Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3817/16.0T8BRR.L1-4
Relator: ALBERTINA PEREIRA
Descritores: EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
PRESUNÇÃO DE ACEITAÇÃO DO DESPEDIMENTO
COMPENSAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/11/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: No processo especial por extinção do posto de trabalho para aquilatar da presunção de aceitação do despedimento por parte do trabalhador tem este de ter recebido ou de ter sido posta à sua disposição a totalidade da compensação prevista na lei.

(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.


1.Relatório:


1.1.AAA, instaurou a presente acção especial de impugnação da regularidade e ilicitude do despedimento, por extinção do posto de trabalho, contra BBB, Ld.ª, ambos com os sinais dos autos.

A ré veio invocar que pela extinção do posto de trabalho do autor foram pagos pela ré todos os créditos salariais a que o mesmo tinha direito, bem como a indemnização nos termos do artigo 366.º do Código do Trabalho. Tendo o autor aceite o pagamento e não tendo ilidido a presunção do n.º 5, do artigo 366.º, do Código do Trabalho, o trabalhador aceitou o despedimento, devendo a ré ser absolvida do pedido. Refere que por diversas vezes foi o autor questionado sobre quando e como seria o pagamento dos valores a receber, devidos pelo fim do contrato, tendo agendado tal pagamento para dia 4 de Janeiro de 2017 e descontando de imediato os cheques. Invoca que o autor litiga de má-fé e com manifesto abuso de direito, uma vez que, após ter dado entrada neste douto Tribunal do formulário para declaração da ilicitude ou irregularidade no dia 6 de Dezembro de 2016, agenda com a ré o pagamento dos valores devidos pelo fim do contrato, sendo que na data em que o autor recebeu todos os valores devidos pela cessação do seu contrato de trabalho, bem sabia que havia já intentado a presente acção especial, pelo que deve ser condenado como litigante de má-fé, bem como no pagamento de multa a favor deste douto Tribunal.

O autor, veio invocar ser falso que a ré lhe tenha pago a compensação devida em virtude da extinção do posto de trabalho, impugnando o documento de fls. 51, no sentido pretendido pela ré, de extrair que do mesmo consta o pagamento da compensação, pela cessação por despedimento. Alegou, para o efeito, e em suma, que o valor de 717,97 €, pago pela ré a título de compensação, fica muito aquém da quantia a que o mesmo tem direito, em virtude da cessação do contrato por despedimento, na sequência de extinção de posto de trabalho. Acresce ainda que sempre deixou claro perante o réu que não aceitava o despedimento. Não aceitava a indemnização. E que já havia procedido à impugnação judicial do despedimento. Finaliza no sentido de que o despedimento sempre seria ilícito, porque não foi colocada à sua disposição a compensação a que o mesmo teria direito, pelo que se mostra violado o disposto no requisito no n.º 5 do artigo 368.º do CT, o que determina a ilicitude da cessação do contrato de trabalho, conforme decorre do disposto no artigo 384.º, alínea d), do mesmo diploma legal.

Foi proferido despacho saneador, onde se decidiu do mérito da causa, tendo-se julgado improcedente a acção e julgado lícito o despedimento do autor, bem como improcedente o pedido de condenação como litigante de má-fé do autor, absolvendo-se este do pedido.
 
1.2.Inconformado com a sobredita decisão dela recorre o autor, concluindo as suas alegações de recurso, do seguinte modo:
1. Salvo o devido respeito, que é muito, não se conformando com o Douto Despacho Saneador com a referência 365303913, vem o Recorrente interpor recurso do mesmo, na parte em julgou sic “improcedente, por não provada, a presente acção, com processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, considerando lícito e regular o despedimento do Trabalhador/Autor AAA efectuado pela Entidade Empregadora/Réu BBB, Ld.ª”.
2. O Recorrente não se conforma que o processo contenha os elementos que permita ao Tribunal a quo concluir pela verificação da presunção da aceitação do despedimento pelo trabalhador, com o pagamento da totalidade da compensação, prevista no artigo 366º, n.º 4 do CT, conforme invocado pela Ré.
3. As questões essenciais que se suscitam no presente recurso, é a de saber se (i) atenta a factualidade dada como provada o Tribunal a quo poderia ter julgado lícito o despedimento do Autor, operado por via da presunção contida no artigo 366º, n.º 4 do CTT, se (ii) a quantia paga ao pela Ré no recibo do último vencimento sob o descritivo de “compensação” no montante de 717,97 €, corresponde ao montante efectivamente devido pela extinção do posto de trabalho, face à antiguidade e ao vencimento auferido pelo Autor, se (iii) não beneficiando a Ré da aludida presunção legal, não tinha o Autor que a ilidir, e ainda, se (iv) sendo o pagamento efectuado após a citação da Ré para a acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento ainda tem a virtualidade de operar a presunção do artigo 366º, n.º 4 do CT.
4. Saliente-se desde já, com relevância para o objecto do presente recurso nos autos não se encontram assentes factos que são “essenciais” para a determinação da compensação devida ao Autor em virtude do despedimento.
5. O Tribunal a quo não considerou assente a data de admissão do Autor ao serviço da Ré, nem o montante do vencimento auferido pelo mesmo.
6. Por um lado, a Ré alega que admitiu o Autor ao seu serviço no dia 02/06/2014, com o vencimento mensal de 700,00 €, o que foi impugnado (tendo sido junta prova documental da prestação da actividade em data anterior).
7. O Recorrente, por sua vez, alega que foi admitido ao serviço da Ré, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, no dia 01/09/2011, mediante a retribuição mensal líquida de 1.100,00 € (mil e cem euros), sendo que, a partir de junho de 2015 a Ré passou a pagar ao Autor a retribuição mensal líquida de 1.350,00 € (mil trezentos e cinquenta euros), a qual se manteve até ao despedimento.
8. Estabelece o artigo 366º, n.º 4 do CT que “Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe do empregador a totalidade da compensação prevista neste artigo”, donde de modo a operar a referida presunção o Tribunal a quo teria de determinar qual a compensação devida ao Trabalhador de modo a verificar, e poder concluir, se a totalidade da compensação foi paga pelo empregador.
9. Ora, de modo a determinar qual a compensação devida ao Autor/Recorrente, sempre o Tribunal a quo teria de considerar provada a respectiva data de admissão do Autor ao serviço da Ré e o montante do vencimento auferido, para que pudesse concluir que a quantia paga sob o descritivo de “compensação” era igual ao montante devido em virtude da cessação do vínculo contratual, o que não sucedeu.
10. O Autor jamais aceitou receber a quantia devida em virtude do despedimento, que sempre considerou ilícito em virtude da falta de preenchimento dos pressupostos exigidos para o efeito.
11. Ainda que se considerasse que os requisitos para o despedimento estavam preenchidos, o que não se aceita, e que a compensação seria a prevista no artigo 366º, n.º 1 do CT, considerando que o contrato de trabalho durou 5 anos, 3 meses e 24 dias, sempre o Recorrente teria direito ao montante de 4.395,00 € (quatro mil trezentos e noventa e cinco euros), e, nunca o valor de 717,97 € conforme considerado pela Ré e aceite pelo Tribunal a quo. (Vide Contestação artigos 118º a 130º)
12. Por outro lado, tendo sido admitido em 01/09/2011, seria aplicável a Lei 69/2013, de 30 de agosto, a qual atento o disposto no artigo 5º, n.º 2, determina que a compensação nunca poderia ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades, conforme foi alegado na contestação (vide Artigo 122), o que representava que o Autor teria de receber no mínimo a quantia de 4.050,00 € (1.350,00 € x 3 meses).
13. Efectivamente, o montante de 717,97 € pago a título de alegada “compensação” fica muito aquém da quantia a que o Autor teria direito, em virtude do despedimento por de extinção de posto de trabalho.
14. O Recorrente em Reconvenção, deduziu pedido, referente a diferencial retributivo no salário de dezembro (mês do despedimento), pois auferia o vencimento de 1.350,00 €, sendo que, o montante que lhe foi pago a título da alegada “compensação”, foi imputado a vencimento, sendo que, considerando o recebimento de tal montante, ainda tem a receber da Ré a quantia de 133,03 € a título de retribuição de dezembro. (vide artigos 146 a 149 da Reconvenção).
15. Ademais, tal pagamento foi feito conjuntamente com o vencimento relativo ao mês de dezembro, e sem a identificação do tipo de compensação, sendo que, o mesmo sempre teria de ser imputado a vencimento face à retribuição mensal devida ao Autor pela Ré em montante superior ao efectivamente pago.
16. E, é certo que o Autor não devolveu, efectivamente, o montante de 717,97 €, por entender que constituía pagamento de salário relativo ao mês do despedimento, sendo que, ainda a Ré ficaria em dívida pela quantia de 133,03 € do vencimento de dezembro.
17. O Autor não poderia devolver a quantia recebida a título de “alegada” compensação, na medida em que o montante que lhe estava a ser pago era inferior ao que tem direito a receber referente ao salário de dezembro.
18. As comunicações dirigidas ao Autor no sentido do pagamento, demonstram que a Ré apenas pretendiam pagar o vencimento e o subsídio de Natal.
19. Efetivamente, já após o recebimento da citação para a presente acção, a Ré no dia 23/12/2016, pelas 18:01 dirige ao Autor email com o “Assunto: Subsídio de Natal e Vencimento” e com o conteúdo seguinte “Boa tarde Zé, Tens o vencimento e subsídio de Natal para receber já pedimos o teu NIB, não enviaste, podemos marcar para vires receber, amanhã estou cá pela quinta, não vamos para a terra e para a semana estamos de férias e a empresa está fechada, depois só no dia 01 de Janeiro vê como queres fazer? “ – Vide Doc. n.º 14 com o Articulado Motivador.
20. Não pode deixar de ser revelador de ato de má-fé, o comportamento da Ré, ciente da interposição da acção, chama o Autor para lhe pagar o vencimento e subsídio de natal, e, dissimuladamente, no recibo inclui sob o descritivo de “compensação”, dissociado de qualquer outra indicação que se trata da indemnização pelo despedimento, a quantia de 717,97 € que agora alega ser a compensação pelo despedimento.
21. Ademais, para poder fazer valer-se do pagamento da compensação a Ré teria de fazer verter no recibo o descritivo “compensação pelo despedimento por extinção do posto de trabalho” e não unicamente “compensação”.
22. O termo compensação não é unívoco de modo a que o Autor ao assinar o recibo, extraia a certeza de que está a receber a quantia devida pela antiguidade no posto de trabalho.
23. Donde, não poderá o descritivo “compensação” considerar-se suficiente para poder presumir-se que, por tal se considera paga a compensação prevista no artigo 366º, n.º 1 do CT.
24. Mais, sendo devida ao Autor/Recorrente a compensação no mínimo no montante de 4.050,00 €, não poderia o Tribunal a quo ter considerado que, com o pagamento de compensação pelo montante de 717,97 €, e por essa via, presumir a aceitação do despedimento ao abrigo do disposto no artigo 366º, n.º 4 do CT.
25. Assim, mal andou o Tribunal a quo, quando considerou que o Recorrente ao receber a quantia de 717,97 € (que lhe era devida a título de salário), está a aceitar como lícito o despedimento, sem que, primeiramente determinasse qual a quantia que o Trabalhador teria direito a receber, em função da antiguidade e do montante do salário auferido.
26. Pelo que, o Tribunal a quo teria de ter considerado provados factos que lhe permitisse alcançar concluir qual a compensação devida ao trabalhador pela antiguidade, o que não foi vertido na factualidade assente, pelo que, vedado está concluir que a compensação de 717,97 € é o montante devido pelo despedimento do Recorrente.
27. Não é pelo facto de a Ré verter na comunicação de despedimento que o Trabalhador teria direito a 717,97 €, que o Tribunal terá de considerar regular o pagamento de tal quantia como compensação pela extinção do posto de trabalho.
28. Porém, ainda que assim fosse, o que não se admite, a Ré não pagou a totalidade da compensação referida na comunicação de despedimento.
29. Na comunicação de despedimento foi indicado que o Autor teria direito a receber da Ré a título de valor global pelos créditos exigíveis por efeitos da cessação do contrato de trabalho o montante de 1.923,02 €, sendo que, o cheque para pagamento foi emitido pelo valor de 1.866,44 €. - Vide Doc. junto ao formulário inicial.
30. Ora, por si, a desconformidade entre o montante referido na comunicação de despedimento dirigida ao Autor e o efetivamente pago por via do cheque, afastaria a presunção do pagamento da totalidade da compensação devida, pois na perspetiva da Ré teria de pagar o montante de 1.923,02 €, quando o cheque foi emitido pelo valor de 1.866,44 €.
31. Assim, não se encontrando determinada a compensação devida ao Autor pela antiguidade em virtude do despedimento por extinção do posto de trabalho, não poderia o Tribunal a quo concluir pela verificação da presunção prevista no artigo 366º, n.º 4 do CT, sendo que, também não se poderá dar por verificada o pagamento da totalidade da compensação por desconformidade entre o montante declarado em divida e o pago, pelo que deverá ser revogada a decisão que julgou lícito o despedimento.
32. Por outro lado, o Recorrente está dispensado de ilidir a presunção estabelecida no artigo 366º, n.º 4 do CT.
33. Ora, com já se referiu não resulta da factualidade provada qual o período em que o Autor trabalhou para a Ré nem a respetiva retribuição mensal, apesar de se ter provado que o recibo de vencimento datado de 25/12/2016, foi pago através cheque datado de 15/12/2016, em data não apurada, a quantia de 1.886,44 €, referente a vencimento, subsidio de férias, subsidio de Natal, compensação e férias não gozadas no ano anterior.
34. É certo que a Ré fez incluir no recibo de vencimento sob o descritivo compensação a quantia 717,97 €, e que o recibo foi assinado pelo Autor, todavia, essa quantia fica muito aquém da que lhe devida a título de compensação a que se reporta o artigo 366º, nº 1 do CT.
35. Mas, mesmo que, porventura, se entendesse que a Ré gozaria da presunção de aceitação do despedimento decorrente da circunstância do Autor ter aceite a quantia recebida, não poderemos deixar de considerar que a invocação dessa presunção constituiria exercício abusivo do direito, caindo na alçada do artigo 334º do Cód. Civil.
36. Com efeito, como se viu, nos termos do artigo 366.º do Código do Trabalho, na redação dada pela Lei n.º 23/2012, de 25/06, e do n.º 2 do artigo 5.º desta última, a cessação do contrato de trabalho do Autor por despedimento por extinção do posto de trabalho conferia-lhe direito a uma compensação de montante mínimo não inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, isto é, € 4.050,00 (€ 1.350,00 x 3), sendo certo que, o contrato trabalho teve duração superior a 3 anos pelo que a compensação seria superior, a que devia acrescer ainda o valor dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho.
37. Não obstante, a empregadora apenas colocou à disposição do trabalhador a mísera quantia de 717,97 €, a título de pretensa compensação global apurada sob o pretexto de o contrato ter tido duração inferior ao real e de “fazer de conta” que o vencimento seria inferior ao real.
38. O pagamento dessa quantia diminuta (em face da que era legalmente devida), apresenta-se manifestamente como arbitrária e aleatória, não satisfazendo o requisito legal de validade do despedimento em apreço.
39. Por conseguinte, estabelecendo o n.º 5 do citado preceito que se presume que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe a compensação prevista naquele artigo, só pode concluir-se que, in casu, falha o pressuposto factual de base para que se verifique essa presunção legal, por não ter sido paga a compensação ali prevista.
40. E, assim sendo, não beneficiando a empregadora da aludida presunção legal, não tinha o trabalhador que a ilidir nos termos do mencionado n.º 6.
41. Não tendo sido colocada à disposição do Recorrente a compensação pela antiguidade devida em virtude do despedimento por extinção do posto de trabalho, nada obsta a que o mesmo o impugne judicialmente, pois que está dispensado de ilidir a presunção estabelecida no artigo 366º, n 4 CT, pelo que deverá ser revogada a decisão que declarou lícito o despedimento.
42. Finalmente, consagrando o artigo 366º, nº 4 do CT uma presunção juris tantum, a prova em contrário pode consistir em acto expresso, feito até ao momento do recebimento da compensação, no sentido da não aceitação do despedimento
43. Em nosso entender, no caso vertente, tendo o pagamento da “alegada” compensação ocorrido após a citação da Ré para a ação de impugnação da regularidade do despedimento, não terá o Autor de ilidir a referida presunção, pois a mesma não poderá operar, quando se encontra em curso o processo judicial de impugnação.
44. Está assente que o Recorrente se recusou assinar a comunicação de despedimento datada de 24 de Novembro de 2016, o que não poderia deixar de indiciar que nessa data perante a Ré o Autor terá manifestado a sua recusa em aceitar a licitude do despedimento.
45. Mas, também, os autos documentam suficientemente que, o Recorrente nunca se conformou com o despedimento, tanto assim que, no dia 06 de Dezembro de 2016, apresentou em Tribunal o formulário de oposição ao despedimento, remetido via correio registado no dia 05 de Dezembro 2016.
46. Mais, a Ré foi citada para a acção, por meio de carta registada expedida no dia 14/12/2016, cujo aviso de recepção foi assinado no dia 20 de Dezembro de 2016, isto antes da emissão do recibo que se mostra assinado pelo Recorrente.
47. A apresentação em Tribunal da acção de impugnação da regularidade do despedimento em Tribunal constituiu factor insofismável de que o Recorrente não aceitou o despedimento e que se opõe à sua regularidade.
48. A Citação da Ré para a acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, porque anterior à colocação à disposição do Autor da alegada compensação, e ao levantamento da quantia titulada pelo cheque, deverá ser entendida como um acto expresso de rejeição do despedimento de que o Autor fora alvo, acto esse assumido mais de um mês antes da colocação à sua disposição da quantia e do levantamento.
49. A citação da Ré para a acção extingue para todo o sempre a possibilidade de fazer uso da presunção contida no n.º 4 do 366º do CT, a qual não mais poderá operar.
50. A presunção estabelecida no artigo 366º n.º 4 do CT não poderá operar quando o processo já se encontra em curso e a entidade empregadora foi citada para o mesmo.
51. Repete-se, deve-se ter por ilidida a presunção decorrente do disposto no artigo 366.º, nº 4 do CT, na medida em que a presunção não chegou a consolidar-se.
52. A interposição da acção judicial antes do recebimento constitui acto expresso de oposição à licitude do despedimento.
53. Pelo que, deverá ser revogada a decisão que julgou verificada a presunção de que o trabalhador aceitou o despedimento, e, substituída por outra que ordene o prosseguimento dos autos para apreciação da validade procedimental e substancial do despedimento do Autor.
Assim fazendo a costumada JUSTIÇA

Foram colhidos os vistos legais.
 
2. Objecto do recurso.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, que não tenham sido apreciadas com trânsito em julgado - artigos 635.º, números 3 e 4, 639.º, n.º 1, 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
Sabendo que não devem confundir-se questões com os argumento e razões apresentados pelas partes, a questão que o recorrente coloca à apreciação deste tribunal consiste em saber se não se mostra verificada a presunção de aceitação do despedimento.

3. Fundamentação de Facto.
Encontra-se provada a seguinte matéria de facto
1)-O Autor AAA foi trabalhador do Réu BBB, Ld.ª, tendo exercido funções de Técnico de Qualidade.
2)-Por missiva datada de 7 de Novembro de 2016, e assinada pelo Autor na mesma data, o Réu notificou o Autor da intenção de despedimento por extinção do posto de trabalho nos termos do artigo 367.º e ss. do Código do Trabalho (cfr. documento de fls. 40 a 41, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
3)-O Autor após a notificação referida em 2), remete missiva datada de 9 de Novembro de 2016 ao Réu, com o seguinte teor: “ Assunto: Consulta em caso de despedimento por extinção de posto de trabalho Ex.mos Senhores, Na sequência da notificação da intenção de despedimento por extinção do posto de trabalho, nos termos do artigo 367.º e ss. do Código do Trabalho, e, em cumprimento do disposto no artigo 370.º, n.º 2, informo V. Ex.ªs que solicitei à Autoridade para as Condições do Trabalho, a avaliação da verificação dos requisitos para o despedimento por extinção do posto de trabalho, previstos nas alíneas c) e d) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 368.º do CT. Aguardo a emissão do respectivo Relatório nos termos do artigo 370.º, n.º 3 do CT”. (cfr. documento de fls. 42, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
4)-A Autoridade para as Condições do Trabalho emitiu relatório, datado de 16.11.2016, sobre a verificação dos requisitos previstos nas alíneas C) e D) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 368.º do CT para o despedimento por extinção do posto de trabalho, tendo concluído “não se verificam irregularidades nos requisitos sujeitos à verificação deste organismo” (cfr. documento de fls. 43, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
5)-O Réu emitiu a missiva datada de 24 de Novembro de 2016, dirigida ao Autor P.M.P, com o seguinte teor: “Assunto: Notificação da decisão de despedimento por extinção do posto de trabalho, nos termos do artigo 371.º do Código do Trabalho. A BBB, Ld.ª (…), na qualidade de entidade empregadora, comunica por este meio que, face ao parecer favorável do ACT, bem como à ausência de qualquer resposta ou parecer por parte de V. Ex.ª. irá proceder à extinção do posto de trabalho que ocupa, correspondente à categoria profissional de Técnico de Qualidade e, assim sendo, ao seu despedimento com esse fundamento. A presente comunicação é elaborado respeitando o aviso prévio devido que no presente caso é de 30 dias, face à antiguidade de V. Ex.ª que é aproximadamente de dois anos e seis meses, pelo que o contrato terminará no dia 24 de Dezembro de 2016. (…) Cumpridos que estão os requisitos da presente comunicação nos termos do n.º 2 do artigo 371.º do Código do Trabalho, cumpre apenas informar que terá a receber as quantias referentes a vencimento e subsídio de natal no montante de 1.205,05€, acrescido do valor da indemnização nos termos do artigo 366.º do Código do Trabalho, ou seja, 12 dias por cada ano de trabalho, num total de 30 dias, num total de € 717,97” (cfr. documento de fls. 43 verso a 44 verso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
6)-O Autor recusou-se a assinar a recepção da missiva referida em 5) P.M.P (conforme se encontra consignado no teor do documento de fls. 44 verso).
7)-Foram pagos ao Autor através de cheque datado de 15.12.2016, a quantia total de € 1.866,44 (mil, oitocentos e sessenta e seis euros e quarenta e quatro cêntimos), referente a vencimento no valor de € 560,00 (quinhentos e sessenta euros), subsídio de férias no valor de € 46,67 (quarenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos), subsídio de natal no valor de € 700,00 (setecentos euros), compensação no valor de € 717,97 (setecentos e dezassete e noventa e sete euros), férias não gozadas no ano anterior no valor de € 46,67 (quarenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos) – (cfr. recibo de vencimento de fls. 51 e documento (cópia de cheque) de fls. 52).
8)-Foi emitido um recibo de vencimento datado de 25.12.2016, referente às quantias mencionadas em 7), o qual se encontra assinado pelo Autor, e onde consta a menção a um item discriminado como “Compensação - € 717,97” (cfr. recibo de vencimento de fls. 51).

4. Fundamentação de Direito.
Da não verificação da presunção de aceitação do despedimento por parte do autor
Adianta-se desde já que, no essencial, e a este propósito, se subscreve a tese do recorrente.
No presente caso, o autor foi alvo de um despedimento por extinção do posto de trabalho, tendo a ré pago àquele euros € 717,97”, a título de compensação (fls. 51).
Nos termos do art.º 366.º, n.º 5 do Código do Trabalho (aprovado pelo Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, ao caso aplicável), “Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe a compensação prevista neste artigo”, determinando-se no n.º 6, do mesmo preceito legal, que a “presunção referida no número anterior pode ser ilidida desde que, em simultâneo, o trabalhador entregue ou ponha, por qualquer forma, a totalidade da compensação pecuniária recebida à disposição do empregador e do fundo de compensação do trabalho ou mecanismo equivalente”. O referido normativo é aplicável ao despedimento por extinção do posto de trabalho, “ex vi” do art.º 372.º do mesmo compêndio normativo.

Como é sabido, a referida presunção legal, de natureza ilidível, tem sido alvo de várias críticas, realçando-se a sua irrazoabilidade, quando, é certo, os trabalhadores despedidos por alguma das modalidades objectivas (despedimento colectivo, por extinção do posto de trabalho ou por inadaptação), têm direito a compensação por perda do emprego, de acordo com o referido art.º 366.º e artigos 372.º e 379.º, do Código do Trabalho, constituindo mesmo condição indispensável à licitude do despedimento a disponibilização de tal compensação ao trabalhador. O que significa que o trabalhador (no mínimo) sempre terá direito a essa compensação em caso de despedimento lícito, cabendo-lhe montante superior, na hipótese de ser ilícito o despedimento, como do art.º 389.º e segs.

Pese embora assim suceda, muito por força da evolução legal verificada a propósito desta temática, tem-se vindo a entender que a outorga de tal presunção se justifica, sobretudo, como forma de impedir a litigiosidade laboral. Isto é, recebendo o trabalhador a compensação, apenas pode entender-se que o mesmo aceita (acata) o despedimento, não sendo legítimo, por contraditório com essa posição, vir posteriormente  impugnar tal despedimento. E, sendo assim, tal presunção (apenas) poderá ser ilidida desde que “em simultâneo, o trabalhador entregue ou ponha, por qualquer forma, a totalidade da compensação pecuniária recebida à disposição do empregador …”, art.º 366.º, n.º 5. 

Neste sentido se tem vindo a pronunciar firmemente a jurisprudência, em particular a do Supremo Tribunal de Justiça. O que já sucedia, aliás, no domínio do Código de Trabalho de 2003, pese embora este diploma não contivesse norma semelhante à do n.º 6 do art.º 366.º. Assim, mesmo que o trabalhador declarasse expressamente não aceitar o despedimento, desde que o mesmo não devolvesse a compensação recebida, tal declaração não afastava a referida presunção de aceitação do despedimento. (Cfr., entre outros, os acórdãos de 09-12-2010, Sousa Grandão e de 16-06-2015, Melo Lima, www.dgsi.pt).

Mas, se assim é, a questão em apreço assenta num outro aspecto, situado a montante da referida problemática, e que se prende com a circunstância de não estar apurado nos autos o (exacto) valor da compensação a que tem direito o autor.

Ignora-se, com efeito, qual o concreto montante da retribuição-base do autor, bem como a sua antiguidade na ré, elementos esses determinantes para a fixação da compensação devida pelo despedimento por causa objectiva. Como resulta expressamente do art.º 366.º, n.º 1:
Em caso de despedimento …, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a 20 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade
O autor invocou auferir um vencimento mais elevado do que o considerado pela ré e ser maior a sua antiguidade -,  o que ré impugnou, encontrando-se, deste modo, controvertida essa matéria.

É que, para poder operar validamente a aludida presunção legal, é mister que se demonstre ter sido posta à disposição do trabalhador a totalidade da compensação prevista na lei. Essa é a compensação a que o trabalhador tem direito por força desta modalidade de despedimento, sob pena de assim não sendo se desvirtuar o regime legal em vigor, onde, para além do prescrito citado n.º 1, do art.º 366.º, se refere o legislador à “totalidade da compensação” e à “compensação prevista neste artigo”(n.ºs 4 e 5, do mesmo preceito).
 
Assim resulta, entre outros, dos acórdãos do STJ de 13-04-2005, Sousa Peixoto e de 17-03-2016, Ana Luísa Geraldes, in www.dgsi.pt.

Destarte, pese embora o autor não tenha devolvido à ré a compensação paga por esta, não pode com isso significar-se ter o mesmo aceitado o despedimento, visto não se saber se aquela compensação é inferior à que legalmente lhe é devida.
Assim, não contem o processo todos os elementos para se proferir decisão em sede de despacho saneador, como ocorreu, devendo os autos prosseguir seus termos para apuramento dos factos respeitantes à colocação ou não da totalidade da compensação devida ao autor – o que implica, como acima se deixou pressuposto, o apuramento da retribuição e antiguidade deste.

5.Decisão.
Em face do exposto, revoga-se a decisão recorrida, devendo os autos prosseguir para se apurar, nos termos supra expostos, se o autor recebeu ou não a totalidade da compensação devida pelo despedimento, e assim se poder concluir se o mesmo aceitou ou não o despedimento e se este foi lícito ou ilícito.
Custas pelo vencido a final.



Lisboa, 2017-10-11



Albertina Pereira
Leopoldo Soares
Eduardo Sapateiro