Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
606/13.8TCFUN.L1-1
Relator: ISABEL FONSECA
Descritores: FACTOS
JUÍZOS CONCLUSIVOS
PERICULUM IN MORA
INDÍCIOS
ÓNUS DA ALEGAÇÃO
ÓNUS DA PROVA
JUSTO RECEIO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/09/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: As enunciações constantes dos articulados das partes que se reconduzem a meros juízos conclusivos e de direito, a afirmações genéricas, vagas e abstractas que não se reconduzem a factos – só estes importam –, não devem ser incluídas no acervo fáctico probatório; quando o são, indevidamente, têm as mesmas que ser desconsideradas, isto é, impõe-se que (oficiosamente) se considerem as mesmas como juridicamente irrelevantes – não escritas, na terminologia da anterior lei processual civil (art. 646º, nº4).

2. Tem a jurisprudência convergido no entendimento de que se verifica o requisito aludido no art. 392º, nº 1 do C.P.C. (periculum in mora) sempre que dos factos dados como (indiciariamente) assentes se retira que o requerido praticou actos de alienação/oneração/ocultação/dissipação do seu património; que o requerido se furta aos contactos com a requerente, na tentativa de assim retardar e/ou impossibilitar o cumprimento da obrigação; que o requerido se encontra em situação económica deficitária, com uma evidente desproporção entre o activo e o passivo, sem réditos ou sem desenvolver qualquer actividade produtiva, e com inviabilidade de recurso ao crédito etc, etc…

3. É sobre o requerente da providência que recai o ónus de alegação e prova dos factos constitutivos do seu direito, tendo por referência os requisitos para o decretamento da providência de arresto - art. 342º do Cód. Civil – e não ao demandado o ónus de prova da factualidade inversa.

4. Evidenciando os autos que a sociedade (requerida) está no pleno exercício da sua actividade, sem que se tenham apurado quaisquer constrangimentos de ordem financeira; que não foi formulada imputação de que se verifica uma insolvência técnica (com passivo a exceder largamente o activo e sem recurso a crédito); que tem património mobiliário e imobiliário, sem que lhe seja apontada qualquer actuação no sentido de esvaziar a garantia (de pagamento) que esse património representa, não se tendo igualmente apurado a prática de actos de gestão que ponham em perigo a solvabilidade da empresa, não pode ter-se como preenchido o aludido requisito de justo receio de perda de garantia patrimonial.

(Sumário da Relatora)

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa  

1. RELATÓRIO

K, S. A., com sede (…) intenta contra A – Equipamentos Hoteleiros, S. A., com sede (…)a presente providência cautelar de arresto pedindo a determinação do arresto a incidir sobre bens da requerida, designadamente, cinco imóveis, veículos, os saldos credores de todas as contas bancárias de que a requerida seja titular ou co-titular em instituição de crédito a operar em Portugal e quaisquer valores mobiliários que lhe pertençam e os créditos de que seja titular por fornecimentos efectuados à PD.

Alega que no exercício da sua actividade forneceu à requerida diverso equipamento, conforme oito facturas que juntou, e a requerida não procedeu ao pagamento do preço, estando em dívida o valor de 722 882,56€; o balanço da requerida revela um activo de 9 980 721,17€ a título de créditos sobre accionistas e no passivo corrente a quantia de 8 279 330,23€ a título de adiantamentos a clientes, o que significa que o dinheiro recebido é transferido para os accionistas em prejuízo da tesouraria.

Foi proferida decisão que decretou o arresto dos prédios, veículos, saldos de conta de depósito, créditos que a requerida tenha a receber e a quota de que é titular no capital social da A, Lda..

Efectuado o arresto e notificada a requerida esta veio deduzir oposição alegando, em síntese, que:

A requerente e a requerida mantêm uma relação comercial desde há cerca de vinte anos, fornecendo a requerente equipamento comercial à requerida, com diferentes condições financeiras consoante os mercados a que se destina a mercadoria.

Em Abril de 2002 a requerida começou a trabalhar nos mercados da Polónia e Colômbia com o Grupo (…). As condições de pagamento foram acertadas numa reunião em Barcelona mas logo depois a requerente começou a pressionar a requerida para proceder ao pagamento de adiantamentos e foi atrasando os fornecimentos.

A requerida veio a verificar que a requerente estava com problemas financeiros e sem capacidade de assegurar os compromissos de fornecimento assumidos, o que acabou por prejudicar inicialmente todo o negócio da requerida nos mercados da Polónia e Colômbia e, posteriormente, de Angola e Portugal.

Em consequência da actuação da requerente a requerida sofreu prejuízos quanto aos contratos de fornecimento da Polónia, da Colômbia, de Angola, da Madeira e ainda a outros contratos de fornecimento (nomeadamente o fornecimento da loja (…)em Cabo Verde e da loja (…) na Venezuela), pelo que a requerida é credora da requerente pelo valor de 719.409,28€, valor correspondente aos prejuízos sofridos e já apurados, não tendo a requerida interpelado a requerente para pagamento deste valor uma vez que o saldo final ainda não está apurado.

A requerida tem capacidade económica e financeira para proceder ao pagamento do valor em dívida, é uma empresa saudável e não tem dificuldades de financiamento pelo que não existe receio de perda de garantia patrimonial.

A requerida não tem qualquer acção judicial a correr termos contra si.

A requerida emprestou dinheiro à sócia e empresa mãe A SA e a outras empresas do grupo, não para pagar dividendos mas apenas para utilizar o dinheiro onde é mais necessário dentro das empresas do grupo, evitando encargos financeiros desnecessários, pelo que não se pode concluir, como se fez na decisão proferida, que a “requerida recebe adiantadamente dos seus clientes e transfere o dinheiro recebido para os seus accionistas, em prejuízo da sua tesouraria”, nem que “o risco de crédito atribuído à requerida é elevado”.

A requerente litiga de má fé porque apenas pretende manietar a capacidade de crédito da requerida e criar desconfiança quanto a esta, afectando o seu nome comercial.

Pugna, deste modo, pela procedência da oposição e pelo levantamento do arresto decretado.

Foram inquiridas as testemunhas arroladas.

Proferiu-se decisão que concluiu nos seguintes termos:

“Nestes termos e com tais fundamentos, decide este Tribunal julgar parcialmente procedente a presente oposição e, em consequência:

a) manter o arresto decretado que incidiu sobre os bens identificados nos pontos 1), 3), 4) e 5) da decisão de fls. 307 a 315 dos autos;

b) determinar o levantamento do arresto que incidiu sobre os veículos identificados no ponto 2) de tal decisão.

Custas a cargo da requerida, nos termos do art. 527º do CPC.

Registe e notifique”.

Não se conformando a requerida apelou, apresentando alegações, com conclusões, a fls.678 a 749, articulado para o qual se remete [ [1] ]. 

A requerente apresentou contra alegações.

Admitido o recurso interposto, o tribunal proferiu ainda o seguinte despacho:

“Nas suas alegações de recurso a recorrente invoca a nulidade da decisão decorrente da omissão de pronúncia relativa à determinação do valor real dos imóveis sobre os quais incidiu o arresto por entender que este é muito superior ao seu valor patrimonial tributário, pelo que o arresto com a abrangência com que fora determinado seria desproporcional ao montante do crédito.

Entende-se que não se verifica a aludida omissão de pronúncia porquanto o Tribunal pronunciou-se sobre a invocada desproporção do alcance do arresto relativamente ao montante do crédito, ponderando, designadamente quanto aos imóveis arrestados, que sobre eles incidem hipotecas, referindo claramente ter optado pelo valor patrimonial tributário, em consonância, aliás, com o estatuído nos art.ºs 391º, n.º 2 e 812º, n.º 3, a) do CPC.

Acresce que a requerida, ora recorrente, não atribuiu um valor diferente aos bens imóveis, limitando-se a afirmar, de modo conclusivo, que o seu valor real é superior ao valor patrimonial tributário sem sequer indicar ou atribuir o valor que considerava adequado.

Não ocorre, pois, a aludida nulidade consistente na omissão de pronúncia.

Notifique”.

Cumpre apreciar.

II. FUNDAMENTOS DE FACTO

A primeira instância deu indiciariamente como assentes os seguintes factos:

Em audiência realizada em 04-12-2013 (em momento anterior à citação do requerido):

1. A requerente dedica-se ao fabrico, comércio e montagem de equipamentos comerciais.

2. No exercício da sua actividade, no corrente ano de 2013, a requerente vendeu e entregou à ora requerida, a pedido desta, a estanteria, os demais equipamentos e os produtos discriminados nas facturas e guias de remessa que constam de fls. 27 a 207, que aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais, no montante total de € 827 375,87.

3. A requerida aceitou os preços e as datas de vencimento que constam dessas facturas.

4. Tais facturas foram enviadas pela requerente à requerida, que as recebeu.

5. A requerida não pagou as quantias indicadas nas facturas, nem nas respectivas datas de vencimento, nem posteriormente, apesar das insistências da requerente para que o fizesse.

6. Tendo-se limitado a entregar à requerente a importância de € 103 727,25 (cento e três mil, setecentos e vinte e sete euros e vinte e cinco cêntimos), para pagamento parcial da factura n.º 13-1424, de 31-3-2013.

7. Ao valor total indicado nessa factura deverá, ainda, ser deduzida a quantia de € 766,06 (setecentos e sessenta e seis euros e seis cêntimos), correspondente à nota de crédito com o n.º 13-1886, de 23-4-2013.

8. O montante total devido à requerente pela requerida é, hoje, de € 722 882,56 (setecentos e vinte e dois mil, oitocentos e oitenta e dois euros e cinquenta e seis cêntimos).

9. A requerida também não pagou fornecimentos que lhe foram efectuados pela sociedade K, Lda., que é a subsidiária da requerente em Portugal, no montante global de € 165 538,36, estando a totalidade dessa dívida vencida desde 15 de Agosto de 2013.

10. Tem um processo judicial pendente por uma dívida a outro fornecedor, com o valor de € 9 968,52.

11. O balanço da requerida referente ao exercício de 2012, depositado no Registo Comercial, apresenta, no activo corrente, o montante de € 9.980.721,17, a título de créditos sobre accionistas e, no passivo corrente, a quantia de € 8.279.330,23, a título de adiantamentos de clientes.

12. A requerida recebe adiantadamente dos seus clientes e transfere o dinheiro recebido para os seus accionistas, em prejuízo da sua tesouraria.

13. No relatório que consta de fls. 211 a 225 o risco de crédito atribuído à requerida é elevado.

14. A requerida tem registada a seu favor a propriedade dos seguintes imóveis (todos adquiridos por compra):

a) fracção autónoma designada pela letra "M", correspondente ao quarto andar, unidade habitacional tipo T1, do prédio urbano sito no Funchal, (…);

b) prédio rústico sito no (…), com a área de 1.620m2, na freguesia de (…);

c) fracção autónoma designada pela (…);

d) fracção autónoma designada pela (…);

e) fracção autónoma designada pela (…).

15. Os imóveis identificados nas alíneas a) e b) do ponto 14. têm, respectivamente, o valor patrimonial tributário de € 39.980,00 (determinado em 2012) e de € 137,99.

16. As fracções autónomas identificadas nas alíneas c), d) e e) do ponto 14. têm os valores patrimoniais tributários (determinados em 2011), respectivamente, de € 73.081,50, € 148.414,38 e € 90.459,63.

17. Essas fracções estão oneradas com as seguintes hipotecas: a fracção autónoma AL, com hipoteca voluntária para garantia do capital de € 119 000,00, com um montante máximo assegurado de € 156.336,25; as fracções autónomas AM e NA, com hipoteca voluntária para garantia do capital de € 360.000,00, com um montante máximo assegurado de 477.000,00.

18. A requerida tem registada em seu nome a propriedade dos seguintes veículos automóveis

a) veículo com a matrícula (…), de marca P.;

b) veículo com a matrícula (…), de marca N.;

c) veículo com a matrícula (…), de marca V.;

d) veículo com a matrícula (…), de marca I.;

e) veículo com a matrícula (…), de marca M., sobre o qual incide penhora a favor da Top (…);

f) veículo com a matrícula (…), de marca T., sobre o qual incide penhora a  favor da P, Lda.

19. É de presumir que a requerida seja titular de contas bancárias que a requerente não consegue identificar adequadamente.

20. A ora requerente não conhece quaisquer outros bens à requerida.

Em audiência realizada em 10-02-2014 (depois da citação do requerido):

1. A requerida é uma sociedade anónima de direito português que tem como objecto a comercialização de equipamentos para hotelaria e similares.

2. A requerida faz parte de um grupo de sociedades onde se inclui a H e R.

3. A requerida e a requerente começaram a colaborar entre si há cerca de 20 anos atrás, com trabalhos para o mercado da Região Autónoma da Madeira.

4. Em 2008, iniciou-se a expansão da requerida para mercados internacionais mantendo-se a colaboração com a requerente.

5. As compras efectuadas pela requerida ao Grupo K (onde se insere a requerente e a K Lda.) foram sempre aumentando tal como se afere do gráfico que consta de fls. 361 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido.

6. No ano 2008 o Grupo A inicia a sua expansão para a Venezuela e Angola.

7. Na Venezuela a requerida executou 29 Supermercados P (…).

8. Para o efeito, a requerida contratou a requerente para fornecimento de materiais e assegurava a operação através de pronto pagamento.

9. Para os mercados de Portugal (R. A. Madeira) e Angola foram acordados prazos de pagamento específicos com a KP.

10. Até meados de 2013, houve sempre um cordial e cooperante entendimento entre os responsáveis das duas entidades.

11. A requerida contratou o Grupo K para o fornecimento de materiais no mercado de Angola onde executou obras com o Grupo Ke  e Grupo E.

12. No mercado português, na Região Autónoma da Madeira, a requerida contratou o Grupo K para o fornecimento de materiais para execução de todas as lojas do Grupo J, Grupo S e em Portugal Continental, do Grupo CS nos seus Supermercados G.

13. No mercado de Cabo Verde, a requerida contratou a KP para fornecimento de materiais, tendo em vista a execução das lojas do Grupo V.

14. Em Abril de 2012, a requerida começou a trabalhar também nos mercados da Polónia e da Colômbia com o Grupo JM.

15. A gestão do cliente Grupo JM envolve um trabalho técnico, que passa por:

i) Processo de homologação de estanteria segundo os Standards (…);

ii) Desenvolvimento de Lojas Tipo;

iii) Desenho e fabrico de protótipos;

iv) Desenvolvimento de manuais com especificações;

v) Testes e aprovação de Lojas Piloto e consequentes modificações;

vi) Logística que garanta a compra, transporte, distribuição e montagem de 50 lojas ano

em média, e as remodelações necessárias no mesmo período;

vii) Dispor e garantir stock de peças necessário à rápida resposta para montagem de Lojas consoante plano do Cliente;

viii) Controlo de cerca de 250 referências de equipamento de Loja (Estanteria, Check Outs e Carros de Auto Serviço);

ix) Cumprimento de prazos de fornecimento.

16. A operação do Grupo JM teve início em Abril de 2012 e envolvia a contratação da requerente para o fornecimento dos materiais, tendo esta sido chamada desde o início a desenvolver toda a operação.

17. Numa reunião realizada em Barcelona, no dia 17 de Outubro de 2012, com a presença do Sr. (…), foram estabelecidas diversas condições de cooperação, nomeadamente operacionais e financeiras.

18. Relativamente às condições financeiras para os mercados da Polónia e Colômbia, ficaram consignadas em acta as seguintes condições:

Polónia – Pagamento das facturas da requerente a 90 dias a partir da data do recebimento do material no armazém, na Polónia;

Colômbia – Pagamento a 120 dias, com a menção de que seria necessário para tanto um pagamento antecipado ou a apresentação de documento que permitisse à requerente negociar com os bancos.

19. Após esta reunião em Barcelona, entre 30/10/2012 e 02/11/2012, foram trocadas mensagens electrónicas entre a administração da requerente e a administração da requerida nas quais aquela solicitava a esta um documento para poder justificar o pedido de financiamento bancário de forma a poder iniciar a produção dos materiais a fornecer posteriormente à requerida, tendo sido sugerido por SC a apresentação de “confirming”.

20. A contratação de fornecimentos à requerida passava sempre pelas seguintes etapas:

1.ª – Encomenda e negociação de conjunto de estanteria para um projecto global para cada país pela requerida à requerente;

2.ª - Requisição faseada dos materiais, consoante plano de abertura de lojas do cliente final, pela requerida à requerente;

3.ª – Entrega faseada dos materiais, consoante plano de abertura de lojas do cliente final, pela requerente à requerida;

4.ª – Emissão de factura dos materiais entregues pela requerente;

5.ª – Pagamento de factura dos materiais entregues pela requerida.

21. Em Novembro/Dezembro de 2012, foi solicitado pela administração da requerente que a requerida facultasse um pagamento antecipado ou a apresentação de documento de “confirming” a 90 ou 120 dias pelo valor total de cada factura (Colômbia ou Polónia); ou uma carta de crédito pelo total da factura ou um pagamento antecipado de 40% sobre a facturação e o resto a 90 ou 120 dias (Colômbia ou Polónia).

22. Este pedido foi analisado pela Administração da requerida que acedeu a uma antecipação de 30% para o mercado da Colômbia, a oito dias após a encomenda e o restante até 120 dias da data da factura.

23. Com data de 27/06/2013, o Sr. P da KP enviou uma mensagem electrónica à requerida onde consta o seguinte: “Mesmo com os problemas financeiros que a K atravessa, a empresa continua com capacidade de produção, mas foi obrigada pelas circunstâncias do momento a alterar as características e métodos de pagamento que tinha para com os clientes. Em resumo, para se poderem cumprir as obrigações necessárias aos processos de fabricação de projectos como os destas lojas Ke (de grande dimensão), será sempre necessário (pelo menos neste momento) receber em forma de adiantamento algo perto de 50% do seu valor. Sem este condicionante que reconheço ser de grande relevância, penso que não será possível às fábricas de momento assumirem o arranque destes projectos ou de outros similares.”

24. Por mensagens electrónicas de 14 de Junho de 2013 e 10 de Outubro de 2013, a requerente deu conta à requerida que necessitava de um adiantamento de 50% sobre o valor da encomenda para a Polónia para poder assegurar o respectivo fornecimento ou a antecipação por alguns dias da factura que se vencia em final de Outubro de 2013.

25. Mais informou a requerente que face às suas condições financeiras necessitariam de prever adiantamentos de 50% relativamente às encomendas solicitadas.

26. Por mensagem electrónica de 4 de Dezembro de 2012, a administração da requerente solicita à requerida alterações ao acordado sobre a forma de pagamento para as operações da (…), na Polónia.

27. Em Fevereiro de 2013, a requerente interpela a requerida para proceder ao pagamento de mais um adiantamento de 30% em relação à operação de Colômbia, ao que a requerida respondeu não ter sido assim acordado e não lhe ser possível assegurar pagamentos atempados de outro modo.

28. Por mensagem electrónica com data de 31 de Julho de 2013 a requerente formaliza junto da requerida a sua proposta quanto às condições futuras para o relacionamento comercial com esta.

29. Por mensagem electrónica com data de 1 de Agosto de 2013, a requerida comunicou ao Sr. DT a sua posição quanto à proposta, referindo que para os mercados de Angola, Colômbia e Polónia, os prazos de pagamento nunca poderiam ser inferiores a 120 dias face ao processo de entrega relativo aos clientes.

30. A requerida solicitou ainda à requerente a entrega dos recibos de quitação de todas as transferências bancárias respeitantes a pagamentos efectuados, que até então não tinham sido entregues.

31. Em Julho de 2013, a requerida foi notificada no âmbito do Concurso Voluntário – Procedimiento Ordinario nº (…), para, querendo, reclamar créditos no âmbito de tal processo.

32. Por mensagem electrónica de 25 de Junho de 2013, remetida pelo Sr. PE ao Sr. JG, aquele dá conta do pedido de “concurso de credores” por parte da administração executiva do Grupo K, S. A., com o que justifica os atrasos verificados na entrega dos materiais encomendados ao Grupo K.

33. Por carta com data de 25/09/2013, a requerida foi interpelada para proceder ao pagamento dos valores em dívida para com a requerente por parte do Sr. (…), em representação de Ge, S.L.P..

34. Na Polónia a requerente não cumpriu uma encomenda, com o principal objectivo de reabastecimento de stock, designadamente para completar lojas e para dar seguimento ao plano de montagem.

35. Perante a frustração do fornecimento e perante as perspectivas pouco animadoras quanto ao  futuro e capacidade de fornecimento pela requerente a requerida viu-se obrigada a mudar de fornecedor neste país.

36. Isto implicou para a requerida e para a sociedade parceira neste negócio –(…): imobilização de stock de material K para B; perda de vendas e de ganho/lucro devido à interrupção no fornecimento K.

37. A requerida ficou com stock de lojas por não ser possível montar Lojas completas, atendendo à interrupção de fornecimento por parte da requerente.

38. Ao mudar de parceiro e marca de estanteria e após a sua aprovação pela B, já não é possível tornar a colocar estanteria K nas lojas daquele cliente, atendendo aos procedimentos previamente aprovados por este.

39. As remodelações nestas lojas podem levar 5 a 6 anos, inviabilizando a utilização deste stock.

40. Atendendo ao risco de perda total da operação com a B na Polónia a empresa parceira da requerida neste negócio e pertencente ao mesmo grupo económico, a I PL, viu-se forçada a comprar localmente à concorrência, por preços mais elevados do que os da requerente, que tiveram como resultado a perda de margem/ganho, sempre associado aos custos de logística inerentes.

41. A I PL tem stock armazenado que não pode utilizar devido a encomendas efectuadas pela requerida à requerente e não satisfeitas integralmente por esta, uma vez que as requisições dos materiais eram feitas de forma faseada de acordo com a fase do plano de abertura de lojas do cliente B.

42. Na Colômbia a requerente não satisfez a encomenda correspondente à requisição n.º 130428 que visava reabastecimento de stock para completar lojas e dar seguimento ao plano de montagem, em relação à qual exigira a antecipação de 50%, encomenda que foi cancelada pela requerida por mensagem electrónica de 02/07/2013.

43. A requerida efectua uma nova encomenda (requisição n.º 130603 de 19-09-2013) à requerente, a que esta responde que para tanto se torna necessário a requerida regularizar a situação de facturas vencidas.

44. A requerida mudou de fornecedor também na Colômbia e a sociedade parceira da requerida neste país – H – e a própria requerida ficam com imobilização de stock de material K para lojas ARA que se tornou inútil por não ser possível montar lojas completas em face da interrupção de fornecimento por parte da requerente.

45. As remodelações nestas lojas podem levar 5 a 6 anos a fazerem-se.

46. As requisições dos materiais eram feitas de forma faseada de acordo com a fase do plano da obra.

47. Em Angola, a requerida concorreu em Maio/Junho de 2013 para executar 3 lojas do Grupo Ke (…).

48. Por mensagem electrónica de 27 de Junho de 2013 a requerente dá conta à requerida que o fornecimento para as lojas Ke passaria, pelo menos nesse momento, por um adiantamento perto de 50% do seu valor e a requerida respondeu por mensagem de 28 de Junho de 2013 que perdera a obra sobretudo devido a esta situação de incerteza e ao facto de ser exigido pagamento de 50%, por o cliente não pagar mais de 20% de entrada.

49. A terceira loja foi adjudicada à requerida e por mensagem de 14 de Julho de 2013 esta informa a requerente que necessita de dar mais 10% de desconto e saber as datas certas de entrega.

50. Por mensagem de 30 de Julho de 2013 a requerida dá conta à requerente que devido aos prazos de entrega o cliente Ke suspendeu a adjudicação à H, tendo sido esclarecido por mensagem electrónica da mesma data que se tratava de anulação por causa do prazo de entrega dos equipamentos.

51. A K P foi contratada pela requerida para fornecimento de moedeiros ao Grupo K em Angola.

52. No mercado de Angola, entre a requerente e a requerida foi acordada uma comissão de venda pela loja (…).

53. Esta comissão foi dada como processada no dia 03/05/2013 pelo Sr. PE, com indicação de envio de Notas de Crédito na semana seguinte.

54. Após meses com insistência por parte da requerida junto dos serviços da requerente para proceder a este pagamento, o Sr. PE, em 04/09/2013, informou que o pagamento da comissão está nas mãos da Direcção Comercial da requerente para validação (ou não).

55. Na Madeira a requerente não entregou atempadamente o equipamento encomendado pela requerida necessário à execução da loja P pois que a encomenda foi efectuada no dia 28/06/2013 e a entrega foi sucessivamente adiada até Julho de 2013.

56. A requerida justificou directamente ao cliente o motivo do atraso.

57. No final do ano de 2012, a requerente atrasou-se no fornecimento da Loja (…), em Cabo Verde.

58. Na Venezuela, para a execução de uma loja D, a requerida contratou os fornecimentos da requerente.

59. Os materiais saíram da fábrica da requerente em Abril de 2013 e chegaram à Venezuela em Junho de 2013.

60. Durante a montagem dos equipamentos, a equipa local da requerida detectou faltas de material e material enviado errado.

61. Contactada a requerente sobre o ocorrido, esta, em Setembro de 2013, invocou nas respostas apresentadas o não pagamento por parte da requerida de facturas anteriores.

62. A requerida tentou agendar uma reunião com a requerente e em face da ausência de respostas por parte desta, aquela enviou-lhe uma carta registada datada de 31/10/2013, interpelando-a para a marcação de uma reunião com a seguinte ordem de trabalhos:“1.  Liquidación de las deudas entre (…); 2. La reformulación de la relación comercial; 3. Otros asuntos de interés para ambas partes.”

63. Em resposta, a requerente enviou uma carta com data de 21 de Novembro de 2013 que consta de fls. 620 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, onde impugna o afirmado pela requerida e refere que não lhe parece necessária uma reunião considerando que a requerida não apresentou até então uma proposta ou plano de pagamento que possa ser discutida de forma séria e construtiva, informando ainda que irão recorrer à via judicial.

64. A requerida efectuou o pagamento, por transferência bancária, de € 40.000,00 e € 60 000,00, em 11/10/2013 e € 50 000,00, em 28-10-2013.

65. A acção executiva n.º  que correu termos no 1º Juízo em que era exequente M e executada A, S. A., sendo o valor da quantia exequenda de € 9 968,52 foi declarada extinta em Abril de 2012 por desistência do exequente.

66. A requerida funciona em contexto de grupo de tal modo que empresta dinheiro à sócia e empresa mãe A, S.A. e outras empresas do grupo, de modo a utilizar o dinheiro onde é mais necessário dentro das empresas do grupo, evitando encargos financeiros.

67. A requerida é uma empresa de envergadura internacional.

68. A requerida remeteu ao Grupo JM uma carta com data de 27 de Novembro de 2013 dando conta da actuação da K, S. A. junto dos clientes daquela conforme consta de fls. 632 a 635 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

69. O M dirigiu uma carta à requerida, com data de 20 de Dezembro de 2013, informando que todas as suas contas bancárias foram arrestadas.

III. FUNDAMENTOS DE DIREITO

1. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela apelante e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – arts. 635º e 639º do novo C.P.C. [ [2] ], diploma a que aludiremos quando não se fizer menção de origem – salientando-se, no entanto, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito –  art.º 5º, nº3.

No caso, ponderando as conclusões de recurso, impõe-se apreciar:

- do julgamento da matéria de facto;

- da nulidade de sentença por omissão de pronúncia;

- da verificação dos pressupostos para o decretamento do arresto: da excepção de compensação;

- da verificação dos pressupostos para o decretamento do arresto: do justificado receio de perda da garantia patrimonial;

2. A apelante pretende que se adite à factualidade assente matéria muito vasta, que especificamente enuncia, tomando por referência a decisão proferida, na parte em que aí se indicou a matéria tida como não provada.

Vejamos, então, se procede a argumentação da requerida, considerando que esta deu cumprimento ao disposto no art. 640º, não se limitando a uma impugnação genérica e global, sustentada em mera afirmação de discordância.

Previamente, porém, há que delimitar a intervenção da Relação quando está em causa apreciar da valoração probatória feita pelo tribunal de primeira instância.

Essa análise só deve ser efectuada com referência àqueles factos que assumem relevância para a decisão do mérito da causa, ponderando as várias soluções plausíveis de direito, quer na perspectiva da acção, quer da defesa. Considerando que o tribunal está vinculado a providenciar pelo andamento regular e célere do processo, recusando o que for impertinente e dilatório – art. 6º, nº1 –, nenhum sentido ou utilidade teria efectuar uma análise crítica sobre o mérito da valoração da prova feita pela primeira instância, quando a impugnação do julgamento de facto recaia sobre factos que não tem qualquer potencialidade de influenciar o sentido da decisão (factos essenciais, instrumentais ou complementares, conforme o art.5º). Acrescente-se que a afirmação serve para as hipóteses de exclusão/eliminação de factos dados como assentes pelo Meritíssimo Juiz, como também para as hipóteses de inclusão de factos a que, indevidamente, o tribunal não atendeu e até nas situações de simples alteração dos termos em que determinado circunstancialismo é dado como provado [ [3]  ].

Por outro lado, está em causa exclusivamente o apuramento de matéria de facto e não de matéria de direito. Admitindo-se o “melindre da distinção” [ [4] ], temos no entanto por seguro que meras conclusões ou apreciações valorativas, não se enquadram na definição (naturalística) de facto, como o “acontecimento ou circunstância do mundo exterior ou da vida íntima do homem, pertencente ao passado ou ao presente, concretamente definido no tempo e no espaço e como tal apresentando as características de objecto” [ [5] ], cabendo nesta “categoria” (factos processualmente relevantes), não apenas “os eventos reais, as ocorrências verificadas”, como ainda “as ocorrências virtuais (os factos hipotécticos), que são, em bom rigor, não meros factos, mas verdadeiros juízos de facto” [ [6]  ].

Em suma, as enunciações constantes dos articulados das partes que se reconduzem a meros juízos conclusivos e de direito, a afirmações genéricas, vagas e abstractas que não se reconduzem a factos – só estes importam –, não devem ser incluídas no acervo fáctico probatório, acrescentando-se que, quando o são, indevidamente, têm as mesmas que ser desconsideradas, isto é, impõe-se que (oficiosamente) se considerem as mesmas como juridicamente irrelevantes – não escritas, na terminologia da anterior lei processual civil (art. 646º, nº4).

Posto isto, centremo-nos no recurso interposto pela requerida, incidindo sobre a matéria de facto, ponderando a matéria que especificamente pretende que se dê como assente, com a consequente ampliação da factualidade dada por provada bem como os elementos de prova concretamente indicados, nomeadamente os depoimentos das testemunhas (…), a cuja audição se procedeu.

                                                        *   

(…) [ [7]  ] [ [8]  ] [ [9] ]  [ [10] ] [ [11] ]  [ [12] ] [ [13] ] [ [14] ] (…)

                                                            *

Pretende ainda a apelante que se dê por assente que:

- Não há na presente data qualquer risco de recair qualquer penhora sobre os bens da requerida;

- Face aos prejuízos já apurados e compensado o valor efectivo em dívida das facturas juntas com o requerimento inicial, resulta nesta data um crédito a favor da requerente tão só no montante de € 3 473,37;

- A requerida é uma empresa que paga os compromissos comerciais que assume e não tem processos judiciais pendentes intentados contra si, de qualquer natureza – seja para cobrança de dívida ou outra;

- O arresto dos prédios de que a requerida é titular, atento ao seu valor real, seria suficiente para garantia do crédito de que a requerente se diz titular.

Á excepção da referência de que a requerida “não tem processos judiciais pendentes intentados contra si, de qualquer natureza – seja para cobrança de dívida ou outra”, matéria a que se aludirá infra, entendemos que estamos perante matéria conclusiva e de direito pelo que não pode ser levada aos factos assentes.

Acrescente-se que, relativamente ao valor dos prédios, nunca a requerida aludiu devidamente a essa matéria, limitando-se a alegar conforme consta do art. 244º do articulado de oposição [ [15] ].

Quanto à pendência de acções judiciais, entendemos que se impõe um aditamento à matéria assente.

Vejamos.

O presente procedimento cautelar foi instaurado em Novembro de 2013 e a requerente invocou no art. 10º do requerimento inicial que a requerida “tem processos judiciais pendentes por dívidas a outros fornecedores, no montante global de €351.853,03 (cfr. relatório de informações comerciais que se junta como doc. nº20”.

Em audiência de julgamento, antes da citação da requerida, a requerente rectificou esta alegação, como segue:

 “K, S. A., requerente no procedimento cautelar de arresto acima identificado, vem, ao abrigo do disposto nos art.ºs 146.º e 260.º a contrario, do Código de Processo Civil:

A – Corrigir o art. 10.º do requerimento inicial, porquanto, por lapso manifesto do mandatário, foi aí alegado, por referência ao que consta do doc. n.º 20 (pág. 7), que a requerida tem processos judiciais pendentes por dívidas a outros fornecedores, no montante global de € 351.853,03, quando, na verdade, esse valor se reporta a processos instaurados pela mesma e não contra ela. Assim sendo, rectifica-se o artigo 10.º do r.i., em consonância com o que consta da pág. 6 do referido documento, passando o seu teor a ser o seguinte:

 “10.º - E tem um processo judicial pendente por uma dívida a outro fornecedor, com o valor de € 9.968,52 (cf. relatório de informações comerciais que se junta como doc. n.º 20).”

B – Corrigir o mesmo lapso no art. 23.º do requerimento inicial, pelo que o teor desse artigo passa a ser o seguinte:

“23.º - A Requerida é ainda devedora, à subsidiária portuguesa da Requerente, do montante de € 165.538,36 e a outro credor que contra ela tem um processo judicial pendente, do montante de €: 9.968,52.”

Tendo o tribunal deferido à requerida rectificação considerou depois como provada a pendência de acção executiva contra a requerida, pelo montante de 9.968,52€ - número 10 dos factos assentes –, factualidade que veio a revelar-se incorrecta porquanto, depois da citação da requerida, e na sequência de nova produção de prova, se deu como assente que essa execução tinha sido declarada extinta em Abril de 2012, isto é, muito antes da instauração da presente providência – facto provado sob o número 65.

Ou seja, dúvidas não há que pelo menos à data de instauração do presente procedimento cautelar a requerente da providência não logrou assinalar a pendência de qualquer acção judicial contra a requerida – as que assinalou fê-lo incorrectamente.

Quanto à requerida, estando agora em causa o ónus de prova de inexistência de processos judiciais instaurados contra si, isto é, a prova de facto negativo, tem de reconhecer-se a particular dificuldade – se não impossibilidade – de juntar documento comprovativo dessa factualidade (facto negativo). Quedava-se, pois, pela possibilidade de apresentação de prova testemunhal, que concretizou.

Efectivamente, a testemunha PR, que trabalha para a requerida desde Outubro de 2009, exercendo funções de controler financeiro, inquirido expressamente sobre a pendência de “acções executivas, acções judiciais”, respondeu negativamente, sendo que a testemunha MQ, técnico oficial de contas da requerida desde 2011, indicou igualmente não haver processos contra a requerida, à excepção do presente.

Saliente-se que não se encontra no despacho de fundamentação do julgamento de facto qualquer indicação a este respeito, ou seja, não se compreende, no contexto assinalado supra, das razões pelas quais a Meritíssima Juiz não deu como assente a factualidade ora em causa, tanto mais que é notória a relevância desse circunstancialismo. A primeira instância referiu, em sede de fundamentação jurídica da sua decisão, o seguinte:

“A circunstância de não estar demonstrada a pendência de outros processos judiciais contra a requerida não prova o contrário, ou seja, que não possam existir outros processos pendentes”.

Com o devido respeito parece-nos que a questão é outra.

A resposta negativa a um facto não permite concluir pela verificação do facto contrário mas, no caso, não é disso que se trata. Efectivamente, a requerida não só impugnou a pendência da acção executiva dada por assente – com êxito, como resulta do que a Meritíssima Juiz deu como provado sob o número 65 –, como acrescentou que honra os seus compromissos e que não tem processos a correr termos contra si, produzindo prova quanto a essa matéria. Afastada a invocação (conclusiva) de que a requerida honra os seus compromissos, tinha o tribunal que apreciar do demais, uma vez que se trata de facto pertinente à defesa sabendo-se, como se sabe, que um dos indícios a que a jurisprudência usualmente atende para avaliar da verificação do justo receio de perda da garantia patrimonial é, exactamente, a pendência de acções de cobrança de dívida contra o requerido.

Considerando a primeira instância que a requerida não provou o facto em causa, impunha-se que fundamentasse essa apreciação, indicando concretamente as razões dessa avaliação, o que não foi feito, limitando-se o tribunal a quo à breve referência que consta da fundamentação jurídica da decisão e que nem sequer está em causa.

Assim, procede nessa parte a impugnação, devendo aditar-se à factualidade dada por provada o circunstancialismo invocado no art. 230º da oposição, alusivo à inexistência de acções judiciais pendentes contra a requerida, sendo que o momento processualmente relevante é obviamente a data de instauração do presente procedimento cautelar – sendo certo que as testemunhas até se pronunciaram tendo em conta o momento do depoimento.

                                                       *

Em suma, procedendo em parte a impugnação, adita-se à factualidade dada por provada o seguinte circunstancialismo:

70. À data de instauração do presente procedimento cautelar, a requerida não tinha acções judiciais pendentes contra si.

No mais, improcede a impugnação do julgamento de facto, mantendo-se o juízo valorativo feito pela primeira instância.

3. Invoca a apelante uma nulidade de sentença, alegando que o tribunal não se pronunciou “sobre o pedido de determinação do valor de mercado” dos imóveis arrestados (art. 615º, nº1, alínea d).

Lendo a decisão recorrida constata-se que efectivamente o tribunal não decidiu sobre tal pedido, pela singela e cristalina razão de que nunca a apelante deduziu qualquer pretensão nesse sentido, aquando da apresentação do articulado da oposição.

A apelante limitou-se, nesse articulado, a indicar conforme consta do art. 244º, nos moldes supra referidos peticionando, a final e em segunda linha, que se proceda à “redução, nos termos do disposto no nº3 do artº 372º do CPC, do arresto aos seus justos limites, conforme previsto no artigo 393º nº2 do CPC, nomeadamente determinando-se o valor real dos prédios de que a Requerida é proprietária e limitando-se a referida tutela cautelar a tais bens, apenas e só na medida do necessário”.

Ora, não só a requerida/apelante não indicou qual o valor real, de mercado, dos imóveis, como nem sequer arrolou e/ou produziu qualquer prova quanto a essa matéria – é a requerente quem junta alguns documentos pertinentes, como adiante melhor se verá –, pelo que mal se compreenderia que fosse o Sr. Juiz a determinar a produção de prova, substituindo-se à ilustre mandatária da apelante e assim delineando a estratégia de defesa que (exclusivamente) lhe incumbe, não sendo essa a função dos tribunais.

Assim sendo, inexiste qualquer omissão de pronúncia, sendo que quanto ao pedido de redução da determinação de arresto a determinados bens, o tribunal apreciou e decidiu, tanto assim que reduziu a determinação do arresto dela excluindo os veículos automóveis.

Não ocorre, pois, a apontada nulidade.

4. A requerente questiona a verificação do primeiro requisito de deferimento do procedimento cautelar de arresto, a saber, a séria probabilidade ou verosimilhança de existência do direito de crédito invocado pelo requerente (art. 392º, nº1), não porque discuta o valor do crédito que a requerente se arroga ser titular, mas porque considera que tendo ficado “indiciariamente provado a existência de prejuízos da Requerida imputáveis à Requerente, teria o tribunal a quo de ter reconhecido que a Requerida detém sobre a Requerente um crédito que configura uma qualquer situação de compensação, nos termos dos arts. 847º e ss. Do CC”. (fls. 728-v).

Abra-se aqui um parêntesis para referir que não pode aceitar-se a matéria dada por assente sob o nº 8, a saber, que “[o] montante total devido à requerente pela requerida é, hoje, de € 722 882,56 (setecentos e vinte e dois mil, oitocentos e oitenta e dois euros e cinquenta e seis cêntimos)”, que deve ter-se como juridicamente irrelevante. Estando em discussão no presente procedimento se a requerente é titular de um crédito sobre a requerida – essa invocação faz parte da causa de pedir –, é elementar que não pode dar-se como provada, directamente, essa matéria, na medida em que encerra em si a resolução de uma das questões de direito que é objecto da acção.

Quedamo-nos, pois, pela factualidade dada por assente sob os números 1 a 7, fixada aquando da realização da audiência de 04-12-2013, sendo certo que a requerida nunca questionou o montante do crédito de 722.882,56€ liquidado pela requerente, dando de barato a sua existência – cfr. os arts. 145º a 149º do articulado da oposição, sendo que não foi impugnado o julgamento de facto na parte em que a primeira instância deu como não provado que “a requerida não aceitou as datas de vencimento das facturas em causa nos autos por não corresponderem com o acordado entre as partes em Outubro de2012 quanto às condições de pagamento”.

O que a requerida invoca é, genericamente, e agora sem preocupação de rigor factual, que no âmbito da relação negocial estabelecida com a requerente esta não cumpriu devidamente a sua prestação, causando prejuízos à requerida que, assim, se arroga ser titular de um direito de indemnização (por ilícito contratual), que computa, à data de apresentação da oposição, em 719.409,28€. Fazendo operar a compensação destes dois créditos, considera então que o crédito da requerente fica reduzido a 3.473,37€ (sendo que 722.882,56€ - 719.409,28€ = 3.473,28€).

Ponderando a factualidade assente, consolidada com o naufrágio da impugnação da apelante, na parte que ora interessa, claramente se conclui que a requerida não logrou provar integralmente a sua tese, inexistindo elementos de facto (ainda que em sede indiciária) que permitam julgar preenchidos os requisitos da compensação previstos no artigo 847.º do Cód. Civil.

Improcedem, pois, as conclusões de recurso.

5. Impõe-se agora apreciar da verificação de outro requisito para o decretamento da providência, a saber, o justo receio da perda de garantia patrimonial.

O credor que tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito, pode requerer o arresto de bens do devedor (art. 391º, nº1 do C.P.C e 619º do Cód. Civil), devendo o requerente do arresto deduzir os factos que tornam provável a existência do crédito e justificam o receio invocado (art. 392º, nº1 do C.P.C. e 302º, nº1 do Cód. Civil), aceitando-se, como unanimemente se tem considerado, que “para a comprovação do justo receio da perda da garantia patrimonial não basta o receio subjectivo do credor, baseado em meras conjecturas, já que para ser justificado há-de assentar em factos concretos que o revelem à luz de uma prudente apreciação” [ [16] ].

 “Para que haja justo receio de perda da garantia patrimonial basta que, com a expectativa da alienação de determinados bens ou a sua transferência para o estrangeiro, o devedor torne consideravelmente difícil a realização coactiva do crédito (…) ficando no seu património só com bens que, pela sua natureza, dificilmente encontrem comprador, numa venda judicial. Basta igualmente (…) que exista uma acentuada desproporção entre o montante do crédito e o valor do património do devedor, desde que este património seja facilmente ocultável” [ [17] ] [ [18] ]. 

No caso em apreço, em face da factualidade dada por assente entendemos faltarem elementos que suportem afirmação de periculum in mora, que é a razão de ser da tutela cautelar, não se subsumindo a hipótese que ora se nos depara a qualquer das situações que a jurisprudência vem reconhecidamente assinalando como de evidente risco para a satisfação do direito do credor.

Assim, tem a jurisprudência convergido no entendimento de que se verifica o aludido requisito sempre que dos factos dados como (indiciariamente) assentes se retira que o requerido praticou actos de alienação/oneração/ocultação/dissipação do seu património; que o requerido se furta aos contactos com a requerente, na tentativa de assim retardar e/ou impossibilitar o cumprimento da obrigação; que o requerido se encontra em situação económica deficitária, com uma evidente desproporção entre o activo e o passivo, sem réditos ou sem desenvolver qualquer actividade produtiva, e com inviabilidade de recurso ao crédito etc, etc…

Tendo-se por seguro que é sobre o requerente da providência que recai o ónus de alegação e prova dos factos constitutivos do seu direito, tendo por referência os requisitos para o decretamento da providência de arresto - art. 342º do Cód. Civil – e não ao demandado o ónus de prova da factualidade inversa.     

                                                       *

Vejamos o caso em apreço, com incidência nos vários pontos em que a decisão se alicerçou.

Considerou-se na decisão recorrida, a este propósito, o seguinte:

“A requerente demonstrou o montante provável do seu crédito e, numa primeira fase, a aparente situação patrimonial deficitária da requerida.

Incumbe, pois, à requerida provar a existência de bens suficientes para solver a dívida.

Conforme resulta do acima expendido, com a dedução de oposição ao arresto não se pretende colocar em crise a prova anteriormente produzida mas trazer aos autos novos elementos que permitam infirmar as conclusões a que o Tribunal chegou previamente.

A requerida não logrou carrear para os autos qualquer dado que permita infirmar a conclusão a que o Tribunal então chegou.

Na verdade, quer o facto de a acção executiva n.º (…) ter sido declarada extinta por desistência do aí exequente, quer o facto de a requerida ser uma empresa de envergadura internacional não bastam, por si só, para afastar as conclusões formuladas aquando do decretamento do arresto.

A circunstância de não estar demonstrada a pendência de outros processos judiciais contra a requerida não prova o contrário, ou seja, que não possam existir outros processos pendentes”.

Não pode aceitar-se este raciocínio.

A requerente começa por alegar no art. 10º do requerimento inicial que a requerida tem processos judiciais pendentes por dívidas a outros fornecedores no montante global de 351.853,03€, alegação que depois corrigiu, indicando ter ocorrido um lapso, limitando-se então à invocação da pendência de uma execução de valor de cerca de 10.000,00€, como já se deu conta supra. Ora, não só a requerida provou que tal execução há muito tinha cessado, como provou que à excepção destes autos, não tem qualquer outro processo pendente contra si – cfr. a acta de audiência e os números 10, 65 e 70 dos factos dados por assentes.

A requerida tem património, mobiliário (veículos) e imobiliário, que não pode ter-se por irrelevante ou sem qualquer significado económico. Pese embora o valor tributário dos imóveis e as hipotecas registadas, onerando três dos cinco imóveis, afigura-se-nos podermos afirmar que o seu valor de mercado excede esse valor tributário. É que, pese embora não se tenha logrado determinar o mesmo, não pode deixar de atentar-se na descrição dos imóveis consignada nos documentos de fls. 282 a 290, documentos juntos pela própria requerente e que a requerida não impugnou, sendo certo que não é indiferente o valor das hipotecas que incidem sobre três desses imóveis uma vez que, tratando-se de hipotecas a favor de entidades bancárias (Banco …SA), pode razoavelmente inferir-se que o prédio terá um valor de mercado superior ao montante cujo pagamento se destina a garantir. Saliente-se que subsequentemente à oposição, a primeira instância levantou o arresto decretado quanto aos veículos indicados, reduzindo a extensão da determinação do arresto [ [19] ]. Ora, com referência a esse património, nunca a requerente invocou qualquer actuação da requerida tendente a fazer perigar a garantia de pagamento que o mesmo representa.

A requerente invocou conforme consta dos arts. 11º e 12º do requerimento inicial, factualidade que foi levada aos números 11 e 12 dos factos provados [ [20]  ] [ [21] ].

Ora, o significado que a Meritíssima Juiz atribuiu a tais factos foi posto em causa pela requerida, crê-se que com êxito. Lê-se na decisão que decretou o arresto o seguinte:

“O crédito provável da requerente ascende a mais de € 700.000,00 e está em dívida desde meados do ano 2013.

Do balanço referente ao exercício do ano 2012, reportado à data de 31 de Dezembro de 2012, é possível constatar a saída do montante de cerca de dez milhões de euros a título de créditos a accionistas, valor que reflecte a existência de empréstimos por parte da requerida aos seus accionistas e, por outro lado, um valor do lado passivo de quase oito milhões.

Se o dinheiro entregue aos accionistas não for reposto (como ainda não foi, conforme se retira daquele balanço), a requerida ver-se-á na impossibilidade de cumprir com as suas obrigações.

Acresce que o património identificado na esfera jurídica da requerida encontra-se, parte dele, onerado com hipotecas que garantem os montantes máximos de € 156 336,25 e de € 477 000,00.

Conclui-se, assim, pela verificação do justo receio de perda de garantia patrimonial de tal modo que o arresto dos bens da requerida, tal qual como solicitado pela requerente, se apresenta como meio necessário à salvaguarda do crédito desta”.

Tendo posteriormente dado por provado, na sequência da oposição, a factualidade indicada sob os números 1, 2, 4, 66 e 67, afigura-se-nos que não podia manter-se esse juízo valorativo.

Efectivamente, podendo prefigurar-se na factualidade inicialmente indicada uma actuação tendente à descapitalização da empresa, através da transferência de activos, tem agora que enquadrar-se a actuação da requerida noutro contexto quando se prova que esta é uma empresa que faz parte de um grupo económico, funcionando numa lógica de gestão de grupo, em que é frequente, particularmente nos últimos anos, caracterizados por particulares dificuldades de acesso ao crédito – facto notório – a cedência de liquidez entre empresas do mesmo grupo.

Sem necessidade de caracterização dessa específica forma de cooperação entre as empresas do grupo, entende-se que fica assim afastada a interpretação feita na decisão que decretou o arresto e que ainda assim se manteve, sendo que a última decisão se integra naquela – art.372º, nº3, in fine.   

Tendo a Meritíssima Juiz dado como provado que a requerida funciona em contexto de grupo de tal modo que empresta dinheiro à sócia e empresa mãe A, S.A. e outras empresas do grupo, de modo a utilizar o dinheiro onde é mais necessário dentro das empresas do grupo, evitando encargos financeiros – nº66 – e que a requerida é uma empresa de envergadura internacional – nº 67 –, entende-se que não tem cabimento o raciocínio exposto na decisão quando aí se alude como segue:

“Acresce que o facto de a empresa se manter em actividade e aparentemente revelar capacidade para a continuar com pujança não é bastante para escamotear o facto de estar demonstrado que se trata de uma empresa que, tal como referiu o seu técnico oficial de contas, funciona em contexto de grupo emprestando dinheiro à sócia e empresa mãe A, S.A. e a outras empresas do grupo, de modo a utilizar o dinheiro onde é mais necessário dentro das empresas do grupo, evitando encargos financeiros. Significa isto que o regresso desse dinheiro à empresa depende, única e exclusivamente, da vontade da sua administração, ou seja, os seus credores ficarão sempre na expectativa de, pretendendo executar o seu crédito, ser possível suceder que nenhum saldo positivo exista no património daquela posto que o dinheiro recebido dos clientes está a ser transferido para outras empresas, ainda que pertencentes ao mesmo grupo”.

Com todo o respeito, o receio assinalado verifica-se sempre, em qualquer circunstância, perante qualquer devedor – pessoa singular ou sociedade –, bastando para tal que em virtude de uma relação negocial fique constituído um crédito: o credor fica sempre dependente e na expectativa de que o devedor cumpra as suas obrigações (art. 406º, nº1 do Cód. Civil) mas não tem qualquer garantia prévia de solvabilidade do devedor, a menos que concretamente negoceie nesse sentido, como acontece com os créditos garantidos. Esse receio (genérico e abstracto) do credor não é tutelado por lei, sendo o legislador mais exigente na ponderação deste requisito, não bastando, como a jurisprudência uniformemente assinala, a mera constatação do incumprimento.

Acrescente-se que nos parece que os factos ora dados por provados implicam que se elimine da factualidade assente a matéria assinalada sob o número 12, alusiva ao requerimento inicial, sob pena de contradição com a matéria enunciada sob os referidos números 66 e 67, tendo por base o articulado da oposição. Quanto à factualidade indicada sob o nº 11, a mesma, desacompanhada de qualquer outro facto, não é significativa, não se podendo avaliar da solvabilidade da ré apenas por esses elementos do balanço, sendo certo que essa factualidade só assumia algum significado exactamente no contexto assinalado no número 12 dos factos provados.    

Por último, a requerente nunca alegou que, pese embora reiteradas tentativas de cobrança da dívida, a requerida não só não paga como se furta ao seu contacto. Paradoxalmente, provou-se que é a requerida quem tenta contactar a requerente com vista à resolução do litígio, sem qualquer êxito – cfr. os números 62 e 63 dos factos assentes.

Em suma, tudo se resume à constatação do incumprimento da requerida e do valor da dívida, que pode ter-se por significativo.

No mais, o que temos é uma sociedade (requerida) no pleno exercício da sua actividade, sem que se tenham apurado quaisquer constrangimentos de ordem financeira ou imputação de insolvência técnica (com passivo a exceder largamente o activo e sem recurso a crédito), que tem património mobiliário e imobiliário, sem que lhe seja apontada qualquer actuação no sentido de esvaziar a garantia (de pagamento) que esse património representa, não se tendo igualmente apurado a prática de actos de gestão que ponham em perigo a solvabilidade da empresa.

Tudo em ordem a concluir que, ao contrário do que entendeu a Meritíssima Juiz, não se verifica o apontado requisito legal, de justificado receio de perda da garantia patrimonial.

                                                        *   

                                                        *

                                                        *

Conclusões:

1. As enunciações constantes dos articulados das partes que se reconduzem a meros juízos conclusivos e de direito, a afirmações genéricas, vagas e abstractas que não se reconduzem a factos – só estes importam –, não devem ser incluídas no acervo fáctico probatório; quando o são, indevidamente, têm as mesmas que ser desconsideradas, isto é, impõe-se que (oficiosamente) se considerem as mesmas como juridicamente irrelevantes – não escritas, na terminologia da anterior lei processual civil (art. 646º, nº4).

2. Tem a jurisprudência convergido no entendimento de que se verifica o requisito aludido no art. 392º, nº 1 do C.P.C. (periculum in mora) sempre que dos factos dados como (indiciariamente) assentes se retira que o requerido praticou actos de alienação/oneração/ocultação/dissipação do seu património; que o requerido se furta aos contactos com a requerente, na tentativa de assim retardar e/ou impossibilitar o cumprimento da obrigação; que o requerido se encontra em situação económica deficitária, com uma evidente desproporção entre o activo e o passivo, sem réditos ou sem desenvolver qualquer actividade produtiva, e com inviabilidade de recurso ao crédito etc, etc…

3. É sobre o requerente da providência que recai o ónus de alegação e prova dos factos constitutivos do seu direito, tendo por referência os requisitos para o decretamento da providência de arresto - art. 342º do Cód. Civil – e não ao demandado o ónus de prova da factualidade inversa.

4. Evidenciando os autos que a sociedade (requerida) está no pleno exercício da sua actividade, sem que se tenham apurado quaisquer constrangimentos de ordem financeira; que não foi formulada imputação de que se verifica uma insolvência técnica (com passivo a exceder largamente o activo e sem recurso a crédito); que tem património mobiliário e imobiliário, sem que lhe seja apontada qualquer actuação no sentido de esvaziar a garantia (de pagamento) que esse património representa, não se tendo igualmente apurado a prática de actos de gestão que ponham em perigo a solvabilidade da empresa, não pode ter-se como preenchido o aludido requisito de justo receio de perda de garantia patrimonial.

                                                        *

                                                        *

                                                        *

Pelo exposto acordam os juízes desta Relação em julgar procedente a apelação pelo que, revogando a decisão recorrida, se julga improcedente a providência requerida, com o consequente levantamento do arresto.

Custas, que rem primeira instância que nesta Relação, pela autora/apelada.

Notifique.

                                         Lisboa, 9 de Julho de 2014

                                                 (Isabel Fonseca)

                                     (Maria Adelaide Domingos)

                                   (Eurico José Marques dos Reis)


[1] O ficheiro informático enviado com as alegações de recurso é imprestável como apoio para o texto a elaborar, motivo pelo qual nos limitamos a remeter para o suporte papel que consta do processo, procedimento que se adopta sempre que o Sr. Advogado e os Srs. Funcionários Judiciais não cuidam de remeter ficheiro adequado ao processamento de texto, como aconteceu no caso.
[2] Aprovado pela Lei 41/2013 de 26/06, em vigor desde 1 de Setembro de 2013.

[3] Neste sentido vão os Acs. RC de 25/10/2011, processo 1006/10.7TBCVL.C1 (Relator: Henrique Antunes) e de 12/06/2012, processo nº 4541/08.3TBLRA.C1 (Relator: António Beça Pereira), acessíveis in www.dgsi.pt.

[4] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, Almedina, Coimbra, 1982, p.370. Refere ainda o autor que “a linha divisória entre facto e direito não tem carácter fixo, dependendo em considerável medida não só da estrutura da norma, como dos termos da causa”.   

[5] Lebre de Freitas, A Confissão no Direito Probatório, Coimbra Editora, Coimbra, 1991, p. 44.

[6] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, Coimbra, 1984, pp. 392-393.
[7] Sublinhado nosso.
[8] Sublinhado nosso.
[9] O tribunal a quo deu como não provado que:
 - a requerente foi declarada em situação de insolvência;
- em face do referido processo de insolvência da requerente, a requerida providenciou um acompanhamento jurídico para este processo, no intuito de salvaguardar os seus interesses;
[10] Á pergunta do mandatário da requerente sobre “quem calculou estes prejuízos” a testemunha respondeu “cada uma das delegações, mas temos os documentos de suporte a esse cálculo”, documentos que, no entanto, não foram juntos a estes autos.

[11] Contrariamente à indicação que consta do art. 67º da oposição, sendo que quando confrontada pelo mandatário da requerente a testemunha indicou não saber “o pormenor da estrutura accionista das duas empresas”, desconhecendo ainda se o Sr. (…) tem interesses accionistas ou outros na (…).
[12] Facto este cujo aditamento a apelante peticiona a fls. 735, na III) Conclusão, mas que seguramente por lapso omitiu a fls. 742, na LX) Conclusão).
[13] Na transcrição da apelante refere-se, a seguir a “[f]ora imagem” que o depoimento é “imperceptível” mas tal não acontece.

[14] Com a seguinte redacção: O que sempre seria manifestamente excessivo, porquanto, o arresto dos prédios de que a Requerida é titular, atendo ao seu valor real e não ao seu valor patrimonial tributário, sempre seria suficiente para garantia do crédito de que a requerente se diz titular”.
[15] Com a seguinte redacção: O que sempre seria manifestamente excessivo, porquanto, o arresto dos prédios de que a Requerida é titular, atendo ao seu valor real e não ao seu valor patrimonial tributário, sempre seria suficiente para garantia do crédito de que a requerente se diz titular”.
[16] Ac. RC de 10/02/2009, processo:390/08.7TBSRT.C1 (Relator: Isaías Pádua), acessível in www.dgsi.pt.

[17] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol.I, Coimbra Editora, Coimbra, 3ª edição, 1982, p.60. Cfr. ainda Lebre de Freitas Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, Coimbra Editora, Coimbra, 2ª edição, p. 125-126.

[18] Almeida Costa aludindo ao fundado receio do credor perder a garantia patrimonial refere que “[n]omeadamente será o caso de temer uma próxima situação deficitária do património do devedor, ou uma sonegação ou ocultação de bens que impossibilite ou dificulte a realização objectiva do crédito (Direito das Obrigações,11ª edição revista e actualizada, Almedina, Coimbra, 2008, p. 876).
[19] Lê-se na fundamentação da decisão: “Justifica-se, pois, face ao montante a considerar como crédito da requerente, manter o arresto sobre os imóveis identificados e, bem assim, sobre os saldos das contas bancárias (tendo presente o valor arrestado nesta sede), os créditos sobre entidades terceiras e sobre a quota de que a requerida é titular.
Quanto aos veículos arrestados, tendo em conta a actividade da requerida e porque será de admitir que os demais bens sejam suficientes para garantir o crédito da requerente, determina-se o levantamento do arresto de modo a viabilizar o desenvolvimento da actividade da requerida”.
[20] Diga-se que a matéria dada como assente sob o número 13 é completamente irrelevante porquanto pouco importa considerar o que “consta” ou não desse relatório. O relatório apresentado pela requerente constitui apenas um meio de prova (documental) que a Meritíssima Juiz tinha que valorar nesses termos, não tendo qualquer mais valia a referência ao que dele “consta” – para esse efeito bastamo-nos com a sua leitra uma vez que foi junto aos autos. Ou seja, a invocada atribuição de “risco de crédito” “elevado” não tem qualquer significado

[21] Atente-se, aliás, no texto inscrito no fim desse relatório, a fls. 225, em tamanho de letra (ainda) mais pequena: “Para a elaboração dos relatórios, a (…) processa diariamente uma enorme quantidade de informação proveniente de diversas fontes, sobre as quais não exerce controlo ou responsabilidade. Por este motivo, não obstante o rigor no tratamento da informação, a (…) não garante sempre a verificação e confirmação dos dados, não podendo por isso ser responsabilizada por eventuais erros, inexatidões ou omissões”.