemas em obra", que aqui se dá por integralmente reproduzida, nos termos da qual: "(...)Vamos ver qual o problema e resolver de imediato a situação. Prevemos quinta feira logo pela manhã estar em obra. (...) ";
2.11. - Em 23 de Setembro de 2015, a Ré remeteu à Autora a comunicação cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 10, com o mesmo assunto, que aqui se dá por integralmente reproduzida, nos termos da qual: " Sem dúvida representa uma anomalia que não desejamos que aconteça, nossos objectivos são precisamente o contrário pelo que lamentamos a situação ocorrida. Serão executadas de imediato todas as obras necessárias para deixar o pavimento com excelente qualidade, não pouparemos esforços. Apresentamos as nossas desculpas (...). ";
2.12. - A Ré procedeu a reparações no pavimento em finais Setembro de 2015;
2.13. - Em Outubro de 2015, a Câmara Municipal de Oeiras informou da existência de novas anomalias relacionadas com a desagregação do material do pavimento;
2.14. - Em 27 de Outubro de 2015, a Autora remeteu à Ré a comunicação cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 10 verso a 11 verso, sob o assunto " Problemas em Oeiras", que aqui se dá por integralmente reproduzida, nos termos da qual: " No seguimento da nossa conversa, envio-lhe as fotos dos problemas na obra de Oeiras, o qual fomos alertados pela fiscalização da Câmara, veja se me resolve isto com a maior brevidade possível de modo que nos possamos fechar este assunto, pois já começa a ser incómodo para nós esta situação (…)";
2.15. - Em 12 de Novembro de 2015, a Ré remeteu à Autora a comunicação cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 12, sob o assunto "Problemas em obra", que aqui se dá por integralmente reproduzida, nos termos da qual: " Estimamos reparar o mais breve possível (…) ";
2.16. - Em Novembro de 2017 a Ré realizou novas intervenções para reparação das anomalias, de desagregação, verificadas no pavimento;
2.17. - Aquando dessa intervenção, a Autora solicitou à Ré que fosse aplicada uma "capa nova";
2.18- A Ré recusou a aplicação de uma "capa nova", alegando que tal não seria necessário;
2.19. - Em 27 de Novembro de 2015, a Ré remeteu à Autora a comunicação cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 12 verso, sob o assunto "Problemas em obra", que aqui se dá por integralmente reproduzida, nos termos da qual : " (...) Na nossa apreciação as ocorrências no pavimento deveu-se a defeito de construção. Trata-se de um preparado feito "in situ " e as variantes decorrentes de cada situação/aplicação/local são múltiplas inclusive a existência de alguma contaminação dos inertes usados como referem. O ideal na construção deste tipo de pavimento será num ambiente o mais controlado possível de humidade, temperatura, melhor controlo da pureza dos inertes, não sujeito a ventos e geadas na sua fase de execução e enquanto o gel não solidificar, o que devido às contingências de cada obra por variadíssimas razões poderão ser difíceis de obter conjuntamente, enquanto noutras situações esses requisitos são mais facilitados. O motivo de não aplicarmos uma "capa nova" completo como foi comentado deveu-se à nossa apreciação do risco, numa superfície que nos parece consolidada, substituir a mesma em princípio renova e aumenta o risco de poder ocorrer outras anomalias. Em resumo, no que está consolidado tentar melhorar pode em último resultar "piorar" pois é uma nova colocação nova em locais já consolidados. A diferença de tonalidade é momentânea e tende a harmonizar com o tempo. Fazemos notar que algumas áreas reparadas foi por abatimento da base o que não pode ser imputado ao pavimento. Pedimos desculpa pelo sucedido e somos os primeiros a lamentar o ocorrido como é óbvio mas aproveitamos para avisar que durante 2-3 semanas o teste de utilização do pavimento é conclusivo, se não aparecerem mais deficiências no imediato podemos concluir que definitivamente está apto. (...) ";
2.20. - A Câmara Municipal de Oeiras não aceitou a reparação nos termos em que foi feita pela Ré, porque o pavimento não ficou uniforme, apresentando "remendos", e exigiu, em Dezembro de 2015, "uma recarga total para a estabilização e uniformização do pavimento";
2.21. - O pavimento não ficou uniforme e, não obstante as intervenções realizadas pela Ré, continuou a apresentar problemas de desagregação;
2.22. - Para correcção do referido no número anterior, a Autora solicitou à Ré que esta procedesse à remoção do pavimento aplicado e à aplicação de novo pavimento;
2.23. - A Ré não aceitou proceder nesses termos;
2.24. - Em 2 de Julho de 2016, a Autora remeteu à Ré a comunicação cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 15, que aqui se dá por integralmente reproduzida nos termos da qual: "(...) dou-lhe até dia 4 de Julho, para entrar em obra (...) Garantindo desde já que se até à data em questão, não entrar em obra iremos contratar outra empresa para reparar e terminar o trabalho e iremos imputar todos os custos à vossa empresa (...) ";
2.25. - Em 4 de Julho de 2016, a Ré comunicou à Autora, através da comunicação cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 15 verso, que aqui se dá por integralmente reproduzida, que "declinamos a pretensão manifestada ";
2.26. - Atenta a posição assumida pela Ré, a Autora procedeu à remoção do pavimento aplicado pela Ré, para substituição, na mesma área, por outro pavimento;
2.27. - Para aplicação de novo pavimento, na mesma área, a Autora contratou a sociedade Lei….,Lda;
2.28. - A Lei…, Lda. forneceu a mão-de-obra para aplicação do novo pavimento ;
2.29. -  Os materiais foram disponibilizados pela Autora;
2.30. - A Autora despendeu a quantia de €11.549,58, em materiais e mão-de-obra para aplicação de novo pavimento na mesma área que havia sido intervencionada pela Ré.
2.31. - O novo pavimento foi executado em betão poroso, por ser mais económico.

B)– NÃO PROVADA
2.32. - A Ré só tomou conhecimento que o pavimento por si aplicado não se destinava apenas a passagem pedonal mas também a circulação de veículos automóveis, após a primeira reparação ;
2.33. -  Até então, a Autora ocultou à Ré que o pavimento de destinava à circulação automóvel ;
2.34. -  O pavimento com a espessura adjudicada pela Autora à Ré ( de 2,5 cm) não é adequado à circulação de veículos automóveis, o que era do conhecimento da Autora ;
2.35. - A Autora procurou reduzir os custos por metro quadrado adjudicando à Ré o fornecimento e execução de um pavimento com a espessura de 2,5 centímetros;
2.36. -  A desagregação do pavimento aplicado e fornecido pela Ré foi motivada pelo aluimento do sub-piso ;
2.37.O sub-piso/base aplicado pela Autora cedeu, o que determinou a execução de obras de drenagem em volta da zona adjacente/exterior ao pavimento aplicado pela Ré, procurando evitar a passagem de águas no sub-solo e, consequente, abatimento do pavimento;
2.38.  -  Foi aplicada uma nova base efectuada em tout-venant.
*

3.– Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal a quo.
Analisadas as alegações e conclusões da apelante B e no que à decisão relativa à matéria de facto proferida pelo tribunal a quo diz respeito, inquestionável é que impugna a recorrente diversas respostas/julgamentos da primeira instância no tocante a vários/concretos pontos de facto da referida decisão, considerando para tanto terem sido todos eles incorrectamente julgados.

Por outra banda, tendo presente o conteúdo das apontadas peças recursórias, impõe-se reconhecer, observou e cumpriu a apelante as regras/ónus processuais a que alude o artº 640º, do CPC, quer indicando ( maxime nas conclusões) os concretos pontos de facto que considera como tendo sido incorrectamente julgados, quer precisando ( maxime nas alegações ) quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo de gravação nele realizada, que impunham uma decisão diversa da recorrida, quer , finalmente , indicando ( maxime nas conclusões ) quais as diferentes respostas que deveria o tribunal a quo ter proferido.

E, ademais, porque gravados os depoimentos das testemunhas pela apelante indicadas, procedeu a mesma , outrossim, à indicação, com exactidão ( maxime nas alegações ), das passagens da gravação efectuada e nas quais ancora a ratio da impugnação deduzida.

Destarte, na sequência do exposto, nada obsta, portanto, a que proceda este Tribunal da Relação à análise do “mérito” da solicitada/impetrada alteração das  respostas aos pontos de facto impugnados [ que são os reproduzidos nos itens 2.30 ( julgado provado) e 2.32  a  235 ( os 4 julgados não provados),  todos do presente Ac. ] .

3.1.- Do ponto de facto correspondente ao item 2.30 do presente Ac.
Tendo o tribunal a quo julgado como provado que “A Autora despendeu a quantia de €11.549,58, em materiais e mão-de-obra para aplicação de novo pavimento na mesma área que havia sido intervencionada pela Ré” , considera porém a Ré apelante que, em face da prova documental e testemunhal produzida nos autos, e que indica, forçoso é que o referido ponto de facto deva ser reconduzido ao rol dos factos não provados.

É que, para a autora recorrente, o julgamento do tribunal a quo apenas é compreensível em face de um erro do Exmº julgador em sede de apreciação e valoração das provas produzidas.

Vejamos, já de seguida, se a impugnação da recorrente é de atender, sendo que, a justificar o tribunal a quo a convicção a que chegou e que terá sido decisiva em sede de julgamento do ponto de facto ora em sindicância , apenas se descobre - com pertinência - no âmbito da decisão a que alude o nº 4, do artº 607º, do CPC,  as seguintes considerações :
“ (…)
No mais, a convicção do Tribunal quanto à factualidade que considerou provada assentou na análise crítica, ponderada e conjugada da prova documental junta aos autos a fls. 9  a 17, 20, 28 verso a 32 verso e 40 a 41 verso, com o depoimento prestado pelas testemunhas Tiago …, administrador da sociedade United ….., S.A., empreiteira da obra em questão, e Carlos …., gerente da Lei…., Lda. e , coadjuvantemente, na parte em que são corroboradas por outros meios de prova, e sem prejuízo das ressalvas que infra de referirão, nas declarações de parte prestadas pelo legal representante da sociedade Ré.
(…)
A testemunha Carlos …., gerente da sociedade Lei…., Lda. descreveu os trabalhos adjudicados e realizados pela referida sociedade, que afirmou terem sido pagos. Afirmou que esta sociedade apenas procedeu à aplicação do pavimento, em botão poroso, fornecendo a mão-de-obra e não os materiais. Referiu que a área intervencionada pela Lei…., Lda. foi a área onde estava aplicado anteriormente o pavimento que foi removido, esclarecendo as circunstâncias em que, por vezes, ocorreram diferenças na indicação das áreas em m2, mas reafirmando que a área que intervencionou foi exactamente a mesma em que estava colocado o piso anterior. Mais afirmou que o piso em betão poroso foi colocado por cima da base que já lá estava e que tinha servido de base ao pavimento que lá estava antes e que foi removido.
(…)
Embora esta testemunha tenha referido já não se recordar do valor que foi pago à Lei…. pela aplicação do pavimento, afirmou que a quantia acordada lhe foi paga e quando confrontada com o documento de fls. 16 conformou que o mesmo corresponde ao modelo/aparência das facturas que são emitidas pela Leiribrilho. Ponderando o afirmado por esta testemunha, embora não esteja junto aos autos o respectivo recibo ou qualquer outro documento comprovativo de pagamento, o Tribunal ficou convencido que a quantia indicada no documento de fls. 16 corresponderá ao valor pago à Leiribrilho pela aplicação do betão poroso, o que motivou, juntamente com os documentos de fls. 16 verso e 17, a convicção do Tribunal quanto ao facto considerado provado em 31.
De referir, ainda, a este propósito, que os documentos de fls. 16 verso e 17 se tratam de facturas recibo, que o material a que se referem coincide com o que a testemunha Carlos …. afirmou ter sido aplicado pela Leiribrilho na obra e que o local da obra indicado nas facturas, em particular na factura de fls. 16 verso, corresponde ao local da obra em causa nestes autos. Nestas circunstâncias, atentas as datas de tais facturas e o local da obra nas mesmas indicado não há razão para questionar que respeitem aos materiais que foram aplicados na execução do novo piso, o que se aceita.
De referir, por fim, que embora na factura junta a fls. 16 conste como quantidade "759,50", a testemunha Carlos …. foi firme a afirmar que a área que intervencionou foi exactamente a mesma onde estava colocado o piso anterior, que foi removido.”
Ou seja, e perante as “explicações” acima transcritas, e ainda que de uma forma não totalmente precisa, tudo indica que a prova que conduziu e justificou o julgamento do tribunal a quo ora em sindicância, circunscreveu-se à análise do depoimento prestado pela testemunha Carlos …, por sua vez conjugado com o teor da prova documental junta aos autos a fls. 16, 16 verso e 17 , as quais mais não correspondem aos documentos nºs 13, 14 e 15, juntos pela Autora com a respectiva petição inicial, e precisamente indicados como prova do alegado no artº 17º da petição [ com a seguinte e parcial redacção “ (…) A Autora viu-se obrigada a contratar a empresa Lei….,Ldª para reparar a situação, tendo sido retirado todo o pavimento existente e aplicado um novo, o que custou à Autora Eur. €11.549,58 “ ] .

Ora, conhecida em traços largos qual a ratioda convicção do tribunal a quo, urge de imediato aferir se a prova indicada pela apelante justifica/obrigaque o ad quem enverede por uma diversa/diferente convicção, sendo que, neste âmbito, pertinente é não olvidar que não cabe de todo a este Tribunal da Relação realizar um segundo ou um novo julgamento, antes é a sua competência residual [porque os respectivos poderes circunscrevem-se à reapreciação de concretos meios probatórios relativamente a determinados pontos de facto impugnados (1)], ou seja, a impugnação  da decisão de facto “ não pode transformar o tribunal de segunda instância em tribunal de substituição total e pleno, anulando, de forma plena e absoluta, o julgamento que foi realizado por um tribunal a quem cabe, em primeira e decisiva linha, fazer uma aproximação, imediata e próxima, das provas que lhe são presentes. À segunda instância cabe proceder ao julgamento da decisão de facto por forma a corrigir erros de julgamento patentes nos tribunais de 1.ª instância, mas dentro de limites que não podem exacerbar ou expandir-se para além do que a lei comina.” (2) .

Daí que, compreensivelmente , aquando da formação da convicção pelo ad quem [que pode ser ,naturalmente, diferente da do a quo] , pertinente é não olvidar que, se é certo que o princípio da imediação não pode constituir obstáculo à efectivação do recurso da matéria de facto, a pretexto de, na respectiva decisão, intervirem elementos não racionalmente explicáveis (3) , a verdade é que [ o que ninguém ousa questionar ] muito do apreendido pelo Julgador da primeira instância nunca chega - porque não é gravado ou registado - ao ad quem, sempre existindo inúmeros factores difíceis de concretizar ou de verbalizar e que são importantes e decisivos em sede de formação da convicção , e , consequentemente, no âmbito do julgamento da impugnação da decisão de facto, há-de  o Tribunal da Relação evitar a introdução de alterações quando não seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de um erro de apreciação da prova relativamente aos concretos pontos de facto impugnados .(4)

Isto dito, e começando pelo depoimento prestado pela testemunha Tiago ….,e pela apelante invocado como sendo comprovativo do erro de julgamento do tribunal a quo, é vero que do mesmo resulta a alusão à circunstância de a firma empreiteira geral da obra ( a UBC ) haver igualmente suportado parte dos custos relacionados com as reparações efectuadas.

Porém, por si só, porque o referido depoimento - além de algo genérico - não infirma a demais prova produzida nos autos, maxime de natureza documental,  e , ademais, aludindo de alguma forma a um acordo/acertamento pretensamente estabelecido entre o empreiteiro e o subempreiteiro , e que não interfere de todo e directamente com o objecto do processo, traduzindo-se em rigor de matéria que é estranha ao contrato que apenas vincula apelante e apelada, não pode com relevância o mesmo corroborar um inequívoco erro de apreciação da prova ( maxime no tocante ao julgamento do item 2.30 ) .

Depois, analisada a prova documental junta aos autos [ documentos alusivos a facturas, juntos a fls.16, 16 verso, 17 e 20 ], verifica-se que toda ela tem por objecto ( aludindo de resto à execução de trabalhos e fornecimento de material  em obra sita em Oeiras ) bens e serviços facturados efectivamente à Autora/apelada A.

Ainda da análise de toda a referida prova documental e tendo presente todos os valores que das diversas facturas constam [ a pagar pela Autora/apelada A. , sendo 3 delas facturas-recibo ], constata-se que a respectiva soma atinge precisamente o valor total de €11.549,58 [ 3.645,60€ + 2.885,58€ +2.760,12€ +2.258,28€ ], ou seja, exactamente o montante indicado no ponto de facto impugnado e ora em análise .

Também ouvido que foi o depoimento prestado pela testemunha Carlos …., gerente da sociedade Lei…, Lda, certo é confirmou a mesma ter executado os trabalhos facturados ( doc. junto a fls. 16)  à Autora A, explicando que se limitou a trabalhar na área onde estava aplicado anteriormente o pavimento que foi removido , e que efectivamente recebeu a correspondente quantia de 3.645,60€ .

Por último, analisados ainda todos os documentos acima indicados, certo é todos eles aludem ao mesmo local de obra ( Oeiras),  ao mesmo tipo de trabalho ( Pavimento), e a igual tipo de material aplicado ( Unidrem colorido castanho ) .

Ora, em face da prova acima indicada e escalpelizada, e sabendo-se que em sede de demonstração da realidade dos factos ( cfr. artº 341º, do CC ) não exige de todo uma convicção assente num juízo de certeza lógica, absoluta, sob pena de o direito falhar clamorosamente na sua função essencial de instrumento de paz social e de realização da justiça entre os homens (5), e impondo-se decidir se a convicção da Exmª Juiz a quo se mostra de todo desconforme com as mais elementares regras de bom senso, da experiência ou da normalidade da vida, ou manifestamente desajustada de uma adequada avaliação probatória, é entendimento do ad quem que a resposta só pode ser  negativa.

Ou seja, está longe ( e muito ) de revelar a prova pela apelante invocada de apontar para a existência de um efectivo erro de julgamento da parte do tribunal a quo,obrigando o mesmo a que se confira uma resposta diversa ao ponto de facto vertido no item 2.30. do presente Acórdão, bem pelo contrário.
Nesta parte, improcede portanto a impugnação da decisão de facto.

3.2.- Dos pontos de facto correspondentes aos itens 2.32 a 2.35 do presente Ac.
Tendo o tribunal a quo julgado não provados todos os pontos de facto ora em sindicância, do referido julgamento discorda todavia a Ré/apelante, considerando que todos eles mereciam ter sido reconduzidos ao leque dos factos provados.
A justificar o tribunal a quo a convicção a que chegou e que terá sido decisiva para o julgamento dos pontos de facto ora em sindicância , recorda-se, aduziu-se na sentença apelada, em parte,  as seguintes considerações :
“ (…)
A factualidade não provada resultou da ausência ou insuficiência de prova susceptível de a revelar.
O afirmado pelo legal representante da Autora de que apenas teve conhecimento que o pavimento se destinava a circulação automóvel quando foi feita a primeira reparação, afirmando que, até aí, desconhecia que a obra era um parque de estacionamento, não merece qualquer credibilidade, para além de ser frontalmente contrariado pelo depoimento da testemunha Tiago de Jesus Patrício que referiu que o legal representante da Ré antes de "entrar em obra" esteve na obra para verificar o local e os trabalhos preparatórios à aplicação do pavimento e que, já então, sabia que era um estacionamento. De resto, é absolutamente inverosímil que uma pessoa que acompanhou a obra nos termos em que o legal representante da Ré o refere ter feito - quase diariamente e ali ou nos arredores permanecendo longos períodos - ainda que tal não lhe tivesse sido expressamente referido, não se tivesse tomado conhecimento que se tratava de um parque de estacionamento, considerando, além do mais, as características do local.
Nestas circunstâncias consideraram-se não provados os factos referidos em a) e b ).
Ainda que o legal representante da Ré o tenha referido e nos documentos juntos aos autos a fls. 29 verso e 30 (propostas apresentadas pela Ré à Autora para outra obra) constem espessuras diferentes para piso para automóveis e para piso pedonal e que na comunicação da Autora junta a fls. 32 se afirme que "a espessura do pavimento que foi executado é reservada a utilização pedonal", não foi feita prova bastante de que o piso com a espessura que foi adjudicado pela Autora à Ré não fosse adequado à circulação de veículos automóveis, não podendo o Tribunal sustentar a afirmação deste facto apenas nas declarações de parte do legal representante da Ré e em documentos por esta produzidos, o que motivou que se tivesse considerado não provado o facto descrito em c)
De referir, de resto, quanto a esta matéria, que a testemunha Carlos …. afirmou que o piso com a espessura de 2,5 cm não é necessariamente inadequado para a circulação automóvel.
Acresce que não foi feita qualquer prova que permita estabelecer uma relação entre a espessura do piso adjudicado à Ré e por esta aplicado, a utilização que dele era feita e a desagregação que se veio a verificar do mesmo.
Os factos referidos em d), e) e f) foram afirmados apenas pelo legal representante da sociedade Ré.
Assim, não pode o Tribunal afirmar a realidade de factos, que são essenciais, apenas com base em declarações de parte que, pela sua própria natureza, são pouco ou nada objectivas.”

Já a apelante, no âmbito da prova produzida  e a alicerçar a impetrada alteração da decisão de facto na parte ora em apreciação, limita-se tão só a invocar, por um lado, a parcialidade e a irrelevância  do depoimento prestado pela testemunha Tiago …. ( o representante legal da empreiteira )  e, por outro, a injustificada não consideração/valorização da Exmª Julgadora do depoimento prestado em audiência pelo legal representante da recorrente .

Ora, porque qualquer das referidas criticas apontadas pela apelante não se revelam pertinentes  e, ademais, importa não olvidar , é sobre a apelante que incide o ónus da prova da factualidade inserida nos itens de facto ora em aferição ( porque susceptível de integrar a previsão da II parte do nº1, do artº 799º, do CC ), então, face ao disposto na primeira parte do artº 414º, do CC, bem se compreende o julgamento de facto - negativo - pelo qual enveredou a primeira instância.

Desde logo, ainda que o depoimento prestado pela testemunha Tiago …. ( o representante legal da empreiteira ) não merecesse efectivamente ser valorado, tal só obrigava à respectiva desvalorização em sede e para efeitos de contra-prova ( cfr. artº 346º, do CC ), que não já para a prova de factos alegados pela própria Ré/apelante e outrossim a parte onerada com o respectivo ónus probatório.

Depois, porque o grosso dos fundamentos invocados em sede de almejada alteração da decisão de facto entroncam fundamentalmente nas declarações prestadas pelo próprio representante legal da Ré/apelante, sendo que, quando incidem sobre factualidade que é também da conveniência do próprio - como é o caso - , são na referida parte “apenas“ apreciadas livremente pelo tribunal nos termos do  disposto no artº 466º, nº 3, do CPC .

E, assim sendo, e no âmbito da referida apreciação, bem se compreende que por norma e em regra [ ainda que nada obrigue - de lege lata -  o julgador a desvalorizar os depoimentos de partes quando respeitam a factos que são favoráveis ao depoente ], acabe o juiz por ser mais cauteloso e exigente quando se trate de valorar positivamente as declarações de ciência efectuadas pelo depoente e quando tenham precisamente por objecto factos favoráveis ao próprio, maxime quando na presença de factualidade facilmente documentável ou susceptível de prova testemunhal  [ logo, quando não está o depoente confrontado com uma qualquer – diabolic probatio - impossibilidade de demonstrar os factos que suportam o direito subjectivo do qual se arroga titular ], e isto apesar de o novo CPC ter consagrado ( no artº 466º ) a admissão e a valoração ou eficácia probatória das declarações da própria parte sobre quaisquer factos controvertidos, e quer sejam eles favoráveis ou desfavoráveis ao depoente e que interessem à decisão da causa.

É que, devendo o juiz apreciar livremente a prova segundo a sua prudente convicção ( cfr. artº 607º, nº4, do CPC ), e sendo verdade que o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham, ou não, emanado da parte que devia produzi-las ( cfr. art. 413º, do CPC), ou seja, não existe portanto qualquer proibição de valoração das declarações da própria parte e em benefício da mesma (pro se),  ad cautelam (porque dificilmente a parte , nas declarações que presta, consegue alhear-se dos verdadeiros interesses em causa/jogo no processo, e os quais pretende fazer valer em seu benefício ) deve porém o julgador complementar [ que não formar a sua convicção exclusivamente nas declarações da parte ] as declarações da parte com quaisquer outras provas produzidas , e , de preferência, avaliá-las de acordo como as regras da experiência e alicerçá-las em presunções judiciais livremente valoráveis pelo tribunal.

Ora, in casu, certo é que, não são de todo os documentos pela Ré/apelada invocados nas suas alegações, por si só, minimamente reveladores de que o pavimento que a Autora/apelada encomendou à Ré/apelante não era de todo adequado à utilização à qual estava o mesmo destinado e, outrossim, não indicam também os mesmos documentos, com clareza, que a Autora ocultou à Ré que o pavimento se destinava à circulação automóvel, o que fez com o desiderato de procurar reduzir os respectivos custos por metro quadrado.

Consequentemente, e dispondo o artº 414º, do CPC, que “ A dúvida sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita”, temos para nós que nenhuma censura é merecedora a decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, não se descortinando que em sede de julgamento de facto tenha o tribunal a quo incorrido em erro de julgamento em razão de incorrecto, desadequado e injustificado  mau desempenho em sede de apreciação da prova.
Tudo visto e ponderado, e porque coo vimos supra, e no âmbito do julgamento da impugnação da decisão de facto, há-de  o Tribunal da Relação evitar a introdução de alterações quando não seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de um erro de apreciação da prova relativamente aos concretos pontos de facto impugnado, a impugnação da decisão de acto só pode improceder, como in casu improcede in totum,
*

4.– Da almejada alteração do julgado, impondo-se a revogação in totum da sentença apelada, ou a alteração parcial do julgado, não podendo a condenação da Ré apelante ultrapassar - como o foi - um valor superior a €7.857,00.

Como decorre do relatório do presente Ac., e , sobretudo , das conclusões recursórias da Apelante dirigidas para a sentença recorrida , manifesto é que a pretendida alteração do julgado [  ser a sentença da primeira instância substituída por Acórdão que declare a acção totalmente improcedente com referência à Ré B, ou , pelo menos , que condene a Ré em montante inferior ao peticionado ] pressupunha e exigia, forçosamente, a modificação/alteração da decisão sobre a matéria de facto proferida pelo a quo.

Na verdade, qualquer uma das referidas pretensões recursivas exigia, ou respostas positivas aos itens de facto correspondentes ao supra identificados sob os nºs  2.32 a 2.35 , ou uma resposta negativa ( ou apenas restritiva )  ao ponto de facto nº 2.30.

Porém, e em razão dos fundamentos aduzidos em 3.1 e 3.2. , considerou este tribunal não existirem motivos pertinentes e relevantes para se introduzirem alterações nas respostas que foram dadas pela primeira instância aos concretos pontos de facto impugnados .

Destarte, e não olvidando o disposto no artº 608º,nº2, do CPC, ex vi do nº2, do artº 663º, do mesmo diploma legal, inevitável e forçosa é , consequentemente, a improcedência da apelação .

Por último, resta acrescentar que não é ainda e também a sentença apelada merecedora de qualquer censura, em sede de subsunção dos factos às normas legais correspondentes, maxime em sede de indagação, selecção, interpretação e aplicação,  não tendo a apelante razão quando defende que em tese apenas poderia ser condenada a reparar a obra, não assistindo já à recorrida o direito de, avançando sponte sua para a reparação, solicitar depois à Ré o reembolso da quantia entretanto suportada
É que, em face da conjugação de toda a factualidade assente em 2.21 , 2.22 , 2.23 , 2.24 , 2.25 [ “Em 4 de Julho de 2016, a Ré comunicou à Autora, através da comunicação cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 15 verso, que aqui se dá por integralmente reproduzida, que "declinamos a pretensão manifestada "]  e 2.26 [ “Atenta a posição assumida pela Ré, a Autora procedeu à remoção do pavimento aplicado pela Ré, para substituição, na mesma área, por outro pavimento“ ], nada obrigava a que a autora/apelada tivesse inevitavelmente seguido o obrigatório íter legal (6) previsto ( nos artºs 1221º a 1223º, todos do Código Civil ) para a eliminação dos defeitos, que o mesmo é dizer, observado a prioridade dos direitos consagrados nos referidos arts do Código Civil.

Na verdade, como bem se chama à atenção na sentença apelada, e para além dos casos de manifesta urgência, há muito que vem sendo admitido [ na doutrina (7)  e na jurisprudência (8) ] que nada impede também o dono da obra de  executar directamente a reparação dos defeitos, por si ou por terceiro, nos casos em que se verifica um incumprimento definitivo das obrigações que incidem sobre o empreiteiro de proceder à eliminação dos defeitos ou de executar a obra nova, exigindo posteriormente o reembolso das respectivas despesas.

Ou seja, não se olvidando que perante a existência de defeitos , concede a lei ao dono da obra vários direitos, sendo o primeiro forçosamente o de exigência de eliminação dos defeitos [ cfr. Pedro Romano Martinez (9) ] , certo é que, como com total acerto se refere no Ac. do Tribunal da Relação do Porto acima indicado e de 24/2/2014, “ O direito de primazia concedido ao empreiteiro relativo à eliminação dos defeitos não é absoluto “, pois que, “ nos casos de urgência na reparação ou nos casos em que volvido um prazo razoável não realizar de forma definitiva e de modo útil a prestação a que está vinculado, o princípio da boa fé e da razoabilidade traduzido no equilíbrio das prestações contratuais, determina que seja permitido ao dono da obra executar por si ou por terceiro, a eliminação dos defeitos à custa do empreiteiro”.

Ora,  resultando dos autos que a Ré manifestou de forma peremptória a sua recusa em diligenciar pela reparação dos defeitos e pela execução de novo da obra, tal por si só configura um incumprimento definitivo por parte do empreiteiro da obrigação de eliminação dos defeitos , e , consequentemente, bem andou o Tribunal a quo em decidir tal como decidiu.
Em suma, a apelação improcede in totum.
*

5. -  Sumariando  ( cfr. artº 663º, nº7,  do CPC).
5.1.- O direito de primazia concedido ao empreiteiro e relativo à eliminação dos defeitos não é absoluto, pois que, nos casos de urgência na reparação ou v.g. de incumprimento definitivo da obrigação de eliminação dos defeitos, o princípio da boa fé e da razoabilidade traduzido no equilíbrio das prestações contratuais, determina que seja permitido ao dono da obra executar por si ou por terceiro, a eliminação dos defeitos à custa do empreiteiro.
***

6.–Decisão
Em face de tudo o supra exposto, acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa , em , não concedendo provimento ao recurso de apelação apresentado pelos AA :
6.1.- Não introduzir quaisquer alterações na decisão de facto proferida pelo tribunal a quo ;
6.2. -  Manter/confirmar a sentença recorrida .
***
Custas a cargo da apelante.
***



LISBOA , 19/4/2018

 
                                                                                     António Manuel Fernandes dos Santos  (Relator)
Eduardo Petersen Silva (1º Adjunto)                                                
Cristina Isabel Ferreira Neves (2ª Adjunta)



(1)Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2010, 3ª Edição, pág. 309.
(2)Cfr. Ac. do STJ de 1/7/2014, Proc. nº 1825/09.7TBSTS.P1.S1, in www.dgsi.pt.
(3)Cfr. Ac. do STJ de 8/6/2011, Proc. nº 350/98.4TAOLH.S1, in www.dgsi.pt.
(4)Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, ibidem, pág. 318.
(5)Cfr. Prof. Antunes Varela e outros, in Manual de Processo Civil, 1984, págs. 420 e segs.
(6)Vide, de entre muitos outros, o  Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07-07-2010 ( Proc. nº  31/04.1TBTMC.S1.), e in www.dgsi.pt.
(7)Vide v.g. João Cura Mariano, in Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, 3.ª ed., Almedina, pág. 147
(8)Vide, de entre muitos outros, os  Acórdãos do Tribunal da  Relação do Porto de 28/03/2011 ( Proc. 444/08.0TBLSD.P1) e de 26/06/2012 (  Proc.nº 329/09.2TBESP.P1) e de 24/02/2014, todos eles disponíveis em www.dgsi.pt.
(9)In Contrato de Empreitada , 1994, Almedina, pág. 205 e segs. .