Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
12475/18.7T8SNT-A.L1-8
Relator: LUÍS CORREIA DE MENDONÇA
Descritores: PENHORA DE CASA DE MORADA DE FAMÍLIA
EXECUÇÃO FISCAL
DUPLA PENHORA
SUSTAÇÃO DA EXECUÇÃO
VENDA DO BEM PENHORADO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/12/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. Depois da Lei n.º 13/2016, de 23 de maio, a venda judicial da casa de habitação permanente do executado passou a ter particulares restrições.
2. A protecção da habitação do executado apenas se faz nos casos em que se sacrifica a posição do fisco, mas não a dos demais credores.
3. Pendendo duas execuções contra o mesmo executado, com sucessivas penhoras em cada uma delas do mesmo imóvel, de valor patrimonial tributário não superior a € 574.323,00 efectivamente afecto à habitação do devedor, e do seu agregado familiar, e sendo a penhora fiscal a primeira penhora em tempo, a Administração Fiscal não pode promover, nos casos aí contemplados, a venda desse bem, mas o artigo 244.º, 2, do CPPT não impede que um credor que nesse processo tenha reclamado o seu crédito promova essa venda dado que se encontra em situação similar à prevista no art.º 850º, n.º 2, do C. P. Civil.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

A moveu execução contra B e outros.
No decurso do processo o exequente requereu o seguinte:
1. Nos vertentes autos foi penhorado o imóvel hipotecado ao Exequente, imóvel este também penhorado à ordem da Fazenda Nacional, e onde o Exequente já reclamou os seus créditos.
2. Conforme dispõe a Lei nº 13/2016, de 23 de Maio, sendo penhorado, em execução fiscal, bem imóvel que corresponda a habitação própria e permanente do Executado, não há lugar à realização da venda na execução fiscal.
3. Tal disposição só não será aplicável quando o valor patrimonial tributário dos imóveis seja superior a € 574.323,00, o que não é o caso dos vertentes autos.
4. Em suma, a Lei em vigor estabelece um impedimento legal à venda dos imóveis que se encontrem nestas circunstâncias.
5. Contudo, tem-se verificado uma alteração do paradigma dos Tribunais quanto à pendência de penhoras fiscais, tendo a jurisprudência vindo a entender que os autos devem prosseguir com as diligências tendentes à venda dos imóveis, procedendo-se à citação da Autoridade Tributária para reclamar créditos.
6. Assim, sendo o imóvel em causa o domicilio fiscal do executado, é a situação enquadrável nas disposições da lei nº 13/2016 de 23 Maio, no que refere à proteção da casa de morada de família, no âmbito de processos de execução fiscal, impedindo a venda executiva por parte da Administração Tributária e Aduaneira (AT) nos termos do artigo 244º nº 2 do CPPT.
7. Tal situação é claramente lesiva dos interesses do Exequente, bem como dos interesses dos Executados, uma vez que a execução está sustada quanto ao imóvel e na execução fiscal há um impedimento legal à realização da venda, do imóvel hipotecado e penhorado, mantendo-se a penhora da Fazenda Nacional apenas como mera garantia do crédito fiscal, sem quaisquer outras consequências processuais, pois a venda não se irá realizar.
8. Na verdade, de acordo com jurisprudência do STA, está vedado ao Reclamante requerer o prosseguimento da execução e as diligências de venda (vide Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 3 de Fevereiro de 2016, in www.dgsi.pt).
9. Como é unanimemente reconhecido pela Jurisprudência dos nossos Tribunais, a sustação só faz sentido quando a execução para a qual o Exequente é remetido, está em andamento e em termos normais, permitindo-lhe o reconhecimento do crédito e seu pagamento em tempo razoável.
10. A ratio legis do art.º 794.º do CPC tem subjacente razões de certeza jurídica e proteção dos devedores e dos credores, postulando que ambas as execuções se encontrem numa situação de dinâmica processual.
11. Como demonstrado, tal não está a suceder, o que implica inclusivamente uma negação da cobrança do crédito exequendo pela impossibilidade de satisfação do credor atingido pela sustação.
12. Aliás poderemos estar perante a afronta ao direito de propriedade privada constitucionalmente garantido e a garantia do credor à satisfação do seu crédito (artº 62, nº 1 da CRP) tornando, pelo menos, desproporcionadamente mais difícil ou onerosa a satisfação do direito do Exequente (com violação do artº 18º da CRP).
13. Assim, não se verifica o circunstancialismo do artº 794º, nº 1 do CPC (pendência de duas ou mais execuções dinâmicas sobre o mesmo bem), pelo que tem o Exequente direito a requerer o prosseguimento da presente execução, o que desde já se requer, citando-se os credores, designadamente a Autoridade Tributária, para, querendo, vir reclamar os seus créditos, assim se assegurando que o credor não é prejudicado com o prosseguimento dos autos, apesar da penhora anterior registada a seu favor.
14.Tendo em conta que a Autoridade Tributária sempre será citada para reclamar créditos, os seus direitos não serão prejudicados com o prosseguimento dos autos.
15. Assim e em face do exposto requer-se a V. Exa. se digne autorizar o prosseguimento dos autos para venda do imóvel penhorado’’.
Sobre tal requerimento foi proferido o seguinte despacho:
Assiste ao exequente beneficiário da penhora posterior o direito de reclamar o seu crédito na execução fiscal onde o bem foi previamente penhorado, e, nessa qualidade, aí promover a venda do mesmo, por aplicação (subsidiária), com as devidas adaptações, do disposto no artigo 850.º, n.º 2, do CPC (neste sentido, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13/11/2019, proferido no processo n.º 7389/17.0T8CBR, e jurisprudência aí citada).
Acresce que, caso a Administração Tributária não acolha um tal entendimento da lei – a única que se afigura capaz, no quadro legal, de permitir à exequente ultrapassar a situação de impasse em que se encontra e assegurar a efectiva tutela jurisdicional do seu direito fundamental de propriedade –, sempre assiste a esta o direito de sindicar, em sede de execução fiscal, pelos meios legalmente previstos, interpretação que a tanto obste.
Ora, estando os direitos da exequente desse modo acautelados, não há que determinar o prosseguimento da execução para venda de imóvel onerado com penhora anterior, em violação do que expressamente decorre do artigo 794.º, n.º 1, do CPC.
Pelo exposto, indefiro o requerido’’.
Inconformado, interpôs o exequente competente recurso, cuja minuta concluiu da seguinte forma:
“A) O presente recurso vem interposto do despacho que indeferiu o prosseguimento dos vertentes autos e o levantamento da sustação da execução, com vista à venda do imóvel penhorado, por existir penhora anterior registada a favor da Fazenda Nacional.
B) Nos vertentes autos foi executado um contrato de mutuo com hipoteca, e nessa sequência foi penhorado a favor do aqui Recorrente, o imóvel dado em garantia.
C) O imóvel em causa constitui habitação permanente do Executado.
D) Tal imóvel encontrava-se já penhorado à ordem da Fazenda Nacional, razão pela qual a execução foi sustada nos termos do artº 794º nº 1 do CPC, tendo o Recorrente apresentado a sua reclamação de créditos junto do processo de execução fiscal nº 3549201201285394, que corre termos no Serviço de Finanças de Sintra 2.
E) Perante a falta de andamento do processo de execução fiscal, cuja penhora se encontra registada desde 16/12/2015, o Recorrente insistiu, por várias vezes telefonicamente para saber quando iria o processo avançar para venda, mas sem qualquer sucesso.
F) Em 15/06/2020, foi enviado um email ao Serviço de Finanças, tendo recebido a seguinte resposta:
“Em resposta ao solicitado, informa-se que se mantêm válidos os pressupostos que originaram a penhora no processo 3549201201285394 e apensos, instaurado contra Luis Filipe Silva Pinto – NIF 225813157. Não foi marcada a venda. Não há previsões acerca de diligências futuras…”, conforme documento que se junta e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os demais efeitos legais.
G) Em Maio de 2016 entrou em vigor a Lei nº 13/2016 de 23 de Maio, que prevê que sendo penhorado em execução fiscal bem imóvel que corresponda a habitação própria e permanente do Executado, não há lugar à realização da venda na execução fiscal.
H) Tal disposição só será aplicável quando o valor patrimonial dos imoveis seja superior a € 574.000,00, o que não é o caso dos presentes autos,
I) Ou seja, a nova Lei vem estabelecer um impedimento legal à venda dos imóveis que se encontrem nessas circunstâncias.
J) Face ao exposto, está o Recorrente numa situação de impasse, não podendo obter nem por via dos vertentes autos, nem por via da execução fiscal, o pagamento da divida hipotecária.
K) Requereu assim, o Recorrente, que o Tribunal a quo reconhecendo o impedimento legal à realização da venda nas Finanças, levantasse a sustação e ordenasse o prosseguimento da execução, por não se verificar o circunstancialismo do artº 794º, nº 1 do CPC (pendencia de duas ou mais execuções dinâmicas sobre o mesmo bem).
L) Reforçando ainda que Autoridade Tributária sempre será citada para reclamar créditos, os seus direitos não serão prejudicados com o prosseguimento da execução.
M) O Tribunal a quo indeferiu o requerido, invocando que “assiste ao exequente beneficiário da penhora posterior o direito de reclamar o seu crédito na execução fiscal onde o bem foi previamente penhorado, e, nessa qualidade, aí promover a venda do mesmo, por aplicação (subsidiária), com as devidas adaptações, do disposto no artigo 850.º, n.º 2, do CPC..”
E continua
N) “Acresce que, caso a Administração Tributária não acolha um tal entendimento da lei – a única que se afigura capaz, no quadro legal, de permitir à exequente ultrapassar a situação de impasse em que se encontra e assegurar a efectiva tutela jurisdicional do seu direito fundamental de propriedade –, sempre assiste a esta o direito de sindicar, em sede de execução fiscal, pelos meios legalmente previstos, interpretação que a tanto obste”.
O) O CPPT não prevê qualquer possibilidade de a execução prosseguir por impulso do reclamante com garantia real em situação semelhante à dos autos, contrariamente ao defendido pelo tribunal
a quo.
P) Se assim fosse o art. 244º do CPPT teria essa previsão, tal como se prevê a possibilidade do próprio executado fazer cessar este impedimento legal no seu nº6.
Q) A referida disposição legal é omissa quanto à cessação do impedimento legal de venda a requerimento de outro credor reclamante.
R) Estando suspensa a execução fiscal, não pode funcionar o regime previsto no nº 1 do art.º 794º do CPC, que tem como pressuposto a ausência de qualquer impedimento legal ao prosseguimento normal da execução fiscal e venda do bem penhorado;
S) O art.º 244º do CPPT encontra-se inserido na Secção VIII, sob a epígrafe “Da convocação dos credores e da verificação dos créditos”, o que constitui um elemento sistemático de interpretação que não pode ser ignorado, donde se infere que nada vale reclamar na execução fiscal o crédito se a sua satisfação só poderia ser obtida pela venda do imóvel hipotecado, venda que está expressamente interdita na execução fiscal.
T) A regra da preferência resultante da penhora (art.º 822º do Código Civil) não pode impedir a venda do imóvel no processo onde a penhora é posterior, visto que a Autoridade Tributária pode reclamar o seu crédito nesta execução (art.º 786º do CPC), sendo o seu crédito graduado no lugar que lhe competir.
U) Neste sentido já se pronunciaram o Tribunal da Relação de Évora em 02/07/2018, no âmbito do processo nº 893/12; o Tribunal da Relação de Coimbra em 26/09/2017, no âmbito do processo nº 1420/16; Tribunal da Relação de Guimarães em 30/05/2019, no âmbito do processo nº 2677/10.0TBGMR.G1 e Tribunal da Relação do Porto, em 22/10/2019, no âmbito do processo nº 8590/18.5T8PRT-B.P1.
V) Aliás o próprio Venerando Tribunal da Relação de Lisboa (proc. nº 2270/07.4TBVFX-B.L1-7), refere que a tese supra defendida, “… foi sancionado pelo Tribunal Constitucional que, nos Acórdãos nºs. 610/2017 e 329/2019, bem como na decisão sumária nº 728/2018, considerou que o artigo 244.º, n.º 2, do CPPT, configura um impedimento à venda judicial do imóvel penhorado no âmbito do processo de execução fiscal, mas não nos autos de execução comum”.
W) A ratio legis do art.º 794º nº 1 do CPC prende-se com a necessidade de evitar que sobre o mesmo bem recaiam duas vendas ou adjudicações, pretendendo-se que a liquidação seja uma só, por razões de certeza e de proteção das partes.
X) Pressupondo que as execuções se mostrem ativas e dinâmicas, o que não sucede com a execução fiscal, conforme já demonstrado (email do Serviço de Finanças ora junto).
Y) Para que este preceito tenha efeito útil a primeira execução deve estar em movimento; no caso de a execução à ordem da qual foi registada a primeira penhora ficar “parada” por qualquer razão, deve a “segunda” execução prosseguir.
Z) Pelo exposto impunha-se que a presente execução prosseguisse os seus termos, relativamente ao imóvel penhorado, porquanto não se justifica a sustação da execução no caso concreto.
AA) Quando não se atende ao caso concreto surgem situações de denegação de justiça- o que se verifica.
BB) A não se admitir o prosseguimento da execução nos casos em que há um impedimento legal à venda do imóvel nas execuções fiscais, são postos em crise os princípios constitucionais da proporcionalidade e da garantia do direito à propriedade privada, previstos nos artigos 18º, nº 2 e 62º, nº 1 da Constituição, isto na medida em que o Recorrente fica sujeito a uma intolerável compressão do exercício dos seus direitos, nomeadamente do direito à satisfação do seu crédito, indelevelmente ligado ao direito à propriedade privada, sendo que, por outro lado, sempre ficaria sujeito às vicissitudes próprias da suspensão da execução fiscal, determinada pelo impedimento legal à venda do imóvel, sem que, quanto a essas, tenha a possibilidade de , por via dos competentes mecanismos legais, promover ou requerer o prosseguimento.
CC) O propósito deste princípio é a proteção da confiança dos cidadãos na ordem jurídica e na atuação do Estado, prevendo a proteção da certeza e segurança jurídicas e das expetativas legitimamente formadas.
Termos em que deverá o presente recurso proceder, por provado, e, em consequência, ser revogado o despacho proferido, substituindo-se por outro que determine o levantamento da sustação da execução com vista à venda, do imóvel penhorado e citação da Fazenda Nacional para reclamar os seus créditos, rateando-se o produto da venda em conformidade com o que for determinado na sentença de graduação.
Fazendo-se assim a Costumada JUSTIÇA!’’.
Não foram oferecidas contra-alegações.
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Constitui questão decidenda saber se a execução cível deve prosseguir os seus termos ou se pelo contrário o exequente deve procurar obter junto da execução fiscal a tutela dos seus direitos.
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Depois da Lei n.º 13/2016, de 23 de maio, a venda judicial da casa de habitação permanente do executado passou a ter particulares restrições.
Preceitua, com efeito, o artigo 244.º do CPPT, na redacção que lhe foi dada pela referida lei
1 - A venda realiza-se após o termo do prazo de reclamação de créditos.
2 - Não há lugar à realização da venda de imóvel destinado exclusivamente a habitação própria e permanente do devedor ou do seu agregado familiar, quando o mesmo esteja efetivamente afeto a esse fim.
3 - O disposto no número anterior não é aplicável aos imóveis cujo valor tributável se enquadre, no momento da penhora, na taxa máxima prevista para a aquisição de prédio urbano ou de fração autónoma de prédio urbano destinado exclusivamente a habitação própria e permanente, em sede de imposto sobre as transmissões onerosas de imóveis.
4 - Nos casos previstos no número anterior, a venda só pode ocorrer um ano após o termo do prazo de pagamento voluntário da dívida mais antiga.
5 - A penhora do bem imóvel referido no n.º 2 não releva para efeitos do disposto no artigo 217.º, enquanto se mantiver o impedimento à realização da venda previsto no número anterior, e não impede a prossecução da penhora e venda dos demais bens do executado.
6 - O impedimento legal à realização da venda de imóvel afeto a habitação própria e permanente previsto no n.º 2 pode cessar a qualquer momento, a requerimento do executado.
Este novo regime não abrange as situações em que as pessoas têm as suas casas hipotecadas à banca e que se viram privados de meios que lhes permitam satisfazer os seus compromissos. Estas últimas situações carecem de solução diferente que ainda não foi dada.
Quer isto dizer que a protecção da habitação do executado apenas se faz nos casos em que se sacrifica a posição do fisco, mas não a dos demais credores.
Se outro fosse o entendimento e se se tivesse sem mais proibido a venda de imóveis penhorados nas execuções cíveis, levantar-se-iam delicados problemas de eventuais inconstitucionalidades, designadamente por violação dos princípios constitucionais de proporcionalidade (artigo 18.º,2, CRP) da garantia do direito de propriedade (artigo 62.º, 1) e do direito de acesso à justiça (artigo 20.º CRP).
Pendendo duas execuções contra o mesmo executado, com sucessivas penhoras em cada uma delas do mesmo imóvel, de valor patrimonial tributário dos imóveis não superior a € 574.323,00 efectivamente afecto à habitação do devedor, e do seu agregado familiar, e sendo a penhora fiscal a primeira penhora em tempo, como obstar ao impedimento da venda?
Para uns, “estando suspensa a execução fiscal, não pode funcionar o regime previsto no nº 1 do art.º 794º do CPC, que tem como pressuposto a ausência de qualquer impedimento legal ao prosseguimento normal da execução fiscal e venda do bem penhorado’’. Deve pois a venda realizar-se na execução civil, com possibilidade de o fisco aí reclamar os seus créditos. É esta a tese do recorrente e dos Acórdãos que cita.
Para outros, o citado art.º 244º, n.º 2 tem de ser interpretado no sentido de que a Administração Fiscal não pode promover, nos casos aí contemplados, a venda desse bem, mas não impede que um credor que nesse processo tenha reclamado o seu crédito promova essa venda dado que se encontra em situação similar à prevista no art.º 850º, n.º 2, do C. P. Civil,
Aderimos a esta interpretação que se encontra sufragada v.g. pelos  Acórdãos da Relação de Coimbra de 24.10.2017, processo n.º 249/13.6TBSPS-A.C1, e de 13/11/2019, processo n.º 7389/17.0T8CBR, www,dgsi.pt, a única que se compagina com o estatuto do credor prioritário ( prior in tempore potior in jure ) estatuto que decorre, entre outros, dos artigos 822º do C. Civil e do disposto no art.º 794º n.º 1, do C. P. C. e com o princípio da economia processual.
Esta é também a posição de Miguel Teixeira de Sousa em comentário ao Ac. STJ de 23.01.2020 (blog IPPC, 10.11.2020) que escreve:
3. [Comentário] a) Em termos práticos, a oposição entre as duas orientações em confronto não é grande, porque tudo se resume a saber em que execução -- se na fiscal, se na cível -- se vai realizar a venda do imóvel penhorado.
Certo é, no entanto, que, também sob o ponto de vista prático, é muito mais simples considerar que o disposto no art. 244.º, n.º 2, CPPT não impede que o particular reclamante venha a obter a satisfação do seu crédito na execução fiscal (que está -- se assim se pode dizer -- "activa") do que entender que este particular está impedido de obter essa satisfação nessa execução e que, por isso, há que levantar a suspensão da execução cível que tinha determinada pelo estabelecido no art. 794.º, n.º 1, CPC. Na primeira situação, tudo se passa numa execução e não se desaproveita nada do que nela foi realizado; na segunda, há que operar em duas execuções, dado que se desaproveita a reclamação de créditos deduzida na execução fiscal e a Autoridade Tributária tem de reclamar o seu crédito na execução cível.
Sendo assim, a economia processual leva a adoptar a orientação contrária àquela que foi assumida no acórdão do STJ. No sentido preferível decidiu RC 25/5/2020 (367/16.9T8CVL-C.C1).
b) A latere, note-se que, se se verificar a venda do imóvel na execução fiscal, nada obsta a que o crédito da Autoridade Tributária seja pago de acordo com a sua graduação. O que o regime legal impede é que a Autoridade Tributária promova a venda do imóvel para pagamento de um crédito próprio; mas nada obsta a que, uma vez reclamado um crédito na execução fiscal e nela vendido o imóvel, o crédito da Autoridade Tributária seja pago. O regime legal visa proteger o devedor perante a Autoridade Tributária, e não a favorecer um credor desse mesmo devedor através da renúncia à satisfação do crédito fiscal por essa Autoridade.
Não se encontrando o exequente impedido de exercer o direito a ver satisfeito o seu crédito através da penhora do bem imóvel que se encontra penhorado na execução fiscal, podendo fazer prevalecer o seu direito
à venda nesse processo, é de concluir que a decisão impugnada, que não padece de qualquer vício de inconstitucionalidade, deve ser confirmada.

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Pelo exposto acordamos em julgar improcedente a apelação e, consequentemente, em confirmar a decisão impugnada.
Custas pelo recorrente.
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12.11.2020
Luís Correia de Mendonça
Maria Amélia Ameixoeira
Rui Moura