Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
242/13.9GCTVD.L1-5
Relator: LUÍS GOMINHO
Descritores: SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/05/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: - Tendo o arguido sofrido uma primeira condenação em prisão há já cerca de 15 anos, vindo depois a sofrer outras, por esta ou distintas infracções, poder-se-á concluir que uma pena de natureza pecuniária deixou de traduzir uma forma adequada e suficiente para a punição do crime de condução de veículo sem habilitação legal em que foi novamente sancionado.

- Por outro lado, tendo-o sido já em penas de 16 e 18 meses de prisão, e ainda que aparente uma regular inserção familiar e laboral, nada mais concorrendo no campo atenuativo, não se mostra excessiva a pena de 20 meses de prisão que lhe foi aplicada.

- Atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, existem dúvidas fundadas em como a simples censura do facto e a ameaça da prisão poderão realizar, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição (o arguido já beneficiou de várias suspensões, com condições diversas, mormente a frequência de um curso “sobre comportamento criminal e estratégias de prevenção da reincidência.

- Havendo dúvidas sobre a capacidade do arguido para aproveitar a oportunidade ressocializadora que lhe tem sido oferecida, deve resolver-se negativamente a questão do prognóstico, devendo ser negada a aplicação da pena substitutiva de suspensão de execução da pena.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção Criminal (5.ª) da Relação de Lisboa:

                I – Relatório:

I – 1.) No Tribunal Judicial de Torres Vedras, foi o arguido J, com os demais sinais, submetido a julgamento em processo sumário, mediante a imputação, por parte do Ministério Público, da prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3.º, n.ºs 1e 2 do DL n.º 2/98, de 03/01, com referência aos art.ºs 121.º, n.º1, e 122.º, n.º1, do DL n.º 114/94, de 03/05, na redacção que lhes foi dada pelo DL n.º 2/08, de 03/01.

Proferida a respectiva sentença, veio aquele a ser condenado pela referida infracção na pena de 20 meses de prisão.

I - 2.) Razão pela qual recorreu o arguido supra-mencionado para esta Relação, deste modo sintetizando os motivos da sua divergência:

1.ª - O ora recorrente impugna a douta sentença do tribunal a quo decretou a sua prisão efectiva.

2.ª - Das motivações do presente recurso alegou, ser este limitado à matéria de direito, art. 412.º, n.º 2, CPP.

3.ª - Desde logo, o recorrente invoca como normas violadas os art. 40.°, 50.°, n.º 1, 70.°, 71.° do CP

4.ª - O tribunal a quo não teve em consideração a Jurisprudência constante do STJ no que tange à aplicação da suspensão de execução das penas de prisão seguindo-se a preferência do Legislador e os fins das penas ou se opta pelas penas não privativas da liberdade, decisão mais favorável ao arguido do instituto da suspensão de execução da pena consignado no art. 50° do CP.
Sentença recorrida e na qual o arguido J foi condenado em pena de vinte meses de prisão, efectiva, ser revogada, suspendendo-se a sua execução nos termos do art. 50.º do CP.

I - 3.) Respondendo ao recurso interposto a Digna magistrada do Ministério Público junto do Tribunal de Torres Vedras teve o ensejo de evidenciar as razões pelas quais, no seu entendimento, o recurso deve ser julgado improcedente.

II - Subidos os autos a esta Relação, a Exm.ª Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer sustentando essa mesma improcedência.

No cumprimento do preceituado no art. 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, nada mais foi acrescentado.

Seguiram-se os vistos legais e teve lugar a conferência.
*
Cumpre pois apreciar a decidir:

III - 1.) Como se tem por Doutrinária e Jurisprudencialmente adquirido, são as conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respectiva motivação o que num recurso define e delimita o respectivo objecto.

Nesta conformidade, afiguram-se-nos serem as seguintes, as questões que nos são colocadas para exame por parte do arguido Jaime Policarpo:

- Discordância sobre a medida da pena que lhe foi aplicada;

- Não suspensão da execução da prisão determinada.


II - 2.) Como temos por habitual, vamos recordar primeiro a matéria de facto que se mostra definida em 1.ª Instância:

Factos provados:
a) No dia 1 de Maio de 2013, pelas 15 horas e 23 minutos, na Estrada Nacional 8-3, Abrunheira, Ramalhal, em Torres Vedras, o arguido conduzia o veículo automóvel, ligeiro de mercadorias, com a matrícula … HM, sem que para tal estivesse habilitado com carta de condução ou qualquer outro documento que legalmente o habilitasse a conduzir aquele veículo na via pública.
b) O arguido conhecia as características do veículo e, da via por onde o conduzia, bem sabendo que não era titular de carta de condução ou de qualquer outro documento que o habilitasse a conduzir o mesmo.
c) Não obstante, quis conduzir aquele veículo nas referidas circunstâncias.
d) O arguido agiu livre, deliberada e voluntariamente, bem sabendo que tal conduta era proibida e punida pela lei penal.

Apurou-se, ainda, que:
e) O arguido foi condenado em 08/09/94, pela 1.ª secção do Tribunal Judicial de Torres Vedras, pela prática em 11/10/93 de um crime de condução ilegal, previsto e punido pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.° 123/90, de 14/04, na pena de 13.500$00 de multa e, em alternativa, 30 dias de prisão subsidiária.
e1) O arguido foi condenado em 12/06/98, pelo 2.º juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras, pela prática em 12/06/98, de um crime de condução sem habilitação, previsto e punido pelo artigo 3.° n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 03/01, na pena de 75 dias de multa à razão diária de 400500, valor global de 30.000500 ou, subsidiariamente em 50 dias de prisão.
f) O arguido foi condenado em 30/08/00, pelo 3.° juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras, pela prática em 28/08/00 de um crime de condução ilegal, previsto e punido pelos artigos 3.° n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98 de 03/01, 121.º, n.º 1, 122.° e 123.º do Código da Estrada, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, sendo que por decisão datada de 11/03/03, foi declarada extinta a pena de prisão.
g) O arguido foi condenado em 29/11/01, pelo Tribunal Judicial da Lourinhã, pela prática em 27/08/99 de dois crimes de emissão de cheque sem provisão, previstos e punidos pelo artigo 11.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 454/92 de 28/01, na pena, por cada um dos crimes, de 120 dias de multa à taxa diária de 1000500, sendo que por efeito de cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 180 dias de multa à taxa diária de 1.000500, sendo que em 11/12/02, o arguido procedeu ao pagamento da multa.
h) O arguido foi condenado em 25/11/02, pelo 1.° juízo do Tribunal Judicial da Comarca do Bombarral, pela prática em 12/10/01 de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.° do Decreto-Lei n.º 2/98 de 03/01 e, em 15/10/02 de um crime de desobediência, previsto e punido pelo artigo 348.° do Código Penal, na pena de única, por efeito de cúmulo jurídico, de 13 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 4 anos.
i) O arguido foi condenado em 13/10/03, pelo 2.° juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras, pela prática em 20/04/02 de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.°, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98 de 03/01 e, de um crime de desobediência, previsto e punido pelo artigo 348.° do Código Penal, na pena de 9 meses de prisão pelo crime de condução sem habilitação legal e, na pena de 5 meses de prisão, pela prática de crime de desobediência, sendo que por efeito de cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 12 meses de prisão e, por decisão datada de 28/04/05 foi declarada a perda de autonomia da pena por a mesma ter sido englobada no processo n.° 42/02.1GCALQ do 1.° juízo do Tribunal Judicial de Alenquer.
j) O arguido foi condenado em 27/01/04, pelo 1.° juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras, pela prática em 19/01/04, de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 2/98, de 03/01, na pena de 16 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 4 anos, sujeita às seguintes condições:
- Frequência de um curso sobre condução segura dinamizado pela Prevenção Rodoviária, suportando os respectivos custos, em data e local a indicar ao arguido pelo I. R. S.,
- Frequência de um curso sobre comportamento criminal e estratégias de prevenção de reincidência, dinamizado pelo I. R. S., em data e local a indicar ao arguido por aquele instituto, e
- Realização de entrevistas com técnico de reinserção social, com periodicidade por este definida.
1) O arguido foi condenado em 17/06/04, pela secção única do Tribunal Judicial da Comarca de Grândola, pela prática em 22/12/03 de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.°, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98 de 03/01, com referência aos artigos 106.°, 121.° n.º 1 e 122.º, n.º 1 do Código da Estrada e, pela prática em 23/12/03 de um crime de desobediência, previsto e punido pelo artigo 348.°, n.º 1, alínea a) do Código Penal, na pena única de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos e 6 meses, com a condição de se inscrever numa escola de condução, frequentar as aula teóricas e apresentar-se a exame teórico para obtenção de carta de condução de veículos automóveis ligeiros, devendo fazer prova nos autos desse facto até ao final do período de suspensão.
m) O arguido foi condenado em 10/01/05, pelo 1.° juízo do Tribunal Judicial de Beja, pela prática em 05/12/03 de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.° do Decreto-Lei n.º 2/98 de 03/01, na pena de 150 dias de multa à taxa diária de € 5, no valor global de € 750, sendo que por decisão datada de 12/03/10 foi declara a prescrição da pena.
n) O arguido foi condenado em 24/06/05, pelo 3.º juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras, pela prática em 11/10/03 de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.° do Decreto-Lei n.º 2/98 de 03/01 e, de um crime de desobediência previsto e punido pelo artigo 348.°, n.º 1, alínea b) do Código Penal com referência ao artigo 387.°, n.º 2 do C. P. P., na pena única de 18 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos e 6 meses, sendo que por decisão datada de 05/06/12 foi declarada extinta, nos termos do artigo 57.° do C. Penal, a pena.
o) O arguido foi condenado em 12/06/03, pelo 1.° juízo do Tribunal Judicial de Alenquer, pela prática em 31/07/01 de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.° do Decreto-Lei n.º 2/98 de 03/01, na pena de 18 períodos de prisão por dias livres, sendo que por efeito de cúmulo jurídico efectuado com o processo referido em i), foi o arguido condenado na pena única de 16 meses de prisão e, por decisão datada de 20/09/05 foi declarada extinta, pelo cumprimento, a pena de prisão.
p) O arguido foi condenado em 24/11/05, pelo 3.° juízo do Tribunal Judicial das Caldas da Rainha, pela prática em 28/06/03 de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.° do Decreto-Lei n.º 2/98, de 03/01 e, de um crime de desobediência previsto e punido pelo artigo 348.° do Código Penal, na pena única de 11 meses de prisão substituída por 340 horas de trabalho a favor da comunidade, nos termos do artigo 58.° do Código Penal, sendo que por decisão datada de 27/10/11 foi declarada a prescrição da pena.
q) O arguido foi condenado em 12/07/06, pela secção única do Tribunal Judicial do Bombarral, pela prática em 11/12/03, de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.°, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 03/01, na pena de 8 meses de prisão e, de um crime de desobediência, previsto e punido pelo artigo 348.°, n.º 1, alínea b) do Código Penal na pena de 4 meses, sendo que por efeito de cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena de 20 meses de prisão, suspensa na sua execução por três anos e, por efeito de cúmulo jurídico com os processos referidos nas alíneas j) e 1), foi o arguido condenado na pena única de na pena única de 20 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, sujeita ao dever do arguido entregar aos Bombeiros Voluntários da área da sua residência a quantia de € 2.000, durante o prazo da suspensão.
r) O arguido foi condenado em 31/07/06, pelo 2.° juízo criminal do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Vila Franca de Xira, pela prática em 03/01/00 de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 205.° n.ºs 1 e 4, alínea a) do Código Penal, na pena de 400 dias de multa, à taxa diária de € 5, no valor global de € 2.000, sendo que por decisão datada de 01/12/10 foi declarada a prescrição da pena.
s) O arguido foi condenado em 12/11/2009, por decisão transitada em 10/05/2013, pelo 3.° juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras, pela prática em 22/12/2006, de um crime de condução de veículos em habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.°, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.° 2/98, de 03/01, na pena de 18 meses de prisão.
t) O processo de desenvolvimento e socialização do arguido é referenciado ao contexto familiar de origem, numeroso e de baixa condição social. Com excepção de um quadro de limitação de recursos materiais, o contexto em causa é percepcionado pelo próprio como afectivo e dissociado de disfuncionalidades.
u) A precariedade económica do meio familiar condicionou a prossecução da escolarização, tendo-a abandonado após completar o primeiro ciclo do ensino básico. A iniciação laboral ocorreu na adolescência, com o arguido a protagonizar um percurso caracterizado pelo exercício continuado de actividade na área da construção civil e agricultura, apenas descontinuado para cumprimento de uma pena de prisão.
v) Autonomizou-se do agregado de origem aos vinte e um anos de idade, na sequência de casamento. A relação conjugal, da qual resultou o nascimento de uma filha, denota algumas dificuldades no passado recente, relacionadas com os problemas legais do arguido.
x) O arguido apresenta um percurso criminal persistente na área da criminalidade rodoviária. Regista diversas condenações, a maioria por crimes de condução sem habilitação legal, em penas de execução na comunidade e também privativas de liberdade. Regista situações de incumprimento na execução de algumas das penas aplicadas.
z) O arguido refere manter a relação conjugal e contacto com os elementos do agregado familiar constituído pela cônjuge e a filha, desempregadas. Contudo, menciona frequentes ausências do domicílio, atribuídas à aceitação de ofertas laborais em locais distanciados.
aa) Descreve uma inserção precária e contingente no mercado de trabalho. Aceita ofertas de trabalho de curta duração, na área agrícola e de corte de madeiras, que concilia com a exploração agrícola por conta própria.
ab) A situação económica está condicionada pela variabilidade dos rendimentos do trabalho do arguido (quantificados pelo próprio entre 400 a 600 euros mensais). As principais despesas mencionadas pelo arguido relacionam-se com o alojamento (uma renda de aproximadamente 300 euros mensais), consumos domésticos e manutenção dos elementos do agregado.
ac) O arguido não apresenta ligações a actividades estruturadas ou a instituições comunitárias, apresentando uma imagem social algo denegrida no meio sócio-residencial por condutas consideradas desadequadas no âmbito da sua actividade profissional.
ad) Refere ter aprendido a conduzir veículos automóveis na adolescência, tendo tentado obter por diversas vezes habilitação legal para condução sem sucesso, assumindo relevância os défices de literacia que o arguido apresenta no tocante à compreensão de termos técnicos. Neste quadro, revela propensão para a assumpção de riscos no que se refere à condução rodoviária, sobrestimando as competências de condução que afirma ter adquirido através da experiência O arguido manifesta preocupação relativamente às consequências pessoais, decorrentes da situação jurídica em que se encontra envolvido. Não foram referidos impactos significativos desta situação nos planos laboral e social.
ae) O arguido tem clara consciência da ilicitude da conduta delituosa pela qual está acusado. Contudo, manifesta fraca capacidade de racionalização crítica em relação ao seu potencial risco e, à dimensão negligente que ela comporta, recorrendo a argumentos de necessidade para justificar a sua recorrência.
af) Manifesta adesão a uma obrigação de inscrição e, frequência de aulas de condução no quadro de uma medida penal de execução na comunidade.
ah) O contacto recorrente com o sistema da justiça, iniciado na idade adulta, por práticas delituosas ligadas à condução rodoviária, surge como o principal factor desestabilizador do percurso de vida do arguido, a que acresce características de funcionamento indiciadoras de dificuldade na adesão a planos estruturados e, na adequação a normas e regras.
ai) A propensão à assumpção de risco de condução rodoviária sem habilitação legal,
conjugada com a fraca capacidade de racionalização crítica no tocante aos factos que lhe são
atribuídos, configura-se como o principal factor de risco de reincidência a destacar.


Factos não provados:

Consignou-se inexistirem.

III - 3.1.) Posto que a questão do eventual excesso patenteado pela pena que lhe foi aplicada esteja mais esboçada do que verdadeiramente explicitada na motivação e conclusões oferecidas, ainda assim, não será por essa razão que nos escusaremos a sobre ela nos pronunciar.

Note-se, a este propósito, que se chega mesmo a afirmar a fls. 112, que aquele excesso decorre “não pela sua determinação, mas por ser injustamente efectiva”.

Ora não se questionando a prática, por parte do Recorrente, do imputado e verificado crime de condução de veículo sem habilitação legal, tendo o mesmo se efectivado em viatura automóvel, significa isso então, de acordo com o preceituado no art. 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03/01, a possibilidade de aplicação abstracta consequente de uma pena de prisão até 2 anos ou de multa até 240 dias.

Em face do quadro sancionatório acima exposto, pontuado desde logo no já distante ano de 2000 por uma primeira condenação em prisão, que depois se repetiu em diversas outras circunstâncias, tem-se por manifesto que uma pena de natureza pecuniária há muito deixou de traduzir uma forma adequada e suficiente para a punição do comportamento delitivo que temos em presença (assim art. 70.º do Cód. Penal).

À mesma conclusão aportou a sentença recorrida.

Já no domínio dos factores que presidiram à sua determinação concreta, deixou-se referido:

“Considerando o disposto no artigo 71.º, n.º 2 do Código Penal, cumpre referir que o grau de ilicitude é elevado.

Quanto ao dolo do arguido, o mesmo é intenso, dado que é dolo directo.

No que se refere às necessidades de prevenção geral, verifica-se que as mesmas são elevadas, face à acentuada perigosidade e a significativa frequência de ilícitos desta natureza, bem como as elevadas taxas de sinistralidade rodoviária do nosso país.

Quanto às necessidades de prevenção especial, as mesmas também são igualmente elevadas, já que o arguido possui treze antecedentes criminais que se reconduzem à prática de crime de idêntica natureza, o que revela uma tendência para a reiteração de condutas contrárias à segurança da circulação rodoviária, bem como uma manifesta dificuldade em se conformar com as regras que enformam a referida circulação.

Acresce que haverá que não olvidar que o arguido tem clara consciência da ilicitude da conduta delituosa pela qual está acusado. Contudo, manifesta fraca capacidade de racionalização crítica em relação ao seu potencial risco e, à dimensão negligente que ela comporta, recorrendo a argumentos de necessidade para justificar a sua recorrência.

Milita a favor do arguido o facto de se encontrar económica, profissional e familiarmente inserido.”

No fundo, aquilo que de essencial se indica como eventualmente desconsiderado – “o percurso familiar e social do arguido recorrente desde a data dos factos até ao presente” – na verdade foi-o.

Por outro lado, não se fale apenas de reintegração do agente na sociedade, pois que, de harmonia com o preceituado no art. 40.º do Cód. Penal, tal finalidade não é inferior à da protecção dos próprios bens jurídicos.

Sendo que ao arguido, escusado será enfatizá-lo, já foram concedidas inúmeras oportunidades de emenda cívica, sem que, até ao momento, tenha evidenciado uma verdadeira vontade de mudar, pelo menos, no que a este crime concreto concerne.

Violação do grau da culpa, também não a detectamos. Esta não poderá deixar de ser acentuada, exprimindo o grau de censura que o seu comportamento efectivamente assume.

Em função das sucessivas advertências anteriormente efectuadas pela ordem jurídica, não só aquele tinha uma particular consciência do carácter anti-jurídico da sua conduta, como um especial dever de não o praticar, em função do conhecimento assim adquirido sobre a possível reacção penal que daí poderia advir, em face de nova recidiva.

Mas ainda assim, sem que se evidencie qualquer razão plausível para o ter voltado a fazer, conduziu.

Logo, o que os factos inculcam, é a necessidade do reforço das necessidades de prevenção especial, por via da pena.

Ora se atentarmos nas condenações por si já sofridas, poderemos surpreender, por exemplo uma, de 2004, em 16 meses de pisão, uma outra, em 2009, de 18 meses de prisão, … sem que os respectivos efeitos de admonição se evidenciem.

Logo, não é o acrescento de mais dois meses que aqui introduz algum excesso.

III – 3.2.) No que concerne à impetrada suspensão da execução da pena, trata-se de matéria que, naturalmente, a decisão recorrida não deixou de apreciar, ainda que para a negar.

Com efeito, deixou expendido a este propósito, o seguinte:

Nos termos do artigo 50.º, n.º 1, do C. P., na redacção introduzida pela Lei n.º 59/2007 de 04/09, deverá o tribunal suspender a pena de prisão em medida não superior a cinco anos, desde que conclua que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
Ora, do que já anteriormente se deixou referido, afigura-se a este Tribunal que a ameaça de execução da pena de prisão não realiza de forma adequada e suficiente os objectivos prosseguidos pela punição da conduta, até porque, há que relembrar que o arguido já foi condenado em penas de prisão efectivas pela prática de crime de idêntica natureza, bem como em penas de prisão suspensas na sua execução, o que significa que o juízo de prognose favorável que foi efectuado no âmbito das condenações em penas de prisão suspensas na sua execução, se gorou em toda a sua linha, na medida em que não constituíram medidas suficientemente dissuasoras para o arguido não voltar a delinquir, levando inclusive a condenações a penas de prisão efectivas.
De outra vertente apreciada que haverá que não olvidar que o arguido tem clara consciência da ilicitude da conduta delituosa pela qual está acusado. Contudo, manifesta fraca capacidade de racionalização crítica em relação ao seu potencial risco e, à dimensão negligente que ela comporta, recorrendo a argumentos de necessidade para justificar a sua recorrência. E, esta realidade é, por si só, suficiente para se pugnar pela absoluta inviabilidade de se efectuar um juízo de prognose favorável quanto a uma eventual suspensão da pena de prisão.
Em face do exposto, não se suspende a execução da pena privativa da liberdade ora aplicada.”

Ora não deixando-se de convir nas finalidades pedagógicas e reeducadoras que subjazem à aplicação desta pena de substituição, a sua concessão, como é sabido, não é automática.

Depende, previamente, da solução positiva do prognóstico acima indicado, cujo vector essencial se traduz na capacidade do aviso formulado ser bastante para afastar o arguido da criminalidade.

No caso concreto, com condições diversas, em que não faltou sequer a imposição da frequência de um curso “sobre comportamento criminal e estratégias de prevenção da reincidência”, os resultados das anteriores suspensões não foram susceptíveis de conduzir àquela finalidade.

Pelo que, não se pode pois firmar tal prognóstico.

Ora havendo dúvidas, que no caso são mais do que fundadas, é o próprio Jescheck quem preconiza (Tratado de Derecho Penal – Parte General – Comares Editorial, Granada 1993, pág.ª 760/1, tradução de José Luís Samaniego), que aquele deve resolver-se negativamente “(O tribunal deve dispor-se a correr um risco aceitável, porém se houver sérias dúvidas sobre a capacidade do réu para aproveitar a oportunidade ressocializadora que se lhe oferece, deve resolver-se negativamente a questão do prognóstico”).

Por outro lado, não vemos também condições processuais ou substanciais para uma substituição da prisão cominada pelas modalidades previstas nos art.ºs 44.º, 45.º e 46.º do Cód. Penal, que aliás, nem sequer foram solicitadas.

Nesta conformidade

IV – Decisão:


Nos termos e com os fundamentos indicados, acorda-se em julgar improcedente o recurso interposto pelo arguido J, deste modo se confirmando a sentença recorrida.

Em razão do seu decaimento, e sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que possa beneficiar, pagará o mesmo 3 (três) UCs de taxa de justiça, ex vi dos art.ºs 513.º e 514.º do Cód. Proc. Penal e respectivo Regulamento das Custas Processuais.

Elaborado em computador. Revisto pelo Relator o 1.º signatário.

Luís Gominho

José Adriano