Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
364/19.2T8MTA.L1-2
Relator: NELSON BORGES CARNEIRO
Descritores: REGISTO PREDIAL
RECURSO HIERÁRQUICO
PRAZOS
MULTA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/09/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – A interposição de recurso hierárquico ou de impugnação judicial poderá ser feita presencialmente nos respetivos serviços, valendo, neste caso, como data da interposição a da entrega do respetivo requerimento nos serviços de registo onde foi proferida a decisão impugnada, ou, se praticado o ato através de remessa por correio registado, vale como data da interposição, o da efetivação do respetivo registo postal, isto é, aquando da sua entrega no serviço postal, e independentemente, do dia em que o requerimento for recebido nos serviços de registo.
II – Não é o momento da apresentação no livro diário que determina a contagem para a prática de qualquer ato processual no âmbito do registo predial, mas sim, a data da efetivação do registo postal, caso o ato tenha sido apresentado através de remessa por correio registado.
III – Sendo o prazo de interposição de recurso previsto no nº 6, do art. 131º, do CRPredial, um prazo processual, poderão ser-lhe aplicáveis subsidiariamente as normas do código de processo civil, nomeadamente, a possibilidade da prática do ato num dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, desde que, com a prática do ato, pague de imediato uma multa.
IV – A possibilidade de a parte praticar o ato para além do termo do prazo, visa, essencialmente, protegê-la contra a preclusão de um direito, em virtude de um eventual descuido ou desleixo do seu mandatário.
V – O pagamento da multa pela prática de um ato processual para além dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, não representa qualquer agravamento dos emolumentos, pois estes correspondem ao custo efetivo dos atos praticados pelos serviços do registo, mas sim, a uma penalização pela prática do ato para além do termo do prazo.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes da 2ª secção (cível) do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. RELATÓRIO
CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, S.A.  requereu junto da CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL DO BARREIRO, a retificação do registo de cancelamento das hipotecas registadas a seu favor (nos termos do art. 120.º e seguintes do CRPredial), pedido esse, que foi indeferido.
Inconformada, CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, S.A.  interpôs recurso hierárquico da decisão do CONSERVADOR DA CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL DO BARREIRO (nos termos do art. 131.º e seguintes do CRPredial), recurso esse, que foi indeferido por extemporaneidade, pela PRESIDENTE DO CONSELHO DIRECTIVO DO INSTITUTO DOS REGISTOS E NOTARIADO.
CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, S.A. impugnou judicialmente o despacho proferido pela PRESIDENTE DO CONSELHO DIRECTIVO DO INSTITUTO DOS REGISTOS E NOTARIADO que indeferiu, por extemporâneo, o recurso hierárquico da decisão do CONSERVADOR DA CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL DO BARREIRO.
Foi proferida sentença que julgou procedente a “impugnação judicial apresentada pela Caixa Geral de Depósitos, SA e, em consequência, revogou a decisão da Exma. Sra. Presidente do Conselho Diretivo do Instituto dos Registos e Notariado que deverá ser substituída por outra que ordene a notificação da recorrente nos termos e para os efeitos previstos no art. 139º, nº5 CPC aplicável ex vi art. 156º CRP”.
Inconformada, veio a recorrida apelar da sentença, tendo extraído das alegações[1],[2] que apresentou as seguintes
CONCLUSÕES[3]:
I.) Decorre do disposto nos n.ºs 1, 5 e 6 do artigo 131.º  do Código do Registo Predial, que a decisão sobre o pedido de retificação pode ser impugnada mediante interposição de recurso hierárquico para o conselho diretivo do Instituto dos Registos e do Notariado, I.P., ou mediante impugnação judicial para o tribunal da comarca da área da circunscrição a que pertence o serviço de registo, no prazo de 10 dias, considerando· se feita a impugnação com a apresentação do respetivo requerimento no serviço de registo onde foi proferida a decisão impugnada.
II.) Porquanto, em sede de registo predial, é o momento da apresentação do pedido no livro diário que marca a prioridade do registo e que determina o início do prazo de todas as hipóteses juridicamente relevantes previstas no respetivo Código.
III.) As conhecidas funções do registo e os seus importantes efeitos substantivos determinaram o estabelecimento de um determinado momento, que a lei fixou como sendo o da apresentação, através do qual se sabe, designadamente, se se encontra ou não esgotado o prazo para impugnar a decisão do conservador sobre o pedido de retificação.
IV.) De facto, o Código do Registo Predial é claro no sentido de que a única decisão impugnável é a do conservador (artigos 130.º, nºs 6 e 131.º, n.º 1), pelo que, julgado improcedente o recurso hierárquico, cabe impugnação judicial, da decisão sobre o pedido de retificação, e não da decisão tomada pelo presidente do Instituto dos Registos e do Notariado.
V.) Ora, nem em matéria de objeto do recurso, nem no campo do prazo do recurso hierárquico ou da impugnação judicial carecem as normas do Código do Registo Predial de aplicação subsidiária das normas do processo civil, na medida em que não há efetiva lacuna na lei, mas a aplicação da ordem jurídica global do registo predial.
VI.) Se o Código do Registo Predial, no artigo 131.º, n.º 6, dispõe que o recurso hierárquico e a impugnação judicial devem ser interpostos no prazo de 10 dias, considerando-se a interposição feita com a apresentação do respetivo requerimento no serviço de registo onde foi proferida a decisão impugnada, adotando o critério prosseguido por todo o complexo normativo registal, não há que recorrer, nesta matéria, a título subsidiário, a qualquer norma do Código de Processo Civil, designadamente ao disposto no artigo 139.º,  n.º  5 do CPC.
VII.) Acresce que os emolumentos previstos em sede de recurso hierárquico são apenas os constantes do artigo 27.º, n.º 5 do Regulamento Emolumentar dos Registos e do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de dezembro e norma alguma, seja do Código do Registo Predial, seja do Regulamento Emolumentar, prevê a possibilidade da prática do aludido ato para além do prazo legal nem, coerentemente, a possibilidade do agravamento do quantitativo emolumentar fixado no artigo 27.º, n.º 5.1. do Regulamento Emolumentar. 
VIII.) Por outro lado, resulta claramente do artigo 5.º n.º 1 do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado que "as disposições tabelares não admitem interpretação extensiva, nem integração analógica."
IX.) Por conseguinte, o disposto no n.º 5 do artigo 139.º do Código de Processo Civil não é aplicável, a título subsidiário, ao recurso hierárquico da decisão sobre o pedido retificação, previsto e regulado nos artigos 131.º a 131.º-B do   Código do Registo Predial, pelo que o recurso em causa foi interposto intempestivamente.
X.) Na decisão recorrida foram violadas as normas dos artigos 139.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, n.ºs 5 e 6 do Código do Registo Predial e 5.º n.º 1 e 27.º, n.º 5.1 do Regulamento Emolumentar dos Registos e do Notariado.
Nos termos expostos, e nos demais que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, deve revogar-se a decisão recorrida, dado que o recurso hierárquico em causa foi apresentado intempestivamente e ao mesmo não é aplicável o disposto no n.º 5 do artigo 139.º do Código de Processo Civil.
A recorrente contra-alegou, pugnando pela improcedência da apelação da recorrida.
Colhidos os vistos[4], cumpre decidir.
OBJETO DO RECURSO[5],[6]
Emerge das conclusões de recurso apresentadas por INSTITUTO DOS REGISTOS E NOTARIADO, I.P. ora apelante, que o seu objeto está circunscrito às seguintes questões:
1.) Saber quando se considera interposto o recurso hierárquico, se na data da apresentação do recurso no serviço de registo onde foi proferida a decisão impugnada (como decorre do disposto no art. 131º, nº 6, do CRPredial), ou, se praticado o ato através de remessa pelo correio, na data da efetivação do respetivo registo postal (por aplicação subsidiária do disposto no art. 144º, nºs 7 e 8, do CPCivil, ex vi, do art. 156º, do CRPredial).
2.) Saber se os atos processuais no âmbito do registo predial podem ser praticados dentro dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, mediante o pagamento de uma multa progressiva (por aplicação subsidiária do disposto no art. 139º, nºs 4 e 5, do CPCivil, ex vi, do art. 156º, do CRPredial).
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. FACTOS PROVADOS NA 1ª INSTÂNCIA
1.) Em processo de retificação de registo apresentado na Conservatória do Registo Predial do Barreiro foi proferida decisão em 16/11/2018 que indeferiu o pedido de retificação.
2.) A referida decisão foi notificada ao Mandatário da requerente Caixa Geral de Depósitos, SA sob registo postal de 26/11/2018.
3.) Não se conformando com a decisão, a requerente Caixa Geral de Depósitos, SA interpôs recurso hierárquico nos termos do art. 131º CRP, anotado no Diário da Conservatória do Barreiro sob a ap. 3320 de 12/12/2018.
4.) A Senhora Presidente do Conselho Diretivo do Instituto dos Registos e do Notariado, I.P. proferiu em 16-04-2019 o despacho de rejeição do recurso hierárquico, por intempestividade.
2.3. O DIREITO
Delimitada a matéria de facto, que não vem impugnada[7], importa conhecer o objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso[8].          
1.) MOMENTO EM QUE SE CONSIDERA INTERPOSTO O RECURSO HIERÁRQUICO E A IMPUGNAÇÃO JUDICIAL.
a.) Direito subsidiário aplicável aos atos, processos e prazos previstos no código do registo predial.
Salvo disposição legal em contrário, aos atos, processos e respetivos prazos previstos no presente código é aplicável, subsidiariamente e com as necessárias adaptações, o disposto no Código de Processo Civil – art. 156º, do CRPredial.
Deste preceito decorre, sem margem para qualquer dúvida, que o direito subsidiário aplicável, com as devidas adaptações, aos atos, processos e respetivos prazos previstos neste Código, é o consagrado no Código de Processo Civil[9].
Anteriormente, o artigo 147º-B, na redação conferida pelo DL nº 116/2008, de 4 de julho, numa notória incompreensão dos princípios e regras que regem o registo predial e ao arrepio da melhor doutrina e da nossa tradição, previa a aplicabilidade ao recurso hierárquico, subsidiariamente, do disposto no Código do Procedimento Administrativo[10].
O direito subsidiário ou supletivo, por definição, aplica-se apenas quando necessário, para suprir as omissões de outro corpo de normas de direito, aplicação que não poderá deixar de ser feita sempre com as devidas adaptações para que os princípios e regras deste último não sejam postergadas ou postas em crise.
Daí que seja de equacionar quando se considera interposto o recurso hierárquico, se na data da apresentação do recurso no serviço de registo onde foi proferida a decisão impugnada (como decorre do disposto no art. 131º, nº 6, do CPRredial), ou, se praticado o ato através de remessa pelo correio, na data da efetivação do respetivo registo postal (por aplicação subsidiária do disposto no art. 144º, nºs 7 e 8, do CPCivil, ex vi, do art. 156º, do CRPredial).
b.) Modo de interposição de recurso hierárquico ou de impugnação judicial.
A apelante alega que ”Decorre do disposto nos n.ºs 1, 5 e 6 do artigo 131.º  do Código do Registo Predial, que a decisão sobre o pedido de retificação pode ser impugnada mediante interposição de recurso hierárquico para o conselho diretivo do Instituto dos Registos e do Notariado, I.P., ou mediante impugnação judicial para o tribunal da comarca da área da circunscrição a que pertence o serviço de registo, no prazo de 10 dias, considerando· se feita a impugnação com a apresentação do respetivo requerimento no serviço de registo onde foi proferida a decisão impugnada”.
Assim, de acordo com a apelante “é o momento da apresentação do pedido no livro diário que marca a prioridade do registo e que determina o início do prazo de todas as hipóteses juridicamente relevantes previstas no respetivo Código”.
Vejamos a questão.
Está provado que:
Em processo de retificação de registo apresentado na Conservatória do Registo Predial do Barreiro foi proferida decisão em 16/11/2018 que indeferiu o pedido de retificação – facto provado nº 1.
A referida decisão foi notificada ao Mandatário da requerente Caixa Geral de Depósitos, SA sob registo postal de 26/11/2018 – facto provado nº 2.
Não se conformando com a decisão, a requerente Caixa Geral de Depósitos, SA interpôs recurso hierárquico nos termos do art. 131º CRP, anotado no Diário da Conservatória do Barreiro sob a ap. 3320 de 12/12/2018 – facto provado nº 3.
A Senhora Presidente do Conselho Diretivo do Instituto dos Registos e do Notariado, I.P. proferiu em 16-04-2019 o despacho de rejeição do recurso hierárquico, por intempestividade – facto provado nº 4.
Quadro legal:
O processo previsto neste capítulo visa a retificação dos registos e é regulado pelos artigos seguintes e, subsidiariamente e com as necessárias adaptações, pelo Código de Processo Civil – art. 120º, do CRPredial.
A decisão sobre o pedido de retificação pode ser impugnada mediante interposição de recurso hierárquico para o conselho diretivo do Instituto dos Registos e do Notariado, I.P., ou mediante impugnação judicial para o tribunal da comarca da área da circunscrição a que pertence o serviço de registo, nos termos dos números seguintes – art. 131º, nº 1, do CRPredial.
A interposição de recurso hierárquico ou de impugnação judicial considera-se feita com a apresentação do respetivo requerimento no serviço de registo onde foi proferida a decisão impugnada – art. 131º, nº 6, do CRPredial.
Salvo disposição legal em contrário, aos atos, processos e respetivos prazos previstos no presente código é aplicável, subsidiariamente e com as necessárias adaptações, o disposto no Código de Processo Civil – art. 156º, do CRPredial.
Sempre que se trate de causa que não importe a constituição de mandatário, e a parte não esteja patrocinada, a apresentação a juízo dos atos processuais referidos no n.º 1 é efetuada por uma das seguintes formas:
a) Entrega na secretaria judicial, valendo como data da prática do ato processual a da respetiva entrega;
b) Remessa pelo correio, sob registo, valendo como data da prática do ato processual a da efetivação do respetivo registo postal;
c) Envio através de telecópia, valendo como data da prática do ato processual a da expedição;
d) Entrega por via eletrónica, nos termos definidos na portaria prevista no n.º 2 do artigo 132.º, valendo como data da prática do ato a da respetiva expedição – art. 144º, nº 7, do CPCivil.
Quando a parte esteja patrocinada por mandatário, havendo justo impedimento para a prática dos atos processuais nos termos indicados no n.º 1, estes podem ser praticados nos termos do disposto no número anterior – art. 144º, nº 8, do CPCivil.
Perante este quadro normativo legal, a entrega do requerimento de interposição do recurso hierárquico ou de impugnação judicial terá que ser feita presencialmente no serviço de registo onde foi proferida a decisão impugnada (como entende a apelante), ou, poderá essa entrega não ser presencial, podendo, nomeadamente, ser efetuada por correio, sob registo (como entende a apelada), recorrendo-se, neste caso, ao direito processual civil subsidiário do direito processual registal predial?
A retificação dos registos, seja por iniciativa do conservador, logo que tome conhecimento da irregularidade, seja a pedido de qualquer interessado, pressupõe, naturalmente, que os referidos registos sejam inexatos ou que tenham sido indevidamente lavrados[11].
O pedido de retificação previsto e regulado nos arts. 120º e ss. visa apenas retificar os registos inexatos ou indevidamente lavrados, não cabendo no seu âmbito a possibilidade de se proceder a uma nova decisão de qualificação que se traduza na modificação da natureza dos registos visados[12].
A desconformidade registal, que implique a retificação do registo, pode consistir em divergência (era A…, e escreveu-se F…), em acrescentamento (era AM…, e inscreveu-se, somente, A…), ou, em omissão (era AM…, e inscreveu-se, somente, A…). A situação “registo errado”, sujeito ao processo de retificação, resultante dos artigos 120º e seguintes do CRP, não se confunde com a de “registo nulo”, estabelecido no art. 16º do CRP[13].
Com as alterações introduzidas pelo DL nº 125/2013, de 30 de agosto, reforçaram-se as garantias impugnatórias dos cidadãos e das empresas, e consagrou-se a possibilidade de impugnação, através de recurso hierárquico, das decisões proferidas no âmbito dos processos de retificação de registo[14].
Assim, contra a decisão de indeferimento proferida sobre o pedido de retificação pode, atualmente, ser interposto recurso hierárquico ou impugnação judicial[15].
E, quando se considera interposto o recurso hierárquico ou a impugnação judicial?
A propositura do recurso hierárquico ou da impugnação judicial, considera-se efetuada mediante a apresentação do respetivo requerimento (onde são expostos os respetivos fundamentos) no serviço de registo detentor do processo objeto da impugnação, cabendo-lhe a anotação própria no Diário como decorre do disposto no nº 6 deste preceito[16].
Ora, da leitura do preceito legal (art. 131º, nº 6, do CRPredial), decorre que o requerimento para interposição de recurso deve ser apresentado no serviço que proferiu a decisão impugnada, mas não impondo que tenha que ser efetuada presencialmente nos serviços.
Assim, não resulta que a interposição do recurso hierárquico ou da impugnação judicial tenha que ser feita presencialmente no serviço do registo onde foi proferida a decisão impugnada.
Temos, pois, que a interposição do recurso é feita com a apresentação do requerimento no serviço do registo onde foi proferida a decisão impugnada (considerando-se a interposição feita com a apresentação do respetivo requerimento), e não, que esse requerimento tenha que ser entregue presencialmente nesses serviços.
Uma coisa, é o local onde terá que ser apresentado o requerimento de interposição do recurso, outra, que essa entrega tenha que ser feita presencialmente nesses serviços, por outras formas não serem permitidas para a sua entrega.
Assim, não impondo o código de registo predial que a apresentação do requerimento de interposição de recurso tenha que ser feita presencial, poderá essa entrega ser realizada por outras formas, nomeadamente, por remessa por correio registado, como permitido pelo direito subsidiário, no caso, o direito processual civil?
Pensamos que sim, isto é, a entrega do requerimento para interposição de recurso hierárquico ou de impugnação judicial poderá ser feita por outras formas, nomeadamente, por remessa por correio registado, por aplicação das normas subsidiárias do processo civil.
Isto, porque, o código de registo predial não proíbe a prática de atos por correio, pois, v.g., permite que os pedidos de registo possam ser efetuados, além de pessoalmente, também por via eletrónica ou por correio[17] (nos termos dos arts. 41º-B a 41º-D, todos do CRPredial).
Temos, pois, que o código de registo predial permite a prática de atos por correio, não vedando essa hipótese em caso algum, seja para a prática de atos de registo (consagrando expressamente em letra de lei a possibilidade da sua prática), seja para a prática de atos processuais (não resultando das suas normas legais a proibição da sua prática).
Não proibindo o código de registo predial a prática de atos por remessa pelo correio, sejam eles pedidos de atos de registo, sejam eles atos processuais, poder-se-á recorrer ao direito subsidiário, no caso ao direito processual civil, no que concerne à apresentação dos atos processuais, nomeadamente, do requerimento de interposição do recurso hierárquico ou de impugnação judicial, por remessa por correio registado (art. 144º, nº 7, do CPCivil, ex vi, do art. 156º, do CRPredial).
Aliás, tal também é o entendimento da apelada, pois “não resultando do Código de Registo Predial a obrigatoriedade de apresentação pessoal de peças processuais, não pode uma parte ser prejudicada pela simples circunstância de o seu mandatário constituído ter domicílio profissional noutra comarca”.
Assim, praticando a parte o ato processual por remessa pelo correio, vale como data da sua prática, a da efetivação do respetivo registo postal, pelo que, será esta a data da interposição do recurso.
Se a parte praticar o ato através de remessa pelo correio, sob registo, o ato processual considera-se praticado aquando da efetivação do respetivo registo postal. Vale isto por dizer que, nesse caso, o ato considera-se praticado aquando da entrega do ato no serviço postal – independentemente do dia em que o ato processual for recebido no tribunal (no caso, o serviço de registo onde foi proferida a decisão impugnada)-, valendo como comprovativo da entrega o registo postal, devidamente carimbado e datado por esse serviço[18].
Se o prazo processual para a prática do ato termina num determinado dia, o ato processual deve, nesse caso, ser praticado até ao termo do horário de atendimento ao público do respetivo serviço postal[19].
Concluindo, a interposição de recurso hierárquico ou de impugnação judicial poderá ser feita presencialmente nos respetivos serviços, valendo, neste caso, como data da interposição, a da entrega do respetivo requerimento nos serviços de registo onde foi proferida a decisão impugnada (como decorre do art. 131º, nº 6, do CRPredial), ou, se praticado o ato através de remessa por correio registado, valendo, neste caso, como data da interposição, o da efetivação do respetivo registo postal, isto é, o da sua entrega no serviço postal, e independentemente, do dia em que for recebido nos serviços de registo (por aplicação subsidiária do disposto no art. 144º, nºs 7 e 8, do CPCivil, ex vi, do art. 156º, do CRPredial).
Temos, pois, que sendo o recurso hierárquico remetido pelo correio, considera-se interposto na data da efetivação do respetivo registo postal, e não na data em que for recebido no serviço de registo que proferiu a decisão impugnada.
Ou, concretamente, a data da prática do ato será a da efetivação do registo postal, e não a data da anotação no livro diário do requerimento de interposição do recurso[20].
c.) Prioridade de registo pela apresentação do pedido no livro diário.
Entende, no entanto, a apelante que “é o momento da apresentação do pedido no livro diário que marca a prioridade do registo e que determina o início do prazo de todas as hipóteses juridicamente relevantes previstas no respetivo Código”.
Vejamos a questão.
O direito inscrito em primeiro lugar prevalece sobre os que se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens, por ordem da data dos registos e, dentro da mesma data, pela ordem temporal das apresentações correspondentes – art. 6º, nº 1, do CRPredial.
Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, os documentos apresentados para registo são anotados no diário pela ordem dos pedidos – art. 60º, nº 1, do CRPredial.
Os documentos apresentados pelo correio são anotados imediatamente após a última apresentação pessoal de cada dia, observando-se o disposto no artigo 63.º, se necessário – art. 60º, nº 4, do CRPredial.
O diário é encerrado após a última anotação do dia ou, não tendo havido apresentações com a anotação dessa circunstância, fazendo-se menção, em qualquer dos casos, da menção da data da feitura do último registo em cada dia – art. 67º, nº 2, do CRPredial.
A data dos registos é a da apresentação ou, se desta não dependerem, a data em que forem efetuados – art. 77º, nº 1, do CRPredial.
O art. 6º, nº 1, do CRPredial consagra uma regra de prioridade, ou, de prevalência entre direitos compatíveis, que vale, antes de mais, para os direitos reais que se constituam com o registo, nomeadamente, a hipoteca[21].
Sendo possível a concorrência de direitos similares, pertencentes a titulares diferentes, sobre o mesmo prédio, é necessário definir entre eles uma ordem de prioridade. É por isso necessário definir um critério que permita estabelecer sem margem para dúvidas qual o direito que deve ter a prevalência; critério de exclusão, no caso de direitos incompatíveis, ou critério de graduação, no caso de um direito poder ser satisfeito depois do outro. O critério legalmente estabelecido foi o da prevalência do direito primeiramente inscrito no registo, independentemente da antiguidade do título[22].
A prioridade é, em primeira mão, estabelecida pela ordem cronológica de realização dos registos. Pode, porém, dar-se o caso de se realizarem vários registos na mesma data, razão pela qual o critério exposto tinha de ser complementado por outro. Recorre-se, então, à ordem cronológica das apresentações. É o regime contido no nº 1 do aludido preceito[23].
O princípio da prioridade está intimamente relacionado coma apresentação do pedido, que obedece inexoravelmente ao prescrito nos artigos 60º e segs., sendo de extrema importância visto consagrar uma regra fundamental que não pode ser postergada sob pena de se frustrar a própria essência do registo[24].
Em face do disposto no nº 1, o direito primeiramente inscrito prevalece sobre os posteriormente registados sobre os mesmos bens, observando-se rigorosamente a ordem da data dos registos e, dentro da mesma data, a ordem temporal das apresentações correspondentes[25].
Como se depreende da análise do preceito (art. 60º, do CRPredial), anotação e apresentação são coisas diferentes. A anotação do pedido no diário é um ato do funcionário do serviço de registo que decorre na dependência da apresentação do pedido no referido serviço, sendo esta feita pela pessoa que formula o pedido[26].
Ora, uma coisa é o ato de registo em que a prioridade é determinada pela sua ordem da apresentação, outra, bem diferente, é saber se o ato processual remetido por correio, foi praticado dentro do prazo legal.
É que nos casos de prática de atos processuais, como não há que respeitar qualquer prioridade de registo, pois não respeitam ao registo de qualquer facto a ele sujeito, mas sim, no caso, saber se a sua apresentação foi tempestiva, isto é, se o ato foi praticado dentro do prazo legal, será indiferente que seja anotado imediatamente após a última apresentação pessoal do dia.
Concluindo, com a interposição de recurso hierárquico não há qualquer pedido de registo de factos a ele sujeitos, mas sim, no caso, averiguar se o requerimento foi apresentado tempestivamente nos serviços.
Podendo, no caso, o ato ser apresentado por remessa por correio registado, será irrelevante que seja anotado imediatamente após a última apresentação pessoal do dia, uma vez que se considera interposto na data da efetivação do respetivo registo postal, e não, na data da sua anotação no diário.
Temos, pois, que não é com a anotação no livro diário do documento enviado por correio que determina a data da prática do ato processual no âmbito do registo predial, mas sim, a data da efetivação do registo postal que determina a data da sua prática.
d.) Justo impedimento do mandatário judicial para praticar o ato por correio.
O nº 8 do art. 144º abre uma outra exceção à obrigatoriedade da transmissão eletrónica de dados prevista no nº 1 e no art. 132º, admitindo que a parte, embora patrocinada por mandatário, faça uso dos meios alternativos indicados no nº 7 (entenda-se: nas suas als. a), b) e c)). Para tal, é suposto que se esteja perante uma situação enquadrada na figura do “justo impedimento” para a prática do ato processual pela via prioritária prevista no nº 1. Por referência à previsão do art. 140º, nº 1, deverá tratar-se de uma circunstância que, por razões não imputáveis à parte ou ao seu mandatário, impeça a apresentação da peça processual por via eletrónica[27].
Ora, no caso dos autos, torna-se irrelevante saber se o recurso hierárquico podia ser apresentado nos serviços de registo por correio registado (no caso, ainda saber se havia justo impedimento por parte do mandatário judicial), pois, quer da alegação da apelada, quer dos documentos, não há elementos de onde se possa concluir que o ato tenha sido praticado por correio registado.
Não havendo tais elementos, e nada em contrário resultando dos autos, o recurso hierárquico, no caso, terá sido ser apresentado presencial nos respetivos serviços de registo (como até decorre das alegações da apelante, ao alegar que a apelada interpôs pessoalmente o recurso – art. 9º das alegações).
Aliás, tal também foi o entendimento do tribunal a quo ao referir que “a recorrente aceita ter sido notificada da decisão do Conservador que indeferiu o pedido de retificação, sob registo postal de 26/11/2018, aceitando ainda que o recurso hierárquico por si interposto de tal decisão foi registado no Diário da conservatória respetiva em 12/12/2018, nada dizendo nas suas alegações de recurso sob a forma da prática do ato (entrega ou remessa por correio).
Assim, pese embora entendermos que a interposição de recurso hierárquico ou de impugnação judicial poderá ser apresentada nos serviços de registo onde foi proferida a decisão impugnada por remessa pelo correio, será irrelevante para o caso em apreço, por nada estar alegado ou resultar dos documentos juntos, que esta tenha sido a maneira como o ato processual foi apresentado.
2.) PRÁTICA DOS ATOS PROCESSUAIS NO ÂMBITO DO REGISTO PREDIAL DENTRO DOS TRÊS DIAS ÚTEIS SUBSEQUENTES AO TERMO DO PRAZO, MEDIANTE O PAGAMENTO DE UMA MULTA PROGRESSIVA.
a.) Prática do ato processual dentro dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo.
A apelante alega que “se o Código do Registo Predial, no artigo 131.º, n.º 6, dispõe que o recurso hierárquico e a impugnação judicial devem ser interpostos no prazo de 10 dias, considerando-se a interposição feita com a apresentação do respetivo requerimento no serviço de registo onde foi proferida a decisão impugnada, adotando o critério prosseguido por todo o complexo normativo registal, não há que recorrer, nesta matéria, a título subsidiário, a qualquer norma do Código de Processo Civil, designadamente ao disposto no artigo 139.º,  n.º  5 do CPC”.
Vejamos a questão.
O processo previsto neste capítulo visa a retificação dos registos e é regulado pelos artigos seguintes e, subsidiariamente e com as necessárias adaptações, pelo Código de Processo Civil – art. 120º, do CRPredial.
A interposição de recurso hierárquico ou de impugnação judicial considera-se feita com a apresentação do respetivo requerimento no serviço de registo onde foi proferida a decisão impugnada – art. 131º, nº 6, do CRPredial.
Salvo disposição legal em contrário, aos atos, processos e respetivos prazos previstos no presente código é aplicável, subsidiariamente e com as necessárias adaptações, o disposto no Código de Processo Civil – art. 156º, do CRPredial.
O decurso do prazo perentório extingue o direito de praticar o ato – art. 139º, nº 3, do CPCivil.
Independentemente de justo impedimento, pode o ato ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de uma multa, fixada nos seguintes termos:
a) Se o ato for praticado no 1.º dia, a multa é fixada em 10 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 1/2 UC;
b) Se o ato for praticado no 2.º dia, a multa é fixada em 25 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 3 UC;
c) Se o ato for praticado no 3.º dia, a multa é fixada em 40 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 7 UC – art. 139º, nº 5, do CPCivil.
Praticado o ato em qualquer dos três dias úteis seguintes sem ter sido paga imediatamente a multa devida, logo que a falta seja verificada, a secretaria, independentemente de despacho, notifica o interessado para pagar a multa, acrescida de uma penalização de 25 % do valor da multa, desde que se trate de ato praticado por mandatário – art. 139º, nº 6, do CPCivil.
Perante o quadro legal normativo aplicável, pode o ato processual, no caso, a interposição de recurso hierárquico, ainda ser praticado dentro dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, mediante o pagamento de uma multa progressiva, por aplicação subsidiária das normas do código de processo civil, no caso, o disposto no art. 139º, nºs 4 e 5?
O prazo adjetivo ou processual é aquele que se destina a regular a prática de um ato dentro de um processo ou a produção de um determinado efeito jurídico-processual[28]
Regra geral, os prazos estabelecidos por lei ou fixados pelo juiz para a prática de atos processuais são perentórios[29].
É prazo perentório o estabelecido para a prática de um ato processual que, uma vez ele decorrido, deixa de poder ser praticado[30].
Assim, o prazo de interposição de recurso previsto no nº 6, do art. 131º, do CRPredial, é um prazo processual, por se destinar a regular a prática de um ato dentro do processo[31].
O decurso do prazo perentório extingue o direito de praticar o ato – art. 139º, nº 3, do CPCivil.
O prazo 10 dias para interposição do recurso interposição de recurso hierárquico, será um prazo perentório, por estabelecido por lei, cujo decurso do prazo, implica a extinção, por caducidade, o direito de o praticar.
Contudo, em face do disposto nos artigos 139º, nºs 4 e 5, e 140º do CPC, os efeitos preclusivos podem ser contornados em duas situações: uma, pela prática do ato em causa dentro dos três dias subsequentes ao termo do prazo, mediante o pagamento de multa progressiva e a outra pela ocorrência de justo impedimento[32].
Para além da invocação de justo impedimento e das situações de validação previstas no nº 5 do art. 139º do CPCivil, não é consentida por outros meios, a admissão da prática de ato processual decorrido que seja o prazo fixado na lei[33].
Com efeito, a possibilidade de a parte praticar o ato para além do termo do prazo, dentro dos três dias úteis subsequentes, mediante o pagamento de uma multa, visa, essencialmente, proteger a parte contra a preclusão de um direito, em virtude de um eventual descuido ou desleixo do seu mandatário[34].       
Se o ato for praticado num dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, sem que a parte pague, de imediato, a multa correspondente, a secretaria, logo que verifique essa omissão, deve, sem necessidade de despacho judicial ou de requerimento de alguma das partes, notificar o interessado para pagar a multa devida, acrescida de uma penalização de 25% do valor da multa, quando esteja em causa um ato praticado por um mandatário (art. 139º, nº 6)[35].
Assim, porque o prazo de interposição de recurso previsto no nº 6, do art. 131º, do CRPredial, é um prazo processual, poderão ser-lhe aplicáveis subsidiariamente as normas do código de processo civil, nomeadamente, a possibilidade da prática do ato num dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, desde que, com a prática do ato, pague de imediato uma multa.
Acresce ainda, que como a possibilidade de a parte praticar o ato para além do termo do prazo, visa, essencialmente, protegê-la contra a preclusão de um direito, em virtude de um eventual descuido ou desleixo do seu mandatário, seria também, por esse facto, de aplicar sempre subsidiariamente ao processo registal predial as normas processuais civis, no caso, as do art. 139º, nºs 4 e 5.
No sentido de ser aplicável subsidiariamente o disposto no artigo 139º, nºs 5 e 6, do CPCivil, maioritariamente, nesse sentido, tem decidido a jurisprudência dos nossos tribunais[36],[37],[38].
Pois bem, não obstante as especificidades próprias do registo predial, parece-nos de concluir que, tendo em conta o prescrito no artigo 156º do CRP, o disposto nos artigos 139º, nºs 4 e 5, e 140º do CPC é aplicável em sede de recurso hierárquico e de impugnação judicial, não tendo aqui cabimento introduzir qualquer distinção em função da natureza da entidade ad quem[39].
Por força do art. 147º-B, à impugnação das decisões do conservador é aplicável, subsidiariamente e com as necessárias adaptações, o disposto no código de processo civil. São assim aplicáveis designadamente as disposições que se referem à retificação de erros materiais, às causas de nulidade da decisão e à possibilidade de ser requerido o esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade que a decisão contenha[40],
Concluindo, é aplicável subsidiariamente o disposto no artigo 139º, nºs 5 e 6, do CPCivil, isto é, a possibilidade de a parte poder praticar o ato para além do termo do prazo, dentro dos três dias úteis subsequentes, mediante o pagamento de uma multa, como decidiu o tribunal a quo.
Mesmos nos casos em que a apresentação de pedidos de registo esteja sujeita ao cumprimento de prazos, devem ser tidas em conta, além da regra geral fixada no art. 279º CC, as seguintes regras decorrentes da aplicação subsidiária dos artigos 145º e 146º do CPC:
a) Consideram-se encerrados os serviços quando for tolerância de ponto, pelo que o prazo se transfere para o primeiro dia útil seguinte;
b) Considera-se justo impedimento para o cumprimento do prazo o evento não imputável à parte, nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do ato, permitindo-se que, neste caso, o ato possa ser praticado logo que cesse o impedimento[41],[42].
b.) Emolumentos e multa processual.
A apelante alega ainda que “acresce que os emolumentos previstos em sede de recurso hierárquico são apenas os constantes do artigo 27.º, n.º 5 do Regulamento Emolumentar dos Registos e do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de dezembro e norma alguma, seja do Código do Registo Predial, seja do Regulamento Emolumentar, prevê a possibilidade da prática do aludido ato para além do prazo legal nem, coerentemente, a possibilidade do agravamento do quantitativo
emolumentar fixado no artigo 27.º, n.º 5.1. do Regulamento Emolumentar”.
Vejamos a questão.
No momento do pedido deve ser entregue, a título de preparo, a quantia provável do total da conta – art. 151º, nº 1, do CRPredial.
É responsável pelo pagamento dos emolumentos o sujeito ativo dos factos, não obstante o disposto nos números seguintes e na legislação própria relativamente ao pagamento de emolumentos, taxas e outros encargos devidos pela prática dos atos previstos no presente código – art. 151º, nº 2, do CRPredial.
O preparo é a quantia provável do total da conta exigível no momento em que se faz o pedido de registo ou de outro ato, devendo, sempre que possível, ser coincidente com o emolumento devido, isto é, com a conta final[43].
O preparo tem por fim principal garantir o custo do serviço a prestar[44].
Logo no ato da apresentação deve ser cobrada, a título de preparo, a quantia provável do total da conta[45],
Pelos atos praticados nos serviços de registo são liquidados e cobrados os emolumentos, taxas e encargos, devendo quem solicita a prática do ato efetuar o pagamento, dos emolumentos e taxas devidas, incluindo as quantias relativas ao cumprimento tardio da obrigação de registar[46].
Ora, como a multa progressiva pela prática do ato processual num dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, não representa o pagamento pelo serviço prestado por qualquer ato de registo, não se pode definir ou enquadrar na categoria de emolumento, mas sim, configurar como uma penalização pela prática do ato para além dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo.
Assim, a multa processual não representa qualquer agravamento do quantitativo emolumentar pelo custo efetivo do serviço prestado, pois não acresce ao emolumento eventualmente devido, uma vez que não há um serviço prestado, mas uma penalização pela prática do ato processual fora de tempo, mas dentro dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo.
E, por não se tratar de um emolumento, por não haver contrapartida pelo custo efetivo do serviço prestado, é que o montante da multa é fixado por referência à unidade de conta (UC), e não a numerário, como é o fixado para a tributação dos atos de registo.  
Assim, enquanto os emolumentos correspondem ao custo efetivo do serviço prestado, a multa processual corresponde à penalização pela prática de um ato processual para além dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo.
Temos, pois, que o pagamento da multa pela prática de um ato processual para além dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, não representa qualquer agravamento dos emolumentos, pois estes correspondem ao custo efetivo dos atos praticados pelos serviços do registo, mas sim, a uma penalização pela prática de um ato processual para além do termo do prazo.
Concluindo, como a multa processual corresponde a uma penalização pela prática de um ato processual para além dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, não se configura como emolumento, o qual corresponde ao custo efetivo do serviço prestado, podendo assim ser cobrada pelos respetivos serviços de registo.
c.) Unidade de conta.
A UC é atualizada anual e automaticamente de acordo com o indexante dos apoios sociais (IAS), devendo atender-se, para o efeito, ao valor de UC respeitante ao ano anterior - artigo 5.º, nº 2, do Regulamento das Custas Processuais
O valor correspondente à UC para o pagamento de encargos, multas e outras penalidades fixa-se no momento da prática do ato taxável ou penalizado - artigo 5.º, nº 4, do Regulamento das Custas Processuais.
Nos termos do art. 22º do DL nº 34/08, de 26-2 (diploma que aprovou o RCP), a UC é a quantia monetária equivalente a um ¼ do valor do Indexante dos Apoios Sociais (IAS), arredondada à unidade €. O IAS foi instituído pela Lei nº 53-B/06, de 29-12. Para o ano de 2008, a Port. nº 9/08, de 3-1, fixou o valor do IAS em € 407,41. Tendo o RCP entrado em vigor em 20-02-09, a UC passou a ter o valor de € 102,00[47].
O valor da Unidade de Conta (UC) está, desde o DL 34/2008, de 26 de fevereiro, sujeito a atualizações anuais, de acordo com o indexante dos apoios sociais (art. 5-2 RegCustas; cf. Art.5 da lei 53-B/2006, de 29 de dezembro)[48].
Em princípio, o valor da UC deveria ser atualizado anual e automaticamente com base na taxa de atualização daquele indexante, mas tal ainda não ocorreu, seja porque, durante alguns anos, o IAS não foi alterado, seja porque a própria atualização automática da UC foi sendo suspensa[49].
Em 2020, mantém-se a suspensão da atualização automática da unidade de conta (UC) prevista no n.º 2 do artigo 5.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, mantendo-se em vigor o valor das custas vigente em 2019 - artigo 210.º da Lei n.º 2/2020, de 31 de março, que aprovou o Orçamento de Estado para 2020.       
Por tudo isso, o valor da UC mantem-se em € 102,00[50].
A UC, no montante de € 102,00, que vigora desde 20 de abril de 2009, foi fixada com base no indexante de apoios sociais vigente em dezembro de 2008, com o valor de € 407,41[51].
****
Mostrando-se, pois, a sentença sindicada corretamente estruturada quanto a tal questão (prática do ato nos três dias úteis seguintes ao termo do prazo), este tribunal considera dever seguir a fundamentação deduzida pelo tribunal a quo, sem necessidade de reproduzir todos os raciocínios ou explanar mais convincentes argumentos, pelo que, nos termos do CPCivil, art. 663º, n.º 6, se remete para os fundamentos da decisão impugnada, que, no essencial, se acolhem.
Destarte, improcedendo as conclusões do recurso de apelação, há que confirmar a decisão proferida pelo tribunal a quo.
3. DISPOSITIVO
3.1. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível (2ª) do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso e, consequentemente, em confirmar-se a decisão recorrida.       
3.2. REGIME DE CUSTAS
Custas pela apelante (na vertente de custas de parte, por outras não haver[52]), porquanto a elas deu causa por ter ficado vencida[53].
                    
Lisboa, 2020-07-09[54],[55]
Nelson Borges Carneiro
Pedro Martins
Inês Moura
_______________________________________________________
[1] Para além do dever de apresentar a sua alegação, impende sobre o recorrente o ónus de nela concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – ónus de formular conclusões (art. 639º, nº 1) – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 503.
[2] As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 639º, nº 3. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 795.
[3] O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar, as normas jurídicas violadas; o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, e invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada – art. 639º, nºs 1 e 2, do CPCivil.
[4] Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação – art. 657º, n.º 2, do CPCivil.
[5] Todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas, não podendo de elas conhecer o tribunal de recurso.
[6] Vem sendo entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.
[7] Quando não tenha sido impugnada, nem haja lugar a qualquer alteração da matéria de facto, o acórdão limita-se a remeter para os termos da decisão da 1.ª instância que decidiu aquela matéria – art. 663º, nº 6, do CPCivil.
[8] Relativamente a questões de conhecimento oficioso e que, por isso mesmo, não foram suscitadas anteriormente, a Relação deve assegurar o contraditório, nos termos gerais do art. 3º, nº 3. A Relação não pode surpreender as partes com uma decisão que venha contra a corrente do processo, impondo-se que as ouça previamente – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 829.
[9] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 383.
[10] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 384.
[11] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 330.
[12] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 3287.
[13] RUI JANUÁRIO – ANTÓNIO GAMEIRO, Direito Registral Predial, p. 272.
[14] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 341.
[15] Tanto o despacho do conservador que indefira liminarmente o requerimento de retificação, como a decisão final do conservador sobre o pedido de retificação, podem ser impugnadas “mediante a interposição de recurso hierárquico para o conselho diretivo do Instituto dos Registos e do Notariado, I.P., ou mediante impugnação judicial para o tribunal da comarca da área da circunscrição a que pertence o serviço de registo”, vd. artigos 127º, n.º 2 e 131º, n.º 1 – EZAGÜY MARTINS, Impugnação judicial das decisões do Conservador no âmbito do Registo Predial, Registo Predial, E-Book, CEJ, p. 95.
[16] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 342.
[17] Esta modalidade de pedido de registo já se encontrava prevista no art. 146º do código de 1967, embora, ao tempo, só fosse admissível dentro de determinados condicionalismos relativos à residência dos requerentes, isto é, os requerentes tinham de residir fora da área de competência da conservatória – ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 167.
[18] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Prazos Processuais, p. 139.
[19] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Prazos Processuais, p. 139.
[20] Os documentos apresentados pelo correio são anotados imediatamente após a última apresentação pessoal de cada dia, observando-se o disposto no artigo 63.º, se necessário – art. 60º, nº 4, do CRPredial.
[21] ALBERTO VIEIRA, Direitos Reais, p. 280.
[22] SEABRA LOPES, Direito dos Registos e do Notariado, 4ª edição, p. 432.
[23] CARVALHO FERNANDES, Lições de Direitos Reais, p. 121.
[24] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 113.
[25] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 113.
[26] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 193.
[27] ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 182.
[28] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Prazos Processuais, pp. 14.
[29] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Prazos Processuais, pp. 23.
[30] LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 4ª ed., p. 293.
[31] Os referidos prazos de impugnação hierárquica ou judicial são continuados sendo-lhes aplicáveis, subsidiariamente, e com as necessárias adaptações, o disposto no Código de Processo Civil, cfr. artigos 155º, n.º 2 e 156º - EZAGÜY MARTINS, Impugnação judicial das decisões do Conservador no âmbito do Registo Predial, Registo Predial, E-Book, CEJ, p. 91.
[32] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 357.
[33] Ac. STJustiça de 2005-05-26, citado in ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 358.
[34] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Prazos Processuais, pp. 154/155.
[35] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Prazos Processuais, p. 156.
[36] A contagem do prazo da impugnação judicial das decisões do Conservador faz-se nos termos especificamente previstos no artigo 154º do CRegPredial, sendo-lhe subsidiariamente aplicáveis as normas constantes do CPC. É-lhe assim aplicável o disposto no artigo 139º, nºs 5 e 6, do CPC, podendo o ato de impugnação ser praticado num dos três dias úteis seguintes, mediante o pagamento da multa aí prevista – Ac. Tribunal da Relação de Coimbra de 2018-01-16, Relator: MARIA JOÃO AREIAS, http://www.dgsi.pt/jtrc.
[37] O prazo de 30 dias a que alude o art.º 141.º, n.º 1, do CRP é judicial de natureza processual, sendo-lhe, por isso, aplicável o prescrito nos art.ºs 144.º e 145.º do CPC de 1961 e nos art.ºs 138.º e 139.º do NCPC – Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2014-02-06, Relator: MÁRIO FERNANDES, http://www.dgsi.pt/jtrp. 4
[38] Ao mesmo procedimento processual - recurso contencioso – é aplicável a regra do artigo 145º, nºs 5 e 6 do mesmo diploma legal – Ac. Tribunal da Relação de Coimbra de 2009-10-06, Relatora: JUDITE PIRES, http://www.dgsi.pt/jtrc.
[39] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 357.
[40] SEABRA LOPES, Direito dos Registos e do Notariado, 4ª edição, p. 592.
[41] SEABRA LOPES, Direito dos Registos e do Notariado, 4ª edição, p. 512.
[42] O Conselho Técnico dos Registos e Notariado interpretou coo justo impedimento, a propósito de uma greve dos correios, “o atraso do serviço dos correios que determina a chegada de documentação à conservatória fora do prazo de vigência do registo provisório, quando a sua expedição foi feita com a antecedência normal e previsivelmente necessária – citado em, SEABRA LOPES, Direito dos Registos e do Notariado, 4ª edição, p. 513.
[43] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 378.
[44] CATARINO NUNES, Código do Registo Predial, p. 520.
[45] SEABRA LOPES, Direito dos Registos e do Notariado, 4ª edição, p. 593.
[46] ISABEL QUELHAS GERALDES, Código do Registo Predial Anotado e Comentado, 2ª edição, p. 379.
[47] ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 174.
[48] LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 4ª ed., p. 295.
[49] ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 174.
[50] ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 174.
[51] SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 131.
[52] Como o conceito de custas stricto sensu é polissémico, porque é suscetível de envolver, nos termos do nº 1 do artigo 529º, além da taxa de justiça, que, em regra, não é objeto de condenação – os encargos e as custas de parte, importa que o juiz, ou o coletivo de juízes, nos segmentos condenatórios das partes no pagamento de custas, expressem as vertentes a que a condenação se reporta – SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 8.
[53] A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito – art. 527º, nº 1, do CPCivil.
[54] A assinatura eletrónica substitui e dispensa para todos os efeitos a assinatura autógrafa em suporte de papel dos atos processuais – art. 19º, nº 2, da Portaria n.º 280/2013, de 26/08, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 267/2018, de 20/09.
[55] Acórdão assinado digitalmente.