Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3133/15.5T8CSC.L1-6
Relator: CRISTINA NEVES
Descritores: ACÇÃO DE DIVÓRCIO
FUNDAMENTOS
ABANDONO DO LAR
RUPTURA DEFINITIVA DO CASAMENTO
ALIMENTOS A EX-CONJUGE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/07/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I– Com a alteração introduzida pela Lei 61/2008 de 31/10, no que se reporta aos requisitos do divórcio sem o consentimento do outro cônjuge, o legislador assumiu como princípio o de que ninguém deveria permanecer casado contra a sua vontade, se considerar que houve quebra do laço afectivo, independentemente do requisito da culpa.

II– A invocação da ruptura definitiva da vida em comum é fundamento para o decretamento do divórcio, sem dependência de prazo, sem necessidade de aceitação do outro cônjuge e sem aferição de culpa de qualquer um dos cônjuges.

III– Preenche este requisito, previsto na alínea d) do artº 1781 do C.C. o facto de um dos cônjuges ter abandonado a título definitivo o lar conjugal, passando a residir e trabalhar noutro país, sem intenção de retomar a vivência conjugal, estando inclusive regulado (ainda que provisoriamente) o poder paternal referente a filho menor do casal.

IV– A prestação de alimentos ao ex-cônjuge assume carácter excepcional, incumbindo assim ao requerente dos mesmos, alegar e demonstrar que deles carece e a possibilidade de o obrigado os poder prestar.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.


RELATÓRIO:


A. propôs contra a sua mulher B., acção de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, pedindo seja decretado o divórcio entre o (a) A. e a(o) R., com fundamento na ruptura definitiva do casamento, nos termos do artº 1781º, al. d), do C.Civil., alegando que devido à agressividade da R. teve de deixar o lar conjugal em 13 de Dezembro de 2014, persistindo a R. em persegui-lo inclusive no local de trabalho, insultando-o e agredindo-o na presença de funcionários e colegas, insultando o A. e seus filhos de anterior matrimónio, provocando propositadamente embates entre o seu veículo e o veículo do A., estando por estes motivos comprometida, definitivamente, a vida conjugal entre o A. e a R.
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Citada, a R. apresentou contestação a fls. 88 e segs., negando as actuações que lhe são imputadas pelo A., concluindo pela improcedência do pedido de divórcio.
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Após, procedeu-se à elaboração de despacho saneador, dele constando o seguinte:

Objecto do litígio
Consideram-se já provados por prova documental e acordo os factos constantes dos artigos 1º, 2º, da petição inicial, sendo que o objecto do litígio é a relação matrimonial e a sua eventual ruptura.
Temas de prova
As provas a produzir destinar-se-ão a prova o teor dos factos constantes dos art. 5º (2ª parte) 34º, da p.i. e art. 36º da contestação.”
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A fls. 144 e na sequência de despacho nesse sentido, foi incorporado o pedido de fixação de alimentos provisório deduzido pela R., pedindo a condenação do A. no pagamento de uma pensão de alimentos, a título provisório, em valor não inferior a 2.000,00 Euros mensais, alegando estar desempregada e suportar uma renda mensal elevada, não podendo prover às suas despesas.
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A este pedido, veio o A. deduzir oposição a fls. 183 e seguintes, concluindo pela improcedência do pedido por a ruptura do casamento ser imputável à R. e subsumível a uma situação de violência doméstica perpretada pela requerente de alimentos e, subsidiariamente, caso o Tribunal assim não o entenda, que a ser fixada alguma quantia o seja em valor não superior a 100,00 Euros e pelo período de 6 meses.
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Procedeu-se a audiência de julgamento, tendo afinal o tribunal proferido sentença em 18/04/17 com o seguinte teor:

III- 6. DECISÃO:
Face ao exposto:
a)- Julgo procedente, por provada, a presente acção de divórcio e, em consequência, decreto o divórcio entre A. e B., com a consequente dissolução do casamento celebrado entre ambos no dia 20 de Março de 2014, cessando as relações pessoais e patrimoniais entre os cônjuges, nos termos do artº 1.688º, do C.Civil.
b)- Julgo improcedente, por não provado, o pedido de fixação de alimentos deduzido pela Requerente B. e, em consequência, absolvo o Requerido A. do mesmo.
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Custas pelo A./Requerido e pela R./Requerente, na proporção do respectivo decaimento (artº 527º, nº 1, do C.P.Civil).
Valor processual: o da alçada da Relação acrescido de 0,01 Euros.
Registe e notifique.
Após trânsito, comunique à C.R.Civil.”
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Não conformada com esta decisão, impetrou a recorrente B recurso da mesma, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem:

CONCLUSÕES
I– A recorrente não se conforma com o juízo positivo que foi feito pelo Tribunal a quo acerca dos factos elencados nos pontos 2, 3, 4 e 5 da Fundamentação de Facto (i) Factos Provados, nem com a circunstância de não ter sido dada como provado que a fracção identificada em 17 da Fundamentação de Facto (i) Factos Provados, se encontra hipotecada, a fim de garantir o mútuo contratado para respectiva aquisição e cuja dívida actual se cifra em € 160.000,00 (cento e sessenta mil euros).
II– A sentença recorrida merece censura, quer quanto à matéria de facto, quer quanto ao enquadramento jurídico em que se firma. O Tribunal a quo apreciou e valorou a prova de forma incongruente, ditando errada e injusta decisão de facto - em razão do que a presente apelação tem também por objecto a reapreciação da decisão sobre a matéria de facto - e de direito.
Consequentemente, não pode a Recorrente conformar-se, nem com o julgamento de facto, nem com as soluções jurídicas encontradas pelo Tribunal a quo para a decisão da causa.
III– Da análise crítica da prova produzida nos autos resulta, sem margem para dúvida, que a convicção do Tribunal a quo no que respeita à matéria de facto assenta: numa errada interpretação dos depoimentos prestados, por H.…. e G….., em audiência; numa errada afirmação de que aquelas testemunhas disseram coisas que não disseram; numa errada consideração dos respectivos depoimentos que, salvo opiniões que transmitiram ao Tribunal, se resumiram lhes dissera e ao que o mandatário do A. as levara a dizer; e numa errada valoração do alegado pelo A., uma vez que estamos perante direitos indisponíveis.
IV– Erros que levaram à errada consideração como provados dos pontos ora postos em causa [2, 3, 4 e 5 da Fundamentação de Facto (i) Factos Provados], existindo, por parte do Tribunal a quo, um erro notório de julgamento na apreciação e valoração da prova, causa de erro no julgamento da matéria de facto.
V– Acresce que, considerando os critérios de apreciação da prova, não tendo sido feita prova sobre os factos alegados e que foram levados aos “temas da prova” e tendo o Tribunal a quo considerado que sim, fê-lo incorrer na violação, além do disposto nos arts. 354.º, 341.º e 342.º, n.º 1, do [Código Civil (CC)] e arts. 413.º e 414.º do [Código de Processo Civil (CPC)].
VI– O Tribunal a quo errou no julgamento da matéria de facto, ao inserir na factualidade assente que em Dezembro de 2014 o A. abandonou a casa onde até então residia com a R., que o A. tinha medo da R., que não mais tendo vivido em comunhão de leito, mesa e habitação com a R. e que o A. não pretende reatar a vida conjugal com a R.. e desconsiderar o ónus que incide sobre o bem que diz à R. para vender para subsistir, em clara violação do princípio da aquisição processual.
VII– Os depoimentos prestados por H….. [H….. - que prestou depoimento na audiência de 15 de Novembro de 2016, registado na aplicação Habilus Media Studio, início:14:54:43, termo:14:59:28] e por G….. [G..…, com depoimento, prestado a 9 de Janeiro de 2017, registado na Aplicação Habilus Media Studio, início:10:17:46, termo:10:27:34] nos quais se baseou o Tribunal a quo para prova dos factos integradores de uma situação de ruptura definitiva do casamento, não fazem dos mesmos prova, contrariamente ao indicado pelo Tribunal a quo.
VIII–A prova testemunhal produzida traduz-se, fundamentalmente, no que as testemunhas disseram que o A. lhes tinha dito - sem contudo ter sido dito tudo o que o Tribunal a quo disse que disseram - e no que as testemunhas crêem, inexistindo, em qualquer dos casos, razão de ciência válida. Em momento algum as testemunhas atestam factual e concretamente elementos integradores da ruptura definitiva do casamento de A. e R., sendo os aludidos factos ficção face à prova produzida.
IX– Perante direitos indisponíveis não podia ter sido considerado valorável, nem considerados como o foram, os depoimentos prestados pelas testemunhas.
X– Da prova documental não resulta valoração diversa da supra propugnada.
XI– De tais factos não serve de prova o simples facto de o A. ter interposto acção de divórcio litigioso.
XII – Porque estamos no âmbito de direitos indisponíveis, não é admissível a confissão - Se a lei não admite a confissão quando estão em causa direitos indisponíveis, fá-lo coerentemente, pois se a parte não tem poder de disposição sobre o direito, por ser indisponível, então os factos que o suportam também estão subtraídos à disponibilidade da sua vontade, não podendo ser validamente manipulados ao sabor dos interesses privados. - palavras do Tribunal da Relação de Coimbra, que se subscrevem. (Acórdão proferido no âmbito do processo 737/09.9T6AVR-B.C1, acessível em www.dgsi.pt.)
XIII– O Tribunal a quo não analisou, nem valorou devidamente a prova documental, nem a prova testemunhal produzida nos autos, o que constitui vício de erro na apreciação e valoração da prova, razão dos invocados erros no julgamento da matéria de facto, o que propiciou a prolação das decisões ora recorridas com os vícios invocados.
XIV– Não foi provado que em Dezembro de 2014 o A. abandonou a casa onde até então residia com a R.;
XV– Não foi provado que o A. tinha medo da R.;
XVI– Não foi provado que em que A. não mais viveu em comunhão de leito, mesa e habitação com a R.;
XVII– Não foi provado que em que o A. não pretende reatar a vida conjugal com a R..
XVIII– Devia, nomeadamente ao abrigo do princípio da aquisição processual, ter sido considerada a hipoteca que garante o mútuo contratado para aquisição da fracção identificada em 17 da Fundamentação de Facto (i) Factos Provados, bem como deverá ser considerada, face aos documentos juntos, a existência de dívida de montante superior ao do respectivo valor patrimonial. Não obstante,
XIX– nunca seria admissível negarem-se alimento, porque se diz, a quem se reconhece situação de insuficiência económica, “tem uma casa, venda-a”.

XX– Da apreciação criteriosa e ponderada da prova, deveriam resultar não provados e provado os factos infra indicados, pelo que deve o Tribunal ad quem modificar a decisão da matéria de facto erradamente julgada, nos termos seguintes:
a)- O facto 2 dos factos provados deverá ser dali suprimido e passar a constar dos factos não provados;
b)- O facto 3 dos factos provados deverá ser dali suprimido e passar a constar dos factos não provados;
c)- O facto 4 dos factos provados deverá ser dali suprimido e passar a constar dos factos não provados;
d)- O facto 5 dos factos provados deverá ser dali suprimido e passar a constar dos factos não provados, e
e)- Deverá ser aditado o seguinte facto aos factos provados da matéria de facto: Sobre a fracção que se encontra registada nas Finanças em nome da R. [ponto 17 de (i) Factos Provados] incide um ónus, uma hipoteca, para garantia de mútuo contratado para a respectiva aquisição, cujo valor em dívida, à presente data, se cifra em € 160.000.00 (cento e sessenta mil euros).

XXI– Nestes termos, deve este Tribunal concluir pela existência de erro de julgamento de facto de que padece a decisão recorrida, alterando a decisão sobre a matéria de facto nos termos supra propugnados (cfr. art. 662.º, nº.1, do CPC).
XXII– Com fundamento na decisão de facto que se impõe, outra deveria ter sido necessariamente a decisão quanto à matéria de direito, tendo assim também violado o disposto na al. d), do art. 1781.º, CC, 2009.º e 2004.º do CC.
XXIII– A falta de demonstração dos factos que permitiriam a razão de Direito que levou a que o divórcio fosse decretado, implica que o mesmo não o possa ser, absolvendo-se a R. do pedido.
XXIV– Demonstrando-se que a R., recorrente, carece de alimentos, que não possui de quaisquer meios de natureza patrimonial - sem ser recurso a família e amigos - e que o obrigado a prestá-los tem, para tanto, capacidade, não pode deixar de se concluir pela condenação do A. no pedido, mesmo que em montante inferior ao peticionado.
XXV– Os documentos juntos no presente recurso, porque apenas com a sentença se revelaram necessários, são admissíveis.
XXVI– Sob pena de subversão dos princípios de apreciação e valoração da prova e face a tudo o exposto, impõe-se a alteração da decisão do Tribunal a quo, relativa e conforme aos factos supra descritos (art. 662.º do CPC).
Nestes termos e nos mais de Direito deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser a sentença revogada e substituída por decisão que considere em vigor o casamento celebrado entre A. e R. e que condene em alimentos o A.,
Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.”
***

Pelo A. e ora recorrido foram interpostas contra alegações, pugnando pela manutenção do decidido e concluindo da seguinte forma:

“CONCLUSÕES
Do Pedido de Divórcio
1)– A prova testemunhal apresentada pelo autor e produzida em audiência de julgamento (H….. e G..…) constituem prova sólida, adequada e suficiente para que o Tribunal “a quo” proferisse sentença a decretar o divórcio, considerando como factos provados que em Dezembro de 2014 o autor abandonou a casa onde até então residia com a ré; o autor tinha medo da ré; não mais tendo o autor vivido em comunhão de leito, mesa e habitação com a ré; e o autor não pretende reatar a vida conjugal com a ré.
2)– Por via da referida prova testemunhal fez-se prova que em Dezembro de 2014 o autor abandonou a casa onde até então residia com a ré; a essa data o autor tinha medo da ré; o autor ainda tem medo da ré; o autor há muito tempo que vive sozinho; o autor está separado da ré; o autor, depois de se ter separado da ré reforçou os laços de amizade com os seus amigos, tendo começado a passar mais tempo com estes, nomeadamente em eventos sociais e durante as férias; o autor, desde que abandonou a casa, encontra-se separado da ré e não mais viveu em comunhão de leito, mesa e habitação com a mesma; o autor até esta data não reatou a relação conjugal com a ré; e o autor em momento algum pretende reatar a relação conjugal com a ré.
3)– Pela testemunha G….. e em complemento foi referido que viu mensagens enviadas pela ré para o telemóvel do autor, em Novembro e Dezembro de 2014, onde a primeira apelidava o segundo de “cabrão”, “paneleiro”, “impotente, “maricas”, ameaçava que o ia matar e que ia fazer mal aos filhos dele (do primeiro casamento).
4)– De igual forma a prova documental junto aos autos, designadamente o Doc. n.º 11 junto com a petição inicial, email enviado por email pela ré (........@.......pt) ao colega de trabalho do autor, no dia 21 de Maio de 2015, esta relata que o autor saiu de casa em Dezembro e não mais voltou a casa. (Não esquecendo a acta da conferência de pais, Doc. 1 junto com o requerimento apresentado pela recorrente para fixação de um regime provisório de alimentos, onde, no âmbito do processo da regulação das responsabilidades parentais, a mesma informou o Tribunal do seu endereço de correio electrónico).
5)– De igual modo, o contrato de comodato celebrado entre o autor e Z….., no dia 23 de Dezembro de 2014, respeitante à fracção autónoma sita na Avª. M..., n.º , R/c – A, em S... A... da C..., concelho de S..., onde o autor habitou desde que abandonou a casa onde até então residia com a ré e com a filha menor de ambos.
6)– Referindo novamente a acta da conferência de pais realizada no processo da regulação das responsabilidades parentais da filha menor, o autor encontra-se a trabalhar em Itália desde Setembro de 2015, tendo aí fixado o seu domicílio fiscal e residência.
7)– Não deverá ser admitida a junção aos autos do Doc. 1, com data de 09 de Dezembro de 2016, que acompanha as alegações de recurso da recorrente, pese embora o tenha feito nos termos do disposto no artigo 651º do CPC, uma vez que o relatório em questão refere apenas a cordialidade na comunicação parental – comunicação essa que foi imposta por via do douto despacho proferido, com data de 17 de Fevereiro de 2016 no processo da regulação das responsabilidades parentais, que se junta sob Doc. 1
8)– Deverá, por seu lado, ser admitida a junção aos autos do mencionado despacho judicial, o qual é apresentado única e exclusivamente para justificar o teor enganador e simulado (quanto à cordialidade existente entre recorrente e recorrido) do teor do documento junto pela recorrente, nos termos do disposto no artigo 651º do CPC.
9)– Em todo o caso, ainda se refira que a genuinidade dessa cordialidade é questionável de tal forma que em Agosto de 2016, aquando da apresentação do requerimento para fixação de um regime provisório de alimentos, por via do engenhoso e falso argumento de incumprimento do requerido no cumprimento do regime provisório das responsabilidades parentais, requereu ao Tribunal “a quo” que os dois mil euros fossem descontados directamente do seu vencimento, como se de uma penhora se tratasse.
10)– Por conseguinte, e ao contrário do referido pela recorrente, o Tribunal “a quo” proferiu uma sentença que se encontra em plena harmonia com a prova documental carreada aos autos e com a prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento,
11)– Pelo que não se constatam na douta sentença quaisquer erros ou outros vícios, na apreciação e valoração da prova, não tendo ocorrido uma violação do disposto nos artigos 354º, 341º e 342º, n.º 1 do Código Civil e nos artigos 413º e 414º do Código de Processo Civil.
12)– Encontrando-se as alegações de recurso apresentadas pela recorrente vazias de fundamento legal e de suporte factual e probatório.

Do Pedido de Alimentos
13)– O recorrido, ora requerido, opõe-se ao aditamento aos factos provados da matéria de facto que, sobre a fracção autónoma propriedade da requerente se encontra registado um ónus, uma hipoteca para garantia de mútuo contratado para a respectiva aquisição, cujo valor actualmente em dívida se cifra em cento e sessenta mil euros, na medida em que a recorrente de forma intencional e voluntária ocultou a existência de (pelo menos) o património entretanto identificado – não informou que é proprietária da fracção autónoma identificada pelo requerido na oposição apresentada; não informou que é titular de uma quota na firma “... R... C.... – T..., Lda”, com o valor nominal de 12.500,00€, identificada pelo requerido na oposição deduzida; e não informou que é proprietária de um veículo automóvel de marca BMW, modelo 320 D e com a matrícula xx-xx-xx (conforme consta no documento de protecção jurídica junto com a contestação à petição inicial de divórcio).
14)– A recorrente tinha a obrigação legal – no âmbito do incidente para fixação de um regime provisório de alimentos – e o dever moral de informar o Tribunal “a quo” de todos os bens e activos de que é proprietária (para aferir a necessidade aos alimentos).
15)– De igual forma a recorrente ocultou ao Tribunal “a quo” que recebe do pai do seu primeiro filho a verba de 300,00€ (trezentos euros) a título de pensão de alimentos, conforme consta na acta da conferência de pais junto sob Doc. 1 que acompanha o requerimento para fixação de um regime provisório de alimentos.
Facto que, salvo melhor entendimento tem que ser aditado aos factos provados de matéria de facto.
16)– Pela mesma ordem de argumentos, não deverá ser admitida a junção aos autos dos Docs. N.º 2 e 3 que acompanham as alegações da recorrente.
Caso esse não seja o douto entendimento de V. Exas., o que como mera hipótese académica se admite, por mero dever de patrocínio ainda se considera o seguinte:
17)– De acordo com os referidos documentos, verifica-se que a recorrente contraiu um crédito à habitação, por via da qual em 17/01/2002 foi registada uma hipoteca sobre a fracção autónoma identificada; e dois créditos ao consumo, por via dos quais foram registados mais duas hipotecas sobre a referida fracção autónoma – 17/01/2002 e 07/08/2006.
18)– A recorrente trabalhou no ramo dos transportes na empresa YYY, auferindo mensalmente um vencimento de três mil euros (3.000,00€) ao qual ainda acresceriam as ajudas de custo, o que significa que em dez anos, considerando os subsídios de férias e de Natal, a requerente auferiu de rendimentos próximos de quatrocentos e vinte mil euros (420.000,00€ - sem as referidas ajudas de custo).
19)– A partir do final de Março de 2015 começou a ser pago à requerente um subsídio de desemprego no valor de 1.048,20€, pelo que sensivelmente até essa altura trabalhou no ramo dos transportes.
20)– O que significa que a recorrente teve sempre meios financeiros para liquidar integralmente ou em grande percentagem os créditos contraídos, não o tendo feito porque não quis, e agora pretende responsabilizar o recorrido pela forma como geriu os seus rendimentos e os seus encargos (veja-se que os empréstimos foram contraídos sensivelmente oito anos e mais de doze anos antes das partes terem contraídos matrimónio – 20 de Março de 2014 - e o autor separou-se da ré em Dezembro de 2014).
21)– Pelo menos desde Novembro de 2015 a recorrente encontra-se a viver numa vivenda num condomínio privado em A..., pela qual liquida uma renda mensal de 1.200,00€.
22)– De Novembro de 2015 a Junho de 2017 e só em rendas a recorrente despendeu de 24.000,00€, quantia que poderia ter sido direcionada para amortizar o crédito à habitação, cuja prestação mensal será certamente inferior a 1.200,00€ e que com isso iria poupar uma quantia significativa em juros e demais despesas associadas.
23)– Durante esse tempo, o pai do primeiro filho da recorrente esteve e ainda se encontra a usufruir de um apartamento com cinco divisões a custo zero – situação que permitiria à requerente auferir de um rendimento mensal para fazer face às suas despesas.
24)– Em todo o caso, a mudança para a fracção autónoma de que é proprietária faria a recorrente poupar nas despesas correntes (água, electricidade e gaz – que serão forçosamente inferiores aos consumos numa moradia), como também evitaria o gasto supérfluo com a renda que se encontra a pagar.
25)– As despesas mensais da recorrente consideradas como factos provados pelo Tribunal “a quo” fixam-se em 1.857,59€.
26)– No entanto, o Tribunal “a quo”, conforme consta na douta sentença proferida, fixou o valor de 400,00€ a título de despesas de alimentação da recorrente e do seu primeiro filho fruto de um casamento anterior.
27)– Como já foi referido e de acordo com a acta da conferência de pais junto aos autos pela requerente, o pai deste entrega-lhe todos os meses a quantia de 300,00€ a título de pensão de alimentos.
28)– Facto que o Tribunal “a quo” terá ignorado, mas que forçosamente tem que ser tido em consideração, na medida em que faz reduzir as despesas de alimentação da recorrente, pelo menos, em 200,00€ (duzentos euros).
Pelo que deverá ser reduzido o valor considerado pelo Tribunal “a quo”, a título de despesas de alimentação da recorrente., para a quantia de duzentos euros mensais.
29)– Pelo recorrido e pelo pai do filho do primeiro casamento da recorrente são pagas duas pensões de alimentos no valor global de 1.140,00€ (840,00€ + 300,00€).
30)– Deduzindo ao valor das despesas – 1.857,59€ - o valor da renda mensal (1.200,00€) e 200,00€ das despesas com a alimentação verificar-se-ia uma redução para 457,59€.

31)– Quanto aos rendimentos auferidos pela recorrente, e voltando a ter em consideração a acta de conferência de pais junto aos autos, “…Desde Janeiro (de 2015) até agora tem vivido com ajuda de familiares e amigos, recebendo subsídio de desemprego no valor de €948 (novecentos e quarenta e oito euros)…”, constata-se que a requerente tem tido uma cumulação de rendimentos:
– De 27 de Março de 2015 a 27 de Agosto de 2015 a recorrente auferiu de 1.048,20€ desubsídio de desemprego, a qual acresce os 1.500,00€ mensais que o pai lhe empresta - pelo que se verifica que durante esse período de tempo a ré auferiu de um rendimento nunca inferior a verifica-se que 2.548,20€ (sem contabilizar com a ajuda do irmão de cerca de 500,00€/600,00€), acrescida dos lucros que sejam distribuídos por via da quota nominal de que é titular;
– De 27 de Setembro de 2015 a 27 de Agosto de 2016 a recorrente auferiu de 943,50€ de subsídio de desemprego, a qual acresce os 1.500,00€ mensais que o pai lhe empresta - pelo que se verifica que durante esse período de tempo a ré auferiu de um rendimento nunca inferior a verifica-se que 2.443,50€ (sem contabilizar com a ajuda do irmão da ré de cerca de 500,00€/600,00€), acrescida dos lucros que sejam distribuídos por via da quota nominal de que é titular;
– A partir de Setembro de 2016, a recorrente aufere todos os meses a quantia de 1.500,00€, acrescida dos lucros que sejam distribuídos por via da quota nominal de que é titular, acrescida da ajuda do seu irmão, o que totaliza uma quantia nunca inferior a 2.000,00€/mês.

32)– No que se refere aos activos da recorrente estes são compostos pela fracção autónoma com valor patrimonial de 127.960,00€; pela quota nominal de 12.500,00€ e pelo veículo automóvel de marca BMW, modelo 320 D e com a matrícula xx-xx-xx (conforme requerimento de protecção jurídica junto com a contestação).
33)– A recorrente tem meios para fazer face às suas despesas, designadamente vendendo o veículo automóvel que tem um valor comercial que ronda os 3.000,00€ e os 4.000,00€ ou, aproveitando a sua capacidade de trabalho e experiência profissional, por ter trabalhado no ramo dos transportes, trabalha na firma na qual detém a quota nominal (“.... R.... C... – T..., Lda), o que lhe permitira auferir de um rendimento mensal.
34)– Não esquecendo que a recorrente é uma pessoa com capacidade de trabalho diferenciado, considerando que auferia 3.000,00€ por mês, tem 40 anos de idade e uma grande e forte capacidade para ingressar no mercado de trabalho.
35)– A recorrente é detentora de meios para fazer face às suas despesas e garantir a sua subsistência, no entanto não pode viver acima das suas possibilidades como tem feito e continua a fazer e, assim alegar que tem fundamentos para requerer uma pensão de alimentos devidos a cônjuge, no valor de dois mil euros mensais, e uma pensão de alimentos, no âmbito das responsabilidades parentais, de três mil euros mensais, num total de cinco mil euros mensais.
36)– Dos rendimentos auferidos pelo recorrido e deduzidas as despesas consideradas como factos provados pelo Tribunal “a quo”, este fica com o montante disponível para fazer face as demais despesas com o vestuário, lazer, incluindo férias, bem como para tratamento particular como o tratamento dentário que resultou provado e manutenção do património do qual aufere as rendas, nomeadamente com o respectivo pagamento do imposto municipal sobre imóveis, despesas de manutenção e de conservação.
37)– Desde Setembro de 2015, o recorrido encontra-se a viver e trabalhar em Itália, auferindo de um vencimento (líquido) de 6.671,00€ (o qual já inclui as rendas de 171,00€ e o prémio de produtividade de 500,00€).
38)– As condições de trabalho apresentadas pela GEFCO Itália não são tão vantajosas como as condições e benesses que tinha quando trabalhava em Portugal, beneficiando apenas de uma ajuda de custo – o apartamento onde se encontra a viver em Itália, o qual foi disponibilizado pela entidade patronal.
39)– Todavia as despesas correntes são suportadas pelo recorrido.
40)– Fiscalmente, o sistema italiano é mais gravoso do que o português, na medida em que não existem benefícios fiscais e os descontos que recaem sobre o vencimento do recorrido são muito elevados.
41)– Até à presente data o recorrido nunca beneficiou de uma devolução de IRS.
42)– O recorrido recebe mais dois meses por ano (embora não sejam apelidados em Itália de subsídios de férias e de Natal, têm o mesmo efeito prático), os quais vão ser tributados com o mesmo vigor que qualquer outro vencimento mensal.
43)– Mesmo assim o recorrido continua a optar por se manter em Itália, não só pelo projecto, embora financeiramente não seja estimulante, como também permite-lhe estar mais afastado da recorrente/ré/requerente.
44)– Pelo que as alegações da recorrente, quanto ao pedido de alimentos, se encontram igualmente vazias de fundamento legal, não só por que esta omitiu ao Tribunal a existência de bens e activos de que é proprietária/titular, com a intenção de simular a sua necessidade aos alimentos e iludir a sua (não) capacidade para garantir a sua subsistência,
45)– Não esquecendo que as hipotecas existentes (uma garantia de cumprimento do contrato de crédito à habitação e as outras duas para garantia de cumprimento dos contratos ao consumo celebrados) foram constituídas décadas antes do autor e ré terem contraído matrimónio, tendo a recorrente auferido rendimentos que lhe permitiram liquidar integralmente esses encargos, tendo optado por não fazê-lo.

Pelo supra exposto, e com o douto suprimento de V. Exas., não deverá a decisão recorrida ser revogada, mantendo-se nos precisos termos em que foi   proferida, salvo quanto ao pedido de alimentos, onde se impõe a alteração dos  seguintes factos:
– “A título de despesas com a alimentação a requerente despende todos os meses de cerca de 200,00€ (duzentos euros)”; e
O aditamento dos seguintes factos aos factos provados:
– “A requerente recebe do pai do filho F..., de um anterior casamento, a quantia de 300,00€ (trezentos euros) a título de pensão de alimentos”;
– “A requerente é proprietária de um veículo automóvel de marca BMW, modelo 320 D e com a matrícula xx-xx-xx”; e
– “Desde Janeiro de 2015 que a requerente tem vivido com ajuda de familiares e amigos”.
Fazendo, assim, a costumada JUSTIÇA!”
***

QUESTÕES A DECIDIR
Nos termos do disposto nos Artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial. Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.

Nestes termos, as questões a decidir que delimitam o objecto deste recurso, consistem em apurar:
a)- da admissibilidade de junção de documentos com as alegações de recurso;
b)- da admissibilidade de reapreciação da matéria de facto adquirida pelo tribunal recorrido e se esta deve ser alterada no sentido propugnado pela recorrente;
a)- se se verificam os pressupostos para decretar a dissolução do matrimónio contraído entre A. e R., por divórcio sem o consentimento do outro cônjuge;
b)- se se verificam os pressupostos para fixação de alimentos à R.
***

Corridos que se mostram os vistos aos Srs. Juízes adjuntos, cumpre decidir.
***

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O tribunal recorrido considerou a seguinte matéria de facto:

“(i) Factos provados.

Da discussão da causa - tendo em atenção os temas da prova indicados no despacho saneador de fls. 112, quanto ao pedido de divórcio; e quanto ao pedido de alimentos provisórios os factos alegados no requerimento de fls. 144 e segs. e na resposta e fls. 183 e segs. -, com relevância para a sua decisão resultaram provados os seguintes factos:

(Quanto ao pedido de divórcio)
1.– A., com 51 anos e B., com 38 anos, casaram um com o outro no dia 20/03/2014, civilmente e sob o regime da separação de bens;
1.1.- C. nasceu no dia 00/00/00 e é filha de A e B.
2.– Em Dezembro de 2014 o A. abandonou a casa onde até então residia com a R.;
3.– … o A. tinha medo da R.;
4.– … não mais tendo vivido em comunhão de leito, mesa e habitação com a R.;
5.– O A. não pretende reatar a vida conjugal com a R.;

(Quanto ao pedido de alimentos provisórios)
6.– A casa morada de família, da Requerente e do Requerido, era sita no C.... Q... M..., na Rua V...nº..., em A...;

7.– Em Outubro de 2015 o Requerido intentou a acção de divórcio contra a Requerente, para a qual foi citada em 1/03/2016;
8.– O contrato de arrendamento da casa de morada de família tem a renda, mensal, de 1.2000,00 Euros;
9.– Na casa de morada de família vive a Requerente, a filha C., também filha do Requerido e um filho menor da Requerente;
10.– A Requerente tem consumos com água, luz, electricidade e gaz que rondam os 150,00 Euros mensais;
11.– A Requerente tem despesas de alimentação em montante de cerca de 400,00 Euros mensais;
12.– Com internet, telefone e televisão despende cerca de 90,00 Euros mensais;
13.– A Requerente contratou seguro de saúde com o custo de 105,51 Euros semestrais;
14.– A Requerente está desempregada;
15.– Até Agosto de 2016 recebeu subsidio de desemprego no montante mensal de, nos primeiros seis meses, 1.048,20 Euros e nos onze meses seguintes, no valor mensal de 943,50 Euros;
16.– A Requerente tem tido ajuda de familiares e amigos,
17.– A Requerente tem registado em seu nome, nas Finanças, a fracção I do prédio urbano sito na Rua D...B...S..., nº..., tendo também para os nºs.  e  E, da Prac. D... M..., nº...  da Rua D... I... C..., C... B..., em B..., correspondente ao ...... andar, afecto a habitação, com .... divisões, com o valor patrimonial de 127.960,00 Euros;
18.– … e é titular de uma quota no valor nominal de 12.500,00 Euros, na sociedade “ Ao …… - T......, Lda”;
19.– O Requerido tem um vencimento de 6.000,00 Euros mensais, liquido e recebe prémios de 500,00 Euros;
20.– Paga de pensão de alimentos e despesas de educação, para a filha de ambos, C., mensalmente, o montante de 840,00 Euros;
21.– O Requerido tem dois filhos de anterior casamento, um já é maior, mas encontra-se a estudar e o outro é menor;
21.1.- Com o filho M....., que é maior, despende 400,00 Euros a titulo de alimentos e 150,00 para pagamento da Universidade;
22.– Com o filho N..… despende 400,00 Euros a titulo de alimentos, 280,00 com mensalidade da escola e 85,00 Euros com equitação;
23.– O Requerido está a trabalhar em Itália;
24.– Com consumos de gás, electricidade e água despende, mensalmente, cerca de 150,00 Euros;
25.– Para limpeza da casa em Itália paga, mensalmente, 200,00 Euros;
26.– É proprietário de um prédio em A..., que adquiriu com recurso a crédito bancário, pagando mensalmente a prestação de 502,91 Euros, acrescido de 17,00 Euros do seguro de casa e 54,65 Euros pelo seguro de vida;
27.– Anualmente paga IMI no valor de 130,00 Euros;
26.– …e mensalmente paga 42,95 Euros para alarme/segurança;
28.– Por mês o Requerido recebe rendas no valor de 171,00 Euros;
29.– Em Itália o Requerido despende cerca de 60,00 Euros por dia em alimentação;
30.– Com despesas relacionadas com o seu veiculo, despende anualmente com o pagamento do IUC 45,00 Euros (mensalmente 3,75 Euros) , seguro anual 550,00 Euros (mensalmente 45,83 Euros), manutenção 350,00 Euros ( mensalmente 29,16 Euros);
31.– O Requerido pretende fazer um tratamento dentário que está calculado no valor de 15.000,00 Euros;
32.– Em Itália o A. (Requerido) paga mensalmente cerca de 120,50 Euros com electricidade;

(ii) Factos não provados.

(Do pedido de divórcio)
1.– A data em que ocorreu o facto constante do ponto 3., dos factos provados, foi o dia 13/12/2014.
2.– O A. saiu de casa para jantar no dia 12 de Dezembro e não dormiu nessa noite em casa;
3.– No dia 31/10/2014, pelas 23h.40m, em P... S..., quando o A. foi levar o filho mais novo do primeiro casamento de nome N..… a casa dele, sita na Rua L... P... nº  , após deixar o filho em casa e quando já seguia o caminho, na Rua L... P..., a R. atirou propositadamente o veículo onde seguia, de matricula jj-jj-jj, propriedade onde esta trabalha, contra o veículo onde seguia o A., de matricula zz-zz-zz, veiculo de serviço da propriedade da empresa onde trabalha, tendo o A. acordado em subscrever a declaração amigável do sinistro, para evitar o surgir de maiores problemas;

(Do pedido de alimentos provisórios)
4.– A Requerente e o Requerido começaram a procurar casa para viverem juntos em Outubro de 2012;
5.– Mensalmente, em média, a Requerente tem despesas de saúde de 30,00 Euros;
6.– Em combustível, portagens e manutenção despende, mensalmente, 350,00 Euros;
7.– Com vestuário, calçado, cultura e lazer despende 200,00 Euros por mês;
8.– Na sua alimentação a Requerente gasta, mensalmente, 460,00 Euros;
9.– A Requerente encontra-se a explorar um SPA com o nome “A….inic”;
10.– A Requerente e o Requerido deixaram de estar juntos em Abril de 2015;
11.– Mensalmente o Requerido despende com a sua viatura 80,00 Euros em gasóleo e 20,00 Euros em portagens;
12.– … e com despesas médicas, mensalmente, 42,00 Euros, com vestuário e calçado 200,00 Euros por mês;
13.– Em Itália o Requerido gasta 160,00 Euros com água electricidade e gaz;”
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QUESTÃO PRÉVIA
a)– Da admissibilidade de junção de documentos com o recurso
Veio a recorrente com as suas alegações de recurso juntar cinco documentos, alegando como motivo para a sua junção, o facto de se terem tornado necessários, posteriormente à sentença proferida.

Por sua vez, vem o recorrido requerer a junção de um documento, alegando que, se trata de resposta à alegação da recorrente.

Ora, no que respeita à junção de documentos em fase de recurso, dispõe o artº 651 nº1 do C.P.C. que “As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o artigo 425º ou no caso da junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na primeira instância.”

Por sua vez, o artº 425 do C.P.C., consigna que “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.”, norma esta excepcional, semelhante à prevista no nº3 do artº 423, no que se reporta à fase de junção de documentos em sede de aferição da prova em julgamento.

Sendo esta uma fase excepcional, a junção de documentos em sede de recurso, depende de alegação por parte do apresentante de uma de duas situações:

-a impossibilidade de apresentação deste documento em momento anterior ao recurso. A superveniência em causa, pode ser objectiva ou subjectiva: é objectiva quando o documento foi produzido posteriormente ao momento do encerramento da discussão; é subjectiva quando a parte só tiver conhecimento da existência desse documento depois daquele momento;
-o ter o julgamento efectuado na primeira instância, introduzido na acção, um elemento adicional, não expectável, que tornou necessário esta junção, até aí inútil. Pressupõe esta situação, todavia, a novidade da questão decisória justificativa da junção pretendida, como questão operante (apta a modificar o julgamento) só revelada pela decisão, sendo que isso exclui que a decisão se tenha limitado a considerar o que o processo já desde o início revelava ser o thema decidendum. Com efeito, como refere António Santos Abrantes Geraldes, “podem (…) ser apresentados documentos quando a sua junção apenas se tenha revelado necessária por virtude do julgamento proferido, maxime quando este se revele de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos já constantes do processo.” (Recursos no Novo Código de Processo Civil, cit., p. 184)

Prossegue ainda este autor, em anotação ao artº 651 nº1, referindo que “a jurisprudência anterior sobre esta matéria não hesita em recusar a junção de documentos para provar factos que já antes da sentença a parte sabia estarem sujeitos a prova, não podendo servir de pretexto a mera surpresa quanto ao resultado” (Recursos no Novo Código de Processo Civil, cit., p. 185)[2].

Como referia ainda Antunes Varela (RLJ, Ano 115,º, pág. 95 e segs.), a propósito do regime anterior à Lei 41/2013 “A junção de documentos com as alegações da apelação, afora os casos da impossibilidade de junção anterior ou de prova de factos posteriores ao encerramento da discussão de 1ª instância, é possível quando o documento só se tenha tornado necessário em virtude do julgamento proferido em 1ª instância. E o documento torna-se necessário só por virtude desse julgamento (e não desde a formulação do pedido ou da dedução da defesa) quando a decisão se tenha baseado em meio probatório inesperadamente junto por iniciativa do tribunal ou em preceito jurídico com cuja aplicação as partes justificadamente não tivessem contado.

Todos sabem, com efeito, que nem o Juiz nem o Colectivo se podem utilizar de factos não alegados pelas partes (salvo o disposto nos artºs 514º e 665º do CPC). Mas que podem, em contrapartida, realizar todas as diligências probatórias que considerem necessárias à averiguação da verdade sobre os factos alegados (artºs 264º nº 3, 535º, 612º etc.) e que nem o juiz nem o tribunal se têm de cingir, na decisão da causa, às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação ou aplicação das regras de direito (artº 664º - 1ª parte).

A decisão de 1ª instância pode por isso criar pela primeira vez a necessidade de junção de determinado documento, quer quando se baseie em meio probatório não oferecido pelas partes, quer quando se funde em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação os litigantes justificadamente não contavam. Só nessas circunstâncias a junção do documento às alegações da apelação se pode legitimar à luz do disposto na parte final do nº 1 do artº 706º do CPC.”[3]

Neste caso concreto, refira-se que a recorrente omite de todo, justificação concreta para a junção de documentos nesta fase, alegando tão só que se tornaram necessários após a sentença proferida nos autos, sem que no entanto, se vejam razões para tal.
Não se tratam nem de factos posteriores ao encerramento da discussão de audiência e julgamento, nem conhecidos só após este encerramento.

Denote-se que a efectiva separação do casal e a intenção de não reatamento da vida em comum, eram fundamentos do pedido de divórcio, sendo este documento cuja junção se requer sob o nº1 anterior ao encerramento da audiência de julgamento.

A necessidade de alimentos da requerente e a capacidade do requerido de os prestar, eram já objecto de discussão, pelo que poderia e deveria a requerente de alimentos indicar não só todos os seus bens, como os ónus que sobre eles incidam, incumbindo-lhe ainda requerer a junção de documentação com vista a demonstrar os bens do requerido.

À excepção dos documentos 3 e 5, que correspondem a prints obtidos nessa data, podendo ter sido obtidos em data anterior, os demais são anteriores, podendo ter sido juntos em momento prévio às alegações de recurso.

O mesmo se dirá em relação a documentos que o R. pretende juntar, sem que estejam alegadas as razões da superveniência (trata-se de despacho notificado à parte em Fevereiro de 2016) e da necessidade de junção.

Assim sendo, indefere-se a sua junção, com multa a cargo da recorrente que se fixa em 2 Ucs. e pelo recorrido que se fixa em 1 U.C.
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DA REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

Vem a recorrente requerer a alteração da matéria de facto adquirida pelo tribunal sob os pontos 2, 3, 4 e 5, para não provados, requerendo ainda que seja aditado o seguinte ponto à matéria de facto: Sobre a fracção que se encontra registada nas Finanças em nome da R. [ponto 17 de (i) Factos Provados] incide um ónus, uma hipoteca, para garantia de mútuo contratado para a respectiva aquisição, cujo valor em dívida, à presente data, se cifra em € 160.000.00 (cento e sessenta mil euros).

Por sua vez o recorrido, que não impugnou a decisão recorrida, veio requerer a alteração de um facto:
– “A título de despesas com a alimentação a requerente despende todos os meses de cerca de 200,00€ (duzentos euros)”; e
E o aditamento dos seguintes factos:
– “A requerente recebe do pai do filho F...., de um anterior casamento, a quantia de 300,00€ (trezentos euros) a título de pensão de alimentos”;
– “A requerente é proprietária de um veículo automóvel de marca BMW, modelo 320 D e com a matrícula xx-xx-xx”; e
– “Desde Janeiro de 2015 que a requerente tem vivido com ajuda de familiares e amigos”.
a)– Da apreciação do recurso quanto à matéria de facto;

Decidindo:

Relativamente aos requisitos de admissibilidade do recurso quanto à reapreciação da matéria de facto pelo tribunal “ad quem”, versa o artº 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, o qual dispõe que:

«Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a)– Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b)– Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c)– A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”

No que toca à especificação dos meios probatórios, «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (Artigo 640º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil).

No que respeita à observância dos requisitos constantes deste preceito legal, após posições divergentes na nossa jurisprudência, o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a pronunciar-se no sentido de que «(…) enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.»[4]

Assim, “O que verdadeiramente importa ao exercício do ónus de impugnação em sede de matéria de facto é que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham todos os requisitos que constam do art. 640º do Novo CPC.

A saber:
– A concretização dos pontos de facto incorrectamente julgados;
– A especificação dos meios probatórios que no entender do Recorrente imponham uma solução diversa;
– E a decisão alternativa que é pretendida. (Ac. STJ. de 03.03.2016, Ana Luísa Geraldes, proc. nº 861/13.3TTVIS.C1.S).

Posto isto, no que toca à possibilidade e limites da reapreciação da matéria de facto, não obstante se garantir um duplo grau de jurisdição[5], tem este de ser enquadrado com o princípio da livre apreciação da prova pelo julgador, previsto no artº 607 nº 5 do C. P. Civil, sendo certo que decorrendo a produção de prova perante o juiz de 1ª instância, este beneficia dos princípios da oralidade e da mediação, a que o tribunal de recurso não pode já recorrer.

De acordo com Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, pág. 347, “Algumas das provas que permitem o julgamento da matéria de facto controvertida e a generalidade daquelas que são produzidas na audiência final (…) estão sujeitas à livre apreciação do Tribunal (…) Esta apreciação baseia-se na prudente convicção do Tribunal sobre a prova produzida (art.º 655.º, n.º1), ou seja, as regras da ciência e do raciocínio e em máximas da experiência”.

Assim, para que a decisão da 1ª instância seja alterada haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes.

Daqui decorrem duas importantes conclusões:
– em primeiro lugar que só pode impugnar a matéria de facto a parte que interpõe recurso;
– em segundo lugar que, sendo interposto recurso, dele devem constar todos os requisitos exigidos pelo artº 640 do C.P.C.

Assim sendo, não tendo sido interposto recurso pelo A e recorrido nesta acção, nem cumpridos consequentemente os requisitos do artº 640 do C.P.C., não há que apreciar do seu pedido de alteração ou aditamento da matéria de facto.

Nestes autos, cabe-nos apenas apreciar o recurso interposto pela R. na acção de divórcio e requerente no pedido incidental de prestação de alimentos.  

Posto isto, fundamenta a recorrente a sua discordância quanto aos factos dados como assentes nos pontos 2, 3, 4 e 5, na ausência de prova a este respeito, entendendo que, tratando-se de direitos indisponíveis, sobre estes factos não pode incidir confissão e defendendo que do depoimento das testemunhas do A., que só sabiam o que o A. lhes transmitiu, não se retiram estes factos.

Posto isto, nada obstando à apreciação desta parte do recurso interposto pela R. nesta acção, este tribunal procedeu à audição de toda a prova testemunhal e visionou e ponderou os documentos juntos aos autos. 

Invoca a recorrente que, não foi feita qualquer prova dos factos dados como provados nos pontos 2, 3, 4 e 5, alegando que do depoimento das testemunhas do A. não resultaram estes factos, não sendo ainda admissível confissão sobre os mesmos, porque respeitante a direitos indisponíveis.

É a seguinte a convicção do tribunal recorrido quanto aos factos dados como assentes relativamente ao divórcio: “Quanto aos demais factos, a convicção do Tribunal resulta da conjugação da prova testemunhal com os demais documentos que foram juntos aos autos, documento(s) este(s) que foram sujeito ao contraditório e valorado pelo Tribunal face à demais prova produzida em audiência de julgamento.

Assim e quanto à prova dos fatos constantes dos pontos “2” a “5”, dos “factos provados”, foi relevante o depoimento da testemunha J... V..., o qual declarou ser amigo do A. há vários anos, saber que o mesmo era casado, não conhecendo contudo a R. Disse que, na decorrência da amizade que tinha com o A., encontravam-se em vários eventos e férias, embora tal nunca tenha acontecido com a Ré.

Sabe que o A. saiu no principio de Dezembro de 2014 de casa – não sabendo, contudo, a data certa – e explicou ter esse conhecimento, pois o A. foi viver para a C... da C..., disse-lhe que estava separado e acrescentou que, depois de o A. lhe ter dito que se separou, passaram a estar mais tempos juntos em jantares de amigos.

O seu depoimento foi confirmado e complementado pelo depoimento da testemunha G...., o qual igualmente declarou ser amigo do A. e não conhecer a Ré.

Esta declaração – do não conhecimento ou convívio com a A. -, quer numa testemunha, quer noutra, poderia causar alguma perplexidade ao Tribunal ou dúvida quanto à proximidade das testemunhas com a vivência do A.. Mas, considerando a data em que A. e R. casaram (M.... de 20...), que a filha de ambos nasceu em Dezembro de 2013 e a altura da separação, no segmento que o Tribunal veio a dar como provado, tal não significou para o Tribunal nem falta de objectividade das testemunhas, nem sinal de imparcialidade.

Por um lado é um período de casamento relativamente curto, nove meses, pois foi este período que o Tribunal veio a dar como provado e, por outro, não houve o relato de situação em que, necessariamente, as testemunhas tivessem que encontrar a A., sendo que não era obrigatório que convivessem com a mulher do seu amigo.

Assim e continuando com o depoimento desta testemunha, G…., quanto à separação do A. da Ré, confirmou que tal ocorreu no final de 2014, localizou primeiro Novembro e disse depois Dezembro, não sabendo a data exacta, mas esclarecendo que teve conhecimento deste facto, por ter ajudado o A. a encontrar casa, o qual veio a mudar-se para a C... da C....

O A. disse-lhe que se tinha separado, falou-lhe de telefonemas e mensagens ofensivas que a sua mulher, ora R., lhe tinha enviado, mostrou-lhe mensagens, mas em relação a estes factos a testemunhas não podia confirmar se tinha sido a Ré a fazer os telefonemas ou a enviar as mensagens.

O que sabia era o que o amigo lhe dizia, mas não narrou situação em que tivesse estado presente em que tais telefonemas – os ofensivos ou que humilhassem o A. - tivessem acontecido ou as mensagens tivessem acabado de chegar, na sequência do que o seu amigo lhas tivesse mostrado logo.

Também não presenciou a quaisquer incidentes entre o A. e a R., nem situações em que esta tivesse atingido ou afectado qualquer filho do A.. Quanto a isto, o que sabe foi por o A. lhe ter contado, mas não resultando do seu discurso que tal lhe tivesse sido contado com proximidade da ocorrência dos factos, ou em qualquer outra circunstância de que tal relato tivesse sido incidental, de forma a podermos aferir se o “relatar” já foi por causa da audiência de julgamento ou qual a razão que esteve subjacente a esse relato.

No entanto o seu contributo foi relevante quanto à convicção que o tribunal formou, quanto à não intenção do A. de reatar a vida em comum com a R.

A testemunha disse ao Tribunal que o A. tinha medo da mulher – facto alegado pelo A. e que o Tribunal deu como provado -, estacionava o carro longe de casa para que a mulher não pudesse saber onde estava/que estava em casa.

Perguntado pelo Tribunal a razão pela qual tinha conhecimento do que antecede, explicou que uma vez foi a casa do A., na C... da C..., não viu o carro estacionado, tocou à campainha e quando se ia embora, apareceu então o A., o qual lhe disse que “escondia” o carro para que a mulher não pudesse saber onde morava. Como referimos o A. verbalizou-lhe, nesta altura da separação e da mudança de casa, que veio a ser para a C... da C..., que tinha receio da mulher, que temia a mulher.

E a testemunha confirmou, igualmente, que o A. lhe tinha dito que não pretendia voltar a fazer vida com a mulher e que não mais tinha vivido com a mesma.

O procedimento que antecede – do “esconder” do carro, para que a mulher não pudesse descobrir onde morava, pois era disso que se tratava -, conjugado com a verbalização que o A. fez às testemunhas de que não pretendia voltar a ter qualquer vida em comum com a R., tendo explicado à testemunha G.…. que tinha receio da mulher, do que esta pudesse fazer (em relação a si A. ou aos seus), aliado o facto de ter interposto a acção de divórcio, criaram a convicção, no Tribunal, pela ocorrência dos factos dados como provados, quer em relação à data e duração da separação – desde Dezembro de 2014 e até ao momento -, quer em relação ao receio que tinha da Ré, quer em relação à intenção de não voltar a refazer a vida em comum.

A final, a prova dos factos integradores de uma situação de ruptura definitiva do casamento.

3.1.3.– Por sua vez, do depoimento das testemunhas B….. (irmão da R.), E….. (Pai da R.), D.…. (Amiga da Ré), resultou igualmente a confirmação de que A. e R. estavam separados, tendo confirmado que inicialmente a R.( Requerente dos alimentos), recebeu subsidio de desemprego até Agosto de 2016 – o que é confirmado pelo documento de fls. 171 -, tendo ficado sem qualquer rendimento após essa data.

Confirmaram ao tribunal que, após essa altura, quer o irmão, quer o pai, quer a amiga da R., embora esta tenha dito que o fez de forma pontual, ajudaram economicamente a R. (Requerente).

Confirmaram ao Tribunal que o agregado da R. é constituído por si, pela filha que tem em comum com o A. e por um filho mais velho (12/13 anos), de outro casamento e que residem todos na moradia em que o casal residiu enquanto tal.

O irmão da R. (Requerente) disse que a ajudou com 500,00/600,00 Euros de cada vez, quando vai podendo. A irmã tem procurado emprego, mas não tem conseguido.

O pai diz que a ajuda com cerca de 1.500,00 Euros por mês e confirmou que a mesma paga 1.200,00 Euros de renda por mês. A amiga da R. disse ao tribunal que a ajuda que deu foi pontual, sendo apreensível do seu depoimento, para o Tribunal, que se tratou mero empréstimo.

Destes depoimentos, conjugados com o teor dos documentos de fls. 151 ( quanto à pensão de alimentos paga pelo A. à filha C.), fls. 155 ( relativo ao contrato de arrendamento da casa habitada pela R. e do qual consta o montante da renda), fls. 158 a 168 ( quanto aos consumos/pagamentos da Ré com água, electricidade, gaz, internet/telef), resultou a convicção do Tribunal quanto á prova destas despesas mensais da R., bem como composição do agregado familiar.”

Da audição da prova testemunhal, resultou quer do depoimento das testemunhas do A., H….., G….., quer do depoimento das testemunhas B….., irmão da R., E.…., pai da R. e D.…., amiga desta, que A. e R. se encontram separados (referindo estas últimas testemunhas que o agregado familiar é constituído por ela e pelos filhos menores, sem qualquer referência ao A.), fixando a primeira testemunha a saída de casa do A. em Dezembro de 2014 e a segunda em finais de 2014.

Do teor do facto provado nº 23, resulta que o A. se encontra a trabalhar em Itália, resultando do teor do documento de protecção jurídica junto pela R. a estes autos em 07/04/16 e da acta de conferência de pais, junta pela mesma R. com o pedido de atribuição de alimentos, datada de Novembro de 2015, que se encontram separados (fixando a R. esta data em 12/12/14), e que, pelo menos o A., não pretende retomar a vida em comum, o que aliás decorre também da regulação do poder paternal referente à menor e da fixação de alimentos a esta.

Por outro lado, a impugnação da matéria de facto não pode consistir numa mera impugnação da convicção retirada pelo tribunal do conjunto da prova apreciada, uma vez que, dos elementos de prova produzidos, tendo em conta o objecto do litígio definido pelo tribunal, temos como assente que, em data não apurada de Dezembro de 2014, o A. saiu de casa, foi entretanto trabalhar e residir em Itália e não pretende retomar a vida em comum com a R., existindo ruptura definitiva dos laços conjugais, assim se mantendo os factos dados como assentes nos pontos 2, 4 e 5.

Relativamente ao facto considerado como assente no ponto 3 “…o A. tinha medo da R.”

A este respeito há que considerar que o A. interpôs acção de divórcio contra a R., invocando diversa factualidade, quer anterior à sua saída da residência da família, quer posterior, mas na pendência do matrimónio, tendente a demonstrar a ruptura definitiva da vida em comum, por comportamentos que imputa à R. e que tornariam impossível a manutenção do casamento, com fundamento na alínea d) do artº 1781 do C.C. (Quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a ruptura definitiva do casamento.)

Em sede de elaboração de temas de prova, o tribunal recorrido, considerou como temas de prova os factos constantes do artº 5, 2ª parte (… o autor teve que abandonar a casa onde até então residia com a ré no dia 13 de Dezembro de 2014) e do artº 34 da p.i. (No dia 31 de Outubro de 2014, pelas 23h40m, em P... S..., quando o autor foi levar o filho mais novo do primeiro casamento de nome N…. a casa dele sita na Rua L... P... n.º... , após deixar o filho em casa e quando já seguia a caminho, na Rua L... P..., a ré atirou, propositadamente o veículo onde seguia, de matrícula xx-xx-xx, propriedade da empresa onde esta trabalha, contra o veículo onde seguia o autor, de matrícula ...-PC-..., veículo de serviço da propriedade da empresa onde trabalha, conforme declaração amigável de acidente automóvel que se junta sob Doc. N.º10 e que o autor acordou em subscrever para evitar o surgir de ainda maiores problemas.), bem como o teor do artº 36 da contestação (Relativamente ao referido em 51º da p.i. – no qual o A. se refere a dia 13 de Dezembro de 2014 – o A. saiu de casa para jantar no dia 12 de Dezembro de 2014 e não dormiu nessa noite em casa.)

Tudo o mais alegado pelo A., mereceu a total indiferença do tribunal a quo, possivelmente por se reportarem a situações ocorridas, alegadamente, após a saída de casa do A.

Assim, tendo em conta este enquadramento, não poderia o tribunal considerar como provado o teor do ponto 3, quer por não alegado, quer porque encerra uma conclusão, não admissível, quer porque por via da admissão esta conclusão, não se sabe sequer, se o A. tinha medo da R. por comportamentos anteriores à sua saída de casa e causais dessa saída (sendo que o único comportamento descrito, ocorrido em data anterior, resultou não provado), ou se passou a ter, face à reacção da R. perante a sua saída do lar conjugal.

É uma conclusão que poderia resultar dos factos alegados, como eventual causa de ruptura do casamento e de eventual decisão do A. de abandonar o lar conjugal e da sua decisão de não retomar, nem pretender retomar, a vida em comum, mas não é facto, sendo certo que o único facto descrito em data anterior resultou não provado (sob o ponto 3) e os demais factos alegados, não foram levados aos temas de prova.

Posto isto, a enunciação dos temas de prova não se destina a que “o juiz elencasse factos descritos segundo a sua perspectiva sobre a distribuição do ónus da prova, mas apenas questões genéricas, (que podem ser formuladas segundo o uso de qualificações jurídicas e que têm como referência a causa de pedir e as excepções alegadas pelas partes (embora com estas se não confundam, na medida em que não são factos concretos). Diversamente da prova, que tem como objecto factos, dos articulados, que cumprem a função de alegação de factos e da decisão de facto, que inclui todos os factos relevantes para a decisão da causa, a enunciação dos temas de prova não tem em vista (embora também não vede) uma listagem de factos, ainda que principais, mas de questões formuladas de modo abrangente, que orientem a posterior produção de prova, sem todavia a condicionar ou restringir.” (José Lebre de Freitas, Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 3ª ed., pág. 669/670).

Devendo ser elaborados temas de prova enunciativos, que sejam posteriormente concretizados pelos factos alegados pelas partes, tendo em conta o disposto no artº 410 do C.P.C., o certo é que dos temas elaborados, limitou-se a actividade instrutória ao momento da separação efectiva do casal (estando controvertido no fundo a data em que ocorreu) e à não intenção de vivência em comum e a um episódio concreto, referido no artº 34 da p.i., anterior à saída do A. do lar conjugal, que resultou não provado.

Posto isto, não é possível ao tribunal, dando como não provado o facto descrito no ponto 34 da p.i. e tendo arredado da fase de instrução, os demais factos alegados pelo A. respeitantes a comportamentos da R. que, na sua perspectiva, constituem violações graves dos deveres conjugais que impossibilitam a (retoma da) vida em comum, posteriormente, em sede de decisão, concluir por um singelo “…o A. tinha medo da R.”

Mas tinha, ou passou a ter medo? E porquê? Não se sabe…

Por outro lado, há que atentar a que “No julgamento da matéria de facto ter-se-á por não escrita a decisão do tribunal sobre questões de direito como, de resto, expressamente constava do disposto no artigo 646º, nº 4 do aCPC, preceito este que, não obstante não tenha correspondência no nCPC, se entende continuar ter sentido, posto que a prova continua a incidir sobre factos, como se infere do citado artigo 410º do nCPC.

E, conforme tem sido entendimento doutrinário e jurisprudencial esta solução aplicar-se-á, por analogia, às respostas que constituam conclusões de facto, designadamente quando as mesmas têm a virtualidade de, por si só, resolverem questões de direito a que se dirigem – v. LEBRE DE FREITAS, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 605-07, ABEL SIMÕES FREIRE, Matéria de Facto – Matéria de Direito, C.J./STJ, ano XI, tomo III, 5-9.

Como já referia ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, vol. III, 4ª ed., Coimbra Editora, 212 “(…) tudo o que sejam juízos de valor, induções, conclusões, raciocínios, valorações de factos, é actividade estranha e superior à simples actividade instrutória.”[6]

Assim sendo, este suposto facto não se pode manter, não só porque não consta de qualquer tema de prova enunciado pelo tribunal, que deu como provado um facto e ignorou os demais factos que a este respeito foram alegados pelo A., como não foi sequer alegado e não é sequer “facto”, mas antes uma conclusão.

Relativamente ao facto que a recorrente pretende ver aditado e referente ao empréstimo bancário e seu montante, recorda-se à recorrente que não invocou este facto, nem na sua petição de alimentos, nem em momento algum, que lhe incumbia alegar e provar a sua carência de alimentos (artº 342 nº1 do C.C.), o que passaria por demonstrar a ausência de meios para se sustentar, decorrente, nomeadamente, de não possuir rendimentos ou bens ou, possuindo-os, que estes se encontram indisponíveis, onerados, ou não constituem fonte de rendimentos.

Foi matéria que a recorrente não alegou, porque não indicou, como lhe competia, qualquer património de que era proprietária e é matéria que este tribunal não pode apreciar, estando-lhe vedado em sede de recurso apurar se existe empréstimo bancário associado a esta habitação, qual o montante ainda em dívida, etc….

Era questão que deveria ter sido invocada e decidida a montante, que o não foi e não em sede de recurso. 
   
Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este tribunal, em eliminar o ponto 3 da matéria de facto assente e no demais manter inalterada a decisão recorrida.
***

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

Vem a recorrente invocar que não está demonstrado o requisito constante da alínea d) do artº 1781 do C.C., devendo assim ser considerado improcedente o pedido de divórcio formulado pelo A., bem como deve ser revogada a decisão quanto ao pedido de alimentos, por deles carecer, não tendo o R. demonstrado que os não pode prestar.

Decidindo

a)– se se verificam os pressupostos para decretar a dissolução do matrimónio contraído entre  A. e R., por divórcio;
Considerou a sentença recorrida que “Dispõe o artº 1.671º, nº 1 e 2, do C.Civil, que o casamento baseia-se na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges, pertencendo a ambos a direcção da família, os quais devem acordar sobre a orientação da vida em comum tendo em conta o bem da família que fundaram e os interesses de um e outro.

Por sua vez e no que ao presente caso interessa, dispõe o artº 1.781º, al. a), do C.Civil, que é fundamento do divórcio sem o consentimento do outro cônjuge, a separação de facto por um ano consecutivo.

Entende-se que há separação de facto quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges e há por parte de ambos, ou de um deles, o propósito de não a restabelecer ( cfr. artº 1782º, nº 1, do C.Civil).

E dispõe o artº 1.781º, al. d), do Código Civil, que é igualmente fundamento de divórcio, sem o consentimento do outro cônjuge, “ …quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a ruptura definitiva do casamento.”

Quer no caso do fundamento da al. a), do artº 1782º, do C.Civil, quer no caso da alínea d), o divórcio pode ser requerido por qualquer um dos cônjuges ( cfr. artº 1.785º, do C.Civil).

5.2.– No caso concreto, o A. deduziu a sua pretensão ao abrigo da alínea d), do artº 1.781º, do C.Civil.

Da análise da matéria de facto que resultou provada – tendo em atenção os temas da prova enunciados no despacho saneador; a prova que veio a ser produzida em audiência de julgamento em relação aos factos alegados e que pudessem preencher os referidos temas da prova; sendo que sobre os depoimentos prestados quer A., quer R., tiveram sempre a oportunidade de se pronunciarem, nos termos do artº 5º, nº 2, al. b), do C.P.Civil -, nomeadamente dos factos constantes dos números “1.” a “5”, dos factos provados, temos que o A. e R. casaram um com o outro no dia 20/03/2014.

Em Dezembro de 2014 o A. abandonou a casa onde até então residia com a R, na altura tinha receio da R., não voltaram a ter vida em comum, o A. não pretende reatar a vida conjugal com a R..

Não resultaram contudo provados os factos alegados pelo A., em relação a uma ofensa, por parte da R. no dia 31/10/2014, pelas 23h.40m, em P... S..., quando o A. foi levar o filho mais novo do primeiro casamento, de nome N …., a casa dele, sita na Rua L... P... nº....

Alegou que após deixar o filho em casa e quando já seguia o caminho, na Rua L... P..., a R. atirou propositadamente o veículo onde seguia, de matricula xx-xx-xx, propriedade onde esta trabalha, contra o veículo onde seguia o A., de matricula ...-PC-....

Este seria, à partida e no âmbito dos temas da prova enunciados, facto demonstrativo de uma das causas graves e objectivas da ruptura definitiva do casamento.

Mas resultou, no entanto, provado, que após Dezembro de 2014, altura em que o A. abandonou a casa onde vivia com a R., por ter receio desta, este não mais viveu em comunhão de leito, mesa e habitação com a R. e não pretende reatar a vida conjugal com a R.
A questão a decidir é se estes factos (provados) e considerando os demais alegados e não provados, permitem concluir que está preenchida a cláusula geral e objectiva a que se refere a al. d), do artº 1.781º, do C.Civil, para a qual não é exigida qualquer duração mínima para a separação entre os cônjuges, pois á data em que foi interposta a acção de divórcio, 10/10/2015, ainda não tinha decorrido um ano consecutivo de separação entre o A. e a R., dado que o A. alegou que tal ocorreu em Dezembro de 2014.

E, quanto ao tratamento e valoração desta questão, sigo a Jurisprudência do Acordão do STJ, de 3/10/2013, relatado pela Senhora Juiz Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (processo nº 2610/10.9TMPRT.P1.S1, in www.DGSI.pt), Jurisprudência que considero dar critérios para a decisão do caso concreto.

Com a al. d), do artº 1781º, do C.Civil, o legislador pretendeu introduzir uma clausula geral e objectiva da ruptura definitiva do casamento, para a qual não se exige a culpa por parte do outro cônjuge, qualquer período mínimo de duração para a causa invocada, mas que apenas, pela sua gravidade ou reiteração, resulte a ruptura definitiva do casamento.

O preenchimento deste conceito indeterminado de “ruptura definitiva do casamento”, apenas exige que não estejamos perante factos banais e esporádicos, que estejamos perante situação reveladora do comprometimento definitivo da vida em comum.

E citando o referido acórdão, quanto aos factos demonstrativos da inexistência da comunhão de vida e de ruptura de um casamento de forma definitiva, “…do ponto de vista da lei, essa comunhão de vida encontra-se fundamentalmente traduzida na lista dos efeitos do casamento quanto às pessoas e bens dos cônjuges, máxime na enunciação que o artº 1672º do Código Civil faz dos respectivos deveres: dever de respeito, de fidelidade, de coabitação e de cooperação(…).

A demonstração da ruptura definitiva – presumida nos casos das alíneas a), b) e c) ao fim de um ano – implicará, naturalmente, a prova da quebra grave desses deveres, e da convicção da irreversibilidade do rompimento da comunhão própria da vida conjugal.

Entende-se que esta irreversibilidade há-de ter em conta predominantemente as circunstâncias concretas dos cônjuges, sem naturalmente descurar exigências decorrentes, por exemplo, da dignidade humana e da igualdade entre ambos (…).”.

E foi considerado, no citado acórdão - que tratava de uma situação em que, tal como no presente caso, estava alegado como fundamento para o divórcio a al. d), do artº 1781º, do C.Civil; e em que á data da propositura da acção ainda não tinha decorrido o período de um ano consecutivo de separação de facto; havendo ainda dado como provado a alteração de orientação religiosa da R., em momento que antecedeu a saída de casa do A. -, que não obstante a 1ª instância ter analisado “…o pedido de divórcio fundamentalmente na perspectiva de que a causa de pedir alegada teria sido a separação de facto, [mas] o pedido não pode ser visto desse ângulo. Mesmo quando ponderou se seria possível “concluir pela verificação de qualquer outro dos fundamentos do divórcio previstos no artº 1782º do Código Civil “, considerando em especial a sua alínea d), teve como decisiva a “exiguidade” do “lapso de tempo” da separação de facto anterior à propositura da acção, concluindo que era essa exiguidade que não permit[ia] concluir ser tal ruptura definitiva, inexistindo da parte do autor o propósito de reatar a vida em comum com a ré(…)”.

Mas e aqui consideramos o paralelo ao caso concreto, quanto à questão da actualidade do conhecimento dos factos, designadamente do tempo da separação de facto e sua influência quanto á prova da ruptura definitiva da união conjugal, “(…) entende-se, todavia, que está suficientemente demonstrada a cessação irreversível da comunhão conjugal (…). Acresce, mas acresce decisivamente, que a presente acção foi proposta em Novembro de 2010, mas que o julgamento da matéria de facto tem a data de 11 de Junho de 2012 (…); e que dos seus termos, lida a respectiva fundamentação, resulta que os factos reveladores da cessação da vida provada e social em comum se mantinham nessa altura (portanto, cerca de um ano e meio depois de proposta a acção.

Não se trata, repete-se, de uma situação em que o decurso do prazo de um ano desempenha a função de facto constitutivo do direito que o autor pretende exercer nesta acção, o direito ao divórcio; no contexto da causa de pedir enunciada na al. d) do artigo 1781º, o tempo ou duração desses factos releva como elemento de prova da cessação duradoura ou irreversível da comunhão conjugal, podendo e devendo ser considerado pelo tribunal ao abrigo do disposto na parte final do nº 2 do artigo 264º do Código Civil ( factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa (…)”.

5.3.– Assim, a ruptura definitiva do casamento a que se refere a alínea d), do artº 1781º, do C.Civil, pode ser demonstrada pela prova de quaisquer factos, incluindo os passíveis de integrar qualquer uma das demais alíneas do demais artigo, desde que sejam graves, reiteradas e demonstrem que, objectivamente, deixou de haver vida em comum pelos cônjuges.

Considerando a data da propositura da acção, 10/10/2015 e a data da primeira audiência de julgamento, 15/11/2016, cfr. fls. 389, temos que os conjugues já estavam separados de facto desde Dezembro de 2014, portanto há quase dois anos.

Atento o disposto no artº 611º, nº 1, do C.P.Civil, “… deve a sentença tomar em consideração os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que se produzam posteriormente à proposição da acção, de modo que a decisão corresponda á situação existente no momento do encerramento da discussão”.

A separação de facto que resulta provada, desde Dezembro de 2014, por iniciativa do A., revela uma decisão e situação duradoura e consolidada. Demonstrativa, por sua vez, de uma vontade reiterada e irreversível do A. de pôr termo ao casamento.
A quebra dos laços afectivos e de cooperação – é certo por iniciativa do A., mas em circunstâncias em que tinha receio da A. -, pelo tempo - desde Dezembro de 2014 e até ao momento - e pela forma consequentemente reiterada, revela a ruptura do casamento e a gravidade dessa ruptura: estamos perante uma violação prolongada do dever de coabitação, sendo certo que o A. é que tomou a decisão de sair de casa, mas que demonstra uma vontade irreversível de colocar termo ao casamento.

Está demonstrado que, objectivamente, deixou de haver comunhão de vida entre os cônjuges, tendo o A. vontade séria e irreversível de pôr fim à vida conjugal (cfr. Ac. TRG, de 14/03/2013, processo nº 91/10.6TMBRG.G1, in www.DGSI.pt)”.
Conforme já referido e reconhecido pela decisão recorrida, o A. intentou pedido de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge, com fundamento na alínea d) do artº 1781 do C.C., alegando ter saído do lar conjugal em 13/12/14, ao qual não mais voltou, mais alegando um conjunto de comportamentos da R. ocorridos entre Outubro de 2014 e durante o ano de 2015 que tornam inviável, a seu ver, a manutenção do matrimónio e são fundamento de uma ruptura irreversível do mesmo.

Destes factos relatados, apenas o descrito no artº 34 da p.i., é anterior à alegada saída de casa por parte do A., tendo o tribunal a quo considerado apenas como tema de prova (para além da data da separação do casal) este facto, que resultou não provado.

Eliminado que foi o artº 3 dos factos provados respeitante ao alegado medo da R., sentido pelo A., resta-nos apreciar se os factos dados como assentes fundamentam, por si, o divórcio entre A. e R., ou se, não o fundamentando, permanecem por apurar factos relevantes, havendo assim que mandar baixar os autos à primeira instância, a fim de ser produzida prova sobre factos que, apesar de alegados, não foram elencados nos temas de prova, com relevo para a decisão da causa.

Vejamos:

Dispõe o artigo 1781º do C.C. (na redacção introduzida pela lei 61/2008 de 31/10) que é fundamento do divórcio sem consentimento de um dos cônjuges:
“a)- A separação de facto por um ano consecutivo;
b)- A alteração das faculdades mentais do outro cônjuge, quando dure há mais de um ano e, pela sua gravidade, comprometa a possibilidade de vida em comum;
c)- A ausência, sem que do ausente haja notícias, por tempo não inferior a um ano;
d)- Quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a ruptura definitiva do casamento.”

Ora, o A. interpôs a presente acção de divórcio com fundamento na na alínea d) do artº 1781 do C.C., e não com fundamento na separação de facto prevista na alínea a) do mesmo preceito legal. Caso o tivesse feito, a acção estaria condenada ao insucesso ab initio[7], tendo em conta que, na data de interposição da acção, pese embora se tratasse de uma causa objectiva de divórcio, ainda não tinha decorrido um ano, desde a data da cessação da vida em comum entre A. e R.

Considerou no entanto a decisão recorrida que, tendo em conta o tempo decorrido, desde a entrada em juízo da p.i., e a data da primeira sessão de julgamento, quase dois anos, sem que A. e R. tenham retomado a sua vivência, tendo cessado a comunhão de leito, mesa e habitação entre os cônjuges, não pretendendo o A. retomá-la, se verifica o requisito constante da alínea d) deste preceito (que não necessita da observância de qualquer prazo, mas sendo o tempo decorrido, em que se mostra violado o dever de coabitação e cooperação entre os cônjuges, forte indicador desta ruptura definitiva). Cita em abono da sua posição, jurisprudência do nosso tribunal superior, a que aderimos, tendo em conta a ratio da alteração introduzida pela Lei 61/2008 de 31/10.

Com efeito, com a alteração introduzida, mormente no que se reporta aos requisitos do divórcio, o legislador assumiu como princípio o de que ninguém deveria permanecer casado contra a sua vontade se considerar que houve quebra do laço afectivo, independentemente do requisito da culpa (violação culposa dos deveres conjugais cfr. se previa na anterior redacção do artº 1779 do C.C.).

É o que decorre do disposto nesta diploma legal e da exposição de motivos que o antecedeu e que constam do Projecto Lei n.º 509/X, apresentado pelo Partido Socialista, no qual se discorre que: “Em primeiro lugar, elimina-se a culpa como fundamento do divórcio sem o consentimento do outro, tal como ocorre na maioria das legislações da União Europeia e alargam-se os fundamentos objectivos da ruptura conjugal. O abandono do fundamento da culpa é, aliás, ponto de convergência na legislação europeia como se pode ler na obra atrás citada: “A eliminação a qualquer referência à culpa é consistente com a evolução da lei e da prática nos sistemas legais europeus analisados. Em muitos desses sistemas a culpa foi abandonada. Mesmo os poucos que, de forma parcial, a mantém muitas vezes na prática evoluíram na direcção do divórcio sem culpa. De qualquer dos modos é difícil atribuir culpa apenas a um dos cônjuges” (in Boele-Woelki et al. (2004), Principles of European Family Law Regarding Divorce and Maintenance Between Former Spouses, Commission on European Family Law, Antwerp-Oxford, Intersentia, p.55).

Assim, “qualquer cônjuge que considere que o seu casamento já não reúne condições de afetividade, de equilíbrio emocional ou que atente contra a sua dignidade deve poder pôr termo à relação conjugal, mesmo contra a vontade do outro cônjuge. A invocação da rutura definitiva da vida em comum deve ser fundamento suficiente para que o divórcio possa ser decretado, sem necessidade de mais condições e sem estar na dependência da aceitação do outro cônjuge.”[8], sem dependência de prazo e sem necessidade de aferição de culpa de um dos cônjuges.

Conforme se refere in Ac. do TRL de 14/04/16, acima citado “A referida Lei nº 61/2008, de 31.10, eliminou a culpa como fundamento de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges, tendo consagrado na nossa ordem jurídica o designado modelo de “divórcio constatação da ruptura conjugal”, inspirado na concepção de divórcio unilateral e potestativo, em que qualquer um dos cônjuges pode pôr termo ao casamento, com fundamento em factualidade que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a ruptura definitiva do matrimónio, desta forma se tendo abandonado a modalidade de divórcio por violação culposa dos deveres conjugais, o chamado “divórcio-sanção”.

Como bem se refere no Ac. STJ de 09.02.2012[9], “era já o «divórcio-sanção» como uma entidade em vias de ser ultrapassada e a adesão ao conceito-modelo do «divórcio-constatação da ruptura conjugal» como uma nova realidade destinada a ser o instrumento para a obtenção da felicidade de ambos os cônjuges[4], razão pela qual sempre que um deles entenda, mesmo numa perspectiva egoísta, que, pelo menos, para si, essa felicidade já não pode ser alcançada com o casamento, goza de legitimidade para requerer o divórcio, ainda que a responsabilidade pela falência do casamento lhe possa ser imputada, em exclusivo.

É agora a concepção do divórcio unilateral e potestativo, em que um dos cônjuges pode por termo ao casamento, por simples declaração de vontade singular, sem que haja lugar à apreciação da culpa ou à aplicação de sanções, o que acaba por significar que o fundamento da ruptura se traduz na inexistência de uma plena comunhão de vida entre os cônjuges, a que alude o artigo 1577º, do CC, isto é, numa expressão mais redutora, quando a «affectio conjugalis» e a cumplicidade entre os cônjuges baixou ao grau zero de satisfação para um deles, e em que a lei não pode sobrepor-se ou substituir-se à vontade do cônjuge que pretende a dissolução do seu casamento.

Trata-se, afinal, do direito ao casamento e do direito ao divórcio como duas faces inseparáveis da mesma moeda, expressão do princípio da autonomia da vontade, que, na hipótese do divórcio, pode ainda ser decretado, em consequência da vontade unilateral de um dos cônjuges, nos casos e termos previstos na lei, atento o estipulado pelos artigos 406º, nº 1 e 1781º, do CC, na sequência do entendimento que reconduz o casamento a um contrato dissolúvel pela vontade das partes, porque celebrado com vista à sua felicidade.

Com efeito, a relação a dois existente dentro do casal, movida pelo propósito da realização pessoal, independentemente de qualquer quadro de valores e de respostas externas, apenas baseada no compromisso permanente e na gratificação renovada, contém, em si mesma, o acordo prévio sobre a sua própria dissolução. A ideia do casamento como relação pura, baseada no compromisso privado, que contém em si a possibilidade antecipada da sua dissolução, torna injustificada a definição de deveres conjugais imperativos, conduzindo os sistemas jurídicos para uma regulamentação minimalista do sistema de divórcio.

Tratou-se do prenúncio do aparecimento do modelo do «divórcio sem culpa», assente na constatação da ruptura do matrimónio, indiciada por causas objectivas, ou no acordo dos cônjuges, através do mútuo consentimento activo ou do consentimento passivo do cônjuge que se não opõe ao pedido de divórcio formulado pelo outro”.

Assim, a Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro, limitou-se a aprofundar o modelo “moderno” de casamento, por contraposição ao seu modelo “tradicional”, modelo esse que “desvaloriza o lado institucional e faz do sentimento dos cônjuges, ou seja, da sua real ligação afectiva, o verdadeiro fundamento do casamento”, que passa a ser “tendencialmente”, ou, no limite, antes que uma “instituição”, “uma simples associação de duas pessoas, que buscam, através dela, uma e outra, a sua felicidade e a sua realização pessoal”, ideia que justifica e propugna a dissolução jurídica do vínculo matrimonial quando, independentemente da culpa de qualquer dos cônjuges, ele se haja já dissolvido de facto, por se haver perdido, definitivamente, e, sem esperança de retorno, a possibilidade de vida em comum.

Com efeito, o chamado divórcio-ruptura, em contraposição ao divórcio-sanção, funda-se em causas objectivas, designadamente a separação de facto, reconhecendo-se que o vínculo matrimonial se pode perder independentemente da causa do fracasso da vida conjugal.

Posto isto, o A. deu entrada desta acção de divórcio em 09/10/15.

Resultou dos factos assentes que em Dezembro de 2014 o A. abandonou a casa onde até então residia com a R., onde estava estabelecido o lar conjugal, não mais tendo vivido em comunhão de leito, mesa e habitação com a R. e que o A. não pretende reatar a vida conjugal com a R., residindo e trabalhando em Itália.

É certo que à data de propositura da acção, não tinha decorrido o prazo de um ano previsto na alínea a) do artº 1781 e 1782 do C.C., nem a acção foi intentada com essa causa de pedir (embora haja jurisprudência que considere que o pressuposto da duração temporal de separação se pode verificar no decurso da acção[10].)

De todo o modo, estando adquirido que desde essa data não mais A. e R. viveram em comunhão de leito, mesa e habitação, que o A. não pretende retomar a vida em comum com a R., estando regulado o poder paternal em relação à filha menor do casal, verifica-se o requisito de ruptura definitiva do matrimónio, ainda que por acto do A., mas sendo certo que, este requisito prescinde da culpa e basta-se com a efectiva ruptura do matrimónio e com a intenção de uma das partes de não retomar esse vínculo (sendo a ruptura definitiva), ainda que a R. a tal se oponha, uma vez que a relação afectiva que o matrimónio supõe, não é, nem pode ser, unilateral.[11]

Assim sendo, improcede nesta parte a apelação, mantendo-se o decidido na decisão recorrida que decretou o divórcio entre A. e R.

Passemos assim a apreciar a segunda parte do recurso,
c)- se se verificam os pressupostos para fixação de alimentos à R.
Em princípio, dissolvido o matrimónio, por divórcio, o princípio geral é o de que cada ex-cônjuge deve prover à sua subsistência (artº 2016 do C.C.), só em casos excepcionais tendo direito a alimentos, independentemente do tipo de divórcio e do requisito de culpa (exigido na redacção anterior à lei 61/2008 deste artigo).

Excepcionalmente, qualquer dos cônjuges pode pedir alimentos ao seu-ex-cônjuge (artº 2009 nº1 a) do C.P.C.), incumbindo ao cônjuge que deles careça, alegar e provar a sua carência e a possibilidade de o obrigado os poder prestar.

Para determinar o montante destes alimentos, cfr. decorre do disposto no artº 2016-A do C.C., deverá o tribunal “tomar em conta a duração do casamento, a colaboração prestada à economia do casal, a idade e estado de saúde dos cônjuges, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, o tempo que terão de dedicar, eventualmente, à criação de filhos comuns, os seus rendimentos e proventos, um novo casamento ou união de facto e, de modo geral, todas as circunstâncias que influam sobre as necessidades do cônjuge que recebe os alimentos e as possibilidades do que os presta”, devendo ainda dar prevalência “a qualquer obrigação de alimentos relativamente a um filho do cônjuge devedor sobre a obrigação emergente do divórcio em favor do ex-cônjuge.”

Mais se dispõe como princípio geral que o “cônjuge credor não tem o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiou na constância do matrimónio.”

É mais um afloramento do princípio do divórcio sem culpa, introduzido pela Lei 61/2008 de 31/10, não pretendendo “Ao redigir o artigo 2016º-A, nº 1, do CC, não teve o legislador português (…) colocar o ex-cônjuge carecido de alimentos numa posição idêntica, do ponto de vista financeiro, aquela que desfrutaria se o casamento não tivesse sido dissolvido, desmistificando uma certa expectativa jurídica de garantia da auto-suficiência, durante e após a dissolução do matrimónio, que consubstanciaria o casamento como um verdadeiro «seguro de vida», por não ser «concebível a manutenção de um status económico atinente a uma relação jurídica já extinta»[10], até porque não se pode subestimar a ideia básica, hoje vigente neste âmbito do Direito da Família, de que “cada cônjuge deve prover à sua subsistência, depois do divórcio”, porquanto o direito a alimentos pode ser negado, por razões manifestas de equidade.É que o direito do cônjuge a uma existência, economicamente, autónoma e condigna, já não é, presentemente, uma realidade a tomar em consideração nas situações posteriores ao divórcio, pois que a duração do casamento, a colaboração prestada à economia do casal, a idade, o estado de saúde dos cônjuges, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, o tempo que terão de dedicar, eventualmente, à criação de filhos comuns, os seus rendimentos e proventos, um novo casamento ou união de facto e, de um modo geral, todas as circunstâncias que influam sobre as necessidades do cônjuge que recebe alimentos e as possibilidades daquele que os presta, a que alude o nº 1, do artigo 2016º-A, do CC, são apenas «índices» do critério da fixação do montante dos alimentos e não a «razão de ser» da existência do direito do autor do pedido.”[12]

Assim, a medida dos alimentos não resulta da eventual deterioração da situação económica e social do carecido, após o divórcio, uma vez que este ex-cônjuge, não tem o direito de exigir a manutenção do nível de vida existente ao tempo da comunhão conjugal, nem sequer pode invocar qualquer expectativa de que esse nível se manteria.

Mas tem o direito de exigir do obrigado a prestá-los montante “indispensável ao sustento, habitação e vestuário.” (arteº 2003 do C.C.), devendo ser proporcionais, “aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los.”, atendendo-se ainda “à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência.” (arteº 2004 do C.C.)

Posto isto, dos factos provados resultou que ao requerido aufere de rendimento líquido mensal € 6.000,00, acrescido de um prémio de € 500,00.

De prestação de alimentos aos seus três filhos, sendo um em comum com a R., despende a quantia de € 2.155,00.

De despesas totais consideradas e fixas despende a quantia de € 3.096,75, a que há que abater o montante de €171,00 de rendas percebidas.

Tem pois gastos fixos mensais na ordem dos € 5.080,75., restando de rendimento a quantia de € 1.419,25.

A estas despesas acresce a necessidade de realizar tratamentos dentários para os quais despenderá a quantia de € 15.000,00 e despesas não consideradas com o seu vestuário e calçado.

Posto isto, a requerente reside com a sua filha (comum ao requerido) e com outro filho também menor, numa mor... no C.... S. M..., em A..., com uma renda mensal de 1.200,00 Euros.

A Requerente tem consumos com água, luz, electricidade e gaz que rondam os 150,00 Euros mensais, despesas com a alimentação em montante de cerca de 400,00 Euros mensais, com internet, telefone e televisão despende cerca de 90,00 Euros mensais; contratou seguro de saúde com o custo de 105,51 Euros semestrais.

A Requerente está desempregada, tendo recebido subsídio de desemprego até agosto de 2016, no montante mensal de, nos primeiros seis meses, 1.048,20 Euros e nos onze meses seguintes, no valor mensal de 943,50 Euros.

A Requerente tem tido ajuda de familiares e amigos.

A Requerente tem registado em seu nome, nas Finanças, a fracção I do prédio urbano sito na Rua D... B... nº... , tendo também para os nºs....   e  , da Prac. D... M... e o nº...,   da Rua D.... I... C..., C... B..., em B..., correspondente ao .... andar, afecto a habitação, com 5 divisões, com o valor patrimonial de 127.960,00 Euros e é titular de uma quota no valor nominal de 12.500,00 Euros, na sociedade “ .... …. - T..., Lda.”(e não “sei” como referido na decisão recorrida).

Temos pois que a requerente, apresenta como despesas fixas a quantia de € 745.95, a que acresce a renda da moradia onde reside no montante de € 1.200,00 mensais.

A sua filha menor recebe de alimentos do requerido o montante de € 840,00.

É proprietária de um imóvel e de uma quota numa sociedade comercial.

O tempo de duração do casamento foi escasso (sendo a comunhão conjugal de cerca de 9 meses), a requerente é pessoa de cerca de 40 anos, que exercia anteriormente actividade profissional.

Posto isto, sendo excepcional a prestação de alimentos ao ex-cônjuge e não podendo este esperar manter o mesmo nível de vida que tinha aquando da comunhão conjugal, é inevitável a conclusão de que não pode esta esperar nem é expectável, a manutenção de um arrendamento, com uma renda de € 1200,00 mensais, para cujo pagamento, nem a requerente, nem em bom rigor o requerido, têm meios para tal, por si só.

Nem se justifica a manutenção deste encargo, tendo em conta que conforme decorre do contrato de arrendamento junto pela requerente em 20/07/16, trata-se de mor... em C... fec..., com jardim e piscina, sendo que o período de duração do matrimónio e do arrendamento, não impõe que razões de natureza afectiva ou outras relevantes (nomeadamente por parte da menor, filha do casal), exijam a manutenção desta residência com os custos associados, notoriamente elevados.

Por outro lado, sendo a requerente proprietária de um imóvel onde poderá habitar ou, do qual poderá retirar rendimento (sendo que não alegou nem que estivesse onerado, nem que nele não possa habitar, nem que dele não retire rendimento) ou que poderá vender, de forma a prover à sua subsistência.

É ainda titular de uma quota social em sociedade, pelo que, visando toda e qualquer sociedade o lucro, decorre que algum rendimento retirará desta participação societária, sendo que conforme resulta de certidão da empresa (junta pelo requerido com o seu articulado de 22/08/16), foi esta constituída em 25/06/07, tem um capital social de € 50.000,00, são sócios desde a sua constituição e gerentes designados inicialmente, a requerente de alimentos, I….., B….. e L….., tendo a requerente e esta última, cessado funções como gerentes, em Setembro de 2007, mas mantendo a sociedade a sua actividade (e não podendo este tribunal deixar de equacionar se a ajuda que seu irmão, gerente desta sociedade, em sede de julgamento, referiu prestar-lhe mensalmente, não se tratará antes da sua parte nos lucros de exploração da referida sociedade).

Da conjugação destes factos, incumbindo à requerente de alimentos, o ónus de alegar e demonstrar que deles carece e sendo a prestação de alimentos ao ex-cônjuge de carácter excepcional, resulta que não estão verificados estes pressupostos, acrescendo que conforme refere a decisão recorrida, “quanto à capacidade de a Requerente ingressar no mundo do Trabalho, que a mesma actualmente tem cerca de 40 anos, é uma mulher que trabalhou e que, pelo subsidio de desemprego que lhe foi atribuído (1.048,20 Euros mensalmente, nos primeiros seis meses e 943,50 Euros mensalmente, nos onze meses seguintes), é pessoa com capacidade de trabalho diferenciado. Aliás, do documento de fls. 151 a 153, junto pela própria, resulta que das declarações que prestou auferia 3.000,00 Euros por mês.

Assim e à partida, será uma pessoa com qualificações e com mais possibilidades de encontrar colocação laboral, se o quiser”, tendo a requerente bens, mormente patrimoniais, para prover à sua subsistência.

Improcede igualmente este último segmento de recurso.
***

DECISÃO.
Pelo exposto, julgam os juízes desta relação em julgar improcedente o recurso interposto pela recorrente e, em consequência, manter a decisão recorrida.
Custas pela apelante.


Lisboa, 07/02/19


                          
(Cristina Neves)
(Manuel Rodrigues )
(Ana Paula A.A. Carvalho)



[1]A Tribunal Relação de Coimbra de 20/01/2015, relator Henrique Antunes, proc. nº 2996/12.0TBFIG.C1
[2]A.Tribunal Relação de Coimbra de 18/11/14, relator Teles Pereira, proc. nº 628/13.9TBGRD.C1
[3]A.do S.T.J. de 26/09/12, relator Gonçalves Rocha, Proc. nº 174/08.2TTVFX.L1.S1
[4]A.STJ de 01.10.2015, P. nº 824/11.3TTLRS.L1.S1, Ana Luísa Geraldes; A. STJ de 14.01.2016, P. n.º 326/14.6TTCBR.C1.S1, Mário Belo Morgado; A. STJ de 11.02.2016, P. n.º 157/12.8TUGMR.G1.S1, Mário Belo Morgado; A. STJ, datado de 19/2/2015, P. nº 299/05, Tomé Gomes; A. STJ de 22.09.2015, P. 29/12.6TBFAF.G1.S1, 6ª Secção, Pinto de Almeida; A. STJ, datado de 29/09/2015, P. nº 233/09, Lopes do Rego; Acórdão do S.T.J de 31.5.2016, Garcia Calejo, P. nº 1572/12; Acórdão do S.T.J. de 11.4.2016, Ana Luísa Geraldes, P. nº 449/410; Acórdão do S.T.J. de 27.1.2015, Clara Sottomayor, P. nº 1060/07.
[5]Cf. o Acórdão da Relação de Guimarães de 04.02.2016, no Proc. 283/08.8TBCHV-A.G1, disponível em www.dgsi.pt, com o seguinte sumário: «Para que a decisão da 1.ª instância seja alterada, haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “prudente convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção, retratada na resposta que se deu à factualidade controvertida, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente aferir da razoabilidade da convicção formulada pelo juiz da 1.ª instância, face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, sem prejuízo do poder conferido à Relação de formular, nesse julgamento, com inteira autonomia, uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova.»
De igual modo, cf. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31.05.2016, no Proc.1572/12.2TBABT.E1.S1, disponível na mesma base de dados, decidindo que «O Tribunal da Relação deve exercer um verdadeiro e efectivo 2.º grau de jurisdição da matéria de facto e não um simples controlo sobre a forma como a 1.ª instância respondeu à matéria factual, limitando-se a intervir nos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, pois que só assim se assegurará o duplo grau de jurisdição, em matéria de facto, que a reforma processual de 1995 (DL n.º 329-A/95, de 12-12) visou assegurar e que o actual Código confirmou e reforçou.»
[6]-A. do TRL de 14/04/16, relatora Ondina Carmo Alves, proferido no proc. nº 273/14.1TBSCR.L1-2, disponível para consulta in www.dgsi.pt 
[7]A.-TRE de 07/12/17, proferido no proc. nº 1042/17.2T8FAR.E1, disponível in www.dgsi.pt; no sentido de que os requisitos de duração temporal da separação têm de estar reunidos à data da instauração da acção, sendo irrelevante que se verifiquem posteriormente, A. do TRG. De 12/09/12, Espinheira Baltar, proc. nº 250/10.1TMBRG.G1, ABEL PEREIRA DELGADO, O Divórcio, 1980, 69, FERNANDO BRANDÃO FERREIRA PINTO, Causas do Divórcio, 1980, 122, TOMÉ D’ALMEIDA RAMIÃO, O Divórcio e Questões Conexas (Regime Jurídico Actual), 2ª ed. 67 a 68.
[8]“Divórcio e Responsabilidades Parentais”, 2ª edição, CEJ, Dezembro de 2013
[9]Relator Hélder Roque, proferido no proc. 819/09.7MPRT.P1.S1, disponível in www.dgsi.pt
[10] Entre outros, Cas. STJ de 03.11.2005 (Pº05B2266), e de 06.03.2007 (Pº 07A297); A. R.L. de 15.5.2012 (Pº 1017/09.5TMLSB.L1-7) , acessíveis em www.dgsi.pt.
[11]neste sentido A. STJ de 03.10.2013 (Pº 2610/10.9TMPRT.P1.S1), citado na decisão recorrida e A. R.L. de 22.10.2013 (Pº 16/11.1TBHRT.L1-7), acessíveis in www.dgsi.pt
[12]A. do STJ de 23/10/12, relator Hélder Roque, proco nº 320/10.6TBTMR.C1.S1, disponível para consulta in www.dgsi.pt; no mesmo sentido vide Catre de 26/01/17, relatora Conceição Ferreira, proc. nº 1550/15.0T8TMR-A.E1; Ac. do TRP de 10/07/13, relatora Maria Amália Santos, proc. nº 304/11.7TMPRT-A.P1