Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
28983/18.7T8LSB.L1-2
Relator: INÊS MOURA
Descritores: ACTIVIDADE TRANSITÁRIA
CONTRATO DE TRANSPORTE
RESPONSABILIDADE
PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/01/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1.De acordo com o disposto no art.º 15.º n.º 1 do Decreto Lei 255/99 de 7 de julho, diploma que rege sobre a atividade transitária, a R. enquanto empresa transitária contratada, responde perante a A. sua cliente, não só pelo incumprimento das suas obrigações enquanto tal, mas também pelo das obrigações contraídas pelo terceiro com quem outorgou o contrato de transporte, sem prejuízo do direito de regresso sobre ele.

2.A Convenção CMR destinando-se à regulação do contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada não se aplica diretamente ao transitário, mas a ela importa recorrer por remissão, quando este tenha contratado o transporte em nome do expedidor, por força do art.º 15.º do Decreto Lei 255/99 que o responsabiliza quando os danos do expedidor resultam do transporte da mercadoria.

3.Uma vez que a responsabilidade da R. enquanto empresa transitária se afere nos mesmos termos da responsabilidade da transportadora, tudo se passa como se tivesse sido ela a transportar a mercadoria, não havendo que excluir a aplicação do art.º 32.º da Convenção CMR relativo ao regime da prescrição.

4.Não se tratando de uma responsabilidade da R. por incumprimento dos serviços a que se obrigou enquanto transitária, mas antes da sua responsabilização pelo incumprimento do serviço de transporte que contratou, não é aplicável o prazo de prescrição de 10 meses previsto no art.º 16.º do Decreto Lei 255/99, mas o prazo especial previsto no art.º 32.º da Convenção CMR, que por ser especial afasta também o prazo ordinário da prescrição de 20 anos estabelecido no art.º 309.º do C.Civil.

5.Ainda que a prescrição tenha de ser invocada por aquele que dela se quer aproveitar, como dispõe o art.º 303.º do C.Civil, é preciso não esquecer que a mesma opera «ipso facto». Decorrido o prazo prescricional, o seu efeito produz-se, sem necessidade de qualquer ato do devedor, pelo que a partir do momento em que já ocorreu a prescrição, não pode haver uma interrupção da mesma por ato posterior, seja do credor seja do devedor com o reconhecimento do direito do credor previsto no art.º 325.º do C.Civil.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa


I.Relatório


Vem MP – Produtos Alimentares, Lda. intentar a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra a Logimore - Unipessoal, Lda., pedindo a sua condenação no pagamento de uma indemnização no valor de € 22.748,40.

Alega, em síntese, para fundamentar o seu pedido, que se dedica ao comércio por grosso de batata. No âmbito da sua atividade vendeu à empresa alemã Theodor Stadtmann GmbH & Co. KG 23.520,00 kg de batata tipo Challenger, pelo preço de € 11.524,80, e à empresa holandesa HZPC Holland B.V. 23.880,00 kg de batata tipo Challenger, pelo preço de € 11.223,60. A R. é agente transitária, dedicando-se à organização de transporte e logística e foi quem a A. incumbiu de efetuar o transporte em segurança da referida mercadoria até à Alemanha e de a entregar aos respetivos destinatários garantindo todas as condições necessárias de acondicionamento. Foi acordado entre A. e R. que esta trataria de organizar o transporte das mercadorias, assegurando a deslocação da mercadoria até ao destino. A R. contactou uma empresa de transportes para fazer deslocar a mercadoria de acordo com as especificações (à temperatura de 10º positivos) da Autora. Houve uma avaria de frio nos veículos que transportaram a mercadoria para os destinatários e em ambas as situações a mercadoria chegou ao destino em muito más condições, sem possibilidade de revenda para consumo humano, verificando-se a sua perda total. A A. não recebeu o preço da mercadoria e apresentou reclamação à R. que lhe criou uma representação errónea da situação confiando que a mesma estaria a ser resolvida. A 7 de Março de 2017, após várias insistências da A., a R. vem propor a emissão de nota de crédito correspondente ao valor do transporte, no valor de € 5.800,00, acrescida do montante de € 3.000,00 “para a ajuda de algum dano causado”. A A. sofreu um dano equivalente ao valor da mercadoria que não recebeu, sendo a R. responsável pelo incumprimento do contrato.

A R. apresentou contestação, concluindo pela improcedência da ação. Começou por invocar a sua ilegitimidade por não ter sido ela a realizar o transporte da mercadoria, mais defendendo que um eventual direito indemnizatório da A. sempre estaria prescrito. Impugna também os factos alegados, referindo desconhecer o estado e condições em que a mercadoria chegou ao destinatário e se a A. recebeu ou não o preço do carregamento de batatas. Veio ainda alegar que prestou todas as informações à A., não protelou o envio de elementos e a comunicação que lhe fez a propor uma compensação pelos danos sofridos não traduziu qualquer assunção de responsabilidade pela produção do ocorrido.

A R. requer ainda a condenação da A. como litigante de má-fé.

A A. veio responder às exceções suscitadas, concluindo pela sua improcedência, defendendo que o prazo prescricional aplicável ao caso é o comum de 20 anos.

Foi realizada audiência prévia e elaborado despacho saneador, que julgou improcedente a exceção de ilegitimidade passiva da R., mais afirmando a validade e e regularidade da lide, relegando para final o conhecimento da exceção de prescrição. Foi fixado do objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento e foi proferida sentença que julgou procedente a exceção da prescrição suscitada pela R., assim absolvendo a mesma do pedido contra ela formulado pela A., mais julgando improcedente o pedido de condenação da A. como litigante de má-fé.

É com esta sentença que a A. não se conforma e dela vem interpor recurso pedindo a sua revogação e substituição por outra que dê procedência à ação, apresentando para o efeito as seguintes conclusões que se reproduzem:

“Do recurso sobre a matéria de facto
A)Entende a Autora/Recorrente que nos autos existe prova abundante e contundente que, sem qualquer dúvida razoável, permite demonstrar que a Ré/Recorrida lhe prestou informação errada para se abster da sua responsabilização;
B)Com tal conduta, a Ré/Recorrida criou uma representação errónea da situação à Autora/Recorrente;
C)No mesmo sentido, resulta de toda a prova produzida que a Ré/Recorrida agiu fora do contrato e das suas obrigações de transitária;
D)O facto 26 (A Ré, por sua vez, comunicava com a Transportadora e transmitia à Autora a informação dada por aquela) dos factos dados como provados pelo Tribunal a quo encontra-se incorretamente julgado face ao teor dos depoimentos das seguintes testemunhas:
a)-SC
(20210112103041_19687196_2871114)
E)Especificamente assinalam-se as passagens do depoimento de SC com início nos minutos 20:40, 20:57, 21:53, 24:22 e 25:37.
F)Assim, face ao teor do referido depoimento deveria ter sido dado como provado o seguinte: A Ré transmitiu à Autora informação que bem sabia não ser verdadeira tendo agido fora das suas obrigações enquanto transitária;
G)O facto A. (Na sequência do pedido de envio de cópia da sentença a Ré foi protelando a situação), B. (A Ré prestou informação errada à Autora tentando abster-se do pagamento de uma indemnização) e C. (Ao fazê-lo criou na Autora uma representação errónea da situação); dos factos dados como não provados encontram-se incorretamente julgado face ao teor dos depoimentos de:
a)-SC (20210112103041_19687196_2871114)
b)-VP (20210112112705_19687196_2871114)
H)Especificamente assinalam-se as passagens dos referidos depoimentos de SC com início nos minutos 21:46, 22:37, 23:04, 24:22 e 25: 37 e de VP com início no minuto 14:05;
I)De modo que, face ao teor dos referidos depoimentos referidos deveria ter sido dado como provado o seguinte: Na sequência de a Autora ter pedido o envio da sentença proferida a Ré foi protelando a situação; A Ré prestou informação errada à Autora tentando abster-se do pagamento de uma indemnização; Ao fazê-lo criou na Autora uma situação errónea da situação;
J)Os factos D. (Fê-lo consciente de que tal iria evitar que a Autora desse início a diligências tendentes à obtenção do montante ora peticionado) e E. (Situação que previu e que quis) dos factos dados como não provados pelo Tribunal a quo encontram-se incorretamente julgados face ao teor da prova documental, nomeadamente dos documentos 8, 9 e 10 juntos à petição inicial e ainda face ao teor dos depoimentos das seguintes testemunhas:
a)- SC (20210112103041_19687196_2871114);
b)- VP (20210112112705_19687196_2871114);
c)- PG (20210112112705_19687196_2871114)
K)A esse respeito assinalam-se as passagens do depoimento de SC com início nos minutos 20:57, 21:17, 21:30, 21:58, 23:04; 24:22, de VP, com início no minuto 14:05 e de PG com início no minuto 13:50;
L)De modo que, face ao teor da prova documental e dos referidos depoimentos referidos deveria ter sido dado como provado o seguinte: Fê-lo consciente de que tal iria evitar que a Autora desse início a diligências tendentes à obtenção do montante ora peticionado; Situação que previu e quis;
M)O facto F. (Ao se aperceber que a Autora não ia deixar de pugnar pelo envio da sentença a Ré propõe o pagamento dos valores acima referidos, numa tentativa de findar o assunto sem que se descobrisse que havia estado a ludibriar a Autora) dos factos dados como não provados pelo Tribunal a quo encontra-se incorretamente julgado face ao teor da prova documental, nomeadamente do documento 10 junto à petição inicial e dos depoimentos das seguintes testemunhas:
a)- SC (20210112103041_19687196_2871114);
c)- PG (20210112112705_19687196_2871114)
N)Especificamente assinalam-se as passagens do depoimento de SC, com início no minuto 20:57, 21:58 e 24:22 e de PG, com início no minuto 13:50;
O)Tendo em conta a prova documental referida e o teor dos depoimentos deveria ter sido dado como provado que: Ao se aperceber que a Autora não ia deixar de pugnar pelo envio da sentença a Ré propõe o pagamento dos valores acima referidos, numa tentativa de findar o assunto sem que se descobrisse que havia estado a ludibriar a Autora.

Do recurso sobre a matéria de direito
P)Entende a Autora/Recorrente que o Tribunal a quo fez uma interpretação errada do artigo 325.º n.º 1 do Código Civil; Ainda,
Q)Entende a Autora/Recorrente que o tribunal errou na determinação da norma aplicável;
R)Assim, concretamente o Tribunal a quo errou ao aplicar o artigo 32.º n.º 1 da Convenção relativa ao transporte internacional de mercadorias à situação em apreço;
S)De toda a prova produzida conclui-se que a Ré/Recorrida reconheceu a existência do direito da Autora, pois caso contrário teria declinado desde o início qualquer responsabilidade na situação, o que não ocorreu;
T)Tanto é assim que a Ré/Recorrida propôs o pagamento da quantia de € 3.000,00 (três mil euros) à Autora/Recorrente para “compensação de qualquer dano causado”;
U)Tais factos demonstram que a Ré/Recorrida reconhece inequivocamente a existência do direito da Autora/Recorrente; Ora bem,
V)O artigo 325.º n.º 1 do Código Civil dispõe a prescrição é interrompida pelo reconhecimento do direito, efetuado perante o respectivo titular por aquele contra quem o direito pode ser exercido.
W)O e-mail junto à petição inicial sob DOC. 10 constitui reconhecimento inequívoco por parte da Ré da existência do direito da Autora.
X)Pelo que o Tribunal a quo teria de ter concluído que a prescrição se considerava interrompida no dia 07.03.2017 fazendo dessa forma uma correta interpretação do artigo 325.º n.º 1 do Código Civil. De todo o modo, mesmo que assim não se entenda,
Y)O Tribunal a quo errou ao aplicar ao caso concreto o n.º 1 do artigo 32.º da Convenção relativa ao contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada.
Z)Tal como não é aplicável o regime do Decreto-Lei n.º 255/99 de 7/7 por não estar em causa o incumprimento de obrigações da Ré/Recorrida enquanto transitária também não é aplicável o regime da Convenção CMR (Decreto-lei n.º 46235);
AA)Nos termos do artigo 15.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 255/99 de 7/7 a transitária responde objetivamente perante o cliente pelo incumprimento de terceiros que haja contratado;
BB)Nos termos do n.º 2 do mesmo artigo à responsabilidade emergente dos contratos celebrados no âmbito deste diploma aplicam-se os limites estabelecidos, por lei ou convenção, para o transportador a quem seja confiada a execução material do transporte, salvo se outro limite for convencionado pelas partes;
CC)Do n.º 1 resulta de forma clara que o transitário responde objetivamente pelo incumprimento do transporte de mercadorias contratado com terceiros;
DD)Do n.º 2 resulta que se aplicam os limites estabelecidos pela lei ou convenção para a responsabilidade do transportador;
EE)Contudo, este preceito apenas limita o montante da responsabilidade a recair sobre o transitário, indicando que esta terá como montante máximo o da responsabilidade do transportador;
FF)Já o transitário responde nos termos do artigo 798.º do Código Civil, devendo indemnizar o prejuízo causado nesses termos;
GG)É também essa a interpretação da Jurisprudência;
HH)A esse respeito referimos o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra datado de 04/04/2006 proferido no âmbito do Processo n.º 4296/05;
II)Consequentemente, o prazo de prescrição que se aplica é o prazo ordinário de 20 anos previsto no artigo 309.º do Código Civil e não os prazos especiais previstos no artigo 32.º da Convenção CMR;
JJ)Pelo que o direito da Autora/Recorrente não encontra prescrito não podendo assim operar a exceção perentória que determinou a absolvição do pedido conforme concluiu erradamente a sentença recorrida.
A R. vem responder ao recurso pugnando pela sua improcedência e confirmação da sentença proferida.

II.Questões a decidir

São as seguintes as questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pela Recorrente nas suas conclusões- art.º 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do CPC - salvo questões de conhecimento oficioso- art.º 608.º n.º 2 in fine:
- da impugnação da decisão da matéria de facto;
- da (in)aplicabilidade do prazo da prescrição previsto no art.º 32.º da Convenção CMR;
- da interrupção do prazo da prescrição com o reconhecimento pela R. do direito indemnizatório da A.

III.Fundamentos de Facto

- da impugnação da decisão da matéria de facto
Vem a Recorrente impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, invocando o seu erro quanto ao ponto 26 dos factos provados e quanto às alíneas A), B), C), D), E), e F) dos factos não provados, cuja alteração requer.
Por terem sido por ela cumpridos os requisitos previstos no art.º 640.º n.º 1 e n.º 2 do CPC, procede-se à apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto apresentada.

O ponto 26 dos factos provados tem o seguinte teor:
26.- A Ré, por sua vez, comunicava com a Transportadora e transmitia à Autora a informação dada por aquela.
Pretende a Recorrente que em alternativa se considere provado que:
“A Ré transmitiu à Autora informação que bem sabia não ser verdadeira tendo agido fora das suas obrigações enquanto transitária.”
Invoca o depoimento da testemunha SC, nos excertos de gravação que assinala, como fundamento para a alteração pretendida.
Verifica-se que este facto que a Recorrente agora põe em causa, foi por si expressamente alegado na petição inicial, nos art.º 26.º e 27.º, onde refere que nunca teve contacto com a Transportadora, mas apenas com a R. e que era esta que comunicava com a Transportadora, transmitindo-lhe a informação dada por ela.
Por outro lado, o depoimento da testemunha indicada, funcionária da A., não só não infirma este facto tido como provado, como antes o confirma, nas afirmações que a mesma faz no sentido de que após o sinistro foi com a R. que a A. contactou e era esta que lhe dava a conhecer os procedimentos que estavam a ser feitos, designadamente com a seguradora do Transportador para a resolução do assunto, contactos que por vezes eram feitos por si, como revela no seu depoimento.
Também os documentos juntos aos autos com a p.i. como doc. 7, 8, 9 e 11 mostram que os contactos eram feitos entre a A. e a R., respondendo a R. de acordo com a informação que havia obtido da Transportadora que lhe encaminha.
Conclui-se, por isso, que os elementos probatórios indicados pela Recorrente não permitem que se considere errada a decisão do tribunal ao considerar este facto como provado que, além do mais, como se viu, tem abundante suporte no depoimento da testemunha SC e nos documentos mencionados, para além de se tratar de facto alegado e reconhecido pela A. na sua petição.

Improcede a impugnação apresentada a este facto.

Quanto às alíneas A), B), C), D), E), e F) dos factos não provados, é a seguinte a sua redação:
A)-Na sequência do mencionado em 32) a Ré foi protelando a situação.
B)-A Ré prestou informação errada à Autora tentando abster-se do pagamento de uma indemnização.
C)-Ao fazê-lo criou na Autora uma representação errónea da situação.
D)-Fê-lo consciente de que tal iria evitar que a Autora desse início a diligências tendentes à obtenção do montante ora peticionado.
E)-Situação que previu e quis.
F)-Ao se aperceber que a Autora não ia deixar de pugnar pelo envio da sentença a Ré propõe o pagamento dos valores acima referidos, numa tentativa de findar o assunto sem que se descobrisse que havia estado a ludibriar a Autora.
Defende a A. que esta matéria deve ser considerada provada, invocando para o efeito os doc. 9, 10 e 11 juntos com a petição inicial, bem como o depoimento das testemunhas SC e VP, funcionárias da A. e PG, funcionária da R.

Verifica-se, no entanto, relativamente a esta matéria tida como não provada, que a questão não se coloca no âmbito da sua sustentação ou não em qualquer meio de prova, mas antes na circunstância de se tratar de matéria puramente conclusiva, relacionada com o alegado comportamento doloso da R. que no entender da A. é suscetível de determinar o alargamento do prazo da prescrição previsto no art.º 32.º da Convenção CMR, que não tem o seu lugar próprio de avaliação em sede de decisão de facto, mas antes em sede de apreciação jurídica da causa.

Aliás esta confusão é bem patente nas alegações de recurso da Recorrente em que a mesma, para sustentar a referida impugnação da matéria de facto, tira conclusões dos factos que se apuraram e entra em considerações de direito para defender que, a entender-se aplicável o art.º 32.º da Convenção CMR deve levar-se em conta que teve lugar por parte da R. um comportamento doloso, suscetível de determinar o alargamento do prazo da prescrição ali previsto.

O art.º 607.º n.º 4 do CPC estabelece: "Na fundamentação da sentença o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que foram admitidos por acordo, provados por documento ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou pelas regras de experiência".

A decisão sobre a matéria de facto deve ser integrada por factos, o que decorre da norma mencionada, devendo assim ficar afastados da mesma os juízos meramente conclusivos ou os conceitos de direito.

Os contornos entre o que é facto e o que é direito são muitas vezes ténues, ensinando-nos Anselmo de Castro, in Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, pág. 269: “a linha divisória entre facto e direito não tem carácter fixo, dependendo em considerável medida não só da estrutura da norma, como dos termos da causa; o que é facto ou juízo de facto num caso, poderá ser direito ou juízo de direito noutro. Os limites entre um e outro são flutuantes”.

Assim, nem sempre é fácil distinguir um facto de uma conclusão ou distinguir matéria de facto de matéria de direito. Diz-nos o acórdão do TRP de 07 de outubro de 2013, no proc. 488/08.1TBVPA.P1, in www.dgsi.pt : “Pode afirmar-se, em sentido muito simplificador, que uma conclusão implica um juízo sobre factos e estes, quando em si mesmos considerados, revelam uma realidade, compreensível e detetável sem necessidade de qualquer acréscimo dedutivo.

A jurisprudência tem vindo a considerar, do que é exemplo o Acórdão do STJ de 7 de maio de 2014, no proc. 39/12.3T4AGD.C1.S1, in www.dgsi.pt que: “são de afastar expressões de conteúdo puramente valorativo ou conclusivo, destituídas de qualquer suporte factual, que sejam suscetíveis de influenciar o sentido da solução do litígio, ou seja, na expressão do Ac. de 09-12-2010 deste Supremo Tribunal, que invadam o domínio de uma questão de direito essencial.”

À luz destas considerações e revertendo para o caso em presença, sem grande dificuldade se percebe que a matéria que consta destes pontos não provados e que a Recorrente pretende que se considere provada, tem natureza conclusiva, apenas podendo ser alcançada com recurso a factos concretos que o revelem e que em parte são por ela invocados e estão concretizados nos factos já tidos como provados, que se referem ao efetivo comportamento da R. após o sinistro – factos provados 26 a 39.

Saber se a R. protelou a situação; se prestou informação errada à A. para se abster de pagar uma indemnização; se criou na A. uma representação errónea da situação de forma consciente para evitar que a A. desse início a diligências tendentes à obter uma indemnização; se quando propôs o pagamento dos valores, numa tentativa de findar o assunto era para que não se descobrisse que havia estado a ludibriar a A., tudo isto são conclusões que apenas podem resultar de factos concretos que as revelem. Ou seja, o que interessa são as atitudes e comportamentos da R. em concreto verificados, pois eles é que vão permitir aferir se tinham ou não como fim protelar a situação e evitar o pagamento; tal como para se dizer que foi prestada uma informação errada temos de saber que informação em concreto é que foi prestada e porque é que estava errada.

Os factos relevantes referem-se ao momento e ao conteúdo das informações que foram prestadas, para que possa concluir-se que houve um protelamento da situação pela R. e que aquelas foram erradas e assim transmitidas com conhecimento do erro e intenção de enganar a A., reportando-se à matéria alegada pelas partes e que o tribunal fez constar dos pontos 27 a 39 dos factos provados, que não foram impugnados, pelo que serão esses factos que admitirão ou não que deles se retire a conclusão que consta da matéria tida como não provada.

Em conclusão, estes pontos não provados não integram factos suscetíveis de ser apreendidos por qualquer meio de prova enquanto realidade objetiva, antes contêm matéria puramente conclusiva a avaliar precisamente em função dos factos que resultaram provados, devendo por isso tal matéria ser tida como não escrita.

A impugnação apresentada pela Recorrente improcede, no sentido de se aditar esta matéria aos factos provados.
*

Resultaram provados os seguintes factos com interesse para a decisão:
1.-A Autora é uma sociedade por quotas que se dedica ao comércio por grosso de produtos hortícolas, designadamente de batata, mercearia e café.
2.-No âmbito da sua atividade a Autora vendeu à empresa alemã Theodor Stadtmann GmbH & Co. KG 23.520,00 kg de batata tipo Challenger, pelo preço de € 11.524,80 (onze mil quinhentos e vinte e quatro euros e oitenta cêntimos).
3.-No âmbito da sua atividade a Autora vendeu à empresa holandesa HZPC Holland B.V. 23.880,00 kg de batata tipo Challenger, pelo preço de € 11.223,60 (onze mil duzentos e vinte e três euros e sessenta cêntimos).
4.-A Ré é uma sociedade comercial por quotas que se apresenta como agente transitária e que se dedica à organização de transporte e logística.
5.-A Autora já recorria aos serviços da Ré desde 2012.
6.-A Autora contactou a Ré para planear e organizar o transporte da batata comprada pelas sobreditas empresas até ao respetivo destino na Alemanha.
7.-A Autora incumbiu a Ré de planear e organizar o transporte da mercadoria até à Alemanha para que chegasse aos respetivos destinatários.
8.-Foi acordado entre a Autora e a Ré que esta trataria de organizar o transporte da mencionada mercadoria assegurando a sua deslocação, em boas condições, até ao destino, mediante comissão.
9.-A Ré obrigou-se perante a Autora a organizar o transporte das mercadorias, por si e através de empresas por ela contratadas, desde Portugal até ao destino na Alemanha.
10.-A Ré, na qualidade de transitária, contactou e contratou uma empresa de transportes – Goldentrans Transportes Rodoviários, SA. - para fazer deslocar a mercadoria, de acordo com as especificações dadas pela Autora, desde o Montijo até ao destino na Alemanha.
11.-À Ré incumbia tratar de toda a documentação relacionada com o transporte, retransmitir toda a informação recebida e diligenciar pela recolha e entrega de mercadoria por parte da transportadora por ela designada.
12.-Foi a Ré que organizou toda a logística para que se realizasse o transporte.
13.-A mercadoria com destino à empresa Theodor Stadtmann GmbH & Co. KG foi transportada no veículo com a matrícula …-…-…, sob a referência L-….
14.-A mercadoria destinada à empresa HZPC Holland B.V. foi transportada no veículo com a matrícula …-…-…, sob a referência L- …
15.-A primeira encomenda de batatas foi carregada para expedição no dia 24 de Junho de 2015 e a segunda encomenda foi carregada no dia 27 de Junho de 2015.
16.-A Autora contactou com a sobredita transportadora (contratada pela Ré) aquando do carregamento das mercadorias nos aludidos veículos, tendo dado instruções de que deveriam ser transportadas à temperatura abaixo indicada.
17.-A mercadoria (batatas) acima referida deveria ser entregue na Alemanha, respetivamente, em Straelen e em Neuenkirchen.
18.-Atendendo à mercadoria transportada – batatas para consumo humano – e à distância percorrida no transporte, a Autora especificou que a mercadoria deveria ser transportada à temperatura de 10º positivos.
19.-Atendendo a que a mercadoria é um bem perecível a Autora mencionou expressamente à Ré, com quem já contratava o transporte de batata desde 2012, que assegurasse a devida diligência durante o transporte, nomeadamente que este seria efetuado com a temperatura indicada.
20.-A Ré obrigou-se a organizar o transporte por si e através de empresa por si contratada para o efeito.
21.-Houve uma avaria de frio no veículo que transportou a mercadoria para as instalações da empresa Theodor Stadtmann GmbH & Co. KG.
22.-Houve uma avaria de frio no veículo que transportou a mercadoria para as instalações da empresa HZPC Holland B.V.
23.-Em ambas as situações a mercadoria chegou ao destino, nos dias 01.07.2015 (mercadoria destinada à empresa HZPC Holland B.V.) e 03.07.2015 (mercadoria destinada à empresa Theodor Stadtmann GmbH & Co. KG), em más condições (verificando-se a existência de batatas podres e a perda total da mercadoria), sem possibilidade de revenda para consumo humano.
24.-A Autora não recebeu o montante global de € 22.748,40 pelos referidos carregamentos de batatas expedidos para a Alemanha.
25.-Verificada a situação de perda total da mercadoria a Autora nunca contactou com a Transportadora, apenas com a Ré a quem apresentou reclamação (verbal) aquando da chegada da mercadoria ao destino.
26.-A Ré, por sua vez, comunicava com a Transportadora e transmitia à Autora a informação dada por aquela.
27.-Em 7 de Agosto de 2015 a Ré envia à Autora as comunicações cujas cópias se mostram insertas a fls. 13 e 13v, cartas da Seguradora da Transportadora Goldentrans, SA. a informar que não assume a responsabilidade pelos sinistros.
28.-A Autora questiona a Ré relativamente ao procedimento que tencionava seguir, referindo que a Ré havia descurado as suas responsabilidades enquanto transitária não pretendendo dar qualquer solução à situação.
29.-A Ré enviou à Autora o email de fls. 14, datado de 05.10.2015, a comunicar que não descurou a situação e que teria apurado junto da Transportadora que esta teria agido judicialmente contra a Seguradora.
30.-A Autora foi contactando telefonicamente a Ré para se inteirar dos desenvolvimentos.
31.-Em 30 de Dezembro de 2016 a Ré enviou à Autora o email de fls. 14v e 15, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, a inteirar a Autora da situação referente aos sinistros, indicando que a audiência de julgamento referente aos mesmos teria já ocorrido e que a sentença teria sido desfavorável, não tendo igualmente sido possível chegar a acordo.
32.-A Autora solicita à Ré que envie cópia da sentença proferida.
33.-A Ré afirmou que o seu envio estava pendente do transportador.
34.-Em 7 de Março de 2017 a Ré enviou à Autora o email cuja cópia se mostra inserta a fls. 15v, de cujo teor consta: «Conforme nossa conversa telefónica e após temos andado sempre a insistir na resolução desdes acidentes somos a informar o seguinte: A companhia de seguros desde do inicio se recusou a ter responsabilidade nos sinistros bem como livrou o transportador de qualquer culpa pois as batatas não foram arrefecidas antes de carregadas nos camions, baseando-se no facto de o camion frigorifico apenas serve para manter a temperatura e não para o arrefecimento da carga, conforme documentos já enviados. No sentido de uma resolução mais rápida deste assunto propomos o não pagamento dos dois transportes no valor de 5.800,00 € conforme nossa nota de Crédito já efectuada, bem como o valor de 3.000,00 € para a ajuda de algum dano causado».
35.-A Autora continuou a insistir no envio da dita sentença.
36.-Em 5 de Abril de 2017 a Ré enviou à Autora o email cuja cópia se mostra inserta a fls. 16v, de cujo teor consta: «O transportador tinha-me informado que tinha 7 processos com a Companhia de Seguros e que iria tribunal com a mesma para resolução dos mesmos (informei o nosso Cliente MP com base no que me foi transmitido)... não descorámos de forma alguma esta situação, pois ia falando com o Transportador para saber como estavam as coisas e ia transmitindo também ao nosso Cliente. Fui informada pelo Transportador que dos 7 processos dois ficaram logo excluídos, sendo os nossos 2 processos, uma vez que conforme vos foi enviado a Companhia de Seguros excluía toda e qualquer responsabilidade assim como do Transportador uma vez que a mercadoria teria que ser arrefecida antes da entrada no camion pois o camion frigorifico serve para manter as temperaturas e não para a arrefecer. Mais informamos que toda esta discrição foi sempre transmitida ao nosso Cliente. No entanto vou falar com o Transportador para saber se existe mais algum documento que possa ajudar».
37.-A Autora sempre confiou na informação que a Ré lhe transmitia, atendendo à duração do relacionamento comercial que as unia.
38.-A Autora confiou que teria sido intentada acção judicial contra a Seguradora e decidiu aguardar o desfecho.
39.-A Ré transmitiu à Autora todas as informações que lhe foram sendo prestadas pela transportadora Goldentrans, S.A.

IV.Razões de Direito
- da (in)aplicabilidade do prazo da prescrição previsto no art.º 32.º da Convenção CMR
A Recorrente defende que tendo a R. sido contratada como transitária e não como transportadora, deve aplicar-se o prazo ordinário de 20 anos da prescrição previsto no art.º 309.º do C.Civil, excluindo-se os prazos especiais da prescrição do art.º 32.º da Convenção CMR.
A sentença recorrida reconhecendo que a R. é transitária, considerou aplicável o Decreto Lei 255/99 de 7 de julho e por via do art.º 15.º deste diploma, o regime relativo à responsabilidade do transportador da Convenção CMR, considerando prescrito o direito indemnizatório reclamado pela A. nos termos do art.º 32.º da Convenção.
A questão sobre a qual se centra a discordância da Recorrente é por isso a de saber se é aplicável ao caso a Convenção CMR e em concreto o disposto no seu art.º 32.º que estabelece prazos especiais de prescrição, tendo em conta que a A. contratou com a R. como transitária e não como transportadora da mercadoria.
Os factos provados mostram que a A. contactou e incumbiu a R. de planear e organizar o transporte das batatas que vendeu, até ao destino pretendido na Alemanha, assegurando a R. a deslocação da mercadoria em boas condições, mediante comissão, tendo esta contratado outra empresa que realizou o transporte da mercadoria desde Portugal até ao seu destino.
Apurou-se que à R. incumbia tratar de toda a documentação relacionada com o transporte, retransmitir toda a informação recebida e diligenciar pela recolha e entrega da mercadoria por parte da transportadora, tendo sido a R. que organizou toda a logística para que se realizasse o transporte na sua qualidade de transitária e contactou e contratou uma empresa de transportes para fazer deslocar a mercadoria, de acordo com as especificações dadas pela A., desde o Montijo até ao destino na Alemanha.
Não oferece qualquer dúvida, em face dos factos provados e tal como refere a sentença recorrida de que a R. foi contratada pela A. para lhe prestar os seus serviços no âmbito da atividade transitária que exerce, pelo que importa ter em conta em primeiro lugar o regime legal aplicável a esta atividade, não se vislumbrando qualquer fundamento para o afastar, como pretende a Recorrente.
É o Decreto Lei 255/99 de 7 de julho vem regular o acesso e o exercício da atividade transitária, cujo âmbito é definido no seu art.º 1.º nos seguintes termos:
1- O presente diploma aplica-se ao acesso e exercício da actividade transitária.
2- A actividade transitária consiste na prestação de serviços de natureza logística e operacional que inclui o planeamento, o controlo, a coordenação e a direcção das operações relacionadas com a expedição, recepção, armazenamento e circulação de bens ou mercadorias, desenvolvendo-se nos seguintes domínios de intervenção:
a)- Gestão dos fluxos de bens ou mercadorias;
b)- Mediação entre expedidores e destinatários, nomeadamente através de transportadores com quem celebre os respectivos contratos de transporte;
c)- Execução dos trâmites ou formalidades legalmente exigidos, inclusive no que se refere à emissão do documento de transporte unimodal ou multimodal.”

Desta previsão resulta que os serviços que podem ser contratados ao transitário no âmbito da sua atividade são múltiplos, correspondendo à prática de diversos serviços diretamente relacionados com o transporte de mercadorias, podendo integrar a celebração de contratos de transporte em nome e representação do cliente, como previsto na al. b) deste artigo. O transitário, por força do contrato de prestação de serviços que celebra com o expedidor, que assume a modalidade de um contrato de mandato, age como um intermediário entre o expedidor e o transportador.
O transporte das mercadorias visado tanto pode ser realizado diretamente pelo transitário, que nessa medida age também como transportador, como por terceiro por ele contratado para o efeito.
Ao contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada é aplicável a denominada Convenção CMR, aprovada em Portugal pelo Decreto Lei n.º 46235 de 18 de março de 1965, que no art.º 1.º define o seu âmbito de aplicação, estabelecendo o n.º 1: “A presente convenção aplica-se a todos os contratos de transporte de mercadorias por estrada a título oneroso por meio de veículos, quando o lugar de carregamento da mercadoria e o lugar da entrega prevista, tais como são indicados no contrato, estão situados em dois países diferentes, sendo um deste, pelo menos, país contratante e independentemente do domicílio e nacionalidade das partes.

O contrato de transporte de mercadorias tem por objeto o serviço de fazer deslocar determinada mercadoria de um local para outro que corresponde ao seu destino mediante retribuição – vd neste sentido, Francisco Costeira da Rocha in O Contrato de Transporte de Mercadorias, pág. 53 -  não se confundindo, nem se esgotando no contrato celebrado com o transitário.

Pela sua clareza na distinção do contrato de prestação de serviços integrado na atividade do transitária, do contrato de transporte, citamos aqui o Acórdão do TRL de 17/05/2001 no proc. 0130568 in www.dgsi.pt : “(…) a actividade típica da empresa transitária é a prestação de um serviço, o de «arquitectar» o transporte, assumindo o transitário a obrigação de concluir os actos jurídicos que assegurem a deslocação das mercadorias, a efectuar por terceiros, ou seja, o dever de contratar o transporte em nome do expedidor. [Citado acórdão do STJ de 17.11.94]. Em sentido estrito, o contrato de expedição é um mandato, pelo qual o transitário se obriga a celebrar um contrato de transporte por conta do expedidor-mandante. Em sentido amplo, estamos perante um contrato de prestação de serviços que poderá abranger a prática de operações materiais, ou de actos jurídicos ligados a um contrato de transporte. Pode assim definir-se o contrato de «comissão de transporte», também denominado expedição ou trânsito, como o contrato pelo qual uma das partes (transitário) se obriga perante a outra (expedidor) a prestar-lhe certos serviços – que tanto podem ser actos materiais ou jurídicos – ligados a um contrato de transporte, e também a celebrar um ou mais contratos de transporte em nome e representação do cliente. [Costeira da Rocha, obra citada, pág. 80]. Apesar da actividade multiforme desenvolvida actualmente pelos transitários, o contrato de expedição ou comissão de transporte e o contrato de transporte são realidades jurídicas distintas. O transitário, em rigor, celebra com o expedidor um contrato de prestação de serviços, na modalidade de contrato de mandato, funcionando como intermediário entre o expedidor e o transportador. Assim, em princípio, o transitário não é o «transportador». Contudo, começou a ser frequente os transitários agirem como transportadores, acordando com os expedidores serem eles ou alguém a seu mando a executar o transporte, surgindo assim, a figura do denominado transitário-transportador. Importa referir que se o transitário celebrar com o expedidor um contrato de transporte, sem que se interponha um contrato de mandato, o transitário vincular-se-á apenas como transportador.”

Na situação em presença, como se viu, a R. contratou com a A. na sua qualidade de transitária e não de transportadora, tendo depois, ao abrigo de tal contrato, celebrado com empresa transportadora terceira o contrato de transporte internacional da mercadoria do A.

Importa então saber em que termos é que pode a R., que não foi a transportadora, ser responsabilizada pelos danos sofridos pela A. na sequência do contrato de transporte não ter sido devidamente cumprido, apurando-se que houve uma avaria nos contentores de frio que transportavam as batatas, que chegaram impróprias ao seu destino, tendo a mercadoria sido rejeitada pelo comprador.

A resposta é dada pelo art.º 15.º do mencionado Decreto Lei 255/99 que regula sobre a responsabilidade das empresas transitárias, dispondo:
1- As empresas transitárias respondem perante o seu cliente pelo incumprimento das suas obrigações, bem como pelas obrigações contraídas por terceiros com quem hajam contratado, sem prejuízo do direito de regresso.
2- À responsabilidade emergente dos contratos celebrados no âmbito deste diploma aplicam-se os limites estabelecidos, por lei ou convenção, para o transportador a quem seja confiada a execução material do transporte, salvo se outro limite for convencionado pelas partes.”

De acordo com o disposto no art.º 15.º n.º 1, a R. enquanto empresa transitária responde perante a A., sua cliente não só pelo incumprimento das suas obrigações enquanto tal, mas também pelas obrigações contraídas pelo terceiro com quem outorgou o contrato de transporte, sem prejuízo do direito de regresso sobre ele.

Como refere a este propósito o Acórdão do STJ de 14/01/2014 no proc. 2896/04.TBSTB.L2.S1 in www.dgsi.pt : “Quer dizer que as empresas transitárias respondem perante os clientes que consigo contratam, como se fossem elas próprias as transportadoras que tivessem incorrido em incumprimento, empresas estas por si contratadas para efectuarem o transporte, sem prejuízo do direito de regresso que poderão accionar.”

A responsabilidade do transportador, como se viu, deve ser aferida à luz da Convenção CMR e é condição para a responsabilidade do transitário, atento o disposto no art.º 15.º n.º 1 do diploma referido. Neste sentido pronuncia-se também o Acórdão do STJ de 09/07/2014 no proc. 7347/04.5TBMTS.P2.S1 in www.dgsi.pt : “Como o Supremo Tribunal de Justiça repetidamente tem observado, e resulta da forma como o citado artigo 15º faz recair sobre o agente transitário a garantia do pagamento da indemnização que, a final, poderá recair sobre o encarregado de executar o transporte, por via do direito de regresso, há que determinar a responsabilidade deste último para se saber qual a medida da responsabilidade do primeiro. Cumpre assim aplicar as regras do contrato de transporte (neste sentido, cfr. por exemplo os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Maio de 2003, proc. nº 03B4302, ou de 18 de Dezembro de 2008, proc. nº 08B3832, ambos disponíveis em www.dgsi.pt ou António Menezes Cordeiro, Introdução ao Direito dos Transportes, ROA, vol. I, Janeiro 2008, em http://www.oa.pt .”

A Convenção CMR destinando-se à regulação do contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada não se aplica diretamente ao transitário, mas a ela importa recorrer por remissão, quando este tenha contratado o transporte em nome do expedidor, por força do art.º 15.º do Decreto Lei 255/99 que o responsabiliza quando os danos do expedidor resultam do transporte da mercadoria.

Na situação em presença, estando em causa a responsabilidade da R. enquanto empresa transitária responsável perante a A., nos mesmos termos em que o seria se tivesse sido ela a transportadora, forçosamente caímos no âmbito da aplicação da Convenção CMR.

A responsabilidade da transportadora pelos danos causados à A. pelo facto de não ter recebido o preço da venda da mercadoria que foi rejeitada no destino por não estar em condições é questão que não constitui objeto do presente recurso e que por isso não importa avaliar e se tem como adquirida, tendo a sentença recorrida decidido nos seguintes termos que se reproduzem:
“O transportador obriga-se a entregar a mercadoria no local de destino, na mesma quantidade e estado em que a recebeu, bastando ao interessado, seja expedidor ou destinatário, alegar e provar que a mercadoria foi entregue ao primeiro e que este a não entregou no destino ou que a entregou danificada. A regra é a de que o transportador é responsável pela perda total ou parcial, ou pela avaria que se produzir entre o momento do carregamento da mercadoria e o da entrega (artigo 17º, n.º 1 da CMR). Só fica desobrigado dessa responsabilidade se a perda teve por causa uma falta do interessado, uma ordem deste que não resulte de falta sua, um vício próprio da mercadora ou circunstâncias que não podia evitar e a cujas consequências não podia obviar, cabendo-lhe a prova desses factos e de outros susceptíveis de o isentar de responsabilidade (artigos 17º n.º 2 e 18º n.º 1 da CMR). No caso o transporte de mercadorias em causa foi defeituoso, houve uma avaria de frio nos veículos que transportaram a mercadoria que chegou ao destino em más condições (verificando-se a existência de batatas podres e a perda total da mercadoria), sem possibilidade de revenda para consumo humano, e não foram alegadas (e, consequentemente, não foram demonstradas) circunstâncias que isentassem o transportador de responsabilidade (artigos 762º, n.º 1, e 799º, n.º 1 do Código Civil e 17º da CMR). Como se deixou expresso na qualidade de transitária a Ré responde pelo incumprimento das obrigações contraídas pelo transportador que contratou, por força do disposto no artigo 15º do DL. n.º 255/99, de 07.07, pela perda da mercadoria durante a execução do transporte, sendo-lhe aplicável (ainda que indirectamente) o disposto no artigo 17º, n.º 1 da CMR). Flui do exposto que a Ré é responsável pelo incumprimento das obrigações contraídas pela transportadora que contratou – Goldentrans, S.A. - respondendo pela perda da mercadoria durante a execução do transporte (artigo 17º, n.º 1 da CMR). Embora o contrato de transporte (celebrado entre a Ré e a Transportadora Goldentrans, S.A.) se deva qualificar como de prestação de serviços, o serviço que interessa ao contratante não é o transporte por si só, mas a colocação da pessoa ou dos bens íntegros na data e no local convencionado, tratando-se a obrigação assumida de uma obrigação de resultado. Nos termos prescritos pelo artigo 17º, n.º 1 da CMR basta a comprovação da não entrega na data aprazada, ou da perda da mercadoria, para que se possa afirmar o incumprimento da obrigação assumida pelo transportador. Resulta do conspecto factual apurado que houve uma avaria de frio nos veículos que transportaram a mercadoria e em ambas as situações esta chegou ao destino, nos dias 01.07.2015 (mercadoria destinada à empresa HZPC Holland B.V.) e 03.07.2015 (mercadoria destinada à empresa Theodor Stadtmann GmbH & Co. KG), em más condições (verificando-se a existência de batatas podres e a perda total da mercadoria), sem possibilidade de revenda para consumo humano. A Autora não recebeu o montante global de € 22.748,40 pelos referidos carregamentos de batatas expedidos para a Alemanha. Pelo que à luz do artigo 17º CMR se pode afirmar a responsabilidade da transportadora contratada pela Ré pela perda das mercadorias em causa, e consequentemente, a responsabilidade da Ré Logimore, Unipessoal Lda. (cfr. artigo 15º, n.º 1 do DL 255/99).”

Uma vez que a responsabilidade da R. enquanto empresa transitária responsável perante a A., se afere nos mesmos termos da responsabilidade da transportadora, conforme previsto na Convenção CMR, tudo se passando como se tivesse sido ela a transportar a mercadoria, sem prejuízo do direito de regresso, já se vê que também o art.º 32.º da Convenção CMR é aplicável ao caso.

Na verdade, não se tratando de uma responsabilidade da R. por incumprimento dos serviços a que se obrigou enquanto transitária, mas antes a sua responsabilização pelo incumprimento do serviço de transporte que contratou, nos termos do art.º 15.º do Decreto Lei 255/99, não é aplicável o prazo de prescrição de 10 meses previsto no art.º 16.º deste diploma, mas o prazo especial previsto no art.º 32.º da Convenção CMR por estar em causa um direito indemnizatório resultante do transporte da mercadoria, que por ser especial afasta o prazo ordinário da prescrição de 20 anos estabelecido no art.º 309.º do C.Civil.

O art.º 32.º da Convenção CMR tem o seguinte teor:
1.- As acções que podem ser originadas pelos transportes sujeitos à presente Convenção prescrevem no prazo de um ano. No entanto a prescrição é de três anos no caso de dolo, ou de falta que a lei da jurisdição a que se recorreu considere equivalente ao dolo. O prazo de prescrição é contado:
a)- A partir do dia em que a mercadoria foi entregue, no caso de perda parcial, avaria ou demora;
b)- No caso de perda total, a partir do 30º dia após a expiração do prazo convencionado, ou, se não tiver sido convencionado prazo, a partir do 60º dia após a entrega da mercadoria ao cuidado do transportador;
c)- Em todos os outros casos, a partir do termo de um prazo de três meses, a contar da conclusão do contrato de transporte.
O dia indicado acima como ponto de partida da prescrição não é compreendido no prazo.
2.-Uma reclamação escrita suspende a prescrição até ao dia em que o transportador rejeitar a reclamação por escrito e restituir os documentos que a esta se juntaram. No caso de aceitação parcial da reclamação, a prescrição só retoma o seu curso para a parte da reclamação que continuar litigiosa. A prova da recepção da reclamação ou da resposta e restituição dos documentos compete à parte que invoca esse facto. As reclamações ulteriores com a mesma finalidade não suspendem a prescrição.
3.- Salvas as disposições do parágrafo 2 acima, a suspensão da prescrição regula-se pela lei da jurisdição a que se recorreu. O mesmo acontece quanto à interrupção da prescrição.
4.- A acção que prescreveu não pode mais ser exercida, mesmo sob a forma de reconversão ou excepção.”

Regista-se aliás que o corpo do n.º 1 deste artigo, desde logo não delimita a sua aplicação de forma subjetiva, designadamente com a menção do transportador, mas antes de forma objetiva, ao estabelecer que prescrevem no prazo de um ano as ações que podem ser originadas pelos transportes sujeitos à convenção, como é de forma patente a presente ação.

Crê-se aliás que é pacífico considerar aplicável o art.º 32.º da Convenção CMR ao transitário, quando este responde perante o expedidor pelo incumprimento das obrigações do transportador que contratou. Neste sentido pronuncia-se o Acórdão do STJ de 30/04/2019 no proc. 613/13.0TVPRT.P1.S1 in www.dgsi.pt , onde se refere: “Apenas se acrescenta que, como adiante se explicitará, a responsabilidade do transitário se mede pela do transportador (artigo 15º do Decreto-Lei nº 255/99), razão pela qual se citou o nº 1 do artigo 32º da CMR, estando a tratar-se da responsabilidade da empresa transitária.(…) o transportador responde pelos actos e omissões dos terceiros “a cujos serviços recorre para a execução do transporte, quando esses agentes ou essas pessoas actuam no exercício das suas funções” (artigo 3º da CMR e 800º do Código Civil). Neste âmbito, é objectiva a responsabilidade do transportador.”

O prazo de prescrição a considerar é assim o prazo de um ano previsto no art.º 32.º n.º 1 da Convenção CMR, sendo apenas de três anos no caso de dolo, ou de falta que a lei da jurisdição a que se recorreu considere equivalente a dolo.

E não se diga, conforme chega a A. a referir, que a ser assim teria de considerar-se alargado para três anos o prazo da prescrição por ser caso de dolo. É que o dolo aqui contemplado reporta-se ao dolo do transportador no cumprimento das obrigações que para si emergem do contrato de transporte, não sendo suscetível de assumir relevância para este efeito, o comportamento da R. enquanto transitária já depois da verificação do sinistro, no âmbito dos procedimentos e conduta adotada para com a A. na tentativa de resolução da questão com a transportadora ou com a Seguradora desta.

De qualquer forma, os factos provados não permitem concluir por uma qualquer conduta dolosa da R., conforme bem refere a sentença recorrida.

Resta concluir que ao direito da A. é aplicável o prazo de prescrição de um ano, previsto na 1ª parte do n.º 1 do art.º 32.º da Convenção CMR, por força do art.º 15.º do Decreto Lei 255/99, prazo que deve ser contado a partir do 60.º dia após a entrega da mercadoria ao cuidado do transportador, por se tratar de um caso de perda total da mesma, não se apurando ter sido convencionado qualquer prazo, e de acordo com o estabelecido na al. b) daquele art.º 32.º n.º 1.

Os factos revelam que foram realizados dois transportes, tendo a mercadoria dirigida à empresa HZPC Holland B.V. chegado ao destino no dia 01/07/2015 e a mercadoria dirigida à empresa Theodor Stadtmann GmbH & Co. KG chegado ao seu destino a 03/07/2015.

Contabilizando os 60 dias posteriores a cada uma dessas datas em que a mercadoria chegou ao destino para dar início à contagem do prazo da prescrição, tendo presente que não é compreendido no prazo o dia indicado como ponto de partida para a contagem da prescrição temos, com referência ao primeiro transporte mencionado que o prazo deve começar a ser contado a partir de 31/08/2015 e quanto ao segundo transporte mencionado, dois dias depois, a partir de 02/09/2015.

Não foi invocada qualquer causa que pudesse levar à suspensão do prazo da prescrição, que pudesse ser integrado na previsão do art.º 32.º n.º 2 da CMR.

Assim sendo, o prazo de prescrição do direito indemnizatório da A. verifica-se respetivamente e com referência aos danos sofridos em cada um dos transportes, a 31/08/2016 e a 02/09/2016 decorrido o prazo de um ano sobre aquelas datas.

Resta apenas apurar se pode considerar-se que tal prazo foi interrompido, como pretende a Recorrente.
- da interrupção do prazo da prescrição com o reconhecimento pela R. do direito indemnizatório da A.
Alega a Recorrente que a R. reconheceu o seu direito indemnizatório e a sua responsabilidade no email que lhe enviou a 07/03/2017 onde lhe propõe uma compensação pelo dano causado, o que releva para efeitos de interrupção do prazo da prescrição, nos termos do art.º 325.º n.º 1 do C.Civil.

A sentença proferida entendeu que a conduta da R. não traduz o reconhecimento do direito da A. capaz de determinar a interrupção da prescrição e que a compensação proposta foi além do mais apresentada já depois de ter decorrido o prazo da prescrição.

A razão de ser da prescrição pode ser encontrada nos princípios de certeza e segurança jurídica que norteiam o nosso ordenamento jurídico. Tal como nos diz o Acórdão do STJ de 15/02/2017 no proc. 540/12.9TVLSB.L1.S1 in www.dgsi.pt : “A prescrição, tal como a caducidade e o não uso, exprimem a relevância do tempo (do seu decurso sobre as relações jurídicas), visando a certeza e a segurança do tráfego jurídico, tendo como fundamento a consideração de que não merece a protecção do ordenamento jurídico quem descura o exercício dos direitos que lhes assistem, porque a paz social não se compadece com a inércia, para lá de limites temporais impostos pelo legislador.”

Na avaliação da situação em presença, e por força do disposto na parte final do n.º 3 do art.º 32.º da CMR, importa ter em conta o regime da interrupção da prescrição previsto nos art.º 323.º ss. do Código Civil.

Como nos diz Luís A. Carvalho Fernandes, in Teoria Geral do Direito Civil, Vol. II, pág. 560: “As causas interruptivas da prescrição podem ser de duas modalidades, consoante resultem de acto do credor ou de acto do devedor.” E acrescenta a pág. 563: “A interrupção por acto do devedor verifica-se sempre que este reconheça, perante o credor, o direito que a este assiste (art.º 325.º). Esse reconhecimento pode ser expresso ou tácito (…). Importa, porém, salientar que a lei é aqui mais exigente no que respeita à natureza dos factos concludentes; com efeito, vê-se do n.º 2 do art.º 325.º que só há reconhecimento tácito «quando resulte de factos que inequivocamente o exprimam». A razão de ser deste agravamento em relação ao regime geral da declaração tácita reside, ainda aqui, numa necessidade de certeza, bem compreensível em matéria de tão marcada importância no regime do direito subjectivo.”

No caso, a A. vem invocar a interrupção da prescrição por ato do devedor que, no seu entender representou um reconhecimento do direito indemnizatório que aqui reclama, por via do email que a R. lhe enviou em 7 de março de 2017, que corresponde ao doc. 10 junto com a petição inicial e cujo teor é reproduzido no ponto 34 dos factos provados.

É o art.º 325.º do C.Civil que com a epígrafe “reconhecimento” se refere à interrupção da prescrição por ato do devedor, estabelecendo:
1.-A prescrição é ainda interrompida pelo reconhecimento do direito, efetuado perante o respetivo titular por aquele contra quem o direito pode ser exercido.”
2.-O reconhecimento tácito só é relevante quando resulte de factos que inequivocamente o exprimam.”

Independentemente da questão de saber se o email enviado pela R. à A. pode ser visto como um reconhecimento do direito da A. para efeitos de interromper o prazo da prescrição, o que a sentença recorrida considerou negativamente, a verdade é que essa avaliação é neste momento totalmente inútil, na medida em que na data em que tal documento foi emitido pela R., a prescrição do direito da A. já havia ocorrido, pelo que já não havia qualquer prazo em curso que pudesse ser interrompido com tal ato, como aliás a sentença sob recurso também refere.

Ainda que a prescrição tenha de ser invocada por aquele que dela se quer aproveitar, como dispõe o art.º 303.º do C.Civil, é preciso não esquecer, tal como nos ensina Luís A. Carvalho Fernandes, in ob. cit. pág. 564 que: “(…) a prescrição opera «ipso jure» ou «ipso facto». Significa isto que decorrido o prazo prescricional, o seu efeito se produz, sem necessidade de qualquer acto do devedor, por exemplo, da comunicação ao credor de que ocorreu a prescrição.

A interrupção da prescrição pressupõe que o prazo prescricional ainda esteja a correr. A partir do momento que já ocorreu a prescrição, não pode haver uma interrupção da mesma por ato posterior, seja do credor seja do devedor.

Ora, no caso, como já se viu, o direito da A. emergente de cada um dos transportes realizados prescreveu respetivamente a 31/08/2016 e a 02/09/2016, pelo que qualquer comportamento da R. posterior a essa data não é suscetível de interromper um prazo que já decorreu. Concretamente, o email por ela enviado à A. a 7 de março de 2017 nunca poderia ter a virtualidade de interromper a prescrição do seu direito, como a mesma defende.

Impõe-se por isso a confirmação da sentença recorrida que julgou procedente a exceção da prescrição invocada pela R.

V.Decisão:

Em face do exposto, julga-se o presente recurso interposto pela A. totalmente improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique.

*


Lisboa, 1 de julho de 2021



Inês Moura (relatora)
Laurinda Gemas (1ª adjunta)
Arlindo Crua (2º adjunto)

(assinado eletronicamente)