Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1913/18.9T8PDL.L2-2
Relator: ARLINDO CRUA
Descritores: PREFERÊNCIA LEGAL
ACÇÃO DE PREFERÊNCIA
PRAZO DE CADUCIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/26/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I - Impugnando os Recorridos, em sede contra-alegacional, a decisão proferida sobre a matéria de facto, quer no corpo alegacional, quer nas conclusões, ainda que não formulem requerimento específico ou expresso no sentido de procederem a ampliação do âmbito do recurso, nos termos do nº. 2, do artº. 636º, do Cód. de Processo Civil, desde que cumpridos os demais pressupostos ou exigências recursórias, (maxime as enunciadas nos artigos 639º e 640º, do CPC), deve conhecer-se acerca da impugnação da matéria de facto apresentada ;
II - As exigências decorrentes do cumprimento da obrigação legal de preferência, nos termos do artº. 416º, do Cód. Civil, tem lugar antes da alienação da coisa objecto do direito de preferência, enquanto que a situação de recurso à acção de preferência, nos quadros do artº. 1410º, nº. 1, do mesmo diploma, já pressupõe uma situação de incumprimento na comunicação conducente à possibilidade de efectivação daquele direito ;
III – Efectivamente, para que se considerem cumpridas as legais exigências da comunicação inscrita no artº. 416º, urge transmitir ao preferente o projecto de venda e as cláusulas contratuais do negócio perspectivado ou a efectivar com terceiro, enquanto que o recurso ao artº. 1410º tem já por pressuposto o incumprimento daquele dever de comunicação, seja por que foi totalmente omitido, seja por que foi deficientemente cumprido, cerceando à esfera de conhecimento do preferente informações contratuais do acto projectado que as exigências de boa fé impunham e que permitiriam uma opção informada e esclarecida ao beneficiário da preferência ;
IV – Apenas nesta segunda situação se coloca a questão do prazo de caducidade no exercício da acção de preferência, computável a partir do momento em que o preferente postergado tenha tido conhecimento dos elementos essenciais da alienação já efectivada ou consumada ;
V - Estando-se perante uma venda executiva por negociação particular, resulta que a modalidade de pagamento e forma de alienação encontram-se legalmente reguladas, pelo que não se descortina que outros elementos, para além da identificação do adquirente e valor da venda, devessem chegar ao âmbito de conhecimento da Autora para que se pudesse concluir estar a mesma na posse da totalidade dos aludidos elementos essenciais da alienação ;
VI – Se à data da instauração da acção já se encontrava exaurido o prazo de seis meses inscrito naquele normativo, a computar desde a data em que a demandante preferente teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação, tal determina clara caducidade do direito de acção, atenta a inexistência de qualquer causa de suspensão ou interrupção de tal prazo, o que se traduz na verificação de excepção peremptória, conducente a juízo de absolvição do pedido.
Sumário elaborado pelo Relator – cf., nº. 7 do artº. 663º, do Cód. de Processo Civil
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]:
               
I – RELATÓRIO
1F……………., LDA., com sede na Rua ……………., Ponta Delgada, instaurou acção declarativa constitutiva, sob a forma de processo comum, contra:
- MASSA INSOLVENTE da sociedade W………………, LDA., representada pelo Administrador Judicial Dr. Francisco José Areias Duarte ;
- LUÍS ………….. e mulher MARIA …………….., residentes na Rua ………………, Ribeira Grande,
deduzindo o seguinte petitório:
a) Condenar-se os Réus (alienante e adquirente) a reconhecer à Autora o direito de preferência na aquisição do prédio identificado supra (i.e., na compra e venda formalizada por escritura pública de 20 de Outubro de 2017, outorgada no Cartório Notarial do Dr. Jorge Carlos Serro da Costa e Silva, do prédio urbano, em regime de propriedade total, composto pela Casa Alta destinada a Comércio, sito na freguesia de ………………., descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o número …………….., e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ……………, substituindo-o na mesma compra e venda, ao Réu comprador, nela passando a ocupar a posição deste);
b) Condenar-se os Réus a entregar imediatamente o prédio melhor identificado supra à Autora, assim se reconhecendo e declarando, com efeitos ex tunc, o direito exclusivo de propriedade daquela sobre este, mais se autorizando o cancelamento de quaisquer inscrições registrais incompatíveis com tal decisão, com todas as legais consequências”.
Alegou, em súmula, o seguinte:
- Em 01.08.2014, a Autora celebrou com a sociedade W…………, LDA., um contrato de arrendamento comercial, destinado à exploração de um estabelecimento comercial de farmácia, detido pela aqui Autora ;
- tendo esta, na qualidade de arrendatária, explorado o referido negócio no identificado locado, de forma ininterrupta e pública, desde essa data até ao presente (o contrato mantém-se vigente) ;
- sendo tal contrato referente ao prédio urbano, em regime de propriedade total, composto pela Casa Alta destinada a Comércio, sito na freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, na Rua ………………, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o número ………….., e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ………. ;
- em inícios do mês de Novembro de 2017, a Autora tomou conhecimento de que o referido prédio havia sido alienado no âmbito do processo de insolvência (entretanto decretada) da sociedade proprietária/senhoria ;
- porquanto o Réu Luís …………… estabeleceu contacto informal a comunicar que a renda devia ser, doravante, paga a si, agora na qualidade de novo senhorio, por força da mencionada aquisição pretensamente ocorrida em processo de liquidação da insolvente ;
- e, em Fevereiro de 2018, e por força de uma notificação judicial avulsa, que correu termos sob o processo n.º 260/18.0T8PDL (Tribunal Judicial da Comarca dos Açores – Juízo Local Cível de Ponta Delgada – Juiz 1), a Autora tomou conhecimento da pretensão do Réu Luís ………., que através daquele mecanismo, veio denunciar o contrato de arrendamento entre as partes, pelo que este cessará a sua vigência em 31.07.2018 ;
- Nessa mesma data, a Autora tomou igualmente conhecimento do preço da mencionada aquisição (€295.000,00), fazendo fé no teor do declarado na escritura de compra e venda lavrada no Cartório Notarial do Dr. Jorge Carlos Serro da Costa e Silva, celebrada em 20.10.2017 ;
- Ou seja, em inícios de Fevereiro de 2018, a Autora toma conhecimento de que o prédio de que é arrendatária, desde 01.08.2014, foi objecto de alienação ao Réu Luís ……….., em 20.10.2017, e pelo preço de €295.000,00, naquela data pretensamente liquidados ;
- A Autora nunca foi notificada, designadamente, pelo Sr. Administrador Judicial, na qualidade de representante da massa insolvente [proprietária do locado], nos termos e para os efeitos concretos do exercício do seu direito de preferência, de origem ou matriz legal, quanto à referida aquisição ;
- O que se imporia em face da antiguidade do contrato de arrendamento e seu integral conhecimento por aquele, ao que acresce, a sua própria subsistência na data da transmissão operada a favor do Réu adquirente.
Juntou vários documentos, tendo a acção sido proposta em 30/07/2018.
2 – Citados os Réus, vieram apresentar contestação, fazendo-o os Réus Luís …………… e mulher Maria ………………, em resumo, nos seguintes termos:
- por impugnação, aduzindo que em 28/07/2017, à data da abertura das propostas, a Autora não era sequer titular do direito de preferência de que se arroga, de origem legal, pois o contrato de arrendamento ainda não tinha completado 3 anos ;
- por excepção, atenta a caducidade do alegado direito de preferência, pois, à data da propositura da acção (30/07/2018), já havia decorrido prazo superior ao legalmente previsto para o exercício daquele direito ;
- da existência de efectiva renúncia do exercício do mesmo direito por parte da Autora, traduzida no seu comportamento de reconhecimento dos Réus contestantes como legítimos proprietários do imóvel em causa ;
- de efectivo abuso de direito da Autora, na modalidade de venire contra factum proprium, no exercício daquele direito, em contradição com o anterior comportamento de reconhecimento dos Réus como legítimos donos do imóvel.
Concluem, no sentido da “presente acção ser julgada improcedente, por não provada, e procedentes, por provadas as excepções alegadas pelos RR. e ainda que assim se não entenda, seja declarado e decretado pelo Tribunal que a Autora excede os limites impostos pela boa fé, em manifesto abuso de direito, devendo, pois, o R. ser absolvido do pedido formulado, com todas as consequências legais”.
3 – Veio igualmente contestar a Ré Massa Insolvente de W…………….., Lda., fazendo-o, em súmula, nos seguintes termos:
- por excepção, invocando a inadmissibilidade do recurso à acção de preferência, pois a Autora foi expressamente notificada para o exercício de tal direito e tinha-o de exercer no próprio acto de abertura das propostas, nos termos do artº. 819º, nº. 1, do Cód. de Processo Civil, o que não fez ;
- pelo que perdeu tal direito, não podendo assim prevalecer-se do disposto no nº. 4. do artº. 819º. do Cód. de Processo Civil, não podendo propor a presente acção de preferência ;
- Por excepção, invocando a caducidade do direito de agir, pois o prazo de 6 meses previsto no artº. 1410º, do Cód. Civil, terá tido, no seu limite, o seu termo inicial em 06/11/2017, expirando em 06/05/2018, pelo que à data da propositura da acção já havia caducado o direito de agir da Autora ;
- por impugnação, referenciando terem sido cumpridos pelo Administrador da Insolvência todos os trâmites legais atinentes ao cabal exercício do direito de preferência por parte da Autora, que o não exerceu no tempo e local devidos.
Conclui, no sentido de:
a) Ser julgada totalmente procedente a matéria de excepção relativa à inadmissibilidade de recurso à presente acção de preferência por parte da A., ao abrigo do disposto nos artigos 165º do CIRE e 819º, n.º 1, do CPC;
b) Quando assim se não entenda, ser julgada totalmente procedente a matéria de excepção relativa à caducidade do direito de agir da A., por decurso do prazo de 6 meses previsto no artigo 1410º do Código Civil;
c) Quando assim se não entenda, ser a acção julgada improcedente, por não provada;
em qualquer dos casos se absolvendo a Ré dos pedidos formulados pela A”.
4 – No exercício do contraditório, veio a Autora, a fls. 80 a 83, responder às contestações, pugnando no sentido das mesmas serem julgadas intempestivas e, subsidiariamente, caso assim não se entenda, improcedentes as excepções arguidas.
5 – Conforme despacho de fls. 85, foram consideradas tempestivas as contestações apresentadas, e designada data para a realização de audiência prévia, considerando-se a possibilidade de conhecer, no imediato, acerca das excepções peremptórias invocadas pelos Réus.
6 – Procedeu-se à realização da audiência prévia, na qual se proferiu saneador stricto sensu, fixou-se o valor da causa e determinou-se a suspensão da instância, por 10 dias, mediante requerimento das partes, com vista a lograrem obtenção de acordo (cf., acta de fls. 86 e 87).
7 – Findo tal prazo, sem que se lograsse obter transacção, em 28/02/2019, foi proferido saneador - sentença – cf., fls. 88 a 91 -, traduzindo-se o Dispositivo nos seguintes termos:
Em face do exposto, julgo a presente ação improcedente por não provada e, consequentemente, absolvo os Réus Massa Insolvente da Sociedade W………………, Lda. e Luís ………….. e Maria ……………..a do pedido deduzido nos autos pela Autora F………….., Lda.
Custas a cargo da Autora.
*
Registe e notifique”.
8 – Inconformada com o decidido, a Autora interpôs recurso de apelação, por referência à sentença prolatada.
9 – Conforme Acórdão deste mesmo Colectivo datado de 10/09/2020, decidiu-se o seguinte:
“A) julgar totalmente procedente a presente apelação, em que figura como Apelante/Recorrente F…………….., LDA.,, e como Apelados/Recorridos MASSA INSOLVENTE da sociedade W…………………, LDA. e LUÍS ……………… e mulher MARIA ……………… ;
B) consequentemente:
Ø revoga-se o saneador sentença apelado, no reconhecimento da Autora ser titular de direito legal de preferência, na data da outorga do instrumento de venda executiva (escritura pública de compra e venda), por negociação particular, do local arrendado - prédio urbano, em regime de propriedade total, sito na freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, na Rua ………………. descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o número ……………., e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ……….. ;
Ø determinando-se o ulterior prosseguimento da presente acção, de forma a conhecer-se acerca do pedido accional formulado pela Autora, com a prática dos actos considerados necessários e pertinentes pelo Tribunal a quo.
10 – Interpostas Revistas de tal decisão, foram as mesmas negadas, conforme douto Acórdão do STJ de 23/02/2021.
11 – Designada data para a realização da audiência de discussão e julgamento, veio esta a realizar-se conforme acta de 26/11/2021, na observância do legal formalismo.
12 – Em 07/12/2021, foi proferida sentença, em cujo Dispositivo consta o seguinte:
VI. Decisão
Pelo exposto, julgo a presente ação improcedente e, em consequência, absolvo os Réus dos pedidos contra si formulados.
*
Custas pela Autora.
*
Registe e notifique.”.
13 – Novamente inconformada com o decidido, a Autora interpôs recurso de apelação, no qual formulou as seguintes CONCLUSÕES (que ora se transcrevem na íntegra, corrigindo-se os lapsos de redacção):
A. O presente recurso é interposto da douta Sentença proferida em 07.12.2021, a qual
determinou improcedente a presente ação de preferência, absolvendo dos pedidos os Réus alienante e adquirente.
B. Ora, salvo o devido respeito pelo entendimento espelhado na sentença em crise, certo é que a Recorrente não se pode conformar com tal sufrágio e entende que a decisão em apreço incorreu em erro de julgamento e concomitante violação de lei.
C. Na verdade, o Tribunal entendeu erradamente que houve caducidade do direito de ação (proposta em 30.07.2018), renúncia ao direito de preferência e abuso do direito por banda da Autora, sendo certo que da prova produzida não é possível inferir tal raciocínio, mas antes o seu contrário,
D. Uma vez que resultou patente do julgamento que, e tal facto nevrálgico foi ignorado e não levado à matéria assente, foram os Réus adquirentes que unilateralmente romperam as negociações do arrendamento, sem qualquer justo motivo ou pertinente fundamento (em rigor, abandonando o acordo, sem nada dizer), quando as partes já haviam (até com a participação dos seus advogados) concluído a elaboração das respetivas minutas,
E. Logo, existindo má-fé negocial e concomitante abuso do direito, o mesmo só poderia ser imputado aos Réus adquirentes dado que ficou ostensivamente demonstrado, em sede de julgamento, que encetaram negociações que, mesmo já concluídas e finalizadas (faltando apenas a sua assinatura), nunca se quiseram comprometer e vincular,
F. De igual sorte, não apenas o abuso do direito pode legitimamente ser imputado (de forma exclusiva) ao comportamento dos Réus adquirentes, como em circunstância alguma, de boa-fé, podia o Tribunal ter entendido que houve qualquer renúncia ao direito de preferência,
G. Não só porquanto tal renúncia nunca foi assumida, conforme é exigência inequívoca da lei, e porque sobretudo foi a parte contrária (Réus adquirentes) que iludiram a Autora quanto à hipótese da solução do arrendamento,
H. Nesta conformidade, ao colocar a má-fé do lado da Autora e a imputar-lhe comportamento putativamente contraditório e conflituante (gerador do hipotético abuso do direito), o Tribunal desprezou completamente a factualidade efetivamente verificada, e de sentido inverso ou diametralmente oposto ao ocorrido; ou seja, foram os Réus adquirentes que iludiram a Autora quanto à hipótese do arrendamento que nunca para si pretenderam.
I. É assim, notória a falta de ética dos Réus adquirentes cujo único propósito consistiu em iludir a Autora quanto à possibilidade de ser ajustado entre ambos um arrendamento, pelo que invocar o abuso do direito daquela quando quis exercer o seu direito de preferência (estando em tempo de o fazer), configura, esse sim, um comportamento completamente contraditório e moral e legalmente reprovável e censurável.
J. Da mesma forma que a Autora foi iludida/ludibriada quanto ao conhecimento dos elementos do negócio, não tendo sido informada do momento da realização do mesmo, da data da outorga da escritura de compra e venda ou das condições do pagamento, ao ponto da própria escritura ter sido realizada, espantosa e injustificadamente, em Portugal continental.
K. Nos termos e para os efeitos do estatuído no artigo 640.º do CPC, importa, desde logo, identificar os concretos pontos da decisão da matéria de facto que foram incorretamente julgados.
15. No dia 26-03-2018, a Autora entregou aos Réus um documento denominado “CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS NÃO HABITACIONAIS POR PRAZO CERTO”, devidamente rubricado e assinado pela Autora, na qualidade de arrendatária”.
16. Não tendo os 2.ºs Réus aceite as cláusulas de tal documento, a Autora, a 02/04/2018, remeteu novo documento denominado “CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS HABITACIONAIS POR PRAZO CERTO” devidamente rubricado, carimbado e assinado pela Autora, na qualidade de arrendatária”.
L. Ora, o juízo do Tribunal merece censura pois neutraliza e ignora um facto muito relevante para a sorte do litígio, porque mais do que dar como provado que a Autora enviou minutas de arrendamento por si já devidamente assinadas,
M. Devia ter considerado dado como provado, até pela prova produzida em julgamento, que as partes haviam efetivamente acordado (no seio das negociações) naqueles exatos termos, e que faltando apenas a assinatura dos Réus adquirentes, estes por duas vezes recuaram no acordo já estabelecido (embora não formalizado do lado deles).
N. Neste sentido, o Tribunal, ao limitar-se a dar como provado que a Autora enviou minutas de contratos de arrendamento, passa ao lado do facto mais importante e fundamental consistente no acordo por elas firmado quanto àquelas exatas condições contratuais de relação locatícia.
O. Assim, o Tribunal devia ter considerado como provado que as partes, e por duas ocasiões, chegaram a acordo quanto aos termos do contrato de arrendamento, embora sem que os Réus adquirentes os tivessem assinado.
P. E a dar-se como provado tal facto jamais se poderia imputar qualquer abuso do direito à Autora no exercício do direito de preferência, porquanto aquela sempre agiu com total boa-fé e convencida que a outra parte estava a negociar imbuída do mesmo espírito e pretendendo selar um arrendamento.
Q. E conforme veremos infra, foram os Réus adquirentes que, sem qualquer explicação, reverteram o acordo já dado e fechado com a Autora, quanto a qualquer uma das versões dos contratos de arrendamento selados (e pela Autora até já assinados).
R. Ou seja, é aos Réus que pode ser, com legitimidade, imputado um comportamento censurável de contradição e oscilação, ora alimentando na Autora a expetativa que estaria protegida por um contrato de arrendamento, ora depois rompendo, sem motivo algum ou justificação dada, a assinatura e compromisso sobre tal relação locatícia.
S. Até porque, e os Réus adquirentes tinham plena consciência disso (cf. Doc. 14 junto com a contestação daqueles), a Autora, ao explorar uma atividade de farmácia, estava fortemente constrangida e condicionada quanto à continuidade do exercício da sua atividade,
T. Pois tal como ali se informa, de boa-fé, a parte contrária, e é do conhecimento público, a mudança de localização do estabelecimento comercial (farmácia) tem de cumprir com uma miríade de pressupostos e requisitos legais, de ordem pública,
U. E obviamente que os Réus adquirentes bem sabiam que a Autora, por explorar uma atividade de farmácia, estava fortemente condicionada, quanto ao futuro imediato da sua atividade, pela localização em que se inseria o seu estabelecimento comercial, necessitando de muito tempo para relocalizar-se, em face de todos os constrangimentos de natureza legal e de ordem pública inerentes a tal particular atividade económica.
V. E sabendo disso, os Réus adquirentes iniciaram e concluíram negociações, fechando-as, mas que nunca quiseram formalizar, mesmo depois da parte contrária ter assinado os contratos que correspondiam fielmente ao acordado por ambas.
W. Logo, não podem os Réus adquirentes vir (depois) culpabilizar e responsabilizar a Autora, se, tendo esta ponderado e refletido sobre a possibilidade de exercer o direito de preferência, em face da frustração do arrendamento – frustração dolosa e intencionalmente provocada, sem motivo, por eles, imputando-lhe qualquer abuso do direito,
X. O exercício de um direito (no caso, de preferência) nunca se poderia considerar abusivo, e dentro do mesmo espírito interpretativo, também não podia subsumir-se na hipótese de reversão de uma putativa renúncia,
Y. Ou, no limite, deve entender-se que a Autora apenas consentiria não se tornar proprietária, se o arrendamento tivesse sido alcançado, mas falhando tal condição exclusivamente por razões de má-fé negocial da parte (interessada) contrária, também nunca podia ter tido lugar qualquer espécie de renúncia abdicativa definitiva – única que poderia ser eventualmente operante e oponível.
Z. Da análise puramente objetiva e fidedigna ao depoimento do Réu adquirente (marido) é facilmente percetível que aquele deu efetivamente assentimento ao arrendamento que havia negociado com a Autora, concordando com o valor demais condições contratuais.
AA. Em rigor, confessou, sem reservas, que as partes haviam alcançado perfeito e total entendimento, e nunca explicou por que razão não apôs, nesse seguimento, a assinatura a um contrato previamente negociado, escrutinado pelo seu advogado (cf. Doc. 14 junto com a sua contestação) e nessa conformidade até já assinado pela parte contrária, e portanto, fechado e concluído.
BB. Pelo que, jamais se poderia interpretar no comportamento da Autora um abuso do direito ou reversão de qualquer putativa anterior renúncia abdicativa (que nunca existiu), quando ponderadamente, visando a sua própria subsistência e continuidade da atividade de exploração de farmácia, intentou a presente ação preferencial,
CC. E fê-lo, bem dentro do prazo legal em que finalmente teve conhecimento das circunstâncias e da realização do negócio jurídico transmissivo do imóvel a favor dos Réus adquirentes.
DD. Da decisão que devia ter sido proferida sobre as questões de facto impugnadas
Resulta manifesto do depoimento do Réu adquirente (marido) que os factos 15 e 16 da matéria assente deviam ter outra (diversa) enunciação – que ora se propõe, ou então que fossem aditados outros factos, nos seguintes termos:
- Em meados de março de 2018, A Autora e os Réus adquirentes estabeleceram negociações tendentes a celebrar um contrato de arrendamento, tendo concluído e acordado, de comum entendimento, a totalidade das condições daquele.
- O contrato de arrendamento assim negociado ente elas, correspondeu à vontade de ambas, tendo sido assinado pela Autora que entregou tal versão assinada (por duas vezes) aos Réus adquirentes para igualmente estes o assinarem.
EE. No mesmo sentido, propugna-se pelo aditamento dos seguintes factos à matéria assente, dado ser fundamental para a justa composição do litígio e escorreita aplicação do Direito ao caso concreto, nos seguintes ou similares termos que aqui reproduzem:
- Os Réus adquirentes, não obstante terem concordado inteiramente com o contrato de arrendamento que lhes foi entregue pela Autora (e por ela devidamente assinado), em março de 2018, nunca o assinaram, e não alegaram, em momento algum, qualquer razão para o efeito.
FF. Falece o argumento da putativa caducidade, em primeiro lugar, e tal como nos ensina a nossa jurisprudência superior; um prazo porque inerente ao exercício de um direito não se inicia, no caso concreto, enquanto o obrigado à preferência não cumprir com o seu dever de informar verdadeira e lealmente o titular do direito de preferência sobre o negócio em causa.
GG. Convém esclarecer que o obrigado à preferência é que tem esse dever/ónus – e neste caso tal incumbência estava deferida ao Réu alienante (massa insolvente, representada pelo administrador judicial).
HH. E se atentarmos, com rigor, no conteúdo da comunicação (que é a mesma) que foi remetida para esse efeito – facto provado n.º 11, datada de 3 de agosto de 2017, concluímos que não cumpre minimamente com os pressupostos da notificação para preferência.
II. Em primeiro lugar, tal notificação não destaca ou informa que se destina (porque supostamente esse seria o seu objeto principal ou único leitmotiv) a habilitar o seu destinatário com a possibilidade do exercício do direito de preferir na compra e venda de certo bem imobiliário.
JJ. Ou seja, e desde logo, é totalmente falha e deficiente tal comunicação, quanto ao apontado desiderato que lhe preside – e é bom ter presente que o destinatário de tal notificação não é necessariamente, como é apodítico, um versado em leis e/ou jurista, mas, como acontece aqui (farmacêutica) uma pessoa leiga.
KK. Serve este raciocínio para explicar que o conteúdo da dita comunicação para o exercício do direito de preferência jamais se poderia subsumir em tal categoria, ou ver-lhe emprestada tal eficácia e/ou validade jurídica.
LL. Note-se que inclusivamente, a comunicação nem sequer refere/indica/informa qualquer norma ou regra legal que permita ao destinatário ir consultar a lei para perceber do que se trata concretamente, i.e., que tem um direito a exercer, que direito a exercer é esse, que prazo dispõe para o efeito, se o mesmo está sujeito (ou não) a caducidade, etc.
MM. Ou seja, tal comunicação, mostra-se totalmente deficiente e imprestável quanto aos efeitos que se lhe pretendem atribuir, violando qualquer das estatuições normativas constantes do artigo 416.º e seguintes do CC.
NN. E conforme é igualmente sabido e incontrovertido, às vendas judiciais aplica-se, no atinente ao direito de preferência, aquele conteúdo normativo do artigo 416.º do CC, devendo o titular do direito ser objetivamente informado da faculdade que lhe assiste, com clareza, lealdade e transparência.
OO. E bem se compreende o alcance da não distinção entre venda livre ou venda judicial/coercitiva, porque, num caso como noutro, está em causa a salvaguarda dos direitos do preferente (faculdade de atribuição ou origem legal), daí que a notificação deva, imperativamente, cumprir com aqueles pressupostos.
PP. E se indagarmos o conteúdo concreto de tal comunicação (que é a mesma e repetida, nem a data foi alterada – sempre 03.08.2017), o que dela resulta e se infere é que já terá havido a venda do bem «o imóvel foi adjudicado» em causa àquele comprador, mas sem nada referir sobre as concretas condições do negócio, designadamente, prazo de celebração da escritura (uma vez que a Autora podia preferir até esse momento, condições de pagamento, local, data e cartório notarial, etc.).
QQ. E nem se diga que é irrelevante ou despiciendo a indicação do prazo para exercer o direito, e antes disso que há um direito a exercer, a informação sobre a sua possível caducidade, o dia, a hora e o local da escritura, ou até as condições de pagamento do preço, porque obviamente que não é indiferente para a Autora saber se a escritura teria lugar dali a 10 dias ou dali a, por exemplo, 2 meses (no caso concreto tal hiato temporal até foi maior), desde logo para efeitos de buscar financiamento.
RR. Mas reitera-se a seguinte ideia nuclear: A dita comunicação é totalmente imprestável para o efeito de anunciar e informar do exercício do direito de preferência, tanto é assim que, o que se interpreta (homem comum) da sua leitura é que a venda já foi realizada – o imóvel foi adjudicado.
SS. E robustecendo tal entendimento (sobre a imprestabilidade de tal notificação para efeitos do exercício do direito de preferência), note-se que, quando em finais de outubro é expedida novamente a missiva (a primeira não foi recebida), o conteúdo é exatamente o mesmo).
TT. E na verdade, a incorreção de tal notificação criou (aquilo que era suposto criar no homem comum) a errada perceção, na Autora (legal representante), que a venda (já em agosto de 2017) estava realizada e consumada, com a adjudicação do imóvel àquele comprador.
UU. Tanto assim é que, de boa-fé, quando reuniu com o Réu adquirente (marido) e o seu filho, em agosto de 2017 (cf. facto provado n.º 7) estava convencida que reuniu com o já novo proprietário do espaço que tinha de arrendamento.
VV. Aliás, diga-se que, e tal é confessado pelo próprio filho do Réu adquirente, aquando da realização dessa reunião, aqueles se apresentaram diante dela como sendo já os verdadeiros proprietários, tendo assumido tal discurso (e a Autora acreditado e, de boa-fé, cofiado que assim seria).
WW. Embora se tenha vindo a saber depois que tal, efetivamente, só ocorreu, em 20.10.2017 – data da outorga da escritura de compra e venda do imóvel em causa, facto que curiosamente não consta dos factos assentes, mas cuja inclusão ora se requer, atenta a sua total pertinência e não impugnação.
XX. E retornando às insupríveis deficiências da alegada comunicação para o exercício do direito de preferência (que não produziu assim quaisquer efeitos) ficou igualmente clarividente, após a realização do julgamento, a razão de tal (quiçá intencional) violação de lei.
YY. Destarte, do depoimento da experiente colaboradora do administrador judicial é facilmente percetível que não houve qualquer distinção entre a primeira (não recebida) e a segunda comunicação, em ambas o conteúdo é o mesmo, feito sem qualquer rigor e sem cumprimento dos ditames legais, e limita-se a informar (no entendimento da própria) que o negócio já se realizou – o que era falso – em agosto 2017 – e totalmente enganador.
ZZ. Aqui chegados, e concatenados todos os factos, constatamos com clareza, que a notificação recebida em novembro de 2017 (embora não tivesse sido conhecida da Autora, mas por razões que o Tribunal possa considerar não oponíveis), certo é que não cumpriu minimamente com os requisitos fixados na lei,
AAA. E assim sendo, nunca o Tribunal a quo podia ter considerado que se havia iniciado o prazo de caducidade do exercício do direito (mas qual direito? – se a notificação é totalmente omissa quanto a tão central aspeto), donde não pode ver-lhe reconhecido tal mérito e corolário e ser-lhe atribuída tal função prototípica.
BBB. Em síntese, nunca tendo ocorrido qualquer válida comunicação para exercício do direito de preferência, nunca tal alegada notificação podia ter sido prestável para iniciar qualquer prazo de caducidade,
CCC. Tanto mais que a comunicação feita o foi em termos ardilosos e capciosos (enganadores), inculcando a ideia de que o negócio estava consumado, ideia que convenceu a Autora,
DDD. Ao que acresce a postura adotada pelos Réus adquirentes que logo se apresentaram como proprietários (não o sendo), por forma a iludir a Autora,
EEE. Negociando depois o arrendamento com ela, que nunca quiseram, rompendo um acordo já definitivamente estabelecido e por ela assinado (só faltando a sua assinatura), sem qualquer justo motivo ou sequer alguma explicação dada, ao ponto de a deixarem privada de poder continuar com a exploração da atividade de farmácia,
FFF. Donde: (i) não ocorreu a caducidade do direito, pois que apenas em fevereiro de 2018 a Autora, quando recebeu cópia da escritura de compra e venda, é que se apercebe da totalidade das condições do negócio (a começar pela data da sua realização), quando estava convencida que há muito (desde agosto de 2017) o negócio já se havia consumado, não tendo a comunicação recebida qualquer idoneidade legal/jurídica para desencadear o início do prazo, (ii) em momento algum ocorreu qualquer renúncia abdicativa expressa do direito de preferir, desde logo porque a Autora nem estava na posse do conhecimento sobre a totalidade das condições de compra e venda e dos factos que lhe estão subjacentes, e (iii) menos ainda existiu abuso do direito do seu lado, dado que foram os Réus adquirentes que abandonaram, de má-fé, e sem motivo algum, a solução negocial fechada e concluída do arrendamento, por forma a privá-la da continuação de atividade, e foi perante esta circunstância de sobrevivência comercial que a Autora, dentro do prazo cominado no artigo 1410.º do CC intentou a presente ação preferencial, pois que estava em plenitude o exercício de tal direito.
GGG. Ao decidir como o fez, a sentença violou, inter alia, o disposto nos artigos 298, n.º 2, 416.º, n.º 1 e 1410.º, n.º 1, todos do CC, razão pela qual não se pode manter na ordem jurídica, devendo nessa medida ser revogada, o que expressamente se requer”.
Conclui, no sentido de revogação da sentença recorrida, que deverá ser substituída por outra que julgue procedente a presente acção preferencial, com as legais consequências.
14 – A Recorrida Massa Insolvente de W……………….., Lda., apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes CONCLUSÕES (que ora se transcrevem, na íntegra, corrigindo-se os lapsos de redacção):
1. A sentença proferida em 1ª Instância pelo Meritíssimo Juiz a quo não merece qualquer censura, não padecendo de qualquer erro de julgamento ou de direito que implique a sua revogação.
2. Ao contrário do que sustenta a recorrente, e como se pretenderá elucidar, verifica-se de facto nestes autos a excepção de caducidade do direito de agir da mesma, para além das demais questões abordadas na sentença recorrida relativas à renúncia ao direito de preferência e abuso de direito.
3. No âmbito da liquidação dos bens apreendidos no processo de insolvência da “W………………, Lda.”, onde se contava a verba n.º 32 que aqui nos ocupa, foi determinada a venda dos bens apreendidos através de negociação particular, mediante a apresentação de propostas em carta fechada, que foi agendada pelo administrador judicial para dia 28/07/2017, pelas 10h00, na Sala Polivalente do Edifício do Palácio da Justiça de Ponta Delgada.
4. Como se verifica do anúncio de venda, a verba n.º 32 estava devidamente identificada com o ónus do arrendamento da recorrente, arrendamento que o administrador judicial sempre lhe reconheceu, tanto que inclusivamente na sua contestação a Massa Insolvente nunca invocou a inexistência do dito direito de preferência, mais a mais porque a preferência tinha sido inclusivamente pactuada no contrato de arrendamento celebrado, onde se estabeleceu um direito de preferência convencional, que o administrador judicial respeitou integralmente mesmo não tendo eficácia real.
5. Tendo sempre reconhecido a recorrente como arrendatária do prédio a vender, por carta registada com aviso de recepção datada de 12/07/2017, recebida pela recorrente em 17/07/2017 e dirigida para a morada do prédio locado, o administrador judicial notificou a recorrente expressamente, na sua qualidade de inquilina, do seguinte – vide doc.2 junto com a contestação da aqui recorrida:
- Das condições de venda dos imóveis apreendidos à ordem da massa insolvente (onde se contava a verba n.º 32), anexando o respectivo anúncio de venda que continha entre outras menções os valores base e mínimo de venda do prédio arrendado;
- Do dia, hora e local da abertura das propostas (que também se encontravam reproduzidas no anúncio de venda anexado);
- De que a notificação era efectuada nos termos do artigo 165º do CIRE, com vista ao exercício do direito de preferência nos termos do disposto nos artigos 823º e 824º do CPC, pois entendia o administrador judicial, como sempre entendeu, que assistia de facto de direito a preferência à recorrente.
6. Pese embora ao tempo, na perspectiva do administrador judicial, a recorrente não tenha estado presente nem se tenha feito representar nessa diligência de abertura de propostas, o que desde logo precludia o direito de preferência, facto que foi vertido na contestação da aqui recorrida, a verdade é que veio a resultar do julgamento que na diligência de abertura de propostas que teve lugar em 28/07/2017, esteve presente o Dr. V…………., irmão da Dra. V…………. (a gerente formal da recorrente), que era afinal o verdadeiro gerente de facto da recorrente e era quem tudo decidia na empresa.
7. Na abertura de propostas foi aceite a proposta apresentada para a verba n.º 32 aqui em apreço apresentada pelos co-Réus Luís ……….. e mulher, que ofereceram pelo prédio o montante de € 295.000,00, factos de que (comprador e preço de venda) o dito Dr. V………., gerente de facto da recorrente, desde logo tomou conhecimento, não tendo manifestado qualquer intenção de preferir.
8. Como hoje se sabe porque decorreu inequivocamente do julgamento, nesse mesmo dia 28/07/2017, à saída do Tribunal, o Dr. V…………, gerente de facto da recorrente, foi apresentado de imediato aos compradores, para logo em 02/08/2017 estarem a fazer uma primeira reunião entre si para efeitos de negociação da manutenção do arrendamento do prédio pela F…… Autora, aqui recorrente.
9. No seguimento da diligência de abertura de propostas em que foi decidida a adjudicação da verba n.º 32 ao co-Réu Luís …………, o administrador judicial remeteu nova carta registada com aviso de recepção à recorrente, em 03/08/2017 (ou seja, já após, e naturalmente sem o saber, o início das reuniões de negociação entre recorrente e co-Réu Luís …………) comunicando-lhe formalmente essa adjudicação, com identificação do comprador e valor de venda.
10. Tal carta foi devolvida pelos serviços postais – vide mesmo doc.3 e factos provados 9 e 10.
11. Tendo sido entretanto outorgada a escritura pública de compra e venda do prédio em 20/10/2017, o administrador judicial repetiu a notificação anterior, o que fez novamente por carta registada com aviso de recepção, registada em 31/10/2017 e para a morada do prédio locado, e recebida pela recorrente em 06/11/2017.
12. No contexto supra descrito e com base nos pressupostos anteditos, designadamente:
- do administrador judicial ter reconhecido sempre, e ab initio o contrato de arrendamento e o direito de preferência da recorrente;
- de a ter notificado do dia, hora e local da abertura de propostas para que pudesse exercer aquele seu direito;
- da recorrente (supostamente, pois que o administrador judicial desconhecia que o Dr. V……….. era seu gerente de facto) não ter comparecido nessa diligência, deixando precludir o seu direito de preferência;
naturalmente que a sua carta, cujo conteúdo agora a recorrente explora até á exaustão, não tinha o propósito de permitir a preferência mas dar conhecimento da concretização final da venda.
13. Em sede de contestação a aqui recorrida sustentou que pelo menos desde 06/11/2017 a recorrente tem conhecimento de todos os elementos essenciais da venda operada pelo administrador da insolvência, que sempre tudo lhe comunicou, ao contrário do falsamente alegado pela mesma no item 11º da P.I.
14. Realizado o julgamento percebe-se que afinal, na pessoa do seu gerente de facto, Dr. V…………., a recorrente tem conhecimento de tudo o que se passou na venda, e respectivas condições, desde o dia 28/07/2017, dia da abertura das propostas, tanto assim que o Meritíssimo Juíz a quo levou ao acervo dos factos não provados (vide respectiva alínea a)), que “A Autora não compareceu nem se fez representar no dia, na hora e no local designados para a abertura das propostas de venda”.
15. É falso só ter tido a recorrente conhecimento informal da venda em Novembro de 2017, através do comprador, e só ter tido conhecimento das efectivas condições de venda em Fevereiro de 2018 através da notificação judicial avulsa promovida também pelos compradores, onde estes juntaram a escritura pública de compra e venda.
16. Pese embora o facto dado como não provado na alínea a) dos factos não provados, e não obstante a fundamentação constante da sentença para essa decisão, entende-se que com base na prova documental existente nos autos (acta da diligência de abertura de propostas) bem como com base no depoimento da testemunha António ……….. acerca da presença nessa diligência do Dr. V…………., gerente de facto da recorrente, se imporia carrear para o acervo dos factos provados o seguinte facto:
Na diligência de abertura de propostas realizada em 28/07/2017, referida em 4., esteve presente V………….., gerente de facto da Autora e pessoa que tudo nesta decidia, que nesse acto tomou conhecimento das condições de venda do imóvel identificado em 1.”.
17. A recorrente, desde 28/07/2017, tinha conhecimento de todos os dados relevantes da venda (tendo o administrador judicial notificado a recorrente, ainda assim, depois de outorga da escritura de compra e venda), pelo que se entendesse ter sido preterida nesse seu direito teria de ter desencadeado a acção de preferência nos seis meses seguintes, o que não fez.
18. Não o tendo feito, a recorrente deixou caducar o seu direito.
19. Verifica-se ainda que a recorrente reconheceu o co-Réu Luís ………. como novo dono do prédio pois no próprio dia da abertura das propostas, por intercedência do Dr. Rui Cordeiro, Advogado, também presente, logo agendou uma reunião negocial para o dia 02/08/2017 com vista à manutenção de uma relação de arrendamento, sem qualquer outro propósito que não esse; e, depois da escritura de compra e venda realizada, reconheceu-o como seu novo senhorio, pois passou a pagar-lhe directamente as rendas devidas pela ocupação do imóvel.
20. A sentença recorrida entendeu também, e bem, que sempre haveria renúncia ao direito de preferência e abuso de direito na propositura desta acção, em virtude da recorrente apenas ter intentado o presente processo quando percebeu que as condições que pretendia para o arrendamento não seriam aceites.
21. Acresce que a presente acção foi proposta precisamente no último dia de vigência do contrato de arrendamento que havia sido denunciado (30/07/2018), data a partir da qual a recorrente tinha de entregar o imóvel, precisamente para procurar legitimar a continuação da sua ocupação.
22. Tendo o administrador judicial assumido sempre a qualidade de arrendatária da recorrente e o seu direito de preferência, desde o início do procedimento de venda que sempre lhe transmitiu todas as informações relevantes nesse procedimento, a saber:
- notificou-a do dia, hora e local da abertura de propostas, informando-a de todas as condições de venda, missiva que a recorrente recebeu (embora negando-o em juízo) e de que se prevaleceria (mesmo não tendo, afinal, direito de preferência constituído) acaso tivesse tido condições (mormente financeiras) para comprar o prédio nessa ocasião;
- permitiu-lhe o exercício da preferência no dia da abertura das propostas, que a recorrente, apesar de ter presente o seu gerente de facto, não exerceu;
- comunicou-lhe a seguir a identidade do comprador e valor da venda, em missiva recebida em 06/11/2017 pela recorrente, que nenhuma observação ou reparo fez ao conteúdo da mesma;
mas agora nesta sede, percebendo a oportunidade gerada pela questão do direito de preferência não estar ainda constituído em 28/07/2017, por não existir ainda arrendamento há mais de três anos (argumento que nem a própria recorrente se “lembrou” de invocar na sua petição inicial), vem alegar um comportamento ardiloso e capcioso do administrador judicial que afinal a pretende enganar e esconder de si a realização da escritura de compra e venda.
23. E, assim, as comunicações do administrador judicial tornam-se todas imprestáveis e de nenhum efeito, e a recorrente qual leiga vítima abandonada à sua sorte deixa de ter conhecimento de tudo quanto à venda respeita e nega em juízo ter alguma vez recebido comunicações do administrador judicial.
24. A recorrente vai literalmente ao sabor do vento, ajustando as suas teses às conveniências do momento: se tivesse tido condições para preferir em 28/07/2017, nenhum problema haveria decerto com a inexistência do direito de preferência, que nunca traria à colação; se tivesse logrado o novo arrendamento, que era o seu único propósito, nenhum problema haveria com a venda do prédio aos co-Réus; como não se consegue uma coisa nem outra, então faz-se tábua rasa de tudo o que se passou no processo de venda e negociações conexas que levou a cabo com os co-Réus, bem como de toda a informação que sempre lhe foi dada, e usa-se o subterfúgio da carta final do administrador judicial recebida em 06/11/2017 não poder produzir efeitos como comunicação para preferência, que passa a inexistir.
25. Este comportamento da recorrente não pode colher e está claramente eivado de pura e simples má fé que, aliás, o tribunal a quo apenas não conheceu, como resulta da fundamentação da alínea b) dos factos não provados, por entender que a Dra. V…………. não tinha conhecimento dos assuntos respeitantes à gestão da farmácia, que era gerida pelo seu irmão Dr. V…………..
26. Porém, excedendo manifestamente este comportamento os limites impostos pela boa fé, a recorrente pauta toda a sua atuação por claro e manifesto abuso de direito, nos termos do disposto no artigo 334º do Código Civil, o que deve ser reconhecido”.
Conclui, no sentido da improcedência do recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
15 – Os Recorridos/Réus Luís ………….. e mulher Maria …………….. apresentaram contra-alegações, nas quais formularam as seguintes CONCLUSÕES (que ora se transcrevem integralmente ; corrigem-se os lapsos de redacção ; consigna-se que existem dois pontos 36):
1. O recurso a que agora se responde foi interposto da douta Sentença proferida em 07.12.2021 que julgou improcedente a ação de preferência interposta por F……………., Lda., absolvendo os ora recorridos dos pedidos;
2. Na verdade, o Tribunal “a quo” entendeu corretamente que houve caducidade do direito de ação, renúncia por banda da Autora (ora recorrida) ao direito de preferência e ainda abuso de direito por esta;
3. Entende a recorrente que o Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento e concomitante violação da lei;
4. Sem quebra do devido respeito, que é muito, a recorrente não tem razão. Senão vejamos:
5. A tese da recorrente assenta essencialmente, desde logo, nos argumentos por ela alegados ad nauseam (cfr. alíneas D.; E; G; H; I; L; M; N; O; P; Q; R; V; Y; Z; AA; DD e EE das doutas alegações de recurso) de supostamente terem sido os Réus adquirentes, os ora recorridos, quem unilateralmente rompeu as negociações do arrendamento, fazendo-o sem qualquer justo motivo ou pertinente fundamento, quando – sempre na versão da recorrente - as partes já haviam (até com a participação dos seus advogados) concluído a elaboração das respetivas minutas;
6. Desde logo, tais pressupostos de facto são totalmente falsos, como resulta dos autos;
7. Considera, ainda, a recorrente que tal facto teria sido ignorado e não levado à matéria assente pelo Tribunal recorrido, concluindo, por isso, que a existir má-fé negocial e concomitante abuso de direito, o mesmo só poderia ser imputado aos Réus adquirentes, porque, na sua tortuosa versão dos factos (e da realidade), teria ficado demonstrado que encetaram negociações que, mesmo já concluídas e finalizadas (faltando apenas a sua assinatura), nunca se quiseram comprometer e vincular;
8. Partindo dos referidos pressupostos, conclui a recorrente F………………., Lda. que a existir má-fé e concomitante abuso de direito, este só poderia ser imputado aos Réus adquirentes, ora recorridos;
9. Ora, não só os pressupostos do raciocínio são falsos como a conclusão ilógica, e até abusiva;
10. Antes de mais, não se vislumbra qual concretamente o direito cujo exercício pelos recorridos a recorrente considera abusivo. É que, segundo a melhor doutrina (e as regras da lógica), o abuso do direito pressupõe logicamente um qualquer direito, que possa ser exercitado pelo respetivo titular, ainda que abusivamente. Porém, como é bem de ver, “in casu” a recorrente não especifica ou identifica qual o direito subjetivo que os recorridos exercem alegadamente em abuso (de direito). É que, na verdade, limitaram-se a contestar a ação. Adiante…
11. Depois, a argumentação da recorrente quanto à iniciativa, autoria e responsabilidade pelo rompimento unilateral das negociações para o arrendamento é cabalmente desmentida pelo teor literal (explícito) do e-mail (doc.18 junto com a contestação) enviado pela recorrente ao recorrido marido no dia 31-07-2018, onde consta escrito o seguinte: “Venho pelo presente comunicar a V. Exa. que não tendo sido possível renegociar o contrato de arrendamento em vigor, atento o valor final pedido por V. Exa. a título de renda, o qual seria incomportável, e representou um acréscimo muito significativo sobre o valor inicialmente acordado e selado pelas partes, a F……………., Lda. entendeu avançar com uma ação judicial…”;
12. Depois, ainda, a argumentação da recorrente quanto à suposta conclusão das negociações relativas ao contrato de arrendamento, invocando repetitivamente (à exaustão) no seu douto recurso a ideia que as referidas negociações já estariam “concluídas e finalizadas (faltando apenas a sua assinatura)”, é totalmente desmentida por prova documental da sua própria autoria, antes de mais, pelo teor literal do já referido e-mail de 31-07-2018 (doc.18), por ela enviado – como já se disse – ao Réu marido para unilateralmente pôr termo ao processo negocial em curso, onde consta escrito, entre o mais, o seguinte: “… não tendo sido possível renegociar o contrato de arrendamento em vigor, atento o valor final pedido por V. Exa. a título de renda…” (sublinhado nosso);
13. Ora, é evidente e decorre do teor literal do referido documento que a recorrente tinha a noção plena de não ter à data de 31-07-2018 logrado (ainda) concluir as negociações tendentes à celebração do contrato de arrendamento, apesar das duas propostas negociais escritas (docs. 15, 16 e 17, juntos com a contestação) por ela elaboradas e apresentadas ao Réu marido como meras propostas negociais e por este nunca aceites na sua totalidade, motivo porque nunca as validou ou assinou;
14. Na verdade, as duas minutas de contrato de arrendamento elaboradas pela própria recorrente, e por ela apresentadas ao Réu marido como meras propostas de acordo (docs. 15 e 17), previam 10 (dez) cláusulas contratuais, nelas se incluindo designadamente a identificação e a concreta área (parcial) do imóvel a arrendar (cfr. plantas anexas às minutas dos contratos), prazo de duração do arrendamento, o valor e a periodicidade do pagamento da renda, o regime tributário aplicável ao contrato, as obrigações para as partes decorrentes da realização de obras no locado e vários outras aspetos negociais objeto do contrato e de aturada negociação entre as partes, a ora recorrente e os recorridos;
15. Ou seja, as negociações em curso até 31-07-2018, abruptamente e unilateralmente terminadas nesse mesmo dia pela ora recorrente V…………, Lda., nunca foram concluídas entre as partes, porque as partes nunca aceitaram na sua globalidade, nem mesmo quanto ao valor final da renda, as propostas escritas de contrato de arrendamento documentadas nos autos (docs.15, 16 e 17, da contestação) designadamente quanto à área concreta do imóvel a arrendar, acessos e portas de entrada e saída para a via pública (cfr. mapa anexo à minuta do contrato), área total a arrendar, prazo do arrendamento e eventual modo de renovação do mesmo, obrigações decorrentes de obras, etc, e, por isso, aquelas nunca reciprocamente validaram ou assinaram;
16. Acresce que, mesmo que assim se não entendesse, o que não se concede, foi a própria recorrente quem revogou unilateralmente a última proposta de contrato por ela apresentada ao Réu marido, negando a este último qualquer possibilidade de, querendo, a aceitar a partir de 31-07-2017, com a comunicação por e-mail desse dia e com a prévia interposição desta ação.
17. Ou seja, não só ficou cabalmente demonstrado (e provado) que o recorrido marido nunca validou (pessoalmente ou sequer através do seu advogado), aceitou e/ou assinou qualquer das duas propostas contratuais elaboradas pela recorrente designadamente na extensão das suas (dez) cláusulas, condições e plantas anexas que o contrato em apreço pretendia regular nomeadamente, as acima questões já referidas, como inclusive o recorrido marido foi confrontado com a revogação expressa da última proposta de contrato que lhe foi proposta e apresentada pela recorrente, conforme resulta evidente da conjugação do depoimento do recorrido e do teor do e-mail junto com a contestação como documento nº 18;
18. Acresce que, a argumentação da recorrente é contraditória em si mesma, dizendo, por um lado, que as negociações já estariam finalizadas e concluídas entre recorrente e recorridos e, por outro lado, que o Réu marido não se quis vincular e assinar as duas propostas de contrato, por não as aceitar - minutas essas que foram elaboradas, convém recordar, unicamente pela recorrente;
19. Ora, ao contrário do que incorretamente sustenta a recorrente, o Tribunal “a quo” não só não ignorou os factos falsamente alegados pela recorrente como deu por provado o que ficou cabalmente demonstrado no julgamento, ou seja, que durante vários meses e nomeadamente em meados de março e Abril de 2018 e durante os meses que se seguiram até 31/07/2018, a recorrente e o recorrido marido estabeleceram negociações tendentes a celebrar um novo contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 31/07/2018, nunca tendo, porém, concluído ou finalizado tais negociações e/ou os termos exatos do contrato, motivo pelo qual os Recorridos não aceitaram qualquer das duas versões de minutas de contrato de arrendamento elaboradas e propostas pela recorrente, não as tendo, por isso, validado, confirmado e muito menos assinado;
20. É evidente, por outro lado, que o Tribunal recorrido julgou provado – e bem! – que quem, de facto, revogou unilateralmente a proposta pendente de contrato de arrendamento foi a própria recorrente, por via do e-mail de 31/07/2018, o qual põe definitivamente termo às negociações (ainda) em curso. (cfr. números 17. e 18. D dos factos provados);
21. Na verdade, a tese da recorrente esbarra na prova e na realidade, não tendo, por isso, o mínimo fundamento factual a gratuita imputação de má-fé ou abuso de direito por banda dos recorridos, quando ficou sobejamente provado exatamente o contrário, ou seja, que foi a recorrente, como aliás ela própria admitiu, quem unilateralmente rompeu as negociações em curso em 31-07-2018 e que estas, exatamente por estarem em curso, nunca foram concluídas, tendo aliás sido a própria recorrente quem unilateralmente as fez cessar, pelos motivos que apenas ela invocou e nesse mesmo dia comunicou pelo já referido e-mail. (doc.18);
22. Quanto à caducidade do direito de preferência da recorrente, ao contrário do que esta sustenta, sem quebra do devido respeito, que é muito, analisadas e ponderadas as declarações e os depoimentos das partes e das testemunhas, conjugando-as comas acareações e com os documentos juntos aos autos, ficou evidente para todos e, por isso, cabalmente provado que aquele direito já havia caducado quando foi instaurada a presente ação;
23. Assim, por escrito particular intitulado por “CONTRATO DE ARRENDAMENTO”, de 01/08/2014, a recorrente tomou de arrendamento comercial à sociedade W…………..e, Lda., que, por seu turno, deu de arrendamento, destinado à exploração de um estabelecimento comercial de farmácia, o prédio urbano, em regime de propriedade total, sito na freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, na Rua …………………, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o número …………….., e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ………..;
24. Porém, no âmbito da liquidação dos bens apreendidos no processo de insolvência da sociedade “W……………, Lda.” onde se encontrava a verba nº 32 correspondente ao imóvel antes referido, foi determinada a venda dos bens apreendidos através de negociação particular, mediante a presentação de propostas em carta fechada, que foi agendada pelo Sr. Administrador de insolvência para o dia 28/07/2017, pelas 10.00 horas, na Sala Polivalente do Edifício do Palácio da Justiça de Ponta Delgada, diligência do que a recorrente foi notificada;
25. Tendo reconhecido a recorrente como arrendatária do prédio a vender, por carta registada com aviso de receção datada de 12/07/2017 e dirigida para a morada do prédio locado, recebida pela recorrente em 17/07/2017, o administrador de insolvência notificou a recorrente expressamente na sua qualidade de inquilina, do seguinte: Das condições de venda dos imóveis apreendidos à ordem da massa insolvente (onde se encontrava a verba nº 32), anexando o respetivo anúncio de venda que continha entre outras menções os valores base e mínimo da venda o prédio arrendado; Do dia, hora e local da abertura das propostas; De que a notificação era efetuada nos termos do artigo 165º do CIRE com vista ao exercício do direito de preferência nos termos do disposto nos artigos 823º e 824º do CPC, por entender, bem ou mal, que assistia de facto e de direito a preferência à recorrente;
26. Resultou da audiência de julgamento destes autos que na diligência de abertura de propostas que teve lugar em 28/07/2017, esteve presente o Dr. V………………, irmão da Dra. V………….. (a gerente formal da recorrente), que era afinal o verdadeiro gerente de facto da recorrente e quem tudo decidia na empresa;
27. Na abertura de propostas foi aceite a proposta apresentada para a verba nº 32 correspondente ao imóvel em discussão nestes autos apresentada pelos ora recorridos, que ofereceram pelo mesmo o montante de € 295.000,00, factos de que (comprador e preço e venda) o dito Dr. V…………, gerente de facto da recorrente, desse logo, tomou conhecimento, não tendo manifestado qualquer intenção de preferir;
28. Nesse mesmo dia 28/07/2017, à saída do Tribunal, o Dr. V…………, gerente de facto da recorrente, foi apresentado de imediato aos adquirentes, designadamente ao recorrido marido, para logo em 02/08/2017 estarem a fazer uma primeira reunião entre si para efeitos de negociação da manutenção do contrato de arrendamento do prédio pela F……………., ora recorrente;
29. Depois, no dia 02/08/2017, V………….., gerente (formal) da recorrente participou na qualidade de arrendatária do imóvel vendido aos recorridos, numa reunião com  o recorrido marido, este último na qualidade de adquirente e novo senhorio dela;
30. No seguimento da diligência de abertura de propostas em que foi decidida a adjudicação da verba nº 32 ao recorrido Luís ……………, o Sr. Administrador de Insolvência remeteu nova carta Registada com aviso de receção à recorrente, em 03/08/2017, comunicando-lhe formalmente essa adjudicação, com identificação do comprador e valor da venda, carta que foi devolvida pelos serviços postais;
31. Tendo sido, entretanto, outorgada a escritura pública de compra e venda do prédio em 20/10/2017, o Sr. Administrador de Insolvência repetiu a notificação anterior, o que fez novamente por carta registada com aviso de receção, registada em 31/10/2017 e para a morada do prédio locado, sendo que tal carta foi recebida pela recorrente em 06/11/2017;
32. Antes disso, conforme doc. nº -- (PI da Autora) os recorridos procederam ao imediato registo da sua aquisição do imóvel em discussão nestes autos na Conservatória do Registo Predial competente no dia 23/10/2017, pela AP. 573, com acesso público, conforme documento nº 2, junto com a PI da própria Autora, onde até consta que a Certidão Permanente ficou disponibilizada à recorrente por acesso em 19/10/2017 e válida até 19-04-2018 (doc. 2, junto pela recorrente com a PI);
33.A partir do mês de Novembro de 2017, a Ré passou a pagar a renda aos ora recorridos, o que fez mensalmente até Agosto de 2018;
34. Mesmo que hipoteticamente se admita a tese de o Sr. Administrador da Insolvência não ter cumprido com a notificação para o exercício pela recorrente do direito de preferência que lhe assistia, a verdade é que, senão antes, certamente no dia 06/11/2018, a recorrente teve pleno conhecimento que o prédio de que era arrendatária havia sido alienado aos Recorridos no âmbito do processo de insolvência, quem o tinha comprado bem como o respetivo preço, bem como todos os detalhes da venda, cfr. data do registo (público) da aquisição pela AP. De 23/10/2017;
35. Aliás, logo no início do mês de Novembro de 2017, o recorrido marido estabeleceu novo contacto com a recorrente, comunicando-lhe que, uma vez que já tinha sido feita a escritura, em 20/10/2017, a renda devia ser, doravante, paga a si, agora na qualidade de novo senhorio, sendo que a recorrida assim passou a
fazer, pelo que, a partir de Novembro de 2017, começou a pagar a renda diretamente aos recorridos, o que fez mensalmente até Agosto de 2018. (cfr. facto provado 13)
36. Por outro lado, realizado que foi o julgamento, constatou-se que afinal na pessoa do seu gerente de facto, Dr. V……………., a recorrente teve conhecimento de tudo o que se passou na venda, e respetivas condições, desde o dia 28/07/2017, dia da abertura das propostas, tanto assim que o Meritíssimo Juiz “a quo” levou ao acervo dos factos não provados, que “A Autora não compareceu nem se fez representar no dia, na hora e no local designados para a abertura das propostas de venda”;
36. É falso que a recorrente só tenha tido conhecimento informal da venda em Novembro de 2017, através do comprador, e só ter tido conhecimento das efetivas condições de venda em Fevereiro de 2018 através da notificação judicial avulsa promovida pelos ora recorrentes, para o efeito de denúncia (ou oposição à renovação) do contrato de arrendamento em vigor para o seu termo em 31/07/2018, notificação à qual foi anexada a escritura de compra e venda;
37. Pese embora o facto dado como não provado na alínea a) dos factos não provados, e não obstante a fundamentação constante da douta sentença para essa decisão, entende-se que com base na prova documental existente nos autos (acta da diligência de abertura de propostas e documento nº 2 junto pela Autora com a PI) bem como com base no depoimento da testemunha António …….. acerca da presença nessa diligência do Dr. V………………, irmão da Dra. V…………… e gerente de facto da recorrente, se imporia carrear para o acervo dos factos provados o seguinte facto: 38.“Na diligência de abertura de propostas realizada em 28/07/2017, referida em 4. dos factos provado, esteve presente V………….., gerente de facto da Autora e pessoa que nesta tudo decidia, que nesse acto tomou conhecimento das condições de venda do imóvel identificado em 1.
38. A recorrente, desde 28/07/2017, tinha conhecimento de todos os dados relevantes da venda (tendo o Sr. Administrador Judicial notificado a recorrente, ainda assim depois da outorga da escritura de compra e venda), pelo que se entendesse ter sido preterida nesse seu direito teria desencadeado a ação de preferência nos seis meses seguintes, o que não fez e, por isso, deixou caducar o seu direito;
39. Na verdade, dispõe o artigo 1410º do Código Civil que o titular do direito de preferência a quem se não dê conhecimento da venda, tem direito a haver para si a coisa alienada, contanto que o requeira dentro do prazo de seis meses, a contar da data em que teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação, e deposite o preço devido nos quinze dias seguintes à propositura da ação;
40. Ou seja, ainda que, por hipótese, se admita não ter sido cumprida pelo Sr. Administrador de Insolvência a notificação para a recorrente, na qualidade de titular do direito de preferência, exercer o seu direito, deveria ela, ainda assim, ter interposto a presente ação no prazo máximo de 6 meses, a contar da data em que teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação.
41. Por isso, como muito bem refere o Sr. Juiz “a quo” na fundamentação douta sentença, “contrariamente ao que a recorrente alegou na sua petição inicial, provou-se que ela teve conhecimento do projeto de alienação, respetivo preço e condições de compra e venda antes ainda da celebração da escritura: teve conhecimento da adjudicação do imóvel e respetivo preço no próprio dia da abertura das propostas (28/07/2017), tal foi-lhe novamente transmitido na primeira reunião que teve com Luís …… (a 02/08/2017) e, após a escritura, recebeu, a 06/11/2017, nova comunicação por parte do Administrador de Insolvência, donde consta o preço pago (o que ela já sabia), acrescentando ainda, se dúvidas houvesse, que “mesmo que se considere apenas a última data, por se tratar de comunicação realizada após a realização da escritura pública de compra e venda, concluímos, sem margem para dúvida, que, à data da instauração da presente ação (31/07/2018), o direito daquela já se mostrava caducado”;
42. Quanto à renúncia ao direito de preferência pela recorrente, ao contrário do que esta, aliás sem qualquer convicção ou base factual sustenta, ficou provado que aquela efetivamente renunciou ao mesmo;
43. Na conclusão FFF. do seu douto recurso, a propósito da questão da eventual caducidade do direito de preferência, alega-se (a recorrente) expressamente que “apenas em fevereiro de 2018 a Autora, quando recebeu cópia da escritura de compra e venda, é que se apercebeu da totalidade das condições do negócio (a começar pela data da sua realização), quando estava convencida que há muito (desde agosto de 2017) o negócio já estava consumado…”;
44. Ou seja, para que não restem dúvidas, mesmo segundo a sua versão enviesada da realidade (enviesada porque tinha, de facto conhecimento, senão antes, pelo menos desde o dia 06/11/2017 de todos os elementos essenciais da alienação), a recorrente admite que, quando recebeu a copia da escritura de compra e venda, em fevereiro de 2018, apercebeu-se da totalidade das condições do negócio.
45. Porém, estranhamente, a raiar a má-fé, escreve na mesma conclusão FFF. do seu douto recurso, já a propósito da eventual renúncia ao direito de preferência, que “em momento algum ocorreu renúncia abdicativa expressa do direito de preferir, desde logo porque a Autora nem estava na posse do conhecimento da totalidade das condições de compra e venda e dos factos que lhe estão subjacentes”. (sublinhado nosso)
46. A falsidade do que diz, resulta, do que ela própria alega.
Senão vejamos;
a)A negociação entre recorrente e os recorridos do contrato de arrendamento prolongou-se durante quase um ano, até ao dia 31/07/2018;
b) Em março e Abril de 2018 foram elaboradas pela recorrente e apresentadas ao recorrido marido duas propostas negociais sob a forma de minutas de contrato de arrendamento;
c) A última dessas propostas manteve-se pendente de aceitação pelos recorridos até ao dia 31/07/2018, data em que foi revogada unilateralmente pela recorrente;
d) A Autora reconheceu os recorridos como legítimos proprietários pagando-lhes as rendas do imóvel a partir do mês de Novembro de 2017 designadamente nos meses de Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho e Agosto de 2018 (cfr. ponto 13. dos factos provados), tudo após ter recebido cópia da escritura de compra e venda, em notificação judicial avulsa promovida pelos recorrentes para denúncia do contrato de arrendamento (então) em vigor, por ela recebida em fevereiro de 2018, pela qual “se apercebe da totalidade das condições do negócio (a começar pela data da sua realização) …” como ela própria expressamente admite, aliás no mesmo parágrafo!
47. Assim;
Considerando que, mesmo na versão da recorrente, já em Fevereiro de 2018, se apercebe da totalidade das condições do negócio (a começar pela data da sua realização;
Considerando que, ainda assim, a Autora reconheceu os recorridos como legítimos proprietários pagando-lhes as rendas do imóvel a partir do mês de Novembro de 2017 designadamente, e especialmente, os meses de Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho e Agosto de 2018;
Considerando ainda que, em meados de março de 2018, a recorrente e o Recorrido marido, acompanhado do seu filho António, reuniram-se a fim de negociarem um novo contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 31 de Julho de 2018;
Considerando que, no dia 26-03-2018, a recorrente entregou aos 2ºs Réus um documento denominado “CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS NÃO HABITACIONAIS POR PRAZO CERTO”, devidamente rubricado e assinado pela recorrente, na qualidade de arrendatária;
Considerando que, não tendo os 2ºs Recorridos aceite as cláusulas de tal documento, a Autora, ora recorrente, a 02/04/2018, remeteu novo documento denominado “CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS HABITACIONAIS POR PRAZO CERTO devidamente rubricado, carimbado e assinado pela Autora, na qualidade de arrendatária;
Considerando ainda que, na cláusula primeira das minutas de contrato de arrendamento antes mencionadas (docs. 15 e 17), juntos com a contestação) consta a declaração escrita que “O SENHORIO é legítimo proprietário do imóvel sito à Rua ……………………, freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada, sob o nº ………… inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …………. da dita freguesia
Considerando que, as minutas dos ditos contratos de arrendamento (docs. 15 e 17), juntos com a contestação) foram elaboradas pela recorrente e, sobretudo, por ela rubricadas e assinadas;
Considerando, por fim, que a recorrente e o Recorrido marido, mantiveram as negociações entre si, umas vezes diretamente, outras vezes através dos seus advogados, com contactos quase permanentes, até ao dia 31/07/2018, tudo com vista à celebração de novo contrato de arrendamento,
48. torna-se óbvio por força de tal factualidade que ocorreu de modo expresso por banda da recorrente a renúncia do direito de preferência que lhe poderia assistir, parecendo até ilógico afirmar o contrário;
49. Na verdade, foi a própria recorrente que apôs a sua assinatura em dois documentos (docs. 15 e 17) por ela elaborados, subscrevendo, desse modo, a seguinte declaração: “O SENHORIO é legítimo proprietário do imóvel sito à Rua ……….., freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada, sob o nº ………… inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ………. da dita freguesia”, sendo o senhorio identificado o dito Luís …………, o ora recorrido;
50. Por isso, não obstante a correta fundamentação de direito constante da douta sentença acerca do ponto em apreciação (renúncia ao direito de preferência), à qual se adere na íntegra, entende-se que com base na prova documental existente nos autos especialmente o teor dos documentos nºs 15 e 17 juntos com a contestação dos ora recorridos, se imporia carrear para o acervo dos factos provados os seguintes factos: “A Autora F………………, Lda., apôs a sua assinatura em dois documentos (docs. 15 e 17) por ela elaborados e assinados em Março e Abril de 2018, subscrevendo, desse modo, a seguinte declaração:
“O SENHORIO é legítimo proprietário do imóvel sito à Rua …………….., freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada, sob o nº ……………. inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ………… da dita freguesia, constando identificado como sendo o senhorio identificado Luís …………..”
51. Pelo que a sentença recorrida entendeu também, e bem, que sempre haveria efetiva renúncia ao direito de preferência por parte da recorrente, uma vez que esta apenas instaurou a presente ação quando se apercebeu que as condições que pretendia impor para o novo contrato de arrendamento não seriam aceites, como aliás elas própria comunica ao recorrido marido, em 31/07/2018. (doc. 18, com a contestação);
52. Por isso, muito bem esteve o Tribunal “a quo”, quando sustenta que sempre a ação improcederia, dado que a Autora efetivamente renunciou ao direito de preferência, não devendo, por isso, merecer qualquer censura ou reparo;
53. Até porque, entendem os recorridos que a renúncia ao direito de preferência por banda da Autora, além de escrita, é efetuada de modo expresso, conforme acima se fundamenta e resulta provado documentalmente;
54. Conforme muito bem sustenta o Tribunal recorrido, “tal leva-nos a concluir por uma manifestação de vontade de não exercício do direito de preferir mesmo antes do dies a quo fixado para o seu exercício (neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30/09/1999, processo nº 99B637, disponível em www.dgsi.pt).”
55. Quanto ao abuso de direito pela Autora decorrente da interposição da presente ação, ao contrário do que esta sustenta nas suas doutas alegações de recurso, salvo o devido respeito, ficou sobejamente demonstrado, não devendo merecer a douta sentença qualquer reparo, de facto ou de direito. Assim;
56. Considera a recorrente que, a haver abuso de direito, o mesmo só poderia ser imputado aos recorridos, nunca a ela própria.
57. Na verdade, sustenta ainda que seriam os recorridos quem teria agido de má-fé, comportamento que - diga-se - nunca estes lhe imputaram.
58. A tese da recorrente assenta essencialmente, desde logo, nos argumentos por ela alegados ad nauseam (cfr. alíneas D.; E; G; H; I; L; M; N; O; P; Q; R; V; Y; Z; AA; DD e EE das doutas alegações de recurso) de supostamente terem sido os Réus adquirentes, os ora recorridos, quem unilateralmente rompeu as negociações do arrendamento, fazendo-o sem qualquer justo motivo ou pertinente fundamento, quando – sempre na versão da recorrente - as partes já haviam (até com a participação dos seus advogados) concluído a elaboração das respetivas minutas.
59. Desde logo, tais pressupostos de facto são totalmente falsos, como resulta dos autos;
60. Considera, ainda, a recorrente que tal facto teria sido ignorado e não levado à matéria assente pelo Tribunal recorrido, concluindo, por isso, que a existir má-fé negocial e concomitante abuso de direito, o mesmo só poderia ser imputado aos Réus adquirentes, porque, na sua tortuosa versão dos factos (e da realidade), teria ficado demonstrado que encetaram negociações que, mesmo já concluídas e finalizadas (faltando apenas a sua assinatura), nunca se quiseram comprometer e vincular;
61.Partindo dos referidos pressupostos, conclui a recorrente F……………., Lda. que a existir má-fé e concomitante abuso de direito, este só poderia ser imputado aos Réus adquirentes, ora recorridos;
62. Ora, não só os pressupostos são falsos como a conclusão ilógica e até abusiva;
63. Antes de mais, não se vislumbra qual concretamente o direito cujo exercício pelos recorridos a recorrente considera abusivo.
64. É que, segundo a melhor doutrina (e as regras da lógica), o abuso do direito pressupõe logicamente um qualquer direito, que possa ser exercitado pelo respetivo titular, ainda que abusivamente. Ora, os recorridos limitaram-se a contestar a ação…
65. Porém, como é bem de ver, “in casu” a recorrente não especifica ou identifica qual o direito subjetivo que os recorridos exercem alegadamente em abuso (de direito);
66. Depois, a argumentação da recorrente quanto à iniciativa, autoria e responsabilidade pelo rompimento unilateral das negociações para o arrendamento é cabalmente desmentida pelo teor literal (explícito) do e-mail (doc.18 junto com a contestação) pela recorrente enviado ao recorrido marido no dia 31-07-2018, onde consta escrito o seguinte: “Venho pelo presente comunicar a V. Exa. que não tendo sido possível renegociar o contrato de arrendamento em vigor, atento o valor final pedido por V. Exa. a título de renda, o qual seria incomportável, e representou um acréscimo muito significativo sobre o valor inicialmente acordado e selado pelas partes, a F………….., Lda. entendeu avançar com uma ação judicial…
67. Depois, ainda, a argumentação da recorrente quanto à suposta conclusão das negociações relativas ao contrato de arrendamento, invocando repetitivamente (à exaustão) no seu douto recurso que as referidas negociações já estariam “concluídas e finalizadas (faltando apenas a sua assinatura)”, é totalmente desmentida por prova documental da sua própria autoria, antes de mais, ou seja, pelo teor literal do e-mail de 31-07-2018 (doc.18), por ela enviado – como já se disse – ao Réu marido para unilateralmente pôr termo ao processo negocial em curso, onde consta escrito, entre o mais, o seguinte: “… não tendo sido possível renegociar o contrato de arrendamento em vigor, atento o valor final pedido por V. Exa. a título de renda…” (sublinhado nosso)
68. Ora, é evidente do teor literal do referido documento que a recorrente tinha a noção plena de não ter à data de 31-07-2018 logrado (ainda) concluir as negociações tendentes à celebração do contrato de arrendamento, apesar das duas propostas negociais escritas (docs. 15, 16 e 17, juntos com a contestação) por ela elaboradas e apresentadas ao Réu marido como meras propostas negociais e por este nunca aceites na sua totalidade, motivo porque nunca as validou ou assinou;
69.Na verdade, as duas minutas de contrato de arrendamento elaboradas pela recorrente, e por ela apresentadas ao Réu marido como meras propostas de acordo (docs. 15 e 17), previam 10 (dez) cláusulas contratuais, nelas se incluindo designadamente a identificação e a concreta área (parcial) do imóvel a arrendar (cfr. plantas anexas às minutas dos contratos), prazo de duração do arrendamento, o valor e a periodicidade do pagamento da renda, o regime tributário aplicável ao contrato, as obrigações para as partes decorrentes da realização de obras no locado e vários outras aspetos negociais objeto do contrato e de aturada negociação entre as partes, a ora recorrente e os recorridos;
70.Ou seja, as negociações em curso até 31-07-2018, abruptamente e unilateralmente cessadas pela ora recorrente V……….., Lda. nesse mesmo dia, nunca foram concluídas entre as partes, uma vez que os recorridos nunca aceitaram na sua globalidade, nem mesmo quanto ao valor final da renda, as propostas escritas de contrato de arrendamento documentadas nos autos (docs.15, 16 e 17, da contestação) designadamente quanto à área concreta do imóvel a arrendar, portas de entrada e saída para a via pública (cfr. mapa anexo à minuta do contrato), área total a arrendar, prazo do arrendamento e eventual modo de renovação do mesmo, obrigações decorrentes de obras, etc, e, por isso, aquelas nunca reciprocamente validaram ou assinaram;
71.Acresce que, mesmo que assim se não entendesse, o que não se concede, foi a própria recorrente quem revogou unilateralmente a última proposta de contrato por ela apresentada ao Réu marido, negando a este último qualquer possibilidade de, querendo, a aceitar a partir de 31-07-2017, com a comunicação por e-mail desse dia e com a prévia interposição desta ação;
72.Ou seja, não só ficou cabalmente demonstrado que o recorrido marido nunca validou (pessoalmente ou sequer através do seu advogado), aceitou e/ou assinou qualquer das duas propostas contratuais elaboradas pela recorrente designadamente nas várias (dez) cláusulas, condições e plantas anexas que o contrato em apreço pretendia regular nomeadamente, as acima questões já referidas, como inclusive o recorrido marido foi confrontado com a revogação expressa da última proposta de contrato que lhe foi proposta apresentada pela recorrente, conforme resulta evidente da conjugação do depoimento do recorrido e do teor do e-mail junto com a contestação como documento nº 18;
73.Acresce que, a argumentação da recorrente é contraditória em si mesma, dizendo, por um lado, que as negociações já estariam finalizadas e concluídas entre recorrente e recorridos e, por outro lado, que o Réu marido não se quis vincular e assinar as duas propostas de contrato, por não as aceitar - minutas essas que foram elaboradas unicamente pela recorrente;
74.Ora, ao contrário do que incorretamente sustenta a recorrente, o Tribunal “a quo” não só não ignorou os factos acima alegados pela recorrente como deu por provado o que ficou cabalmente demonstrado no julgamento, ou seja, que durante vários meses e nomeadamente em meados de março e Abril de 2018 e durante os meses que se seguiram até 31/07/2018, a recorrente e os recorrido marido estabeleceram negociações tendentes a celebrar um novo contrato de arrendamento com efeitos a partir de 31/07/2018, nunca tendo, porém, concluído ou finalizado tais negociações e/ou os termos exatos do contrato, motivo pelo qual os Recorridos não aceitaram qualquer das duas versões de minutas de contrato de arrendamento elaboradas e propostas pela recorrente, não as tendo, por isso, validado, confirmado e muito menos assinado;
75.É evidente, por outro lado, que o Tribunal recorrido julgou provado – e bem! – que quem revogou unilateralmente a proposta pendente de contrato de arrendamento foi a própria recorrente, por via do e-mail de 31/07/2018, o qual põe definitivamente termo às negociações ainda em curso. (cfr. números 17. e 18. D dos factos provados);
76.Na verdade, a tese da recorrente esbarra na prova e na realidade, não tendo, por isso, o mínimo fundamento factual a gratuita imputação de má-fé ou abuso de direito por banda dos recorridos, quando ficou sobejamente provado exatamente o contrário, ou seja, que foi a recorrente, como aliás ela própria admitiu, quem unilateralmente rompeu as negociações em curso em 31-07-2018 e que estas, exatamente por estarem em curso, nunca foram concluídas, tendo aliás sido a própria recorrente quem unilateralmente as fez cessar, pelos motivos que apenas ela invocou e nesse mesmo dia comunicou por e-mail ao recorrido marido;
77.Acresce ainda que,
a)A negociação entre recorrente e os recorridos do contrato de arrendamento prolongou-se durante quase um ano, até ao dia 31/07/2018;
b)Em março e Abril de 2018 foram elaboradas pela recorrente e apresentadas ao recorrido marido duas propostas negociais sob a forma de minutas de contrato de arrendamento;
c)A última dessas propostas manteve-se pendente de aceitação pelos recorridos até ao dia 31/07/2018, data em que foi revogada unilateralmente pela recorrente;
d)A Autora reconheceu os recorridos como legítimos proprietários pagando-lhes as rendas do imóvel a partir do mês de Novembro de 2017 designadamente nos meses de Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho e Agosto de 2018 (cfr. ponto 13. dos factos provados), tudo após ter recebido cópia da escritura de compra e venda, em notificação judicial avulsa promovida pelos recorrentes para denúncia do contrato de arrendamento (então) em vigor, por ela recebida em fevereiro de 2018, pela qual “se apercebe da totalidade das condições do negócio (a começar pela data da sua realização) …” como ela própria expressamente admite, aliás no mesmo parágrafo!
78.Depois;
Considerando que, mesmo na versão da recorrente, já em Fevereiro de 2018, se apercebe da totalidade das condições do negócio (a começar pela data da sua realização; Considerando que, ainda assim, a Autora reconheceu os recorridos como legítimos proprietários pagando-lhes as rendas do imóvel a partir do mês de Novembro de 2017 designadamente, e especialmente, os meses de Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho e Agosto de 2018; Considerando ainda que, em meados de março de 2018, a recorrente e o Recorrido marido, acompanhado do seu filho António, reuniram-se a fim de negociarem um novo contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 31 de Julho de 2018; Considerando que, no dia 26-03-2018, a recorrente entregou aos 2ºs Réus um documento denominado “CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS NÃO HABITACIONAIS POR PRAZO CERTO”, devidamente rubricado e assinado pela recorrente, na qualidade de arrendatária; Considerando que, não tendo os 2ºs Recorridos aceite as cláusulas de tal documento, a Autora, ora recorrente, a 02/04/2018, remeteu novo documento denominado “CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS HABITACIONAIS POR PRAZO CERTO devidamente rubricado, carimbado e assinado pela Autora, na qualidade de arrendatária; Considerando ainda que, na cláusula primeira das minutas de contrato de arrendamento antes mencionadas (docs. 15 e 17), juntos com a contestação) consta a declaração escrita que “O SENHORIO é legítimo proprietário do imóvel sito à Rua ……………… freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada, sob o nº …………… inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ……….. da dita freguesia”; Considerando que, as minutas dos ditos contratos de arrendamento (docs. 15 e 17), juntos com a contestação) foram elaboradas pela recorrente e, sobretudo, por ela rubricadas e assinadas; Considerando, ainda, que a recorrente e o Recorrido marido, mantiveram as negociações entre si, umas vezes diretamente, outras vezes através dos seus advogados, com contactos quase permanentes, até ao dia 31/07/2018, tudo com vista à celebração de novo contrato de arrendamento; Considerando, por fim, que, no dia 31/07/2018, a Autora enviou ao Réu marido, via e-mail a seguinte comunicação:
venho pelo presente comunicar a V. Exa. que não tendo sido possível renegociar o contrato de arrendamento em vigor, atento o valor final pedido por V. Exa. a título de renda, o qual seria incomportável, e representou um acréscimo muito significativo sobre o valor inicialmente acordado e selado pelas partes, a Farmácia de V………………, Lda., entendeu avançar com uma ação judicial de preferência de aquisição do referido prédio, que corre termos sob o processo nº 1913/18.9 T8PDL (Juízo Central Cível e Criminal de Ponta Delgada-Juiz 3), por entender que lhe assiste esse direito que foi violado
79.Torna-se óbvio, sem quebra do devido respeito, concluir por força de tal factualidade que a recorrente apenas instaurou a presente ação de preferência porque não logrou que os recorridos aceitassem as suas condições contratuais e como forma de protelar a entrega do imóvel após a cessação do contrato de arrendamento então em vigor, agindo em manifesto abuso de direito;
80.Conforme muito bem diz o Tribunal “a quo”, “… verificamos que a Autora, ao socorrer-se desta ação apenas porque não conseguiu que as suas condições para o arrendamento fossem aceitas, após quase um ano de negociações, sem que jamais tenha manifestado vontade de preferir na venda, ultrapassou os limites impostos pela boa-fé, pretendendo fazer valer um direito em contradição com a sua conduta anterior, quando o seu comportamento justificava, de facto, a convicção de que não se faria valer de tal direito”;
81.Lapidar é, por fim, o que o Tribunal “a quo” seguidamente sustenta em brilhante fundamentação, a que se adere de pleno:
“Concluímos, assim, pelo abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, pois estamos perante duas condutas da Autora, ambas lícitas, mas assumidas em momentos distintos e distanciadas no tempo, em que a primeira (o facto próprio) é contraditada pela segunda (o venere), de modo que essa relação de oposição entre as duas justifique a invocação do princípio do abuso de direito. O venere tem a sua razão de ser no princípio da confiança enquanto exigência de que as pessoas sejam protegidas quando, em termos justificados, tenham sido conduzidas a acreditar na manutenção de determinados comportamentos da comunidade humana, que se encontra organizada na base de relacionamentos estáveis, em que cada um deve ser congruente, não mudando constante e arbitrariamente de condutas, mormente que sejam nocivas ao seu semelhante. Resta concluir, pois, que estaríamos sempre perante o ilegítimo exercício de um direito por parte da Autora.”.
Concluem, no sentido da total improcedência do recurso.
16 – O recurso foi admitido por despacho datado de 30/03/2022, como apelação, com subida nos próprios autos, de imediato e com efeito meramente devolutivo.
17 - Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir.
*
II ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO
Prescrevem os nºs. 1 e 2, do artº. 639º do Cód. de Processo Civil, estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que:
1 – o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
2 – Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a) As normas jurídicas violadas ;
b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas ;
c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”.
Por sua vez, na esteira do prescrito no nº. 4 do artº. 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que “nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso”, é pelas conclusões da alegação da recorrente Apelante que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do interposto recurso.
Pelo que, no sopesar das conclusões expostas, a apreciação a efectuar na presente sede determina o conhecimento, fundamentalmente, das seguintes questões:
I) DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
DA EVENTUAL PERTINÊNCIA DA MODIFICABILIDADE DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO, nos quadros do artº. 662º, do Cód. de Processo Civil, o que implica a REAPRECIAÇÃO DA PROVA, inclusive da GRAVADA:
1. Da nova redacção a conferir aos factos provados 15 e 16,
Ou
Do aditamento de novos factos, com a seguinte redacção:
a) “Em meados de Março de 2018, a Autora e os Réus adquirentes estabeleceram negociações tendentes a celebrar um contrato de arrendamento, tendo concluído e acordado, de comum entendimento, a totalidade das condições daquele” ;
b) “O contrato de arrendamento assim negociado entre elas correspondeu à vontade de ambas, tendo sido assinado pela Autora, que entregou tal versão assinada (por duas vezes) aos Réus adquirentes para igualmente estes o assinarem” ;
2. Do aditamento de um novo facto, com a seguinte redacção:
a) “Os Réus adquirentes, não obstante terem concordado inteiramente com o contrato de arrendamento que lhes foi entregue pela Autora (e por ela devidamente assinado), em Março de 2018, nunca o assinaram, e não alegaram, em momento algum, qualquer razão para o efeito” ;
- Conclusões D), K) a O), Z), AA), DD) e EE) ;
II) Do ENQUADRAMENTO JURÍDICO
1. Do incumprimento do dever de comunicação previsto no artº. 416º, do Cód. Civil ;
a) Da inidoneidade da comunicação recepcionada em 06/11/2017 para o cumprimento de tal dever e para o desencadear do início do prazo ;
b) Da inexistência de caducidade do direito da preferente - Conclusões J), CC) e FF) a EEE) ;
2. Da inexistência de qualquer renúncia abdicativa expressa do direito de preferir - Conclusões F), G), X), Y) e BB)  ;
3. Da inexistência de abuso de direito - Conclusões E), H), I), P) a X) e BB).
Tendo em consideração o teor das contra-alegações apresentadas pela 1ª Ré e 2ºs Réus, urge apreciar, como questão prévia, acerca da eventual ponderação da apreciação da impugnação da matéria factual apresentada, nomeadamente em sede de ampliação do âmbito ou objecto do recurso.
Posteriormente, caso se conclua afirmativamente, impõe-se a apreciação do reclamado aditamento dos seguintes factos:
- pela 1ª e 2ºs Réus:
Na diligência de abertura de propostas realizada em 28/07/2017, referida em 4., esteve presente V……………., gerente de facto da Autora e pessoa que tudo nesta decidia, que nesse acto tomou conhecimento das condições de venda do imóvel identificado em 1.”.
O que fundamentam:
- Na acta da diligência de abertura de propostas ;
- No depoimento da testemunha António………. ;
- No doc. nº. 2 junto pela Autora na p.i. – Conclusões Contra-alegacionais 13. a 16. (1ª Ré) e 36. a 38. (2ºs Réus).
- pelos 2ºs Réus:
“a Autora F…………………, Lda., apôs a sua assinatura em dois documentos (docs 15 e 17) por ela elaborados e assinados em Março e Abril de 2018, subscrevendo, deste modo, a seguinte declaração:
«o senhorio é legítimo proprietário do imóvel sito à Rua ……………, freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o nº. …………., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ………… da dita freguesia, constando identificado como sendo o senhorio identificado Luís …………..”.
O que fundamenta no teor dos documentos nºs. 15 a 17 juntos pelos 2ºs Réus com a contestação - Conclusões Contra-alegacionais 49. a 51..
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QUESTÃO PRÉVIA
A) Da (in)admissibilidade de conhecimento da impugnação factual deduzida em sede contra-alegacional
Conforme supra referenciámos, em sede contra-alegacional vieram os Réus pugnar pelo aditamento ao acervo factual de dois novos diferenciados factos, assim impugnando a matéria de facto consignada na sentença recorrida.
Não tendo os mesmos invocado ou fundamentado, minimamente, a admissibilidade no recurso a tal mecanismo processual, impõe-se, num primeiro momento, apreciar acerca da admissibilidade de tal pretensão, atenta a sua não qualidade de recorrentes, aditada daquela omissão justificativa.
Prevendo acerca da ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido, estatuem os nºs. 1 e 2, do artº. 636º, do Cód. de Processo Civil, que:
“1 - No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.
2 - Pode ainda o recorrido, na respetiva alegação e a título subsidiário, arguir a nulidade da sentença ou impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas”.
Escalpelizado o teor as contra-alegações, constata-se que os Réus não invocaram expressamente recorrer ao mecanismo de ampliação do âmbito ou objecto do recurso, colocando-se, assim, a questão da legal admissibilidade na consideração da impugnação apresentada.
Referencia Abrantes Geraldes [2] que “o facto de a lei fazer depender a ampliação do objecto do recurso de requerimento da parte vencedora não significa que a pretensão tenha de se apresentar formalmente como tal, bastando que essa vontade resulte de forma inequívoca das contra-alegações, maxime das respectivas conclusões”.
Em nota de rodapé, referencia jurisprudência exigente da mesma “clareza e expressividade”, no sentido da parte dever suscitar a ampliação “de «modo claro e expresso», não bastando a referência à questão nas conclusões das contra-alegações”.
Expressamente, referencia-se no douto Acórdão do STJ de 25/11/1997 – Relator: Martins da Costa, Processo nº. 283/97, BMJ, nº. 471, pág. 332 -, que “para que possa ter lugar essa reapreciação, o recorrido deve suscitá-la, de modo claro e expresso, expondo as razões da sua discordância e contrariando as invocadas na decisão recorrida, e, tal como se exige para o recorrente, não basta a referência à questão nas conclusões da contra-alegação, devendo a mesma ser exposta no respectivo texto, por deverem ser aquelas um simples resumo deste[3].
Com interesse para a questão em apreciação revela-se, ainda, o entendimento sufragado no douto Acórdão do STJ de 31/01/2007 – Relator: Silva Salazar, Processo nº. 06A4492, in www.dgsi.pt -, em situação em que os recorrentes não haviam impugnado a matéria de facto, mas a recorrida fê-lo nas suas contra-alegações da apelação, sem requerer de forma expressa ampliação do âmbito do recurso.
Entendeu-se que “o requerimento de ampliação do âmbito do recurso pelo recorrido só tem de ser expressamente deduzido na hipótese prevista no n.º 1 do citado art.º 684º-A [com correspondência no vigente artº. 636º], de pluralidade de fundamentos da acção ou da defesa; já para a hipótese prevista no n.º 2 do mesmo artigo, como resulta até do termo “ainda”, nele utilizado, a significar que se trata de situação distinta, não se torna necessário um requerimento específico, isto é, não exige a lei a utilização do termo “requerer” ou equivalente, bastando que das contra alegações do recorrido, sem que a lei imponha sequer que tal seja feito em forma de conclusões, resulte com clareza pretender este arguir nulidade ou impugnar matéria de facto.
E das contra alegações produzidas pela ré na apelação resulta com toda a certeza pretender ela fazer essa impugnação” (sublinhado nosso).
Ora, ainda que seja controvertido o entendimento de dispensa de apresentação de conclusões, que colocaria distintas exigências relativamente ás posições processuais de recorrente e recorrido, de difícil aceitação, no perfilhar de tal entendimento, parece podermos concluir o seguinte:
- in casu, em ambos os articulados contra-alegacionais, foram apresentadas conclusões, pelo que a ressalva exposta não colhe em concreto ;
- a impugnação da matéria de facto apresentada consta quer do corpo contra-alegacional, quer das conclusões enunciadas ;
- estamos perante a situação explicitada no nº. 2 do artº. 636º, que parece dispensar o mencionado requerimento específico ou expresso ;
- donde se conclui no sentido de, em abstracto (sem cuidar, no presente, acerca do eventual preenchimento dos demais pressupostos ou exigências recursórias, maxime as enunciadas nos artigos 639º e 640º, do CPC), dever conhecer-se acerca da impugnação da matéria de facto apresentada pelos Recorridos (1ª Ré e 2ºs. Réus) em ambas as contra-alegações recursórias apresentadas.
III - FUNDAMENTAÇÃO
A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Na sentença recorrida, foi considerado como PROVADO o seguinte:
1. Por escrito particular intitulado por “CONTRATO DE ARRENDAMENTO”, de 01/08/2014, a Autora tomou de arrendamento comercial à sociedade W………………., Lda., que, por seu turno, deu de arrendamento, destinado à exploração de um estabelecimento comercial de farmácia, o prédio urbano, em regime de propriedade total, sito na freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, na Rua ……………., descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o número ……………., e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ………...
2. O prédio foi alienado no âmbito do processo de insolvência (entretanto decretada) da sociedade proprietária/senhoria, pela Primeira Ré aos Segundos Réus, pelo preço de 295 000,00€, conforme escritura de 20/10/2017.
3. Nessa data subsistia o contrato de arrendamento comercial.
4. O Senhor Administrador da Insolvência optou pela modalidade de venda de negociação particular, tendo designado data e local para a abertura de propostas, a saber, o dia 28/07/2018, às 10h., na sala “Polivalente do Tribunal de Ponta Delgada”, do que a Autora foi notificada.
5. Após 01/08/2017 a Autora não foi notificada para efeitos de exercício do direito de preferência na alienação referida no ponto 2.
6. A proposta dos Segundos Réus, apresentada antes da diligência referida no ponto 4., veio a ser aceite e adjudicada pelo Senhor Administrador da Insolvência.
7. No dia 02/08/2017, V………………., gerente da Autora, participou na qualidade de arrendatária do imóvel vendido aos Réus, numa reunião com o Réu marido, este último na qualidade de adquirente e novo senhorio dela.
8. Em tal reunião, V………………… arrogou-se como legítima arrendatária [e não proprietária, como por lapso evidente consta, sendo a origem deste facto o teor do alegado no artº. 26º da contestação dos 2ºs. Réus] do imóvel e mencionou que iria continuar a cumprir o contrato de arrendamento até ao fim, pagando as respetivas rendas.
9. No dia 03/08/2017, o Sr. Administrador de Insolvência dirigiu carta registada com aviso de receção comunicando, entre o mais, à Autora o seguinte: Venho por este meio, na qualidade de Administrador Judicial, com a cédula 288, nomeado nos autos à margem identificados, informar V. Exa., nos termos e para os legais efeitos, enquanto inquilina sob a verba 32, que o imóvel foi adjudicado a LUIS ……………., NÚMERO DE IDENTIFICAÇÃO FISCAL ………….., pelo valor de 295.000,00€, carta devolvida pelos serviços postais
10.Tal carta foi endereçada para a morada correspondente ao imóvel arrendado, onde funciona o estabelecimento de farmácia da Autora.
11.No dia 31/10/2017, o Sr. Administrador da Insolvência endereçou carta registada com aviso de receção, comunicando, entre o mais, à ora A. o seguinte: Venho por este meio, na qualidade de Administrador Judicial, com a cédula 288, nomeado nos autos à margem identificados, informar V. Exa., nos termos e para os legais efeitos, enquanto inquilina sob a verba 32, que o imóvel foi adjudicado a LUIS ……………, NÚMERO DE IDENTIFICAÇÃO FISCAL ……………., pelo valor de 295.000,00€.
12.Tal carta foi recebida pela Autora no dia 06/11/2017.
13.A partir de novembro de 2017, a Autora [e não Ré, sendo manifesto o lapso existente] passou a pagar a renda aos 2ºs réus, o que fez mensalmente até agosto de 2018.
14.Em meados de março de 2018, a Autora e o Réu marido, acompanhado do seu filho António, reuniram-se a fim de negociarem um novo contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 31 de julho de 2018.
15.No dia 26-03-2018, a Autora entregou aos Réus um documento denominado “CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS NÃO HABITACIONAIS POR PRAZO CERTO”, devidamente rubricado e assinado pela Autora, na qualidade de arrendatária.
16.Não tendo os 2ºs Réus aceite as cláusulas de tal documento, a Autora, a 02/04/2018, remeteu novo documento denominado “CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS NÃO HABITACIONAIS POR PRAZO CERTO devidamente rubricado, carimbado e assinado pela Autora, na qualidade de arrendatária.
17.A Autora e o Réu marido mantiveram as negociações entre si, umas vezes diretamente, outras vezes através dos seus advogados, com contactos quase permanentes, até ao dia 31/07/2018, tudo com vista à celebração de novo contrato de arrendamento.
18.No dia 31/07/2018, a Autora enviou ao Réu marido, via e-mail a seguinte comunicação: venho pelo presente comunicar a V. Exa. que não tendo sido possível renegociar o contrato de arrendamento em vigor, atento o valor final pedido por V. Exª a título de renda, o qual seria incomportável, e representou um acréscimo muito significativo sobre o valor inicialmente acordado e selado pelas partes, a F………….., Lda., entendeu avançar com uma ação judicial de preferência de aquisição do referido prédio, que corre termos sob o processo nº 1913/18.9 T8PDL (Juízo Central Cível e Criminal de Ponta Delgada -Juiz 3), por entender que lhe assiste esse direito que foi violado….
Na mesma sentença, foram considerados como NÃO PROVADOS os seguintes factos:
a) A Autora não compareceu nem se fez representar no dia, na hora e no local designados para a abertura das propostas e venda.
b) A Autora desconhece absolutamente em que condições ocorreu a referida licitação ou ocorreu a mencionada abertura de propostas, seu teor e respetivas condições, assim como não tem conhecimento se houve ou não o pagamento do preço.
Ao abrigo do disposto no artº. 607º, nºs. 3 e 4, ex vi do nº. 2, do artº. 663º, ambos do Cód. de Processo Civil, tendo por base o teor da prova documental identificada, considera-se igualmente PROVADO que:
1.A – Consta da cláusula nona de tal escrito particular que «a segunda outorgante tem direito de preferência na venda do imóvel»” – cf., doc. nº. 1 junto com a p. i. ;
2.A – Conforme certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada (Açores), freguesia de Ponta Delgada (São Sebastião), tal aquisição encontra-se registada sob a Ap. 573 de 23/10/2017, relativamente ao prédio descrito sob o nº. ………….., constando do seu teor «certidão permanente disponibilizada em 19-10-2017 e válida até 19-04-2018»” - cf., doc. nº. 2 junto com a p. i. ;
16.A – Nos documentos identificados em 15. e 16. figura como «Primeiro Contratante» e «Senhorio» Luís ………….., constando expressamente sob a «Cláusula primeira» o seguinte:
«O SENHORIO é legítimo proprietário do imóvel sito à Rua ………………., freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada, sob o n.º …………, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ………. da dita freguesia»” - cf., docs. nºs. 15 e 17 juntos com a contestação dos 2ºs. Réus.
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B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
1 – DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
I) Da REAPRECIAÇÃO da PROVA, inclusive GRAVADA, decorrente da impugnação da matéria de facto
Prevendo acerca da modificabilidade da decisão de facto, consagra o artigo 662º do Cód. de Processo Civil os poderes vinculados da Relação, estatuindo que:
“1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados”.
Para que tal conhecimento se consuma, deve previamente o recorrente/apelante, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o ónus a seu cargo plasmado no artigo 640º do mesmo diploma, o qual dispõe que:
“1 -Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º”.
No caso sub judice, a prova produzida em audiência foi gravada. E, tendo a Recorrente/Apelante dado cumprimento ao preceituado no supra referido artigo 640º, nº. 2, alín. a), do Cód. de Processo Civil, nada obsta a que o presente Tribunal proceda à reapreciação da matéria factual fixada, operando-se, assim, à devida audição e ponderação da indicada prova, bem como à leitura dos excertos transcritos.
Não se desconhece que “para negar a admissibilidade da modificação da decisão da matéria de facto, designadamente quando esta seja sustentada em meios de prova gravados, não pode servir de justificação o mero facto de existirem elementos não verbalizados (gestos, hesitações, posturas no depoimento, etc.) insusceptíveis de serem recolhidos pela gravação áudio ou vídeo. Também não encontra justificação a invocação, como factor impeditivo da reapreciação da prova oralmente produzida e da eventual modificação da decisão da matéria de facto, da necessidade de respeitar o princípio da livre apreciação pelo qual o tribunal de 1ª instância se guiou ou sequer as dificuldades de reapreciação de provas gravadas em face da falta de imediação”.
Pelo que, poderá e deverá a Relação “modificar a decisão da matéria de facto se e quando puder extrair dos meios de prova, com ponderação de todas as circunstâncias e sem ocultar também a livre apreciação da prova, um resultado diferente que seja racionalmente sustentado[4].
Reconhece-se que o registo dos depoimentos, seja áudio ou vídeo, “nem sempre consegue traduzir tudo quanto pôde ser observado no tribunal a quo. Como a experiência o demonstra frequentemente, tanto ou mais importante que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, sendo que a mera gravação dos depoimentos não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que porventura influenciaram o juiz da 1ª instância.
Na verdade, existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas são percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção do julgador”.
Efectivamente, e esta é uma fragilidade que urge assumir e reconhecer, “o sistema não garante de forma tão perfeita quanto a que é possível na 1ª instância a percepção do entusiasmo, das hesitações, do nervosismo, das reticências, das insinuações, da excessiva segurança ou da aparente imprecisão, em suma, de todos os factores coligidos pela psicologia judiciária e de onde é legítimo aos tribunais retirar argumentos que permitam, com razoável segurança, credibilizar determinada informação ou deixar de lhe atribuir qualquer relevo”.
Todavia, tais dificuldades não devem justificar, por si só, a recusa da actividade judicativa conducente à reapreciação dos meios de prova, ainda que tais circunstâncias ou fragilidades devam ser necessariamente “ponderadas na ocasião em que a Relação procede à reapreciação dos meios de prova, evitando a introdução de alterações quando, fazendo actuar o princípio da livre apreciação das provas, não seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de erro de apreciação relativamente aos concretos pontos de facto impugnados[5] (sublinhado nosso).
- Da nova redacção a conferir aos factos provados 15. e 16. OU do aditamento de dois novos factos
- Do aditamento de um novo facto
A Recorrente Autora, reivindicante preferente, questiona a redacção conferida aos pontos 15. e 16. provados, constando destes que:
15.No dia 26-03-2018, a Autora entregou aos Réus um documento denominado “CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS NÃO HABITACIONAIS POR PRAZO CERTO”, devidamente rubricado e assinado pela Autora, na qualidade de arrendatária.
16.Não tendo os 2ºs Réus aceite as cláusulas de tal documento, a Autora, a 02/04/2018, remeteu novo documento denominado “CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS NÃO HABITACIONAIS POR PRAZO CERTO devidamente rubricado, carimbado e assinado pela Autora, na qualidade de arrendatária”.
Pretende que tal redacção seja modificada, ou então, que sejam aditados dois novos factos, dos quais conste que:
- Em meados de Março de 2018, a Autora e os Réus adquirentes estabeleceram negociações tendentes a celebrar um contrato de arrendamento, tendo concluído e acordado, de comum entendimento, a totalidade das condições daquele” ;
- O contrato de arrendamento assim negociado entre elas correspondeu à vontade de ambas, tendo sido assinado pela Autora, que entregou tal versão assinada (por duas vezes) aos Réus adquirentes para igualmente estes o assinarem”.
Por outro lado, reclama, ainda, o aditamento de um novo facto, do qual conste que:
- Os Réus adquirentes, não obstante terem concordado inteiramente com o contrato de arrendamento que lhes foi entregue pela Autora (e por ela devidamente assinado), em Março de 2018, nunca o assinaram, e não alegaram, em momento algum, qualquer razão para o efeito”.
Alega, no essencial, que:
- foram os Réus adquirentes que unilateralmente romperam as negociações do arrendamento, sem qualquer justo motivo ou pertinente fundamento, quando as partes já haviam (até com a participação dos seus advogados) concluído a elaboração das respectivas minutas ;
- pela prova produzida em julgamento, mais do que dar como provado que a Autora enviou minutas de arrendamento por si já devidamente assinadas, devia-se ter considerado como provado que as partes haviam efectivamente acordado (no seio das negociações) naqueles exactos termos, e que faltando apenas a assinatura dos Réus adquirentes, estes por duas vezes recuaram no acordo já estabelecido (embora não formalizado do lado deles) ;
- pelo que o Tribunal deveria ter considerado como provado que as partes, por duas ocasiões, chegaram a acordo quanto aos termos do contrato de arrendamento, embora sem que os Réus adquirentes os tivessem assinado ;
- da análise do depoimento do Réu adquirente é facilmente perceptível que aquele deu efectivamente assentimento ao arrendamento que havia negociado com a Autora, concordando com o valor demais condições contratuais, tendo confessado que as partes haviam alcançado perfeito e total entendimento ;
- nunca tendo explicitado o motivo pelo qual não apôs, nesse seguimento, a assinatura a um contrato previamente negociado, escrutinado pelo seu advogado e, nessa conformidade, até já assinado pela parte contrária, e portanto, fechado e concluído.
Na resposta apresentada, os Recorridos 2ºs. Réus negam a existência de tal acordo, o que enfatizam com recurso ao teor do e-mail que a Autora enviou ao Réu marido, em 31/07/2018 – facto 18. provado -, no qual se referencia a impossibilidade de renegociar o contrato de arrendamento, atento o valor final pedido a título de renda, assim colocando termo ao processo negocial em curso.
Acrescentam que aqueles documentos traduziram-se em meras propostas negociais, nunca aceites pelo Réu marido na sua totalidade, motivo pelo qual nunca as validou ou assinou.
Referenciam, ainda, nunca se ter chegado a acordo relativamente à globalidade das dez cláusulas contratuais ali enunciadas, nem mesmo quanto ao valor final da renda, designadamente “quanto à área concreta do imóvel a arrendar, acessos e portas de entrada e saída para a via pública (cfr. mapa anexo à minuta do contrato), área total a arrendar, prazo do arrendamento e eventual modo de renovação do mesmo, obrigações decorrentes de obras, etc, e, por isso, aquelas nunca reciprocamente validaram ou assinaram”.
Por outro lado, ainda que assim não fosse, foi a Autora quem revogou unilateralmente a última proposta de contrato por ela apresentada ao Réu marido, negando a este último qualquer possibilidade de, querendo, a aceitar a partir de 31-07-2017, com a comunicação por e-mail desse dia e com a prévia interposição desta acção.
A que acresce a própria argumentação contraditória da Recorrente pois, se por um lado afirma que as negociações já estariam finalizadas e concluídas,  por outro lado alude que o Réu marido não se quis vincular e assinar as duas propostas de contrato, por não as aceitar, sendo que tais minutas foram elaboradas unicamente pela Recorrente.
Apreciando:
A reiterada argumentação da Autora Impugnante respeita à alegada existência de um acordo obtido com os Réus Adquirentes (fundamentalmente com o Réu marido), fruto das negociações iniciadas em Maio de 2018, com a finalidade de estabelecerem um novo contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 31/07/2018.
Defende a Autora que o clausulado do novo contrato foi concluído ou acordado, na totalidade das suas condições, com os 2ºs Réus, mas que estes nunca assinaram os contratos de arrendamento que lhes forma entregues pela Autora, sem alegarem ou justificarem o motivo pelo qual nunca o fizeram.
E, funda tal pretensão numa alegada confissão decorrente do depoimento do Réu adquirente.
Ora, analisado o teor de tal depoimento constata-se não ser possível retirar do mesmo a concludência reivindicada pela Impugnante.
Efectivamente, o que decorre do declarado é que terá existido, num determinado momento do processo negocial, acordo quanto ao valor da renda, mas que posteriormente a ora Autora terá pretendido um aumento do espaço a arrendar, que acabou por inviabilizar o acordo final.
E, mesmo a alusão de um novo acordo quanto a um diferenciado valor de renda (3.450,00 €) sempre respeitaria a um diferenciado espaço cujos contornos não foram devidamente especificados ou concretizados no teor da prova produzida.
A que acresce que as negociações, como bem aduzem os Recorridos, sempre respeitariam a vário clausulado, para além do valor da renda e definição do espaço a arrendar, resultando evidente, até pelo teor do e-mail enviado pela Autora ao Réu marido em 31/07/2018 – facto provado 18. -, que tais negociações nunca lograram obter êxito. E, mesmo a referência aí feita constar de “um acréscimo muito significativo sobre o valor inicialmente acordado e selado pelas partes”, é perfeitamente coadunável e compatível com as existentes variações da área a arrendar, conducentes, inclusive, a que tais documentos assinados pela Autora fossem acompanhados de uma planta definitória do espaço a arrendar, conforme o ponto 1. da cláusula segunda.
Desta forma, o teor do declarado pelo depoente Réu deve ser necessariamente interpretado com tal quadro, definidor do acerto da renda e, num determinado momento, eventualmente de área a locar, mas sem que existisse sintonia ou acerto na definição de ambas, bem como das demais cláusulas contratuais a inserir. 
Pelo que é impossível concluir no sentido dos Réus adquirentes, e fundamentalmente o Réu marido, terem concordado inteiramente com o teor do contrato ou contratos de arrendamento que a Autora lhes entregou, e que previamente assinou, que estes correspondessem à vontade de ambas as partes anteriormente acordadas, e que nunca tenham invocado a razão para a não aposição das suas assinaturas.
E isto, independentemente da maior ou menor valoração de tal factualidade para a sorte da pretensão recursória sob sindicância.
Conclui-se, assim, no sentido de reconhecer-se que a factualidade devidamente assente e incontroversa consta dos factos provados 14. a 17., sem que possa concluir-se no sentido de que, nesse processo negocial, iniciado em Março de 2018 e terminado em 31/07/2018, tenha existido, em algum momento, total sintonia ou concordância quanto à totalidade do clausulado negocial a inserir no novo contrato de arrendamento, com início de vigência previsto para o dia 01/08/2018.
O que determina, neste segmento, total improcedência da pretensão recursória apresentada.
EM SEDE CONTRA-ALEGACIONAL:
- Da pretensão de aditamento de um novo facto pela 1ª e 2ºs Réus
Nas contra-alegações apresentadas, pugnam os Recorridos Réus pelo aditamento à matéria de facto do seguinte ponto:
Na diligência de abertura de propostas realizada em 28/07/2017, referida em 4., esteve presente V……………e, gerente de facto da Autora e pessoa que tudo nesta decidia, que nesse acto tomou conhecimento das condições de venda do imóvel identificado em 1.”.
Referencia a 1ª Ré ter sustentado em sede de contestação que a Autora, pelo menos desde 06/11/2017, tem conhecimento de todos os elementos essenciais da venda operada pelo administrador da insolvência, que sempre tudo lhe comunicou, ao contrário do falsamente alegado pela mesma no item 11º da P.I..
Todavia, acrescenta, realizado o julgamento, verifica-se que, afinal, a Autora tem conhecimento de tudo o quer se passou na venda, e respectivas condições, desde o dia 28/07/2017, tendo-lhe advindo tal conhecimento através do seu gerente de facto, Dr. V…………., que esteve presente no dia da abertura das propostas, tanto assim que o Meritíssimo Juíz a quo levou ao acervo dos factos não provados (vide respectiva alínea a)), que “A Autora não compareceu nem se fez representar no dia, na hora e no local designados para a abertura das propostas de venda”.
Desta forma, alega ser falso que a Autora tenha tido conhecimento informal da venda em Novembro de 2017, através do comprador, e só tenha tido conhecimento das efectivas condições de venda em Fevereiro de 2018, através da notificação judicial avulsa promovida também pelos compradores, onde estes juntaram a escritura pública de compra e venda.
Pelo que, com base na prova documental existente nos autos (acta da diligência de abertura de propostas) bem como com base no depoimento da testemunha António …….. acerca da presença nessa diligência do Dr. V…………, gerente de facto da recorrente, se impõe carrear aquele facto para o acervo dos factos provados.
Donde, tendo advindo tal conhecimento de todos os dados relevantes da venda desde 28/07/2017, caso entendesse ter sido preterida nesse seu direito teria desencadeado a acção de preferência nos seis meses seguintes, o que não fez e, por isso, deixou caducá-lo.
Apreciando:
Conforme expressamente referenciado em aresto desta Relação de 24/04/2019 [6], “na decisão da matéria de facto, o Tribunal apenas pode considerar os factos essenciais que integram a causa de pedir (ou as exceções), bem como os factos instrumentais, complementares ou concretizadores que resultem da instrução da causa, e os factos notórios e de que tem conhecimento por via do exercício das suas funções (art. 5.º do CPC), estando-lhe vedado, por força do princípio da limitação dos atos consagrado no art. 130.º do CPC, conhecer de matéria que, ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito, se mostra irrelevante para a decisão de mérito. São manifestações do princípio dispositivo e do princípio da economia processual que se impõem ao juiz da 1.ª instância aquando da seleção da matéria de facto provada/não provada na sentença, mas também na 2.ª instância, no que concerne à apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto”.
Acrescenta-se, então, citando Acórdão desta Relação de 27/11/2018 [7], que a jurisprudência dos Tribunais Superiores vem reconhecendo que a reapreciação da matéria de facto não constitui um fim em si mesma, mas um meio para atingir um determinado objetivo, que é a alteração da decisão da causa, pelo que sempre que se conclua que a reapreciação pretendida é inútil – seja porque a decisão sobre matéria de facto proferida pela primeira instância já permite sustentar a interpretação do direito aplicável ao caso nos termos sustentados pelo recorrente, seja porque ainda que proceda a impugnação da matéria de facto, nos termos requeridos, a decisão da causa não deixará de ser a mesmaa reapreciação sobre matéria de facto não deve ter lugar, por constituir um ato absolutamente inútil, contrariando os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2.º, n.º 1, 137.º, e 138.º do CPC)” (sublinhado nosso) [8].
Em consonância, refere-se expressamente no douto Acórdão do STJ de 17/05/2017 [9] que “o princípio da limitação de actos, consagrado no artigo 130º do Código de Processo Civil para os actos processuais em geral, proíbe a sua prática no processo – pelo juiz, pela secretaria e pelas partes – desde que não se revelem úteis para este alcançar o seu termo”, tratando-se de uma das “manifestações do princípio da economia processual, também aflorado, entre outros, no artigo 611º, que consagra a atendibilidade dos factos jurídicos supervenientes, e no artigo 608º n.º 2, quando prescreve que, embora deva resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, o juiz não apreciará aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”.
Acrescenta, nada impedir “que também no âmbito do conhecimento da impugnação da decisão fáctica seja observado tal princípio, se a análise da situação concreta em apreciação evidenciar, ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito, que desse conhecimento não advirá qualquer elemento factual, cuja relevância se projecte na decisão de mérito a proferir.
Com efeito, aos tribunais cabe dar resposta às questão que tenham, directa ou indirectamente, repercussão na decisão que aprecia a providência judiciária requerida pela(s) parte(s) e não a outras que, no contexto, se apresentem como irrelevantes e, nessa medida, inúteis”.
Pelo que, conclui, “para se aferir da utilidade da apreciação da impugnação da decisão fáctica importa considerar se os pontos de facto questionados se não apresentam de todo irrelevantes, se a eventual demonstração dos mesmos é susceptível de gerar um juízo diferente sobre a questão de direito, se é passível de influenciar e, porventura, alterar a decisão de mérito no quadro das soluções plausíveis da questão de direito (sublinhado nosso).
Ora, tendo por pressuposto tal entendimento, afigura-se-nos resultar indubitavelmente o seguinte:
- conforme melhor veremos infra, e já resulta do teor do antecedente Acórdão proferido nestes autos por este Colectivo, aquando da realização da diligência de abertura de propostas realizada em 28/07/2017, a Autora ainda não era titular do direito legal de preferência inscrito na alínea a), do nº. 1, do artº. 1091º, do Cód. Civil (na redacção vigente à data e, aqui aplicável, decorrente da Lei nº. 6/2006, de 27/02), donde consta que “o arrendatário tem direito de preferência: a) Na compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de três anos” ;
- efectivamente, naquela data ainda não se havia constituído na titularidade da ora Autora/Apelante arrendatária o direito legal de preferência na compra e venda do local arrendado, pois, naquela data, ainda não se havia completado prazo superior aos três anos então legalmente exigidos ;
- ou seja, relativamente àquela data designada para a abertura de propostas, não sendo ainda a arrendatária titular do invocado direito potestativo de preferência, não era exigível a sua notificação, para eventual exercício, no acto, de um direito de que ainda não dispunha, pois o prazo superior a três anos, imposto pelo normativo vigente, apenas se completaria a partir do dia 02/08/2017 ;
- desta forma, a eventual presença de um putativo gerente de facto da arrendatária na diligência de abertura de propostas surge como inócua, pois nenhum direito de preferência legal gozava a arrendatária, susceptível de, naquela data, ser exercido ;
- tal direito apenas se veio a constituir posteriormente na titularidade da arrendatária, em data antecedente à da efectiva transmissão do imóvel, que só veio a ocorrer mediante a outorga da escritura pública celebrada em 20/10/2017,  através da qual a 1ª Ré vendeu ao 2º Réu, comprador proponente, o imóvel (prédio urbano) objecto do arrendamento comercial ;
- data em que já havia ingressado na titularidade da Autora o invocado direito legal de preferência, pois, nesse interlúdio, ou seja, entre a data designada para a abertura das propostas e a data da outorga da escritura (data da efectiva transmissão do direito de propriedade), completou-se o prazo superior a três anos de vigência do arrendamento, que figurava como condição de existência daquele direito potestativo ;
- donde, inexistindo tal direito naquela data, nunca se poderia concluir pela obtenção ou comunicação dos elementos da venda a uma preferente legal,  que o não era, àquela data ;
- pelo que, naquele momento, tal eventual conhecimento por parte de um putativo gerente de facto sempre se revelaria irrelevante ;
- assim, ainda que tal factualidade, partindo do princípio que possuía lastro probatório, pudesse vir a ser considerada, como facto instrumental resultantes da instrução da causa, com legal inscrição na alínea a), do nº. 2, do artº. 5º, do Cód. de Processo Civil, não resulta que da mesma pudesse resultar uma qualquer alteração do juízo configurador relativamente à excepção de caducidade que melhor apreciaremos infra ;
- donde, a sua putativa prova não releva nos presentes autos, nomeadamente para o conhecimento da controvérsia em equação, tendo em consideração a projectada solução de direito, pois esta não é influenciada ou direccionada com a factualidade ora pretendida aditar ;
- pelo que, conhecer acerca da impugnação da matéria de facto apresentada, e ora em apreciação, sempre se configuraria como a prática de um acto inútil, legalmente sancionado pelo artº. 130º, do Cód. de Processo Civil ;
- ou seja, ainda que lograsse obter procedência tal impugnação da matéria factual, na vertente do reclamado aditamento, e tal matéria passasse a figurar como provada, esta revelar-se-ia totalmente irrelevante e inócua para a sorte da pretensão apresentada, nos termos expostos pelas Recorridas, pelo que aquela reapreciação da matéria de facto traduzir-se-ia na prática de uma acto absolutamente inútil, claramente contrário á observância dos princípios da economia e celeridade processuais ;
- pelo que, na decorrência de tal juízo, decide-se não conhecer, neste específico ponto, acerca da impugnação da matéria de facto apresentada, no âmbito da ampliação do âmbito do recurso deduzido por parte dos Recorridos Réus.
Ainda que assim não se entendesse, duas outras dificuldades sempre se configurariam.
Por um lado, a matéria de facto em referência dificilmente seria enquadrável como facto instrumental do acervo ou base factícia que consubstancia e enforma a invocada excepção de caducidade no exercício do direito de preferência por parte dos demandados Réus.
Com efeito, conforme resulta dos artigos 9º - 1ª Ré – e 19º - 2ºs Réus -, das respectivas contestações, a alegação apresentada foi a de que, apesar de estar devidamente notificada, a Autora não compareceu, nem se fez representar, no dia, hora e local designados para a abertura de propostas. Ou seja, a alegação aduzida pelos Réus é totalmente contraditória ou dissonante com a ora pretendida aditar.
Por outro lado, e contrariamente ao sustentado pelos Réus, não resulta estarem os presentes autos enformados pela aludida acta da diligência de abertura de propostas (apesar da procura exaustiva efectuada em sede de processo electrónico), o que sempre dificultaria a percepção do invocado sustento probatório.
- Da pretensão de aditamento de um novo facto pelos 2ºs Réus
 Por fim, pugnam, ainda, os 2ºs Réus pelo aditamento à matéria factual provada do seguinte facto:
“a Autora F…………………, Lda., apôs a sua assinatura em dois documentos (docs 15 e 17) por ela elaborados e assinados em Março e Abril de 2018, subscrevendo, deste modo, a seguinte declaração:
«o senhorio é legítimo proprietário do imóvel sito à Rua ……………., freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o nº. ……….., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ………… da dita freguesia, constando identificado como sendo o senhorio identificado Luís ……….”.
O que fundamentam no teor dos documentos nºs. 15 a 17 por si juntos com a contestação.
Apreciando:
A factualidade ora equacionada, que se traduz na especificação de um segmento dos documentos referenciados nos factos provados 15. e 16., em parte (1º §) já figura nestes e, no demais, já foi objecto do oficioso aditamento supra exposto, dando origem ao facto provado 16-A.
Donde, a pretensão ora formulada já se encontra devidamente satisfeita ou consumada, nada mais urgindo conhecer. O que se consigna.
2 - DA VERIFICAÇÃO DE ERRO DE JULGAMENTO NA SUBSUNÇÃO JURÍDICA EXPOSTA NA DECISÃO RECORRIDA, TENDO EM CONSIDERAÇÃO OS FACTOS APURADOS
Nos presentes autos o presente Colectivo já proferiu decisão de reconhecimento da Autora como titular de direito legal de preferência, na data da outorga do instrumento de venda executiva (escritura pública de compra e venda), por negociação particular, do local arrendado - prédio urbano, em regime de propriedade total, sito na freguesia de São Sebastião, concelho de Ponta Delgada, na Rua …………….., descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o número ………………, e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ……... 
Juízo que foi sancionado na revista interposta para o Colendo Supremo Tribunal de Justiça.
Determinou, ainda, este Colectivo o ulterior prosseguimento da presente acção, de forma a conhecer-se acerca do pedido accional formulado pela Autora, atenta a existência de matéria factual controversa com directa incidência e implicância no conhecimento das excepções invocadas pelos Réus – caducidade, renúncia e abuso de direito -, maxime, essencialmente no conhecimento da excepção de caducidade.
Assente que está, na titularidade da Autora, o invocado direito potestativo de preferência legal, a sentença ora apelada raciocinou nos seguintes termos:
- Relativamente à excepção de caducidade, a Autora teve conhecimento do projecto de alienação, do respectivo preço e das condições da compra e venda ainda antes da celebração da escritura, tendo esta sido outorgada em 20/10/2017 ;
- Nomeadamente, teve conhecimento da adjudicação e preço no próprio dia de abertura de propostas (28/07/2017) ;
- Sendo que tal foi-lhe ainda transmitido na primeira reunião que teve com o Réu Luís ………… (02/08/2017) ;
- Bem como após a escritura, concretamente em 06/11/2017, quando recebeu nova comunicação do administrador da insolvência donde consta a identidade do adquirente e o preço pago (o que a Autora já sabia) ;
- A presente acção só foi instaurada em 31/07/2018, isto é, mais de um ano depois, pelo que, em tal data, o prazo de caducidade previsto no artº. 1410º, nº. 1, do Cód. Civil, já se encontrava transcorrido ;
- Tal inobservância do prazo obsta ao exercício do direito, extinguindo-o, verificando-se, assim, excepção peremptória conducente à absolvição do pedido (o artº. 576º, nº. 3, do Cód. de Processo Civil) ;
- Ademais, ainda que se considerasse apenas a última data – 06/11/2017 -, por se tratar de comunicação realizada após a outorga da escritura pública de compra e venda, à data da instauração da acção – 31/07/2018 – o direito da Autora já se mostrava caducado ;
- Ainda que se entendesse como improcedente a excepção de caducidade, sempre se verificaria, por parte da Autora, renúncia ao direito de preferência ;
- Tal renúncia verifica-se pela circunstância da Autora, mesmo após ter tido conhecimento de todos os elementos essenciais da adjudicação do imóvel, ter mantido negociações com o Réu Luís ………., durante aproximadamente 1 ano ;
- E apenas tendo avançado com a presente acção em virtude de não ter conseguido que aquele aceitasse as suas condições contratuais ;
- Tal comportamento traduz-se numa manifestação de vontade de não exercício do direito de preferir, mesmo antes do dies a quo fixado para o seu exercício ;
- Ou seja, o comportamento adoptado pela Autora, interpretado por um declaratário normal (o nº. 1 do artº. 236º, do Cód. Civil), configura uma declaração de vontade abdicativa do exercício do direito de preferir na compra ;
- Configurando-se, assim, a renúncia como uma forma de extinção do direito potestativo, e real de aquisição, de preferência ;
- Ademais, ainda que assim não se considerasse, sempre urgia considerar ter a Autora agido em abuso de direito ;
- Efectivamente, ao propor a presente acção:
1. apenas porque não conseguiu que as suas condições para o arrendamento fossem aceites ;
2. após quase um ano de negociações ;
3. sem que jamais tenha manifestado vontade de preferir na venda,
ultrapassou os limites impostos pela boa fé, pretendendo fazer valer um direito em contradição com a sua conduta anterior ;
- efectivamente, o seu comportamento justificava, de facto, a convicção de que não se faria valer de tal direito ;
- ocorrendo, deste modo, abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium ;
- com efeito, estamos perante duas condutas da Autora, ambas lícitas, assumidas em momentos distintos e distanciadas no tempo, em que a primeira conduta (o facto próprio) é contraditada pela segunda conduta (o venire) ;
- donde, a relação de oposição entre as duas condutas justifica a invocação do princípio do abuso de direito, pois sempre estaríamos perante o ilegítimo exercício de um direito por parte da Autora.
Vejamos.
- Do dever de comunicação e da caducidade do direito da preferente
Prevendo acerca do conhecimento do preferente, estatui o artº. 416º, do Cód. Civil, que:
“1. Querendo vender a coisa que é objecto do pacto, o obrigado deve comunicar ao titular do direito o projecto de venda e as cláusulas do respectivo contrato.
2. Recebida a comunicação, deve o titular exercer o seu direito dentro do prazo de oito dias, sob pena de caducidade, salvo se estiver vinculado a prazo mais curto ou o obrigado lhe assinar prazo mais longo”.
Aduzindo o artº. 423º, do mesmo diploma, ser tal disposição, entre outras, extensível, “na parte aplicável, à obrigação de preferência que tiver por objecto outros contratos com ela compatíveis”.
Por sua vez, estatui o artº. 1410º, nº. 1, ainda do Cód. Civil, equacionando acerca da acção de preferência, que “o comproprietário a quem se não dê conhecimento da venda ou da dação em cumprimento tem o direito de haver para si a quota alienada, contanto que o requeira dentro do prazo de seis meses, a contar da data em que teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação, e deposite o preço devido nos 15 dias seguintes à propositura da acção”.
Por fim, com maior relevância in casu, prevendo acerca da regra geral do direito de preferência no arrendamento de prédios urbanos, estatui a alínea a), do nº. 1, do artº. 1091º, do Cód. Civil (na redacção vigente à data e, aqui aplicável, decorrente da Lei nº. 6/2006, de 27/02), que “o arrendatário tem direito de preferência: a) Na compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de três anos”.
Acrescentando o nº. 4 do mesmo normativo ser aplicável, “com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 416.º a 418.º e 1410.º”.
Referenciam Pires de Lima e Antunes Varela [10] que a comunicação referenciada no artº. 416º pode ser efectuada por via judicial ou extrajudicial, e efectivada “pelo obrigado à preferência e não pelo pretenso adquirente, salvo se este agir como mandatário daquele”, sendo qualificada, nas situações de notificação extrajudicial e desde que contenha todos os elementos necessários à decisão do preferente, “como uma proposta de contrato”.
Traduzindo-se o direito de preferência como um verdadeiro direito real de aquisição atribuído, no caso concreto, à arrendatária, e tendo em consideração que o prazo de seis meses para o exercício do direito se configura como um prazo de caducidade (o nº. 2, do artº. 298º, do CC), computável a partir do conhecimento, por parte do preferente, dos elementos essenciais da alienação, “não basta, portanto, que o preferente saiba que a alienação se realizou: é preciso que conheça os elementos essenciais do contrato realizado. Note-se que a lei fala em venda e não na simples promessa de venda: é, pois, a partir do conhecimento daquela, e não desta, que o prazo de caducidade se há-de contar”.
Relativamente aos elementos essenciais cujo conhecimento importa ao começo da contagem do prazo de caducidade, apelando ao entendimento exposto no aresto do STJ de 12/01/1974, referencia serem “todos os factores do negócio capazes de influir decisivamente na formação da vontade de preferir ou não, todos os elementos reais do contrato que pudessem ter influência num sentido ou noutro”.
Desta forma, “sempre que o obrigado à preferência projecte vender ou dar em cumprimento a coisa sujeita à prelação, a lei impõe-lhe, sucessivamente, os seguintes deveres:
1º - O dever de notificar ao preferente o projecto de alienação e as cláusulas essenciais do contrato a realizar (arts. 416º, nº. 1, e 1410º, nº. 1) ;
2º - O dever de não efectivar o projecto de alienação enquanto o preferente não declarar, dentro do prazo em que lhe é lícito fazê-lo (art. 416º, nº. 2), se pretende ou não preferir ;
3º - O dever, que é um corolário dos dois anteriores, de realizar o contrato com o preferente, se este, em resposta à notificação, manifestar a vontade de exercer o seu direito”.
Através da presente acção de preferência, e da sua procedência, obtém-se, como resultado e efeito, a substituição, com eficácia ex tunc, do adquirente pelo preferente. Com efeito, “o contrato celebrado entre o alienante e o adquirente produz a sua eficácia translactiva normal, mas, em virtude da existência de um direito de opção, a posição jurídica do adquirente fica sujeita, por força da lei, a uma condição (conditio iuris) resolutiva (…) ele perderá o direito que adquiriu, se a preferência vier a ser triunfantemente exercida” [11]. Assim, a pretensão do autor ou demandante será a de que o contrato “se mantenha nas condições em que foi celebrado, com a simples modificação de ser afastado o adquirente, e substituído na sua posição pelo preferente, que tem, à face da lei, melhor direito do que ele para adquirir, em igualdade de circunstâncias (…)” [12].
Resulta, assim, que para que se possa considerar cumprida a obrigação, “a comunicação tem de conter todos os elementos essenciais do contrato a celebrar, de modo a permitir ao preferente o conhecimento cabal dos respectivos termos, a fim de poder tomar uma decisão esclarecida. O que implica que também elementos de conteúdo que não são habitualmente qualificados como essenciais tenham de ser dados a conhecer: assim, p. ex., o prazo de cumprimento das obrigações ou, até, o lugar do cumprimento, se este assumir relevância patrimonial ou de esforço pessoal”.
Ajuizando acerca da possibilidade de tal comunicação ser efectuada por terceiro candidato ao contrato, e considerando ser duvidoso que tal seja apto a satisfazer o interesse do preferente, acrescenta que se este “tiver conhecimento do projecto do contrato por qualquer outra via, há não cumprimento da obrigação de comunicação, o que, não alterando o direito do preferente, o deixa sem mais proteção do que a que cabe a qualquer credor por incumprimento, nos casos em que a execução específica não é admitida. Só se o direito de preferência tiver eficácia real (ou tiver fonte legal), esse conhecimento releva, quer contra ele, pois a partir daí inicia-se a contagem do prazo de caducidade da ação de preferência previsto no nº. 1 do art. 1410º, quer a seu favor, pois pode exercer o seu direito por via judicial através da mesma ação[13](sublinhado nosso).
Relativamente ao ónus probatório na presente acção, o princípio a adoptar é simples e singelo: quem pretenda que lhe seja reconhecido o direito de preferência terá de alegar, e provar, os enunciados pressupostos ou requisitos, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova, previstas no art.º. 342º do Cód. Civil, donde decorra a existência do seu direito, ou seja, a qualidade de preferente [14].
Todavia, existem particularidades a considerar. Assim, já não é “sobre o preferente que impende o ónus de provar a falta de comunicação a que se reporta o nº. 1 do artigo 416º do Código Civil.
Com efeito, a realização da comunicação para preferir, aliada ao não exercício tempestivo do respectivo direito, constituem factos extintivos do direito invocado pelo preferente”.
Como tal, e conforme resulta do estatuído no nº. 2 do artigo 342º, “a sua prova cabe ao réu”, o que também é sustentado pelo prescrito no nº. 2 do artigo 343º, “que encontra a sua justificação em a ausência da realização do aviso constituir um facto negativo e assim de extrema dificuldade”.
Deste modo, relativamente ao prazo de caducidade – cf., art.º. 298º, nº. 2, do Cód. Civil – de seis meses previsto para a instauração da acção de preferência, por parte do preterido no invocado direito de preferência, cabe ao Réu “provar o decurso daquele prazo, isto é, demonstrar que há mais de seis meses o titular do direito de preferência teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação” [15].
No sentido do aduzido, e exemplificativamente, sumariou-se no douto aresto da RP de 17/02/2005 [16], caber aos preferentes apenas o ónus da prova “da existência do seu direito, não lhes cabendo o ónus da prova da falta de comunicação a que se reporta o nº. 1 do art. 416º do CCiv, antes incidindo sobre os réus o ónus da prova da aludida comunicação, até pela razão de que a realização da comunicação para preferir, aliada ao não exercício tempestivo do respectivo direito, constituem factos extintivos do direito invocado pelo preferente. Aliás, constituindo um facto negativo a ausência da realização do aviso para preferir, com a inerente extrema dificuldade de prova, o ónus probandi deve ter-se por invertido, relativamente à regra geral vertida no art. 342º, nº 1.
Da mesma forma, é ao réu na acção de preferência que incumbe provar que há mais de seis meses o titular do direito de preferência teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação (art.º 1410º, nº 1 CC)” [17].
Ora, de acordo com o exposto na análise da matéria do ónus probatório, cabia nos presentes autos aos Réus demandados demonstrar que há mais de seis meses, por referência à data da instauração da acção, a ora Autora, titular do direito de preferência, tinha conhecimento dos elementos essenciais da alienação. E que deixou caducar o prazo legalmente previsto para o exercício do direito.
Ónus probatório que a sentença apelada considerou preenchido, determinante da verificação da excepção peremptória de caducidade, conducente a juízo de absolvição do pedido.
Questionando tal entendimento, alega a Recorrente Autora, no essencial, que:
- foi ludibriada quanto ao conhecimento dos elementos essenciais do negócio, não tendo sido informada do momento da realização do mesmo, da data da outorga da escritura de compra e venda ou das condições de pagamento ;
- a acção foi instaurada bem dentro do prazo legalmente previsto, após ter tido conhecimento das circunstâncias e da realização do negócio jurídico transmissivo do imóvel, a favor dos Réus adquirentes ;
- efectivamente, o prazo inerente ao exercício de um direito não se inicia, no caso concreto, enquanto o obrigado à preferência não cumprir com o seu dever de informar verdadeira e lealmente o titular do direito de preferência sobre o negócio em causa ;
- sendo que o obrigado à preferência é que tem esse dever/ónus – e neste caso tal incumbência estava deferida ao Réu alienante (massa insolvente, representada pelo administrador judicial) ;
- as comunicações datadas de Agosto e Novembro de 2017 não cumprem minimamente com os pressupostos da notificação para preferência ;
- pois, não destaca ou informa que se destina (porque supostamente esse seria o seu objeto principal ou único leitmotiv) a habilitar o seu destinatário com a possibilidade do exercício do direito de preferir na compra e venda de certo bem imobiliário ;
- tal comunicação é totalmente falha ou deficiente, quanto ao apontado desiderato que lhe preside ;
- e nem sequer refere/indica/informa qualquer norma ou regra legal que permita ao destinatário ir consultar a lei para perceber do que se trata concretamente, i.e., que tem um direito a exercer, que direito a exercer é esse, que prazo dispõe para o efeito, se o mesmo está sujeito (ou não) a caducidade ;
- mostrando-se, assim, a mesma totalmente deficiente e imprestável quanto aos efeitos que se lhe pretendem atribuir, violando qualquer das estatuições normativas constantes do artigo 416.º e seguintes do CC ;
- ademais, decorre do conteúdo concreto de tais comunicações que já teria havido a venda do bem, referenciando-se que «o imóvel foi adjudicado» em causa àquele comprador, mas sem nada referir sobre as concretas condições do negócio, designadamente, prazo de celebração da escritura (uma vez que a Autora podia preferir até esse momento, condições de pagamento, local, data e cartório notarial, etc.) ;
- e, nem se afirme ser irrelevante ou despiciendo a indicação do prazo para exercer o direito, e antes disso que há um direito a exercer, a informação sobre a sua possível caducidade, o dia, a hora e o local da escritura, ou até as condições de pagamento do preço, porque obviamente que não é indiferente para a Autora saber se a escritura teria lugar dali a 10 dias ou dali a, por exemplo, 2 meses (no caso concreto tal hiato temporal até foi maior), desde logo para efeitos de buscar financiamento ;
- tais comunicações, e concretamente a de Novembro de 2017 (que reproduz a de Agosto, não recepcionada pela Autora), não cumpriu minimamente com os requisitos fixados na lei ;
- pelo que nunca o Tribunal a quo podia ter considerado que se havia iniciado o prazo de caducidade do exercício do direito ;
- ou seja, nunca tendo ocorrido qualquer válida comunicação para exercício do direito de preferência, nunca tal alegada notificação podia ter sido prestável para iniciar qualquer prazo de caducidade.
Ora, existirá efectivo incumprimento do dever de comunicação previsto no artº. 416º por parte da Ré Massa Insolvente, obrigada ao direito de preferência ?
Mostra-se a comunicação recepcionada pela Autora em 06/11/2017 inidónea ao cumprimento daquele dever e consequente desplotar do início do cômputo do prazo de caducidade ?
Ou o conhecimento decorrente da mesma é susceptível de conduzir à conclusão de que a Autora teve efectivo conhecimento dos elementos essenciais da alienação, pelo que é a partir de tal data que se deve iniciar a contagem do enunciado prazo de seis meses ?
Apreciemos.
Aferindo acerca de concreta situação com alguma atinência ao caso concreto, em que estava em equação o direito de preferência na venda de imóvel sobre o qual existia um contrato de arrendamento urbano, referenciou-se no douto Acórdão do STJ de 09/03/2021 [18] que o direito do preferente “só se integra na sua esfera jurídica com a realização da comunicação para preferência, ou seja, só após a comunicação pode o preferente exercer o seu direito.
Como refere Henrique Mesquita, in “Obrigações Reais e Ónus Reais”, vol. I, p. 211, “o preferente, mesmo que tenha conhecimento do projeto de alienação, nada pode fazer senão aguardar que o mesmo lhe seja notificado [pois não] pode, como credor, exigir a notificação, porque o sujeito passivo da relação de preferência, enquanto não alienar a coisa a terceiro, está sempre a tempo de a efetuar; e não pode exercer o seu direito potestativo, declarando à contraparte que pretende preferir, porque, para tanto, é imprescindível, nos termos do art. 416, que o vinculado à prelação lhe manifeste a intenção de alienar a coisa e lhe dê a conhecer as cláusulas essenciais do contrato que projeta realizar”.
No caso em apreço não se coloca a questão de apurar se a autora é titular de um direito de preferência, pois que se tem este como assente, face à posição de arrendatária do objeto da preferência (a obrigada à preferência fez a comunicação à preferente).
Só a consumação da venda a um terceiro espoleta no titular do direito de preferência a necessidade e possibilidade de exigir judicialmente o seu direito, mas tal só sucederá quando o titular do direito de propriedade, querendo vender, não comunique ao preferente o projeto da venda e as cláusulas do respetivo contrato.
“Querendo vender” constitui-se no obrigado o “dever de comunicação”, pelo que deve “proceder segundo as regras da boa-fé”, princípio estruturante no direito civil, quer substantivo, quer adjetivo. “No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa-fé” - art. 762, nº 1 do CC.”.
Relativamente aos elementos que a comunicação para a preferência deve incluir, reconhece-se a falta de clareza legal, atenta a referência a ““projeto de venda” e às “cláusulas do respetivo contrato”, facto que acarretou controvérsia doutrinal e jurisprudencial”.
Todavia, acrescenta, tanto a jurisprudência como a doutrina “vêm entendendo que devem ser comunicados, ao titular do direito de preferência, os “elementos essenciais da alienação” baseando-se na letra do art. 1410, n.º 1, do CC, o que também não é pacífico, pois que, os elementos essenciais para o vendedor podem não ser os mesmos, no entender do preferente.
Agostinho Guedes, in “O Exercício do Direito de Preferência”, p. 457 refere, que a informação deve ser “completa e verdadeira, contendo exatamente os termos negociados entre o sujeito passivo e o terceiro.”
A letra da lei, art. 416, n.º 1 do CC e art. 1028, n.º 1 do CPC indicam requisitos que devem incluir-se no teor que a comunicação para a preferência deve ter.
Resulta dos mesmos que a comunicação, daquele que quer vender, ao preferente, deve conter:
- Que existe um projeto de venda;
- Quem é o terceiro interessado (Ac. STJ de 11-01-2011, proc. nº 4363/07.9TVLSB.L1.S1);
- Quais as cláusulas do contrato projetado, com a identificação concreta, e sem dúvidas, do bem a alienar;
- Que tipo de alienação pretende levar a cabo (venda ou dação em cumprimento);
- Qual o preço e as condições de pagamento;
- Qual o prazo, segundo a lei civil, para o preferente exercer o direito;
- Pedido ao preferente para declarar, dentro desse prazo, se quer preferir;
É, pois, necessária a comunicação (sem vícios) dos elementos que permitam ao preferente uma declaração de vontade livremente formada e uma decisão consciente de exercer, ou não, o seu direito ou, até, deixá-lo caducar sem nada dizer.
Sendo que a falta de elementos essenciais ou a comunicação de elementos erróneos faz com que a comunicação não produza os efeitos de comunicação para preferência.
Antunes Varela in RLJ, Ano 121, 1988/1989, em anotação ao Ac. do STJ de 22-02-1984, com o sumário, “para o efeito do conhecimento do preferente previsto no art. 416 do CC, não é suficiente quanto à comunicação das clausulas do contrato, qualquer aviso vago ou genérico, devendo exigir-se a comunicação do projeto de venda e as clausulas do contrato, não bastando o entendimento de que os elementos não comunicados por aviso figuram supletivamente na lei”, refere a págs. 360 que, “o dono da coisa não pode, por exemplo, limitar-se a informar o preferente de que está a pensar em vendê-la, ou que está disposto a vendê-la por um preço entre 30 a 50 mil contos, mas não quer fazê-lo sem previamente saber se o destinatário está ou não interessado em adquiri-la e que preço está disposto a dar por ela.
A falta de resposta a uma interpelação feita em semelhantes termos é líquido que não acarreta a caducidade do direito do preferente””.
Por sua vez, o douto Acórdão do STJ de 13/02/1996 [19] referencia que “o artigo 416 n. 1 do Código Civil impõe que a comunicação dos elementos essenciais do negócio ao preferente seja feita pelo pretenso vendedor e, por outro lado, a mesma disposição legal não dá qualquer relevância à comunicação feita por terceiro, ainda que futuro comprador” [20].
Acrescenta, fazendo a devida distinção entre cumprimento do dever de preferência e acção de preferência (o que se evidencia relevante para o caso sub júdice), que “intimamente ligada no dever de preferência, consubstanciada na obrigação de comunicar o projecto de venda e as cláusulas do contrato projectado, está a acção de preferência regulada no artigo 1410 do Código Civil, também aplicável ao direito legal de preferência dos arrendatários habitacionais na compra e venda ou dação em cumprimento dos imóveis respectivos - Lei n. 63/77, de 25 de Agosto.
Só quando o alienante tenha o dever de oferecer a preferência a alguém, na altura da venda ou dação em pagamento do imóvel, e haja faltado ao cumprimento desse dever, é que o lesado pode recorrer à acção de preferência.
Tudo a significar que:
- a aplicação do n. 1 do artigo 416 tem lugar antes da alienação da coisa a que se refere o direito de preferência, constituindo uma etapa no cumprimento da obrigação de dar preferência;
- o recurso ao artigo 1410 do Código Civil pressupõe que estejamos face a uma situação de incumprimento de dar preferência (sublinhado nosso).
Por fim, o douto aresto do mesmo STJ de 11/01/2011 [21], acerca dos elementos a transmitir pelo vinculado à preferência, reconhece a existência de jurisprudência que vem sustentando, dentre os elementos que devem ser comunicados, dever efectuar-se uma distinção entre os que são essenciais e aqueles que assim não devem ser considerados, entre os quais o nome do comprador, o local e a data de concretização do contrato projectado, relativamente aos quais se devia antes atender às “especificidades concretas do caso”.
Criticando tal distinção, cita Carlos Lima [22], no sentido da “comunicação deve conter todos os elementos essenciais do contrato projectado e tudo o mais que integra o respectivo conteúdo, e não apenas como se tem entendido - aquilo que se julgue poder influenciar a decisão do titular do direito de preferência no sentido de exercer ou não.
Aliás, mesmo em relação a elementos que objectivamente pareçam marginais, pode acontecer que, em concreto, em relação ao titular do direito de preferência, tenham significativa relevância na perspectiva da posição a tomar.
Assim, não cabe ao vinculado à preferência - e pode ser juridicamente arriscado - fazer distinções no conteúdo e comunicação, permitindo-se antecipar juízos sobre o que pode relevar, ou não, na decisão do titular do direito de preferência quanto a exercê-lo ou não”.
Aqui chegados, retornemos ao caso concreto.
Parece inquestionável que no âmbito dos fundamentos recursórios apresentados, a Recorrente Autora incorre em manifesto erro ou equívoco relativamente às exigências decorrentes do cumprimento da obrigação legal de preferência, nos termos do artº. 416º, do Cód. Civil, que tem lugar antes da alienação da coisa objecto do direito de preferência, e a situação de recurso à acção de preferência, nos quadros do artº. 1410º, nº. 1, do mesmo diploma, que já pressupõe uma situação de incumprimento na comunicação conducente à concessão daquele direito de preferência.
Efectivamente, para que se considerem cumpridas as legais exigências da comunicação inscrita no artº. 416º, urge comunicar ao preferente o projecto de venda e as cláusulas contratuais do negócio perspectivado ou a efectivar com terceiro, enquanto que o recurso ao artº. 1410º tem já por pressuposto o incumprimento daquele dever de comunicação, seja por que foi totalmente omitido, seja por que foi deficientemente cumprido, cerceando à esfera de conhecimento do preferente informações contratuais do acto projectado que as exigências de boa fé impunham e que permitiriam uma opção informada e esclarecida ao beneficiário da preferência.
E, só nesta segunda situação se coloca a questão do prazo de caducidade no exercício da acção de preferência, computável a partir do momento em que o preferente postergado tenha tido conhecimento dos elementos essenciais da alienação já efectivada ou consumada.
Ora, é esta a situação que se configura in casu.
Assim, reitera-se, neste momento processual surge incontroverso que a Autora, à data da concreta alienação do imóvel arrendado (27/10/2017), era titular do direito legal de preferência que lhe advinha da sua condição de arrendatária, nos termos previstos na alínea a), do nº. 1, do artº. 1091º, do Cód. Civil (na redacção vigente à data e, aqui aplicável, decorrente da Lei nº. 6/2006, de 27/02), donde constava que “o arrendatário tem direito de preferência: a) Na compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de três anos”.
Efectivamente, conforme mencionámos, naquela data, já havia ingressado na titularidade da Autora o invocado direito legal de preferência, pois, no interlúdio entre a data designada para a abertura das propostas e a data da outorga da escritura (data da efectiva transmissão do direito de propriedade), completou-se o prazo superior a três anos de vigência do arrendamento, que figurava como condição de existência daquele direito potestativo.
Resulta, assim, que quando ocorre a notificação da Autora em Julho de 2017 – cf., facto provado 4. -, esta ainda não era titular de qualquer direito legal de preferência, explicando-se eventualmente tal notificação devido ao pacto de preferência convencional que constava do contrato de arrendamento comercial – cfr., facto provado 1-A.
Ora, consolidando-se aquele direito legal de preferência na titularidade da Autora, após a completude daqueles 3 anos, e dado que a venda do imóvel arrendado ainda não estava efectivada, pois a transmissão da propriedade da coisa objecto de venda executiva só ocorre com a emissão do título de transmissão por parte do agente de execução, ou seja, apenas se concretiza depois do depósito do preço e da adjudicação, com consequente passagem do título de transmissão, devia então o Administrador da Insolvência ter dado conhecimento à Autora arrendatária do valor da maior proposta apresentada, ou seja, transmitir-lhe os elementos essenciais do negócio (projecto de venda e cláusulas integrantes do mesmo) e conceder-lhe razoável prazo para que esta exercesse o direito legal de preferência.
O que não concretizou, pois as comunicações de 03/08/2017 e de 31/10/2017 (sendo que a primeira não foi sequer recepcionada) – cf. factos 9. a 12. -, não se destinaram a cumprir tal desiderato, sendo que, para além do mais, a comunicação destinada ao exercício do direito de preferência não se pode confundir com as demais, e aquelas, manifestamente, não tinham como finalidade proporcionar à arrendatária o exercício de tal direito.
Para além de que a notificação concretizada em 06/11/2017 já se efectiva após a alienação do imóvel arrendado aos ora 2ºs. Réus, datada de 20/10/2017 – cf., facto 2. -, pelo que nunca poderia servir como comunicação conducente ao exercício do direito de preferência.
Sendo que aquela notificação à Autora explica-se e entende-se pelo facto desta manter a sua qualidade de arrendatária do imóvel transmitido, indicando-lhe, para além do mais, a identidade do novo senhorio.
Por outro lado, devendo tal comunicação ser cumprida pela 1ª Ré, obrigada e onerada ao dever de preferência, sempre não possuiria qualquer relevância eventual comunicação feita por terceiros, ou seja, e in casu, pelos 2ºs Réus adquirentes, sendo certo, ainda, que dos factos provados 7. e 8. não resulta igualmente que tal comunicação, com os seus elementos essenciais, tivesse sido concretizada. Tendo-se inclusive provado, conforme facto 5., que após 01/08/2017, a Autora não foi notificada para efeitos do exercício do direito de preferência na alienação efectivada aos Réus adquirentes.
Donde, incumprida a obrigação de dar preferência à ora Autora arrendatária, constitui-se na titularidade desta o direito de instaurar acção de preferência nos quadros do artº. 1410º, nº. 1, ex vi do nº. 4, do artº. 1091º, ambos do Cód. Civil.
Urgindo agora apreciar se à data da instauração da acção – 31/07/2018 -, já se encontrava exaurido o prazo de seis meses inscrito naquele normativo, a computar desde a data em que a demandante preferente teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação.
Ora, da comunicação datada de 31/10/2017, recepcionada pela Autora em 06/11/2017 – factos 11. e 12. -, consta a identificação do adquirente do imóvel em equação, que a Autora inclusive já conhecia, pois já se havia reunido com o mesmo em 02/08/2017 – os factos 7. e 8. provados -, bem como valor pelo qual se efectivou a venda executiva.
Tais elementos contratuais, no caso concreto, são susceptíveis de preencherem o conceito de elementos essenciais da alienação, ou seja, tais elementos como que se confundem com a totalidade dos pressupostos ou requisitos consubstanciadores do acto de transmissão/alienação efectivado.
Com efeito, estando-se perante uma venda executiva por negociação particular (apesar da designação de data, hora e local para a apresentação/abertura de propostas em carta fechada), resulta que a modalidade de pagamento e forma de alienação encontram-se legalmente reguladas, pelo que não se descortina que outros elementos devessem chegar ao âmbito de conhecimento da Autora para que se pudesse concluir estar a mesma na posse da totalidade os aludidos elementos essenciais da alienação.
Donde se conclui que, necessariamente, e pelo menos desde 06/11/2017, possui a Autora conhecimento da totalidade dos elementos essenciais da alienação, daí decorrendo que na data da instauração da acção já havia decorrido prazo superior aos seis meses legalmente previstos como prazo para instaurar a acção de preferência.
Determinando clara caducidade do direito de acção, atenta a inexistência de qualquer causa de suspensão ou interrupção de tal prazo, o que se traduz na verificação de excepção peremptória, conducente a juízo de absolvição do pedido.
Por fim, e como reforço argumentativo, sempre se dirá que contrariamente ao aduzido pela Autora Apelante, não se trata de aferir acerca da (in)idoneidade da comunicação recepcionada pela Autora em 07/11/2017 para o cumprimento do dever de  lhe dar preferência, mas antes aferir acerca do âmbito ou amplitude do conhecimento adquirido através de tal comunicação para o desplotar do prazo de seis meses previsto para o exercício da acção de preferência, inscrito no citado nº. 1, do artº. 1410º, do Cód. Civil, sob pena de caducidade.
Pelo exposto, em guisa conclusória, decide-se:
§ pela improcedência das conclusões recursórias, relativamente à invocada inexistência de caducidade do direito da Autora no exercitar da acção de preferência ;
§ confirmando-se, nesta parte, o juízo de improcedência da acção formulado na sentença recorrida/apelada, com consequente absolvição dos Réus dos pedidos ;
§ julgar prejudicado o conhecimento dos demais fundamentos recursórios invocados (excepções de renúncia e de abuso de direito).
Relativamente à tributação, decaindo a Apelante Autora no recurso interposto, é a mesma responsável pelo pagamento das custas em dívida, nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil.
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IV. DECISÃO
Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, o seguinte:
A) julgar improcedente a presente apelação, em que figura como Apelante/Recorrente F…………….., LDA.,, e como Apelados/Recorridos MASSA INSOLVENTE da sociedade W…………………, LDA. e LUÍS ……………. e mulher MARIA …………….., relativamente à invocada inexistência de caducidade do direito da Autora no exercitar da acção de preferência ;
B) confirmando-se, nesta parte, o juízo de improcedência da acção formulado na sentença recorrida/apelada, com consequente absolvição dos Réus dos pedidos ;
C) julgar verificada prejudicialidade no conhecimento dos demais fundamentos recursórios invocados (excepções de renúncia e de abuso de direito) ;
D) decaindo a Apelante Autora no recurso interposto, é a mesma responsável pelo pagamento das custas em dívida, nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil.

Lisboa, 26 de Maio de 2022
Arlindo Crua
António Moreira
Carlos Gabriel Castelo Branco
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[1] A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original.
[2] Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª Edição, Almedina, pág. 118.
[3] Em idêntico sentido, o referenciado no douto aresto do mesmo STJ de 18/03/1997 – Relator: Martins da Costa, Processo nº. 96A735, in www.dgsi.pt -, onde se sumariou que “reapreciação pressupõe que a questão seja suscitada pelo recorrido, de modo expresso, expondo as razões da sua discordância, e que tal conste tanto do texto da contra-alegação como das respectivas conclusões (artigo 690 n. 1 do C.P.C.67)”.
[4] Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª Edição, Almedina, pág. 285.
[5] Idem, pág. 285 a 287.
[6] Relatora: Laurinda Gemas, Processo nº. 5585/15.4T8FNC-A.L1, no qual o ora Relator figurou como Adjunto.
[7] Processo nº. 1660/14.0T8OER-E.L1.
[8] Em idêntico sentido, citam-se ainda, entre outros, os doutos acórdãos da Relação de Guimarães de 10-09-2015, no processo 639/13.4TTBRG.G1, e 11-07-2017, no processo n.º 5527/16.0T8GMR.G1, da Relação do Porto de 01-06-2017, no processo n.º 35/16.1T8AMT-A.P1, e do STJ de 13-07-2017, no processo 442/15.7T8PVZ.P1.S1, todos in www.dgsi.pt .
[9] Relatora: Fernanda Isabel Pereira, Processo nº. 4111/13.4TBBRG.G1.S1, in www.dgsi.pt .
[10] Código Civil Anotado, Volumes I e III, 4ª Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora, págs. 390 a 392 (vol. I) e 372 a 374 e 379 (vol. III).
[11] Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., Vol. III, pág. 381.
[12] Rodrigues Bastos, Notas ao Código Civil, 1997, Rei dos Livros, pág. 177.
[13] Ana Prata, Código Civil Anotado, Vol. I, 2017, Almedina, pág. 526 a 528.
[14] cf., Henrique Mesquita, Direito de Preferência, CJ, Ano XI, 1986, tomo 5, pág. 50.
[15] Assim, o douto Acórdão do STJ de 06/05/2010, Relator: Oliveira Vasconcelos, Processo nº. 537/02.G1.S1, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf .
[16] Relator: Fernando Baptista, Doc. nº. RP200502170530530, in http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf .
[17] Em idêntico sentido, e exemplificativamente, cf., o sumariado no douto aresto da RL de 21/10/2010, Relator: Manuel Gonçalves, processo nº. 13867/05.7 TMSNT.L1-6, in http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf .
[18] Relator: Jorge Dias, processo nº. 2997/18.5T8PDL.L1.S1, in www.dgsi.pt, citado nas alegações recursórias.
[19] Relator: Miranda Gusmão, Processo nº. 087687, in www.dgsi.pt .
[20] No mesmo sentido de que a comunicação a que se refere o artº. 416º, do Cód. Civil, deve ser feita pelo obrigado à preferência, e não pelo pretenso adquirente, salvo se este agir como mandatário daquele, cfr., o douto Acórdão do STJ de 06/04/1995 – Relator: Raul Mateus, Processo nº. 086413, in www.dgsi.pt .
[21] Relator: Salazar Casanova, Processo nº. 4363/07.9TVLSB.L1.S1, in www.dgsi.pt .
[22] Direitos Legais de Preferência. Estrutura in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Inocêncio Galvão Telles, IV Volume, Novos estudos de Direito Privado, pág. 501.