Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
614/09.3TVLSB.L1-7
Relator: LUÍS ESPÍRITO SANTO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL
AGÊNCIA DE VIAGENS
RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA
CONTRATO DE SEGURO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/24/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDÊNCIA
Sumário: I – As agências de viagens e turismo respondem objectivamente, no âmbito contratual, pelo comportamento (negligente ou inclusive doloso) dos agentes que sejam escolhidos para a execução de um serviço compreendido na prestação turística global oferecida e facturada.
II – Tal responsabilidade incide sobre os eventos lesivos ocorridos durante a viagem ou circuito organizado, ainda que resultem de actos ilícitos praticados por quem executa o serviço de transporte de turistas, desde que se circunscrevam à concretização do roteiro turístico contratualizado e pago à agência de viagens e turismo.
III - O comportamento grosseiramente negligente da pessoa encarregue de levar à prática, através da condução de veículo automóvel, um programa turístico integrado nos serviços contratualizados e pagos pelo cliente à agência, enquadra-se na figura do cumprimento defeituoso desta sua prestação contratual típica, tudo se passando como se tivesse sido um funcionário do quadro profissional da própria agência de viagens e turismo – e por si pessoalmente escolhido - a assumir tal ( irresponsável ) conduta.
IV - Para a Ré seguradora se eximir à sua responsabilidade fundada no contrato de seguro obrigatório, tem que alegar e provar, não que “ o veículo estava obrigado a ter seguro obrigatório de responsabilidade civil “ ( cfr. artigo 13º da sua contestação ), mas que a responsabilidade civil emergente da circulação daquela viatura se encontrava efectivamente coberta através de contrato de seguro válido e eficaz.
V - Não releva, para este efeito, que o Regulamento nº 12/99, de 29 de Abril de 1999, publicado no Diário da República, II Série, nº 113, pag. 7259, do Instituto de Seguros de Portugal, tenha aprovado as condições uniformes do seguro obrigatório de responsabilidade civil das agências de viagens e turismo, nelas incluindo a exclusão consistente nos “ danos causados por acidentes ocorridos com meios de transporte que, nos termos da lei, devam ser objecto de seguro obrigatório de responsabilidade civil “ ( artigo 6º, alínea f) do respectivo Anexo ), uma vez que o artigo 51º, nº 2, alínea b) do Decreto-lei nº 209/97, de 13 de Agosto – que prevalece na hierarquia de leis sobre o dito Regulamento – é claro e peremptório ao permitir como causa de exclusão da responsabilidade da seguradora, neste seguro obrigatório, apenas as situações em que, não pertencendo os meios de transporte à agência ( como sucede ), o transportador ( in casu a empresa brasileira dos ditos buggys ) tenha efectivamente o seguro exigido para aquele meio de transporte.

(Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO.
Intentou a A, residente na Rua (...), a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra AA, com sede na Av. (...), e COMPANHIA DE SEGUROS (...), com sede na Rua (...).
Essencialmente, alegou :
A 1ª Ré é uma sociedade comercial que se dedica à organização e venda de viagens turísticas.
No exercício daquela actividade, entre a A. e a 1ª Ré, foi celebrado, em Março de 2006, contrato em que, mediante pagamento do preço, esta obrigava-se a organizar viagem ao Brasil e bem assim a prestar serviços conexos com acolhimento turístico para o período compreendido entre 30 de Março e 12 de Abril daquele ano.
Para além da deslocação ao Nordeste Brasileiro (Maceió, Porto de Galinhas e Pipa), alojamento e alimentação, integrava o contrato a realização de diversas actividades, que foram indicadas pela 1ª Ré.
O contrato celebrado entre a A. e a 1ª Ré estava suportado por seguro de responsabilidade civil, tendo a 1ª Ré transferido parte da sua responsabilidade para a 2ª Ré.
Sucedeu que, no dia 10 de Abril de 2006, no Nordeste Brasileiro (Natal), ocorreu um acidente com um veiculo “buggy” em que foi vítima a aqui A, sendo que tal excursão de “buggy” estava inserida no programa da viagem, vendida pela 1ª R.– “Buggy Genipabu”.
Momentos antes do acidente, todos os “buggys” transportavam quatro estudantes e um condutor, seguindo pela praia, paralelamente à linha do mar, sendo que no buggy em que se encontrava a A. seguiam – para além do condutor - três outras estudantes (todas sentadas): uma no banco dianteiro e as restantes no banco traseiro.
Os “buggies” seguiam em “fila indiana” quando, repentinamente, o condutor do veículo em que seguia a A. saiu daquela fila, tentou ultrapassar, pela direita, todos os outros veículos e invadiu a areia molhada.
O condutor acelerou significativamente o veículo, retirou as mãos do volante e bateu palmas, colocou ainda as mãos em cada um dos lados do seu banco, elevando o seu corpo, tirou os pés dos pedais, levantou-os e colocou-os no exterior do carro pelo lado esquerdo.
O condutor apercebeu-se então que o veículo seguia em direcção ao mar, invadindo a água, agarrou o volante e rodou-o bruscamente para a esquerda. Já sem controlo, rodou o volante para a direita e novamente para a esquerda, tendo de imediato e abruptamente o veículo capotado para o lado direito e para a frente.
A A. foi violentamente projectada no mesmo sentido, tendo o buggy – já vazio - tomado a direcção desta, embatendo e passado por cima – literalmente - das suas costas e pernas.
O buggy era conduzido por pessoa contratada pela 1ª Ré.
Durante cerca de uma hora (que decorreu entre o momento do acidente e a chegada ao centro hospital) a A. esteve em grande sofrimento, sobretudo devido às lesões visíveis nos membros superiores e inferiores, manifestava grande palidez, suores frios e náuseas.
Foi transportada de ambulância para a “Casa de Saúde (...)”, local onde foi prestada a primeira assistência médica, “foi imobilizada devido a quadro doloroso em ombro e joelho direito, devendo ser reavaliada...”. Ali lhe foram feitas radiografias, tendo ficado em observação de um dia, com controle álgico (...)a controlar com medicamentos.
No dia 11 de Abril foi-lhe dada alta, dia em que iniciou a viagem de regresso a Portugal, a qual foi extremamente desconfortável e dolorosa, atentas as mazelas sofridas.
Já em Portugal, entre outras intervenções médicas, em 26 de Abril de 2006 a A. deslocou-se ao Hospital (...) com fortes dores na perna direita e mau estar geral, onde esteve em repouso absoluto, tendo durante o dia 26, tomado injecções, realizado exames eco-doppler, radiografias. Naquela data, à A. foram-lhe prescritos mais medicamentos.
Desde o acidente e 3/4 vezes por semana, (e por recomendação médica) a A. diligenciava a mudança dos pensos, atentas as escoriações sofridas, o que lhe provocava enorme sofrimento. Usava diariamente meias elásticas.
Em Maio do mesmo ano, permanecendo as dores muito fortes, por ordem médica a A. realizou ressonância magnética, que não foi integralmente satisfatório.
Na consulta de especialidade de medicina física foi recomendado reabilitação e tratamento conservador do joelho direito, o que culminou assim, desde Maio a Janeiro de 2007, em tratamentos semanais de fisioterapia, que provocavam enorme sofrimento, dores intensas e difíceis de suportar, sobretudo no joelho direito.
Permanecendo as fortes dores, no dia 12 de Outubro de 2006 a A. teve necessidade de recorrer, uma vez mais, aos serviços médicos especializados, viu-se forçada a realizar nova ressonância magnética.
Até àquela data sempre existiu a possibilidade de a A. vir a sujeitar-se a cirurgia ao joelho direito, o que lhe provocou enorme ansiedade.
Durante estes meses usou meias elásticas (até à coxa), numa tentativa de aliviar a dor e de evitar novos acidentes vasculares e durante meses tomou vários medicamentos.
Desde a data do acidente até Janeiro de 2007, a A. viu-se impossibilitada de fazer o seu normal quotidiano tal como o fazia anteriormente, com grandes dificuldades em subir e descer escadas, conduzir veículo automóvel, fazer caminhadas e jogging (conforme era semanalmente usual), ou mesmo fazer um movimento de elevação mais pronunciado da perna direita.
Não possui a destreza física necessária ao desenvolvimento do seu dia-a-dia, com redução muito elevada da sua mobilidade e flexibilidade.
Nos primeiros tempos após o acidente, em repouso absoluto, a A. não conseguia deslocar-se sozinha na sua própria casa, nem tão pouco fazer as suas tarefas domésticas e pessoais, necessitando do auxílio de familiares para realizar a sua higiene pessoal, vestir-se e alimentar-se.
Perdeu o apetite e reduziu (involuntariamente) o seu peso para menos 8 quilos.
O seu estado de saúde e a difícil e dolorosa recuperação causou à A. grandes preocupações, tristeza, ansiedade e angústias.
Não conseguia desenvolver a sua actividade profissional de fisioterapeuta que exige considerável esforço físico.
Ainda hoje a A. tem dores, em especial na mudança do tempo.
A forma como o acidente ocorreu, as consequências visíveis nos momentos imediatamente seguintes, as colegas feridas (duas mesmo inconscientes), causaram na A. uma forte imagem traumática e choque psicológico.
Com 26 anos de idade, ainda hoje as cicatrizes (que a desfeiam), sobretudo na perna são bem visíveis, provocando à A. grande constrangimento e embaraço, especialmente na praia, piscinas ou quando usa outro tipo de roupa.
Desde a data do acidente que a A. receia circular de automóvel.
Como consequência directa do acidente, a A. suportou despesas médico-medicamentosas e outras entregues à 2ª R. De um total de despesas apresentadas à 2ª Ré no montante de € 2.413,39, esta só procedeu ao reembolso de € 1.250.
A Autora suportou ainda inerentes despesas de deslocação em veículo particular, não só para consultas e realização de exames, como também para mudança de pensos e sessões de fisioterapia, respectivamente em Campo de Ourique e Alcântara, tudo em montante não inferior a 400 € (correspondente a pelo menos 100 deslocações).
Ainda devido ao acidente, a A. viu inutilizados alguns dos seus bens que naquele dia fatídico utilizava.
Ainda na sequência do acidente e tendo ficado sem desenvolver a sua actividade principal (fisioterapeuta) durante 9 meses, a A. deixou de auferir, a quantia média de € 600 mensais. Viu-se ainda a A. impossibilitada de comparecer e desenvolver outras actividades junto de entidade organizadora de eventos – tal como tinha sucedido nos anos anteriores. Assim, não lhe foi possível assumir no Estoril Open as funções de Coordenadora dos Transportes, evento em que iria auferir cerca de 1.300 € e posteriormente como coordenadora de pessoal Lisboa e etapas na equipa do Lisboa-Dakar, onde poderia auferir 1.000 €.
Conclui pedindo que sejam as Rés condenadas a pagar à A. as seguintes quantias:
I. Danos Patrimoniais:
a) 1.884,00 € despesas médicas e medicamentosas apuradas na presente data, inerentes deslocações e vestuário danificado.
b) o remanescente que se vier a apurar após junção e apreciação da relação das despesas comparticipadas e não comparticipadas;
c) 7.700,00 €, valor que deixou de auferir pelo não desenvolvimento das suas actividades remuneratórias desde a data do acidente até Janeiro de 2007;
Danos Não Patrimoniais:
d) 15.000,00 €, a título de danos morais pelas dores e sofrimento causados pelas lesões;
e) 15.000,00 € a título de danos morais pela diminuição da sua qualidade de vida.
Acrescendo juros de mora, calculados às taxas legais sucessivamente em vigor, contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
Citada, contestou a Ré AA, aduzindo desde logo que transferiu para a 2ª Ré a responsabilidade civil decorrente do exercício da actividade de agência de viagens através de contrato de seguro titulado pela apólice nº 9350/79574/88, o qual abrange todas as indemnizações que sejam da responsabilidade da segurada, até ao limite de €74.819,68, de onde conclui que “todos os danos que estão a ser reclamados à aqui 1ª Ré estão cobertos pelo seguro de responsabilidade civil, pelo que será a 2ª Ré a única e exclusiva responsável pelo pagamento de qualquer indemnização que venha a ser arbitrada à Autora”.
No mais e em sede de impugnação efectuou o enquadramento do contrato celebrado com a Autora numa viagem dita típica de estudantes académicos, viajando assim a Autora integrada num grupo de estudantes de fisioterapia do “ISCS (...)”.
Prestou à Autora todos os cuidados que lhe foi possível prestar nas circunstância, acompanhando a Autora e proporcionando-lhe todas as comodidades que lhe era possível prestar na altura e no local, tendo a expensas suas pago o “upgrade” da classe de avião, passando a Autora (e restantes passageiras do “buggy” dos autos) da classe de “turística” para “executiva”.
Referiu ainda que o passeio de “buggy” proporcionado à Autora foi realizado por terceiras entidades, facto que era do conhecimento da Autora.
Mais que a Autora e amigas que a acompanhavam no buggy foram prévia e devidamente informadas sobre a perigosidade da actividade e sobre os cuidados a tomar, concretamente de que deveriam permanecer sempre sentadas nos respectivos lugares e que não deveriam interferir na condução do dito “buggy “.
Contudo e não obstante esses avisos, estavam todas em grande animação e diversão, até que a dado momento o dito “bugueiro”, animado pela Autora e suas amigas, retirou as mãos do volante e começou a bater palmas e a cantar.
A amiga da Autora, de nome FM, que se encontrava sentada à frente, ao lado do condutor, talvez assustada ou talvez querendo participar na brincadeira, levou a mão ao volante e, imperitamente, fez com que o dito “buggy” guinasse bruscamente e invadisse a água do mar, momento em que e por força daquela manobra que o “buggy” tombou e forçou os seus ocupantes a serem projectados para fora do mesmo.
Refuta ainda a gravidade das lesões sofridas pela Autora, impugnando toda a demais factualidade alegada quanto às consequências do acidente em termos de saúde, trabalho e demais circunstâncias de vida da Autora.
Requereu ainda a incidente de intervenção de terceiros nos termos do art. 330º do Código de Processo Civil de (…).
Mais requereu ainda a apensação da presente acção à acção nº (…).
Citada, contestou também a Ré “Companhia de Seguros (...) Portugal, SA”, enunciando particularmente os termos e condições da pólice de seguro contratada com a 1ª Ré e, no mais, impugnando substancialmente quer por desconhecido quer por não corresponder à verdade o alegado pela Autora, com ressalva para os tratamentos médicos que foram apresentados para pagamento à 1ª Ré.
Refutou especialmente que o condutor do veículo onde a A. era transportada não era funcionário, empregado, prestador de serviço nem, tão pouco, de sucursal ou de outra forma de representação da 1ª Ré, na zona onde ocorreu o acidente.
De onde conclui que o acidente dos autos não está abrangido pelo contrato de seguro em causa vistos os arts. 2º, alínea a), e 3º, nº 1, das Condições Gerais, por ser o condutor do veículo um terceiro alheio ao fornecimento das prestações próprias da actividade da 1ª Ré e a organização de passeios de “buggies” não ser uma actividade própria nem acessória da de agência de viagens e turismo, previstas no art. 2º do DL 209/97, de 13 de Agosto, na redacção que lhe foi dada pelo DL 12/99, de 11 de Janeiro, sendo que o buggy enquanto veículo automóvel está sujeito a seguro obrigatório.
Admitiu ainda ter celebrado com a 1ª Ré um outro contrato de seguro do ramo acidentes pessoais, o qual era titulado pela apólice nº 2096/83694/29, o qual garantia aos clientes da 1ª Ré, entre outros riscos, o reembolso de despesas de tratamento até ao valor de €1.250 em caso de acidente sofrido no estrangeiro.
Foi apresentado articulado pela 1ª Ré pronunciando-se sobre a contestação da 2ª Ré, o qual não foi admitido por despacho de fls. 184 a185.
Por despacho proferido em 2 de Julho de 2009 não foi admitida a apensação requerida e por despacho proferido em 21 de Janeiro de 2010 não foram admitidos os requeridos incidentes de intervenção acessória provocada de (…).
Subsequentemente veio a 1ª Ré deduzir incidente de intervenção principal provocada ainda daqueles (…), reiterando o já afirmado quanto a estes na respectiva contestação, incidente este que foi indefiro por despacho proferido em 9 de Março de 2010, do qual foi pela 1ª Ré interposto recurso de apelação em separado com efeito meramente devolutivo, o qual já foi objecto de decisão transitada em julgado por parte do Tribunal da Relação de Lisboa, a qual confirmou a decisão recorrida salvo no que tange ao montante da condenação em custas.
Procedeu-se ao saneamento dos autos conforme fls. 184 a 190.
Realizou-se audiência de julgamento.
Foi proferida sentença que julgou a presente acção parcialmente procedente a presente acção e, em consequência, condenou a 1ª Ré a pagar à Autora:
a) a quantia de € 1.513,39 a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação da Ré à taxa anual de 4% até integral pagamento, sem prejuízo de eventual alteração legal daquela taxa;
b) a € 2.300 a título de indemnização por de rendimentos que auferia e ainda o valor a liquidar em incidente ulterior pela perda do rendimento que a Autora auferia da sua actividade de fisioterapeuta no período de 239 dias até ao montante máximo de €5.400, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação da Ré à taxa anual de 4% até integral pagamento, sem prejuízo de eventual alteração legal daquela taxa;
c) a quantia de € 12.000,00 a título de indemnização pela IPG de que ficou a padecer, acrescida de juros contados à taxa anual de 4% desde a data desta decisão até integral pagamento, sem prejuízo de eventual alteração legal dessa taxa; e
d) a quantia de € 10.000 a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros contados à taxa anual de 4% desde a data desta decisão até integral pagamento, sem prejuízo de eventual alteração legal dessa taxa.
Mais condenou a 2ªRé a pagar à Autora solidariamente com a 1ª Ré os montantes supra referidos a título de capital deduzidos de 10%, correspondentes à franquia da apólice de seguro, e acrescidos de juros nos moldes supra fixados. No mais, absolveu as Rés do peticionado ( cfr. fls. 545 a 577 ).
Apresentou a R. COMPANHIA DE SEGUROS (...) recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação ( cfr. fls. 723 ).
Juntas as competentes alegações, a fls. 669 a 684, formulou a apelante as seguintes conclusões:
a) A responsabilidade legalmente prevista para as agências de viagem é de natureza contratual e apenas engloba a realização efectiva das viagens e eventos contratados.
b) Assim, e ao contrário do entendido na sentença recorrida, nessa responsabilidade não está englobada a responsabilidade civil extracontratual dos efectivos executantes das viagens contratadas, o que não teria a mínima correspondência no texto legislativo nem no pensamento do legislador.
c) Porque os danos sofridos pela ora recorrida foram consequência de um acidente imputável ao executante de um dos eventos previstos e realizados na viagem contratada entre a ora recorrida e a ora 1ª R., é aquele que incumbe a obrigação de indemnizar em consequência do facto ilícito praticado e não a qualquer das RR., por falta de fundamento legal para que a 1ª R. possa ser responsabilizada por tais danos.
d) Ainda que assim não fosse, por força de se tratar de um acidente que, ao abrigo da legislação brasileira, era objecto de um seguro obrigatório, o qual, ainda que não existisse, sempre seria ressarcível pela entidade ali existente e equiparada ao português Fundo de Garantia Automóvel, sempre essa responsabilidade da 1ª R. que, não concedendo, existisse estaria expressamente excluída do contrato de seguro ajuizado.
e) De resto, as condições gerais deste contrato foram, em execução do diploma sobre a actividade das agências de viagens, expressamente imposto às seguradoras a operarem em Portugal por Regulamento da entidade reguladora da actividade seguradora, com o que a ora recorrente não poderia ter contratado com a ora 1ª R. seguro com conteúdo diferente do que foi dado assente nos presentes autos.
f) Com o que nunca seria responsável, também por esta via, pelos danos da ora recorrida.
g) Foram violadas as normas dos arts. 9º do C. Civil, 39º, 41º, 50º 3 51º do Decreto-Lei nº 209/97, de 13 de Agosto, do Regulamento nº 12/1999 do Instituto de Seguros de Portugal publicado a págs. 7259 e seguintes do Diário da República, II Série, nº 113, de 15/05/1999, e ainda o artº 20º, alínea l), do Decreto-Lei nº 73, de 21 de Novembro de 1966, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 8.374, de 30 de Dezembro de 1991, e o artº 4º, § 3º, da Lei nº 6.194, de 19 de Dezembro de 1974, estas da legislação brasileira.
Contra-alegou a co-R. AA, pugnando pela procedência do recurso quanto à primeira das suscitadas questões ( ausência de responsabilidade da Ré agência de viagens ) e pela improcedência quanto à segunda ( ausência de cobertura do seguro face à verificação da cláusula de exclusão ).
A A. não apresentou resposta.

II – FACTOS PROVADOS.
Foi dado como provado em 1ª instância :
A) A Ré AA é uma sociedade comercial que se dedica à organização e venda de viagens turísticas (Alínea A) dos Factos Assentes ).
B) No exercício da sua actividade, a 1ª Ré e a Autora celebraram entre si, em Março de 2006, contrato em que, mediante o pagamento de um preço pela Autora, a 1ª Ré obrigava-se a organizar viagem ao Brasil e a prestar serviços conexos com acolhimento turístico para o período compreendido entre 30 de Março e 12 de Abril daquele ano ( Alínea B) dos Factos Assentes ).
C) Para além da deslocação ao Nordeste Brasileiro, com o itinerário descrito no documento de fls. 16, que se dá por reproduzido, alojamento e deslocação, a 1ª Ré comprometia-se ainda a realizar diversas actividades, a proporcionar à Autora ( Alínea C) dos Factos Assentes ).
D) Essas actividades e respectivas datas foram informadas à Autora, a quem foi entregue o programa que constitui documento de fls. 16 ( Alínea D) dos Factos Assentes ).
E) Entre a 1ª e a 2ª Ré vigorava, entre 30 de Março e 12 de Abril de 2006, o contrato de seguro com a apólice n.º 9350/79574/88, com as condições constantes de fls. 88 a 96, que se dão por reproduzidas ( Alínea E) dos Factos Assentes ).
F) No dia 10 de Abril de 2006, em Natal, ocorreu um acidente com um veículo “buggy” de que a Autora foi vítima ( Alínea F) dos Factos Assentes ).
G) A actividade de excursão de “buggy” estava inserida no programa da viagem constante do documento de fls. 16, sob a designação de “passeio de buggy em Genipabú” ( Alínea G) dos Factos Assentes ).
H) No buggy em que se encontrava a Autora seguiam, para além do condutor, três outras passageiras, todas sentadas, uma no banco dianteiro e as restantes no banco traseiro, sendo que a Autora era uma das passageiras que se encontrava sentada no banco traseiro ( Quesito 1º da Base Instrutória ).
I) Nessa excursão, no início, seguiam vários “buggies” uns atrás dos outros em fila indiana e a distâncias não necessariamente iguais entre si e a partir de dada altura, já na praia, sendo o piso areia, continuando todos a avançar no mesmo sentido com a água do lado direito, seguiam uns mais para a esquerda e outros mais para a direita por referência à posição do que lhe antecedia ou precedia ( Quesito 2º da Base Instrutória ).
J) A dada altura, o condutor do “buggy” onde seguia a Autora ultrapassou pela direita pelo menos o veículo que o precedia e conduziu o seu veículo mais para a direita na direcção da água, invadindo a areia molhada ( Quesito 3º da Base Instrutória ).
K) Além do referido em J), o condutor do veículo onde seguia a Autora acelerou o veículo, designadamente para efectuar aquela ultrapassagem, bem como, a dada altura, retirou as mãos do volante e bateu palmas, ao som da música que tocava no rádio do referido veículo, e depois colocou ainda as mãos de cada um dos lados do seu banco e, tirando os pés dos pedais, levantou-os e colocou-os no exterior do “buggy”, pelo lado esquerdo ( Quesitos 4º e 5º da Base Instrutória ).
L) Depois destes comportamentos, o condutor do veículo em que seguia a Autora apercebeu-se que o veículo se dirigia para o mar, pelo que agarrou o volante e rodou-o para a esquerda, na sequência do que perdeu o controlo do veículo, pelo que, na tentativa de o recuperar, rodou o volante tanto para a esquerda como para a direita, porém sem sucesso, fazendo com que o veículo capotasse abruptamente para o lado direito e frente ( Quesitos 6º e 7º da Base Instrutória ).
M) Na sequência do referido em L), a Autora foi projectada para fora do “buggy” e o veículo já vazio, seguiu na sua direcção, embatendo em zona não concretamente apurada do corpo da Autora passando por cima da mesma ( Quesito 8º da Base Instrutória ).
N) A 1ª Ré para efeitos de realização da excursão de buggy referida G) e I) contratava os serviços da empresa “Papabuggy”, a quem pagava pela disponibilização de buggies e respectivos condutores para aquela excursão, sendo o condutor do veículo em que seguia a Autora por sua vez remunerado pelo seu serviço por esta empresa ( Quesito 9º da Base Instrutória ).
O) A Autora só chegou ao estabelecimento hospitalar, pelo menos, uma hora após o acidente, tendo estado durante esse período em sofrimento ( Quesito 10º da Base Instrutória ).
P) A Autora foi transportada de ambulância para a “Casa de Saúde (...)”, onde o ortopedista ordenou que fosse imobilizada devido a quadro doloroso no ombro e joelho direito ( Quesito 11º da Base Instrutória ).
Q) Na “Casa de Saúde (...)” foram-lhe feitas radiografias, e ficou em observação de um dia, com controlo álgico por medicamentos ( Quesito 12º da Base Instrutória ).
R) A Autora recebeu alta hospitalar em 11 de Abril, tendo viajado de regresso para Portugal nesse mesmo dia, e sentido dores e desconforto durante a viagem de avião, a qual contabilizando o tempo dos respectivos procedimentos de embarque e desembarque, durou cerca de 10 horas ( Quesito 13º da Base Instrutória ).
S) Ainda como consequência das lesões sofridas no acidente, a Autora sentiu em 26 de Abril de 2006 fortes dores na perna direita e mal estar geral, razão pela qual se deslocou ao Hospital (...), onde esteve em repouso absoluto, e onde lhe foram ministradas injecções, realizadas radiografias e eco-dopplers e prescritos medicamentos ( Quesito 14º da Base Instrutória ).
T) Desde a sua chegada a Portugal em 12 de Abril e durante cerca de dois meses, a autora teve que efectuar mudança dos pensos que lhe foram colocados nas zonas do corpo (pernas, braços, costas e barriga) onde ficara com a pele escoriada devido à abrasão da areia molhada, sendo tal mudança efectuada com a regularidade de 3 a 4 vezes na primeira semana, e diminuindo progressivamente de regularidade, mudança esta e limpeza das escoriações que então efectuava que lhe provocaram sofrimento ( Quesito 15º da Base Instrutória ).
U) Desde a data referida em S) e por lhe ter sido diagnosticado um processo de tromboflebite na perna esquerda, a Autora durante período não concretamente apurado, mas não inferior a alguns meses, usava diariamente meias elásticas até à coxa para evitar a dor e novos acidentes vasculares ( Quesito 16º da Base Instrutória ).
V) Uma vez que as lesões sofridas no acidente continuavam a provocar-lhe dores fortes, a Autora realizou em Maio de 2006 uma ressonância magnética, por prescrição médica ( Quesito 17º da Base Instrutória ).
W) Para tratamento das lesões sofridas no acidente, foi recomendada à Autora a realização de tratamentos semanais de fisioterapia, os quais realizou entre Maio de 2006 e Janeiro de 2007 ( Quesito 18º da Base Instrutória ).
X) As sessões de fisioterapia causavam-lhe sofrimento e dores no joelho direito ( Quesito 19º da Base Instrutória ).
Y) Uma vez que a Autora continuava a ter dores, provocadas pelas lesões sofridas no acidente, a Autora foi novamente ao médico em 12 de Outubro de 2006, tendo-lhe sido prescrita a realização de nova ressonância magnética, que realizou ( Quesito 20º da Base Instrutória ).
Z) A Autora sentiu ansiedade, porquanto o médico ortopedista que a acompanhava a alertou para a possibilidade de realização de intervenção cirúrgica ao joelho direito, conhecendo esta as implicações de tal operação e a necessidade de subsequentemente a tal intervenção, se realizada, efectuar mais fisioterapia, sendo que essa possibilidade se manteve em discussão durante vários meses ( Quesito 21º da Base Instrutória ).
AA) Desde a data do acidente e, pelo menos, até Setembro de 2006, devido às lesões sofridas, a Autora viu-se impossibilitada de fazer caminhadas e o “jogging” que praticava semanalmente e desde a data do acidente até ao início de Dezembro de 2006, a Autora sentiu dificuldade em subir e descer escadas e conduzir automóveis, bem como a partir de Setembro de 2006 até, pelo menos, Janeiro de 2007, manteve dificuldade em fazer caminhadas e o “jogging” ( Quesito 22º da Base Instrutória ).
BB) Devido às lesões sofridas no acidente, a Autora não consegue elevar completamente a perna direita ( Quesito 23º da Base Instrutória ).
CC) Devido às lesões sofridas, nos dois primeiros meses após o acidente, a Autora para além das dificuldades referidas em AA) não conseguia auxiliar a sua mãe nas tarefas domésticas, como anteriormente fazia, e precisou do auxílio daquela sua mãe pelo menos nas duas primeiras semanas após o acidente para a realização da sua higiene pessoal, designadamente para tomar banho e ainda para se vestir e alimentar-se ( Quesito 24º da Base Instrutória ).
DD) Devido às lesões sofridas no acidente, a Autora perdeu apetite e perdeu cerca de 8 quilos ( Quesito 25º da Base Instrutória ).
EE) Devido ao seu estado de saúde e às dores sentidas na recuperação, a Autora sentiu preocupação, tristeza, ansiedade e angústia ( Quesito 26º da Base Instrutória )
FF) À época do acidente, a Autora efectuava alguns trabalhos de fisioterapia em acompanhamento de jogos de futebol e râguebi aos fins de semana, actividade que desde o acidente e pelo menos até ao início de Dezembro de 2006 não conseguiu exercer, virtude das lesões sofridas com este, considerando que é actividade que exige esforço físico ( Quesito 27º da Base Instrutória ).
GG) Ainda hoje a Autora sente dores derivadas das lesões sofridas no acidente, especialmente na mudança do tempo ( Quesito 28º da Base Instrutória ).
HH) O acidente sofrido e tudo o que o mesmo envolveu, seja relativamente ao que viu e também ao que padeceu em tratamentos e incapacidade física, marcaram a Autora psicologicamente, continuando esta a vivenciar o acidente quando o evoca com dor psíquica, como se este tivesse ocorrido ontem, limitando-a nas actividades de lazer, pois que recusa qualquer actividade que inclua buggys ( Quesito 29º da Base Instrutória )
II) Em resultado das lesões sofridas no acidente, a Autora ficou com o joelho direito com um perímetro maior do que o esquerdo, com aparência de inchaço e edema, e no membro inferior esquerdo ficou com cicatriz hipopigmentada irregular de maior eixo horizontal, na face póstero-lateral do terço medial da coxa que mede 4cmx1cm, o que lhe causa constrangimento e embaraço na praia ou a vestir saias e vestidos, peças de vestuário que, desde o acidente, evita usar ( Quesito 30º da Base Instrutória ).
JJ) Devido ao acidente a Autora passou a recear andar de automóvel, embora conduza por necessidade, principalmente se for conduzida por pessoas que não conheça ( Quesito 31º da Base Instrutória ).
KK) A Autora despendeu 2.413,39€ em despesas médico-medicamentosas resultantes do acidente, das quais a 2ª Ré apenas suportou 1.250€ ( Quesito 32º da Base Instrutória ).
LL) A Autora efectuou número não concretamente apurado de deslocações em veículo particular para consultas, exames, fisioterapia e mudança de pensos, com o inerente encargo ( Quesito 33º da Base Instrutória ).
MM) Com o acidente inutilizaram-se peças de vestuário e acessórios que a Autora usava no momento:
- biquini da marca,
- sandálias,
- relógio da marca “Swatch”,
- óculos escuros da marca “Vogue” e mala, de valor não concretamente apurado mas seguramente não inferior a 200€ ( Quesito 34º da Base Instrutória ).
NN) Por ter deixado de exercer a actividade de referida em FF) e como ali expresso a Autora deixou de auferir a correspondente remuneração, cuja regularidade e valor se não apurou ( Quesito 35º da Base Instrutória ).
OO) Devido ao acidente a Autora deixou de poder exercer outras actividades remuneradas numa empresa de organização de eventos, como tinha efectuado nos anos anteriores ( Quesito 36º da Base Instrutória ).
PP) Como no ano anterior e não fora o acidente e a situação física da Autora decorrente daquele, esta teria sido contratada para ser Coordenadora dos Transportes do Estoril Open por aquela empresa de eventos, no que iria auferir valor correspondente a cerca de 1.300€ ( Quesito 37º da Base Instrutória ).
QQ) Também como no ano anterior e não fora o acidente e a situação física da Autora decorrente daquele, esta teria sido contratada para ser coordenadora de pessoal de Lisboa e etapas na equipa do Lisboa-Dakar, onde iria auferir cerca 1.000€ ( Quesito 38º da Base Instrutória ).
RR) Antes do início do passeio de “buggy” os monitores contratados pela 1ª Ré para acompanharem aquela excursão advertiram oralmente os participantes, incluindo a Autora, que em todo o percurso de buggy deveriam permanecer sentados ( Quesito 39º da Base Instrutória ).
SS) O veículo em que seguia a Autora era conduzido por RS, o qual tinha relação não concretamente apurada com Cooperativa ...( Quesito 42º da Base Instrutória ).
TT) A autora nasceu em 2 de Janeiro de 1981.
UU) A data de consolidação médico legal das lesões sofridas pela Autora na sequência do acidente é fixável em 6 de Dezembro de 2006, tendo esta sofrido de um período de défice funcionário temporário total fixável em 1 dia e de um período de défice funcional temporário parcial fixável em 239 dias, com um sofrimento físico e psíquico vivenciado durante o período de danos temporários, considerando as lesões do mesmo resultantes, o período de recuperação funcional, o tipo de traumatismo e os tratamentos efectuados quantificável num grau 3 numa escala de 7 de gravidade crescente.
VV) A Autora ficou a padecer, sequência do acidente e lesões sofridas com o mesmo, de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 2 pontos de 100 (ponto III.Mf 1319 da Tabela Nacional de Incapacidades em Direito Civil – Anexo II do DL 352/07, de 23/10), sendo as sequelas permanentes compatíveis com o exercício da sua actividade profissional de fisioterapeuta mas implicam esforços suplementares, sendo que por sua vez a repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer fixável no grau 4 numa escala de 7 de gravidade crescente.
 
III – QUESTÕES JURÍDICAS ESSENCIAIS.
São as seguintes as questões jurídicas que importa dilucidar[1]:
1 – Viagem organizada. Âmbito da responsabilidade da agência de viagens e turismo. Actos lesivos praticados na execução do programa turístico. Passeio de buggy.
2 – Contrato de seguro obrigatório. Cobertura da respectiva apólice. Exclusões de cobertura.
Passemos à sua análise :
1 – Viagem organizada. Âmbito da responsabilidade da agência de viagens e turismo. Actos lesivos praticados na execução do programa turístico. Passeio de buggy.
A questão essencial a decidir tem a ver com a responsabilidade da Ré, agência de viagens e turismo, pelos danos provocados na pessoa da sua cliente em consequência da conduta culposa do condutor de um veículo buggy, utilizado na realização de um passeio previsto no “ programa turístico “ vendido, em bloco, à A[2].
Dispõe o artigo 39º, nº 1, do Decreto-lei nº 209/97, de 13 de Agosto[3] : “ As agências são responsáveis perante os seus clientes pelo pontual cumprimento das obrigações resultantes da venda de viagens turísticas, sem prejuízo do disposto nos números seguintes “.
Refere o nº 2 do mesmo preceito : “ Quando se trate de viagens organizadas, as agências são responsáveis perante os seus clientes ainda que os serviços devam ser executados por terceiros e sem prejuízo do direito de regresso “.
Estes preceitos legais dão a necessária sequência à Directiva Comunitária nº 90/314/CEE, sobre viagens organizadas, de 13 de Junho de 1990, mormente ao consignado no respectivo 5º, nº 1, onde se prevê : “ Os Estados membros tomarão as medidas necessárias para que o operador e/ou agência que sejam partes no contrato sejam responsáveis perante o consumidor pela correcta execução das obrigações decorrentes do contrato, quer essas obrigações devam ser executadas por eles próprios ou por outros prestadores de serviços, e isso sem prejuízo do direito de regresso do operador e/ou agência contra esses outros prestadores de serviços “.
Acrescenta o nº 2 : “ No que se refere aos danos que a não execução ou a incorrecta execução do contrato causem ao consumidor, os Estados-membros tomarão as medidas necessárias para que o operador e/ou a agência sejam responsabilizados, a não ser que a culpa da referida não execução ou incorrecta inexecução não seja imputável nem ao operador e/ou agência nem a outro prestador de serviços porque :
- as faltas verificadas na execução do contrato são imputáveis ao consumidor ;
- essas faltas são imputáveis a um terceiro alheio ao fornecimento das prestações previstas no contrato e se revestem de um carácter imprevisível e inevitável ;
- essas faltas são devidas a um caso de força maior ( … ) ou a um acontecimento que nem o operador e/ou a agência nem o prestador poderiam prever ou evitar, mesmo efectuando todas as diligência necessárias ( … ) “.
Segundo o regime legal vigente à data da ocorrência do evento lesivo[4],
As agências de viagens e turismo respondem objectivamente[5], no âmbito contratual[6], pelo comportamento ( negligente ou inclusive doloso ) dos agentes que sejam escolhidos para a execução de um serviço compreendido na prestação turística global oferecida e facturada[7].
Trata-se, no fundo, de um regime similar ao previsto no artigo 800º, nº 1 do Código Civil, onde se dispõe : “ O devedor é responsável perante o credor pelos actos dos seus representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados pelo próprio devedor “[8].
Tal responsabilidade incide sobre os eventos lesivos ocorridos durante a viagem ou circuito organizado, ainda que resultem de actos ilícitos praticados por quem executa o serviço de transporte de turistas[9], desde que se circunscrevam à concretização do roteiro turístico contratualizado e pago à agência de viagens e turismo[10].
No caso concreto,
O evento lesivo é exclusivamente imputável à condução grosseiramente negligente de um dos condutores dos buggys contratados pela respectiva empresa brasileira local que, durante o percurso, decidiu ultrapassar pela direita os restantes buggys que seguiam em fila indiana, invadindo, em aceleração, a areia molhada; retirou as mãos do volante, batendo palmas ao som da música que tocava na rádio do veículo; colocou as mãos em cada um dos lados do seu banco; tirou os pés dos pedais, levantou-os e colocou-os no exterior do buggy, pelo lado esquerdo; tudo propiciando a perda de controlo do veículo que capotou abruptamente atingindo a passageira transportada.
Não subsiste qualquer dúvida de que
Este passeio de buggy foi especificamente incluído na programação turística proposta pela R. agência de viagens e turismo, constituindo um serviço a prestar por esta, ainda que com recurso a empresas locais, e que, como tal, foi-lhe antecipadamente pago.
Ora,
O comportamento inadequado da pessoa encarregue de levar à prática, através da condução de veículo automóvel, o programa turístico integrado nos serviços contratualizados e pagos pelo cliente à agência de viagens e turismo, enquadra-se – como não podia deixar de ser – na figura do cumprimento defeituoso[11] da prestação contratual típica[12].
No fundo, em termos jurídicos, tudo se passa como se tivesse sido um funcionário do quadro profissional da própria agência de viagens e turismo – e por si pessoalmente escolhido - a assumir tal ( irresponsável ) conduta.
Conforme justifica, em termos clarividentes, Miguel Miranda in “ O Contrato de Viagem Organizada “, a fls. 214 a 217 : “ Com a Directiva Comunitária veio, finalmente, a estabelecer-se um regime uniforme de responsabilidade objectiva da agência organizadora para os casos de inexecução ou execução deficiente das prestações de terceiros prestadores. Perante a opção entre a recondução ao mandado ou ao “ appalto “ de serviço italiano, a opção do legislador comunitário foi pela segunda hipótese, entendendo que a agência organizadora se obrigava à obtenção de um resultado, isto é, realizar a viagem organizada, entendida como um todo orgânico. Como tal deveria garantir a boa execução do contrato, ainda que as prestações fossem executadas por terceiros.
Esta orientação foi acolhida no artigo 5º, nº 1 da Directiva, sendo equilibrada através do estabelecimento de causas exoneratórias de responsabilidade, cuja prova incumbirá à agência, bem como através da admissão de limites legais e convencionais dos montantes indemnizatórios.
( … ) São vários os méritos da actual solução legislativa. Visa, por um lado, onerar a empresa que obtém as vantagens económicas da organização. Esta actividade, que envolve uma grande complexidade e elevado grau de imprevisibilidade, causados, por exemplo, pela distância entre o local da contratação e o da execução da viagem ou o contacto com novas realidades económicas, sociais e culturais, tem como consequência um risco acrescido para os turistas, risco que, de certo modo, é proporcional aos benefícios económicos que a agência retira da organização deste tipo de viagens.
Por outro, lado, pretendeu também o legislador conferir ao cliente/turista uma tutela mais eficaz dos seus direitos. Ocorrendo a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso durante a execução da viagem, muitas vezes realizada no estrangeiro, tornava-se, na prática, difícil que o cliente reclamasse a indemnização aos prestadores dos serviços, no que era sucessivamente confrontado com obstáculos de ordem burocrática, económica e até jurídica. Agora, é mais cómoda a posição do cliente e mais eficaz a efectiva reparação dos prejuízos causados, uma vez que pode accionar, directamente, a agência organizadora pelos prejuízos sofridos durante a execução “.
De resto,
Quando a agência de viagens e turismo propõe ao cliente a realização de determinado passeio ou evento, por si propagandeado – e que por ele se faz pagar –, deve assegurar-se, primeiro, da idoneidade da empresa a que recorre para o efeito, percebendo se está a proporcionar uma actividade minimamente segura ou se, ao invés, o está a encaminhar para um jogo de risco, servido por elementos escolhidos sem um rigoroso e selectivo critério, desqualificados ou absolutamente imaturos e inconscientes[13].
Ou seja, a proposta de participação no evento pressupõe a necessária garantia por parte da agência de viagens e turismo de que estarão reunidas, à partida, todas as condições gerais de segurança e, em especial, que o serviço estará entregue a pessoa de confiança, com sentido de responsabilidade acima da média.
Nem podia ser de outra forma.
Nenhum cliente no seu perfeito juízo – jovens ou seniores – poderia admitir ou aceitar que a sua participação neste passeio turístico constituísse uma perigosa e arriscada aventura, perante o total desconhecimento ou alheamento da agência de viagem e turismo quanto ao grau de elevado profissionalismo por parte de quem irá, no terreno, assumir o domínio do facto na condução automóvel que constituirá o meio de transporte dos turistas. 
Daí o fundamento substantivo para a responsabilização da Ré agência de viagens e turismo[14] relativamente aos danos pessoais e patrimoniais sofridos pela A., assente, basicamente, no brocardo ubi commoda ibi incommoda.
Assistir-lhe-á o pertinente direito de regresso, previsto no artigo 39º, nº 2 do Decreto-lei nº 209/97, de 13 de Agosto, podendo recuperar, junto da empresa de buggys brasileira[15], o montante indemnizatório que agora, em termos de responsabilidade objectiva, seja obrigada a despender[16].
2 – Contrato de seguro obrigatório. Cobertura da respectiva apólice. Exclusões de cobertura.
Alegou a apelante seguradora:
Tratando-se de um acidente que, ao abrigo da legislação brasileira, era objecto de um seguro obrigatório, o qual, ainda que não existisse, sempre seria ressarcível pela entidade ali existente e equiparada ao português Fundo de Garantia Automóvel, sempre essa responsabilidade da 1ª R. que, não concedendo, existisse estaria expressamente excluída do contrato de seguro ajuizado.
De resto, as condições gerais deste contrato foram, em execução do diploma sobre a actividade das agências de viagens, expressamente imposto às seguradoras a operarem em Portugal por Regulamento da entidade reguladora da actividade seguradora, com o que a ora recorrente não poderia ter contratado com a ora 1ª R. seguro com conteúdo diferente do que foi dado assente nos presentes autos, com o que nunca seria responsável, também por esta via, pelos danos da ora recorrida.
Apreciando:
Conforme salientado supra, a Ré segurada – agência de viagens e turismo - é responsável pelos efeitos lesivos provocados na pessoa e no património da A. em virtude da desastrada actuação do condutor do buggy, na execução do serviço turístico contratualizado pela primeira.
Responsabilidade que foi transferida para a Ré seguradora – constituindo a celebração deste tipo de seguro uma obrigação legal[17].
Conforme resulta do objecto de cobertura do contrato de seguro, a fls. 91, a cobertura da apólice circunscreve-se à “ responsabilidade civil decorrente da actividade do segurado, na sua qualidade de agência de viagens e turismo, suas sucursais ou representantes legais “, garantindo : “ o pagamento das indemnizações que legalmente sejam exigíveis ao segurado, pelos danos patrimoniais e/ou não patrimoniais resultantes de lesões corporais e/ou materiais causados a clientes ou terceiros, decorrentes exclusivamente de acções ou comissões suas, dos seus representantes ou mandatários no âmbito da sua actividade definida nas Condições particulares “ ( artigo 3º ).
Por seu turno, no âmbito das exclusões previstas no artigo 6º prevê-se especificamente “ os danos causados por acidentes ocorridos com meios de transporte que, nos termos da lei, devam ser objecto de seguro obrigatório de responsabilidade civil “( cfr alínea f) ).
Verificar-se-á, in casu, portanto, a exclusão de cobertura da apólice consignada nesta alínea f), com a consequente exoneração de qualquer responsabilidade por parte da Ré seguradora, ora apelante?
A resposta terá, a nosso ver, que ser negativa.
Com efeito,
Trata-se, como se disse, de um seguro obrigatório, imposto pelo artigo 50º, do Decreto-lei nº 209/97, de 13 de Agosto[18].
As respectivas exclusões encontram-se consignadas no artigo 51º do mesmo diploma legal onde se prevê, em termos de tipicidade, as seguintes previsões :
- os danos causados aos agentes ou representantes legais das agências ( artigo 51º, nº 1, alínea a) ) ;
- os danos provocados pelo cliente ou por terceiro alheio ao fornecimento das prestações ( artigo 51º, nº 1, alínea a) ) ;
Admite a lei, excepcionalmente, que possam ser excluídos da cobertura do seguro :
- os danos causados por acidentes ocorridos com meios de transporte que não pertençam à agência, desde que o transportador tenha o seguro exigido por aquele meio de transporte ( artigo 51º, nº 2, alínea a) ) ;
- As perdas, deteriorações, furtos ou roubos de bagagens ou valores entregues pelo cliente à guarda da agência ( artigo 51º, nº 2, alínea b) ).
Daqui resulta que
para a Ré seguradora se eximir à sua responsabilidade fundada no contrato de seguro obrigatório, haveria que ter alegado e provado, não que “ o veículo estava obrigado a ter seguro obrigatório de responsabilidade civil “ ( cfr. artigo 13º da sua contestação ), mas que a responsabilidade civil emergente da circulação daquela viatura se encontrava efectivamente coberta através de contrato de seguro válido e eficaz[19].
O que a Ré seguradora não fez[20].
Não releva, para este efeito, que o Regulamento nº 12/99, de 29 de Abril de 1999, publicado no Diário da República, II Série, nº 113, pag. 7259, do Instituto de Seguros de Portugal, tenha aprovado as condições uniformes do seguro obrigatório de responsabilidade civil das agências de viagens e turismo, nelas incluindo a exclusão consistente nos “ danos causados por acidentes ocorridos com meios de transporte que, nos termos da lei, devam ser objecto de seguro obrigatório de responsabilidade civil “ ( artigo 6º, alínea f) do respectivo Anexo ).
Saliente-se que
O artigo 51º, nº 2, alínea b) do Decreto-lei nº 209/97, de 13 de Agosto – que prevalece na hierarquia das leis sobre o dito Regulamento – é claro e peremptório ao permitir, como causa de exclusão da responsabilidade neste seguro obrigatório, apenas as situações em que, não pertencendo os meios de transporte à agência ( como sucede ), o transportador ( in casu a empresa brasileira dos ditos buggys ) tivesse efectivamente o seguro exigido para aquele meio de transporte.
O que significa que nenhum contrato de seguro obrigatório respeitante à transferência da responsabilidade das agências de viagens e turismo pode conter uma cláusula de exclusão de cobertura que pressuponha menos do que o especialmente exigido pela disposição legal em referência, de cariz imperativo e incontornável.
O que se compreende, uma vez que a causa de exclusão assenta basicamente na existência, cumulativa, de dois seguros acautelando o ressarcimento do mesmo tipo de danos – e não na concorrência entre um seguro ( o assumido pela Ré ) e uma hipotética e incerta cobertura a fornecer pela seguradora que a empresa dos buggys sita no Nordeste Brasileiro pode ter, ou não, contratado[21].
Trata-se de um garantia fundamental estabelecida em favor do cliente/consumidor[22] que não pode ser, deste modo, desvalorizada ou menorizada[23].
Não se verifica, portanto, qualquer causa de exclusão relevante quanto à cobertura da presente apólice, competindo à Ré seguradora o pagamento das indemnizações em apreço, em virtude da oportuna transferência de responsabilidade que incumbia à agência de viagens e turismo.
A apelação improcede, portanto.

IV - DECISÃO : 
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela apelante.

Lisboa, 24 de Fevereiro de 2015.

 
( Luís Espírito Santo ).
                                               
( Gouveia Barros ).
             
( Conceição Saavedra ).

[1] Embora só a Ré seguradora haja recorrido da sentença proferida em 1ª instância ( contra-alegando a co-Ré, em sentido oposto, relativamente à matéria da exclusão de cobertura da apólice ), o certo é que o presente recurso aproveita à co-Ré agência de viagens e turismo, nos termos gerais do artigo 634º, nº 1 do Código de Processo Civil.
[2] Sobre as figuras das “ viagens organizadas, férias organizadas e circuitos organizados “ vide o desenvolvido acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24 de Junho de 2008 ( relatora Maria do Rosário Morgado ), publicado in www.dgsi.pt e ainda acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Outubro de 2008 ( relator Pires da Rosa ), publicado in www.dgsi.pt ; acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 6 de Dezembro de 2011 ( realtor Artur Dias ), publicado in www.dgsi.pt ; acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12 de Janeiro de 2012 ( relator Luís Mendonça ), publicado in Colectânea de Jurisprudência, Ano XXXVII, Tomo I, pags 78 a 81.
[3] O Decreto-lei nº 209/97, de 13 de Agosto ( alterado pelo Decreto-lei nº 12/99, de 11 de Janeiro ), veio a ser objecto de modificação operada pelo Decreto-lei nº 263/2007, de 20 de Julho, que entrou em vigor no dia 21 de Julho de 2007 ( vide artigo 7º ). Por sua vez o Decreto-lei nº 61/2011, de 6 de Maio, entrado em vigor em 5 de Junho de 2011, estabeleceu o novo regime das agências e turismo, tendo o respectivo artigo 48º revogado o Decreto-lei nº 209/97, de 13 de Agosto. Este diploma veio a sofrer as alterações decorrentes do Decreto-lei nº 199/2012, de 24 de Agosto ( que o republicou ). Atendendo à data da ocorrência do sinistro – 10 de Abril de 2006 – é o Decreto-lei nº 209/97, de 13 de Agosto – na versão primitiva - o diploma aplicável.
[4] E que se mantém actualmente no Decreto-lei nº 61/2011, de 6 de Maio ( artigo 29º, nº 2 ), com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei nº 199/2012, de 24 de Agosto, não tendo sido objecto de substancial modificação pelo Decreto-lei nº 263/2007, de 20 de Julho.
[5] Isto é, independentemente de culpa, constituindo uma das situações pontuais, legalmente previstas, de responsabilidade objectiva ( cfr artigo 483º, nº 2 do Código Civil ).
[6] Pelo que não existem dúvidas de que, em termos de normas de conflitos, é aplicável, à análise e valoração da situação sub judice, a lei portuguesa, em conformidade com o disposto no artigo 42º, nº 1 do Código Civil.
[7] Versando sobre uma situação de exoneração da responsabilidade da agência de viagens apenas devido ao facto do causador do evento ter sido um terceiro estranho ao fornecimento da prestação a cargo daquela ( condutor de veículo que, seguindo em contramão, veio a embater no mini-bus alugado onde iam os turistas ), vide acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13 de Outubro de 2009 ( relator João Proença ), publicado in www.dgsi.pt.
[8] Sendo certo que, conforme sublinham Pires de Lima e Antunes Varela in “ Código de Civil Anotado “, Volume II, pag. 57 : “ A responsabilidade limita-se aos actos praticados no cumprimento da obrigação, não abrangendo os actos praticados por ocasião do cumprimento, mas nada tendo com este “.
[9] Normalmente ligados contratualmente a empresa locais, sitas no estrangeiro.
[10] O que se coaduna logicamente com a circunstância de se haver previsto na alínea b) do nº 4 do artigo 39º do Decreto-lei nº 209/97, de 13 de Agosto - em termos de excepção - que a agência de viagens e turismo já não responderá se o incumprimento se tiver ficado a dever à acção de terceiro alheio ao fornecimento das prestações previstas no contrato.
[11] Versando situações de cumprimento defeituoso no âmbito da realização da prestação de serviço turístico, vide acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 6 de Dezembro de 2011 ( relator Manuel Artur Dias ), publicado in www.dgsi.pt e acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12 de Janeiro de 2012 ( relator Luís Mendonça ), publicado in Colectânea de Jurisprudência, Ano XXXVII, Tomo I, pags 78 a 81.
[12] Este passeio turístico – prestação a que a Ré se obrigou - foi realizado de modo totalmente contrário ao que era suposto ser: um momento de descontracção, divertido e animado, e não de pura e insana irresponsabilidade pelo inadmissível desvario do condutor do buggy que colocou em sério risco a integridade física - e a própria vida - dos participantes.
[13] Constituindo, nesta vertente, um afloramento da responsabilidade por culpa in elegendo, com a assunção dos riscos dos auxiliares escolhidos para a realização das tarefas, enquanto se consubstanciarem no concreto desenvolvimento do contrato em causa. Sobre este ponto, vide acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 3 de Julho de 2008 ( relator Bernardo Domingos ), publicitado in www.jusnet.pt
[14] Que será devidamente balizada através da fixação de limites máximos impostos ao cálculo das indemnizações a pagar, obviando à sua responsabilidade ilimitada por danos elevadíssimos e desproporcionados aos benefícios da agência, resultantes de acidentes de enorme dimensão e consequências catastróficas. Neste preciso sentido, vide artigo 30º do Decreto-lei nº 61/2011, de 6 de Maio, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei nº 199/2012, de 24 de Agosto.
[15] Ou da eventual seguradora ou de outra entidade oficial responsável.
[16] E cuja obrigação de pagamento transferiu para a respectiva seguradora, ora co-Ré, por imposição legal.
[17] Vide artigo 41º, nº 1 do Decreto-lei nº 209/97, 13 de Agosto, onde se prevê que, para garantia da sua responsabilidade perante os clientes emergente da sua actividade própria, as agência de viagens e turismo devem prestar uma caução e efectuar o competente seguro. A propósito do carácter cumulativo ( e não exclusivo) destas duas garantias, leia-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26 de Maio de 2011 ( relatora Maria Catarina Manso ), publicado in www.dgsi.pt.
[18] O regime fixado pelo Decreto-lei nº 61/2011, de 6 de Maio - com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei nº 199/2012, de 24 de Agosto - neste tocante, é rigorosamente igual ( vide artsº 35º a 36º ).
[19] Vide, versando uma situação de facto similar à discutida nos presentes autos, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de Junho de 2011 ( relator Lopes do Rego ), no qual ficou assente a responsabilidade da seguradora brasileira de buggys, devidamente identificada e citada nesses autos.
[20] Competindo-lhe o respectivo ónus, nos termos gerais do artigo 342º, nº 2 do Código Civil.
[21] Sendo, para este efeito, irrelevante apurar se no país em que o acidente ocorreu existe ou não uma entidade com funções análogas ao Fundo de Garantia Automóvel português. O que a lei exige – por via da transposição da Directiva Comunitária citada –, para efeitos de exclusão da cobertura do seguro, é que a responsabilidade civil em relação ao veículo causador do acidente esteja transferida e salvaguardada por via da vigência concreta de um contrato de seguro. Não menos do que isso.
[22] Concretizando a orientação programática plasmada no artigo 60º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.
[23] O actual Decreto-lei nº 61/2011, de 6 de Maio, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei nº 199/2012, de 24 de Agosto, criou a figura do Fundo de Garantia de Viagens e Turismo ( FGVT ) que “ responde solidariamente pelo pagamento dos créditos de consumidores decorrentes do incumprimento de serviços contratados às agências de viagens e turismo “ ( respectivo artigo 31º ). Vide, sobre a constituição do FGVT, a Portaria nº 224/2011, de 3 de Junho.

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