Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | TERESA PARDAL | ||
Descritores: | CONTRATO DE EMPREITADA EXECUÇÃO E ÓNUS DE PROVA ELIMINAÇÃO DE EFEITOS | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 06/21/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | Celebrado um contrato de empreitada, em que a autora se obrigou a fazer uma impermeabilização no terraço da ré, mediante um preço que esta pagou e provando-se que a impermeabilização não funcionou, não demonstrando a autora que esse resultado não é imputável à sua execução, não é a ré responsável pelo pagamento das despesas resultantes da segunda impermeabilização, a qual era da responsabilidade da autora, face ao direito de a ré exigir a eliminação dos defeitos da obra. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO. J…, Lda apresentou contra A… requerimento de injunção que, face à oposição da requerida, foi distribuído como acção declarativa com processo especial de cumprimento de obrigações pecuniárias, reclamando a autora o pagamento da quantia de 15 055,04 euros, sendo 15 007,35 euros de capital e o restante de juros, titulada por uma factura, com vencimento imediato e referente a trabalhos efectuados na sede da requerida, que esta não pagou. Na sua oposição, a requerida alegou, em síntese, que os trabalhos em causa, a impermeabilização de um terraço, foram efectuados pelo preço de 21 539,57 euros, o qual foi pago, mas, verificando-se que a impermeabilização estava mal executada, mantendo-se as infiltrações no piso inferior, a requerente assumiu a responsabilidade e admitiu que a obra estava no prazo de garantia, prontificando-se a proceder à respectiva reparação e, não tendo conseguido dar soluções adequadas à impermeabilização, subempreitou noutra empresa, que concluiu a obra com o efeito pretendido, sendo este custo, a que se refere a factura ora reclamada, da responsabilidade da requerente. Concluiu pedindo a improcedência da acção e a absolvição do pedido. Na sequência de um convite do tribunal, a autora apresentou resposta à oposição, alegando que é certo que lhe foi paga a quantia de 21 539,57 euros, mas não é imputável à requerente o facto de os trabalhos não terem tido o efeito pretendido, pois resultaram do pretendido pela ré no caderno de encargos, sendo apenas esses que estavam abrangidos pela garantia, mas a nova impermeabilização incluía novos trabalhos não constantes do caderno de encargos nem abrangidos pela garantia, não constituindo uma mera reparação, pelo que a obra objecto da factura reclamada não se encontra liquidada. Concluiu pedindo a improcedência da excepção arguida pela ré e a procedência da acção. Procedeu-se a julgamento, findo o qual foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a ré do pedido. * Inconformada, a autora interpôs recurso e alegou, formulando conclusões com as seguintes questões: - A recorrida adjudicou à recorrente, em 2012, obra para regularizar “placa superior/terraço e impermeabilização”, cujo valor se fixou em 21 539,57 euros no respectivo orçamento. - Os trabalhos descritos nesse orçamento foram realizados pela recorrente em 2013, com a aplicação dos materiais descritos no mesmo orçamento, que mereceu o acordo das partes. - A recorrente prontificou-se a proceder à “reparação” do terraço, conforme os documentos juntos aos autos, fazendo expressa referência aos trabalhos que se dispunha a realizar, de acordo com a garantia. - A recorrida não aceitou a solução de reparação apresentada pela recorrente e impôs-lhe uma obra nova, totalmente diferente da proposta pelo empreiteiro, junta aos autos a fls 33 e 34. - A nova impermeabilização incluía novos trabalhos não constantes do caderno de encargos nem abrangidos pela garantia, não consubstanciando uma mera reparação, mas sim uma obra diferente, que foi realizada pela autora e teve o valor de 28 282,44 euros, superior ao da primeira empreitada, o que a autora comunicou à ré em 12 de Março de 2014 conforme documento de fls 39 e 40. - Parte dos trabalhos descritos na factura de fls 31 respeita à nova impermeabilização e a outra parte não se relaciona com a nova impermeabilização, sendo sim trabalhos a mais, realizados a pedido da recorrida e que foram executados pela recorrente, nomeadamente a substituição das manilhas, no valor de 1 055,00 euros. - O artigo 1208º do CC estabelece que o empreiteiro deve realizar a obra nos termos acordados e sem vícios que excluam o seu valor ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato, o que se verificou no caso em apreço, não tendo resultado da prova, nem constando na sentença recorrida, que a obra tivesse defeitos. - A primeira impermeabilização foi efectuada com a técnica descrita no orçamento acordado pelas partes e a recorrida não logrou provar que as alegadas infiltrações tivessem sido de má execução da obra pela recorrente. - Apesar de a nova impermeabilização exigida pela recorrida ter o valor de 28 282,44 euros, a recorrente só facturou 12 021,00 euros, porquanto considerou que os restantes trabalhos, correspondentes à diferença, se encontravam abrangidos pela garantia. - O Tribunal recorrido não articulou devidamente a prova documental e testemunhal, não tendo, consequentemente, feito correcta aplicação das normas reguladoras da questão em apreço, nomeadamente o artigo 1218º e seguintes e especificamente o nº2 do artigo 1221º, todos do CC, devendo ser revogada a sentença recorrida e ser substituída por decisão que julgue procedente o pedido, condenando a recorrida no pagamento da factura de fls 31. * A requerida contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso e este foi admitido como apelação com subida imediata, nos autos e efeito devolutivo. A única questão a decidir é a de saber se a ré está obrigada a pagar à autora a quantia peticionada. * FACTOS. A sentença recorrida fixou os seguintes factos provados e não provados: Provados. 1 – A A. é uma empresa que se dedica a todo o tipo de trabalhos de construção civil. 2 – A R. é uma instituição pública, voltada para a investigação científica. 3 – Entre a A. e a R. foi celebrado um contrato para realização pela A. de uma obra de impermeabilização do terraço da R., cujo valor foi fixado em € 21.539,57, de acordo com o orçamento n.º 44/2012 da A.. 4 – Em 27/12/2012, a R. pagou à A. o valor total de € 21.539,57. 5 – A obra foi iniciada em Julho/Agosto de 2013. 6 – Após a finalização da obra em período seco, com o início da estação das chuvas, verificou-se que o terraço não estava impermeabilizado, uma vez que continuava a haver infiltrações no piso inferior (piso 0 da sede da R.). 7 – A A. prontificou-se a proceder à reparação do terraço, o que passaria por efectuar nova impermeabilização. 8 – A A. enviou à R. uma carta datada de 15/02/2014, da qual consta, designadamente, o seguinte: “(…) Assunto terraço do nº 191º 1º Ponto Estou por este meio a comunicar de que o isolamento no mesmo terraço não teve o efeito esperado 2º Ponto Pois faz parte da garantia a reparação e execução para que deixe de ter qualquer tipo de infiltração 3º Ponto Pois de acordo com o email do dia 06/02/2014 tem uma memória descritiva da forma como se vai proceder ao respectivo isolamento de acordo com o técnico 4º Ponto no 12º ponto diz que é da minha inteira responsabilidade 5º Ponto Pois de acordo com a garantia desde o primeiro dia que foi detectado a infiltração que eu assumi a responsabilidade e tomei as respectivas medidas para que fosse atenuado o problema da infiltração estando eu o dia a dia em cima do acontecimento 6º Ponto Quero aqui expressar de que assumi e assumo toda a responsabilidade desse trabalho e de acordo com a garantia (...)”. 9 – Por impossibilidade da A. em dar soluções ajustadas à impermeabilização do terraço da R., a A. subempreitou à empresa C…, Lda., a obra de impermeabilização do terraço. 10 – Tendo a empresa C… concluído a obra com o efeito pretendido. 11 – A obra realizada pela empresa C… teve início em Abril de 2014 e foi concluída no final de Maio de 2014, tendo sido efectuados trabalhos e aplicados materiais diversos dos da obra realizada em 2013. 12 – Em 30-06-2015, a A. emitiu a factura n.º 1521, para pagamento a pronto, no valor de € 15.007,35. 13 – Todos os trabalhos elencados nos pontos 1º a 7º da factura n.º 1521 foram realizados. 14 – A R. não procedeu ao seu pagamento da factura referida em 12. até à data. Não provados. a) A obra foi iniciada em Abril/Maio de 2013. b) Os trabalhos de impermeabilização do terraço em referência não tiveram o efeito pretendido, porquanto, resultaram do pretendido pela R.. e constante do caderno de encargos, mormente, não resultaram em virtude da existência de uma floreira no terraço e de uma manilha estragada que a R. não permitiu que fossem intervencionadas da 1ª vez. * ENQUADRAMENTO JURÍDICO. Apesar de fazer referências à prova documental e testemunhal, a apelante não impugnou a decisão da matéria de facto, não cumprindo nenhum dos requisitos previstos no artigo 640º do CPC. Deste modo, haverá que atender apenas aos factos julgados provados e não provados e, dos mesmos, resulta que as partes celebraram um contrato de empreitada previsto nos artigos 1207º e seguintes do CC, por força do qual a autora se comprometeu a proceder a uma impermeabilização de um terraço da ré e esta se comprometeu a pagar-lhe o respectivo preço, de 21 539,57 euros. Pago o referido preço pela ré, foram executados os trabalhos durante o Verão de 2013, mas, com o início da estação das chuvas, verificaram-se infiltrações no piso inferior ao terraço, não se encontrando este impermeabilizado. Sendo assim e ao contrário do alegado pela autora, a ré logrou satisfazer o ónus da prova que lhe competia, provando a existência de defeitos na obra, ou seja, demonstrando que a obra era inapta para o fim a que se destinava, por a autora não ter cumprido o disposto no artigo 1208º do CC. Provado o incumprimento, ou cumprimento defeituoso por parte da autora, cabia-lhe o ónus de provar que o mesmo não lhe era imputável, nos termos do artigo 799º do CC. Ora a autora não logrou fazer tal prova pois, pelo contrário, resulta dos factos que assumiu a responsabilidade dos defeitos da obra perante a ré (ponto 8 dos factos) e, por outro lado, foi considerado não provado que a primeira impermeabilização não teve o efeito pretendido por facto imputável à ré e, nomeadamente pela necessidade de fazer uma intervenção numa floreira e numa manilha (alínea b) dos factos não provados). Conclui-se, portanto, que os trabalhos da segunda impermeabilização eram da responsabilidade da autora, de acordo artigo 1221º nº1 do CC, por força do qual a ré tinha o direito de exigir a eliminação dos defeitos da obra. Nem se diga que haveria que aplicar o nº2 deste artigo 1221º, por as despesas da eliminação dos defeitos serem desproporcionadas, já que não está demonstrado o montante das despesas da autora, apenas se tendo provado que foi feita uma subempreitada com outra empresa, porque a autora não conseguiu dar solução à impermeabilização do terraço (pontos 9 e 10 dos factos) e que a autora facturou depois a quantia de 15 007,35 euros que vem reclamar à ré, ignorando-se se foi ou não esse o preço da subempreitada e sendo certo que tal factura, que está a fls 31, é ilegível para além do valor que consta no total. Também o facto provado no ponto 11, de que a obra realizada pela subempreiteira incluiu trabalhos e materiais diversos da primeira impermeabilização não demonstra que a obra fosse diferente, já tal facto poderá apenas significar que os trabalhos e materiais diferentes foram necessários para obter o resultado pretendido e que a autora se havia obrigado a obter, mas sem sucesso. Improcedem, pois, as alegações de recurso, não sendo a ré responsável pelo pagamento da quantia reclamada. * DECISÃO. Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação e confirma-se a sentença recorrida. * Custas pela apelante. 2018-06-21 Maria Teresa Pardal Carlos Marinho Anabela Calafate |