Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
8777/21.3T8LSB.L1-7
Relator: LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA
Descritores: LIBERDADE DE EXPRESSÃO
DIREITO À HONRA E À IMAGEM
OFENSA
DEBATE POLÍTICO
FOTOGRAFIA
EMISSÃO DE RETRATAÇÃO PÚBLICA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/14/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I.–A liberdade de expressão não é um direito absoluto, tendo limites imanentes, devendo ser objecto de restrições para tutela de direitos de personalidade em que incluem o direito à honra, à imagem e à reserva da vida privada e familiar.

II.–A doutrina e a jurisprudência têm enunciado várias teses e metodologias quanto à articulação possível entre a liberdade de expressão, por um lado, e o direito à honra e à imagem, por outro, designadamente: critério da ponderação de bens; critério do âmbito material da norma; critério do princípio da proporcionalidade; critério da concordância prática; critério da restrição de direitos prima facie pela existência de outros direitos prima facie.

III.–Segundo o TEDH, pode haver interesse legítimo na partilha de informações, mesmo que impliquem alguma devassa da privacidade ou intimidade de alguém, relativas a questões de saúde pública, administração da justiça, cumprimento das obrigações fiscais, criminalidade, protecção ambiental ou desporto.

IV.–Segundo o TEDH, a liberdade de expressão abrange, com alguns limites, expressões ou outras manifestações que criticam, chocam, ofendem, exageram ou distorcem a realidade, sendo que os políticos e outras figuras públicas, quer pela sua exposição, quer pela discutibilidade das ideias que professam, quer ainda pelo controle a que devem ser sujeitos, seja pela comunicação social, seja pelo cidadão comum – quanto à comunicação social, o Tribunal vem reiterando mesmo a expressão “cão de guarda” - devem ser mais tolerantes a críticas do que os particulares, devendo ser, concomitantemente, admissível maior grau de intensidade destas.

V.–No que tange à conjugação de tais direitos fundamentais, o STJ entende actualmente ser de exigir um juízo de prognose sobre a hipotética decisão que o TEDH adoptaria se o caso lhe tivesse sido submetido, no sentido de se verificar se é de admitir como muito provável que, se a questão viesse a ser colocada ao TEDH, tal órgão jurisdicional entenderia que a concreta afirmação/imputação extravasaria os limites toleráveis do exercício da liberdade de expressão e informação.

VI.–Inexiste factualidade que sustente a tese de que os autores –ao figurarem na fotografia com o Presidente da República - pretenderam ascender à posição de interlocutores da discussão política nacional. E, muito menos, que tenham de alguma forma prefigurado que, dois anos volvidos, tal fotografia fosse utilizada como arma de arremesso político, no âmbito de um debate televisivo para as eleições presidenciais.

VII.–A figuração dos autores numa fotografia ao lado do Presidente da República constitui um ato voluntário dos mesmos que lhes reforça a autoestima e, do mesmo passo, patenteia que são merecedores de igual tratamento a par dos demais cidadãos por parte do Presidente da República, simbolizando este a cúpula do poder político. O consentimento tácito que assim deram à divulgação pública da fotografia não pode dissociar-se deste contexto e intuitos específicos.

VIII.–Os réus utilizaram a fotografia como arma de segregação social enquanto os autores, ao consentirem na sua captura, visaram dar expressão a um evento (visita do Presidente da República) potenciador da inclusão social dos autores e demais habitantes do Bairro.

IX.–Apesar de no debate político ser admissível o emprego de linguagem mais agressiva, exagerada e excessiva, essa permissividade tem um âmbito subjectivo atinente aos protagonistas da discussão política, não visando primacialmente cidadãos/terceiros que não assumem tal estatuto de interlocutores políticos.

X.–Assumindo os Réus (mormente o 1º) o desiderato político-mediático de defender os direitos das forças policiais, para enfatizar a desconsideração que – no seu entender – o seu adversário de debate político pudesse evidenciar perante tais forças não era necessário trazer ao debate a fotografia dos autores nem recorrer aos qualificativos dos mesmos efectivamente utilizados pelo 1º réu (“bandidos”, “bandidagem”).

XI.–Não pode prefigurar-se um consentimento dos autores para a utilização da fotografia feita pelos réus e, mesmo que ocorresse tal autorização tácita, a manipulação da fotografia feita pelos réus lesou a honra das pessoas retratadas (nº3 do Artigo 79º do Código Civil).

XII.–Não é sindicável a constitucionalidade do segmento da condenação que se reporta à emissão de retractação pública por parte dos réus, sendo certo que a retractação constitui uma medida típica de tutela da personalidade.


Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:


RELATÓRIO


AZ, FC, HC, IC, JL, representado em juízo pelos seus pais, HC e JP, KL e VC vieram propor a presente acção declarativa especial para tutela de personalidade contra 1º Réu e 2º Réu pedindo ao Tribunal que:
1.–Reconheça a ilicitude das ofensas ao direito à honra e ao direito de imagem dos Autores descritas na presente ação, bem como o seu cariz discriminatório em função da cor da sua pele e da sua situação socioeconómica;
2.–Condene cada um dos Réus a emitir uma declaração, escrita ou oral, de retratação pública, a ser publicada nos mesmos meios de comunicação social onde as respetivas declarações e publicações ofensivas dos direitos de personalidade dos Autores foram originalmente divulgadas (SIC, SIC Notícias, TVI e conta do 2º Réu no Twitter), no prazo de 5 dias após o trânsito em julgado da sentença condenatória, com a sanção pecuniária compulsória de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros) por cada dia de atraso no seu cumprimento.
3.–Condene o Réu 2º Réu a eliminar a publicação do dia 22 de janeiro de 2021, às 19:49h, da sua conta oficial na rede social Twitter, que ofende o direito à honra e o direito à imagem dos Autores, no prazo de 5 dias após o trânsito em julgado da sentença condenatória, com a sanção pecuniária compulsória de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros) por cada dia de atraso no seu cumprimento.
4.–Condene cada um dos Réus a abster-se de proferir ou divulgar, no futuro, declarações ou publicações, escritas ou orais, de conteúdo idêntico às declarações ofensivas do bom nome dos Autores em causa na presente ação, com a sanção pecuniária compulsória de € 5.000,00 (cinco mil euros) por cada infração.
5.–Condene os Réus a diligenciar pela publicação da sentença condenatória nos mesmos meios de comunicação social onde as declarações ofensivas foram originalmente divulgadas (SIC, SIC Notícias, TVI e conta do 2º Réu no Twitter), no prazo de 5 dias após o seu trânsito em julgado, com a sanção pecuniária compulsória de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros) por cada dia de atraso no seu cumprimento.
Designada data para a realização da audiência de julgamento veio a mesma a ter lugar com observância das formalidades legais, tendo os Réus apresentado contestação pedindo a sua absolvição de todos os pedidos formulados.

Após julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
«Pelo exposto, julgo extinta a instância por inutilidade superveniente da lide quando à medida de tutela de personalidade requerida em 3. e referente ao segundo Réu.
Quanto ao mais, julgo a acção procedente e, em consequência:
Reconheço a ilicitude das ofensas ao direito à honra e ao direito de imagem dos Autores descritas na presente ação.
Condeno cada um dos Réus a emitir uma declaração, escrita ou oral, de retratação pública, quanto aos factos praticados por cada um deles, a ser publicada nos mesmos meios de comunicação social onde as respectivas declarações e publicações ofensivas dos direitos de personalidade dos Autores foram originalmente divulgadas (SIC, SIC Notícias, TVI e conta do 2º Réu no Twitter), no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado da sentença condenatória, com a sanção pecuniária compulsória de € 500,00 (quinhentos euros) por cada dia de atraso no seu cumprimento.
Condeno cada um dos Réus a abster-se de proferir ou divulgar, no futuro, declarações ou publicações, escritas ou orais, ofensivas do bom nome dos Autores, com a sanção pecuniária compulsória de € 5.000,00 (cinco mil euros) por cada infração.
Condeno os Réus a diligenciar pela publicação da presente sentença, a expensas suas, nos mesmos meios de comunicação social onde as declarações ofensivas foram originalmente divulgadas (SIC, SIC Notícias, TVI e conta do 2º Réu no Twitter), no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado da decisão.
No que diz respeito à publicação da sentença na conta do 2º Réu no Twitter, fixa-se ainda a sanção pecuniária compulsória de € 500,00 (quinhentos euros) por cada dia de atraso no seu cumprimento.»

*

Não se conformando com a decisão, dela apelaram os requerentes, formulando, no final das suas alegações, as seguintes CONCLUSÕES:
A.–«Os Recorridos intentaram ação especial de Tutela da Personalidade contra os Recorrentes pedindo ao Tribunal a quo que (…)
B.–A douta decisão julgou parcialmente procedente a ação: (…)
C.–Os Recorrentes não concordam com tal decisão judicial por uma tríade de razões;
D.–Em primeiro lugar entendem os Recorrentes que a douta sentença padece de nulidade nos termos do disposto no art.° 615.°, n.°1, al. d) do Código do Processo Civil;
E.–A douta sentença não se pronúncia sobre um dos pedidos formulados pelos Recorridos;
F.–No ponto 1 (um) dos pedidos formulados na petição inicial os Recorridos pedem ao Tribunal que avalie e julgue o caracter discriminatório em função da cor da sua pele e da sua situação socioeconómica, das declarações do Recorrente 1º Réu e que lhes atribua um grau elevando de ilicitude e gravidade;
G.–Existe omissão de pronúncia quanto a este pedido formulado pelos Recorridos;
H.–Resulta claramente provado nos presentes autos que não existe expressa ou implicitamente nas declarações do Recorrente 1º Réu ou na imagem publicada pelo Recorrente 2º Réu, quaisquer circunstâncias ou factos que possam levar à conclusão direta, ou indireta, de que os Recorrentes tenham atuado com intenções discriminatórias sobre os Recorridos em função da sua cor ou condições socioeconómicas;
I.–Existindo neste sentido uma omissão de pronúncia por parte da Exma. Sra. Juiz a quo quanto ao pedido formulado pelos Recorridos e que gera nulidade nos termos e para os feitos do disposto no art.° 615.°, n.°1, al. d) do Código do Processo Civil;
J.–O Tribunal a quo tem de apreciar e decidir as questões processuais trazidas aos autos pelas partes - pedidos formulados e exceções deduzidas - e todos os factos em que assentam;
K.–Termos em que se requer a V. Exas. que seja conhecida a alegada nulidade e em consequência deve a mesma ser suprida passando a pronunciar-se a douta decisão no sentido de não se reconhecer o cariz discriminatório em função da cor da sua pele e da sua condição socioeconómica, imputadas aos Recorrentes no âmbito da presente ação;
L.–Também não acompanham os Recorrentes a apreciação da matéria de facto vertida na douta sentença ao considerar que as suas atitudes violaram os direitos de honra e imagem dos Recorridos, por revestirem tais atitudes caracter ilícito;
M.–A douta sentença entende que o Recorrente 1º Réu ultrapassou os limites da sua liberdade de expressão ao exibir a fotografia dos Recorridos no debate televisivo ocorrido no contexto das presidências e que o seu comportamento e discurso se mostraram aptos a atingir a honra e consideração dos Recorridos revestindo, por isso, caracter ilícito;
N.–Fundamentando ainda, não entende ter existido consentimento dos Recorridos para a exibição da sua imagem;
O.–Resulta provado nos autos que os Recorridos em 20 de janeiro de 2019 ficaram publicamente conhecidos na sequência dos confrontos polícias ocorridos no bairro (...), na sequência dos quais foram constituídos arguidos em processo-crime e que motivaram a visita do Presidente da Republica ao mencionado bairro;
P.–Durante a visita “relâmpago” do Senhor Presidente da República, os Recorridos tiraram pelo menos uma fotografia em grupo;
Q.–No dia 6 de janeiro do ano de 2021, durante o debate realizado no âmbito das eleições presidenciais, com o Senhor Presidente da República, MM, o Recorrente, 1º Réu (então candidato à Presidência da República), exibiu uma folha de tamanho A4, em orientação horizontal com a cópia da fotografia dos Recorridos;
R.–E proferiu a seguinte declaração “(...) o candidato MM juntou-se com bandidos, um deles é um bandido verdadeiramente, que tinham atacado uma esquadra policial, e quando o Presidente MM foi ao Bairro (...), foi visitar os bandidos, não foi visitar as polícias.”;
S.–Decorre deste excerto que o Recorrente 1º Réu se refere exclusivamente a uma das pessoas constantes da fotografia que é por si exibida, “um deles é um bandido verdadeiramente”;
T.–Pelo que não se acompanha a decisão quando afirma que o Recorrente se refere nas suas declarações e expressões - bandido e bandidagem - a todos os Recorridos;
U.–Resulta igualmente provado na pressente ação que o Recorrente 1º Réu não foi o autor da fotografia e a mesma já tinha sido exibida em muitas ocasiões nos dois anos anteriores à realização do debate televisivo:
V.–Não podemos acompanhar o entendimento da Exma. Sra. Juiz a quo quando afirma que “Em análise podemos dizer que o ato de exibição da fotografia que se sabe não ter sido tirada pelo Réu e que já havia sido exibida em ocasiões anteriores, só se torna relevante através da palavra falada na qual o Réu diz quem é e anuncia o seu propósito.”;
W.–Esta provado que até ao dia 6 de janeiro de 2021 (data da realização do debate televisivo no âmbito das eleições presidenciais entre o então candidato 1º Réu e o Presidente da República MM), os Recorridos foram alvo de inúmeras publicações nos órgãos de comunicação social e redes sociais, deram muitas entrevistas, exclusivamente por factos imputáveis a si próprios e/ou outras entidades e pessoas envolvidas;
X.–O Recorrente não manipulou, deturpou ou inventou imagens ou factos respeitantes aos Recorridos;
Y.–Não se sufraga o entendimento da douta sentença quando afirma que o Recorrente 1º Réu instrumentaliza a imagem dos recorridos para representar um grupo de bandidos;
Z.–As declarações do Recorrente não são uma divulgação de factos, mas sim uma repetição de factos respeitantes aos recorridos amplamente divulgados durante dois anos nos órgãos de comunicação social;
AA.–Deste modo, é forçoso concluir que o Recorrente 1º Réu apenas divulgou factos verdadeiros e públicos sendo justificada e proporcional essa divulgação;
BB.–E neste sentido vamos também contra a douta decisão quando entende que no caso concreto prevalece o direito à honra dos Recorridos sobre o direito à liberdade de expressão e pensamento dos Recorrentes, condenando-os com esse mesmo fundamento;
CC.–Os Recorrentes, apenas fizeram uso do seu direito à liberdade de expressão, que é particularmente alargado no âmbito do debate político;
DD.–Ao tirar aquela fotografia, voluntária e conscientemente tendo em conta o contexto fatídico da altura, com o então Presidente da Republica e, posteriormente, candidato às presidenciais, os Recorridos passam a figurar como elementos de interesse no meio do debate político;
EE.–Não podendo acompanhar-se o argumento de que os Recorridos são pessoas anónimas e que as declarações do Recorrente 1º Réu no debate exibido dia 6 de janeiro de 2021 os sujeitou a escrutínio público;
FF.–Resulta assim suficientemente demonstrado que os Recorridos desde 20 de janeiro de 2019, voluntariamente, tudo fizeram para assumirem uma posição de figuras mediáticas, participando em entrevistas e deixando-se fotografar, tendo, inclusivamente, tomado a iniciativa de introduzir fotos (como a imagem aqui em questão) nas redes sociais;
GG.–A exibição de tal imagem tem fundamento, e ao contrário do entendimento vertido na douta decisão, não foi objetivo ofender, descriminar ou marginalizar os Recorridos, mas sim, dentro do contexto histórico dos problemas ocorridos no Bairro (...) em janeiro de 2019 demonstrar que mais uma vez que os órgãos de polícia criminal foram descurados nos seus diretos e da sua imagem;
HH.–Com efeito, nos termos do disposto no art.° 37.°, n.°1 da Constituição da República Portuguesa, “todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem descriminações.”;
II.–O que nos leva forçosamente a concluir que andou mal o Tribunal a quo ao aplicar o direito ao caso concreto, pois que no presente caso o seu entendimento representa violação do disposto no art.° 37.°, n.°1 da Constituição da República Portuguesa, assim como do citado artigo 10.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e em consequência viola o direito de expressão dos Recorrentes;
JJ.–Não acompanhamos igualmente o entendimento da Exma. Sra. Juiz a quo quando afirma considerar que o Recorrente nas suas declarações durante o debate político se refere aos Recorridos como “pessoas que vieram para Portugal para beneficiar única e exclusivamente daquilo que é o Estado Social e daquilo que o Estado lhes pode dar”;
KK.–Resulta claro da audição das declarações na sua globalidade, assim como das declarações parte do próprio Recorrente, que este se referia aos muitos moradores do Bairro (...) que vivem em benefício daquilo que o Estado lhes provem, sem esforço, sem trabalho, através de subsídios. Não se referia aos Recorridos em concreto;
LL.–Não se acompanha também a douta decisão no que respeita à questão da necessidade de os Recorridos prestarem consentimento aos Recorrentes para estes fazerem uso da sua imagem e consequentemente não colhe, no nosso entendimento, a conclusão de que tenham os Recorrentes violado o direito à imagem dos Recorridos;
MM.–A imagem (fotografia) foi tirada a dia 4 de fevereiro de 2019 com consentimento dos Recorridos e divulgada também com seu consentimento;
NN.–Quando o Recorrente 1º Réu faz exibição da imagem (6 janeiro de 2021) já a imagem tinha revestido caracter público e, diga-se mesmo, que de interesse público nacional;
OO.–Por um lado, em alusão aos acontecimentos do Bairro (...), por outro, porque os próprios Recorridos iniciaram um movimento decorrente dos incidentes e o tornaram público, mas principalmente porque a família fotografada junto do Presidente da República esteve envolvida nos acontecimentos policiais que motivaram a visita ao Bairro (...) por parte do Presidente da República;
PP.–Portanto, no contexto geral de todos os acontecimentos relatados temos forçosamente que concluir que o Recorrente 1º Réu, o Recorrente 2º Réu ou qualquer outra pessoa tivesse que pedir aos Recorridos consentimento para fazer uso daquela imagem;
QQ.–O consentimento dos Recorridos para a exibição da imagem em questão foi expresso;
RR.–Pelo que entendemos que a Exma. Sra. Juiz a quo, também aqui, aplicou mal o direito ao caso concreto quando entende que não se pode enquadrar a presente situação na exceção prevista no art.° 79.°, n.°2 do Código Civil e consequentemente considera que os Recorrentes violaram o direito à imagem dos Recorridos;
SS.–Da omissão de comportamento/reação dos Recorridos perante a divulgação da sua imagem (através de vídeos, fotografias) nos meios de comunicação social durante dois anos conduz forçosamente à conclusão de que aqueles consentiram expressamente a sua utilização e difusão;
TT.–De onde resulta claro que os aqui Recorrentes não necessitavam de consentimento expresso dos recorridos para fazer uso da sua imagem;
UU.–Por todo exposto somos do entendimento de não ter existindo no caso concreto ofensa à honra ou ao direito à imagem dos Recorridos;
VV.–Quanto à ação de divulgação na sua conta na rede social Twitter do Recorrente 2º Réu da imagem do cartaz da campanha de 1º Réu que se descreve no ponto 74 dos factos provados e que inclui na sua montagem a fotografia dos Recorridos também não se acompanha a douta sentença;
WW.– Ficou provado que o Recorrente 2º Réu não foi o autor da imagem ou do seu conteúdo e que apenas partilhou tal imagem no contexto de apoio à campanha presidencial do Recorrente 1º Réu, como centenas de outras pessoas;
XX.–A divulgação de imagem de uma pessoa, por si só, não gera violação dos seus direitos de personalidade;
YY.–Para que tal aconteça tem que estar reunidos os pressupostos legais do instituto da Responsabilidade Civil, previstos nos artigos 483.° e seguintes do Código Civil;
ZZ.–Para haver responsabilidade civil, para além do facto ilícito e culposo é necessária a ocorrência de dano, pois sem este não haverá lugar a responsabilidade civil e que os danos causados sejam imputáveis ao autor do facto;
AAA.–Dos presentes autos resulta provado que os Recorrentes não fizeram uso ilícito da imagem dos Recorridos, não proferiram declarações falsas, de caracter manifestamente ofensivo da honra destes e, muito menos, discriminaram os Recorridos em razão da sua cor de pele ou da sua condição socioeconómica;
BBB.–Do presente processo não resultou a existência de dano para os Recorridos;
CCC.–Por último, entendem os Recorrentes que no caso vertente a condenação à emissão de pedido de desculpas é inconstitucional, por violar o preceituado no artigo 37.° da Constituição da República Portuguesa;
DDD.–Condenar um Partido Político e um Dirigente Político, num contexto de expressão de defesa de ideologias políticas é um atentado à democracia;
EEE.–Por todo o vertido não é por isso possível acompanhar o entendimento da douta sentença que julga os Recorrentes, condenando-os, por considerar o carácter ilícito das suas atitudes;
FFF.–Sendo forçoso concluir-se que andou mal o Tribunal a quo ao condenar os Recorrentes a emitir declarações, escrita e oral, de retratação pública, quanto aos factos praticados por cada um deles, a ser publicada nos mesmos meios de comunicação social onde as respetivas declarações e publicações ofensivas dos direitos de personalidade dos recorridos foram originalmente divulgadas (SIC, SIC Noticias, TVI e conta do 2º Réu no Twitter), no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado da sentença condenatória, com a sanção pecuniária compulsória de €500,00 (quinhentos euros) por cada dia de atraso no seu comportamento; a abster-se de proferir ou divulgar, no futuro, declarações ou publicações, escritas ou orais, ofensivas do bom nome dos recorridos, com a sanção pecuniária compulsória de € 5.000,00 (cinco mil euros) por cada difamação; a diligenciar pela publicação da presente sentença, a expensas suas, nos mesmos meios de comunicação social onde as declarações ofensivas foram originalmente divulgadas (SIC, SIC Noticias, TVI e conta do 2º Réu no Twitter) no praz de 30 dias após o trânsito em julgado da decisão e no que respeita à publicação da sentença na conta do 2º Réu no Twitter, fixou-se ainda a sanção pecuniária compulsória de €500,00 (quinhentos euros) por cada dia de atraso no seu cumprimento, devendo ser revogada a decisão por outra que absolva os recorridos de todos os pedidos formulados;
GGG.–Impugnando-se na íntegra a decisão recorrida pede-se a V. Exas. que revoguem a mesma, por decisão que absolva os Recorrentes de todos os pedidos formulados na ação.
Termos em que,
Deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência deve ser a decisão judicial proferida que declarou parcialmente procedente a ação interposta pelos Recorridos e condenou-os reconhecendo a ilicitude das ofensas ao direito à honra e ao direito de imagem dos Recorridos descritas na presente ação, condenando cada um dos Recorrentes a emitir declarações, escrita e oral, de retratação pública, quanto aos factos praticados por cada um deles, a ser publicada nos mesmos meios de comunicação social onde as respetivas declarações e publicações ofensivas dos direitos de personalidade dos Recorridos foram originalmente divulgadas (SIC, SIC Noticias, TVI e conta do 2º Réu no Twitter), no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado da sentença condenatória, com a sanção pecuniária compulsória de €500,00 (quinhentos euros) por cada dia de atraso no seu comportamento; condenando cada um dos Recorrentes a abster-se de proferir ou divulgar, no futuro, declarações ou publicações, escritas ou orais, ofensivas do bom nome dos Recorridos, com a sanção pecuniária compulsória de € 5.000,00 (cinco mil euros) por cada difamação, condenando os Recorrentes a diligenciar pela publicação da presente sentença, a expensas suas, nos mesmos meios de comunicação social onde as declarações ofensivas foram originalmente divulgadas (SIC, SIC Noticias, TVI e conta do 2º Réu no Twitter) no praz de 30 dias após o trânsito em julgado da decisão, no que respeita à publicação da sentença na conta do 2º Réu no Twitter, fixou-se ainda a sanção pecuniária compulsória de €500,00 (quinhentos euros) por cada dia de atraso no seu cumprimento, REVOGADA e ALTERADA por outra que absolva os Recorrentes de todos os pedidos formulados na petição inicial, com as legais consequências.
V. Exas. farão a acostumada Justiça!»

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Contra-alegaram os apelados, propugnando pela improcedência da apelação.

QUESTÕES A DECIDIR

Nos termos dos Artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo um função semelhante à do pedido na petição inicial.[1] Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso, v.g., abuso de direito.[2]

Nestes termos, as questões a decidir são as seguintes:
i.-Nulidade da sentença por omissão de pronúncia (conclusões D a K);
ii.-Limites da liberdade de expressão do 1º Réu (conclusões M a T, BB a KK);
iii.-Violação do direito de imagem dos autores (conclusões U a AA, LL a BBB);
iv.-Inconstitucionalidade da condenação à emissão de pedido de desculpas (conclusões CCC a FFF).

Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença sob recurso considerou como provada a seguinte factualidade:
1.-Os Autores são membros da mesma família e residem no Bairro (...), popularmente conhecido como “Bairro (...)”: um conjunto de prédios inacabados, onde faltam condições básicas de segurança e de habitabilidade, na freguesia de (...), conjuntamente com outras famílias
2.-No dia 4 de fevereiro de 2019, o Presidente da República, MM, visitou de surpresa e apenas durante breves momentos, o Bairro (...), onde foi fotografado, entre outros, com os Autores da presente ação.
3.-A fotografia foi, naquela altura, divulgada em alguns órgãos de comunicação social, no contexto da notícia da “visita-relâmpago” do Presidente da República ao Bairro (...), na sequência de um episódio mediático de confrontos violentos com a polícia, naquele local, no dia 20 de janeiro de 2019.
4.-Os acontecimentos do dia 20 de janeiro de 2019 deram origem a um processo, no qual estão constituídos arguidos e simultaneamente assistentes, entre outros, um agente da PSP e três dos sete Autores da presente ação – HC, IC e KL.
5.-Atualmente, o processo encontra-se pendente e a correr os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo Central Criminal de Almada – Juiz 1, com o número de processo (...).
6.-Dois anos volvidos, por ocasião da candidatura de 1º Réu à Presidência da República nas eleições de 24 de janeiro de 2021, com o apoio declarado do 2º Réu, os Réus exibiram a fotografia suprarreferida, para efeitos de campanha eleitoral.
7.-1º Réu foi candidato às eleições presidenciais de 24 de janeiro de 2021, com o apoio do 2º Réu, e participou, nessa qualidade, num debate contra o atual Presidente da República, MM, realizado em sinal aberto no canal SIC e em simultâneo no canal SIC Notícias, no passado dia 6 de janeiro de 2021.
8.-O debate iniciou-se às 21 horas do referido dia e logo nos primeiros minutos, entre as horas 21:04 e 21:05, 1º Réu precipita a seguinte intervenção: “...Mas eu, sobre a questão da Direita social e securitária, gostava de mostrar ao candidato MM esta fotografia, vamos ver se ele se recorda disto...”
9.-Com as câmaras focadas em si, 1º Réu ergueu uma folha de tamanho A4, em orientação horizontal, com a fotografia dos Autores com o Presidente da República.
10.-Perguntou, então: “Gostava de perguntar se ele se recorda desta fotografia...”, ao que MM respondeu, “Sim.”
11.- Continuando a apresentar a fotografia para o seu adversário de debate e para as câmaras, 1º Réu afirma, finalmente: “Ora, esta fotografia mostra tudo o que a minha Direita não é. Nesta fotografia, o candidato MM juntou-se com bandidos, um deles é um bandido verdadeiramente, que tinham atacado uma esquadra policial e quando o Presidente MM foi ao Bairro (...), foi visitar os bandidos, não foi visitar as polícias. Eu represento a Direita, não a Direita que está de mãos dadas com o Partido Socialista, mas a Direita que nunca vai deixar os polícias, as forças de segurança, estarem sozinhas e esta fotografia não engana... Porque esta fotografia que está aqui, eu creio que o candidato MM reconhecerá a veracidade da fotografia, não foi tirada depois na esquadra de polícia, foi tirada só, entre aspas e vão me desculpar a linguagem, à bandidagem. E, portanto, talvez seja aqui uma diferença entre nós: eu não tenho medo de ser politicamente incorreto, de lhes chamar os nomes que têm de ser chamados e dizer o que tem de ser dito. O Presidente MM e agora candidato, gosta de se dizer de Direita, mas, na verdade, quer estar de mãos dadas com o eleitorado do Bloco de Esquerda, do PCP, do PS e depois dá nisto... Dá em fotos como esta, que eu acho que ninguém à Direita pode ficar feliz de a ver.”
12.-Em resposta, MM discursou: “Ora bom, a minha Direita é uma direita social. É uma direita que não distingue os portugueses entre os bons e os bandidos: “e com os bandidos não nos damos; e não vamos a bairros de bandidos; e todos os que vivem nesses bairros são bandidos”. Isso é o contrato da inclusão, isso é o contrato do que deve ser um candidato presidencial. Um candidato presidencial deve ser um integrador; o separar logo os bons e os maus... Ainda ninguém foi condenado, ainda não há nenhuma decisão da Justiça... E eu fui lá, e fui lá como fui a muitos outros bairros, para mostrar que o Presidente da República não tem medo de ir a qualquer dos bairros, vai tão depressa a bairros de ciganos, como vai de africanos, como vai daqueles que não o são, vai, de europeus, de europeus dos mais variados e vai, vai e não discrimina. E eu fui lá e não disse uma palavra sobre o que se tinha passado; fui falar, daquilo... Não é um caso de polícia. A (...) é um caso social. É um caso social. É um caso de injustiça social. E é desse caso de injustiça social de que um Presidente da República não pode divorciar-se. Não pode. Não pode... Eu tiro muitas fotografias em esquadras de polícia.... Outras... Mas estive em esquadras de polícia. Agora, ali, eu sei o que é Chefes de Estado com naturais seus, vivendo lá, porque havia cabo-verdianos, angolanos e ciganos, o que é que eles me disseram, e o que é que se disse nesses países, e o que se pensou sobre Portugal, e eu disse “Não! Nós não discriminamos. Nós incluímos. Nós integramos” (...)”
13.-Até que 1º Réu interrompe: “E isso para si foi mais importante que os portugueses...”
14.-Seguiu-se a reação de MM: “Não, não foi mais importante. Eles são tão importantes porque são portugueses. Essa distinção diz tudo sobre si. Portugal é feito, oh senhor deputado, Portugal é feito, desde sempre, de povos que vieram... de germânicos, de África, vieram de todos os pontos do mundo, não há portugueses puros. Não há portugueses puros e impuros. E um Presidente da República não pode distinguir entre portugueses puros e impuros. Não pode. Não pode. Dá votos, mas não pode...”
15.-Por fim, 1º Réu remata: “É que isso não é... Ser verdadeiramente Presidente dos portugueses de bem. É a velha conversa do Presidente de todos os portugueses. Mas esta foto, Senhor Presidente, e eu admito isso, sabe? Eu nunca vou ser Presidente dos traficantes de droga, nunca vou ser Presidente dos pedófilos, nunca vou ser Presidente dos que vivem à conta do Estado, com esquemas de sobrevivência paralelos, enquanto os portugueses de bem pagam os seus impostos, todos os dias a levantar-se de manhã à tarde para os pagar e o que fez aqui não tem nenhuma justificação...”
16.-Continua 1º Réu, enquanto volta a mostrar a fotografia dos Autores com o Presidente da República para as câmaras: “...Com qualquer Chefe de Estado estrangeiro, nem com o que se pense lá fora nem cá dentro, um Presidente da República, na minha perspetiva, antes de mais, tem de dar um sinal a esses portugueses, porque foram esses portugueses, são esses portugueses que sustentam a economia portuguesa, são esses que sustentam Portugal, muitos destes indivíduos [apontando novamente para a fotografia dos Autores] vieram para Portugal para beneficiar única e exclusivamente daquilo que é o Estado Social e daquilo que o Estado lhes pode dar e o Senhor Presidente diz aqui que acha normal ir a um bairro destes porque se não iam dizer... Que vivem lá ciganos, vivem lá afrodescendentes, etecetera, mas não era capaz de dar um sinal à polícia que estava ao lado deles...”
17.-Nenhum dos Autores foi prévia ou posteriormente contactado – por 1º Réu ou por qualquer outra pessoa – a fim de recolher o seu consentimento para a divulgação da sua imagem no contexto deste debate.
18.-1º Réu desconhece qualquer um dos Autores da presente ação.
19.-Nunca se conheceram pessoalmente, nunca trocaram qualquer tipo de correspondência, não têm amigos ou conhecidos em comum, nem frequentam os mesmos espaços ou círculos sociais.
20.-Os Autores desconhecem, tanto quanto sabem, qualquer militante ou dirigente do 2º Réu e são totalmente alheios à sua organização.
21.-AZ, FC, JL e VC têm nacionalidade portuguesa.
22.-HC, IC e KL têm título de residência válido em Portugal –– e cá residem há quase década e meia
23.-1º Réu prestou declarações ao Jornal Sol de 6 de fevereiro de 2021, em que volta a usar as palavras “bandidos” e “bandidagem”, afirmando: “Vou exigir a todos os candidatos autárquicos o registo criminal. Quero garantir que não há bandidagem no 2º Réu
24.-Estas declarações foram divulgadas pelo 2º Réu na sua conta Oficial no Twitter
25.-Em 18 de Janeiro de 2021, os certificados do registo criminal de AZ, FC, HC, KL, e VC não têm qualquer inscrição
26.-O Autor IC tem inscrições no seu registo criminal, tendo sido condenado em três ocasiões, por crime de desobediência, tráfico de menor gravidade e condução sob influência de álcool, praticados, respetivamente, em 01/08/2015, 20/10/2015 e 02/05/2019, sem menções de reincidência, já tendo cumprido as penas aplicadas.
27.-No processo pendente no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo Central Criminal de Almada, supra melhor identificado, onde são partes três dos sete Autores da presente ação, está em causa um episódio de suposta violência policial que ocorreu no Bairro (...), na sequência de uma intervenção policial no local para resolver desacatos entre moradores, e que gerou posteriormente polémica devido à publicação de um vídeo no YouTube com filmagens dos acontecimentos.
28.-Os Autores não são acusados, no âmbito desse processo ou de qualquer outro, de ter atacado uma esquadra policial.
29.-Na sequência dos incidentes ocorridos que deram origem ao processo supramencionado, gerou-se uma onda de indignação popular que culminou em manifestações contra o racismo e a violência policial, em Lisboa.
30.-Após as manifestações, o Diário de Notícias relatou a ocorrência de ataques a uma esquadra em ..., no Bairro ...: “Segundo a PSP, a esquadra ..., em ..., também foi atingida por três daqueles engenhos incendiários. Registaram-se danos na esquadra e numa viatura civil. Os responsáveis não foram detidos e a PSP está a investigar ambas as ocorrências. Na segunda-feira quatro pessoas foram detidas após o lançamento de pedras contra a PSP, numa manifestação em Lisboa de protesto contra atos de suposta violência policial ocorridos domingo no Bairro (...), no (...).
31.-Vários artigos de notícias em órgãos de comunicação social relacionaram o ataque à esquadra no Bairro ..., em ..., como podendo ter sido “retaliação aos incidentes ocorridos no bairro da (...), no (...)” – como escreveu a Revista Sábado.
32.-A Autora VC e o Autor JL (hoje com 6 anos) nasceram em Portugal
33.-Por outro lado, quando “vieram para Portugal” as Autoras AZ e HC tinham 16 e 13 anos, respetivamente, tendo imigrado por decisão dos seus pais e não por motivação própria.
34.-Os Autores FC e KL, e seu filho maior, o Autor IC, à época com 21 anos decidiram vir para Portugal.
35.-Atualmente, FC tem 65 anos e com o 9.º ano de escolaridade trabalha como segurança para a (…) desde 2017, estando alocado à portaria do Centro de Saúde de (...), onde tem ajudado nas logísticas do combate à pandemia COVID- 19 e do processamento de doentes não-covid.
36.-KL tem hoje 55 anos e com o 5.º ano de escolaridade trabalha como técnica da limpeza para a empresa ... – ... ..., S.A., continuando a trabalhar presencialmente mesmo durante a pandemia da COVID-19.
37.-Nem FC nem KL beneficiam de qualquer prestação de apoio social por parte do Estado português, nem a título individual nem dos seus filhos dependentes.
38.-A Autora HC, o seu filho menor, também Autor, JL, e o Autor IC, também não recebem qualquer apoio por parte do Estado português.
39.-A Autora VC, é operadora de call center na empresa (…), desde 2011, e apenas recebe, desde 2020, um subsídio por doença profissional, indexado ao seu salário, por estar incapacitada de trabalhar até à realização da cirurgia que aguarda desde 2018 –.
40.-Recebe também uma prestação de abono de família de crianças e jovens, em nome dos seus sete filhos.
41.-As prestações têm os valores mensais de € 37,46 por cada um dos cinco filhos mais velhos e de € 224,77 por cada um dos dois filhos mais novos, a que acresce o valor de € 63,01 pela deficiência de uma das suas filhas.
42.-A Autora AZ recebe o Rendimento Social de Inserção (€ 276,33 por mês), recebendo adicionalmente uma prestação de abono para crianças e jovens em nome dos seus dois filhos menores (€ 97,42 por mês por ambos).
43.-A Autora AZ está inscrita no Centro de Emprego do (...) e ativamente à procura de emprego, após ter ficado desempregada na sequência das restrições à atividade económica do sector da restauração no âmbito do combate à pandemia COVID-19.
44.-Existe uma fotografia do mesmo dia de MM apenas com o Autor IC.
45.-1º Réu tem formação académica, tendo terminado a sua Licenciatura em Direito com 19 valores na Faculdade de Direito da Universidade (…), onde posteriormente lecionou, e é doutorado em Direito Público pela National University of Ireland desde 2011;
46.-Tem um percurso na política nacional associado ao Partido ... ..., tendo sido vereador na Câmara Municipal ... entre 2017 e 2018; foi consultor num dos principais escritórios de advocacia do país, a “... ...”; foi colonista habitual do jornal diário mais lido do país, o Correio Manhã; foi comentador desportivo entre 2014 e 2020 na CMTV; é atualmente um líder partidário com um foco de atenção na comunicação social de tal ordem que permitiu o “M... L...” da Universidade ....., qualificá-lo como uma “celebridade mediática”.
47.-Na manhã do dia seguinte ao debate, no Semanário Expresso escrevia que o debate entre MM e 1º Réu “bateu os recordes de audiência dos anteriores debates presidenciais, atingindo números invulgares e geralmente só obtidos por grandes jogos de futebol”.
48.-Segundo um estudo da GFK27, perto de 1,7 milhões de espectadores acompanharam o debate em direto no canal SIC
49.-Adicionalmente e de acordo com o mesmo estudo, através da SIC Notícias estiveram mais 145 mil pessoas a assistir ao debate.
50.-De acordo com outra agência de sondagens, a Universal McCann29 do grupo IPG Mediabrands, o frente-a-frente entre 1º Réu e MM transmitido pelo canal SIC foi visto por 1,834 milhões de telespetadores.
51.-A Universal McCann estima também que o debate transmitido através da SIC Notícias contou com uma audiência média adicional de 247.300 espectadores.

52.-Imediatamente após debate, o Diário de Notícias escrevia: “(...) 1º Réu respondeu com uma fotografia da visita de MM ao bairro (...), onde, acusou o líder do 2º Réu, "MM foi visitar os bandidos, não foi visitar os polícias". "Não foi tirar depois a foto na esquadra de polícia, foi só tirar com a bandidagem", "Diz que é de direita, mas depois quer andar de mãos dadas com o Bloco de Esquerda, com o PS e com todos" (...) Antes, a foto de MM no bairro da (...) tinha servido a 1º Réu para afirmar: "Nunca vou ser Presidente dos traficantes de droga ou de pedófilos. Isso não é ser verdadeiramente Presidente dos portugueses de bem. O que fez aqui não tem qualquer justificação."
53.-No JN, pode ler-se: “O tom cordato inicial - 1º Réu elogiou o seu oponente por ter dito que não ilegalizaria o seu partido, ao contrário das candidatas M... e A... - não demorou muito a ficar para trás quando o presidente do 2º Réu confrontou MM com uma fotografia sua no Bairro (...), ao lado de alguns moradores que viriam a ser posteriormente condenados, apelidados de "bandidos" pelo candidato. "Eu represento a direita que não deixa as pessoas de bem sozinhas. Gosta de se dizer da direita, mas está sempre de braço dado com o Bloco e os outros partidos de esquerda", reforçou.
54.-No site da TSF consta: “1º Réu acusou, esta noite, MM de "se juntar com bandidos" e de quando foi o Bairro (...) não ter visitado os polícias.”.
55.-Na TVI24, noticiou-se: “1º RÉU MOSTRA FOTOGRAFIA DE MM NO BAIRRO (...) COM "BANDIDOS” e “De seguida, 1º Réu prossegue em mostrar uma fotografia de MM no Bairro (...), acusando-o de estar com "bandidos". "Esta fotografia mostra tudo o que a minha direita não é ", destacou o candidato de extrema-direita.
56.-Também o jornal Sol noticiou: “MM acusa 1º Réu de demagogia e líder do 2º Réu cola Presidente a “bandidos”: “Para o recandidato presidencial "não há portugueses puros e impuros." A frase surgiu depois de 1º Réu ter mostrado uma foto de MM com várias pessoas no Bairro (...). O episódio ocorreu depois de uma intervenção policial muito polémica. 1º Réu perguntou a MM porque não foi visitar também a esquadra da polícia visada neste processo. A pergunta vinha com um propósito: 1º Réu quis dizer que MM juntou-se a "bandidos" ou a bandidagem.”
57.-Também a Visão fez referência a este episódio, no seu website, qualificando-o como “tema quente” do debate, a par da SIC Notícias e do Correio da Manhã.
58.-Notícias de conteúdo semelhante foram posteriormente reproduzidas na imprensa escrita desse dia e dessa semana, das quais se destacam as edições diárias do jornal Público e do jornal Correio da Manhã de 7 de janeiro de 2021.
59.-A divulgação das declarações em causa foi também feita através das redes sociais.
60.-Na conta oficial do 2º Réu na rede social Twitter – que conta com mais de 23 mil seguidores – foi feita uma publicação, no dia 6 de janeiro de 2021, acompanhada por vídeo com um excerto do debate, onde 1º Réu mostra a fotografia dos Autores com o Presidente da República, divulgando uma passagem da intervenção de 1º Réu: “MM esteve ao lado dos bandidos no Bairro (...)...”
61.-No website Youtube podem encontrar-se vários vídeos onde são reproduzidas e comentadas aquelas declarações de 1º Réu a respeito dos Autores, somando, até à presente data, milhares de visualizações.
62.-As declarações de 1º Réu foram também alvo de algumas reações de indignação.
63.-Assim, no Observador foi noticiada a reação do jogador de futebol RL na sua conta de Twitter, onde pode ler-se: “Mas nem isso fez com que RL, que antes de chegar ao AC Milan jogou nos franceses do Lille em 2018/19 após ter feito toda a formação no Sporting, condenasse aquilo que considera ser a injustiça das palavras de 1º Réu. “Por ser um bairro social não quer dizer que toda gente seja um bandido, antes de ser bandido são pessoas, são humanos independentemente da cor!!”, escreveu o jovem avançado na sua conta oficial no Twitter, acompanhado do vídeo onde o líder do 2º Réu aponta o dedo à “bandidagem” do bairro onde cresceu.”
64.-A mesma notícia foi publicada no site Mais Futebol
65.-No jornal Público, PP escreve um artigo publicado a 8 de janeiro de 2021: “É totalmente inaceitável que no debate com MM tenha mais uma vez violado a Constituição ao usar de forma abusiva uma foto de um grupo de sete pessoas do Bairro (...), sem nenhum respeito pelos homens, mulheres e até uma criança que estavam com o Presidente, que as visitou na sequência de acontecimentos de violência policial. (...) Ao mostrar a fotografia, disse com toda a impunidade que se tratava de uma foto com “a bandidagem”. Dizer isto de pessoas que não se conhece, tenham ou não cadastro, e que certamente não será o caso da criança, é uma vergonha para quem quer ser Presidente da República e tem um cargo eletivo no Parlamento. É inaceitável que o candidato 1º Réu faça uma demonstração tão abusivamente xenófoba e racista através da televisão, que inclui nesses comentários infelizes uma criança, violando de forma grosseira a Constituição da República em muitos dos seus artigos. (...) Quem o autorizou a utilizar a foto com todas aquelas pessoas para lhes chamar bandidos? Que autoridade tem para destruir o bom nome e reputação de todas aquelas pessoas, incluindo de uma criança? Quem o autorizou a destruir a reserva de intimidade privada e familiar das pessoas na foto, mostrada para centenas de milhares de pessoas em todo o país?
66.-Na Rádio Renascença, no programa “Extremamente Desagradável” do dia 11 de janeiro de 2021, é reproduzida o excerto do programa “ “ infra transcrito, seguindo dos seguintes comentários: “Aqui se prova mais uma vez que para 1º Réu as pessoas negras são todas iguais, não é? Só um deles é que foi condenado por um crime, mas 1º Réu acha que são todos, não consegue distinguir, pronto, é um problema...”
67.-No dia seguinte ao debate com o Presidente da República, a 7 de janeiro de 2020, 1º Réu participou no programa “ “, com o apresentador MG, transmitido em direto a partir das 16:10 horas, em canal aberto, desta vez no canal TVI.
68.-A meio da entrevista, MG confronta 1º Réu com a fotografia dos Autores com o Presidente da República e questiona-o: “Ontem não foi injusto quando apresentou esta fotografia ao Presidente MM, eu ouvi a palavra “bandidos” ... Eu vejo aqui quatro mulheres, vejo um homem que possivelmente tem a minha idade, vejo uma criança e vejo um jovem. Bandidos?
69.-Ao que 1º Réu respondeu: “Olhe, este individuo já tinha sido condenado, por crimes, que está aqui no meio, abraçado ao Presidente e isto é na zona, provavelmente com relações variadas com as pessoas...”
70.-Seguindo-se um curto diálogo entre ambos: MLG: “Estas mulheres são bandidas?” AV: “Bom, eu disse nesta zona, os bandidos e estava-me a referir a...” MLG: “Mais uma vez está a tomar a nuvem por Juno... “ AV: “Não, estava-me a referir a este indivíduo que aqui está, de camisola vermelha, já tinha sido condenado e isso aliás até foi notícia depois... Manuel, não podemos ter um Presidente, que uma esquadra é atacada e que vai ter com a bandidagem em vez de ir ter com os polícias. É um péssimo sinal à democracia.”
71.-A emissão do programa “ “ de 7 de janeiro de 2021 registou 4,9% de rating, 18,6% de share e cerca de 460 mil telespectadores em direto.
72.-Na antevéspera das eleições presidenciais, a 22 de janeiro de 2021, às 19:49h – mais de duas semanas volvidas desde o debate com o Presidente da República e da participação de 1º Réu programa “ “ – o 2º Réu publicou, na sua conta na rede social Twitter, a fotografia dos Autores com MM a que se referem os presentes autos, incluída numa montagem original de campanha para a candidatura de 1º Réu que procura ilustrar a diferença entre os candidatos: MM está ao lado dos Autores que são pessoas negras enquanto 1º Réu está ao lado de homens brancos, membros do “Movimento Zero” na manifestação em frente à Assembleia da República no dia 22 de novembro de 2019; a separar na horizontal as duas imagens está a frase: “Eu prefiro os portugueses de bem”, constando na margem inferior da montagem os dizeres “Vota 1º Réu”
73.-No Diário de Noticias on-line (consulta em www.dn.pt/pais/detido-do-bairrro-da-(...)-sai- em-liberdade-10467070.html), de 21 de janeiro de 2019 publica a notícia com o seguinte título “Detido do bairro (...) sai em Liberdade”, identificando o Autor IC como o único detido na sequência do episódio de violência entre agentes da PSP do (...) e moradores do Bairro (...).
74.-O envolvimento do Autor IC nos desacatos ocorridos no Bairro (...) no dia 20 de janeiro de 2019 e a sua detenção foram publicitados e noticiados, assim como foi largamente difundida a sua imagem através de vídeos e fotografias, pelos meios de comunicação social, nomeadamente no telejornal da CMTV do dia de 20 de janeiro de 2019 das 13:00 horas e SIC Noticias, telejornal das 13:00 horas do dia 20 de janeiro de 2019.
75.-O jornal Expresso de 5 de fevereiro de 2019 publica artigo com o seguinte título “Selfies de MM no bairro (...) indignam agentes da PSP
76.-Nesta notícia publicada no Expresso é possível ler-se que “Fontes da PSP garantem que IC já foi detido várias vezes, por tráfico de heroína, tentativa de roubo ou por participação num motim contra a polícia, em 2009. Existe ainda um vasto rol de crimes anteriores não referenciados nesta lista que ainda hoje se arrastam em diligências processuais”, confidencia um responsável.”.
77.-O conhecido registo criminal do Autor IC, foi amplamente divulgado nos órgãos de comunicação social nessa altura (em fevereiro e seguintes meses do ano de 2019);
78.-O Autor IC foi novamente motivo de notícias a 3 de maio de 2019, por conta de mais uma detenção policial motivada por condução em estado de embriaguez.
79.-O motivo pelo qual o Réu abordou o tema durante o debate de dia 6 de janeiro de 2021 – a defesa dos direitos das forças policiais – que é uma das grandes referências da sua candidatura e de grande debate político, conforme resulta das 70 medidas propostas pelo 2º Réu.
80.-1º Réu escolheu levar para o debate a fotografia dos Autores para abordar o tema dos problemas relacionados com o Bairro (...) e os problemas relacionados com os órgãos de polícia criminal.
81.-A publicação do dia 22 de janeiro de 2021, às 19:49h, da conta oficial do 2º Réu na rede social Twitter, com o conteúdo a que se refere o ponto 74 supra, já não existe.

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

NULIDADE DA SENTENÇA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA (CONCLUSÕES D a K).

Os apelantes arguem que a sentença padece de nulidade na medida em que não aprecia um dos pedidos formulados pelos autores, qual seja o segmento do primeiro pedido a seguir sublinhado: «Reconheça a ilicitude das ofensas ao direito e à honra e ao direito de imagem dos Autores descritas na presente ação, bem como o seu cariz discriminatório em função da cor da sua pele e da sua situação socioeconómica». Pedem que a nulidade seja suprida, devendo a decisão pronunciar-se no sentido de não se reconhecer o cariz discriminatório em função da cor da sua pede e da condição socioeconómica dos autores.
Apreciando.
Nos termos do Artigo 615º, nº1, alínea d), do Código de Processo Civil, a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Trata-se de um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de atividade que afeta a validade da sentença.
Esta nulidade está diretamente relacionada com o Artigo 608º, nº2, do Código de Processo Civil, segundo o qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.”
Neste circunspecto, há que distinguir entre questões a apreciar e razõesou argumentos aduzidos pelas partes. Conforme já ensinava ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, V Vol., p. 143, “São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.” Ou seja, a omissão de pronúncia circunscreve-se às questões/pretensões formuladas de que o tribunal tenha o dever de conhecer para a decisão da causa e de que não haja conhecido, realidade distinta da invocação de um facto ou invocação de um argumento pela parte sobre os quais o tribunal não se tenha pronunciado.[3] «O juiz não tem que rebater e esmiuçar todos os argumentos e alegações avançados pelas partes, bastando-lhe, para cumprimento do dever de fundamentação, pronunciar-se sobre as concretas questões em litígio, demonstrando que as ponderou.»[4]
Esta nulidade só ocorre quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição dos pleiteantes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir pedido e exceções e não quando tão só ocorre mera ausência de discussão das “razões” ou dos “argumentos” invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas
Não há omissão de pronúncia quando a matéria, tida por omissa, ficou implícita ou tacitamente decidida no julgamento da matéria com ela relacionada, competindo ao tribunal decidir questões e não razões ou argumentos aduzidos pelas partes.[5]  O juiz não tem que esgotar a análise da argumentação das partes, mas apenas que apreciar todas as questões que devem ser conhecidas, ponderando os argumentos na medida do necessário e suficiente.[6]   Conforme refere Rui Pinto, “Os meios reclamatórios comuns da decisão civil (artigos 613.º a 617.º do CPC)”, in Julgar Online, 2020, p. 26, «o que a lei impõe é, antes de mais, que os fundamentos e a parte dispositiva de uma decisão sejam construídos em jeito de resposta aos problemas fundamentais com que as partes construíram a causa de pedir, os pedidos ou as exceções; não em jeito de resposta aos raciocínios em que as partes suportam as suas posições. Deste modo, uma decisão não tem de ser o espelho do teor respetivos argumentativo da extensão do requerimento ou dos articulados».
Assim, incumbe ao juiz conhecer de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente deve conhecer (Artigo 608º, nº2, do Código de Processo Civil) à exceção daqueles cujo conhecimento esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outros. O conhecimento de uma questão pode fazer-se tomando posição direta sobre ela, ou resultar da ponderação ou decisão de outra conexa que a envolve ou a exclui.[7] Não ocorre nulidade da sentença por omissão de pronúncia quando nela não se conhece de questão cuja decisão se mostra prejudicada pela solução dada anteriormente a outra.[8]
No caso em apreço, a sentença impugnada contém no seu dispositivo o seguinte segmento: «Quanto ao mais, julgo a ação procedente e, em consequência: Reconheço a ilicitude das ofensas ao direito à honra e ao direito de imagem dos Autores descritas na presente ação

Na fundamentação, a questão foi analisada nestes termos:
«Tendo presente os princípios da necessidade e da proporcionalidade na aplicação das medidas de tutela dos direitos de personalidade dos Autores ofendidos pelas acções dos Réus aqui analisadas, não temos dúvidas em considerar eficaz para o efeito pretendido no art. 70º CC, o reconhecimento do carácter ilícito de tais acções conjugado com a obrigação de publicação da sentença em que é feito tal reconhecimento pelos agressores.
É sabido que uma sentença provém dum órgão de soberania do Estado com especial autoridade, sendo o juiz que a profere um terceiro imparcial que analisa os factos e aplica o direito tendo como único objectivo a realização da justiça e essas circunstâncias suscitam no público um efeito de confiança com potencial para neutralizar o que em contrário tiver sido declarado pelos lesantes.
Dito isto, entendemos, tendo por base o conteúdo dos autos que o cariz discriminatório das declarações não é o aspecto mais relevante do processo, nem resulta dos autos que tal discriminação seja necessariamente determinada pela cor da pele ou pela condição socioeconómica dos visados, embora esses elementos ressaltem de imediato aos olhos dos receptores da mensagem.
O que é essencial é o carácter ilícito das declarações com referência à fotografia dos Autores que foi exibida e a ofensa aos direitos de personalidade destes e é isso que importa reconhecer.»
Pronunciando-se expressamente sobre a nulidade arguida em sede de alegações, o tribunal a quo considerou que:
«Nos termos expostos, é manifesto que na decisão foi expressamente tratada a questão da necessidade, ou não, da inclusão das referidas qualificações no segmento decisório, tendo-se concluído pela sua desnecessidade. Daí que não ocorra qualquer omissão de pronúncia.
Sempre se dirá que a discordância dos Recorrentes que pareceria ser, num primeiro momento semântica (o Tribunal não considera relevante a discussão quanto ao cariz discriminatório, ou não, das declarações do 1.º Recorrente, para efeito da sua qualificação como ilícitas e, ipso facto, não inclui tais qualificações no segmento decisório) acabaria por ter como efeito a alteração do sentido do decidido.
É que, como é bom de ver, da circunstância de, tecnicamente, se ter concluído não ser de incluir tais qualificações no competente segmento decisório - por se terem tido por não essenciais, como resulta da douta fundamentação – não só não resulta qualquer omissão de pronúncia, como, também, que se tenha concluído no sentido oposto da fundamentação jurídica expendida como complementar ao carácter ilícito das declarações.
Em suma, da opção técnica de não inclusão de determinada qualificação na decisão, como sucede, por questões técnicas, não se retira a demonstração da qualificação contrária das declarações proferidas como, aparentemente, concluem os Recorrentes.»
Daqui resulta que a questão atinente ao alegado cariz discriminatório das ofensas imputadas aos réus, em função da cor da pele e da situação socioeconómica dos autores, foi expressamente analisada pelo tribunal a quo, tendo o mesmo entendido que não era essencial/necessária a inclusão de tal questão/qualificativo no dispositivo.
Aceita-se a opção assumida pelo tribunal a quo na medida em que as imputadas, e reconhecidas, ofensas à honra e ao direito de imagem dos autores, por um lado, absorvem a vertente discriminatória em função da cor da pele e da situação socioeconómica dos autores e, por outro, tal autonomização não é essencial para efeitos de subsunção jurídica (cf. Artigos 26º, nº1, da CRP e Artigos 70º e 79º do Código Civil).
Termos em que improcede a arguida nulidade.

LIMITES DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO DO 1º RÉU (CONCLUSÕES M a T, BB a KK).

Sustentam os apelantes que:
a.-Em 20.1.2019, os apelados ficaram publicamente conhecidos na sequência de confrontos policiais ocorridos no Bairro (...), na sequência dos quais foram constituídos arguidos em processos-crime e que motivaram a visita do Presidente da República ao referido bairro;
b.-O apelante 1º Réu pretendeu referir-se exclusivamente a uma das pessoas constantes da fotografia, não se reportando a todos os apelados;
c.-Apenas fizeram uso do seu direito à liberdade de expressão, que é particularmente alargado no âmbito do debate político;
d.-Ao tirarem aquela fotografia, os apelados passaram a figurar – de forma voluntária e consciente – como elementos de interesse no meio do debate político;
e.-Os recorridos tudo fizeram para assumirem uma posição de figuras mediáticas, participando em entrevistas e deixando-se fotografar, introduzindo a foto nas redes sociais;
f.-A exibição da fotografia teve por objetivo demonstrar que os órgãos de policia criminal foram descurados nos seus direitos e imagem;
g.-O apelante, quando se referiu às «pessoas que vieram para Portugal para beneficiar única e exclusivamente daquilo que é o Estado Social e daquilo que o Estado lhes pode dar», reportava-se aos moradores do bairro (...) que vivem em tais condições e não aos apelados em concreto.

Apreciando.

Em primeiro lugar, há que frisar que os apelantes não impugnaram a decisão relativa à matéria de facto, o que implicava – além do mais –o cumprimento dos ónus do Artigo 640º do Código de Processo Civil, o que manifestamente não foi efetuado pelos apelantes.
Assim sendo, para efeitos deste recurso, não é atendível a factualidade alegada em sede de recurso pelos apelantes - designadamente a vertida nos artigos 51º a 53º, 96º, 97º e 104º das alegações e e. supra – porquanto a mesma não se encontra provada nos autos, nem foi sequer objeto de alegação tempestiva (cf. Artigo 5º, nº1 e nº2, al. b), do Código de Processo Civil).
Não constitui facto notório a circunstância do apelante ter visitado uma esquadra de polícia e de na ocasião ter proferido determinadas afirmações (cf. artigos 51º a 53º do corpo das alegações).
Com efeito, conforme se refere em Luís Filipe Sousa, Direito Probatório Material Comentado, Almedina, 2020, p. 21:
«Nos termos do  Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23.1.2020, «Facto notório é, por definição, facto conhecido, mas é indispensável que o conhecimento seja amplo e esteja difundido, de forma a poder atribuir-se-lhe um elevado grau de certeza.»[9]
Nos termos do Artigo 412º, nº1, do Código de Processo Civil, não carecem de prova nem de alegação os factos notórios, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral.

A exigência do conhecimento geral atua em vários âmbitos:
-Na esfera pessoal, o facto notório tem de constar como certo ou falso para a generalidade de pessoas de cultura média entre as quais se encontra o juiz;
-Na esfera cognoscitiva, no sentido de que tal conhecimento deve integrar a cultura média, de acesso geral, e não ser constitutivo de um saber especializado próprio de um reduzido número de pessoas que se dedica a uma atividade comum;
-Na esfera espacial, no sentido de que tal facto deve ser conhecido no território que integra as instâncias de recurso. Não pode o facto ser notório para o juiz da primeira instância e desconhecido para o juiz conselheiro. Assim, um desastre nacional divulgado pela imprensa constitui um facto notório, mas já não será facto notório os prejuízos causados pelo granizo numa comarca mesmo que tenham afetado pessoalmente o juiz.»
Ora, a ocorrência de uma visita de um líder partidário a uma esquadra de polícia não assume estes parâmetros constitutivos do facto notório, constituindo –quando muito – facto notório que A ou B é presidente de determinado partido político.
Em segundo lugar, a asserção constante de a. supra não está correta.
Com efeito, o episódio mediático dos confrontos entre residentes no Bairro (...) e a polícia ocorreu no dia 20.1.2019 (facto 3), não estando provado que os apelados tenham ficado publicamente conhecidos nessa mesma data (cf. factos 1, 3, 4, 77, 79) mas apenas após a divulgação da fotografia que tiraram com o Presidente da República, a 4.2.2019 (facto 3).
Após esta delimitação prévia, cumpre então analisar se os apelantes (mormente o primeiro) atuaram dentro dos seus limites da liberdade de expressão ou se os excederam.

O Artigo 37º da Constituição, sob a epígrafe de Liberdade de expressão e informação dispõe que:
1.– Todos têm direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações.
2.– O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.
3.– As infrações cometidas no exercício destes direitos ficam submetidas aos princípios gerais de direito criminal ou do ilícito de mera ordenação social, sendo a sua apreciação respetivamente da competência dos Tribunais judiciais ou de entidade administrativa independente, nos termos da lei.
4.– A todas as pessoas, singulares ou coletivas, é assegurado, em condições de igualdade e eficácia, o direito de resposta e de retificação, bem como o direito a indemnização pelos danos sofridos.”

Já o Artigo 19º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10 de dezembro de 1948, consignava que:
“Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão.

Também o Artigo 10º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem [10] , rege sobre  tal matéria nestes termos:
1- Qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de transmitir informações ou ideais sem que possa haver ingerência de quaisquer autoridades públicas e sem considerações de fronteiras. (...)
2- O exercício destas liberdades, porquanto implica deveres e responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades, condições, restrições ou sanções, previstas na lei, que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a integridade territorial ou a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a proteção da saúde ou da moral, a proteção da honra ou dos direitos de outrem, para impedir a divulgação de informações confidenciais, ou para garantir a autoridade e imparcialidade do Poder Judicial.”.

Tais princípios fazem parte do direito português (Artigo 8º, nº1, da Constituição), sendo que os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem (Artigo 16º, nº2, da Constituição). Institui-se aqui o princípio da interpretação em conformidade com a Declaração Universal o que implica que, no caso de polissemia de uma norma constitucional de direitos fundamentais, deve dar-se preferência àquele sentido que permita uma interpretação conforme à Declaração Universal [11] .
Nos termos do Artigo 1º da Lei da Imprensa (aprovada pela Lei nº 2/99, de 13 de janeiro), é garantida a liberdade de imprensa, nos termos da Constituição e da lei. A liberdade da imprensa abrange o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações.
Contudo, logo no Artigo 3º da mesma Lei e sob a epígrafe de Limites, dispõe-se que “A liberdade de imprensa tem como únicos limites os que decorrem da Constituição e da lei, de forma a salvaguardar o rigor e a objetividade da informação, a garantir os direitos ao bom nome, à reserva da intimidade da vida privada, à imagem e à palavra dos cidadãos e a defender o interesse público e a ordem democrática.”
Resulta das normas referidas que o direito à informação constitucionalmente consagrado não é um direito absoluto, comportando limitações que devem limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, com respeito pelos princípios da proporcionalidade, adequação e necessidade - cf. Acórdão do Tribunal Constitucional nº 394/93, Nunes de Almeida, DR, I Série, de 29.9.93.

No seu Acórdão nº 81/84, D.R., II Série, de 31-01-1985, o Tribunal Constitucional considerou que:
“a liberdade de expressão ― como, de resto, os demais direitos fundamentais ― não é um direito absoluto, nem ilimitado. Desde logo, a proteção constitucional de um tal direito não abrange todas as situações, formas ou modos pensáveis do seu exercício. Tem, antes, limites imanentes. O seu domínio de proteção para ali onde ele possa pôr em causa o conteúdo essencial de outro direito ou atingir intoleravelmente a moral social ou os valores e princípios fundamentais da ordem constitucional. (...) Depois, movendo-se num contexto social e tendo, por isso, que conviver com os direitos de outros titulares, há de ele sofrer as limitações impostas pela necessidade de realização destes. E, então, em caso de colisão ou conflito com outros direitos ― designadamente com aqueles que se acham também diretamente vinculados à dignidade da pessoa humana [v.g. o direito à integridade moral (artigo 25º, nº 1) e o direito ao bom nome e reputação e à reserva da intimidade da vida privada e familiar (artigo 26º, nº 1)]―, haverá que limitar-se em termos de deixar que esses outros direitos encontrem também formas de realização”.
No seu Acórdão nº 67/99, de 3.2.99, Paulo Mota Pinto, acessível em www.tribunalconstitucional.pt, o Tribunal Constitucional reiterou que “ (…) a liberdade de expressão e a liberdade de informação – que, como a liberdade de imprensa, se encontram numa “relação intrinsecamente conflitual” com certos bens jurídicos pessoais (…) não podem deixar de conhecer restrições para tutela da inviolabilidade pessoal, e, em particular, de bens pessoais como a honra e intimidade da vida privada”.
Entre os outros direitos constitucionalmente protegidos e que atuam como limites imediatos à liberdade de imprensa estão, de facto, a integridade moral e física das pessoas (Artigo 25º, nº1, da Constituição) e os direitos ao desenvolvimento da personalidade, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à reserva da intimidade da vida privada e familiar (Artigo 26º, nº1, da Constituição).
A Declaração Universal dos Direitos do Homem proclama no seu Artigo 12º que nenhum indivíduo pode ser sujeitos a intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família e correspondência, nem ataques à sua honra e reputação.
A lei ordinária também tutela os direitos de personalidade.

Assim, sob a epígrafe de Tutela Geral da Personalidade, o Artigo 70º do Código Civil dispõe que
1- A lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física e moral.
2- Independentemente da responsabilidade civil a que haja lugar, a pessoa ameaçada ou ofendida pode requerer as providências adequadas às circunstâncias do caso, com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já cometida.

Da conjugação destas disposições da lei ordinária com os Artigos 24º a 26º e máxime 1º da Constituição (“Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana (...) ”) decorre que, desde logo, é a própria Constituição a consagrar um direito geral de personalidade, acolhendo o princípio que a todo e qualquer aspeto em que necessariamente se desdobra um direito geral de personalidade deve caber o maior grau de proteção do ordenamento jurídico, pois os direitos de personalidade são inerentes à própria pessoa, não podendo ser postergados sob pena de negar o papel da pessoa como figura central da sociedade.  [12]
O artigo 70º, nº1, do Código Civil recorre à cláusula geral “personalidade física e moral” para a proteção do indivíduo encontrar apoio legal o que se justifica dada a crescente e imprevisível mutação da vida.
Mais concretamente e face ao caso sub judicio, importa saber como conjugar a liberdade de expressão com o direito à honra e à imagem dos autores.
Várias têm sido as posições enunciadas pela doutrina e jurisprudência quanto ao modus operandi da articulação/conjugação destes direitos fundamentais.
Refere Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 4ª ed., p. 496, que “a solução destes casos de conflito não é tarefa fácil, recorrendo muitas vezes a doutrina e jurisprudência ao “critério da ponderação de bens”, ao “princípio da concordância prática”, à “análise do âmbito material da norma” e ao “princípio da proporcionalidade””. Também é frequente o recurso à ideia de abuso de direitos fundamentais, designadamente quando se considera que o exercício de um direito fundamental viola criminalmente um outro direito (direito à integridade pessoal, direito ao bom nome e reputação). Aponta-se igualmente como critério operador o princípio da otimização de direitos e bens constitucionais conducente ao estabelecimento de limites aos direitos colidentes de forma a conseguir uma autêntica eficácia ótima de ambos os direitos. De qualquer modo e para este autor, a diretiva fundamental era esta: todos os direitos têm, em princípio, igual valor, devendo os seus conflitos solucionar-se preferentemente mediante o recurso ao princípio da concordância prática. Com este princípio, visa-se delimitar o âmbito material constitucionalmente protegido dos direitos e bens constitucionais que estão em confronto, entendendo que, nos casos de crimes de liberdade de imprensa, a nossa jurisprudência tem infravalorado a dignidade e a honra em favor de um direito de liberdade de expressão que, material e constitucionalmente, não tem o âmbito que se lhe atribui. [13]
Segundo o critério da ponderação de bens, estando em causa o exercício de dois direitos constitucionais em colisão, a solução de tal litígio deve resultar de um juízo de ponderação em que se procure, em face da situação concreta, encontrar e justificar a solução mais conforme ao conjunto dos valores constitucionais - neste sentido, Vieira De Andrade, Direitos Fundamentais na Constituição de 1976, p. 220. Porém, só existe verdadeiro conflito de direitos quando os mesmos são exercidos dentro dos seus limites uma vez que não há direitos absolutos ou ilimitadamente elásticos - Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, IV Vol., p. 157.
Este critério pressupõe a inexistência de uma ordenação abstrata de bens constitucionais o que torna indispensável uma operação de balanceamento desses bens de modo a obter uma norma de decisão situativa, isto é, uma norma de decisão adaptada às circunstâncias do caso. A ponderação visa elaborar critérios de ordenação para, em face dos dados normativos e factuais, obter a solução justa para o conflito de bens. A ponderação reconduz-se, no fundo, à criação de uma hierarquia axiológica móvel entre princípios conflituantes – cf. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7 ª Ed., Almedina, 2003, pp. 1237 e 1241.
De acordo com o critério do âmbito material da norma, dir-se-á que os limites de cada direito determinam-se em função do seu próprio fim e pela existência de outros direitos. Assim, se o agente, no exercício concreto do direito, ultrapassa o seu fim, extravasa o limite do direito.
O critério do princípio da proporcionalidade assenta no seguinte raciocínio: quando se aprecia a proporcionalidade de uma restrição a um direito fundamental, avalia-se a relação entre o bem que se pretende proteger ou prosseguir com a restrição e o bem jusfundamentalmente protegido que resulta, em consequência, desvantajosamente afetado - cf. Jorge Reis Novais, Os Princípios Constitucionais Estruturantes da República Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, p. 178. O meio restritivo escolhido, pressuposto que seja apto e indispensável, só tem que ser não desproporcional.
Conforme se escreveu no Acórdão n.º 634/93, Nunes de Almeida, in ATC, 26º Vol., p. 211, "o princípio da proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios: princípio da adequação (as medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se como um meio adequado para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); princípio da exigibilidade (essas medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos para alcançar o mesmo desiderato); princípio da justa medida, ou proporcionalidade em sentido estrito (não poderão adotar-se medidas excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos)." Seguindo este raciocínio, afirmou-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23.9.2004, Graça Amaral, CJ 2004 – I, p. 94, que “a solução para o litígio decorrente da colisão do exercício de dois direitos constitucionais terá de resultar de um juízo de ponderação e coordenação entre tais direitos, tendo em conta a situação em concreto, de forma a encontrar e justificar a solução mais conforme ao conjunto dos valores constitucionais, encarando as limitações aos respetivos direitos tão só enquanto necessárias para salvaguarda do “outro” direito constitucionalmente protegido, com respeito aos princípios da proporcionalidade, da adequação e necessidade- princípio da ponderação de bens e interesse relevantes no caso concreto.”. «Assumindo estes dois direitos consagração e proteção constitucional, é difícil estabelecer uma ordem hierárquica entre eles, pelo menos em abstrato. Essa ordem deve antes fazer-se sopesando as circunstâncias concretas de cada caso, e com base em princípios de adequação e proporcionalidade em ordem à salvaguarda de cada um dos direitos» (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18.6.2009, Alberto Sobrinho, 159/09)
O princípio da concordância prática, que constitui decorrência inerente do princípio da proporcionalidade, impõe a coordenação e combinação dos bens jurídicos em conflito de forma a evitar o sacrifício (total) de uns em relação aos outros. “Subjacente a este princípio está a ideia do igual valor dos bens constitucionais (e não uma diferença de hierarquia) que impede, como solução, o sacrifício de uns em relação aos outros, e impõe o estabelecimento de limites e condicionamentos recíprocos de forma a conseguir uma harmonização ou concordância prática entre estes bens” - cf. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7 ª Ed., Almedina, 2003, p. 1225.
Realça este autor que os direitos fundamentais se devem considerar como direitos prima facie e não direitos definitivos, dependendo a sua radicação subjetiva definitiva da ponderação e da concordância feita em face de determinadas circunstâncias concretas. Conclui que «(…) as normas dos direitos fundamentais são entendidas como exigências ou imperativos de otimização que devem ser realizadas, na melhor medida possível, de acordo com o contexto jurídico e respetiva situação fáctica. Não existe, porém, um padrão ou critério de soluções de conflitos de direitos válido em termos gerais e abstratos. A “ponderação” e/ou harmonização no caso concreto é, apesar da perigosa vizinhança de posições decisionistas (…), uma necessidade ineliminável. Isto não invalida a utilidade de critérios metódicos abstratos que orientem, precisamente, a tarefa de ponderação e/ou harmonização concretas: “princípio da concordância prática”; “ideia do melhor equilíbrio possível entre os direitos colidentes”» – Op. Cit., pp. 1275-1276.
Note-se que, segundo o Artigo 18º, nº2, da Constituição, a lei pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. Este artigo preconiza o princípio material da proporcionalidade o que envolve, para os tribunais, a obrigação de interpretar e aplicar os preceitos sobre direitos, liberdades e garantias de modo a conferir-lhes a máxima eficácia possível, dentro do sistema jurídico, e a obter equilíbrio, a concordância prática, se possível a realização simultânea dos direitos, liberdades e garantias, por um lado, e da iniciativa privada, por outro – cf. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, Coimbra Editora, 2005, pp. 152, 156 e 157. 
Mais recentemente, Elsa Vaz Sequeira adotou um enfoque bastante pragmático e impressivo para dilucidar esta questão, assentando na natureza principiológica das normas que preveem tais direitos e na restrição de direitos prima facie perante outros direitos prima facie. Nas suas palavras:
«Do exposto conclui-se, por um lado, que as colisões de princípios são solucionadas através da formulação e/ou aplicação de leis de colisão e, por outro lado, que as possibilidades jurídicas de cumprimento de um princípio são limitadas pelos outros princípios. O que significa que os direitos prima facie são restringidos pela existência de outros direitos prima facie, de tal forma que o conteúdo do direito definitivo é igual ao do direito prima facie após a aplicação das restrições.
Ora é justamente isto que se passa com a liberdade de expressão e com os direitos à reserva da intimidade da vida privada ou ao bom nome e reputação. As normas que os preveem, respetivamente os artigos 37.º e 26.º da CRP, são consciente e deliberadamente abertas, tendo uma vocação de plenitude. Uma visão isolada destes preceitos faz surgir a convicção não só de que se pode exteriorizar tudo o que se pensa, sente ou julga saber, como, simultaneamente, que nada pode ser dito sobre a reserva da intimidade da vida privada ou que possa prejudicar a consideração de que uma pessoa é merecedora no seu meio. Uma visão integrada dos mesmos permite, contudo, perceber que um limita o outro e vice-versa. Dito de outro modo, apesar de as referidas normas constitucionais estabelecerem um âmbito de tutela muito amplo quer para a liberdade de expressão quer para a reserva da intimidade privada ou o bom nome e reputação, o âmbito de garantia efetiva destes é consideravelmente menor, sendo um produto da delimitação recíproca que se opera entre elas. Na verdade, a aplicabilidade de uma das normas convergentes limita a aplicabilidade da outra ou, por outras palavras, um direito prima facie limita o outro, por tal forma que este não abrange a conduta ou a situação em questão» (“Responsabilidade civil e liberdade de expressão”, in Revista de Direito da Responsabilidade, Ano 3, 2021, pp. 72-73)
Em sede de conflito entre o direito/dever de informação e o direito à honra, ao bom nome e à reputação social, a jurisprudência do início do século XXI apelou, com frequência, ao princípio da concordância prática de tal modo que a restrição a um deles , em prol do outro, se reduza ao estritamente necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.[14]
De modo mais concreto, foi decidido que “sendo embora os dois direitos de igual hierarquia constitucional, é indiscutível que o direito de liberdade de expressão e informação, pelas restrições e limites a que está sujeito, não pode, ao menos em princípio, atentar contra o bom nome e reputação de outrem, sem prejuízo, porém, de em certos casos, ponderados os valores jurídicos em confronto, o princípio da proporcionalidade conjugado com os ditames da necessidade e da alegação de todo o circunstancialismo concorrente, tal direito poder prevalecer sobre o direito ao bom nome e reputação”.[15] Serão, nomeadamente, os casos em que estiver em causa um interesse público que se sobreponha aos direitos de personalidade e a divulgação seja feita de forma a não exceder o necessário a tal divulgação, sendo exigível que a informação veiculada se cinja à estrita verdade dos factos (cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20.9.2000, Silva Salazar, CJ AcSTJ- III, pp. 42-45, de 3.3.2005, Ferreira de Almeida,4789/04, de 17.12.2009, Oliveira Rocha,4822/06,de 29.4.2010, Oliveira Rocha, 5583/04). Nesta mesma senda, «A liberdade de expressão não tem como limite absoluto o bom nome e a reputação de terceiros quando se tratem de questões de interesse geral» (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13.1.2005, Moitinho de Almeida, 3924/04).
Na doutrina, Filipe Miguel Cruz de Albuquerque Matos, Responsabilidade Civil por Ofensa ao Crédito ou ao Bom Nome, Almedina, 2011, p. 301, “uma vez respeitadas as exigências de rigor na recolha dos dados (fidedignidade das fontes), bem como os ditames da proporcionalidade no tocante ao conteúdo das declarações e havendo interesse objetivo na sua transmissão, a liberdade de expressão legitima a divulgação de factos, mesmo quando estes se revelam prejudiciais aos olhos dos respetivos destinatários”. Iolanda Rodrigues de Brito, Liberdade de Expressão e Honra de Figuras Públicas, Coimbra Editora, 2010, p. 143, fala a este propósito no respeito pelo princípio da verdade da informação, segundo o qual “do lado do jornalista pode invocar-se um direito a divulgar informações verdadeiras de interesse público, ao que naturalmente corresponde um direito do público a recebê-las.” Por sua vez, Pedro Pais de Vasconcelos, Direito de Personalidade, Almedina, 2006, pp. 78-79, afirma que: «Quando o interesse público o imponha, o direito à honra e à privacidade, não podem impedir a revelação daquilo que for estritamente necessário e apenas do que for estritamente necessário. A exclusão da ilicitude resulta, então, do carácter público do interesse em questão e não do carácter público da pessoa atingida ou da sua exposição. É esse o sentido da cláusula de exclusão da ilicitude contida no artigo 180º, nº2 do Código Penal. Só deve admitir-se a exclusão da ilicitude se e quando se demonstre convincentemente que o interesse público sofreria dano grave e real sem a agressão à honra ou à privacidade da pessoa ofendida. Trata-se de casos muito graves e sem dúvida excecionais.»
Paralelamente à jurisprudência nacional referida, sedimentou-se jurisprudência do TEDH  mais liberal e permissiva do que a jurisprudência nacional, entendendo o TEDH que, a haver alguma hierarquia abstrata entre tais direitos, deve tender-se a dar prevalência à liberdade de expressão.[16]
Na síntese de Jónatas Machado, ”Liberdade de Expressão, Interesse Público e Figuras Públicas e Equiparadas”, in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, V. 85 (2009), p. 80,
«(…) o TEDH tem vindo a enfatizar de forma consistente a centralidade do direito à liberdade de expressão, imprensa e radiodifusão, consagrado no artigo 10º do CEDH, enquanto elemento conformador e estruturante de uma sociedade democrática, com inevitáveis limitações para os direitos de personalidade, especialmente de figuras públicas. O TEDH tem sustentando que a imprensa desempenha um papel eminente numa sociedade democrática. Se é verdade que isso não significa que ela tem direito de ultrapassar certos limites, nomeadamente respeitantes à proteção da reputação ou de outros direitos, também é verdade que lhe incumbe comunicar, no respeito dos seus deveres e das suas responsabilidades, informações e ideias sobre todas as questões de interesse geral. Acresce que, no entender do TEDH, essa função difusora de informações e ideias não pode ser separada do direito dos cidadãos de as receberem. A imprensa deve poder desempenhar a sua função de “cão de guarda” do Estado de direito democrático.
(…) tem-se verificado uma nítida dessintonia entre o entendimento dos tribunais nacionais e o do TEDH, que tende a afirmar o seu direito de supervisão europeia e a reduzir a margem de apreciação dos Estados, apontando claramente para uma interpretação dos direitos de personalidade de uma forma restritiva, que não comprometa o papel central da liberdade de expressão, de informação e de imprensa numa sociedade democrática.»

Assim, o TEDH tem asseverado, repetidamente, que:
«A liberdade de expressão vale não somente para as “informações” ou “ideias” favoráveis, inofensivas ou indiferentes, mas também para aquelas que ofendem, chocam ou inquietam.
Esses princípios assumem particular importância no domínio da imprensa. Se ela não deve ultrapassar os limites em vista, nomeadamente, da reputação de outrem, incumbe-lhe, contudo, transmitir informações e ideias sobre questões políticas bem como sobre outros temas de interesse geral.
Os limites da crítica admissível são mais largos quando é visado um político, agindo na sua qualidade de personalidade pública, do que quando é visado um simples particular.
O homem político expõe-se inevitável e inconscientemente a um controlo atento das suas ações e gestos, quer pelos jornalistas quer pelos cidadãos, e deve revelar uma maior tolerância, sobretudo quando produz declarações públicas que se possam prestar à crítica.» (Acórdão Oberschlick contra Áustria, de 1.7.97);
«(…) a liberdade do jornalista compreende também a possibilidade de recurso a uma certa dose de exagero ou até mesmo de provocação.
O direito à liberdade de expressão, consagrado no artigo 10º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e uma das condições primordiais do seu progresso e do direito de manifestação de cada um.
A liberdade de expressão vale não somente para as “informações” ou “ideias” favoráveis, inofensivas ou indiferentes, mas também para aquelas que ofendem, chocam ou inquietam. Assim o recomendam o pluralismo, a tolerância e o espírito de abertura, sem os quais não há “sociedade democrática”.
Esses princípios assumem particular importância no domínio da imprensa.
Os limites da crítica admissível são mais largos quando é visado um político, agindo na sua qualidade de personalidade pública, do que quando é visado um simples particular.
(…)
Exige-se uma interpretação restritiva das exceções ou condicionamentos à liberdade de expressão previstos no nº2 do art. 10º da Convenção.
A ingerência litigiosa que configure um condicionamento deve corresponder a uma necessidade social imperiosa e ser proporcional ao objetivo legítimo pretendido.»
(Acórdão Lopes Gomes da Silva contra Portugal, de 28.9.2000).
De acordo com a doutrina do TEDH, “não se pode exigir à imprensa que publique apenas factos provados ou prováveis porque, se assim fosse, estaria impedida de publicar praticamente tudo. Por outro lado, a liberdade de imprensa está protegida mesmo quando o seu exercício implica um dano na reputação de outrem, sobretudo quando o visado é uma figura pública.” – Iolanda Rodrigues de Brito, Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas, Coimbra Editora, 2010, pp. 67-68.
Segundo o TEDH, pode haver interesse legítimo na partilha de informações, mesmo que impliquem alguma devassa da privacidade ou intimidade de alguém, relativas a questões de saúde pública, administração da justiça, cumprimento das obrigações fiscais, criminalidade, proteção ambiental ou desporto (Elsa Vaz Sequeira, “Responsabilidade civil e liberdade de expressão”, in Revista de Direito da Responsabilidade, Ano 3, 2021, p. 84).
No que tange a juízos de valor (por contraposição a factos), o TEDH enfatiza que os mesmos são insuscetíveis de serem sujeitos à prova da verdade, devendo “haver uma base factual suficiente, pois quando não têm qualquer sustentabilidade em factos não podem deixar de se considerar excessivos” – Iolanda Rodrigues de Brito, Op. Cit., pp. 78-79. E, mais adiante, a mesma autora clarifica a doutrina do TEDH assim: “A exigência da prova da verdade como pressuposto de validade dos juízos de valor impediria a imprensa de publicar uma parte considerável de artigos e opiniões de manifesto interesse público, restringindo intoleravelmente a liberdade de expressão, máxime a liberdade de imprensa, no exercício da sua função pública de enorme importância” – Op. Cit., p. 301.
Como bem assinala António Henriques Gaspar, “A Influência da CEDH no Diálogo Interjurisdicional”, in Revista Julgar, Nº 7- 2009, p. 39,
«Os juízes nacionais estão vinculados à CEDH e em diálogo e cooperação com o TEDH. Vinculados porque, sobretudo em sistema monista, como é o português (artigo 8º da Constituição), a CEDH, ratificada e publicada, constitui direito interno que deve, como tal, ser interpretada e aplicada, primando, nos termos constitucionais, sobre a lei interna. E vinculados também porque, ao interpretarem e aplicarem a CEDH como primeiros juízes convencionais, devem considerar as referências metodológicas e interpretativas e a jurisprudência do TEDH, enquanto instância própria de regulação convencional

Progressivamente, o nosso STJ foi assumindo os parâmetros valorativos adotados pelo TEDH, sendo exemplo disso os seguintes arestos:
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30.6.2011, João Bernardo, 1272/04:
«A Convenção Europeia dos Direitos do Homem não tutela, no plano geral, o direito à honra.
Não o ignora no artigo 10.º, n. º2, mas a propósito das restrições à liberdade de expressão.
Esta construção levou aquele Tribunal a seguir um caminho inverso ao que vinham seguindo, habitualmente, os Tribunais Portugueses. Não partia já da tutela da honra, situando-se, depois, nas suas ressalvas, mas partia antes da liberdade de expressão, situando-se, depois, na apreciação das suas restrições, constantes daquele artigo 10.º, n. º2.
E vem proferindo múltiplas decisões cujo entendimento, mantido de forma constante, vem assentando, essencialmente, no seguinte:
A liberdade de expressão constitui um dos pilares fundamentais do Estado democrático e uma das condições primordiais do seu progresso e, bem assim, do desenvolvimento de cada pessoa;
As exceções constantes deste n. º2 devem ser interpretadas de modo restrito;
Tal liberdade abrange, com alguns limites, expressões ou outras manifestações que criticam, chocam, ofendem, exageram ou distorcem a realidade.
Os políticos e outras figuras públicas, quer pela sua exposição, quer pela discutibilidade das ideias que professam, quer ainda pelo controle a que devem ser sujeitos, seja pela comunicação social, seja pelo cidadão comum – quanto à comunicação social, o Tribunal vem reiterando mesmo a expressão “cão de guarda” - devem ser mais tolerantes a críticas do que os particulares, devendo ser, concomitantemente, admissível maior grau de intensidade destas;
Na aferição dos limites da liberdade de expressão, os Estados dispõem de alguma margem de apreciação, que pode, no entanto, ser sindicada pelo próprio TEDH.»

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6.9.2016, José Rainho, 60/09:
«I.-A Constituição da República Portuguesa não estabelece qualquer hierarquia entre o direito ao bom nome e reputação, e o direito à liberdade de expressão e informação, nomeadamente através da imprensa. Quando em colisão, devem tais direitos considerar-se como princípios suscetíveis de ponderação ou balanceamento nos casos concretos, afastando-se qualquer ideia de supra ou infravaloração abstrata.
II.-De acordo com a orientação estabelecida pelo TEDH e que os tribunais nacionais terão que seguir, as condicionantes à liberdade de expressão e de imprensa devem ser objeto de uma interpretação restritiva e a sua necessidade deve ser estabelecida de forma convincente.»

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13.7.2017, Lopes do Rego, 1405/07:
«Ocorrendo conflito entre os direitos fundamentais individuais – à honra, ao bom nome e reputação - e a liberdade de imprensa, não deve conferir-se aprioristicamente e em abstrato precedência a qualquer deles, impondo-se a formulação de um juízo de concordância prática que valore adequadamente as circunstâncias do caso e pondere a interpretação feita, de modo qualificado, acerca da norma do art.. 10º da CEDH pelo TEDH - órgão que, nos termos da CEDH, está especificamente vocacionado para uma interpretação qualificada e controlo da aplicação dos preceitos de Direito Internacional convencional que a integram e que vigoram na ordem interna e vinculam o Estado Português - e tendo ainda necessariamente em conta a dimensão objetiva e institucional subjacente à liberdade de imprensa, em que o bem ou valor jurídico que, aqui, é constitucionalmente protegido se reporta, em última análise, à formação de uma opinião pública robusta, sem a qual se não concebe o correto funcionamento da democracia.»

Atualmente, as decisões do STJ sobre esta matéria radicam essencialmente nos parâmetros preconizados pelo TEDH. Na síntese do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9.12.2020, Fátima Gomes, 24555/17:
«II.- Nos casos em que haja necessidade de ponderar se a liberdade de expressão ofende o direito ao bom nome de uma pessoa, legitimando a reprovação da ordem jurídica, importa um balanceamento concreto (não podendo aferir-se em abstrato).
III.- Neste sentido, a mais recente orientação jurisprudencial do STJ tem entendido ser de exigir um juízo de prognose sobre a hipotética decisão que o TEDH adotaria se o caso lhe tivesse sido submetido, no sentido de se verificar se é de admitir como muito provável que, se a questão viesse a ser colocada ao TEDH, tal órgão jurisdicional entenderia que os artigos em causa extravasariam os limites toleráveis do exercício da liberdade de expressão e informação.»
Feito este excurso de enquadramento, há que atentar na concreta factualidade em apreço à luz da jurisprudência e doutrina mais recentes.
Antes de mais, há que atentar que a doutrina e jurisprudência referidas desenvolveram-se, principalmente, com base em casos emergentes de artigos ou peças publicadas na imprensa e nos média cujos autores eram jornalistas (na maioria dos casos) ou particulares e os visados eram figuras públicas e/ou políticos. Ora, no caso em apreço, esse paradigma não é replicado.
Com efeito, o 1º Réu é uma figura pública do mundo político, sobejamente conhecida em Portugal, sendo os autores cidadãos privados de notoriedade pública. Conforme já foi analisado supra, o mediatismo dos autores cingiu-se a, durante a breve visita do Sr. Presidente da República ao bairro onde residiam, tirarem com o mesmo uma fotografia, a qual foi divulgada em alguns órgãos da comunicação social. Não está provado que os mesmos tenham procurado cavalgar esse mediatismo instantâneo com a utilização/difusão pessoal de tal fotografia, nem sequer que tenham ficado conhecidos em 20.1.2019 porquanto a fotografia data apenas de 4.2.2019.
Ou seja, inexiste factualidade que sustente a tese de que os autores –ao figurarem na fotografia com o Presidente da República - pretenderam ascender à posição de interlocutores da discussão política nacional. E, muito menos, que tenham de alguma forma prefigurado que, dois anos volvidos (em 24.1.2021), tal fotografia fosse utilizada com arma de arremesso político, no âmbito de um debate televisivo para as eleições presidenciais. Conforme bem se referiu na decisão impugnada, os autores não estão no mesmo palco que os Réus, sendo ainda pertinente a análise do tribunal a quo quando afirmou: «Não cremos, assim, que se possa presumir que os Autores dariam o seu consentimento para a exibição da sua fotografia neste contexto, em que são apelidados de bandidos e em que lhes é colada toda uma panóplia de características negativas.»
É certo que «Na luta político-partidária, nomeadamente em períodos de pré-campanha ou campanha eleitoral, é recorrente a utilização de linguagem mais descabida, agressiva e indelicada, sendo esse um risco do confronto político-eleitoral» (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9.12.2010, Abílio Vasconcelos, 734/05). «As opiniões expressas numa linguagem forte ou exagerada são também protegidas; a extensão da proteção depende do contexto e do propósito da crítica. Em matéria de controvérsia pública ou de interesse público, durante o debate político, em campanhas eleitorais ou quando a crítica se dirija ao governo, políticos ou autoridades públicas, as palavras fortes e a crítica áspera são expectáveis e podem ser toleradas em maior grau. No caso Thorgeirson v. Islândia, por exemplo, o TEDH entendeu que, apesar de os artigos conterem termos fortes – os polícias foram caraterizados como “bestas em uniforme”, “indivíduos com a idade mental de um recém-nascido como resultado do uso de gravata que os polícias aprenderam e usam com espontaneidade brutal” e as referências às forças policiais como sendo “intimidatórias, mentirosas, com ações ilegais, supersticiosas, precipitadas e ineptas” – a linguagem empregue não podia ser vista como excessiva tendo em consideração o objetivo de uma reforma urgente da polícia [tradução nossa]» - Dominika Bychawska-Siniarska, Protecting the Right to Freedom of Expression Under the European Convention of Human Rights, Conselho da Europa, 2017, p. 78. «Os juízos de valor em contexto político não podem ser, em princípio, censurados, ainda que surjam envolvidos em linguagem violenta, exagerada ou provocatória. A compreensão da sociedade democrática que perpassa toda a CEDH promove igualmente a liberdade do debate político, implicando que os limites da critica permitida sejam mais alargados quando o visado é um político do que quando é um cidadão anónimo. O político autocoloca-se na arena pública, submetendo-se ao escrutínio dos jornalistas e dos cidadãos em geral, pelo que lhe é exigível uma maior tolerância à crítica, especialmente quando ela tem origem na comunicação social (…)» (sublinhado nosso) - Iolanda Rodrigues de Brito, Liberdade de Expressão e Honra de Figuras Públicas, Coimbra Editora, 2010, pp. 163-164.
Todavia, consoante já se frisou, os autores não são protagonistas da luta politico-partidária, não detêm uma posição que lhes permita influir no combate político, mesmo presidencial. Aquando do debate televisivo de 24.1.2021, os autores não estavam no palco da discussão nem eram os adversários políticos do 1º Réu. Se era permitida a utilização de uma linguagem mais agressiva e excessiva por parte do 1º réu, tal utilização só era admissível contra o interlocutor e adversário político MM e não contra os autores.
Assumindo os Réus (mormente o 1º) o desiderato político-mediático de defender os direitos das forças policiais (cf. factos 79 e 80), para enfatizar a desconsideração que – no seu entender – o seu adversário de debate pudesse evidenciar perante tais forças não era necessário trazer ao debate a fotografia dos autores nem recorrer aos qualificativos dos mesmos efetivamente utilizados pelo 1º réu. Para tanto, bastaria evidenciar (eventualmente com uma linguagem mais agressiva dirigida ao seu interlocutor direto), por exemplo, que o adversário político dispensou uma atenção diferenciada aos residentes do Bairro por contraposição às forças policiais que aí tinham sido chamadas, 15 dias antes da visita ao Bairro.

São, assim, inteiramente pertinentes e de secundar as seguintes considerações expendidas pelo tribunal a quo:
«Não se concebe que o Réu desconheça o poder da imagem, (tanto mais que afirmou em julgamento ser a exibição da fotografia necessária aos seus objectivos políticos que não seriam atingidos da mesma forma sem tal exibição) e não saiba que a sua utilização desta forma corresponde a uma instrumentalização da imagem dos Autores para representar tudo aquilo a que diz opor-se, utilizando para o descrever uma linguagem depreciativa, em que atribui a uma categoria de indivíduos ou a um grupo com características físicas e sociais determinadas, decalcadas nas características dos Autores que são vistos ao mesmo tempo que são proferidas as palavras, factos que sabe serem eticamente reprováveis, usando essa linguagem indistintamente, salvo quando esparsamente se refere em especial ao Autor IC, tendo como pano de fundo, homens, mulheres e uma criança.
(…)
A imagem dos Autores dá força às palavras do Réu, como este bem sabe, passando aqueles a ser a representação do oposto dos portugueses de bem, o oposto dos portugueses que pagam impostos e trabalham para que aqueles vivam do crime, de esquemas de sobrevivência paralelos e à custa do dinheiro do Estado, aqueles a quem o Réu não quer representar enquanto presidente.
Ora, sabendo-se que todas as pessoas humanas partilham a mesma humanidade, que cada uma dessas pessoas tem em si mesma a capacidade para o bem e para o mal, devendo a censura social ser dirigida aos actos praticados e não às pessoas, esta diferenciação redutora entre bons e maus, entre pessoas de bens e bandidos, não reflecte a natureza humana, nem pacifica as comunidades humanas.
(…) numa sociedade pluralista e democrática como a nossa, o emissor duma mensagem é livre de escolher os meios e as palavras que entende para divulgar o seu pensamento e as suas concepções políticas ou outras mas, essa sua liberdade tem limites.
Nenhuma expressão de ideias políticas pode agredir a honra das pessoas visadas nessa expressão, máxime, se estas não forem actores políticos, nem estiverem no mesmo palco, como é o caso dos aqui Autores.»
Ao contrário do que sustentam os apelantes, não deve entender-se que o 1º Réu se pretendeu referir apenas a um dos figurantes na fotografia (cf. supra al. b)).
Na verdade, apesar de existir uma fotografia do mesmo dia de MM apenas com o autor IC (facto 44), a fotografia utilizada pelo 1º Réu no debate não foi essa, mas uma em que figuram todos os autores. Só na subsequente entrevista a MG é que o 1º Ré esboçou o intuito de autonomizar apenas um dos autores (cf. factos 68 a 70).
Também não colhe a argumentação dos apelantes no sentido de que o 1º Réu se reportou aos moradores do Bairro (...) e não aos apelados em concreto.
O facto provado sob 16 é perentório em sentido contrário ao sustentado na apelação: «(…) um Presidente da República, na minha perspetiva, antes de mais, tem de dar um sinal a esses portugueses, porque foram esses portugueses, são esses portugueses que sustentam a economia portuguesa, são esses que sustentam Portugal, muitos destes indivíduos [apontando novamente para a fotografia dos Autores] vieram para Portugal para beneficiar única e exclusivamente daquilo que é o Estado Social e daquilo que o Estado lhes pode dar e o Senhor Presidente diz aqui que acha normal ir a um bairro destes porque se não iam dizer... Que vivem lá ciganos, vivem lá afrodescendentes, etecetera, mas não era capaz de dar um sinal à polícia que estava ao lado deles» (bold e sublinhado nosso).
Mesmo que o 1º Réu se reportasse aos moradores do Bairro (...), estaríamos perante uma ofensa à honra perpetrada de forma coletiva (cf. Mafalda Miranda Barbosa, Lições de Teoria Geral do Direito Civil, Gestlegal, 2021, p. 373). Nesse contexto, ocorreria ofensa do bem da personalidade dos sujeitos concretamente considerados (autores) porquanto tal afirmação foi acompanhada, simultaneamente,pelo gesto de apontar para a fotografia em que figuravam os autores. 

VIOLAÇÃO DO DIREITO DE IMAGEM DOS AUTORES (CONCLUSÕES U a AA, LL a BBB).

Sustentam os apelantes que:
a.-O 1º Réu não foi o autor da fotografia, a qual já havia sido exibida em muitas ocasiões nos dois anos anteriores ao debate;
b.-O 1º Réu não instrumentalizou a imagem dos recorridos para representar um grupo de bandidos, não constituindo as declarações do 1º Réu uma divulgação de factos, mas sim uma repetição de factos respeitantes aos recorridos amplamente divulgados;
c.-A fotografia foi tirada e divulgada com o consentimento expresso dos apelados, sendo que tal consentimento decorre também da omissão de reação dos mesmos perante a divulgação da fotografia durante dois anos;
d.-Quando o 1º Réu exibiu a fotografia, a mesma já revestia carácter público e de interesse público nacional porque a família fotografada como Presidente da República esteve envolvidas nos acontecimentos policiais que motivaram a visita ao Bairro (...) por parte do Presidente da República;
e.-Inexistiu violação do direito de imagem dos autores;
f.-A divulgação da imagem de uma pessoa, por si só, não gera violação dos seus direitos de personalidade, sendo necessária a ocorrência de dano, o que não sucedeu.

Analisando.

Nos termos do Artigo 79º do Código Civil:
1.- O retrato de uma pessoa não pode ser exposto, reproduzido ou lançado no comércio sem o consentimento dela; depois da morte da pessoa retratada, a autorização compete às pessoas designadas no n.º 2 do artigo 71.º, segundo a ordem nele indicada.
2.- Não é necessário o consentimento da pessoa retratada quando assim o justifiquem a sua notoriedade, o cargo que desempenhe, exigências de polícia ou de justiça, finalidades científicas, didáticas ou culturais, ou quando a reprodução da imagem vier enquadrada na de lugares públicos, ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente.
3.- O retrato não pode, porém, ser reproduzido, exposto ou lançado no comércio, se do facto resultar prejuízo para a honra, reputação ou simples decoro da pessoa retratada.

No que tange à densificação do direito à imagem, há que considerar que:
«A imagem é a representação de uma pessoa na sua configuração exterior.
(…)
O destino que se dê à imagem é, de certo modo, um tratamento dado à própria pessoa.
Proteger a imagem equivale a tutelar a intimidade e a tranquilidade de cada um. Bem se compreende que as pessoas não queiram – ou possam não querer – ser reconhecidas na rua ou em qualquer local público, mercê da divulgação não autorizada da própria imagem.
A imagem de uma pessoa, quando divulgada, raramente o será de modo abstrato: em regra, trata-se de associal a qualquer notícia ou mensagem que se pretenda transmitir. Tal mensagem poderá não ser aprazível para o próprio. Daqui emerge outro valor: o do bom nome e reputação» - Menezes Cordeiro (coord.) Código Civil Comentado, I – Parte Geral, Almedina, 2020, pp. 314-315.
Da conjugação deste Artigo 79º com os Artigos 70º do Código Civil, 26º, nº1, da Constituição, 199º do Código Penal e 18º do Código do Trabalho resulta uma dupla vertente da proteção do direito à imagem: um direito à autodeterminação da imagem exterior e um direito a definir os termos e condições em que o retrato captado pode ser utilizado por terceiros (Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, p. 195).
O consentimento para utilização da fotografia pode ser dado tacitamente, é revogável a todo o tempo (cf. Artigo 81º, nº2, do Codigo Civil), estando sujeito aos limites impostos pela ordem pública (Artigo 81º, nº1), aos bons costumes (Artigo 340º, nº2) e à necessidade de resultar de uma vontade livre e esclarecida (cf. Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, p. 196).
No que tange ao consentimento da pessoa retratada, «Tratando-se de autorização unilateral, ela não vai além do resultante das condições em que seja dada. A fotografia permitida numa escola não pode, depois e sem mais, ser usada numa campanha publicitária. Além dos bens em jogo, cumpre ter presente que tais autorizações são, em regra, gratuitas. Devem, na dúvida, ser interpretadas no sentido menos gravoso para o disponente (237º), o que é dizer: na aceção que menos limite o direito à imagem em jogo» - Menezes Cordeiro (coord.) Código Civil Comentado, I – Parte Geral, Almedina, 2020, p. 316.
Quanto aos retratos tirados em lugares públicos, de factos de interesse geral ou que hajam decorrido publicamente, a lei presume que o interessado está a autorizar o retrato ou que age no âmbito da sua esfera pública ou individual-social. «Tudo depende das circunstâncias e do destino das imagens capptadas: elas só podem visar documentar o sucedido: não, por exemplo, animar campanhas publicitárias, sem autorização do próprio. E também aqui sempre sob a sindicância do 79º/3» - Menezes Cordeiro (coord.) Código Civil Comentado, I – Parte Geral, Almedina, 2020, p. 318. «Esta dispensa de consentimento só se aplica nos casos em que a imagem captada se refira ao lugar público ou ao facto de interesse público, ou que tenha decorrido publicamente, mas já não se aplica nos casos de imagens de pessoas captadas em lugar públicos ou no contexto de factos públicos; isto é, não é lícita a captação de imagens de uma pessoa, em que esta aparece como o tema principal da fotografia ou filme, só porque a mesma é feita num lugar público (numa praia, numa esplanada, numa rua, etc.), isto porque em tal circunstância a imagem, ainda que enquadrara num local público, não se refere a esse local mas a uma pessoa certa e determinada (identificável)» - Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, p. 197.
O nº3 deste Artigo 79º vem «clarificar que mesmo nos casos em que é lícita a captação da imagem de certa pessoa, a sua exposição, reprodução ou lançamento no comércio pode violar outros direitos de personalidade, e, em tais circunstâncias, tal exposição, reprodução ou lançamento é ilícita. Aqui já não está em causa o direito à imagem, mas a utilização desta em termos que causem prejuízo para a honra, reputação ou simples decoro da pessoa retratada, sendo estes os direitos violados» - Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, p. 197.

No que tange à violação do direito à imagem dos autores, considerou o Tribunal a quo que:
«Em análise podemos dizer que o acto de exibição da fotografia que se sabe não ter sido tirada pelo Réu e que já havia sido exibida em ocasiões anteriores, só se torna relevante através da palavra falada na qual o Réu diz quem é e anuncia o seu propósito.
O Réu utiliza a fotografia dos Autores para se distinguir do seu adversário político e ganhar votos através dessa distinção.
Nesse processo e através desse discurso, o Réu faz afirmações de facto e emite juízos de valor sobre os Autores, chamando-lhes “bandidos”, “bandidagem” a quem o Presidente da República se juntou em vez de ficar do lado da polícia. E conclui dizendo “É que isso não é... Ser verdadeiramente Presidente dos portugueses de bem. É a velha conversa do Presidente de todos os portugueses. Mas esta foto, Senhor Presidente, e eu admito isso, sabe? Eu nunca vou ser Presidente dos traficantes de droga, nunca vou ser Presidente dos pedófilos, nunca vou ser Presidente dos que vivem à conta do Estado, com esquemas de sobrevivência paralelos, enquanto os portugueses de bem pagam os seus impostos, todos os dias a levantar-se de manhã à tarde para os pagar e o que fez aqui não tem nenhuma justificação...”
(…)
Enfim, o que se retira deste quadro é que o Presidente MM se deixou fotografar ao lado de bandidos.
Não se concebe que o Réu desconheça o poder da imagem, (tanto mais que afirmou em julgamento ser a exibição da fotografia necessária aos seus objectivos políticos que não seriam atingidos da mesma forma sem tal exibição) e não saiba que a sua utilização desta forma corresponde a uma instrumentalização da imagem dos Autores para representar tudo aquilo a que diz opor-se, utilizando para o descrever uma linguagem depreciativa, em que atribui a uma categoria de indivíduos ou a um grupo com características físicas e sociais determinadas, decalcadas nas características dos Autores que são vistos ao mesmo tempo que são proferidas as palavras, factos que sabe serem eticamente reprováveis, usando essa linguagem indistintamente, salvo quando esparsamente se refere em especial ao Autor IC, tendo como pano de fundo, homens, mulheres e uma criança.
A imagem dos Autores dá força às palavras do Réu, como este bem sabe, passando aqueles a ser a representação do oposto dos portugueses de bem, o oposto dos portugueses que pagam impostos e trabalham para que aqueles vivam do crime, de esquemas de sobrevivência paralelos e à custa do dinheiro do Estado, aqueles a quem o Réu não quer representar enquanto presidente.
Ora, sabendo-se que todas as pessoas humanas partilham a mesma humanidade, que cada uma dessas pessoas tem em si mesma a capacidade para o bem e para o mal, devendo a censura social ser dirigida aos actos praticados e não às pessoas, esta diferenciação redutora entre bons e maus, entre pessoas de bens e bandidos, não reflecte a natureza humana, nem pacifica as comunidades humanas.
(…)
Temos por certo, analisando as declarações do Réu, que este não se dirigiu apenas aos Autores mas, exibindo a sua fotografia, em conjunto com o discurso proferido, transformou-os na representação de todos aqueles a quem se queria referir ao usar tal discurso.
Este comportamento corresponde a uma instrumentalização da imagem que, como já dissemos, confere uma força diferente e maior ao discurso.
A exibição da fotografia mostra a quem se refere o discurso e os receptores da mensagem, criticando ou apoiando o discurso do Réu, integram subliminarmente e entendem expressamente as suas referências como demonstram as subsequentes publicações jornalísticas e os subsequentes comentários.
Não podemos concordar que se defenda a existência de consentimento presumido dos Autores nos termos do art. 340º CC, nestas circunstâncias.
Com efeito, ter a sua fotografia, tirada ao lado do Presidente da República, exibida na comunicação social na sequência da visita daquele ao bairro onde moram os Autores não tem o mesmo significado, nem o mesmo resultado que a exibição daquela foto no contexto que apreciamos nos autos.
Na primeira situação, a fotografia eleva a autoestima dos Autores pelo destaque que lhes foi dado pelo Presidente da República que se deixa fotografar ao seu lado. A fotografia revela, nesse contexto, que os Autores merecem esse destaque enquanto cidadãos iguais aos outros cidadãos.
As condições em que habitam e os seus antecedentes pessoais não os diferenciam, nessa fotografia, pela negativa e é a sua dignidade como pessoas humanas que é realçada.
Pelo contrário, na situação que apreciamos nos autos, a sua autoestima é diminuída, são apresentados como o oposto dos portugueses de bem, colados a um discurso em que se fala deles e das pessoas como eles de forma depreciativa – são referidos como “a bandidagem”. Não cremos, assim, que se possa presumir que os Autores dariam o seu consentimento para a exibição da sua fotografia neste contexto, em que são apelidados de bandidos e em que lhes é colada toda uma panóplia de características negativas.»
Esta análise efetuada pelo tribunal a quo mostra-se correta e pertinente.
Com efeito, a deslocação do Presidente da República ao Bairro (...) é indissociável do intuito político de evidenciar que o mesmo está atento a questões sociais, particularmente a pessoas que vivem em condições habitacionais deficitárias, aos casos de injustiça social, à necessidade de integração cabal das pessoas que vivem em tais condições (cf. facto 12).
Neste contexto, é manifesto que a figuração dos autores numa fotografia ao lado do Presidente da República constitui um ato voluntário dos mesmos que lhes reforça a autoestima e, do mesmo passo, patenteia que são merecedores de igual tratamento a par dos demais cidadãos por parte do Presidente da República, simbolizando este a cúpula do poder político.  O consentimento tácito que assim deram à divulgação pública da fotografia não pode dissociar-se deste contexto e intuitos específicos.
É absolutamente espúrio configurar um consentimento (conjetural) dos autores para a fotografia ser manipulada e instrumentalizada para fins diametralmente opostos aos que presidiram à sua captura. Na verdade, à utilização feita da fotografia pelo 1º Réu (e mesmo pelo 2º) presidiram intuitos diametralmente opostos aos que estiveram subjacentes à sua realização. Com efeito, o 1º réu instrumentalizou a fotografia para nela personificar todos os portugueses que, no seu entender, não são “de bem”, aqui  incluindo os traficantes de droga, os pedófilos, os que vivem à conta do Estado, os que têm esquemas de sobrevivência parelelos (cf. factos 15 e 16). Os réus utilizaram a fotografia como arma de segregação social enquanto os autores, ao consentirem na sua captura, visaram dar expressão a um evento (visita do Presidente da República)  potenciador da inclusão social dos autores e demais habitantes do Bairro ( cf. factos 1 a 3, 12, 14). Convém lembrar, novamente, que Portugal é uma república soberana baseada na dignidade da pessoa humana, tendo todos os cidadãos a mesma dignidade social e não podendo ser prejudicados pela raça, situação económica ou condição social (cf. Artigos 1º e 13º, nos. 1 e 2, da Constituição).
Ao utilizar os qualificativos de “bandidagem” e “bandidos”com referência expressa aos autores, o 1º Réu perpetrou uma ofensa à honra dos mesmos com o propósito de os rebaixar e aviltar, tranformando-os – na sua ótica – no exemplo do que não devem ser os portugueses “de bem”.
À data em que decorreu o debate, apenas o autor IC tinha três condenações no seu registo criminal, reportando-se a crimes de pequena criminalidade(desobediência, tráfico de menor gravidade e condução sob a influência do álcool). Etiquetar como “bandido” um cidadão com este registo criminal é tudo menos proporcional e necessário. Dos demais autores, sabe-se que três são partes em processo pendente, espoletado pela intervenção policial, não sendo os mesos acusados de ter atacado uma esquadra policial (factos 27 e 28). Ou seja, quanto aos demais autores inexiste qualquer condenação dos mesmos, sendo que – quanto ao inquérito/processo pendente – sempre haverá que acatar a presunção de inocência que só é revertida com o trânsito em julgado de uma sentença condenatória.
Note-se que a via ofensiva trilhada e configurada pelo 1º Réu não era necessária para o 1º Réu se arvorar em maior defensor dos direitos das forças policiais, por contraposição ao seu adversário político MM. Dentro da lógica do seu discurso político, o 1º réu bem poderia enfatizar que o seu adversário não teve o cuidado (diacrónico e equivalente) de visitar as forças policiais, não sendo para tal imprescindível rebaixar e estigmatizar os autores, tranformando-os na personificação dos portugueses que não são “de bem”.
Em suma, não pode prefigurar-se um consentimento dos autores para a utilização da fotografia feita pelos réus e, mesmo que ocorresse tal autorização tácita, a manipulação da fotografia feita pelos réus lesou a honra das pessoas retratadas (nº3 do Artigo 79º do Código Civil).
No que tange à densificação do conceito de honra, e de forma sintética, cabe enunciar que «(…) a honra é concebida como um bem jurídico complexo, envolvendo uma dimensão normativo-pessoal e uma dimensão fáctica. Ela concretiza-se, de um lado, na inata pretensão de respeito inerente a toda a pessoa, assente na sua eminente dignidade humana e, do outro, na adquirida pretensão de respeito da pessoa, resultante das suas relações exteriores, isto é, na sua reputação ou consideração social. Por conseguinte, esta conceção garante o reconhecimento da honra a toda a pessoa, inerente à sua dignidade humana, admitindo-se que ela pode diminuir em determinadas situações (v.g. como resultado do comportamento da pessoa), sem poder nunca desaparecer, nem mesmo aumentar (v.g. em função do estatuto da pessoa), abrindo espaço apenas para a proteção da consideração social merecida, através da admissibilidade da prova da verdade» (Iolanda Rodrigues de Brito, Liberdade de Expressão e Honra de Figuras Públicas, Coimbra Editora, 2010, pp. 42-43). «Todas as pessoas têm direito à honra pelo simples facto de existirem, isto é, de serem pessoas. É um direito inerente à qualidade e à dignidade humana» (Pedro Pais de Vasconcelos, Direito de Personalidade, Almedina, 2006, p. 77).
Em suma, a atuação dos Réus (mormente do 1º) extravasou os limites da liberdade de expressão e lesou o direito à imagem dos autores, sendo que o 1ª Réu fez imputações ofensivas aos autores sem base factual suficiente e de modo totalmente desproporcionado.
Não colhe a objeção dos apelantes quando arguem que da atuação dos Réus não resultou dano para os autores, não se encontrando preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil.

Conforme referem Rui Pinto e Saulo Chanoca, in Rui Pinto e Ana Alves Leal (coords.), Processos Especiais, Vol. I, AAFDL, 2020, p. 59:
«O pedido inibitório tem por causa de pedir uma “ameaça ilícita e direta à personalidade física ou moral de ser humano”. Articulando com a legitimidade, exige- se, pois,
-um facto de aquisição da titularidade de um direito de personalidade, física ou moral;
- um perigo de ilícito, desdobrado em
a.-atuação futura do réu a iniciar ou já iniciada, mas ainda em execução;
b.- ilícita;
c.-idónea a ofender de modo direto aquele direito de personalidade.
A atuação futura não tem de ser iminente, bastante que seja de ocorrência provável segundo um critério de normalidade. (...)
Ao contrário das providências cautelares, a causa de pedir inibitória não integra factos de perigo de dano; sim, factos de perigo de ilícito. Pelo contrário, o perigo de dano que possa advir do cometimento do ilícito é absolutamente irrelevante em sede inibitória e, muito menos, o receito de dano culposamente causado pelo réu: a tutela inibitória apenas de atem ao ato potencial em si mesmo, independente de culpa do réu.»
Por sua vez, Remédio Marques, “Alguns Aspectos Processuais da Tutela da Personalidade Humano no Novo Código  de      Processo Civil de 2013”,acessível em http://www.cei.mi.pt/cei/recursos/ebooks/ProcessoCivil/Reforma do processo civil.pdf afirma:
«De acordo com o n.° 2 do art. 70.° do Código Civil, no domínio da tutela dos direitos de personalidade, um alegado lesado desfruta do direito de solicitar providências tendentes a evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já cometida. (...)
O regime jurídico constante do novo código de Processo Civil privilegia, como se vê, uma tutela definitiva processual geral da personalidade humana fora das pretensões indemnizatórias. (...)
Observe-se, desde já, que o facto voluntário e ilícito que pode estar na origem do decretamento destas providências não implica que haja culpa por parte do demandado, nem que da ofensa ou da ameaça de ofensa da personalidade resultem danos para o autor.
A produção destes danos é indispensável em acções de responsabilidade civil onde se peticionam indemnização, não sendo, como referi, requisito da tutela processual especial da personalidade prevista no CPC. (...)
O facto jurídico voluntário e ilícito de que pode resultar o actuar desta tutela processual especial da personalidade humana não importa a verificação de culpa por parte do demandado , já que os pressupostos das providências previstas n.° 2 do artigo 70.° do Código Civil e actuadas processualmente por meio deste processo especial não se confundem com os pressupostos da responsabilidade civil consignados no artigo 483.° do mesmo Código.»

Também Filipe Miguel Cruz de Albuquerque Matos, Responsabilidade Civil por Ofensa ao Crédito ou ao Bom Nome, Almedina, 2011, pp. 646-647, assinala que:
«(…) resulta com toda a clareza do nº2 do art. 70º uma outra característica particularmente importante das medidas aí previstas: a dissociação entre o âmbito da sua aplicação e o problema da responsabilidade civil. Não é então necessário colocar-se a questão de responsabilidade civil por ofensas aos direitos de personalidade para o julgador poder fazer desencadear a aplicação das medidas atípicas de tutela, entre as quais se inclui de forma paradigmática a figura da retratação pública.»
Conforme bem assinala a doutrina, o processo especial de tutela da personalidade previsto no Artigo 878º e seguintes do CPC não tem como requisito de procedência a prova da existência de danos, mas apenas de factos demonstrativos de perigo de ilícito. Tanto assim é que neste processo não é admissível a formulação de pretensões indemnizatórias – cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa, Código de Processo Civil Anotado, II Vol., 2020, Almedina, pp. 314-315.

INCONSTITUCIONALIDADE DA CONDENAÇÃO À EMISSÃO DE PEDIDO DE DESCULPAS (CONCLUSÕES CCC a FFF).

Por fim, sustentam os apelantes que a condenação à emissão do pedido de desculpas é inconstitucional, por violar o preceituado no Artigo 37º da Constituição. «Condenar um Partido Político e um Dirigente Político, num contexto de expressão de defesa de ideologias políticas é um atentado à democracia
A questão assim suscitada é manifestamente improcedente e impertinente.

Com efeito, o juízo de constitucionalidade é formulável sobre normas e interpretações legais e não sobre decisões judiciais condenatórias de per si. Na síntese clara do Acórdão do Tribunal Constitucional nº 62/2017:
«(…) sublinhamos corresponder a um traço identitário do nosso sistema de controlo da constitucionalidade a respetiva incidência normativa, com o sentido funcional, de há muito cimentado na jurisprudência do Tribunal Constitucional, de abranger normas e interpretações normativas, considerando o Tribunal, “[…] que a sua apreciação e a sua decisão não têm de respeitar necessariamente à norma «on its face» e em toda a sua dimensão, mas bem podem (e devem) muitas vezes circunscrever-se a uma sua certa interpretação – sendo só essa interpretação (a estabelecida pelo tribunal recorrido) que o Tribunal, consoante o que sobre ela vier a entender, avalisará ou cassará” [José Manuel Cardoso da Costa, “Justiça Constitucional e Jurisdição Comum (Cooperação ou Antagonismo)”, Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor José Joaquim Gomes Canotilho, Vol. II, Coimbra, 2012, p. 203]. Com efeito, ao contrário de outros sistemas que consagram a possibilidade de um controlo jurisdicional diretamente dirigido às decisões dos restantes tribunais, como é o caso do sistema espanhol (através do recurso de amparo) e do sistema alemão (por via da queixa de constitucionalidade dirigida ao Tribunal Constitucional), no sistema português a fiscalização incide – e só incide – sobre normas, estando excluída a apreciação pelo Tribunal Constitucional de recursos que questionem, mesmo que o façam numa perspetiva de conformidade a regras e princípios constitucionais, os concretos atos de julgamento expressos nas decisões dos outros Tribunais. Julga este Tribunal, pois, na fase final de controlo concentrado que lhe está cometida, a desconformidade ou não desconformidade, face à Constituição, de normas jurídicas – com o sentido antes referido – aplicadas no tribunal a quo» (sublinhado nosso).
Em suma, não é sindicável a constitucionalidade do segmento da condenação que se reporta à emissão de retratação pública por parte dos réus, sendo certo que a retratação constitui uma medida típica de tutela da personalidade (cf. Filipe Miguel Cruz de Albuquerque Matos, Responsabilidade Civil por Ofensa ao Crédito ou ao Bom Nome, Almedina, 2011, p. 658).
Por todo o exposto, deve improceder a apelação na totalidade.
A fundamentação autónoma da condenação em custas só se tornará necessária se existir controvérsia no processo a esse propósito (cf. art. 154º, nº1, do Código de Processo Civil; Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs. 303/2010, de 14.7.2010, Vítor Gomes, e 708/2013, de 15.10.2013, Maria João Antunes).

DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelos apelantes na vertente de custas de parte (Artigos 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº6 e 663º, nº2, do Código de Processo Civil).



Lisboa, 14.9.2021



Luís Filipe Sousa
José Capacete
Carlos Oliveira

                                      

[1]Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª ed., 2018, p. 115.
[2]Abrantes Geraldes, Op. Cit., p. 119.
Neste sentido, cf. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 9.4.2015, Silva Miguel, 353/13, de 10.12.2015, Melo Lima, 677/12, de 7.7.2016, Gonçalves Rocha, 156/12, de 17.11.2016, Ana Luísa Geraldes, 861/13, de 22.2.2017, Ribeiro Cardoso, 1519/15, de 25.10.2018, Hélder Almeida, 3788/14, de 18.3.2021, Oliveira Abreu, 214/18. O tribunal de recurso não pode conhecer de questões novas sob pena de violação do contraditório e do direito de defesa da parte contrária (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.12.2014, Fonseca Ramos, 971/12).
[3]Cf. também os Acórdãos do STJ 12.1.2021, Graça Amaral, 7693/19, de 6.1.2020, Bernardo Domingos, https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:189.18.2.T8GRD.C1.S1/, de 7.7.94, Miranda Gusmão, BMJ nº 439, p. 526 e de 22.6.99, Ferreira Ramos, CJ 1999 – II, p. 161, da Relação de Lisboa de 10.2.2004, Ana Grácio, CJ 2004 – I, p. 105, de 4.10.2007, Fernanda Isabel Pereira, de 6.3.2012, Ana Resende, 6509/05, acessíveis em www.dgsi.pt/jtrl.
[4]Acórdão do TCAS de 16.1.2020, Sofia David, 615/15.
[5]Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 9.6.2011, Filipe Caroço, 5/11.
[6]Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30.4.2014, Belo Morgado, 319/10.
[7]Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8.3.2001, Ferreira Ramos, acessível em www.dgsi.jstj/pt.
[8]Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3.10.2002, Araújo de Barros, acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[9]Sendo relatora Rosário MorgadoECLI:PT:STJ:2020:12.15.0TNLSB.L1.S1.
[10]A Lei nº 65/78, de 13 de outubro aprovou, para ratificação, tal Convenção.
[11]Neste sentido, cf. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª Ed. Revista, p. 138.
[12]Cf. Ac. do Tribunal Constitucional nº6/84, Magalhães Godinho, BMJ nº 340, p. 179.
[13]Cf. Nota 58 da 2ª edição da mesma obra.
Sobre a epígrafe de “Direito constitucional de conflitos e proteção de direitos fundamentais”, veja-se ainda o artigo do mesmo autor na RLJ, Ano 125º, p. 35 e ss.
[14]Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13.7.2005, Granja da Fonseca, acessível em www.dgsi.pt/jtrl, de 20.4.2006, Granja da Fonseca, CJ 2006- II, pp. 107-110, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.2.2002, Oliveira Barros, CJ AcSTJ 2002 – I, pp. 92-96, de 5.12.2002, Araújo de Barros, acessível em www.dgsi.pt/jstj, de 16.11.2006, Rodrigues dos Santos, acessível no mesmo site.
[15]Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 5.3.96, Fernando Fabião, CJ 96-I, pp. 123-129, de 29.10.96, Aragão Seia, BMJ nº 460, pp. 686-699, de 7.3.2002, Oliveira Barros, 184/02, de 10.10.2002, Oliveira Barros, 2751/02, de 26.2.2004, Araújo Barros, 3898/03, de 3.3.2005, Ferreira de Almeida, 4789/04, de 27.1.2010, Silva Salazar, 48/04.
[16]Na expressão de Iolanda Rodrigues de Brito, Op. Cit., p. 80, Nota 111, no âmbito da jurisprudência do TEDH, “Na ponderação entre liberdade de expressão e direito à honra, sobretudo de figuras públicas, os pratos da balança partem de uma posição desequilibrada, em desfavor do direito à honra.”