Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2060/15.0T8LRS.L1-2
Relator: SOUSA PINTO
Descritores: SUB-ROGAÇÃO DE CRÉDITOS
PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/26/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: Sumário a que alude o art.º 663.º, n.º 7, do CPC:

I–Da análise das cláusulas contratuais que enformavam o contrato e da vontade apurada dos contraentes pôde-se concluir que o instituto jurídico que esteve subjacente ao acordado entre as partes foi uma sub-rogação voluntária de créditos.

II–Por via igualmente da análise das cláusulas de tal contrato e do mais provado e não provado concluiu-se que a sub-rogação em causa apenas abrangia o crédito exequendo cujo pagamento o A. assumiu perante o respectivo credor.

III–A sub-rogação pressupõe a satisfação do crédito, sendo que esta “representa a condição e a medida dos direitos do terceiro sub-rogado” sendo que nos termos do art. 593º, n.º 1 do Código Civil, o sub-rogado adquire, na medida da satisfação dada ao direito do credor, os poderes que a este competiam.

IV–O prazo de prescrição apenas começa a correr na data do cumprimento - pagamento – pelo terceiro, pois que pressupondo a sub-rogação o pagamento, antes deste não se poderá falar dela.

V–Resultando apurado que o contrato que está na origem da sub-rogação se encontra elaborado em face da execução instaurada, dos títulos executivos que lhe subjazem, do crédito exequendo e do que naquela ocorreu, o prazo prescricional aplicável à situação em concreto é o mesmo que era aplicável à sub-rogante, ou seja, três anos, atento o disposto nos artgs. 77º, 32º, 1.º parágrafo, 78º, 1.º parágrafo e 70º, 1.º parágrafo, todos da LULL.

VI–Tendo-se verificado a deserção da instância no processo de execução, nos termos do disposto no 327.º, n.º 2 do CPC, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo, pelo que após a data da deserção da instância (Setembro de 2001), teria o A. o prazo de três anos para exercer o direito que lhe fora sub-rogado, o que não fez, levando assim a que se considere o seu direito prescrito.


Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Os juízes desembargadores, que integram o presente colectivo do Tribunal da Relação de Lisboa, acordam.


I–RELATÓRIO 


“A.”, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra:
- “B., Lda.”;
- “C.”;
- “D.”;
- “E.”;
- “F.”,
Tendo peticionado:
a)-devem todos os R.R. serem condenados a, solidariamente, pagarem ao A. a quantia total de € 84.199,08, sendo € 70.165,90 a título de capital em dívida e € 14.033,18 a título de juros de mora, à taxa civil, vencidos nos últimos cinco anos, bem como os juros vincendos, à mesma taxa, até integral e efectivo pagamento;
b)-deve a 1ª Ré ser condenada a pagar ao A. a quantia total de € 39.354,14, sendo € 32.795,12 a título de capital em dívida e € 6.559,02 a título de juros de mora, à taxa civil, vencidos nos últimos cinco anos, bem como os juros vincendos, à mesma taxa, até integral e efectivo pagamento;
c)-devem ser todos os Réus condenados no pagamento das custas e demais encargos legais.
Para tanto, alegou, em síntese, que os ora A., a 2ª, a 3ª, o 4º e a 5ª Réus são os únicos herdeiros de “G.”, falecido em 5 de Dezembro de 2010.
Por óbito do referido “G.”, procederam os referidos herdeiros à correspondente partilha do acervo hereditário daquele, através de inventário judicial que, sob o nº ---/11.0TBPNI, correu seus termos pelo Tribunal da Comarca de Leiria – Peniche – Inst. Local – Sec. Compet. Genérica – J1, partilha essa homologada por sentença já transitada em julgado.

A 10 de Outubro de 2000, o ora A. celebrou com a 1ª Ré e com a 2ª Ré e o seu falecido marido e, ainda, com a “H., S.A.”, o “Contrato de Transacção”, através do qual, o ora A. acordou com os demais contraentes proceder à regularização das dívidas da 1ª Ré – “B., Ldª” - à “H., S.A.”, dívidas essas pelas quais era responsável não só a 1ª Ré, como devedora, como também a 2ª Ré e o seu falecido marido, “G.”, como avalistas, uma vez que se encontrava pendente uma execução instaurada pela referida “K., S.A.” contra a 1ª Ré, a 2ª Ré e seu falecido marido, cuja quantia exequenda era de 28.134.993$00 (o equivalente a € 140.336,75), bem como os juros que se vencessem até ao pagamento da mesma, execução essa que, sob o nº ---4, se encontrava pendente no, então, 16º Juízo Cível de Lisboa e na qual já haviam sido nomeados bens à penhora.

O ora A. e os demais contraentes acordaram, então, que aquele pagaria à Geofinança a quantia total de 14.067.000$00 (o equivalente a € 70.165,90), ficando, também, convencionado no referido contrato, com o acordo expresso da 1ª Ré e da 2ª Ré e seu marido, que o A., a quem foi cedido o crédito em questão, ficaria sub-rogado nos direitos da referida credora - a “H., S.A.” - tudo cfr. resulta da cláusula 8ª do contrato em apreço. A quantia acordada seria, como foi, paga pelo ora A. em nove prestações, a primeira das quais, no montante de Esc. 10.000.000$00 (o equivalente a € 49.879,79), com a assinatura do referido contrato e as restantes oito prestações, no montante de Esc. 508.375$00 (o equivalente a € 2.535,76) cada, a partir de Novembro de 2000, inclusive, e nos meses subsequentes, no dia 1 de cada mês. Não obstante o acordado, e apesar das várias interpelações para o efeito, nem a 1ª Ré, nem a 2ª Ré e o seu falecido marido pagaram a quantia devida ao A. em virtude do referido contrato. Os ora Réus são parte legítima na presente acção, sendo a primeira e a segunda Rés por si próprias, e sendo, ainda, a 2ª Ré, bem como os 3ª, 4º e 5ª Réus como herdeiros do falecido “G.” e, como tal, responsáveis pelo pagamento das suas dívidas.

Para prova do alegado o Autora arrolou testemunhas e juntou documentos.

Citados, regularmente, vieram os Réus “B., Lda.”, “D.” e “C.”, apresentar contestação, nos termos da qual invocaram a prescrição do direito de crédito invocado pelo Autor e das obrigações relativas aos alegados pagamentos efectuados pelo A. em nome da R. “B., Lda.”; a exceção dilatória de ilegitimidade, atenta a inexistência de uma sub-rogação de créditos ao A..

Mais alegaram que, em 10 de Outubro de 2000, a R. “B., Lda.”, chegou a acordo com a sociedade “H., S.A.” relativamente ao pagamento da quantia em dívida. Acordo esse no qual interveio o A., apenas e só, para levar a crer à sociedade “H., S.A.” que nenhum dos restantes executados era titular de quaisquer bens ou rendimentos penhoráveis, forçando com isso um acordo benéfico para todas as partes. Como é do conhecimento do A., com a celebração da transacção em causa, nem este, nem os RR. “B., Lda.” e “C.”, nem o já falecido pai do A. – “G.” – pretenderam promover, efectivamente, qualquer promessa de sub-rogação de créditos ou mesmo qualquer sub-rogação de créditos a favor do A..
Tais quantias, constantes do contrato de transação, foram, integralmente, pagas pela R. “B., Lda.”.

Desde o início do ano de 2007, quer a R. “C.”, quer o falecido “G.” – gerentes da R. “B., Lda.” – cortaram relações com o A, não mais tendo estes contactado, entre si, pelo que nunca poderiam estes, em representação da R. “B., Lda.” ter solicitado ao A. que promovesse o pagamento das quantias referidas no artigo 12.º da douta petição inicial. Por sua vez, refira-se que as obrigações dos herdeiros da herança partilhada perante os credores não são solidárias, razão pela qual não é permitido ao credor exigir a cada herdeiro mais do que a proporção da sua quota na herança.

Deduziram, ainda, os Réus pedido reconvencional, peticionando a condenação do Autor a pagar à R. “B., Lda.” a quantia de € 14.105,84, acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos nos últimos cinco anos, no valor de € 3.385,40, e juros vincendos até ao seu integral e efectivo pagamento, bem como deverá o A. ser condenado a pagar à R. “B., Lda.”, as quantias acima referidas, a liquidar em execução de sentença.

Para tanto, alegaram, em síntese, que o A. alienou, por preço e condições que, actualmente, não se pode concretizar, bens móveis dessa sociedade, constituídos por camiões e galeras, sendo que tais quantias, que deveriam ter sido pagas à sociedade R., foram recebidas pelo A., o qual as fez suas e integrou-as no seu património.

De igual forma, o A. recebeu de diversos clientes da R. “B., Lda.” diversas quantias, ainda não apuradas, que eram devidas a esta sociedade, por conta da utilização de um imóvel do qual esta sociedade é dona e legítima proprietária, sito no Bairro da Fraternidade, Rua (…), descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Loures sob o n.º ----8, da freguesia de São João da Talha, concelho de Loures, inscrito, sob o artigo matricial ---5, Imóvel este que é composto por um prédio urbano para armazém amplo, com a superfície coberta de 2.--- metros quadrados e logradouro, com parque de contentores, com a área de 3.--- metros quadrados.

De igual forma, o A. recebeu, no dia 15 de Setembro de 2006, da sociedade “K., SA”, e fez sua, a quantia de € 14.105,84, paga através do cheque n.º --------7, sacado sobre o Banco “W.”, a qual era relativa a montantes que eram devidos por esta entidade à sociedade “B., Lda.”.

Para prova do alegado, os Réus juntaram prova documental.

O Autor deduziu réplica e respondeu às excepções.

Foi proferido despacho saneador, no âmbito do qual foram julgadas improcedentes as exceções, quer de ilegitimidade, quer de prescrição, e admitido o pedido reconvencional, fixado o objecto do litígio e elencado os temas de prova.

Interposto recurso pelos Réus contestantes da decisão de improcedência da excepção de prescrição invocada, foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa que deu procedência ao mesmo, remetendo para final a apreciação da excepção de prescrição.

A Ré “C.” faleceu no dia 4 de Dezembro de 2018, na pendência dos presentes autos tenho os Réus filhos sido habilitados.

Procedeu-se à realização da Audiência de Discussão e Julgamento com observância do legal formalismo.

Foi proferida sentença onde, a final, se decidiu:
«Nos termos e pelos fundamentos expostos, julgo a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente, condeno a Ré “B. Lda.”, a pagar ao Autor a quantia global de € 102.961,01 (cento e dois mil novecentos e sessenta e um euros e um cêntimo), acrescida de juros de mora, à taxa legal em vigor, até integral pagamento.
No mais, absolvo os Réus do pedido.
*
Mais julgo improcedente o pedido reconvencional deduzido pelas Ré Reconvintes, absolvendo o Autor Reconvindo do mesmo.»

Por despacho de 30-06-2021, foi rectificada a decisão final da sentença, nos seguintes termos:
«Por lapso de escrita, não foi contemplado no decisório da sentença proferida, designadamente no segmento de condenação de juros, o início de contagem dos mesmos, ao contrário do referido no corpo da sentença (fls. 24).
Pelo exposto, procede-se à rectificação de tal lapso, passando a constar do decisório “(…) acrescida de juros de mora, à taxa legal em vigor, contados desde a citação, até integral pagamento”.
Notifique e rectifique em local próprio.»

Inconformada com tal decisão veio a Ré, “B., Lda.”, recorrer da mesma, tendo apresentado as suas alegações, nas quais verteu as seguintes conclusões:
«1.No ponto 4 dos factos provados, onde consta “29 de Março”, deveria constar 23 de Março – cfr. fls. 150.
Pelo exposto, requer-se a V. Exas. que seja ordenada a rectificação do mencionado lapso de escrita e, atendendo ao teor da escritura pública de fls. 149 a 154, maxime, fls. 150, no ponto 4 dos factos provados, onde consta “29 de Março”, passe a constar: 23 de Março.
Impondo, portanto, decisão diversa da recorrida o documento de fls. 149 a 154, maxime, fls. 150.
2.Cremos que nos pontos 8 e 9 dos factos considerados como provados, onde consta a expressão “em 5”, ocorreu um lapso de escrita, pretendendo o Tribunal recorrido fazer referência ao ponto 7 dos factos provados, lapso de escrita esse que deverá ser corrigido, independentemente de essa matéria dever ser considerada como não provada, como defendemos.
3.Por sua vez, nos pontos 11 e 13 dos factos considerados como provados, onde consta a expressão “acordo referido em 3”, ocorreu certamente um lapso de escrita, pretendendo o Tribunal recorrido fazer referência ao acordo referido no ponto 7 dos factos provados, lapso de escrita esse que deverá ser corrigido, independentemente de essa matéria também dever ser considerada como não provada.
4.Relativamente aos pontos 8 a 11 da matéria de facto considerada como provada, atendendo aos elementos de prova mencionados na fundamentação da decisão recorrida, conclui-se que tal matéria não deveria ter sido julgada como provada.
Com efeito, a “petição inicial”, mencionada pelo Tribunal recorrido, não poderá jamais ser considerada um meio de prova, como é óbvio, pois a mesma não constitui prova documental, sendo um articulado do qual consta, pura e simplesmente, a matéria alegada pelo recorrido.
Por sua vez, os documentos mencionados pelo Tribunal recorrido, a fls. 749 verso, não têm a virtualidade de provar a realização dos pagamentos em causa pelo recorrido e, muito menos nas datas mencionadas na decisão recorrida, tendo os documentos de fls. 21 a 53 - os únicos referidos na decisão recorrida com eventual relevância para esta matéria – sido impugnados pela recorrente, no artigo 58 da sua contestação – cfr. fls. 88.
Acresce que nos depoimentos de parte do 4.º e da 5.ª RR. falou-se apenas vagamente que foi o recorrido que procedeu a alguns pagamentos respeitantes a dívidas da recorrente, mas sem ser concretizado sequer quais os alegados montantes pagos e a data de realização dos mesmos, nem o respetivo meio de pagamento utilizado.
A 5.ª R. demonstrou no seu depoimento de parte que nada sabia em concreto sobre os alegados pagamentos realizados pelo recorrido referentes a dívidas da recorrente e não se recordava de nenhuma reunião familiar - referida pelo recorrido e pelo 4.ª R. - onde o seu pai tivesse pedido ao recorrido para alegadamente pagar os montantes em causa, não sabia quais os montantes, a que respeitavam os mesmos, nem os meios de pagamento utilizados.
Percebendo-se claramente que a 5.ª R. não assistiu à realização de qualquer pagamento realizado pelo recorrido, não tendo demonstrado a razão de ciência quanto aos factos (vagos) que alegou, nem se percebendo quando e em que circunstâncias alegadamente tomou conhecimento do pedido do seu pai ao seu irmão (recorrido) para pagar as dívidas em causa e como soube que foram realizados alguns pagamentos.
Ainda assim, a 5.ª R. deixou claro que o seu terá realizado o pagamento de algumas das prestações referentes ao contrato de transação de fls. 17 a 20.
Assim sendo, jamais se poderá considerar como provados os factos que constam nos pontos 8 a 11 dos factos provados através dos meios de prova invocados na decisão recorrida.
Pelo exposto, deverá ser alterada a matéria de facto, julgando-se não provada a matéria constante dos pontos 8 a 11 dos factos considerados como provados na decisão recorrida.
Impondo decisão diversa da recorrida a ausência de prova nos autos que demonstre tal matéria, bem como o teor contraditório dos depoimentos de parte prestados pelo recorrido e pelos 4.ª e 5.ª RR., principalmente o depoimento prestado pela 5.ª R., desde os 01 minutos e 25 segundos até aos 05 minutos e 26 segundos, desde os 09 minutos e 39 segundos até ao 10 minutos e 10 segundos e desde os 10 minutos e 41 segundos até aos 11 minutos e 41 segundos, maxime, desde os 01 minutos e 25 segundos até aos 05 minutos e 26 segundos, no qual refere expressamente que o seu pai pagou algumas prestações referentes ao contrato de transação de fls. 17 a 20.
5.Deverá ser eliminado da matéria de facto constante do ponto 16 dos factos provados o seguinte segmento: “que o seu pai entendeu entregar-lhe para acerto de contas”, uma vez que tal factualidade não foi provada.
Impondo decisão diversa da recorrida os documentos de fls. 20, 56, 217 e 218 e o teor do depoimento de parte do recorrido, gravado no dia 27.05.2020, desde os 23 minutos e 42 segundos até aos 25 minutos e 35 segundos, não tendo qualquer testemunha ou os 4.º e 5.ª RR. falado sequer nessa matéria.
Não existindo nos autos qualquer prova, nomeadamente, documental que demonstre que o recorrido recebeu o montante em causa para “acerto de contas” e que pagou qualquer montante devido pela recorrente, em momento anterior, de modo a poder justificar tal “acerto”.
6.Atendendo à impugnação da matéria de facto acima efetuada, consideramos que jamais deverá considerar-se que ocorreu a transmissão do crédito detido pela “H., S. A.” para o recorrido.
Motivo pelo qual deverá ser julgada improcedente a acção e absolvida a recorrente nesse pedido.
Mas, ainda que assim não se considerasse, o que por mera cautela de patrocínio se equaciona, ainda assim teria prescrito o referido crédito que o recorrido alegou ter adquirido da sociedade “H., S. A.”.
Recordamos que sobre tal matéria, nos presentes autos, já antes a 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa se pronunciou, no douto Acórdão proferido no dia 21.01.2020 (apenso B).
Tendo o Tribunal “a quo” feito tábua rasa do já decidido nesse Acórdão, transitado em julgado, sobre a questão da natureza do crédito e do respectivo prazo de prescrição a aplicar.
No referido Acórdão, concluiu o Tribunal da Relação de Lisboa que, atendendo à pretensão deduzida pelo recorrido, caso se considerasse como provada a sua versão dos factos - como julgou provada o Tribunal a quo - estar-se-ia perante uma transmissão de crédito por sub-rogação voluntária, tal como se julgou na decisão recorrida.
Mais, no referido Acórdão considerou-se – e bem – que o crédito em relação ao qual ocorreria, nesse caso, a sub-rogação seria o “crédito exequendo” e, como tal, o prazo de prescrição a aplicar seria de “três anos, não podendo lançar-se mão do prazo ordinário de vinte anos face à manutenção do crédito transmitido com as suas garantias, acessórios e características.” – cfr. artigos 70. º e 77.º da LULL.
Todavia, na decisão recorrida, julgou-se que o crédito transmitido ao recorrido não foi o crédito exequendo, mas sim o que deriva do contrato de mútuo celebrado entre a sociedade “H., S. A.” e a recorrente e, consequentemente, julgou-se que deveria aplicar-se o prazo ordinário de 20 anos e, por esse motivo, considerou improcedente a excepção de prescrição invocada pela recorrente na sua contestação de fls. 75 a 102.
Porém, a decisão recorrida não teve em conta sequer o teor do contrato de fls. 17 a 20 nem os factos que constam dos pontos 6 e 7 da matéria de facto julgada provada.
Pois, o crédito que a sociedade “H., S.A.” concordou em sub-rogar ao recorrido foi o “crédito exequendo”, cedendo-lhe “esse seu crédito”, após o recebimento da quantia em causa do recorrido.
Assim, o crédito que o recorrido pretende fazer valer na acção que propôs contra a recorrente, a que se refere o contrato de transação, só pode ser o referido crédito exequendo e não qualquer outro.
Assim sendo, podemos concluir que, tendo a sociedade “H., S. A.” proposto a acção executiva acima referida no dia 31 de Maio de 1991, no dia 5 de Junho de 1991 interrompeu-se o prazo de prescrição relativamente aos direitos e obrigações, alegadamente, cedidos ao recorrido.
Acontece que, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 327.º do Código Civil, sempre que, porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada deserta, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo.
Ora, ocorreu a deserção da instância do Processo n.º ---4, que correu os seus termos na 3.ª Secção do 16.º Juízo Cível de Lisboa, pelo menos durante o ano de 2003, já que nem a sociedade “H., S. A.”, nem o recorrido promoveram qualquer diligência no processo em causa, desde o final do ano de 2000 - tudo conforme certidão judicial junta aos autos no dia 07.02.2018 - tal como as recorrentes já alegaram em sede de contestação, facto este não impugnado pelo recorrido na sua peça processual do dia 06.02.2017, na qual respondeu às excepções deduzidas na contestação.
Devido a essa deserção, resulta evidente que o prazo de prescrição do direito de crédito, alegadamente, cedido ao recorrido teve o seu início no dia 5 de Junho de 1991.
Prazo este que decorreu sem qualquer interrupção até à presente data e, aliás, nem sequer havia possibilidade de existir nova interrupção, desde a data de (re)início do prazo de prescrição – 5 de Junho de 1991.
De facto, como doutamente tem sido decidido pela nossa douta jurisprudência e como é ensinado pela mais avisada doutrina, o prazo de prescrição apenas se interrompe uma única vez, já que permitir sucessivas interrupções da prescrição seria atentar contra todas as razões que constituem o fundamento daquele instituto jurídico.
Salvo melhor opinião, tendo em conta que o crédito exequendo alegadamente cedido ao A./recorrido resulta de dois títulos de crédito – isto é, de duas livranças – será aplicável a esse crédito o regime previsto no artigo 70.º, “ex vi” do artigo 77.º da Lei Uniforme relativa às Letras e Livranças (LULL), que estabelece um prazo de prescrição de 3 anos para os referidos títulos de crédito.
Prazo este que decorreu, sem qualquer interrupção ou suspensão, desde o dia 5 de Junho de 1991 até à presente data.
Sendo certo que a presente acção só foi proposta no dia 10 de Fevereiro de 2015 – cfr. ponto 1 dos factos provados.
Isto é, na data em que foi proposta a presente acção, já o prazo de prescrição do direito de crédito titulado pelas livranças estava terminado, há mais de 20 anos!!! Já que o alegado direito de crédito do recorrido prescreveu no dia 6 de Junho de 1994.
Mas não é só, já que, inclusivamente, qualquer obrigação subjacente às aludidas livranças estaria prescrita, uma vez que, na data em que foi proposta a presente acção, já tinha decorrido o prazo geral de prescrição de 20 anos, previsto no artigo 309.º do Código Civil, prazo este que findou no dia 6 de Junho de 2011.
Mas, mesmo que assim não se considerasse, o que apenas por cautela de patrocínio se analisa, ainda assim teria prescrito o alegado crédito do recorrido perante as RR., aqui, recorrentes.
Pois, mesmo que tal sub-rogação do direito de crédito tivesse ocorrido – o que não se concede - e a data da realização do último pagamento fosse o dia 12.06.2001, ainda assim, teria prescrito o direito do recorrido.
Mas, mesmo que se considerasse que o prazo de prescrição apenas se deveria começar a contar da alegada data da suposta realização do último pagamento pelo recorrido, já teria ocorrido a prescrição do seu direito.
Pois, o prazo de prescrição aplicável nessa situação seria de 3 anos e não de 20 anos, como defendido na decisão recorrida.
Porque, mesmo que se considerasse que não seria aplicável a norma do artigo 70.º da LULL, por remissão do artigo 77.º desse diploma legal, ainda assim o prazo de prescrição aplicável seria de 3 anos, por – alegadamente – estarmos perante uma situação de sub-rogação.
Com efeito, considerando estarmos perante uma sub-rogação, a norma jurídica aplicável ao caso seria a do artigo 498.º, n.º 2 do Código Civil, por analogia e não o artigo 309.º do mesmo diploma.
Como tal, mesmo iniciando a contagem do prazo de prescrição no dia 12.06.2001, como se defende na decisão recorrida, constata-se que, seguramente, no dia 13.06.2004 já havia decorrido o prazo de prescrição do direito que o recorrido pretende fazer valer.
Como tal, quando a presente acção foi proposta – no dia 10.02.2015 (cfr. ponto 1 dos factos provados) – há muito que havia decorrido o referido prazo de prescrição.
Importa ainda referir que, mesmo que se julgasse como provada a matéria que consta do ponto 11 dos factos provados, o que não se admite, ainda assim a presente acção proposta contra a recorrente, quanto ao pedido que consta na alínea a) do petitório da petição inicial, configuraria uma situação de abuso de direito – cfr. artigo 334.º do Código Civil.
Porquanto, de acordo com o que - alegadamente - foi acordado entre o recorrido e os seus pais, os montantes que fossem pagos pelo recorrido não seriam pagos a este pela 1.ª R., mas sim pelos seus pais, “quando pudessem” – cfr. artigo 778.º, n.º 1 do Código Civil.
Ainda assim, o recorrido decidiu propor a presente acção contra a recorrente, passados mais de 14 anos desde a data da alegada realização do último pagamento.
Como tal, também por esse motivo, deverá improceder a presente ação.
Ao decidir de modo contrário, a douta decisão recorrida violou o disposto nos artigos 308.º, 334.º e 498.º, n.º 2 do Código Civil e nos artigos 70.º e 77.º da LULL.
Assim sendo, deverá ser revogada a douta decisão recorrida, sendo julgada procedente, por provada, a exceção de prescrição relativamente ao pedido deduzido sob a alínea a) na petição inicial, sendo a recorrente absolvida desse pedido.
7.Quanto à matéria de facto constante do ponto 10 dos factos provados, o Tribunal recorrido considerou que, quanto a estes alegados créditos, ocorreu uma situação de sub-rogação legal, atendendo a um interesse directo do recorrido.
Todavia, cremos que, quanto a esta matéria, o Tribunal a quo lavrou em erro, por vários motivos.
Contraditoriamente, o Tribunal recorrido refere, primeiro, que o recorrido deixou de ser sócio da recorrente no dia 29 de Março de 1999, mas, a seguir, conclui que quando o recorrido realizou os pagamentos em causa, nos anos de 2007 e 2008, tinha a qualidade de sócio da recorrente (!) Por esse motivo, a sentença recorrida é nula, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC.
Ora, tal como resulta provado do teor da escritura pública de fls. 149 a 1252, maxime a fls. 150, o recorrido deixou de ser sócio da recorrida no dia 23 de Março de 1999.
Pelo que, não corresponde à verdade que quando alegadamente o recorrido realizou os pagamentos em causa - entre o dia 23.07.2007 e o dia 13.06.2008 - tivesse a qualidade de sócio da recorrente.
Mas, refira-se que, mesmo que o recorrente tivesse a qualidade de sócio da recorrente quando alegadamente realizou os pagamentos, não teria um interesse patrimonial directo em satisfazer o pagamento das dívidas em causa.
Por outro lado, não teria o recorrido interesse directo em satisfazer essas dívidas pelo simples facto de ser herdeiro legitimário dos sócios e gerentes da recorrente, que eram os seus pais e à data da realização dos pagamentos ainda estavam vivos – cfr. pontos 2 e 3 dos factos provados.
Pois, quanto muito, poderia considerar-se que o recorrido teria uma expectativa jurídica de vir a herdar dos seus pais as quotas que os mesmos detinham naquela data na sociedade, quotas essas das quais poderiam não ser já titulares quando falecessem.
Com efeito, apenas se poderia considerar que o recorrido teria um interesse directo em satisfazer o pagamento das dívidas em causa se, caso tais dívidas não fossem pagas, pudesse responder directamente o seu património pelo seu pagamento, o que não é claramente o caso.
Sendo certo que o interesse relevante para que haja uma sub-rogação legal é um interesse patrimonial directo, o que não sucede no presente caso.
Até porque, importa realçar, o recorrido não alegou e provou qualquer interesse directo em satisfazer o pagamento das dívidas fiscais da recorrente.
Como tal, mesmo que se considerasse provado que o recorrido procedeu à realização dos pagamentos referidos no ponto 16 dos factos considerados como provados na decisão recorrida, tais pagamentos implicariam, pura e simplesmente, a extinção da obrigação da recorrente pelo pagamento e não qualquer sub-rogação de créditos.
E, mesmo que se considerasse que a situação em concreto poderia configurar um caso de enriquecimento sem causa, o que é certo é que tal não foi alegado e provado pelo recorrido.
Sendo certo que, mesmo o prazo de prescrição de 3 anos previsto para o enriquecimento sem causa já teria ocorrido – cfr. artigo 482.º do Código Civil – não obstante, recorda-se, o recorrido não ter alegado e provado factos subsumíveis ao instituto do enriquecimento sem causa.
Como tal, jamais deverá a recorrente ser condenada no pagamento ao recorrido de tais montantes.
Ao decidir de modo contrário, a douta decisão recorrida violou o disposto nos artigos 342.º, n.º 1 e 592.º, ambos do Código Civil.
Assim sendo, deverá ser revogada a douta decisão recorrida, sendo considerada totalmente improcedente, por não provada, a acção e, consequentemente, ser a recorrente totalmente absolvida dos pedidos.
8.Foi feita prova de que o recorrido “recebeu, no dia 15 de Setembro de 2006 da Sociedade “K., S.A.”, e fez sua, a quantia de € 14.105,84 (catorze mil cento e cinco euros e oitenta e quatro cêntimos), paga através do cheque n.º --------7, sacado sobre o “Banco W.”, a qual era relativa a montantes devidos à Sociedade “B., S.A..”.
Assim sendo, é o recorrido devedor à recorrente do referido montante de € 14.105,84.
Pelo exposto, deverá ser revogada a douta decisão recorrida, sendo julgado procedente, por provado, o pedido reconvencional deduzido pela recorrente e, consequentemente, deverá ser o recorrido condenado no pagamento à recorrente do montante de € 14.105,84, acrescido de juros de mora, contabilizados desde 15.09.2006 até integral pagamento.
Mais, caso V. Exas. considerem que a recorrente deverá ser condenada no pagamento ao recorrido de algum montante, o que apenas por cautela de patrocínio se equaciona, requer-se que seja realizada a respectiva compensação com o montante de € 14.105,84, já recebido pelo recorrido.
9.Por todo o exposto, deverá ser revogada a douta decisão recorrida, sendo julgada improcedente a acção, sendo a recorrente totalmente absolvida dos pedidos e sendo julgado procedente o pedido reconvencional e, consequentemente, ser o recorrido condenado a pagar à recorrente o montante de € 14.105,84 (catorze mil cento e cinco euros e oitenta e quatro cêntimos).
Nestes termos e nos demais de Direito, que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, sendo revogada a douta decisão recorrida e, consequentemente:
a)-ser julgada totalmente improcedente, por não provada, a acção, sendo a recorrente absolvida totalmente de todos os pedidos;
b)-ser julgado procedente, por provado, o pedido reconvencional, sendo o recorrido condenado a pagar à recorrente o montante de € 14.105,84 (catorze mil cento e cinco euros e oitenta e quatro cêntimos), acrescido de juros de mora, contabilizados desde 15.09.2006 até integral pagamento;
c)-caso V. Exas. considerem que a recorrente deverá ser condenada no pagamento ao recorrido de algum montante, o que apenas por cautela de patrocínio se equaciona, requer-se que seja realizada a respetiva compensação com o montante de € 14.105,84 já recebido pelo recorrido.»

O A. e reconvindo apresentou contra-alegações, nas quais exibiu as seguintes conclusões:
«I–A decisão recorrida não merece qualquer reparo já que a mesma resultou da análise e ponderação de toda a prova produzida, quer documental, quer através de depoimento de parte e, ainda que residual, testemunhal, tendo a Meritíssima Juíza a quo feito uma valoração criteriosa e prudente da mesma.
II–Os lapsos de escrita que se verificam nos pontos 4, 8 e 9 e 11 e 13 dos factos provados em nada beliscam ou desvirtuam a douta decisão ora recorrida, não merecendo, portanto, a mesma qualquer reparo.
III–Atenta a generalidade de toda a prova produzida, quer através de documentos, quer através dos depoimentos de parte, quer, ainda que residual, através das testemunhas, andou bem o douto Tribunal a quo ao considerar provados os pontos 8 a 11 da matéria de facto, devendo, consequentemente, tal matéria manter-se como provada.
IVOs documentos juntos pelo Autor/Recorrido, dada a sua genuinidade, mereceram total credibilidade por parte do Tribunal, pese embora terem sido impugnados pela Apelante, provando, à exaustão, que foi o Autor/Recorrido quem pagou os créditos cujo pagamento o mesmo reclama;
VOs depoimentos de parte do 4º e 5º Réus, que mostraram ter conhecimento directo sobre os respetivos factos, merecerem, igualmente, total credibilidade ao douto Tribunal, o qual os valorou devidamente, pese embora aqueles Réus não se recordassem das datas precisas e dos valores exactos que foram pagos pelo A., o que é absolutamente normal, tendo em conta o tempo que já passou desde a sua ocorrência – nalguns dos casos, mais de vinte anos.
VI– O ponto 16 da matéria de facto provada deverá manter-se tal como se encontra definido na douta sentença recorrida, tendo ficado provado que o valor do cheque em questão foi entregue ao Autor, a mando do seu pai, para pagamento de outros valores que aquele havia pago por conta da Apelante.
VII–Decidiu bem o douto Tribunal a quo ao considerar que o crédito reclamado pelo Autor, correspondente ao valor pago por força do contrato de transacção celebrado com a Geofinança e que o mesmo lhe foi transmitido por sub-rogação voluntária,
VIII– assim como também andou bem o douto Tribunal a quo ao considerar que o crédito transmitido ao Autor é o adveniente da relação material subjacente, isto é, o crédito decorrente do contrato de mútuo celebrado entre a Apelante a Geofinança, e não o crédito exequendo, como pretende a Apelante;
IX– A considerar-se correcta a tese defendida pela Apelante, que entende que o prazo de prescrição relativamente ao crédito Geofinança é de 3 anos e que tal prazo prescreveu a 6 de Junho de 1994, tal significaria que a prescrição teria ocorrido antes da celebração do contrato de transacção e muito antes do Autor ter liquidado o montante a que alude aquele crédito.
X Só após o cumprimento pelo terceiro, começa a correr o prazo para o cômputo da prescrição.
XI Sendo o Autor/Recorrido titular do crédito correspondente ao valor pago em virtude do contrato de transacção em apreço e por força da sub-rogação na relação material subjacente, o prazo de prescrição é o ordinário – vinte anos – por força do artº 309º do Código Civil - e não o prazo de três anos estabelecido na L.U.L.L – artºs 70º e 77º.
XII–Por força do pagamento pelo Autor/Recorrido, nos anos de 2007 e de 2008, de várias dívidas fiscais da responsabilidade da Apelante, operou-se a sub-rogação legal a favor daquele, uma vez que o mesmo tinha interesse directo na satisfação dos créditos,
XIII–dado que o Autor era/é herdeiro dos únicos sócios e gerentes da sociedade “B., Lda.”, tendo, consequentemente, interesse, enquanto tal e por forma a preservar o património que era deles e, que um dia, lhe seria transmitido.
XIV–Deve manter-se integralmente o conteúdo do ponto 16. da matéria de facto provada, tal como supra se refere – conclusão VI – e, consequentemente, a improcedência total do pedido reconvencional deduzido pela Ré/Apelante.
Termos em que e por tudo o mais que V. Exas. suprirão, deve o recurso ser julgado improcedente, confirmando-se na íntegra a decisão recorrida, fazendo-se assim a habitual JUSTIÇA!»

II–DO OBJECTO DO RECURSO
   
Sendo o objecto dos recursos definido pelas conclusões de quem recorre, para além do que for de conhecimento oficioso, são as seguintes as questões suscitadas pela apelante:
A.–Rectificação de lapsos manifestos: pontos 4., 8., 9., 11. e 13.
B.–Impugnação da matéria de facto: pontos 8. a 11. e 16.
C.–Da prescrição do crédito adquirido pelo A. da sociedade “H., S.A.”
D.–Da nulidade da sentença – contradição entre factos invocados na sentença
E.–Dos créditos fiscais pagos pelo A.
F.–Do pedido reconvencional da sociedade Ré

III–FUNDAMENTOS

1.–De facto

São os seguintes os factos dados como provados na sentença:
1.–A presente acção foi intentada pelo Autor a 10 de Fevereiro de 2015.
2.–O ora A. e a 2ª, a 3ª, o 4º e a 5ª Réus são os únicos herdeiros de “G.”, falecido em 5 de Dezembro de 2010.
3.–A Ré “C.” faleceu no dia 4 de Dezembro de 2018.
4.–Em 29 de Março de 1999, o A. vendeu a quota que detinha na sociedade R. à sua mãe, a R. “C.” ficando, como sócios da R. “B., Lda.”, apenas, a R. “C.” e o seu falecido cônjuge “G.”.
5.–Por óbito do referido “G.”, procederam os referidos herdeiros à correspondente partilha do acervo hereditário daquele, através de inventário judicial que, sob o nº ---/11.0TBPNI, correu seus termos pelo Tribunal da Comarca de Leiria – Peniche – Inst. Local – Sec. Compet. Genérica – J1, partilha essa homologada por sentença já transitada em julgado.
6.–Em 31 de Maio de 1991, a “H., S.A.” intentou execução ordinária contra “B., Lda.”, “G.” e mulher “C.”, para pagamento de quantia certa, constituindo título executivo duas livranças com os valores de Esc. 8 721 415$00 e Esc. 19 413 578$00 e datas de vencimento de 13 de Março de 1991 e 5 de Março de 1991, subscritas pela sociedade “B., Lda.” e avalizadas por “G.” e “C.”, entregues como garantia do contrato de mútuo celebrado entre as sociedades a 20 de Maio de 1987, no valor de € 25.000.000$00, à taxa de juro de 19,5%, com uma periodicidade de pagamento de juros semestral, que correu termos pela 3ª Secção do 16º Juízo Cível da comarca de Lisboa sob o número ---4, do ano de 1991, tendo os autos sido remetidos à conta em 17 de Setembro de 2001 e pagas as custas devidas a juízo pelo exequente, em 14 de Janeiro de 2002 (documento de fls. 25 a 34 dos autos).

7.–Por documento particular, designado por “Contrato de Transacção”, datado de 10 de Outubro de 2000, subscrito por:
- Sociedade “H., S.A.” – Em Liquidação, como primeira contraente; sociedade “B., Lda.”, como segunda contraente, “G.” e mulher “C.”, como terceiros contraentes e “A.”, como quarto contraente, consignou-se o seguinte:
Entre os mencionados contraentes «é ajustado e fica assente o contrato promessa de cessão de créditos que consta das cláusulas seguintes:
1.ª- Em 31 de Maio de 1991 a 1.ª contraente “H.” requereu contra a 2ª contraente “B., LDA.” e contra os 3°s contraentes “G.” e “C.” uma execução ordinária para pagamento de quantia certa tendo por título executivo duas livranças, sendo uma de esc. 8.721.415$00 vencida em 13 de Março de 1991 e a outra de esc. 19.413.578$00 vencida em 5 de Março de 1991, ambas subscritas pela 2.ª contraente e avalizadas pelos 3.ºs contraentes.
2.ª- Foi essa execução distribuída à 3.ª Secção do 16.° Juízo Cível de Lisboa (actual 16.ª Vara Cível) onde corre sob o n.º ---4 e na mesma formulado o pedido de os executados pagarem à exequente a importância de esc. 28.134.993S00 e os juros que se vencessem até ao efectivo pagamento, calculados à taxa legal.
3.ª- No decurso do processado, foram nomeados bens à penhora, nomeadamente:
1.- o prédio urbano situado em Marteleira, concelho da Lourinhã, inscrito na matriz urbana sob o art°. ---2° da freguesia de Miragaia e descrito na Conservatória do Registo Predial da Lourinhã na ficha ----5 da freguesia da Marteleira; e
2.- o prédio urbano situado no Estacai d’el Rei, Torre do Evaristo, freguesia de S. João da Talha, concelho de Loures, inscrito na matriz urbana sob o art°. ---2° e descrito na Conservatória do Registo Predial de Loures na ficha ----8 da mesma freguesia.
4.ª- As penhoras foram efectuadas mas os respectivos registos foram lavrados provisoriamente por os prédios, aquando do registo das penhoras, já se encontrarem inscritos em nome de terceiros.
5.ª- A provisoriedade desses registos deu lugar às duas seguintes acções propostas pela 1.ª contraente “H., S.A.”:
1.- uma, respeitante ao prédio da Marteleira, Lourinhã, movida contra os 3°s contraentes e contra “X.” e mulher “Z.”, que com o n.º ---6/96 foi distribuída à 1.ª Secção do 5.º Juízo Cível de Lisboa (actual 5.ª. Vara Cível) e
2.- a outra, respeitante ao prédio do Estacai d’el Rei, Loures, movida contra a 2.ª contraente e contra “Y.”, que com o n.º --3/99 foi distribuída à 1.ª Secção do 9.º Juízo Cível de Lisboa (actual 9.ª Vara Cível)

6.ª-O 4.º contraente, que declara ter exacto conhecimento daquele processo executivo e destas duas acções pendentes, mostrou interesse em regularizar a dívida da 2.ª contraente “B., LDA.” para com a 1.ª contraente “H., S.A.”, com quem entabulou negociações que conduziram ao seguinte acordo:
«1.- “H., S.A.” aceita receber do 4.º contraente a importância de esc. 14.067.000$00 e, após o recebimento desta quantia, concorda em sub-rogálo no crédito exequendo, cedendo-lhe esse seu crédito e a sua posição processual nessa execução e nas acções que estão pendentes e ficaram identificadas neste contrato;
2.- Iniciando a execução desse acordo e por conta da indicada importância de 14.067.000$00 o 1.º contraente recebe neste acto do 4.º contraente a importância de 10.000.000$0;
3.- O 4.º contraente obriga-se a pagar os restantes 4.067.000$00 em oito prestações mensais, iguais e sucessivas de 508.375$00 cada uma, vencendo-se a primeira em 1 de Novembro de 2000 e as restantes em igual dia dos meses subsequentes.
4.- Se o 4.º. contraente não pagar alguma destas prestações a 1.ª contraente fica desobrigada de o sub-rogar e de lhe ceder o crédito, mas o que tiver recebido dele será imputado no crédito da 1.ª contraente sobre os 2.º e 3.°s. contraentes.
5.- Fica entendido que o 4.º contraente deixou de cumprir este contrato se se encontrar em mora por 15 dias seguidos relativamente a cada um dos pagamentos convencionados.

7.ª- O 4.º contraente “A.” aceita este acordo, obriga-se a fazer os pagamentos atrás indicados e em requerer a sua habilitação na execução e nos processos pendentes e identificados neste contrato, sendo de sua conta as custas desse incidente, as da execução e as das acções pendentes.
8.ª- A 2.ª contraente “B., LDA.” e os 3°.s contraentes “G.” e “C.” prestam o seu expresso consentimento a este contrato não se opondo à sub rogação nem à cessão do crédito e da posição processual.»

8.–A quantia acordada referida em 5., foi, paga pelo ora A. em nove prestações, a primeira das quais, no montante de Esc. 10.000.000$00 (o equivalente a € 49.879,79) com a assinatura do referido contrato e as restantes oito prestações no montante de Esc. 508.375$00 (o equivalente a € 2.535,76) cada, a partir de novembro de 2000 inclusive, e nos meses subsequentes no dia 1 de cada mês.
9.–A última das prestações referidas em 5., foi paga pelo Autor a 12.06.2001.
10.–Devido a diversas dificuldades económicas que a sociedade “B., Lda.” atravessou ao longo de vários anos, o A., a pedido da 1.ª Ré, liquidou algumas dívidas fiscais da sua responsabilidade, designadamente:
a)-Em 23-07-2007, a quantia de € 21.876,48 respeitante a diversos processos de execução fiscal instaurados pela Justiça Tributária contra a 1ª R.;
b)-Em 30-09-2007, a quantia de € 1.411,98 respeitante a I.M.I. devido pela 1ª R.;
c)-Em 31-10-2007, a quantia de € 625,00 respeitante a IRC devido pela 1ª R.;
d)-Em 20-11-2007, a quantia de € 1.568,96 respeitante às prestações nºs 121 a 122 do “Pagamento em Regime Prestacional nos termos do DL 124/96”.
e)-Em 02-01-2008, a quantia de € 3.137,92 respeitante às prestações nºs 123 a 126 do “Pagamento em Regime Prestacional nos termos do DL 124/96”;
f)-Em 30-04-2008, a quantia de € 2.605,82 respeitante a IMI devido pela 1ª R.;
g)-Em 13-06-2008, a quantia de € 1.568,96 respeitante às prestações nºs 129 a 130 do “Pagamento em Regime Prestacional nos termos do DL 124/96.
11.–A intenção do Autor e dos seus pais, ao subscreverem o acordo referido em 3., era pagar a dívida à “H., S.A.” e depois estes pagariam àquele o montante em causa, quando pudessem.
12.–No âmbito do processo de inventário referido em 2., o ora Autor não invocou qualquer crédito perante a herança.
13.–Na sequência do acordo referido em 3., o A. não promoveu a prossecução do processo executivo em causa, tendo deixado a instância ficar deserta e, consequentemente, foram levantadas todas as penhoras efectuadas no âmbito do aludido processo executivo.
14.–Por cartas datadas de 23.10.2007 e 22.11.2007, entre outras, a gerência da “B., Lda.” solicitou a “J.”, que lhe fosse entregue a sua contabilidade.
15.–Por carta datada de 30 de outubro de 2007, “J.”, que se identifica como Técnico de Contas, responde à primeira missiva referida em 8.ª, comunicando que “actualmente o Sr. “A.” é o gerente efectivo da sociedade “B., Lda.” (…) A documentação da sociedade “B., Lda.” encontra-se, como também saberá, na sede da empresa, na Marteleira (…)”.
16.–O Autor recebeu, no dia 15 de Setembro de 2006, da Sociedade “K., S.A.”, e fez sua, a quantia de € 14.105,84 (catorze mil cento e cinco euros e oitenta e quatro cêntimos), paga através do cheque n.º --------7, sacado sobre o “Banco W.”, a qual era relativa a montantes devidos à Sociedade “B., Lda.”, que o seu pai entendeu entregar-lhe para acerto de contas.
*

B.–Factos Não Provados

1.–Foi a R. “B., Lda.” quem pagou integralmente, quer à sociedade “H., S.A., quer à Administração Tributária, as quantias peticionadas.
2.–Estando os pagamentos referidos em 1., registados na contabilidade da R. “B., Lda.” como suprimentos efetuados pelos sócios.
3.–Desde o início do ano de 2007, quer a R. “C.”, quer o falecido “G.” – gerentes da R. “B., Lda.” – cortaram relações com o A, não mais tendo estes contactado entre si.
4.–Os RR. não têm acesso, nem aos registos contabilísticos da sociedade “B., Lda.”, nem aos documentos que suportam tais registos, devido ao facto de o A. se ter apoderado de toda a contabilidade da sociedade “B., Lda.”.
5.–O A. apoderou-se de bens móveis, quantias e créditos sobre clientes de que a Sociedade Ré era titular, ascendendo tais valores, pelo menos, à quantia de 17.491,24€.
6.–O A. alienou os camiões e galeras, com as seguintes matrículas: 00-00-73, 00-00-25, 00-00-30, 00-00-94, 00-00-95, 00-00-00, 00-00-02, 00-00-39, 0000-05, 00-00-04, 00-00-84, 00-00-72, O-00007, O-000008, O-00005, O-00006, O-00002, O-00009 e O-00005, os quais eram propriedade da R. “B., Lda.”.
7.–O A., por si ou através de empresas de que é ou foi sócio e/ou gerente, entre os anos de 1990 e 2014, recebeu das sociedades “I., Lda.”, “L., Lda.”, “M., Lda.”, “N., Lda.”, “O., S.A.”, “P., S.A.”, “Q., Lda.”, “R., Lda.”, montantes que deveriam ter sido pagos, directamente, à R. “B., Lda.”, pela utilização do imóvel de um imóvel do qual esta sociedade é dona e legítima proprietária, sito no Bairro da Fraternidade, Rua (…), descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Loures sob o n.º 0---, da freguesia de São João da Talha, concelho de Loures, inscrito sob o artigo matricial ---5.

2.–De direito

Vejamos agora as questões suscitadas no âmbito da presente apelação e que já enunciamos.

A. Rectificação de lapsos manifestos: pontos 4., 8., 9., 11. e 13.

Entende a apelante que no ponto 4. dos factos dados como provados onde consta “29 de Março de 1999”, deverá constar “23 de março de 1999”, posto que é essa a data que consta da escritura de onde se retirou esse elemento.

Tem inteira razão a recorrente, pois que a data constante da escritura em causa é mesmo 23 de Março de 1999 e não a reflectida naquele ponto do probatório (vide a escritura de habilitação, cessão e unificação de quotas (fls. 149 a 154).

Desta forma, rectifica-se tal lapso de escrita, nos termos do disposto no art.º 614.º do CPC, pelo que no ponto 4. dos factos dados como provados, onde se lê “29 de Março de 1999”, passará a ler-se: “23 de março de 1999”.

Sustenta ainda a apelante que nos pontos 8. e 9., onde se faz menção ao referido em “5.”, deveria dizer-se referido em “7.”, tratando-se igualmente de manifesto lapso de escrita. Com efeito, basta ler o que referem os pontos 5. e 7. da factualidade provada para se concluir que apenas o ponto 7. se reporta a “quantias acordadas” e a “prestações”,sendo que o ponto 5. é relativo ao inventário judicial aberto por morte de “G.”.

Dúvidas não subsistem, assim, de que nos deparamos com manifesto lapso de escrita, que desde já corrigimos, à luz do citado art.º 614.º do CPC, pelo que nos pontos 8. e 9. Da factualidade provada, onde se alude ao ponto 5., passará a ler-se, referida/s em 7.”.

Entende ainda a recorrente que existem dois outros lapsos, nos pontos 11. e 13., pois que ao escrever-se acordo referido em 3.”, manifestamente pretendia dizer-se, acordo referido em 7..

Tal como nos lapsos imediatamente anteriores, também estes, são detectáveis pela mera leitura da factualidade provada, pois que o acordo a que os pontos 11. e 13. se reportam só se encontra vertido no ponto 7. da factualidade provada.

Desta forma, nos termos do art.º 614.º do CPC corrigem-se estes manifestos lapsos de escrita, daí derivando que nos pontos 11. e 13. dos factos provados, onde se encontra escrito acordo referido em 3.”, passará a ler-se, acordo referido em 7.”.

B.–Impugnação da matéria de facto: pontos 8. a 11. e 16.

Sustenta a apelante que os pontos 8. a 11. da factualidade provada deverão ser dados como não provados, pois que têm por fundamento o que constará da petição inicial, de documentos que foram impugnados pela Ré na sua contestação e dos depoimentos de parte dos 4.º e 5.º Réus, que se revelaram pouco conhecedores da situação em concreto e demasiado generalistas na sua exposição.

Como decorre do disposto no art.º 662.º, do C. P. Civil, o sistema processual civil português não comporta um segundo julgamento em matéria de facto, posterior, e paralelo ao julgamento realizado em 1.ª instância, antes permite uma reapreciação/sindicância do julgamento realizado pelo 1.ª instância em termos que lhe permitam “…alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa” (n.º 1 do art.º 662.º, do C. P. Civil).

Analisada a fundamentação da decisão recorrida, verificamos que se deram como provados os factos ora impugnados com motivação, não apenas num meio de prova, antes sim, da conjugação de dois meios de prova: documental e declarações de parte (a menção que se faz na fundamentação sobre a petição inicial, apenas pode ser entendida, como se tratando da base de onde se extraíram os factos provados e não, como é óbvio, como resultando se um meio de prova, que não o é).

Ora, apreciando o conteúdo da prova documental, designadamente a certidão do processo executivo constante de fls. 337 a 365, o contrato de transação constante de fls. 21 a 36, a documentação tributária e cheques constantes de fls. 37 a 53; as cartas constantes de fls. 223 a 224, 228 verso; o fax e recibo de quitação constantes de fls. 217 a 218; conjugada com as declarações prestadas pelos Réus “E.” e “F.”, que se mostraram credíveis e espontâneas (embora nem sempre precisas, mas que se mostra complementado pelos indicados documentos), concluímos que nenhuma razão encontramos para não aderir à posição assumida na sentença sobre a interpretação que fez da prova produzida. A observação feita pela recorrente no sentido de que terá impugnado os documentos apresentados em nada releva, pois que os mesmos estão sujeitos à livre apreciação de julgador, sendo certo que não de detectaram razões para os não aceitar.

Pelo que deixamos dito, teremos que concluir ser de manter os apontados pontos 8. a 11. dos factos dados como provados.

A recorrente entende, por outro lado, que no ponto 16. dos factos provados deveria ser eliminado o seguinte segmento de tal ponto: «… que o seu pai entendeu entregar-lhe para acerto de contas.»
Tal ponto, no seu todo integral, reza assim: «16. - O Autor recebeu, no dia 15 de Setembro de 2006, da Sociedade “K., S.A.”, e fez sua, a quantia de € 14.105,84 (catorze mil cento e cinco euros e oitenta e quatro cêntimos), paga através do cheque n.º --------7, sacado sobre o “Banco W.”, a qual era relativa a montantes devidos à Sociedade “B., Lda.”, que o seu pai entendeu entregar-lhe para acerto de contas

Quanto a este segmento impugnado, que a apelante entende que deve ser excluído do demais dele constante, considera a mesma que tal resultará até das declarações do próprio A..

Ora, da audição das mesmas não resulta tal. Resulta sim que o A. terá recebido em mãos da Sociedade “K., Lda.”, o aludido cheque e que tal deveria reverter para si para compensação do que já havia dispendido, posição aceite pelo seu pai. A entrega aqui mencionada é tida em sentido, não físico, mas figurado – disponibilização do quantitativo para o autor.

Do que se deixa dito, conclui-se, que também este ponto da matéria de facto será de manter na integra.

C.–Da prescrição do crédito adquirido pelo A. da sociedade “H., S. A.”
   
A apelante entende (caso se mantenha a matéria de facto inalterada, como sucede no caso) que se encontra prescrito o crédito adquirido pelo A., da sociedade “H., S.A.”, dado que o mesmo é resultante de sub-rogação voluntária derivada do contrato que ambos celebraram em 10 de Outubro de 2000, de onde resulta que o crédito sub-rogado é apenas e tão-só o crédito exequendo que esteve na base do processo executivo n.º ---4 [que tem como títulos executivos 2 livranças] não o resultante do mútuo que as sociedades “H., S.A.” e a aqui Ré tinham celebrado anteriormente. Na sequência de tal entendimento, consideram que o crédito em causa se mostra prescrito, pois que não tendo o aqui A. dado seguimento em tempo útil àquela execução, mostra-se ultrapassado o prazo prescricional de 3 anos a que aludem os artgs. 70.º e 77.º da LULL, não podendo aplicar-se, ao caso, o prazo geral de 20 anos, como se defendeu na sentença.

No acórdão desta Relação de 21-01-2020, que apreciou o recurso interlocutório sobre a prescrição (que culminou determinando que a excepção da prescrição apenas poderia e deveria ser apreciada na sentença final após a produção de prova e estabelecimento dos factos necessários para a sua decisão), enquadrou-se a questão nos seguintes termos[[2]]:   
«(…).
Da leitura dos artigos da petição inicial transcritos no ponto 1. supra resulta de modo evidente que a causa de pedir em que assenta a pretensão deduzida pelo autor/recorrido quanto ao pedido deduzido sob a alínea a) do seu petitório, reside na celebração do denominado “Contrato de transacção”, com data de 10 de Outubro de 2000, pelo qual aquele se obrigou a pagar a mencionada quantia de Esc. 14 067 000$00.
Todavia, certo é também o próprio autor, nos artigos 7º e 8º do seu articulado inicial, sustenta que pagou e que o crédito lhe foi cedido, estando acordado que ficaria sub-rogado nos direitos da credora “H., S. A.”.
É, pois, neste contexto factual que a pretensão do autor tem de ser analisada.
Para tanto, importa que se atente nas cláusulas de tal contrato, sobremaneira nas cláusulas 6ª e 8ª, que fornecem um contributo para a determinação da natureza da obrigação assumida pelo autor/recorrido, ainda que aquilo que nelas se disse possa não reflectir a vontade dos contraentes, o que, aliás, foi expressamente alegado pelas rés na sua contestação.
Por força do acordado entre a credora “H., S. A.” e o autor/recorrido (terceiro na relação obrigacional existente entre aquela e as aqui rés), este aprestou-se perante aquela, exequente, a regularizar a dívida da sociedade “B., Lda.”, acordando que seria efectuado o pagamento da quantia de Esc. 14 067 000$00 (sendo que o valor inicial da quantia exequenda era de Esc. 28 134 993$00 – cf. cláusula 2ª do contrato), o que faria através da entrega, na data da subscrição do contrato, da quantia de Esc. 10 000 000$00 e procedendo ao pagamento dos restantes Esc. 4 067 000$00 em oito prestações mensais, iguais e sucessivas, de Esc. 508 375$00 cada uma, vencendo-se a primeira em 1 de Novembro de 2000 e as restantes em igual dia dos meses subsequentes.
Tal não significa, contudo, como parece decorrer da decisão recorrida (ainda que esta não seja inteiramente clara a esse propósito), que por força do vertido nesse contrato se possa afirmar que o autor/recorrido assumiu o pagamento de uma dívida da responsabilidade das aqui rés/recorrentes e que dessa assumpção tenha resultado para si um direito de crédito constituído ex novo, sem qualquer  relação com o crédito exequendo cujo pagamento assumiu perante o respectivo credor, havendo que analisar o conteúdo das cláusulas vertidas no contrato, em conjugação com aquela que haja sido a vontade das partes (e que, por ora, ainda resta demonstrar) para aferir qual o instituto jurídico que subjaz ao acordado entre as partes.
(…).
Tendo presente estas regras da interpretação dos negócios e não olvidando que a intenção das partes quando subscreveram o conteúdo de tal acordo está expressamente colocada em crise pelas rés, que afirmam na sua contestação não ter existido qualquer intenção de sub-rogar o autor/recorrido na posição da credora exequente, sempre se dirá que, mesmo ponderando apenas o texto do acordo, não se poderia deixar de relevar o que a credora e o autor/recorrido consignaram na cláusula 6ª, ponto 1. do documento número 2 junto com a petição inicial e que acima se reproduziu, de onde resulta que aquela aceitou receber o aludido montante do aqui recorrido obrigando-se a, após o recebimento dessa quantia, sub-rogálo no crédito exequendo.
O texto da cláusula não é totalmente escorreito, pois que nele se alude quer à sub-rogação, quer à cessão do crédito e da posição processual na execução e nas demais acções pendentes (identificadas na cláusula 5ª), sem se atentar que se trata de institutos jurídicos distintos.
De todo o modo, pretendendo o tribunal recorrido conhecer da verificação da prescrição ainda antes de apurar qual foi a vontade real das partes ao celebrarem tal contrato, sempre teria de ter em atenção que do vertido no ponto 1. da sua cláusula 6ª resulta que o pagamento do valor fixado entre as partes para regularização da dívida era condição sine qua non para a sub-rogação do aqui recorrido «no crédito exequendo».
Significa isto que importava determinar a natureza do crédito do autor sendo que uma das soluções jurídicas plausíveis, face ao modo como o autor deduziu a sua pretensão e, mais do que isso, face ao teor das cláusulas contratuais, seria a de se estar perante um acordo entre o credor e terceiro quanto ao pagamento da dívida e a afirmação de que a sub-rogação deste na posição da credora dependeria, em qualquer caso, do pagamento da totalidade do valor acordado, ou seja, da totalidade das prestações acertadas entre as partes.
Ora, dá-se a cessão de um crédito quando o credor, mediante negócio jurídico, transmite a terceiro o seu direito, de modo que o credor originário é substituído por outra pessoa, mantendo-se inalterados os restantes elementos da relação obrigacional. Não há, nesse caso, a substituição da obrigação antiga por uma nova, mas uma mera modificação subjectiva – cf. art. 577º, n.º 1 do Código Civil.
Atento o estatuído no art. 578º, n.º 1 do Código Civil, os requisitos e os efeitos da cessão definem-se em função do tipo de negócio-base, podendo a cessão revestir uma natureza onerosa ou gratuita, mas em que o efeito principal é sempre o da transmissão do crédito.
Na cessão dá-se apenas a substituição do credor originário pelo novo credor, pelo que aquela não afecta a natureza do crédito que, salvo convenção em contrário, é transferido com as suas garantias e outros acessórios que não sejam inseparáveis da pessoa do cedente – cf. art. 582º, n.º 1 do Código Civil.
O art. 588º do Código Civil estende a aplicação das regras da cessão de créditos a figuras dissintas desta, ou seja, à cessão de quaisquer outros direitos não exceptuados por lei, bem como à transferência legal ou judicial de créditos.
Diversa da cessão de créditos enquanto outra forma de transmissão singular de créditos é a sub-rogação.Opera-se a sub-rogação quando um terceiro, que cumpre uma dívida alheia ou que para tal empresta dinheiro ou outra coisa fungível, adquire os direitos do credor originário em relação ao respectivo devedor.”cf. Mário de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 6ª Edição, pp. 707-708.
A sub-rogação pode ser convencional ou legal, resultando a primeira de um acordo entre o terceiro que pagou e o credor primitivo, a quem é feito o pagamento, ou entre o terceiro e o devedor.
A sub-rogação é uma forma de transmissão do crédito, que tem por base o pagamento ou cumprimento da obrigação, feito por terceirocf. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4ª Edição Revista e Actualizada, pág. 604.
O art. 589º do Código Civil reporta-se à sub-rogação pelo credor, de onde decorre que a validade da sub-rogação pelo credor depende de uma declaração expressa de vontade nesse sentido, manifestadas no acto do cumprimento da obrigação ou anteriormente. De contrário, entende-se que houve o propósito de extinguir a relação obrigacional e não o de transmiti-la pelo lado activo.” cf. Mário de Almeida Costa, op. cit., pág. 709.
O teor da cláusula 6ª do contrato referido em 4. permite configurar uma situação de sub-rogação pelo credor, pois que a credora originária, exequente no processo n.º 8154, aceitou receber o montante em dívida do aqui autor e afirmou antecipadamente, ou seja, ainda antes do cumprimento da obrigação pelo terceiro, que este ficaria sub-rogado nos seus direitos de credora logo que ocorresse o pagamento integral.
A sub-rogação, como se referiu, pressupõe a satisfação do crédito, sendo que esta representa a condição e a medida dos direitos do terceiro sub-rogadocf. Mário de Almeida Costa, op. cit., pág. 713.
Assim, enquanto na cessão os direitos do cessionário emergem do negócio que lhe serve de base, na sub-rogação os direitos do terceiro sub-rogado são aferidos pela medida da satisfação do crédito.
Nos termos do art. 593º, n.º 1 do Código Civil, o sub-rogado adquire, na medida da satisfação dada ao direito do credor, os poderes que a este competiam.
Tendo-se presente que a origem da sub-rogação reside no facto jurídico do cumprimento, antes desse pagamento não há sub-rogação e, como tal, só com o pagamento o terceiro que paga recebe os direitos do credor, podendo exercê-los.
Importava, assim, questionar se estaria aqui em causa uma sub-rogação e, nesse caso, se podiam as rés invocar, perante o terceiro que pagou, o prazo de prescrição que aquelas poderiam opor à credora primitiva.
O tribunal recorrido não cuidou de qualificar a relação jurídica em causa, nem identificou as normas aplicáveis, convocando o prazo ordinário de vinte anos, sem que se lobrigue por que motivo afastou desde logo o prazo prescricional da obrigação cambiária, quando é certo que o próprio autor aludiu quer a uma cessão de créditos, quer à sua sub-rogação nos direitos da primitiva credora, encontrando-se os factos atinentes a tal matéria expressamente impugnados.
No entanto, a admitir-se a existência de sub-rogação, haveria que ter em atenção que o art. 594º do Código Civil estende à sub-rogação a aplicabilidade das normas dos art.ºs 582º a 584º desse diploma legal atinentes à cessão de créditos, e ainda que nelas não inclua a norma do art. 585º (que dispõe expressamente sobre os meios de defesa oponíveis pelo devedor), tem-se entendido que essa norma é analogicamente aplicável à sub-rogação, porquanto só assim o devedor não ficará prejudicado.
(…).
A razão da aplicação do art. 585.º à sub-rogação funda-se ainda, para alguns Autores, num princípio da equiparação entre as duas formas de transmissão de créditos (art. 594.º) […]
O crédito aí transmitir-se-á não apenas com as garantias e acessórios, mas também com os vícios ou defeitos.
Assim sendo, o devedor continuará a poder opor ao sub-rogado as excepções que impedissem a constituição do crédito (v.g. invalidade do negócio), o extinguissem (v.g. resolução, cumprimento, prescrição, compensação ou outro facto extintivo) ou paralisassem o seu exercício (v.g. prazo da prestação, exceptio non adimpleti contractus ou exceptio non rite adimpleti contractus, direito de retenção).”
– cf. Da Sub-rogação no Contrato de Seguro, pp. 79-80, disponível em https://www.asf.com.pt/NR/rdonlyres/E0A868B6-B492-413A-AC0C-A5AE04CBFA2/0/FDULFranciscoRodriguesRochaDaSubroga%C3%A7%C3%A3onoContratodeSeguro.pdf.
Também neste sentido, veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 4-05-2017, relator José Fernando Cardoso Amaral, processo n.º 572/16.8T8PTL.G1 onde se aduz:
“Já o legislador não mandou aplicar à sub-rogação o disposto no artigo 585°, preceito que, na cessão de créditos, define os meios de defesa oponíveis pelo devedor ao credor cessionário. Tal não significa, porém, que aqui não possa também ocorrer, em alguns casos, a falada equiparação.
Com efeito, escreve a propósito Antunes Varela: "No caso de sub-rogação legal ou de sub-rogação efectuada pelo credor, já o regime dos meios de defesa invocáveis contra o sub-rogado se aproxima bastante mais da disciplina da cessão. O crédito transmitir-se-á, nesses casos, não apenas com as garantias e acessórios que o fortalecem, mas também com os vícios ou defeitos que o enfraquecem".
(…).
Aderindo a esta posição, que é aquela que se mostra mais adequada perante a consideração de que o sub-rogado recebe o crédito tal qual ele existia na esfera jurídica do credor primitivo, deve considerar-se que é oponível ao recorrente a excepção de prescrição que as rés, enquanto devedoras, pudessem dirigir contra aquela.
Mas que prazo prescricional poderiam as devedoras invocar perante a credora primitiva?
Recorde-se que em face da interpretação que o texto do contrato celebrado entre as partes autoriza (e não se dispondo, neste momento de outros elementos, porquanto não foi ainda produzida qualquer prova), pode admitir-se perante a redacção do ponto 1. da cláusula 6ª, que o autor/recorrido, a ter cumprido integralmente a obrigação, terá sido sub-rogado no crédito exequendo, baseado em dois títulos de crédito – duas livranças –, executando-se na execução n.º 8154 a obrigação cambiária.
Nos termos previstos nos art.ºs 77º, 32º, 1.º parágrafo, 78º, 1.º parágrafo e 70º, 1.º parágrafo, todos da LULL, o prazo prescricional referente aos títulos de crédito em referência é de três anos a contar do vencimento do título cambiário, sendo que este ocorreu, como delas consta, em 13 e 5 de Março de 1991.
A execução deu entrada em juízo em 31 de Maio de 1991.
Admitindo que os executados foram presumivelmente citados antes do decurso do mencionado prazo de três anos, atento o estatuído no art. 323º, n.º 1 do Código Civil que estabelece que a prescrição se interrompe pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente, para além do que vale, em qualquer caso, o regime da citação ficta consagrado no n.º 2 deste normativo, de onde resulta que, se a citação não se fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
Assim, teria de concluir-se pela não prescrição da obrigação cambiária face à pendência da execução instaurada em devido tempo.
Esta asserção é válida, contudo, perante a credora primitiva e face à pendência da acção executiva.
No caso presente, trata-se de aferir se prescreveu o crédito que o autor, mediante esta acção, intentada em 10 de Fevereiro de 2015, pretende exercer contras as rés devedoras e executadas na execução n.º 8154.
Para que se possa determinar qual o prazo de prescrição aplicável importa ajuizar perante os factos que se apresentem como estabilizados qual a natureza da relação jurídica invocada e o regime que lhe é aplicável.
Assim, não poderia o tribunal recorrido deixar de ter presente que se poderia configurar uma situação de sub-rogação, caso em que o devedor primitivo pode opor perante o novo credor as excepções que poderia dirigir contra o primitivo credor.
Sucede que a ter existido o pagamento integral por parte do autor/recorrido (facto impugnado pelas rés/recorrentes), sempre esse pagamento apenas se teria verificado, de acordo com o programa contratual, em 1 de Junho de 2001 ou, conforme alegado pelo autor, em 12 de Junho de 2001.
Ora, quem vem invocar o direito de crédito é precisamente o credor sub-rogado nos direitos da exequente sobre as devedoras na proporção do crédito satisfeito.
Já se viu que o terceiro que cumpre a obrigação fica sub-rogado nos direitos do credor, adquirindo o sub-rogado na medida da satisfação dada ao direito do credor, os poderes que a este competiam.
O que se impõe questionar será, então, qual o momento a partir do qual deverá começar a correr o prazo de prescrição face ao terceiro que pagou?
A jurisprudência tem propendido maioritariamente no sentido de que o prazo de prescrição apenas deverá começar a correr na data do cumprimento - pagamento – pelo terceiro, com o argumento de que se a sub-rogação pressupõe o pagamento, antes deste não se poderá falar de sub-rogação.
Vaz Serra (RLJ, Ano 99, página 360) esclarecia que a sub-rogação “supõe o pagamento... e, portanto, o terceiro que paga pelo devedor só se sub-roga nos direitos do credor com o pagamento. Enquanto não o faz, não é sub-rogado e não pode, por isso, exercer os direitos do credor (…) É que o eventual sub-rogado, enquanto não efectuar o pagamento, não tem crédito contra o terceiro responsável (crédito cujo montante será determinado pelo pagamento que fizer), e não tem sequer um crédito já existente mas ainda inexigível.” – apud acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 25-10-2018, relatora Raquel Baptista Tavares, processo n.º 710/18.6T8GMR-A.G1.
Não se pode deixar de seguir aquela que é a jurisprudência maioritária aderindo aos seus argumentos, que se mostram inteiramente válidos, tal como decorre do amplamente explanado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25-03-2010, relator Lopes do Rego, processo n.º 2195/06.0TVLSB.S1:
“Mas então, se a sub-rogação supõe o pagamento, não pode deixar de entender-se que antes dele não há... sub-rogação. Ou seja, o terceiro que paga pelo devedor só se sub-roga nos direitos do credor com o pagamento - enquanto o não fizer não é sub-rogado e, consequentemente, não pode exercer os direitos do credor.
Não pode razoavelmente aceitar-se que um prazo de prescrição comece a correr ainda antes de o direito se subjectivar, antes ainda de o respectivo titular o poder exercer (sem que possa excluir-se a hipótese de o direito prescrever antes mesmo de poder ser exercido). […]
Antes de satisfazer, por imperativo legal, a indemnização ao lesado, o "A" não é titular de qualquer direito de crédito que possa exercer em substituição do lesado - nomeadamente, não pode, antes de cumprir, interromper a prescrição mediante a propositura de acção contra o responsável civil. […]
Não se nega que – se nos movermos num plano estritamente lógico-jurídico, adoptando uma metodologia interpretativa que estaria mais próxima de uma «jurisprudência de conceitos» - poderia efectivamente ser-se levado a considerar que, assentando a sub-rogação legal na estrita ideia de transmissão do crédito (que não sofre qualquer alteração objectiva), o transmissário sucederia estritamente na posição jurídica do transmitente, devendo, consequentemente, suportar, nos precisos termos em que a este eram oponíveis, as excepções contra ele invocáveis.
Não pode, porém, olvidar-se que tal diferenciação radical de regimes entre a sub-rogação e o direito de regresso, assente na respectiva fisionomia dogmática ou conceitual, e não na ponderação dos interesses que lhe vão subjacentes, acaba por conduzir a um tratamento injustificadamente diferenciado de situações que, de um ponto de vista material, não merecem a aplicação de regimes radicalmente divergentes (podendo conduzir, em última análise, a uma verdadeira impossibilidade prática de obtenção pelo interessado do reembolso através da via da sub-rogação, bastando que tenha ocorrido uma dilação significativa – e não necessariamente imputável ao credor sub-rogado, podendo a demora radicar numa situação litigiosa quanto ao apuramento exacto dos danos causados pelo sinistro – entre os momentos do evento danoso e daquele em que se realizou o cumprimento que gera a sub-rogação).”
Como tal, o presumível sub-rogado, o aqui autor/recorrido, só estaria em condições de exercer os direitos do credor após ter efectuado o pagamento, não sendo razoável considerar que o prazo de prescrição possa começar a correr em momento anterior ao pagamento, quando o titular do direito ainda o não pode exercercf. neste sentido, acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 22-04-2004, relator Ferreira Girão, processo n.º 04B404 e de 17-12-2002, relator Ferreira Ramos, processo n.º 02A3540; acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 16-05-2015, relatora Dina Monteiro, processo n.º 21090/13.0T2SNT-A.L1-7; do Tribunal da Relação de Guimarães de 25-10-2018, relatora Raquel Baptista Tavares, processo n.º 710/18.6T8GMR-A.G1.
Em conclusão, o prazo de prescrição perante o credor sub-rogado apenas poderá iniciar-se uma vez ocorrido o cumprimento da obrigação, porquanto antes do pagamento não há sub-rogação.
Em caso de sub-rogação, o prazo de prescrição que as devedoras poderiam dirigir contra a primitiva credora seria então o referido prazo de três anos, não podendo lançar-se mão do prazo ordinário de vinte anos face à manutenção do crédito transmitido com as suas garantias, acessórios e características.
Com efeito, o sub-rogado passa a assumir perante o devedor originário o papel do primitivo credor, dado que passou a ter o crédito que lhe foi transmitido pelo inicial credor, pelo que se aplica o mesmo prazo prescricional – cf. neste sentido, acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa [[3]] de 30-04-2009, relator Sousa Pinto, processo n.º 2683/06-2[[4]].
Sucede que ao momento da prolação do despacho saneador os autos não forneciam factos assentes suficientes para formular um juízo seguro sobre a verificação ou não verificação do prazo prescricional.
(…).
Ainda que se pressupusesse, como indica o Prof. Miguel Teixeira de Sousa, a existência da pretensão do autor – ou seja, a sub-rogação no crédito exequendo – a contagem do prazo de três anos está dependente da determinação sobre o momento em que ocorreu o pagamento, momento a partir do qual se iniciaria o prazo de três anos para demandar as rés/recorrentes.
Note-se que, conforme o acima expendido, a sub-rogação voluntária provém de um contrato realizado entre o credor e terceiro, sendo que “no acto do cumprimento da obrigação, ou anteriormente, o credor sub-roga expressamente o solvens nos seus direitos de crédito, transmitindo- lhe os direitos que foram satisfeitos. Quando a declaração de sub-rogação seja anterior, ela só produz efeitos com o pagamento, mas vale com o sentido que traduz desde que é proferida.” – cf. Pires de Lima e Antunes Varela, op. cit., pág. 605.
Ora, o pagamento e as datas em que este teria ocorrido resultam impugnados nos autos, não sendo possível tomar como certos nem um, nem outras, tal como indicadas pelo autor.
É relevante para julgar a excepção peremptória invocada pelas rés, que se conclua, com a devida segurança, qual a origem do crédito que o autor pretende fazer valer e qual o prazo prescricional que lhe se aplica, e, bem assim, em que momento este deve iniciar-se.
Ora, a factualidade atinente à sub-rogação do autor nos direitos da “H. S. A.”, e ao pagamento da dívida foi colocada em crise pelas rés na sua contestação e deve, por isso, ser considerada controvertida, tal como o foi pelo tribunal recorrido, que a integrou nos temas da prova (cf. pontos 1. a 3. dos Temas de Prova a folhas 22 dos autos), pelo que o julgamento se apresenta como fundamental para a justa composição do litígio.
Sendo este o enquadramento que se retira dos autos, impunha-se ao tribunal a quo a remissão do conhecimento da excepção de prescrição para momento posterior ao julgamento da matéria de facto pertinente.
O apuramento da intenção das partes contraentes no “Contrato de transacção” e sobre o cumprimento ou não pelo autor/recorrido das obrigações que então assumiu são essenciais para a qualificação final dos factos integradores da pretensão deduzida e só perante a sua demonstração se torna possível aferir em termos definitivos qual o prazo prescricional aplicável e qual o seu dies a quo, revelando-se, assim, prematuro o julgamento de improcedência da excepção de prescrição (…).»

Tendo presente toda a expressiva e bem estruturada fundamentação constante do acórdão que, em parte, vimos de transcrever e face à matéria de facto que, entretanto, se apurou e que nele não pôde ser considerada, podemos concluir, interpretando o contrato que designaram por “Contrato de Transacção”, datado de 10 de Outubro de 2000, que a empresa “H., S.A.” e o A., pretenderam sub-rogar neste, os créditos exequendos discutidos na execução n.º ---4, que tal sociedade “H.” detinha sobre a sociedade Ré e os pais daquele.

Na sentença deu-se como assente, quanto a nós bem, sendo que o apelado não o pôs em crise nas suas contra-alegações, que a intenção do A. e da referida sociedade foi efectivamente a de sub-rogarem o crédito que aquela detinha sobre a sociedade Ré e os falecidos pais do A.. Temos assim, como assente, sem necessidade de mais fundamentação, que nos encontramos perante uma situação de sub-rogação voluntária de créditos. A divergência do nosso entendimento, face ao que foi defendido na decisão recorrida, assenta na circunstância de considerarmos que o crédito que se mostra sub-rogado é o exequendo, assente nas duas livranças que constituíram o título executivo da execução n.º 8154 e não o crédito com origem no contrato de mútuo celebrado em 20 de Maio de 1987.  

Retiramos tal conclusão do facto de em todo o contrato nunca se falar no mútuo que terá estado na base da dívida (apenas se sabe que terá existido por via do que consta do ponto 6. dos factos dados como provados, mas que em nenhum outro local é focado, ignorando-se os seus termos e contornos) e de todo o acordado entre a sociedade “H., S.A.” e o A. se reportar exclusivamente ao que terá ocorrido no seio da citada execução:
- surge na sequência do processo ter sido intentado e de se encontrar na fase de penhora, sendo que “As penhoras foram efectuadas mas os respectivos registos foram lavrados provisoriamente por os prédios, aquando do registo das penhoras, já se encontrarem inscritos em nome de terceiros”, tendo tal circunstancialismo dado azo a que a sociedade “H., S.A.” tivesse intentado 2 acções (quiçá, paulianas) contra Réus desta acção;
- existe o expresso compromisso do A., na cláulula 7.ª do contrato, aceitar o acordo e obrigar-se «… a fazer os pagamentos atrás indicados e em requerer a sua habilitação na execução e nos processos pendentes e identificados neste contrato, sendo de sua conta as custas desse incidente, as da execução e as das acções pendentes.»

Por outro lado, da parte da Ré recorrente (e dos, entretanto falecidos, “G.” e “C.”), surgiu igualmente o expresso consentimento a tal contrato, “não se opondo à sub rogação nem à cessão do crédito e da posição processual.”

Como referimos supra, todo o contrato se encontra elaborado em face da execução instaurada e do que nela ocorreu, daí que o compromisso assumido pelo A. (que nem sequer se revelaria necessário, mas que assim reforça a circunscrição do acordo) surja no sentido de se habilitar nos processos em que a sub-rogante se encontrava envolvida por via da dívida exequenda.

Aqui chegados, estando delimitada a sub-rogação consagrada no contrato celebrado à dívida exequenda, importará agora extrair daí as legais consequências.

Secundamos, como já referimos, os considerandos veiculados no acórdão desta Relação de 21-01-2020, dispensando-nos de repetir o que profusa e claramente nele foi referido, quer quanto aos direitos inerentes ao sub-rogado, quer quanto ao momento a partir do qual deverá ter início o prazo prescricional (a partir do pagamento realizado pelo sub-rogado ao sub-rogante, altura em que se transmite o direito).   

Ora, no que concerne ao momento em que terá tido início o prazo prescricional, de acordo com o ponto 9. dos factos dados como provados, a dívida exequenda à sociedade “H., S.A.”, ficou saldada em 12-06-2001, pelo que foi nessa data que o A. passou a usufruir dos direitos que até aí eram detidos pela sub-rogante, sendo que será também a partir dessa data que se inicia a contagem do prazo prescricional.

Como referimos já, o crédito que se mostra sub-rogado, é o relativo à dívida exequenda, que teve na sua base (títulos executivos) as indicadas duas livranças.

Ora, uma vez que o crédito exequendo, sub-rogado ao A., resulta de dois títulos de crédito – duas livranças – será aplicável a esse crédito o regime previsto nos artgs. 77.º, 32.º, 1.º parágrafo, 78.º, 1.º parágrafo e 70.º, 1.º parágrafo, todos da LULL, sendo o prazo prescricional a eles referentes de três anos a contar do vencimento do título cambiário, o qual ocorreu, como delas consta, em 13 e 5 de Março de 1991.

A execução deu entrada em juízo em 31 de Maio de 1991, pelo que, na pior das hipóteses, teriam de se considerar os executados citados para os termos da mesma em 5-06-1991 (art.º 323.º,n.º 2 do CC), momento em que se terá de considerar interrompido tal prazo prescricional (art.º 323.º, n.º 1 do CC), sendo certo que até aí não decorreu  indicado prazo prescricional de três anos.

O A., como se viu, desde 12-06-2001, passou a assumir os direitos da sub-rogante e as inerentes vicissitudes deles decorrentes, como se referiu no acórdão desta Relação acima, parcialmente, transcrito: «o sub-rogado recebe o crédito tal qual ele existia na esfera jurídica do credor primitivo, deve considerar-se que é oponível ao recorrente a excepção de prescrição que as rés, enquanto devedoras, pudessem dirigir contra aquela

Ora, ficou provado – ponto 6. dos factos provados – que se registou a deserção da instância da execução n.º 8154, tendo os autos sido remetidos à conta em 17 de Setembro de 2001.

Nos termos do disposto no 327.º, n.º 2 do CPC, «Quando, porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada deserta, ou fique sem efeito o compromisso arbitral, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo», o que vale por dizer que após aquela data da deserção da instância (Setembro de 2001), teria o A. o prazo de três anos para exercer o direito que lhe fora sub-rogado, sendo certo que o não fez (como resulta da certidão judicial junta aos autos no dia 07-02-2018), tendo apenas em 10-02-2015 intentado a presente acção.

De tudo quando se deixa ditto, há, assim que concluir que se regista a excepção da prescrição invocada pela Ré/apelante, mostrante prescrito o direito invocado pelo A./apelado de se ver ressarcido da quantia de  ESC. 14.067.000$00/70.165,90€ (setenta mil cento e sessenta e cinco euros e noventa cêntimos), peticionada pelo A., por se encontrar prescrito esse seu direito de crédito.

A apelação procederá nesta questão.

D.–Da nulidade da sentença – contradição entre factos invocados na sentença

Sustenta a apelante que deverá determinar-se a nulidade da sentença, por «Contraditoriamente, o Tribunal recorrido refere, primeiro, que o recorrido deixou de ser sócio da recorrente no dia 29 de março de 1999, mas, a seguir, conclui que quando o recorrido realizou os pagamentos em causa, nos anos de 2007 e 2008, tinha a qualidade de sócio da recorrente (!)», o que deverá ser decidido «nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC.».

Não se vislumbra em que medida a sentença terá cometido a nulidade invocada, pois que a nulidade prevista na apontada alínea do n.º 1 do art.º 615.º, do CPC ocorre quando «O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento», sendo certo que a situação invocada não se enquadra em nenhuma das duas situações previstas na norma, pelo que termos de concluir que a nulidade invocada não se verifica.

Mesmo que se pretendesse que o tribunal ao abrigo do art.º 662.º, n.º 2, al. c) do CPC, determinasse tal nulidade por contraditoriedade entre factos, sempre se dirá que se nos afigura que ela não existe, pois que os pagamentos efectuados pelo A. em 2007 e 2008, em anos em que já não seria sócio da sociedade Ré, reportam-se fundamentalmente a impostos reportados a anos em que ainda o era. Não se regista assim, a apontada contradição.

Deste modo, esta questão improcede.

E.–Dos créditos fiscais pagos pelo A.

Sustenta a apelante que contrariamente ao que se decidiu na sentença recorrida, os pagamentos que o A. efectuou ao fisco em substituição da sociedade Ré, não podem levar a que se entenda estarmos face a uma situação de sub-rogação legal, pois que à data em que os mesmos ocorreram já não era sócio da Ré e o facto de à data de tais pagamentos ser putativo herdeiro dos então sócios da sociedade Ré não pode levar a que se considere que tinham interesse directo na satisfação do crédito.

Nesta questão encontramo-nos em inteira concordância com a posição defendida na sentença.

Com efeito, refere-se aí:
«(…).
Tais factos [[5]] são subsumíveis no art. 767.º, n.º 1, do CC, nos termos do qual a prestação pode ser feita tanto pelo devedor como por terceiro, interessado ou não no cumprimento da obrigação.
Assim sendo, o terceiro que cumpre a obrigação só fica legalmente sub-rogado nos direitos do credor quando tiver garantido o cumprimento, ou quando, por outra causa, estiver diretamente interessado na satisfação do crédito – art. 592.º do CC.
Estamos agora no âmbito da sub-rogação legal e não na sub-rogação voluntária, sendo os requisitos diferentes entre si.
Para que se verifique a sub-rogação legal é necessário que o terceiro que cumpre a obrigação tenha garantido o cumprimento, ou esteja diretamente interessado na satisfação do crédito.
Face aos factos provados afastamos, desde logo, a primeira situação, uma vez que deles não resulta que o Autor tenha garantido as obrigações fiscais da responsabilidade da Ré “B., Lda.”.
No entanto, afigura-se-nos verificado o requisito do interesse directo na satisfação dos créditos, senão vejamos. Resultou demonstrado que o Autor foi sócio da Sociedade “B., Lda.” até 29 de março de 1999 (ponto 4. da Matéria de Facto Provada), pelo que no período em que procedeu ao pagamento de tais dívidas fiscais tinha a qualidade de sócio, da qual decorre, necessariamente, um interesse directo em satisfazer o pagamento das mesmas. Acresce que o Autor é herdeiro dos sócios gerentes da sociedade “B., Lda.”, pelo que tinha interesse em que o património desta não fosse chamado a responder pelas dívidas fiscais em causa, diminuindo, consequentemente, o valor da respetiva herança.
Verificado um dos requisitos legais exigíveis para a sub-rogação legal de créditos, não temos dúvidas de que o Autor se encontra, igualmente, sub-rogado, nos valores correspondentes às dívidas fiscais da responsabilidade sociedade “B., Lda.” que pagou.
(…).»

Assumimos a mesma posição, com a correcção anteriormente avançada em sede de apreciação da arguida nulidade da sentença, no sentido de que as dívidas pagas pelo A. em 2007 e 2008 se reportavam essencialmente a impostos reportados ao período em que foi sócio da sociedade Ré, como resulta dos documentos apresentados com a petição inicial e que estão na base dos factos constantes do ponto 10.dos factos provados.

Por outro lado, reputamos igualmente de interesse directo o facto do A. ser herdeiro dos falecidos RR. e sócios da sociedade Ré, atendendo ao argumentário apresentado na sentença.

Como se refere no acórdão proferido pelo S.T.J., de 12-09-2013, disponível em www.dgsi.pt e referenciado pelo recorrido nas suas alegações:
«Exige-se um interesse directo, que a doutrina vem entendendo como sendo um interesse patrimonial e próprio, excluindo-se “… os casos em que o cumprimento se realize no exclusivo interesse do devedor ou por mero interesse “moral” ou “afectivo” do “solvens”, no dizer de A. Varela (ob. cit.)
Como ensina o ilustre Prof., esse interesse directo do próprio terceiro, verificar-se-á sempre que, com o cumprimento, o terceiro pretenda “evitar a perda ou limitação dum direito que lhe pertence” ou mesmo “quando o solvens apenas pretende acautelar a consistência económica do seu direito “podendo, de um modo geral dizer-se que tem interesse directo “quem é ou pode ser atingido na sua posição jurídica pelo não cumprimento e pretende, precisamente evitar essas consequências.»

Considerando-se, como se considera, que nos encontramos perante uma situação de sub-rogação legal, importará agora aquilatar qual o prazo prescricional de tal crédito.
Também aqui nos encontramos de acordo com o decidido na sentença, sendo o prazo prescricional o ordinário (20 anos – art.º 309.º do CC), dada a situação de sub-rogação legal antes referenciada e a não verificação do enriquecimento sem causa argumentado pela recorrente. Dessa forma, tendo presente que o prazo ordinário de prescrição se iniciou quando o Autor procedeu aos pagamentos das dívidas fiscais em causa – nos anos de 2007 e 2008 – dúvidas não restam de que aquando da propositura da presente acção – em 10-02-2015 – tal prazo prescricional ainda não tinha decorrido.
Do que se deixa dito, temos de concluir que esta questão improcede.

F.–Do pedido reconvencional da sociedade Ré

Sustenta a apelante que «Foi feita prova de que o recorrido “recebeu, no dia 15 de setembro de 2006 da Sociedade “K., S.A.”, e fez sua, a quantia de € 14.105,84 (catorze mil cento e cinco euros e oitenta e quatro cêntimos), paga através do cheque n.º --------7, sacado sobre o “Banco W.”, a qual era relativa a montantes devidos à Sociedade “B., Lda.”.
Assim sendo, é o recorrido devedor à recorrente do referido montante de € 14.105,84. (…).»

Sucede, porém, que o facto que é avançado pela recorrente não corresponde ao que resultou provado, pois que esse (que já foi objecto de apreciação noutra sede, supra) é algo distinto, rezando assim:
«16.- O Autor recebeu, no dia 15 de Setembro de 2006, da Sociedade “K., S.A.”, e fez sua, a quantia de € 14.105,84 (catorze mil cento e cinco euros e oitenta e quatro cêntimos), paga através do cheque n.º --------7, sacado sobre o “Banco W.”, a qual era relativa a montantes devidos à Sociedade “B., Lda.”, que o seu pai entendeu entregar-lhe para acerto de contas

Não tendo sido modificado este ponto da matéria de facto dado como provado, cai pela base a pretendida alteração da decisão de direito veiculada pela apelante, pois que se mostra justificada a referida entrega do quantitativo em causa, não sendo o A. devedor, perante a Ré sociedade, do mesmo.

Improcede, assim, também esta questão. 

Aqui chegados, há que concluir que a apelação é em parte procedente, daqui derivando a absolvição da Ré, sociedade “B., Lda.”, quanto ao pedido formulado pelo A., decorrente da sub-rogação de créditos da sociedade “H., S.A.”, na pessoa deste, no valor de ESC. 14.067.000$00/70.165,90€ (setenta mil cento e sessenta e cinco euros e noventa cêntimos), acrescido dos respectivos juros de mora, atenta a prescrição de tal crédito.

No mais, mantém-se o decidido na sentença recorrida.

Sumário a que alude o art.º 663.º, n.º 7, do CPC:
I–Da análise das cláusulas contratuais que enformavam o contrato e da vontade apurada dos contraentes pôde-se concluir que o instituto jurídico que esteve subjacente ao acordado entre as partes foi uma sub-rogação voluntária de créditos.
II– Por via igualmente da análise das cláusulas de tal contrato e do mais provado e não provado concluiu-se que a sub-rogação em causa apenas abrangia o crédito exequendo cujo pagamento o A. assumiu perante o respectivo credor.
III– A sub-rogação pressupõe a satisfação do crédito, sendo que esta “representa a condição e a medida dos direitos do terceiro sub-rogado” sendo que nos termos do art. 593º, n.º 1 do Código Civil, o sub-rogado adquire, na medida da satisfação dada ao direito do credor, os poderes que a este competiam.
IV– O prazo de prescrição apenas começa a correr na data do cumprimento - pagamento – pelo terceiro, pois que pressupondo a sub-rogação o pagamento, antes deste não se poderá falar dela.
V– Resultando apurado que o contrato que está na origem da sub-rogação se encontra elaborado em face da execução instaurada, dos títulos executivos que lhe subjazem, do crédito exequendo e do que naquela ocorreu, o prazo prescricional aplicável à situação em concreto é o mesmo que era aplicável à sub-rogante, ou seja, três anos, atento o disposto nos artgs. 77º, 32º, 1.º parágrafo, 78º, 1.º parágrafo e 70º, 1.º parágrafo, todos da LULL.
VI– Tendo-se verificado a deserção da instância no processo de execução, nos termos do disposto no 327.º, n.º 2 do CPC, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo, pelo que após a data da deserção da instância (Setembro de 2001), teria o A. o prazo de três anos para exercer o direito que lhe fora sub-rogado, o que não fez, levando assim a que se considere o seu direito prescrito.  

IV–DECISÃO

Assim, face a todo o exposto, os juízes desembargadores que integram o presente colectivo acordam em julgar a apelação em parte procedente, assim revogando em parte a sentença, daqui derivando a absolvição da Ré, sociedade “B., Lda.”, quanto ao pedido formulado pelo A., decorrente da sub-rogação de créditos da sociedade “H., S.A.”, na pessoa deste, no valor de ESC. 14.067.000$00/70.165,90€ (setenta mil cento e sessenta e cinco euros e noventa cêntimos), acrescido dos respectivos juros de mora, atenta a prescrição de tal crédito. No mais, a apelação improcede, mantendo-se o decidido na sentença.
Custas por apelante e apelado, na proporção de 40%, pela primeira e de 60%, pelo segundo.



Lisboa,26-05-2022

                                
                                                        
(José Maria Sousa Pinto)
(João Vaz Gomes)                                                       
(Jorge Leal)
                                                                                                                  

[2]Sublinharemos os segmentos mais significativos de tal decisão, na perspectiva de que terão perfeita interligação com o presente recurso, sendo-lhes por isso aplicáveis os considerandos sobre a natureza e efeitos da figura da sub-rogação.
[3]Por manifesto lapso no acórdão diz-se que o acórdão que se cita é da Relação de Évora, quando na realidade o aresto é da Relação de Lisboa.
[4]Não também qualquer sentido a convocação do estatuído no art. 498º do Código Civil pois que da sua localização sistemática e da conjugação dos art.ºs 483.º a 498.º, que constituem o regime jurídico da responsabilidade por factos ilícitos, se deve concluir que tal normativo se aplica apenas ao exercício dos direitos de indemnização por responsabilidade extracontratual – cf. neste sentido, acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20-11-2014, relator Aristides Rodrigues de Almeida, processo n.º 6582/13.0YIPRT-A.P1.
[5]Os constantes do ponto 10. dos factos provados.