Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1168/20.5T8FNC.L1-2
Relator: ORLANDO NASCIMENTO
Descritores: SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS
PRESCRIÇÃO
CADUCIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/13/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1.–Atento o disposto na segunda parte, do n.º 1, do art.º 217.º, do C. Civil, quanto ao valor da declaração negocial tácita, o pagamento de parte do preço de fornecimento de eletricidade, a negociação e o acordo de pagamento, o incumprimento desse acordo, a celebração de novo acordo e o seu incumprimento, devem ser interpretados como reconhecimento do direito ao preço do serviço/produto fornecido, previsto no n.º 2, do art.º 331.º, do C. Civil, constituindo causa impeditiva da caducidade do prazo estabelecido no n.º 4, do art.º 10.º, da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho (Lei dos Serviços Públicos Essenciais).

2.–Nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2, do art.º 302.º, do C. Civil, esses mesmos atos configuram renúncia à prescrição do direito ao recebimento do preço do serviço prestado estabelecida pelo n.º 1, do art.º 10.º, da Lei n.º 23/96.

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes que constituem o Tribunal da Relação de Lisboa.

1.–RELATÓRIO.

… Empresa de Eletricidade …, S.A propôs contra … Imobiliária, Lda esta ação declarativa de condenação, com processo comum, pedindo a sua condenação a entregar-lhe a quantia de € 185.058,32, acrescida de juros de mora à taxa legal para os juros comerciais vencidos desde a data dos vencimentos das faturas até à data de propositura da ação, no valor de € 58.819,46 e vincendos até integral pagamento, com fundamento, em síntese, em que no âmbito de um contrato entre ambas celebrado em 15/09/2005, lhe forneceu energia elétrica e lhe prestou serviços de instalação e reforço de ligações de baixa tensão, não tendo a mesma pago as facturas respectivas.

Citada, contestou a R dizendo, em síntese que são verdadeiros os factos articulados pela A, invocando a exceção da prescrição e pedindo a absolvição do pedido.

Realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, julgando improcedente a exceção da prescrição e a ação integralmente procedente, condenando a R a pagar à A a quantia de € 243.877,78, acrescida de juros vincendos à taxa legal aplicável aos créditos comerciais sobre a quantia de € 185.058,32, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.

Inconformada com essa decisão a R dela interpôs recurso, recebido como apelação, pedindo a sua revogação, formulando as seguintes conclusões:

A.–Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, Juízo Central Cível do Funchal – Juiz 2, sob o número de processo 1168/20.5T8FNC, através da qual o Meritíssimo Juiz em 28 de Julho de 2021, julgou improcedente a excepção deduzida de prescrição e integralmente procedente, por provada, a acção.

B.–A Autora … Empresa de Electricidade …, S.A., ora Recorrida, intentou uma acção de processo comum contra a então Ré …Imobiliária, Lda., agora Recorrente. A acção tem em vista a cobrança de dívidas por facturas vencidas decorrentes do fornecimento de energia eléctrica. O valor alegadamente devido emerge de um contrato de fornecimento de energia eléctrica, datado de 15 de Setembro de 2005, celebrado entre as partes. Está em causa o pagamento de facturas entre Novembro de 2011 e Setembro de 2014, e entre Julho de 2016 e Fevereiro de 2018, perfazendo a quantia de € 185.058,32 (cento e oitenta e cinco mil e cinquenta e oito euros e trinta e dois cêntimos).

C.–A … apresentou contestação e invocou a prescrição da obrigação de pagamento da dívida e, consequentemente, absolvição do pedido.

D.–Por decisão datada de 25/07/2021, o Tribunal Judicial da Comarca da Madeira julgou improcedente a excepção de prescrição deduzida e condenou a Ré no pagamento da quantia de € 243.877,78 (duzentos e quarenta e três mil oitocentos e setenta e sete euros e setenta e oito cêntimos), acrescida de juros vincendos à taxa legal aplicável aos créditos comerciais sobre a quantia de €185.058,32, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

E.–O Tribunal de Comarca da Madeira veio a aceitar o argumento, julgando por isso improcedente a excepção de prescrição e procedente a excepção de abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium. No caso da prescrição, e de forma muito sumária, porque a … teria reconhecido a dívida e, por conseguinte, tacitamente renunciado ao direito de a invocar em juízo - que se estendeu até 06 de Novembro de 2019 – pois só naquela data (alegadamente) a Ré informa a Autora de que considera a dívida prescrita, como uma mera obrigação natural e apenas nesse pressuposto, se dispunha a pagar as facturas posteriores aos anos a 2014, nada pagando relativamente às facturas dos anos de 2011 a 2014.

F.–Para o Tribunal, a ... teria também excedido manifestamente os “limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo fim económico ou social desse eventual direito a invocar a prescrição da dívida”, concluindo a sentença recorrida que a atitude da Ré “revela um claro venire contra factum proprium”.

G.–O Tribunal a quo interpreta incorrectamente os institutos da caducidade e da prescrição.

H.–Porque interpreta incorretamente tais institutos, interpreta incorretamente o abuso do direito de prescrição.

I.–Por força do recurso da matéria de facto devem ser expurgados da matéria de facto dada como provada, os juízos conclusivos quanto à renúncia à prescrição a que correspondem aos pontos 2.1.21., 2.1.22., 2.1.23., 2.1.24, 2.1.26. e 2.1.27. e, além disso, deve ser acrescentada à matéria de facto dada como provada, por constarem de documentos juntos aos autos e não impugnados o conteúdo dos e-mails trocados pela ... e E.., designadamente nas seguintes passagens: “…Estamos a analisar toda a Conta Corrente e o IVA pago de algumas facturas para acertarmos e apurarmos devidamente os valores em divida.”; “Caro amigo Rui, Para teu conhecimento. Gostaria de propor uma reunião, antes de assinarmos o Plano de pagamentos, para detalharmos algumas situações. Abraço, José …”; “…Foram estes pedidos e de r...bolso do IVA das facturas que obrigaram a nos precaver, juridicamente, das posições assumidas, unilateralmente pela E...”; “Caro Paulo …, A E... não está a por em questão quaisquer análises no que concerne a perspectiva fiscal ou jurídica.”.

J.–O erro de interpretação parte de o Tribunal a quo não ter reconhecido a natureza especial da caducidade e prescrição em questão.

K.–Estão em causa a prescrição e caducidade previstas no artigo 10.º da Lei dos Serviços Essenciais (a Lei n.º 23/96, de 26 de julho). Ora, com a entrada em vigor dessa lei “pretendeu-se, inequivocamente, não só salvaguardar o utente das entidades com as quais se vê obrigado a contratar, mas também a defendê-lo de si próprio relativamente à possibilidade de sobre - endividamento por consumo de bens que tendem a satisfação de necessidades primárias, básicas e essenciais dos cidadãos” (cf. acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 01.12.2015, proc. N.º 98356/13.0YIPRT.P1).

L.–Assim, a caducidade e prescrição em análise têm precisamente o efeito de impedir a cobrança de valores tão expressivos como os agora reclamados pela .... A ideia é não só impedir o sobre-endividamento de particulares com despesas a que não podem fugir, como incentivar os prestadores de serviços essenciais a cobrar tais valores atempada e regularmente.

M.–Quanto à caducidade, o Tribunal a quo equivocou-se porque terá detectado, infundadamente, uma interrupção do prazo de caducidade. Ao que parece, terá presumido – erradamente – que a Recorrente ... teria reconhecido o direito caducado da ... até à data de 06 de novembro, dia em que a ... enviou um e-mail à ... em que anunciava a intenção de invocar a prescrição da dívida. Com esse e-mail, teria “cessado” a interrupção da caducidade prevista no artigo 331.º, n.º 2 do Código Civil.

N.–Sucede que a caducidade é de ordem pública e conhecimento oficioso. Atendendo aos fins prosseguidos pela Lei de Serviços Essenciais, impõe-se uma interpretação particularmente estrita do reconhecimento do direito. Uma interpretação mais extensiva – em que simplesmente aludir à dívida resultasse no reconhecimento do direito à respetiva cobrança – redundaria numa desproteção do consumidor de serviços essenciais. Assim, o reconhecimento do direito tem de ser explícito e claro, sem qualquer vaguidade ou ambiguidade.

O.–Ora, o Tribunal considerou que a ... reconheceu o direito da ... porque ocorreu uma proposta de acordo de liquidação da dívida. Não se refere a qualquer documento ou testemunho de onde tenha resultado esse conhecimento.

P.–Ora, na dúvida, na falta de um reconhecimento categórico e inequívoco do direito em questão, o julgador deve considerar que o devedor do preço de serviços essenciais até pode querer solver parte da dívida, mas essa intenção de pagamento não se confunde com o reconhecimento do direito da ... ao valor em dívida, ou à sua cobrança em juízo. Não houve então reconhecimento do direito.

Q.–Na falta de um tal reconhecimento, a ... é devolvida a regra geral do artigo 331.º, n.º 1 do Código Civil. Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo.

R.–A acção não foi intentada no prazo legal. Pelo que o Tribunal a quo interpretou incorretamente o artigo 10.º, n.º 4 da Lei dos Serviços Essenciais e, bem assim, o artigo 331.º n.º 2 do Código Civil. A sentença recorrida deve ser nesta parte revogada, e substituída por outra, que declare procedente a excepção peremptória da caducidade do direito de ação.

S.–Por outro lado, o Tribunal a quo entendeu que o reconhecimento do direito era como que um pressuposto, que vigorou até a ... afirmar que invocaria a prescrição. Sucede que o reconhecimento do direito é uma declaração de vontade explícita, que ocorre em determinado momento. Por outras palavras, o devedor, quando reconhece o direito, não renuncia à caducidade, que é de resto um instituto de ordem pública, e é por isso irrenunciável. Assim, a caducidade pode ficar impedida no momento em que o direito é reconhecido, mas não fica perpetuamente impedida em virtude desse reconhecimento. Pelo contrário, um novo prazo de caducidade conta a partir da data de reconhecimento do direito, findo o qual o reconhecimento não mais serve como causa impeditiva da caducidade.

T.–A proposta de acordo de que o Tribunal a quo extrai – erradamente, como vimos – um reconhecimento da dívida foi apresentada a 10 de abril de 2018 (cf. facto provado 2.1.20). Ora, a ação foi intentada mais de 6 meses depois desse suposto reconhecimento da dívida. Ainda que o reconhecimento tivesse ocorrido nessa data, o direito da ... já teria caducado na data em que a ação foi intentada. Pelo que a caducidade opera de uma forma ou de outra.

U.–Subsidiariamente, o reconhecimento do direito podia, eventualmente, impedir a caducidade das dívidas associadas aos serviços prestados nos seis meses anteriores à proposta de acordo de 10 de abril de 2018 (as dívidas pelos serviços prestados de novembro de 2017 a abril de 2018); mas nunca faria repristinar o direito de acção da ... em relação às dívidas por serviços prestados antes desses meses. Essas dívidas já tinham caducado, porque a ... não tinha exercido o seu direito de acção em relação a elas no tempo devido.

V.–Quanto à prescrição, o Tribunal a quo entendeu que a Ré ..., ora Recorrente, renunciou tacitamente ao direito de invocar a prescrição, através de “reiteradas promessas de pagamento da dívida prescrita”, que implicavam “a renúncia a invocá-la judicialmente, tanto mais que se trata de uma empresa comercial com alguma dimensão, atento até ao volume de consumos de eletricidade e estava assessorada judicialmente”.

W.–Não só esta interpretação ignora a especial natureza da prescrição em causa nos autos, como ignora o conteúdo das comunicações que a ... pediu para acrescentar à matéria de facto provada, no recurso da matéria de facto.

X.–Nas palavras de Calvão da Silva, o fundamento do estabelecimento de um prazo prescricional muito curto entronca na “chamada ordem pública de protecção ou ordem pública social, própria da reluzente temática da tutela do consumidor, tirado da necessidade de prevenir a acumulação de dívidas, que o utente pode (deve) pagar periodicamente mas encontrará dificuldades em solver se excessivamente agregadas” (…) “Por esta via, entendeu o legislador proteger utentes e consumidores da tentação do sobreendividamento, dando-lhes mais certezas e segurança, ao não os deixar à mercê de credores, desmesuradamente retardatários na exigência judicial de créditos periódicos por serviços públicos essenciais. Por um lado, o prazo prescricional constitui uma arma de pressão sobre o credor, no sentido de ele ser célere na exigência judicial dos créditos, sancionando-lhe a inércia e a negligência decorridos seis meses após a prestação mensal do serviço público” (Aplicação da Lei nº 23/96 ao serviço móvel de telefone e natureza extintiva da prescrição referida no seu art. 10º , RLJ, nº 3901, 3902, ano 132, Agosto/Setembro de 1999, pág. 154).

Y.–Assim, a prescrição tem neste contexto uma especial função estabilizadora. Não protege o devedor apenas do prestador de serviços essenciais. Protege o devedor de si mesmo, evitando que contraia dívidas que não consegue pagar, por serviços a que não pode deixar de recorrer. Por outro lado, a prescrição castiga a inércia do prestador de serviços públicos essenciais, incentivando e premiando a rapidez e regularidade na cobrança.

Z.–Neste contexto, a renúncia à prescrição deve ser interpretada muito restritivamente. Caso contrário, chega-se por via interpretativa ao resultado que o legislador quis categoricamente prevenir.

AA.–No caso, a tentativa da ... chegar a acordo não é incompatível com a vontade de invocar a prescrição da dívida. O efeito da invocação da prescrição é o de converter a obrigação civil numa obrigação natural ou moral (o que se afirma sem prejuízo de boa parte da doutrina a considerar extintiva). Ora, um devedor pode, perfeitamente, ter interesse em invocar a prescrição, e ainda assim querer solver parte da sua dívida. Trata-se, afinal, de um direito disponível.

BB.–A ..., nas sucessivas propostas de acordo, nunca afirmou explicitamente que não invocaria a prescrição. O Tribunal a quo não consegue, de resto, encontrar uma tal declaração, e extrai a renúncia à prescrição da mera tentativa de acordo.

CC.–Não existe, então, renúncia à prescrição.

DD.–Por outro lado, conforme o Acórdão uniformizador nº 11/94, de 5 de maio (DR de 17.07.94) “a renúncia da prescrição permitida pelo artigo 302.º do Código Civil só produz efeitos em relação ao prazo prescricional decorrido até ao acto da renúncia, não podendo impedir os efeitos do ulterior decurso do prazo”. Por outras palavras, a renúncia não é uma renúncia à própria prescrição, mas uma renúncia à prescrição naquele momento. A renúncia não impede o decurso de um novo prazo de prescrição, contado a partir da própria renúncia.

EE.–Assim, ainda que a proposta de acordo de 10 de abril de 2018 fosse um acto de renúncia à prescrição, sempre se teria iniciado nessa data um novo prazo de seis meses de prescrição do direito ao recebimento do preço da ..., que é de seis meses quanto à dívida, contado a partir dessa data. FF. O que significa que, seis meses decorridos sobre a “renúncia”, a 10 de outubro de 2018, renasceu o direito da Recorrida ... a invocar a prescrição. Até essa data, não foi intentada qualquer acção, nem existiu uma nova declaração de “renúncia”, pelo que esse novo prazo de prescrição não se interrompeu. O direito a invocar a prescrição constituiu-se, de novo, na esfera da ... pelo decurso desses seis meses. De uma forma, ou de outra, a ... invocou licitamente a prescrição.

GG.–Por outro lado, o Tribunal a quo desconsiderou o facto de a ... ter conhecimento de que a ... não renunciaria à prescrição: o Presidente do Conselho de Administração da Autora, Dr. Rui Rebelo, em email datado de 25 de Outubro de 2019 em refere “… A ... não está a pôr em questão quaisquer análises no que diz respeito a perspectiva fiscal ou jurídica…”.

HH.–Confessando expressamente que admitia a invocação da prescrição do direito ao recebimento do valor em dívida.

II.–Documento, esse, que traduz uma confissão, por quem tinha legitimidade, inequívoca e com força probatória plena, conforme disposições conjugadas dos artigos 352º, 353º, 357º e 358º do Código Civil (CC).

JJ.–A prescrição foi também invocada sem qualquer abuso. Este argumento é, de certo modo, subsidiário, pois só cá se chega caso não tenham procedido os anteriores.

KK.–Nesse registo subsidiário, a tese Tribunal a quo implica, de certo modo, que o reconhecimento do direito e a renúncia à prescrição seriam realidades cristalizadas, imutáveis, que só se alterariam se a ... apresentasse uma declaração em sentido contrário. Enquanto não o fizesse, a dívida permanecia incaducável e imprescritível.

LL.–Sucede que não é assim. Não reconhecendo que tenha existido reconhecimento do direito, ou renúncia à prescrição, já vimos que um e outra não destroem a possibilidade de invocar a prescrição ou caducidade. O credor continua a poder dispor de ambas, que se renovam com o decurso de novo prazo. Como vimos, esse prazo decorreu, e a ... actuou licitamente, independentemente da interpretação efetuada quanto ao reconhecimento do direito ou a renúncia à prescrição.

MM.–Os direitos exercidos pela ... têm efeitos poderosos, mas têm-nos por escolha do legislador. Reconhecer no caso um abuso de direito seria inverter o comando da Lei dos Serviços Essenciais. Ao condenar a ... no pagamento integral da dívida, o Tribunal a quo premiou o prestador de serviços essenciais pela sua inércia judicial (pois recebe o pagamento de uma dívida antiga e avultada com igualmente avultados juros), castigando o consumidor ... com o pagamento de um valor cuja acumulação a lei quis prevenir.

NN.–Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo interpretou e aplicou incorrectamente os artigos 10.º, n.º 1 e n.º 4 da Lei dos Serviços Essenciais e, bem assim, os artigos 298 n.º 1 e 2, artigo 301º, 302º, 303º, 304º, artigo 331.º n.º 2, 352º, 353º, 357º e 358º do Código Civil e o artigo 607 n.º 4 e 5 do Código de Processo Civil.

OO.–Para o juízo quanto ao abuso, é relevante que a própria ... tenha declarado a dívida incobrável junto da AT, obrigando a ... a devolver o IVA associado às faturas. Não só essa declaração é inconsistente com a interrupção da caducidade e renúncia à prescrição invocadas pela ..., como a devolução do IVA é mais um incentivo à lícita invocação da prescrição. Se não invocasse a prescrição, a ... ver-se-ia obrigada a suportar IVA em excesso quanto à dívida de electricidade, o que só demonstra a importância do efeito estabilizador da prescrição e caducidade consagradas pela Lei dos Serviços Essenciais.

PP.–Ao adiar a colocação da ação, sem dispensar os juros, a ... viu-se beneficiada por uma letargia que lhe é imputável, e da qual resulta um sacrifício excessivo e lesivo para a .... QQ. Para a Lei dos Serviços Essenciais, o abuso não está em invocar a caducidade e prescrição da dívida. O abuso está em ser obrigado a suportá-la.

RR.–A lei apenas impede o exercício de um direito por esse motivo quando se excedam manifestamente os limites da boa-fé.

SS.–A ... nunca afirmou que se absteria de invocar a prescrição, e sobretudo, fá-lo em consequência da comunicação unilateral, por parte da Autora à AT, da incobrabilidade das facturas e devolução do IVA a que foi obrigada.

TT.–Há um reconhecimento da prescrição por parte da ..., que acaba por determinar a invocação por parte da ....

UU.–Por outro lado, a ... nunca impediu, através da sua conduta, que a ... exercesse os seus direitos em Tribunal, e assim suspendesse o prazo de prescrição.

VV.–Foi a própria ..., conforme consta da prova documental e alegado supra, quem reconheceu a prescrição.

WW.–E vem nestes autos, invocar a má fé da ..., por se prevalecer da prescrição, um direito que lhe assiste e reconhecido unilateralmente pela ....

XX.–Ainda que exista abuso de direito, sempre se dirá que a ... abusa do seu direito numa outra modalidade: o desequilíbrio no exercício do direito e os efeitos dele derivados.

YY.–Ao adiar a acção judicial, não dispensando os juros, a ... deu azo a uma situação em que se viu desproporcionalmente beneficiada por uma situação a que ela própria deu origem e cujo sacrifício imposto à ... é, manifestamente, excessivo e lesivo.

ZZ.–A posição jurídica da ... é indevidamente obtida. Nada impedia que a ... tivesse, em tempo, intentado a presente acção e evitado o avolumar de dívida e juros em que a ... se viu agora condenada.

AAA.–As negociações iniciaram em janeiro de 2014 e terminaram com uma tentativa de acordo de pagamento em 10 de abril de 2018.

BBB.–E naturalmente, dir-se-á como não se pode deixar de dizer, que a Autora ao não agir judicialmente para a cobrança do direito de crédito determinou o acumular de dívida da ... até 2018.

CCC.–Até que a 05 março de 2020, a Autora demandou a Ré ... peticionando facturas entre 30 de novembro de 2011 e fevereiro de 2018.

DDD.–Se em março de 2020 propõe acção judicial de cobrança, forçoso é concluir, por maioria de razão, em primeiro lugar, e por toda a prova documental produzida nos autos, em segundo, que o poderia ter feito muito antes.

EEE.–A ... vê-se condenada num montante de dívida e juros, resultante de facturas comunicadas à Autoridade Tributária pela ... como incobráveis por prescritas e cuja prescrição foi reconhecida pelo Exmo. Sr. Presidente do Conselho de Administração da Autora ..., em e-mail de 25 de Outubro de 2019, junto sob doc n.º2 da contestação.

FFF.–A Comunicação de incobrabilidade foi feita pela Autora ..., de forma unilateral e ao arrepio de qualquer informação prestada à Ré ..., durante os anos em que se arrastaram as negociações e aumento da dívida.

GGG.–Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo interpretou e aplicou incorrectamente os artigos 334º, 352º, 353º, 355º, 357º e 358º do Código Civil.

A apelada contra-alegou, pugnando pela confirmação da sentença recorrida, formulando as seguintes conclusões:

1.–Por sentença proferida nos presentes autos, determinou o Tribunal a quo a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 243.877,78 à Autora.

2.–A Ré considera que tal sentença se encontra viciada por erro de julgamento.

3.–É manifestamente carecida de sentido e de fundamento o recurso a que ora se responde.

4.–Não existe qualquer fundamento para a alteração da matéria de facto.

5.–A Ré reconheceu a existência da dívida à Autora, tendo apresentado vários acordos de pagamento.

6.–A Ré, com o reconhecimento da existência da dívida à Autora ora Recorrido, renunciou tacitamente à invocação da prescrição, nos termos do n.º 1 e 2 do art.º 302.º do Código Civil.

7.–Deste modo, a dívida da Ré à Autora não se encontrava prescrita.

8.–Com o reconhecimento da dívida por parte da Ré à Autora ocorreu o impedimento do decurso do prazo de caducidade, previsto no n.º 2 do art.º 331.º do Código Civil.

9.–Age a Ré em claro abuso de direito por, na modalidade de venire contra factum proprium, quando invoca a prescrição da dívida, pois o arrastamento da situação foi por si causado, conforme aliás a Ré confessou.

10.–Assim, não pode a Ré pugnar pela não verificação dos pressupostos de que o Tribunal a quo se socorreu.

11.–Antes pelo contrário, resulta à saciedade dos presentes autos que o Tribunal a quo decidiu de forma correcta e de acordo com a confissão da Ré e da prova produzida.

2.–FUNDAMENTAÇÃO.

A)–OS FACTOS.

O Tribunal a quo julgou:

A.1.–Provados os seguintes factos:

2.1.1.-A A. é uma sociedade que se dedica à produção, transporte e distribuição de energia elétrica.

2.1.2.-No âmbito da sua atividade, a A. celebrou no dia 15 de Setembro de 2005 com a R. um contrato de fornecimento de energia elétrica, nos termos do documento junto como nº 1 da p.i. (fls. 12), cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

2.1.3.-Através do referido contrato, a R. contratou à A. o fornecimento de energia elétrica para a instalação de 5ª categoria com a potência de 80 KW de alimentação trifásica destinada a usos gerais não-domésticos na morada do Caniço, Rua …, Santa Cruz.

2.1.4.-Em cumprimento ao referido contrato, a A. forneceu energia elétrica à R. a pedido e solicitação da mesma.

2.1.5.-Por referência a fornecimento de energia elétrica, a A. emitiu em nome da R., que aceitou, entre outras, as seguintes faturas juntas a fls. 13 a 58 (documentos n.sº 2 a 47 da p.i.) cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido:

- Fatura n.º 106009274777 no valor de Euros 3.453,58 vencida em 30 de Novembro de 2011 (documento n.º 2); - Fatura n.º 106009422631 no valor de Euros 3.831,26 vencida em 30 de Dezembro de 2011 (documento n.º 3); - Fatura n.º 106009701807 no valor de Euros 3.890,36 vencida em 15 de Janeiro de 2012 (documento n.º 4); - Fatura n.º 106010122961 no valor de Euros 4.030,95 vencida em 30 de Maio de 2012 (documento n.º 5); - Fatura n.º 106010404040 no valor de Euros 3.769,90 vencida em 30 de Julho de 2012 (documento n.º 6); - Fatura n.º 106010558461 no valor de Euros 3.563,14 vencida em 30 de Agosto de 2012 (documento n.º 7); - Fatura n.º 106010706365 no valor de Euros 3.732,30 vencida em 1 de Outubro de 2012 (documento n.º 8); - Fatura n.º 106010845804 no valor de Euros 3.744,25 vencida em 30 de Outubro de 2012 (documento n.º 9); - Fatura n.º 106010992832 no valor de Euros 3.570,49 vencida em 30 de Novembro de 2012 (documento n.º 10); - Fatura n.º 106011123906 no valor de Euros 3.600,18 vencida em 31 de Dezembro de 2012 (documento n.º 11); - Fatura n.º 106011246459 no valor de Euros 3.579,87 vencida em 30 de Janeiro de 2013 (documento n.º 12); - Fatura n.º 106011385327 no valor de Euros 3.597,56 vencida em 28 de Fevereiro de 2013 (documento n.º 13); - Fatura n.º 106011548476 no valor de Euros 3.406,37 vencida em 1 de Abril de 2013 (documento n.º 14); - Fatura n.º 106011805451 no valor de Euros 3.296,95 vencida em 31 de Maio de 2013 (documento n.º 15); - Fatura n.º 106011948932 no valor de Euros 2.932,89 vencida em 2 de Julho de 2013 (documento n.º 16); - Fatura n.º 106012093031 no valor de Euros 3.045,14 vencida em 30 de Julho de 2013 (documento n.º 17); - Fatura n.º 106012219116 no valor de Euros 2.948,41 vencida em 30 de Agosto de 2013 (documento n.º 18); - Fatura n.º 106012349183 no valor de Euros 3.039,03 vencida em 30 de Setembro de 2013 (documento n.º 19); - Fatura n.º 106012501545 no valor de Euros 3.068,39 vencida em 30 de Outubro de 2013 (documento n.º 20); - Fatura n.º 106012630684 no valor de Euros 3.963,57 vencida em 2 de Dezembro de 2013 (documento n.º 21); - Fatura n.º 10612767899 no valor de Euros 5.189,93 vencida em 30 de Dezembro de 2013 (documento n.º 22); - Fatura n.º 106013478809 no valor de Euros 8.081,42 vencida em 30 de Maio de 2014 (documento n.º 23); - Fatura n.º 106013745542 no valor de Euros 4.716,58 vencida em 30 de Julho de 2014 (documento n.º 24); - Fatura n.º 106013877095 no valor de Euros 4.578,90 vencida em 1 de Setembro de 2014 (documento n.º 25); - Fatura n.º 106014031252 no valor de Euros 4.682,40 vencida em 30 de Setembro de 2014 (documento n.º 26); - Fatura n.º 106016952677 no valor de Euros 3.269,22 vencida em 30 de Junho de 2016 (documento n.º 27); - Fatura n.º 106017081780 no valor de Euros 3.354,92 vencida em 1 de Agosto de 2016 (documento n.º 28); - Fatura n.º 106017225852 no valor de Euros 3.207,10 vencida em 30 de Agosto de 2016 (documento n.º 29); - Fatura n.º 106017369609 no valor de Euros 3.155,17 vencida em 30 de Setembro de 2016 (documento n.º 30); - Fatura n.º 106017504372 no valor de Euros 3.088,95 vencida em 31 de Outubro de 2016 (documento n.º 31); - Fatura n.º 106017654349 no valor de Euros 2.803,32 vencida em 30 de Novembro de 2016 (documento n.º 32); - Fatura n.º 106017778206 no valor de Euros 2.957,88 vencida em 30 de Dezembro de 2016 (documento n.º 33); - Fatura n.º 106017927068 no valor de Euros 2.994,02 vencida em 30 de Janeiro de 2017 (documento n.º 34); - Fatura n.º 106018083704 no valor de Euros 5.123,53 vencida em 28 de Fevereiro de 2017 (documento n.º 35); - Fatura n.º 106018218823 no valor de Euros 5.645,54 vencida em 30 de Março de 2017 (documento n.º 36); - Fatura n.º 106018429032 no valor de Euros 4.986,82 vencida em 2 de Maio de 2017 (documento n.º 37); - Fatura n.º 106018530372 no valor de Euros 5.374,44 vencida em 30 de Maio de 2017 (documento n.º 38); - Fatura n.º 106018645677 no valor de Euros 4.957,72 vencida em 30 de Junho de 2017 (documento n.º 39); - Fatura n.º 106018783154 no valor de Euros 5.020,95 vencida em 31 de Julho de 2017 (documento n.º 40); - Fatura n.º 106018935537 no valor de Euros 4.722,22 vencida em 30 de Agosto de 2017 (documento n.º 41); - Fatura n.º 106019056307 no valor de Euros 5.081,97 vencida em 2 de Outubro de 2017 (documento n.º 42); - Fatura n.º 106019200834 no valor de Euros 5.395,19 vencida em 30 de Outubro de 2017 (documento n.º 43); - Fatura n.º 106019341786 no valor de Euros 4.192,19 vencida em 30 de Novembro de 2017 (documento n.º 44); - Fatura n.º 106019477739 no valor de Euros 4.342,47 vencida em 2 de Janeiro de 2018 (documento n.º 45); - Fatura n.º 106019624215 no valor de Euros 4.933,16 vencida em 30 de Janeiro de 2018 (documento n.º 46); e - Fatura n.º 106019778504 no valor de Euros 5.305,89 vencida em 28 de Fevereiro de 2018 (documento n.º 47).

2.1.6.-Por conta dessas faturas a R. apenas procedeu ao pagamento dos seguintes valores: - Euros 1.299,61 por referência à Fatura n.º 106009701807 (documento n.º 4); e - Euros 3.882,47 por referência à Fatura n.º 106010122961 (documento n.º 5).

2.1.7.-A A. prestou ainda à R., a solicitação desta, serviços de instalação e reforço de ligações de baixa tensão, a que correspondem as seguintes faturas: - Fatura n.º 120015737 no valor de Euros 44,60 vencida em 5 de Setembro de 2017; e - Fatura n.º 120015738 no valor de Euros 2.969,31 vencida em 5 de Setembro de 2017.

2.1.8.-O valor total das faturas vencidas e não pagas ascende a Euros 185.058,32 (cento e oitenta e cinco mil e cinquenta e oito euros e trinta e dois cêntimos).

2.1.9.-A A. interpelou insistentemente a R. para proceder ao pagamento dos valores em dívida. 2.1.10.- Em 07 de janeiro de 2014, após negociações entre a A. e o R., a A. manifestou-se disponível para aceitar o pagamento em prestações do valor então em dívida, nos seguintes moldes: - pagamento de 10% “up front” sobre o valor da dívida;

- celebração de um “acordo de pagamento” para o restante valor em dívida, em 36 prestações mensais e consecutivas, (com juros de 4%); - pagamento pontual das faturas entretanto vincendas. 2.1.11.-A ré aceitou fazer este acordo de pagamento nos moldes propostos pela autora.

2.1.12.-Em 09 de abril de 2014, a ré, através do seu mandatário judicial, Dr. Tiago …, apresentou uma proposta de regularização da dívida vencida, conforme documento nº 51 junto com a p.i. (fls. 66 vº), cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

2.1.13.-Proposta essa que a A. aceitou.

2.1.14.-Tais acordos para regularização da dívida não foram cumpridos pela R.

2.1.15.-Em 06 de outubro de 2014, o legal representante da ré enviou à autora um email onde, para além do mais, refere lamentar ainda não ter conseguido encontrar um uma solução sustentável para regularizar as dívidas à autora, estando disponível para encontrar uma solução e agradecendo a compreensão, conforme documento nº 52 da p.i. (fls. 67 vº), cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

2.1.16.-Em 06 de junho de 2016, na sequência de mais uma insistência da A., o legal representante da R. enviou novo email dirigido à A., conforme documento nº 53 da p.i (fls. 69), cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, onde refere, para além do mais, “nem tenho palavras para te responder e comentar a situação (…). Entretanto vamos ver se conseguimos ir pagando os meses em atraso (…). Durante esta semana vamos analisar a posição e apresentaremos uma proposta de regularização”.

2.1.17.-Em setembro de 2017, a A. insistiu novamente com a ré para a celebração de um acordo de pagamento da dívida e enviou uma nova proposta para o efeito.

2.1.18.-Em 27 de fevereiro de 2018, a R., através do seu sócio-gerente, enviou um email para a R., junto aos autos como documento nº 55 da p.i., cujo teor se dá aqui por reproduzido, onde expressamente refere, para além do mais, que no próximo dia 05 de março, a ré irá fazer uma transferência para a A., no montante de €7.284,84, para pagamento das duas faturas referentes ao ano de 2011.

2.1.19.-No mesmo documento enviado à A. refere que “(…) vamos trabalhar na apresentação de um plano de pagamento, durante o mês de março.

2.1.20.-Em 10 de abril de 2018, a R., através do seu sócio-gerente, endereçou à A. um email, acompanhado de um anexo, que denominou de “Proposta de Regularização .../...”, onde se refere que a dívida consolidada é de €182.044,41 e propõe à A. que a mesma seja paga em 64 meses, com os pagamentos iniciais em julho de 2018, mas recuperando na 1ª prestação os valores das prestações de maio e junho.

2.1.21.-Em 27 de abril de 2018, a autora aceitou expressamente o acordo proposto pela R., incluindo o pagamento faseado do valor proposto pela R. (€182.044,41), a pagar em 62 prestações mensais. 2.1.22.-Sendo que a diferença das 64 prestações oferecidas na proposta de acordo elaborada pela R. e as 62 prestações aceites pela A. radica apenas na circunstância proposta pela própria R. de que a 1ª prestação a liquidar em julho englobaria as prestações de maio e junho.

2.1.23.-Apesar de diversas vezes interpelada para o efeito, a ré não devolveu assinado o acordo de pagamento que ela própria propusera à A. e que esta expressamente aceitou.

2.1.24.-A A. confiou nas reiteradas manifestações de vontade apresentada pela R. e assumiu que a R. iria honrar os seus compromissos e pagar a respetiva dívida na totalidade.

2.1.25.-Para além dos pagamentos acima referidos em 2.1.6. a R. nada mais pagou à A. referente às faturas juntas aos autos a fls. 13 a 58 e 79 a 81.

2.1.26.-Em 06 de novembro de 2019 a R., pela primeira vez, comunicou à A. que invocava a prescrição da dívida.

2.1.27.-Nessa mesma comunicação a R. refere que, sem prejuízo da invocada prescrição, está disponível para celebrar um acordo de pagamento das faturas em dívida, com exceção das que se venceram em 2011, 2012, 2013 e 2014.

A. 2.–Não provados os seguintes factos:

2.2.1.-Nunca a R. pretendeu assumir o valor total da dívida, tendo sempre deixado claro que tencionava invocar a prescrição, caso a A. a tanto obrigasse.

2.2.2.-Toda a correspondência foi trocada num plano negocial e nunca representou por parte da R. a renúncia à invocação da prescrição da obrigação do pagamento dos valores peticionados.

B)–O DIREITO APLICÁVEL.

O conhecimento deste Tribunal de 2.ª instância, quanto à matéria dos autos e quanto ao objecto do recurso, é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente como, aliás, dispõem os art.ºs 635.º, n.º 2 e 639.º 1 e 2 do C. P. Civil, sem prejuízo do disposto no art.º 608.º, n.º 2 do C. P. Civil (questões cujo conhecimento fique prejudicado pela solução dada a outras e questões de conhecimento oficioso).

Atentas as conclusões da apelação, acima descritas, as questões submetidas ao conhecimento deste Tribunal pela apelante consistem em saber se a) a decisão em matéria de facto deve ser alterada declarando-se não provados aos números 2.1.21., 2.1.22., 2.1.23., 2.1.24, 2.1.26. e 2.1.27. aditando-se à matéria de facto declarada provada o conteúdo dos e-mails trocados pelas partes, designadamente nas seguintes passagens: “…Estamos a analisar toda a Conta Corrente e o IVA pago de algumas facturas para acertarmos e apurarmos devidamente os valores em divida.”; “Caro amigo Rui, Para teu conhecimento. Gostaria de propor uma reunião, antes de assinarmos o Plano de pagamentos, para detalharmos algumas situações. Abraço, José …”; “…Foram estes pedidos e de r...bolso do IVA das facturas que obrigaram a nos precaver, juridicamente, das posições assumidas, unilateralmente pela ....”; “Caro Paulo …, A ... não está a por em questão quaisquer análises no que concerne a perspectiva fiscal ou jurídica.” (conclusão I), b) a ação não foi intentada no prazo legal, tendo o Tribunal a quo interpretado incorretamente o artigo 10.º, n.º 4 da Lei dos Serviços Essenciais e o artigo 331.º n.º 2 do Código Civil, devendo ser declarada procedente a exceção peremptória da caducidade do direito de ação (conclusões J) a U)), c) o direito da apelada prescreveu, não tendo havido renúncia à prescrição (conclusões J) e V) a JJ)), d) não configura abuso de direito fazer acordo de pagamento, não o cumprir e invocar a prescrição do direito de crédito correspondente (conclusões JJ) a GGG)).

Vejamos.

1: Quanto à primeira questão, a saber, se a decisão em matéria de facto deve ser alterada declarando-se não provados aos números 2.1.21., 2.1.22., 2.1.23., 2.1.24, 2.1.26. e 2.1.27. aditando-se à matéria de facto declarada provada o conteúdo dos e-mails trocados pelas partes, designadamente nas seguintes passagens: “…Estamos a analisar toda a Conta Corrente e o IVA pago de algumas facturas para acertarmos e apurarmos devidamente os valores em divida.”; “Caro amigo Rui, Para teu conhecimento. Gostaria de propor uma reunião, antes de assinarmos o Plano de pagamentos, para detalharmos algumas situações. Abraço, José …”; “…Foram estes pedidos e de r...bolso do IVA das facturas que obrigaram a nos precaver, juridicamente, das posições assumidas, unilateralmente pela ....”; “Caro Paulo …, A ... não está a por em questão quaisquer análises no que concerne a perspectiva fiscal ou jurídica.”.

Do confronto do conteúdo da conclusão I), com o texto das alegações, que se torna necessário para uma compreensão mínima das expressões que se pretende sejam aditadas, numa primeira abordagem somos levados a concluir que a pretensão da apelante se traduz numa inversão da decisão recorrida no que respeita aos factos sob os números 2.1.21 a 2.1.24, 2.1.26. e 2.1.27, que pretende se declarem não provados, com os factos sob os números 2.2.1. e 2.2.2., que pretende se declarem não provados.

Todavia, a apelante não expõe, ela mesma, essa pretensão, antes a concretizando sob a expressão “…devem ser expurgados da matéria de facto dada como provada, os juízos conclusivos quanto à renúncia à prescrição a que correspondem aos pontos 2.1.21., 2.1.22., 2.1.23., 2.1.24, 2.1.26. e 2.1.27….”, de cuja interpretação podemos razoavelmente concluir que a apelante entende que tais factos declarados provados têm “juízos conclusivos”.

Os factos sob os números 2.2.1 e 2.2.2., declarados não provados, têm o seguinte conteúdo:

2.2.1.- Nunca a R. pretendeu assumir o valor total da dívida, tendo sempre deixado claro que tencionava invocar a prescrição, caso a A. a tanto obrigasse.

2.2.2.- Toda a correspondência foi trocada num plano negocial e nunca representou por parte da R. a renúncia à invocação da prescrição da obrigação do pagamento dos valores peticionados”.

Por sua vez os factos sob os números 2.1.21 a 2.1.24, 2.1.26. e 2.1.27 têm o seguinte conteúdo:

2.1.21.- Em 27 de abril de 2018, a autora aceitou expressamente o acordo proposto pela R., incluindo o pagamento faseado do valor proposto pela R. (€182.044,41), a pagar em 62 prestações mensais.

2.1.22.- Sendo que a diferença das 64 prestações oferecidas na proposta de acordo elaborada pela R. e as 62 prestações aceites pela A. radica apenas na circunstância proposta pela própria R. de que a 1ª prestação a liquidar em julho englobaria as prestações de maio e junho.

2.1.23.- Apesar de diversas vezes interpelada para o efeito, a ré não devolveu assinado o acordo de pagamento que ela própria propusera à A. e que esta expressamente aceitou.

2.1.24.- A A. confiou nas reiteradas manifestações de vontade apresentada pela R. e assumiu que a R. iria honrar os seus compromissos e pagar a respetiva dívida na totalidade.

2.1.26.- Em 06 de novembro de 2019 a R., pela primeira vez, comunicou à A. que invocava a prescrição da dívida.

2.1.27.- Nessa mesma comunicação a R. refere que, sem prejuízo da invocada prescrição, está disponível para celebrar um acordo de pagamento das faturas em dívida, com exceção das que se venceram em 2011, 2012, 2013 e 2014”.

Cotejando os primeiros (2.2.1. e 2.2.2.) com os segundos (2.1.21 a 2.1.24, 2.1.26. e 2.1.27) podemos desde logo concluir que a qualificação de “juízos conclusivos” se aplicará aos primeiros e não aos segundos, como se deduz das expressões deles constantes:

- Nunca a R. pretendeu assumir o valor total da dívida;

- tendo sempre deixado claro que tencionava invocar a prescrição

-  caso a A. a tanto obrigasse;

- Toda a correspondência foi trocada num plano negocial;

- e nunca representou por parte da R. a renúncia à invocação da prescrição da obrigação do pagamento dos valores peticionados.

Mas, mais do que a natureza conclusiva, aliás, não demonstrada, dos factos sob os números 2.1.21 a 2.1.24, 2.1.26. e 2.1.27, o que na apelação está realmente em causa é a impugnação da decisão recorrida no que respeita à decisão em matéria de facto, sendo certo que esta impugnação deve obedecer ao disposto nos art.ºs 662.º, n.º 1 e 640.º, n.º 1, do C. P. Civil.

Ora, discordando a apelante dessa decisão, como discorda, o certo é que não demonstra que devesse ser outra a decisão desta Relação e qual, apontando claramente “… a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas” e “Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”, como dispõem, respetivamente, as alíneas c) e b), do n.º 1, do art.º 640.º, do C. P. Civil.

A apelante não deu cumprimento ao disposto em tais preceitos processuais afigurando-se-nos até que, na realidade dos autos o não poderia fazer por duas razões ponderosas.

A primeira porque aceitou os factos articulados pela A como o tribunal a quo exarou na motivação da sua decisão, “Acresce que a própria ré aceitou expressamente, como verdadeiros, todos os factos vertidos na petição inicial pela Autora, exarados nos artigos 1 a 28 de tal articulado (cfr. art.º 9º da contestação). “.

O art.º 9.º da contestação da apelante tem o seguinte conteúdo: “A ... considera, porém, que pese embora os factos vertidos nos art.ºs 1º a 28º da petição inicial sejam verdadeiros, vão os mesmos impugnados por entender que não podem produzir o efeito jurídico de que o autor se pretende prevalecer”.

O n.º 2, do art.º 571.º, do C. P. Civil, permite esta forma de impugnação ao dispor que “O réu defende-se por impugnação quando contradiz os factos articulados na petição ou quando afirma que esses factos não podem produzir o efeito jurídico pretendido pelo autor”.

Não obstante, sendo certo que “A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita”, como dispõe o n.º 2, do art.º 342.º, do C. Civil, e “Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado”, como dispõe o n.º 1 do mesmo preceito, o artigo 9.º da contestação só pode ser interpretado, em relação aos factos articulados sob os art.ºs 1.º a 28.º da petição como confessando que os mesmo são verdadeiros, independentemente do seu efeito jurídico, a delimitar na altura própria, aquando da aplicação do direito à matéria de facto declarada provada.

A segunda porque, apesar da confissão desses factos pela apelada, ainda assim, o tribunal a quo não deixou de quanto a eles fundamentar/motivar a sua decisão em matéria de facto, de forma profusa, como resulta do excerto que passamos a transcrever:

Analisando-se o conteúdo de todos os documentos juntos aos autos, nomeadamente os que constam de fls. 12 (contrato de fornecimento de energia elétrica), fls. 13 a 58 e 79 a 81 (faturas), 64 a 76 (toda a correspondência trocada ao longo de vários anos entre a Autora e a Ré). Analisou-se também o conteúdo da correspondência trocada entre a Autora e a Ré, datada de 25 de outubro de 2019 (fls. 90 dos autos), 6 de novembro de 2019 (fls. 88v, 89 e 89v), 9 de março de 2020 (fls. 88vº) e 9 de março de 2020 (fls. 87vº). Teve-se também em conta o depoimento e declarações de parte prestados pelo sócio gerente da Ré, que não nos pareceram credíveis, na parte em que refere ter estado sempre subjacente às negociações estabelecidas pelas partes, a possibilidade de a ré invocar a prescrição, por tal afirmação ser claramente contraditória com o teor das comunicações escritas pelo próprio declarante, na qualidade de legal representante da Ré, e endereçadas à Autora. Toda a correspondência junta aos autos, trocada entre a Autora e a Ré desde 2014 a finais de 2019 é absolutamente coincidente no sentido de que a Ré nunca invocou a prescrição e só o fez em 06 de novembro de 2019. Teve-se também em conta os depoimentos das testemunhas arroladas pelas partes, que, no geral, ou nada acrescentaram ao conteúdo dos documentos juntos aos autos”.

Em face desta motivação, que a apelante não questiona, apesar de se reportar ao “conteúdo dos e-mails trocados pelas partes”, não podemos deixar de concluir que, sem prejuízo da apreciação ulterior relativa ao efeito jurídico que lhe deve ser associado, a apelante não habilitou esta Relação a questionar o acerto da decisão recorrida em matéria de facto e muito menos a alterá-la, quer no que respeita aos números 2.1.21 a 2.1.24, 2.1.26. e 2.1.27, quer no que respeita ao aditamento das enigmáticas expressões acima referidas.

Improcede, pois, a apelação quanto a esta primeira questão.

2.–Quanto à segunda questão, a saber, se a ação não foi intentada no prazo legal, tendo o Tribunal a quo interpretado incorretamente o artigo 10.º, n.º 4 da Lei dos Serviços Essenciais e o artigo 331.º n.º 2 do Código Civil, devendo ser declarada procedente a exceção peremptória da caducidade do direito de ação.

Dispõe o n.º 4, do art.º 10.º, da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho (Lei dos Serviços Públicos Essenciais), sob a epígrafe “Prescrição e caducidade”, que “O prazo para a propositura da acção ou da injunção pelo prestador de serviços é de seis meses, contados após a prestação do serviço ou do pagamento inicial, consoante os casos”.

Esta ação deu entrada em tribunal a 5 de março de 2020 e reporta-se a fornecimentos de eletricidade entre 2011e 20018 pelo que na data da sua entrada há muito se esgotara o prazo de caducidade de seis meses estabelecido em tal preceito.

Ao conhecer da correspondente exceção peremptória, aduziu o tribunal a quo que a mesma não ocorreu porque a apelante reconheceu o direito da apelada, o que constitui causa impeditiva da caducidade, prevista no n.º 2, do art.º 331.º, do C. Civil, julgando improcedente a exceção.

Esse reconhecimento do direito da apelada decorre dos factos constantes sob os números 2.1.6. a 2. 1.20, nos termos da qual a apelada pagou parte do preço, negociou com a apelada para pagamento do preço em dívida, fez acordo, não o cumpriu, entrou em novo acordo, o que, tudo junto, à profusão e sem tergiversações, atento o disposto na segunda parte, do n.º 1, do art.º 217.º, do C. Civil, quanto ao valor da declaração negocial tácita, só pode ser interpretado como reconhecimento do direito da apelada a receber o preço do serviço/produto fornecido.

É certo que em 6 de novembro de 2019 a apelada não só não pagou, como vinha prometendo, como invocou a prescrição da dívida ou de parte da dívida, mas o reconhecimento do direito, incluindo a sua componente coerciva judicial, tinha ocorrido até essa data, tendo a ação dado entrada dentro dos seis meses subsequentes.

Tanto nos basta para concluir que o direito de ação da apelada não caducou por interferência da causa impeditiva reconhecimento do direito, prevista no n.º 2, do art.º 331.º, do C. Civil.

Improcede, pois, esta segunda questão.

3.–Quanto à terceira questão, a saber se o direito da apelada prescreveu, não tendo havido renúncia à prescrição.

Para além do prazo de caducidade do direto de ação, já referido, o n.º 1, do art.º 10.º, da Lei n.º 23/96, estabelece um prazo de prescrição extintiva, também de seis meses, a contar da prestação, para o próprio direito ao recebimento do preço do serviço prestado[1].

O tribunal a quo julgou, todavia, improcedente esta exceção peremptória com fundamento na renúncia da apelante, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2, do art.º 302.º, do C. Civil, consubstanciada nos sucessivos atos da apelada constantes sob os números 2.1.6. a 2.1.20, pagando parte do preço, negociando com a apelada para pagamento do preço em dívida, fazendo acordo, não o cumprindo, entrando em novo acordo, citando em abono da sua decisão, o acórdão da Relação de Coimbra, de 9/5/2017, no processo n.º 462/15.1T8VIS.C1, publicado in dgsi.pt.

Para o efeito, aduz o tribunal a quo que:

São vários os factos considerados como provados que inculcam com segurança que durante cerca de oito anos, a R. sempre fez crer à A. que assumia o dever jurídico de pagar todas as faturas em atraso desde finais de 2011 É pois manifesto que o descrito comportamento da R. ao longo desses anos implica que a mesma renunciou tacitamente ao direito de invocar a prescrição… Esse reconhecimento da dívida e manifestação tácita da renúncia a invocar em juízo a prescrição estende-se até 06 de novembro de 2019, pois só nesta data, pela primeira vez e ao arrepio total das promessas feitas de pagamento total da dívida, a R. informa a A. de que considera a mesma prescrita…

Nos termos e fundamentos do Assento n.º 11/94, publicado no Diário da República, I Série, 14 de julho de 1994, aliás citado pela apelante, atento o disposto no art.º 300.º, do C. Civil, “A renúncia da prescrição permitida pelo artigo 302.º do Código Civil só produz efeitos em relação ao prazo prescricional decorrido até ao acto de renúncia, não podendo impedir os efeitos do ulterior decurso de novo prazo”.

A renúncia da apelante à prescrição, que se foi reiterando ao logo de oito anos relativamente aos sucessivos prazos de prescrição decorridos, não impediu que, com a inflexão do sentido negocial até aí seguido, ocorrida em 6 de novembro de 2019, se iniciasse um novo prazo de prescrição de seis meses, o qual se interrompeu com a propositura da ação, nos termos do disposto no n.º 1, do art.º 323.º, do C. Civil.

Não vislumbramos, pois, que se possa afirmar, sustentadamente, que os sucessivos atos da apelante não consubstanciam renúncia à prescrição estabelecida pelo n.º 1, do art.º 10.º, da Lei n.º 23/96.

Improcede, pois, também esta terceira questão.

4.–Quanto à quarta questão, a saber, se não configura abuso de direito fazer acordo de pagamento, não o cumprir e invocar a prescrição do direito de crédito correspondente.

O tribunal a quo faz apelo na sentença, a título subsidiário de procedência da ação, à figura do abuso de direito para qualificar a contradição entre a ação da apelante ao logo de oito anos e a invocação da prescrição a 6 de novembro de 2019.

Atento o antes decidido relativamente às exceções da caducidade e prescrição, o conhecimento desta questão encontra-se prejudicada, por inútil, nos termos do disposto no n.º 2, do art.º 608.º, do C. P. Civil, uma vez que nem o tribunal a quo fundamentou a decisão de procedência da ação nesse instituto, referindo-se-lhe apenas a talhe de foice, nem a apelada poderia exceder os limites do seu direito, de invocar a prescrição, porque não tinha esse mesmo direito na sua titularidade, como demonstrámos na abordagem das questões anteriores.

Por todo o exposto a apelação não poderá deixar de improceder.

C)– SUMÁRIO

1. Atento o disposto na segunda parte, do n.º 1, do art.º 217.º, do C. Civil, quanto ao valor da declaração negocial tácita, o pagamento de parte do preço de fornecimento de eletricidade, a negociação e o acordo de pagamento, o incumprimento desse acordo, a celebração de novo acordo e o seu incumprimento, devem ser interpretados como reconhecimento do direito ao preço do serviço/produto fornecido, previsto no n.º 2, do art.º 331.º, do C. Civil, constituindo causa impeditiva da caducidade do prazo estabelecido no n.º 4, do art.º 10.º, da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho (Lei dos Serviços Públicos Essenciais).

2. Nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2, do art.º 302.º, do C. Civil, esses mesmos atos configuram renúncia à prescrição do direito ao recebimento do preço do serviço prestado estabelecida pelo n.º 1, do art.º 10.º, da Lei n.º 23/96.

3.–DECISÃO.

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela apelante.

Lisboa,13-01-2022


Orlando Santos Nascimento
Maria José Mouro
José Maria Sousa Pinto



[1]A prescrição prevista no art.º 10.º, n.º 1, da Le i nº. 23/96, de 26 de Julho tem natureza extintiva (Acórdão do STJ de 5/6/2003, publicado in dgsi.pr: Relator: Pires da Rosa).