Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
14663/16.1T8SNT.L1-4
Relator: DURO MATEUS CARDOSO
Descritores: PACTO DE NÃO CONCORRÊNCIA
NULIDADE
COMPENSAÇÃO
DESPROPORCIONALIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/06/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário: I A ratio que está subjacente às cláusulas de não concorrência após a cessação do contrato de trabalho é a de evitar que o ex-trabalhador, aproveitando-se do know-how adquirido, do conhecimento da carteira de clientes e, mesmo das relações pessoais privilegiadas que se criam entre clientes e os trabalhadores da área comercial de vendas, venha a “desviar”/”roubar” clientes da antiga entidade empregadora para a nova empresa para quem começou a trabalhar.

II Tendo o autor contactado e feito propostas comerciais a clientes da autora, como esses clientes já o eram da nova empresa para onde foi trabalhar, não houve aqui “desvio” da clientela da autora, não ocorrendo violação do pacto de não concorrência.

III Não se pode considerar que o pacto de não concorrência é nulo por o montante da compensação fixada ao trabalhador ser desproporcionadamente reduzido se não se demonstrar a autora é uma empresa de tal maneira dominante no mercado que deixaria apenas umas escassas possibilidades de clientes que o réu pudesse contactar.

(Sumário elaborado pelo relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.


Relatório:


I AAA, S.A., intentou no Secção de Trabalho de Sintra a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, CONTRA,
BBB

II PEDIU que a acção seja julgada procedente por provada e, em consequência, ser o réu condenado a pagar-lhe a quantia de € 36.122,28 acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.

III ALEGOU, em síntese, que:
Entre si e o Réu vigorou um contrato de trabalho, tendo o Réu sido contratado para o exercício das funções de Gestor de Mercado (Grandes Superfícies);   - Na vigência do vínculo laboral foi assegurada formação profissional ao Réu, inicial e contínua, e para dotar o Réu de conhecimentos relativos aos produtos e materiais comercializados pela empregadora;
O contrato foi objeto de alteração e, por via de aditamento assinado pelas partes em 15.01.2013, obrigou-se o Réu, na pendência da relação e nos doze meses seguintes à sua cessação por iniciativa do trabalhador, a não exercer atividade concorrencial àquela que era desenvolvida pela Autora;
As partes acordaram ainda na fixação duma cláusula penal, nos termos da qual o Réu pagaria uma indemnização à Autora – cujo montante ficou definido – caso exercesse atividade concorrencial;
Pelo não exercício da referida atividade concorrencial obrigou-se a Autora a pagar ao Réu uma compensação mensal, cujo valor ficou igualmente definido;
O Réu, por sua iniciativa, pôs termo ao contrato tendo a Autora exercido o seu direito de o vincular a não exercer atividade concorrencial;
Por culpa do Réu não pôde a Autora pagar a compensação acordada, tendo o ex-trabalhador iniciado funções semelhantes numa outra empresa, concorrente da Autora na mesma área de mercado;
O Réu ficou na posse de contactos e informações privilegiadas sobre os seus clientes, tendo contactado vários clientes e feito propostas comerciais quando foi trabalhar para a concorrência.

IV O réu foi citado, e realizou-se Audiência de Partes em que teve lugar infrutífera tentativa de conciliação após o que CONTESTOU dizendo, no essencial que:
O conteúdo do pacto de não concorrência, foi da exclusiva autoria da Autora, tendo sido constrangido pela empregadora a assiná-lo;
É desadequada e desproporcional a compensação fixada, motivo porque o pacto se deve ter por nulo;
Foi a Autora quem não cumpriu o pacto de não concorrência, porquanto não lhe pagou a compensação a que estava obrigada no mês seguinte à cessação do contrato;
Nada deve à autora.
A autora RESPONDEU mantendo a sua posição inicial e sustentando que a relação laboral cessou no dia 31.07.2015.

V Foi dispensada a realização de audiência prévia.

Foi proferido despacho saneador em que se relegaram para final o conhecimentos das excepções suscitadas.
Foi dispensada a identificação do objecto do litígio e a enunciação dos temas da prova.
O processo seguiu os seus termos, vindo, a final, a ser proferida sentença que julgou a acção nos seguintes termos:

4DECISÃO.
Pelo exposto, julgo totalmente improcedente, por não provada, a presente ação e, em consequência, absolvo do pedido o Réu BBB.”
Dessa sentença recorreu a autora, apresentando as seguintes conclusões:
a.- O presente recurso tem como tema e objeto duas questões de direito da sentença proferida nos presentes autos, mais precisamente a aplicação das normas jurídicas do instituto do pacto de não concorrência e ainda a declaração de nulidade deste por se mostrar como desproporcional.
b.- Veio o Tribunal ad quo absolver o Réu no pagamento da indemnização peticionada que tinha com fundamento o incumprimento definitivo do pacto de não concorrência.
c.- Para tanto o Tribunal ad quo declarou que não estava verificado o pressuposto da existência do efetivo prejuízo para o funcionamento do pacto de não concorrência.
d.- Mais declarou o Tribunal ad quo ao evidenciar que o pacto de não concorrência padecia do desvalor jurídico de nulidade, uma vez que no confronto entre a compensação pecuniária acordada e o direito restringido não existia uma garantia de proporcionalidade, adequação e justificação.
e.- O que não se mostra compatível com a melhor interpretação das regras jurídicas e sobretudo com o que foi acordado e estipulado entre as partes em sede de pacto de não concorrência.
f.-Relativamente ao incumprimento do pacto de não concorrência o Tribunal ad quo veio declarar que não está verificado uma vez que a Autora não fez prova nem demonstrou a existência de efetivo prejuízo.
g.- Mais declara o Tribunal ad quo que o A. não “roubou” clientes à Autora, pois não ficou demonstrado que o A. tivesse usado informação específica para dialogar, contactar e comercializar com os clientes e como tal não estavam verificados os pressupostos para o acionamento do pacto de não concorrência.
h.- Ora, salvo o devido respeito, não podemos subscrever e aceitar a douta decisão proferida na sentença agora em escrutínio.
i.- A decisão em recurso não está em conformidade com os mandamentos normativos aplicáveis e muito menos numa consequência lógica face ao que foi dado como provado.
j.- O Tribunal ad quo deu como provado que o R.. disponha de informação e contactos de clientes; que foi labutar para empresa concorrente; que foi desenvolver funções semelhantes e em especial que fez propostas comerciais e de fornecimento de produtos a clientes da Autora.
k.- Face a esta matéria factual dada como provada e ao conteúdo da obrigação a que estava adstrito – de não exercer atividade concorrencial e semelhante para os clientes da A. -, em cumulação com a obrigação acessória presente na cláusula penal, não podem restar dúvidas sobre a verificação do incumprimento do pacto de não concorrência por parte do Réu.
l.- Nos termos do acordado no pacto de não concorrência ficou o trabalhador ora Réu adstrito a não exercer atividade semelhante, concorrencial com, para e perante os clientes da Autora e não que o trabalhador ficasse adstrito a não exercer atividade concorrencial.
m.- Foi nestes termos que o Tribunal interpretou o conteúdo da obrigação de non facere em apreço.
n.- O que fez incorretamente.
o.- A obrigação acordada e sobre a qual o trabalhador ora devedor estava adstrito era de que não podia exercer atividade comercial perante e com os clientes da Autora, o que não foi respeitado na medida em que contactou, apresentou propostas de fornecimento.
p.- O conteúdo da obrigação era de não exercer actividade concorrencial para os clientes da Autora.
q.- Mais, o R. exerceu actividade comercial e concorrencial perante e com os clientes da Autora.
r.- Perante este quadro é manifesto o incumprimento pelo trabalhador ora devedor da obrigação a que ficou adstrito e em consequência a sua obrigação de indemnizar, nos termos do acordado na cláusula penal.
s.- A demonstração do efetivo prejuízo não se mostrava como necessária, uma vez que as partes estabeleceram uma cláusula penal de fixação antecipada de danos.                   
t.- Pelo exposto, dúvidas não se levantam de que estão preenchidos e verificados os pressupostos para acionamento do pacto de não concorrência estabelecido entre a A. enquanto entidade empregadora e o R. na qualidade de antigo trabalhador e em consequência ser declarado o seu incumprimento, com as consequências legais.
u.- Considerou ainda o Tribunal que o pacto de não concorrência padecia do desvalor jurídico de nulidade na medida em que não garantia o respeito pelos princípios da adequação, justificação e proporcionalidade.
v.- Para tanto entendeu o Tribunal ad quo que face à compensação pecuniária atribuída e o dever imposto de não concorrencial não era proporcional a restrição acordada do direito fundamental de trabalhar e de iniciativa privada.
w.- Outra vez mais não podemos acompanhar a conclusão normativa adotada.                    
x.- O Tribunal ad quo declarou que o dever imposto se cingia à não possibilidade de exercer qualquer atividade comercial concorrencial na indústria da panificação, o que não está correto.
y.- Na realidade, ao R. foi imposto que não exercesse o direito de trabalhar e de exercer atividade comercial apenas com um número muito limitado de sujeitos e operadores – clientes da Autora.
z.- A restrição ao direito fundamental não era absoluta mas apenas parcial, vinculando-o a não exercer atividade comercial somente com um número específico de clientes,
aa.- Permanecendo intacto e inalterado o direito de privar, contactar, comercial com todos os demais operadores da indústria da panificação.
bb.- Foi respeitado e salvaguardo o direito de o Réu exercer atividade comercial remunerada de qualquer índole, até mesmo de natureza semelhante e concorrencial à da Autora.
cc.- Com efeito, a remuneração mensal de € 414,85 tinha com dever imposto ao R. unicamente não comercializar com os clientes da Autora (era efetivamente este o conteúdo da obrigação de non facere) e não o dever absoluto de exercer atividade comercial.
dd.- O trabalhador por conta de outra empresa, com o seu vencimento e que fique adstrito a não contactar com um número específico de clientes e ainda recebendo uma compensação por tal não vê o seu direito ao trabalhado complemente violado ou restringido de forma desproporcional face à compensação atribuída.
ee.- Perante o exposto, não se mostra como desproporcional ou injustificado o pacto de não concorrência celebrado entre as partes na medida em que a restrição ao direito fundamental não contende nem viola o núcleo do mesmo.
ff.- Razão pela qual deverá ser declarado como válido o pacto de não concorrência celebrado entre as partes nos termos do qual o trabalhador ora Réu não poderia contactar com certos clientes e em consequência auferiria uma compensação quase equivalente a um ordenado mínimo, com todas as consequências legais que daí advêm.
Nestes termos, e nos melhores de Direito, deverão V. Exas., Venerandos Juízes Desembargadores, assegurar o cumprimento das normas do nosso ordenamento jurídico e, nessa medida, deve ao presente recurso ser dado provimento total, revogando-se assim a decisão judicial proferida pelo Tribunal ad quo de declaração de não estarem verificados os pressupostos do acionamento do pacto de não concorrência e da sua nulidade e em consequência condenando-se o Apelado ao pagamento à Apelante da indemnização devida e peticionada.
Só, assim, Exmos. Venerandos Juízes Desembargadores se iluminará o caminho para a realização da JUSTIÇA, como é de Direito!

O réu contra-alegou pugnando pela confirmação da sentença.

Correram os Vistos legais, tendo o Digno Procurador Geral-Adjunto do Ministério Público emitido Parecer (fols. 225 a 228) no sentido de ser negado provimento ao recurso.

VI A matéria de facto considerada provada em 1ª instância, não impugnada, é a seguinte:
1)- A Autora é uma sociedade anónima que se dedica à produção e comercialização de produtos alimentares relacionados com a indústria da panificação e pastelaria – cfr. resposta ao artigo 1º da p.i..
2)- A Autora tem a sua sede legal na Avenida Dr. …, onde nesta mesma morada funciona a fábrica de produção e confeção de produtos alimentares – cfr. resposta ao artigo 2º da p.i..
3)- No âmbito da sua atividade comercial a Autora fornece e vende artigos, melhorantes, bens e produtos alimentares, para a indústria da panificação e pastelaria – cfr. resposta ao artigo 3º da p.i..
4)- No essencial a Autora fornece farinhas, cremes, gemas de ovos, claras, fermento, cremes pasteleiros, cremes de recheio de diversos sabores e ingredientes, açucares, géis de açúcar, chocolates para bolos, geleias, óleos, fruta em calda, caramelizada, fondants, aromas, conservantes, desmoldantes, entre outros – cfr. resposta ao artigo 4º da p.i..
5)- Entre os seus clientes figuram pastelarias, padarias, refeitórios, empresas da indústria da panificação e também cadeias de supermercados e hipermercados (grande superfícies – área de pastelaria e panificação) – cfr. resposta ao artigo 5º da p.i..
6)- Por contrato de trabalho sem termo, reduzido a escrito em 6 de fevereiro de 2012, a Autora contratou o Réu para, sob a sua autoridade, direção e fiscalização, exercer as funções inerentes à categoria de Gestor de Mercado (Grandes Superfícies), cfr. cópia de contrato de trabalho junta aos autos como doc. nº 1 da p.i., que aqui como integralmente reproduzida – cfr. resposta ao artigo 6º da p.i..
7)- Como contrapartida pelo exercício da sua atividade laboral o Réu auferia, ultimamente, a retribuição mensal de € 2.074,24 (dois mil e setenta e quatro euros e vinte e quatro cêntimos), a que acrescia o valor de € 518,56 (quinhentos e dezoito euros e cinquenta e seis cêntimos), a título de pagamento pela isenção de horário – cfr. resposta ao artigo 7º da p.i..
8)- Entre as funções atribuídas ao Réu, e por ele desempenhadas, estavam: visitas regulares aos clientes de acordo com uma periodicidade e objetivos definidos superiormente, elaborar relatórios de visita, proceder à divulgação dos produtos e bens produzidos e fornecidos pela Autora e efetuar a cobrança do bens e produtos fornecidos juntos dos clientes – cfr. resposta ao artigo 8º da p.i..
9)- No âmbito da relação laboral instituída entre as partes ao R. foi assegurada a formação profissional inicial e contínua – cfr. resposta ao artigo 9º da p.i..
10)- Em concreto, foi prestada formação profissional no ano da admissão (2012), ano de 2013, 2014 e ano da cessação (2015) – cfr. resposta ao artigo 10º da p.i..
11)- Ao Réu foi ministrado durante o vínculo laboral, a título de formação profissional, programas, conhecimentos e conteúdos durante cerca de 120H00 – cfr. resposta ao artigo 11º da p.i..
12)- A formação profissional ministrada pela Autora ou então por ela suportada, visou dotar o Réu com conhecimentos suficientes, idóneos e adequados ao conhecimento mais aprofundado dos produtos e materiais comercializados pela Autora – cfr. resposta ao artigo 12º da p.i...
13)- Entre os diversos conteúdos ministrados, encontra-se a formação de Merchadising, a qual visou dotar o Réu de ferramentas úteis para a relação comercial instituída ou a instituir com clientes – cfr. resposta ao artigo 13º da p.i...
14)- Ao Réu foi assegurada formação profissional no estrangeiro, nomeadamente Barcelona e Bruxelas, tendo a Autora suportado todos os custos relacionados, nomeadamente com transportes, hospedagem, refeições – cfr. resposta ao artigo 14º da p.i...
15)- No contrato de trabalho, o qual foi objeto de alteração através de aditamento celebrado a 15 de janeiro de 2013, foi acordado entre as partes, na cláusula 3.ª, que “O segundo outorgante obriga-se, durante a vigência do presente contrato, a exercer a sua actividade para a primeira outorgante em regime de exclusividade, não podendo exercer outra atividade, a título gratuito ou oneroso, por conta própria ou alheia, direta ou indiretamente, que seja concorrente da atividade desenvolvida pela Primeira Outorgante.” – cfr. resposta ao artigo 15º da p.i..
16)- Acordaram ainda as partes, no ponto 4 da aludida cláusula do mesmo contrato, que: “Nos doze meses subsequentes à cessação do presente contrato por iniciativa do segundo outorgante, este compromete-se a não exercer, por conta própria ou alheia, directa ou indirectamente, actividades para os clientes da primeira outorgante onde interveio nos doze meses anteriores à data da cessação do contrato” – cfr. respostas aos artigos 18º da p.i. e 37º da contestação.
17)- Foi ainda estipulado entre as partes no âmbito do aludido contrato de trabalho a fixação de uma cláusula penal nos termos da qual o Réu ficaria obrigado ao pagamento de uma indemnização no valor correspondente à remuneração global, incluindo prémios, auferida nos dozes meses imediatamente anteriores à data da cessação do contrato, caso exercesse atividade concorrencial – cfr. resposta ao artigo 20º da p.i..
18)- Mais acordaram as partes que, caso a Autora optasse por vincular o Réu ao período de limitação da atividade em virtude do pacto de não concorrência estabelecido na cláusula 3ª do aditamento ao contrato, seria atribuído ao Réu uma compensação de valor ilíquido igual a 20% da remuneração mensal base auferida pelo Réu à data da cessação do contrato – cfr. resposta ao artigo 39º da contestação e cláusula 3ª, nº 6 do aditamento ao contrato de trabalho.
19)- Mais ficou estipulado que durante o período de limitação da atividade, a Autora pagaria a compensação prevista no nº 6 da cláusula 3ª do aditamento ao contrato de trabalho até ao final de cada mês – cfr. resposta ao artigo 40º da contestação e cláusula 3ª, nº 7 do aditamento ao contrato de trabalho.
20)- O Réu auferiu nos últimos dozes meses de vínculo laboral para com a Autora a quantia de € 36.122,28 (trinta e seis mil, centos e vinte e dois euros e vinte e oito cêntimos), correspondente aos meses de Agosto de 2014 a julho de 2015, cfr. cópia de recibos de vencimento respeitantes aos meses em referência – cfr. respostas aos artigos 23º da p.i. e 15º da contestação.
21)- O Réu auferiu nos últimos dozes meses anteriores à cessação, detalhadamente, em agosto de 2014 a quantia de € 2357,09; em setembro de 2014: € 2357,09; em outubro de 2014: €2357,09; em novembro de 2014: € 4714,18; em dezembro de 2014: € 2357,09; em janeiro de 2015: € 2357,09; em fevereiro de 2015: € 2357,09; em março de 2015: € 2357,09; em abril de 2015: € 2592,80; em maio de 2015: € 2592,8; em junho de 2015: € 2592,80 e em julho de 2015: € 7130,07 – cfr. resposta ao artigo 24º da p.i..
22)-Decidiu o Réu tomar a iniciativa de denunciar, unilateralmente e com aviso prévio, o contrato de trabalho que o ligava à Autora – cfr. resposta ao artigo 12º da p.i..
23)- Para o efeito o Réu fez chegar à Autora a carta que constitui o doc. nº 19 da p.i. (cfr. fls. 26), datada de 20.07.2015, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – cfr. respostas aos artigos 26º da p.i. e 28º da contestação.
24)- Nessa carta o Réu comunicou à Autora que deixava a data de saída à consideração da empregadora – cfr. resposta ao artigo 14º da resposta à contestação.
25)- O Réu, em agosto de 2015, não trabalhou – cfr. resposta ao artigo 36º da contestação.
26)- A Autora permitiu que o Réu gozasse férias no mês de agosto de 2015 – cfr. respostas aos artigos 27º da pi. e 16º da resposta à contestação.
27)- A Autora liquidou ao Réu a retribuição respeitante aos 31 dias do mês de julho de 2015, no montante de € 2.074,24 (dois mil e setenta e quatro euros e vinte e quatro cêntimos), assim como os demais créditos laborais emergentes da execução e cessação da relação laboral – cfr. respostas aos artigos 28º da p.i. e 29º da contestação.

28)- Na sequência da cessação do contrato de trabalho, a Autora pagou ainda ao Réu as retribuições correspondentes ao tempo de serviço prestado nos seguintes moldes:
17,5 dias, referente ao subsídio de Natal do ano de 2015, no montante de € 1.512,47 (mil quinhentos e doze euros e quarenta e sete cêntimos);
17,5 dias, referente ao subsídio de férias do ano de 2016, no montante de € 1.512,33 (mil quinhentos e doze euros e trinta e três cêntimos);
17,5 dias, referente à retribuição de férias não gozadas em 2016, no montante de € 1.512,47 (mil quinhentos e doze euros e quarenta e sete cêntimos) – cfr. resposta ao artigo 29º da contestação.

29)- A Autora prescindiu de qualquer período de aviso prévio para denúncia do contrato de trabalho apresentado pelo Réu – cfr. respostas aos artigos 32º da contestação e 15º da resposta à contestação.
30)- A Autora enviou ao Réu, em 23 de setembro de 2015, por via postal registada com aviso de receção, carta, nos termos da qual lhe comunicou a obrigação de não exercer atividade concorrencial, por conta própria ou alheia nos dozes meses após a cessação do contrato de trabalho, solicitando-lhe ainda o envio de NIB/IBAN de modo a proceder ao pagamento da compensação – cfr. respostas aos artigos 30º da p.i. e 43º da contestação.
31)- A qual, todavia, não foi rececionada por parte do Réu por falta de levantamento na instituição postal – cfr. resposta ao artigo 31º da p.i..
32)- Procedimento que a Autora voltou a repetir, em outubro de 2015, fevereiro de 2016 e, por fim, em abril de 2016 – cfr. resposta ao artigo 32º da p.i..
33)- Porque o Réu não rececionou as cartas remetidas pela Autora, esta não procedeu ao pagamento da compensação pecuniária estabelecida – cfr. resposta ao artigo 33º da p.i..
34)- À trabalhadora (…), no âmbito do pacto de não concorrência com esta celebrado, a Autora procedeu ao pagamento da compensação pecuniária estabelecida – cfr. resposta ao artigo 34º da p.i..
35)- Pagou a Autora à aludida trabalhadora a quantia mensal de € 342,86 (trezentos e quarenta e dois euros e oitenta e seis cêntimos), por transferência bancária, pela limitação do exercício da atividade concorrencial – cfr. resposta ao artigo 35º da p.i..
36)- O Réu usou durante longo tempo uma Agenda Eletrónica, vulgo PDA, contendo informações sobre clientes, designadamente números de telefone, indicação pormenorizada sobre as pessoas responsáveis da parte do cliente pelas compras efetuadas à Autora – cfr. resposta ao artigo 37º da p.i..
37)- O Réu dispunha de informação e contactos sobre os clientes da Autora – cfr. resposta ao artigo 38º da p.i..
38)- A “…” é uma empresa concorrente da Autora – cfr. resposta ao artigo 40º da p.i..
39)- A empresa “…” fornece produtos e bens relacionados com a panificação e pastelaria – cfr. resposta ao artigo 42º da p.i..
40)- O Réu foi desenvolver semelhantes funções para a empresa “…”, diretamente concorrente da Autora – cfr. respostas aos artigo 43º e 44º da p.i..
41)- O funcionário da Autora ….foi trabalhar para a empresa “…”, em junho de 2016, após ter apresentado demissão na Autora – cfr. resposta ao artigo 46º da p.i..
42)- O Réu fez propostas comerciais de fornecimento de produtos e artigos a clientes da Autora, que eram também clientes da “… – cfr. resposta ao artigo 48º da p.i..
43)- O Réu contactou clientes da Autora, que eram também clientes da “…” – cfr. resposta ao artigo 49º da p.i..
44)- O Réu conhece a prática comercial da Autora – cfr. resposta ao artigo 50º da p.i..
45)- O conteúdo do aditamento ao contrato de trabalho foi de autoria exclusiva da Autora – cfr. resposta ao artigo 3º da contestação.
46)- Não foi permitido ao Réu negociar os termos constantes do aditamento ao contrato de trabalho – cfr. resposta ao artigo 4º da contestação.
47)- Assim como aos demais trabalhadores da Autora que foram confrontados com um aditamento aos seus contratos de trabalho, nos precisos termos e efeitos – cfr. resposta ao artigo 5º da contestação.
48)- A Autora realizava o pagamento das retribuições do Réu através de transferência bancária, para o NIB/IBAN deste, que conhecia – cfr. resposta ao artigo 45º da contestação.

VII Nos termos dos arts. 635º-4, 637º-2, 639º-1-2, 608º-2 e 663º-2, todos do CPC/2013, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação; os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes, salvo se importar conhecê-las oficiosamente.
Tratando-se de recurso a interpor para a Relação, como este pode ter por fundamento só razões de facto ou só razões de direito, ou simultaneamente razões de facto e de direito, assim as conclusões incidirão apenas sobre a matéria de facto ou de direito ou sobre ambas (v. Fernando Amâncio Ferreira, "Manual dos Recursos em Processo Civil", 3ª ed., pag. 148).
Atento o teor das conclusões das alegações apresentadas pela apelante, as questões que fundamentalmente se colocam no presente recurso são as seguintes:
A 1ª, se a sentença recorrida padece da nulidade prevista no art. 615º-1-c) do CPC.
A 2ª, se o réu violou o pacto de não concorrência que acordou com a autora.
A 3ª, se o pacto de não concorrência estabelecido entre autora e réu é válido.
A 4ª, se, em caso de procedência das 2ª e 3ª questões, a autora pode ser indemnizada pelo réu nos termos pretendidos.

VIIIDecidindo.
Quanto à 1ª questão.

No final do corpo das suas alegações, imediatamente antes das respectivas conclusões, diz a apelante que a sentença padece “premente contradição entre a matéria de facto dada como provada e a premissa conclusiva realizada pelo tribunal” tal invocando para efeitos do estabelecido no art 651º-1-c) do CPC.
Ora tal nulidade não foi devidamente arguida em separado nos termos do art. 77º-1 do CPT, pelo que dela não se pode tomar conhecimento, como é jurisprudência antiga, firme e pacífica.

Quanto à 2ª questão.
A possibilidade de estabelecimento de pactos de não concorrência para vigorarem após a cessação do contrato de trabalho está prevista no art. 136º do CT.
A sentença recorrida considerou que não houve violação do pacto de concorrência, designadamente do ponto 4 da Clª 3ª, na medida em que os clientes da ré que foram contactados pelo réu, eram igualmente clientes da empresa para quem o autor passou a trabalhar.
Ali se escreveu que “É certo que o Réu contactou clientes da Autora, mas tais clientes eram já clientes da empresa concorrente, desconhecendo-se se, enquanto trabalhador da Autora, o Réu já tinha estabelecido relações profissionais com esses clientes. A simples circunstância da Autora e da empresa concorrente terem clientes comuns não pode ser fundamento para acionar o pacto de não concorrência se não ficar demonstrado que, de alguma forma, o Réu se socorreu dos conhecimentos e informações obtidos na Autora para chegar até esses clientes ou determinar a opção comercial destes pela empresa concorrente em detrimento da Autora. E essa demonstração a Autora não fez.”
Não podemos deixar de acompanhar, no essencial, esta posição do Tribunal a quo.
De facto, a ratio que está subjacente a este tipo de cláusulas, e a esta em concreto também, é evitar que o ex-trabalhador, aproveitando-se do know-how adquirido, do conhecimento da carteira de clientes e, mesmo das relações pessoais privilegiadas que se criam entre clientes e os trabalhadores da área comercial de vendas, venha a “desviar”/”roubar” clientes da antiga entidade empregadora para a nova empresa para quem começou a trabalhar.
Ora o que no caso concreto se verifica é ter ficado provado que o autor apesar de ter contactado e feito propostas comerciais a clientes da autora, esses mesmos clientes eram já clientes da nova empresa pelo que, naturalmente, o aqui réu não “desviou” clientela da autora, o que era a finalidade da cláusula de não concorrência acordada entre autora e réu (factos nºs 16, 38, 39, 40, 42 e 43).
Não houve, pois, violação do pacto de não concorrência invocado pela autora.
Quanto à questão da necessidade de demonstração pela autora de que a actividade desenvolvida pelo réu era passível de lhe causar efectivo prejuízo, que também serviu de suporte adicional ou de reforço para na sentença se concluir pela improcedência da acção, apurado que não houve violação do pacto de não concorrência, carece agora de qualquer interesse analisar-se a mesma.

Quanto à 3ª questão.
O mesmo se pode dizer quanto a esta questão pois que apurada a inexistência de violação do pacto de não concorrência, ficou inútil estar agora a discutir-se se o pacto em causa é nulo por o montante da compensação fixada ao trabalhador ser desproporcionadamente reduzido.
No entanto, ainda assim, e muito sucintamente, se dirá que não se mostra demonstrada essa invocada desproporcionalidade.
De facto, para que assim se pudesse considerar, haveria de ter sido demonstrado que a autora é uma empresa de tal maneira dominante no mercado que deixaria apenas umas escassas possibilidades de clientes que o réu pudesse contactar, face à limitação imposta pelo nº 4 da Clª 3ª. E aí sim a compensação no valor de 20% sobre a remuneração base mensal mostrar-se-ia claramente desproporcionada.
Como não foi feita tal prova, não se poderia retirar a conclusão de nulidade como se fez na sentença recorrida.

Quanto à 4ª questão.
Face à improcedência da 2ª questão, ficou prejudicado o conhecimento desta 4ª questão.

IX Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas em ambas as instâncias a cargo da autora. 


                                    
Lisboa, 6 de Junho de 2018. 



DURO CARDOSO
LEOPOLDO SOARES
EDUARDO SAPETEIRO