Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
28735/18.4T8LSB.L1-4
Relator: JOSÉ FETEIRA
Descritores: DESPEDIMENTO
JUSTA CAUSA
COMISSÁRIO DE BORDO
COMPORTAMENTO EM VIAGEM
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: I - Constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo assumido pelo trabalhador/Autor no desempenho das suas funções de «Comissário de Bordo» ao serviço da sua empregadora, integrado no pessoal de cabina, comportamento que se traduziu em, a determinada altura de um voo que efetuava ao serviço da empregadora/Ré, no desempenho das referidas funções, ter iniciado diálogo com uma passageira jovem, que viajava sozinha, sendo que, no decurso da conversa, lhe perguntou se não se importava que ele ligasse o monitor do lugar ao lado, a fim de, alegadamente, monitorizar o tempo de voo, aproveitando a oportunidade para lhe perguntar se estava de férias, se já tinha visitado Lisboa, assim como para ver as fotografias das férias de verão da passageira e de, depois de um período de descanso, quando foi verificar o tempo de voo, o trabalhador/Autor ter voltado à conversa com a mencionada passageira, tendo apostado com ela que quem não acertasse na hora de chegada, teria de pagar uma água de coco no dia seguinte, sendo que, então, o trabalhador pediu o número de telefone da passageira, salientando que gostava do facto de ela viajar sozinha, e ainda pelo facto de, mais tarde, em conversa com a mesma passageira, lhe ter perguntado a idade, tendo a passageira respondido que tinha 17 anos e que pretendia estudar medicina, sendo que, como demonstrado também ficou, quando o voo terminou, a passageira dirigiu-se à delegacia especial da polícia existente no aeroporto, apresentando queixa-crime contra o trabalhador/Autor, com fundamento em “importúnio”, tendo a polícia remetido à empregadora/Ré um ofício solicitando a identificação e qualificação daquele.
II - Nas aludidas circunstâncias, não poderia o trabalhador/Autor olvidar as características e as obrigações profissionais apropriadas ao normal desempenho das suas funções de «Comissário de Bordo», as quais consistem em prestar assistência aos passageiros transportados nos aviões da Ré, proporcionando-lhes uma viagem em segurança e tão confortável quanto possível, bem como os interesses comerciais desta enquanto transportadora aérea de passageiros em concorrência, ao mais alto nível, com diversas outras empresas de voos comerciais similares.
Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO
AAA, residente (…) Carcavelos, instaurou um procedimento cautelar de suspensão de despedimento contra a BBB com sede (…), procedimento que corre termos sob o n.º 28195/18.0T8LSB, no final da qual e ao abrigo do disposto no n.º 4 do art. 34º do Código de Processo do Trabalho deduziu requerimento de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento de que foi alvo por parte da Ré em 10 de dezembro de 2018 e que lhe foi comunicado no dia seguinte, 11 de dezembro de 2018.
Correram, pois, em paralelo, a referida providência cautelar e a presente ação de impugnação judicial da regularidade e licitude daquele despedimento.
Nesta ação, foi realizada a audiência de partes a que se alude no art. 98º-F do C.P.T. sem que se tivesse logrado obter acordo entre as mesmas.
Notificada a Ré para apresentar articulado motivador do referido despedimento, veio a BBB fazê-lo, alegando, em síntese, que o Autor exercia as funções de tripulante de cabina com a categoria de «Comissário de Bordo».
No dia 6 de Agosto de 2018, o Diretor de Operações de Voo determinou a instauração de procedimento disciplinar ao Autor, com intenção de despedimento com justa causa e, com o fundamento de ser inconveniente a afetação daquele à realização de voos na pendência do procedimento disciplinar, foi o mesmo suspenso preventivamente.
No processo disciplinar, veio a apurar-se que, no exercício das suas funções, o Autor incorreu na violação culposa e grave dos seus deveres laborais, nomeadamente os deveres de tratar com urbanidade as pessoas que se relacionam com a empresa, o dever de realizar a sua atividade com zelo e diligência assim como o de guardar lealdade ao empregador, previstos nas alíneas a), c) e f) do n.º 1 do art.º 128.º do Código do Trabalho (CT) e nos deveres previstos nas alíneas a), c), f), g) e l) da Cl.ª 4.ª do AE BBB/SNPVAC, os quais, pela sua gravidade e consequências, tornaram impossível a manutenção da relação de trabalho, motivo pelo qual o referido processo disciplinar veio a culminar no despedimento com justa causa do Autor, por decisão do Conselho de Administração da Ré proferida em 3 de dezembro de 2018, decisão que foi comunicada ao Autor por carta registada datada de 10 de dezembro de 2018 e recebida dia 11 do mesmo mês.
Tal despedimento decorreu da circunstância de se haver apurado em sede de procedimento disciplinar que, no dia 28/07/2018, o Autor, que integrava a tripulação que prestou assistência ao voo (…), com origem no Porto e destino a São Paulo, Brasil, a determinada altura do voo, depois do serviço de bordo e das vendas terem terminado, iniciou um diálogo com a passageira (…), na altura com 17 anos de idade, que viajava sozinha no lugar (…).
No decurso da conversa, o Autor perguntou à referida passageira se não se importava que ele ligasse o monitor do lugar (…), a fim de, alegadamente, monitorizar o tempo do voo, aproveitando a oportunidade para lhe perguntar se estava de férias e se já tinha visitado Lisboa, assim como para ver as fotografias das férias de verão da passageira.
Depois do seu período de descanso, quando foi verificar o tempo de voo, o Autor voltou a encetar conversa com a referida passageira, tendo apostado com ela que quem não acertasse na hora de chegada do voo, teria de pagar uma água de coco no dia seguinte, tendo, então, o Autor pedido o número de telefone da referida passageira e salientado que gostava do facto de ela viajar sozinha.
Mais tarde, no decurso da conversa, perguntou-lhe a idade, tendo a passageira respondido que tinha 17 anos e que pretendia estudar medicina.
Quando o voo terminou, a passageira (…), sentindo-se importunada com o sucedido, dirigiu-se à Delegacia Especial da Polícia Federal, no Aeroporto de São Paulo/Guarulhos, onde apresentou queixa-crime contra o Autor, com fundamento em “importúnio”.
Os factos descritos demonstram que o Autor, no exercício das suas funções e quando prestava serviço de assistência aos passageiros da Ré a bordo de uma das suas aeronaves, aproveitou a oportunidade para, de forma deliberada e consciente, se aproximar da passageira (…), mantendo com esta uma conversa e um conjunto de comportamentos por ela não solicitados nem desejados, de natureza pessoal e privada, que se traduziram numa verdadeira situação de importúnio, contrários não só às funções que lhe estão atribuídas, como aos deveres sociais de conduta a que está genericamente adstrito, pelo que, ao agir desse modo, de forma totalmente inapropriada, o Autor causou danos à imagem e bom nome da Ré, em consequência dos efeitos altamente negativos da conduta por si adotada, quer na passageira quer no conhecimento e atuação das autoridades policiais brasileiras, tendo inclusivamente sido reportado à Ré, ainda quando da estadia no Brasil, a possibilidade de a tripulação vir a ser abordada por entidades policiais, para averiguação dos factos, na sequência da queixa apresentada pela referida passageira.
A conduta do Autor, tendo em conta a sua gravidade e consequências, demonstra o incumprimento das obrigações inerentes ao posto de trabalho que lhe está confiado, e assumiu tal gravidade, designadamente pela sua natureza e pelas repercussões externas, que tornou imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho a que se acha vinculado, constituindo, em face do disposto no nº 1, do art.º 351 do Código do Trabalho, justa causa de despedimento.
Concluiu que dever-se-á considerar válido e lícito o despedimento do Autor, por se encontrarem preenchidos todos os requisitos materiais e formais do despedimento com justa causa, o que deverá ser decretado com todas as consequências legais.
O Autor, tendo sido notificado para contestar o mencionado articulado, sob pena de, não o fazendo, se considerarem confessados os factos articulados pelo empregador, sendo logo proferida sentença a julgar a causa conforme fosse de direito, não apresentou contestação.
Foi assim proferida sentença em 27/02/2019, a qual culminou com a seguinte:
«Decisão
3.1. Julgo ilícito o despedimento do autor/trabalhador e, em consequência:
1. Condeno a ré/empregadora BBB a reintegrar o autor/trabalhador com a mesma antiguidade e categoria;
2. Condeno a ré/empregadora BBB a pagar à autor/a/ trabalhador/a o valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da presente sentença, acrescida de juros de mora de 4% a contar desta última data, e descontados os valores que tenha eventualmente recebido de subsídio de desemprego e outras prestação laborais (390º, n. 2, al.s a) e c) do CT).
3.2. Custas a cargo da ré/empregadora (art. 537º n.º 1 e 2 CPC).
Registe e notifique.
Valor da causa: 5.000,01€ – art. 98º-P, do CPT.
Após trânsito comunique a decisão à Segurança Social para efeitos do art. 390, 1, c), CT.».
Notificada desta sentença e por com ela se não conformar, veio a Ré interpor recurso de apelação para este Tribunal, apresentando as correspondentes alegações que termina mediante a formulação das seguintes:
Conclusões:
(…)
Contra-alegou o Autor/apelado, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.
A Ré/apelante prestou caução de forma a obter o efeito suspensivo do recurso por si interposto.
Admitido o recurso com adequado regime de subida e efeito suspensivo, foram os autos remetidos para esta 2ª instância.
Mantida a admissão do recurso, determinou-se que fosse dado cumprimento ao disposto no art. 87º n.º 3 do CPT, tendo a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitido o douto parecer de fls. 82, no sentido da improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.
Este parecer não foi objeto de resposta por nenhuma das partes.
Pelas razões que constam de fls. 85, foram dispensados os vistos dos Exmos. Desembargadores Adjuntos.
Cumpre, agora, apreciar e decidir do mérito do recurso em causa.
*
APRECIAÇÃO
Dado que, como se sabe, são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto perante o Tribunal ad quem, sem prejuízo, claro está, da apreciação de questões de natureza oficiosa, em face das conclusões extraídas pela Ré/apelante no recurso de apelação interposto, colocam-se à apreciação deste Tribunal da Relação as seguintes:
Questões de recurso:
· Impugnação de matéria de facto;
· Ocorrência de justa causa para o despedimento do Autor/apelado, em face da matéria de facto assente e do direito aplicável.

Fundamentos de facto
Na sentença recorrida considerou-se como provada a seguinte matéria de facto:
1. No dia 6 de Agosto de 2018, o Diretor de Operações de Voo determinou a instauração de procedimento disciplinar ao Autor, com intenção de despedimento com justa causa, conforme fls. 2 do processo disciplinar e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
2. Por carta registada com aviso de receção, datada de 26.09.2019 e junta a fls. 11 do processo disciplinar, a requerida comunicou ao requerente que “com fundamento nos factos ocorridos no voo (…), dia 28 de Julho/18, envolvendo a passageira, CCC, ordenei lhe fosse instaurado um procedimento disciplinar.
Mais o notifico que por se considerar inconveniente a sua afectação à realização de voos na pendência do procedimento disciplinar, determinei também a sua suspensão preventiva da prestação de trabalho, com efeitos imediatos, até à conclusão do procedimento disciplinar…”.
3. Por carta de 28 de Setembro de 2018, junta a fls. 16 do processo disciplinar a requerida comunicou ao requerente a intenção de proceder ao seu despedimento pelos seguintes factos que constam da nota de culpa:
“1. No dia 28/07/2018, o arguido integrou a tripulação que prestou assistência ao voo (…) , com destino a São Paulo, Brasil.
2. A determinada altura do voo, depois do serviço de bordo e vendas terem terminado, o arguido iniciou um diálogo com a passageira CCC, na altura com 17 anos de idade que viajava sozinha no lugar (…).
3. No decurso da conversa, o arguido perguntou à passageira se não se importava que ele ligasse o monitor do lugar (…), a fim de, alegadamente, monitorizar o tempo de voo, aproveitando a oportunidade para perguntar se estava de férias e se já tinha visitado Lisboa, assim como para ver as fotografias das férias de verão da passageira.
4. Depois do período de descanso, quando foi verificar o tempo de voo, o arguido voltou à conversa com a passageira, tendo apostado com ela que quem não acertasse na hora de chegada, teria de pagar uma água de coco no dia seguinte.
5. O arguido pediu o número de telefone da passageira, salientando que gostava do facto dela viajar sozinha, e mais tarde, em conversa, perguntou-lhe a idade, tendo a passageira respondido que tinha 17 anos e que pretendia estudar medicina.
6. Quando o voo terminou, a passageira CCC, sentindo-se importunada com o sucedido, dirigiu-se à delegacia especial da policia federal, no aeroporto de São Paulo / Guarulhos, onde apresentou queixa crime contra o arguido, com fundamento em “importúnio”.
(…).”
4. Em 12 de Outubro de 2018, foi junta a fls. 21-23 do processo disciplinar, a resposta à nota de culpa, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
5. Em 11 de Novembro de 2018, foi junto a fls. 48 a 54 o relatório final do processo disciplinar e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
6. Em 28.11.2018, a Comissão de Trabalhadores emitiu o respetivo parecer.
7. Em 3 de Dezembro de 2018, o Conselho de Administração da requerida deliberou o imediato despedimento do requerente sem qualquer indemnização ou compensação.
8. Por escrito de 10.12.2018, a requerida comunicou ao requerente que foi decidido o seu despedimento imediato com invocação de justa causa, sem indemnização nem compensação, anexando deliberação e relatório final.
9. À data de 28.07.2018, o autor encontrava-se ao serviço da ré, com contrato de trabalho a tempo indeterminado, desde 22 de Julho de 2017.
10. O Autor desempenhava as funções correspondentes à categoria profissional de Comissário de Bordo, integrado no Pessoal de Cabina da Direção das Operações de Voo, conforme o planeamento de voos mensais que lhe eram atribuídos.
11. No dia 28.07.2018, o Autor integrou a tripulação que prestou assistência ao voo (…), com origem no Porto e destino a São Paulo, Brasil.
12. A determinada altura do voo, depois do serviço de bordo e vendas terem terminado, o Autor iniciou um diálogo com a passageira CCC, na altura com 17 anos de idade que viajava sozinha no lugar (…).
13. No decurso da conversa, o requerente perguntou à passageira se não se importava que ele ligasse o monitor do lugar (…), a fim de, alegadamente, monitorizar o tempo de voo, aproveitando a oportunidade para perguntar se estava de férias e se já tinha visitado Lisboa, assim como para ver as fotografias das férias de verão da passageira.
14. Depois do período de descanso, quando foi verificar o tempo de voo, o requerente voltou à conversa com a passageira, tendo apostado com ela que quem não acertasse na hora de chegada, teria de pagar uma água de coco no dia seguinte.
15. O Autor pediu o número de telefone da passageira, salientando que gostava do facto dela viajar sozinha, e mais tarde, em conversa, perguntou-lhe a idade, tendo a passageira respondido que tinha 17 anos e que pretendia estudar medicina.
16. Quando o voo terminou, a passageira CCC, dirigiu-se à delegacia especial da polícia federal, no aeroporto de São Paulo / Guarulhos, onde apresentou queixa-crime contra o requerente, com fundamento em “importúnio”.
17. Durante o voo, a referida passageira dirigiu-se à Assistente de Bordo (…), que ocupava a posição E3, e que por força da definição das rotinas a bordo, correspondia o serviço aos passageiros sentados no corredor esquerdo do avião, àquele onde se situava o lugar da passageira em causa – ocupando o Autor a posição E4, a quem, nos mesmos termos, correspondia o serviço de passageiros sentados no corredor do lado direito -, dizendo- lhe que não tinha achado correto o comportamento do autor e que inclusivamente lhe tinha dado o número de telefone errado.
18. Foi reportado à Ré, ainda aquando da estadia no Brasil, a possibilidade de a tripulação vir a ser abordada por entidades policiais, para averiguação dos factos, na sequência da queixa apresentada pela referida passageira.
19. A Policia Federal Brasileira remeteu à Ré o ofício, datado de 28 de Julho de 2018, junto a fls. 46 do processo disciplinar apenso e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido, assinaladamente, «Devido a declarações prestadas nesta Delegacia por CCC no sentido de que foi “importunada” durante o voo acima mencionado por comissário “careca e com bigode”, necessitamos a identificação e qualificação do mesmo para ser inquirido em momento posterior».
*
Considerou ainda a Mma. Juíza do Tribunal a quo que os demais artigos do articulado (passe a redundância) de motivação de despedimento apresentado pela Ré, contêm matéria conclusiva, meras considerações ou de direito.
*
· Da impugnação de matéria de facto
· (…)

Improcede, pois, a impugnação de matéria de facto deduzida no recurso em causa.
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Fundamentos de direito
Fixada a matéria de facto a considerar no presente caso, face à improcedência da impugnação deduzida pela Ré/apelante em termos de matéria de facto, pelas razões anteriormente expressas, importa, agora, passar à apreciação da suscitada questão de direito.
Assim:
· Da invocada ocorrência de justa causa para o despedimento do Autor/apelado, em face da matéria de facto assente e do direito aplicável
A este respeito alega e conclui, muito em síntese, a Ré/apelante que, tendo em conta a matéria de facto provada, os factos descritos constituem condutas inadmissíveis por qualquer cidadão e muito menos quando praticados por um trabalhador no seu local e tempo de trabalho relativamente a clientes da sua entidade patronal, pelo que não podia deixar de se concluir que o Autor desrespeitou gravemente os seus deveres funcionais, podendo mesmo a sua conduta vir a configurar um ilícito criminal, atenta a intenção subjacente àquela conduta, à participação da passageira ofendida e ao processo de inquérito em curso na Justiça Brasileira.
Alega ainda que ficou claramente demonstrada a impossibilidade da subsistência da relação laboral entre as partes, uma vez que o Autor fez tábua rasa de todos os limites que, segundo os ditames da confiança e da boa-fé, seriam razoáveis esperar no âmbito de uma relação contratual onde o elemento fiduciário é preponderante para a subsistência do vínculo, pelo que o despedimento daquele foi proporcional à gravidade dos factos por ele cometidos e à impossibilidade da subsistência da relação laboral, sendo, desse modo, lícito.
A propósito da mesma questão, escreveu-se, a dado passo, na sentença recorrida o seguinte:
«A questão que se coloca é, se com este comportamento o autor, violou algum dever que o autor enquanto trabalhador designadamente como o imputa a ré os previstos nas alíneas c) e f) do n.º 1 do artigo 128º CT.
Ora, perante os factos imputados e provados acima descritos, entende-se que conduta do autor não consubstancia a violação de qualquer um destes deveres.
Na verdade, perante os factos provados, tendo em conta o teor da conversa com a referida passageira não nos parece que tal comportamento possa pôr em causa a imagem da Empresa ré. A questão que pode suscitar maior dúvida é a solicitação do autor à passageira Isabela do seu número de telemóvel bem como o facto de aquela ter 17 anos, sendo menor de idade. Contudo, resulta que quando tal solicitação foi feita o autor desconhecia a idade da passageira e que, sabendo-a, nada mais consta da nota de culpa. Tudo isto por dizer que sabendo a idade da passageira não resulta dos autos que o autor tivesse dado continuidade a qualquer contacto com aquela.
A ré, certamente na sequência da decisão por proferida em sede cautelar e, de certa forma procurando refutar o que ali se diz, alega no artigo 45º da contestação que, “[O]s comportamentos adoptados não poderiam ser justificados ou admissíveis se a passageira fosse maior”.
Concordando em abstracto com a ré, diremos nós, que no caso concreto é a ré que chama à colação a idade da passageira quando a refere na nota de culpa. E, como diz agora a ré, não relevasse, bastaria imputar ao autor o facto ter abordado uma passageira da forma que o fez sem que a sua idade fosse mencionada. Agora o que a ré não pode, é querer o melhor dos dois mundos, designadamente que a idade seja ponderada para agravar o comportamento do autor mas que, em face da mesma, não possa o Tribunal ponderar o comportamento do trabalhador após ter conhecimento dessa mesma idade.
Obviamente que a idade releva no caso. Mas isto não quer dizer que, sendo a passageira maior de idade, tal abordagem não pudesse ser perturbadora, dependendo designadamente das circunstâncias concretas. Mas voltamos a dizer, quem trouxe à colação a idade da passageira foi a ré e não o Tribunal que se limita a apreciar os factos e circunstâncias alegadas e, no caso, uma delas respeita à menoridade da passageira à data dos factos e o desconhecimento desse facto pelo trabalhador. E, apenas neste contexto, se ponderou o comportamento do após ter conhecimento daquele facto. Mas daqui não pode concluir-se (e é até abusivo fazê-lo), como o faz a ré, que o Tribunal considera que se a passageira fosse maior de idade tudo era permitido. E, repita-se, quem trouxe à colação a idade da passageira foi a ré pretendendo com isto atribuir uma maior gravidade ao comportamento do trabalhador.
Assim, compete ao Tribunal aferir se o autor violou com o seu comportamento algum dever que sobre si impendia enquanto trabalhador da ré.
E, julgamos, que não o fez. Com efeito, não reputamos o comportamento do requerente como violador quer do dever de diligência e zelo, nem do dever de lealdade.
Mas concebermos que o comportamento adoptado pelo trabalhador consubstancia a violação de algum desses deveres, seria o dever de zelo e diligência no sentido de podermos considerar que foi displicente ao abordar a passageira nos termos em que o fez e também na violação do dever de respeito para com terceiros que se relacionam com a empresa ré.
Importa ainda dizer que, alude a ré no seu articulado os efeitos do comportamento do trabalhador na imagem da ré pondo enfase na queixa-crime apresentada contra aquele pela passageira e o ofício remetido pela Polícia Federal à ré.
Contudo, não se pode da mera circunstância de um passageiro fazer uma queixa crime contra um tripulante concluir que esse facto lesa a imagem da empresa ré, sendo necessário concretizar e, refira-se que dever ser feito em sede de processo disciplinar, os factos concretos em que se consubstanciou essa lesão.
Mas ainda que, reputando por hipótese o comportamento do trabalhador como displicente e, por isso, negligente na execução das suas tarefas bem como violador do dever de respeito para com terceiros que se relacionam com a empresa, assume este gravidade bastante para tornar imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho com a entidade empregadora?
Ainda que concluíssemos pela violação de tais deveres, tal comportamento não é suficientemente grave para justificar a sanção do despedimento, a qual se mostra desajustada e desproporcionada, uma vez que outra, inferior, seria suficiente para sancionar o comportamento e repor o equilíbrio da relação laboral.
E se é certo que o trabalho deve ser realizado com zelo e diligência, não se nos afigura, que os actos em causa, a constituir infracção disciplinar, seja suficientemente grave a justificar o despedimento. Isto porque o comportamento do trabalhador tem que assumir gravidade suficiente que justifique a aplicabilidade da sanção do despedimento, a mais gravosa das sanções disponíveis.
Acresce que não resulta dos autos que ao autor tenham sido já aplicadas outras sanções disciplinares ainda que a sua antiguidade de acordo com os factos provados seja reportada ao ano de 2017. Estes factores que, em infracções e/ou culpabilidade do trabalhador muito graves devem ser preteridos, não poderão, deixar de ser, em cada caso, ponderados e sopesados no juízo a fazer designadamente quanto à adequação, proporção e justiça da sanção.
Assim, ainda que considerássemos configurar o comportamento do autor uma infracção disciplinar, a ré empregadora dispunha de um leque de outras sanções conservatórias do vínculo, pelo que sempre nos afiguraria manifestamente desadequada e desproporcional sobretudo face à gravidade dos factos e das suas consequências mas também pela ausência de ilícitos disciplinares do autor, não obstante a sua antiguidade.
Assim se considerando dúvidas não restam que o despedimento é ilícito (art. 382º n.º 1 CT)».
Vejamos se se decidiu com acerto!
Dado que os factos imputados pela Ré ao Autor e com base nos quais este foi despedido por aquela ocorreram em julho de 2018, a análise da suscitada questão de recurso deverá ser feita à luz do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009 de 12-02.
No entanto e antes de mais, importa ter presente que logo no art. 53º da Constituição da República Portuguesa se estipula que «[é] garantida aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa…».
Uma das modalidades de cessação do contrato de trabalho é, sem dúvida, a levada a efeito pelo empregador mediante o despedimento por facto imputável ao trabalhador [art. 340º al. c) do CT], despedimento que, para se poder considerar lícito, deve ser apreciado em sede de procedimento disciplinar válido, movido contra o trabalhador dentro dos prazos a que se alude nos n.ºs 1 e 2 do art. 329º do CT e desde que se conclua pela verificação de uma justa causa para esse efeito [v. arts. 351º a 358º e art. 381º als. b) e c) e 382º, todos do CT].
Ora, importa ter presente que, nos termos do disposto no art. 351.º n.º 1 do Código do Trabalho, «[c]onstitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho».
Todavia, como sempre afirmamos na apreciação deste tipo de questões, não basta a demonstração da ocorrência de um qualquer comportamento culposamente assumido pelo trabalhador, que se mostre violador de regras ou deveres que este deva respeitar no relacionamento laboral que mantenha com a sua entidade empregadora, para que, de imediato, se deva concluir pela verificação de justa causa para despedimento do trabalhador. Com efeito, para que tal possa suceder, mostra-se necessário que, cumulativamente, se verifiquem os seguintes pressupostos ou requisitos:
a) Que o comportamento assumido pelo trabalhador seja culposo, na medida em que dolosa ou negligentemente praticado pelo mesmo (requisito subjetivo);
b) Que tal comportamento, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação contratual de trabalho existente entre o trabalhador e o empregador (requisito objetivo);
c) Que se verifique um nexo de causalidade entre a assunção de tal comportamento e uma imediata e prática impossibilidade de subsistência dessa relação contratual laboral (motivo determinante).
A justa causa de despedimento pressupõe, portanto, a ocorrência de uma determinada ação ou omissão imputável ao trabalhador a título de culpa (isto na medida em que tendo capacidade para tal, impunha-se-lhe a assunção de comportamento bem diverso), ação ou omissão violadora de regras ou deveres emergentes da lei, de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável ou do vínculo contratual laboral estabelecido entre si e o empregador e que essa violação seja de tal modo grave em si e pelas suas consequências que torne imediata e praticamente impossível a manutenção desse vínculo contratual.
Por outro lado, quer a culpa, quer a gravidade da violação de tais deveres, devem ser apreciadas segundo critérios de objetividade e de razoabilidade, de acordo com o entendimento e a diligência de um empregador normal, colocado em face do caso concreto, ou seja, na posição do real empregador, sendo que, quanto à impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho e citando-se, entre outros, o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21-11-2012[1], haverá que considerar que a mesma se verifica «… sempre que, na análise diferencial concreta dos interesses em presença se conclua – num juízo de probabilidade/prognose sobre a viabilidade do vínculo, basicamente dirigido ao suporte psicológico e fiduciário que a interacção relacional pressupõe – que a permanência do contrato constitui objectivamente uma insuportável e injusta imposição ao empregador, ferindo, desmesurada e violentamente, a sensibilidade e liberdade psicológica de uma pessoa normal colocada na posição do real empregador», e, nessa medida, se justifica a adoção do despedimento-sanção.
Por outro lado, como refere Pedro Furtado Martins em «Cessação do Contrato de Trabalho» 3ª edição, pag.ª 170, «[é] pois necessário reconduzir os factos que estão na base da justa causa – o «comportamento culposo do trabalhador» – a uma dada situação; a situação de «impossibilidade de subsistência da relação de trabalho». Impossibilidade entendida não em sentido material, mas em sentido jurídico e como sinónimo de inexigibilidade: a verificação da justa causa pressupõe que não seja exigível ao empregador que prossiga a relação», como sucederá, designadamente, quando os factos levem a concluir pela verificação de uma situação de absoluta quebra de confiança entre o empregador e o trabalhador, suscetível de criar no espírito daquele a legítima dúvida sobre a idoneidade futura da conduta deste último, deixando, desse modo, de existir um suporte psicológico mínimo para o normal desenvolvimento da relação laboral entre ambos, ou, então, quando, desde logo, se deva concluir pela verificação de uma situação de tal modo grave, em si e pelas suas consequências, que se revele como inadequada a adoção, pelo empregador, de uma das outras sanções disciplinares colocadas, por lei (art.º 328º do aludido CT), à sua disposição e que, embora conservem ou mantenham o vínculo contratual existente entre as partes, não deixam de ser punitivas ou corretivas do comportamento violador de regras ou deveres laborais culposamente assumidos pelo trabalhador. É que de acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 330º ainda do Código do Trabalho, a sanção disciplinar deve ser proporcional à gravidade da infração e à culpabilidade do trabalhador infrator.
Finalmente, importa considerar que, conforme se estipula no n.º 3 do mencionado art. 351º do Código do Trabalho, «[n]a apreciação da justa causa deve atender-se, no quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes … e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes».
Posto isto e revertendo ao caso em apreço, resulta da matéria de facto provada haver-se demonstrado que o Autor desempenhava as funções correspondentes à categoria profissional de «Comissário de Bordo» integrado no Pessoal de Cabina da Direção das Operações de Voo, conforme o planeamento de voos mensais que lhe eram atribuídos e que, no dia 28 de julho de 2018, integrou a tripulação que prestou assistência ao voo (…), com origem no Porto e com destino a São Paulo, Brasil (v. matéria que consta dos pontos 10 e 11 dos factos provados).
Provou-se, por outro lado, que a determinada altura desse voo, depois do serviço de bordo e de vendas ter terminado, o Autor iniciou um diálogo com a passageira CCC, na altura com 17 anos de idade, que viajava sozinha no lugar (…) e, no decurso da conversa, o Autor perguntou à referida passageira se não se importava que ele ligasse o monitor do lugar 42B, a fim de, alegadamente, monitorizar o tempo de voo, aproveitando a oportunidade para perguntar se estava de férias e se já tinha visitado Lisboa, assim como para ver as fotografias das férias de verão da passageira (v. matéria que consta dos pontos 12 e 13 dos factos provados).
Provou-se também que depois do período de descanso, quando foi verificar o tempo de voo, o Autor voltou à conversa com a mencionada passageira, tendo apostado com ela que quem não acertasse na hora de chegada, teria de pagar uma água de coco no dia seguinte, sendo que, então, o Autor pediu o número de telefone da passageira, salientando que gostava do facto de ela viajar sozinha, e mais tarde, em conversa, perguntou-lhe a idade, tendo a passageira respondido que tinha 17 anos e que pretendia estudar medicina (v. matéria que consta dos pontos 14 e 15 dos factos provados).
Demonstrou-se, para além disso, que quando o voo terminou, a passageira CCC, dirigiu-se à delegacia especial da polícia federal, no aeroporto de São Paulo/Guarulhos, onde apresentou queixa-crime contra o Autor, com fundamento em “importúnio” (v. matéria que consta do ponto 16 dos factos provados).
Embora em 1ª instância se tenha dado por provada a matéria de facto que figura do ponto 17 dos factos tidos por provados na sentença recorrida, matéria cujo teor aqui se dá por reproduzido, não poderá a mesma ser levada em consideração na análise da questão da justa causa de despedimento colocada à apreciação deste Tribunal, na medida em que essa matéria não figura da nota de culpa que foi dirigida ao aqui Autor/apelado em sede de procedimento disciplinar que lhe foi movido pela Ré/apelante e no âmbito do qual viria a ser despedido e tendo em consideração os limites impostos pela conjugação dos já mencionados artigos 357º n.º 4 (parte final) e 387º n.º 3, ambos do C.T. e 98º-J n.º 1 do C.P.T.
Finalmente demonstrou-se que a Policia Federal Brasileira remeteu à Ré o ofício, datado de 28 de Julho de 2018, junto a fls. 46 do processo disciplinar apenso e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido, constando do mesmo que, «[d]evido a declarações prestadas nesta Delegacia por CCC no sentido de que foi “importunada” durante o voo acima mencionado por comissário “careca e com bigode”, necessitamos a identificação e qualificação do mesmo para ser inquirido em momento posterior».
Ora, perante o conjunto da matéria de facto provada e tendo em consideração o tipo de atividade de «Comissário de Bordo» desenvolvida pelo Autor ao serviço da Ré, com as características que devem ser as apropriadas ao normal desempenho da mesma e os interesses subjacentes à operação da Ré, enquanto transportadora aérea de bandeira no transporte de passageiros, em concorrência, ao mais alto nível, com diversas outras empresas de voos comerciais similares, não poderemos deixar de entender todo o descrito comportamento assumido pelo Autor/apelado em relação à passageira CCC no voo (…) que se realizou em 28 de julho de 2018 – comportamento culposo já que tendo aquele a capacidade e a obrigação de se comportar de modo bem diverso, a verdade é que optou por não o fazer – como grave em si mesmo e pelas suas consequências, isto tendo em consideração não só as obrigações profissionais decorrentes do desempenho da referida função de «Comissário de Bordo», as quais consistem em prestar assistência aos passageiros transportados nos aviões da Ré, proporcionando-lhes uma viagem em segurança e tão confortável quanto possível, como também, tendo em consideração os fortes interesses comerciais desta enquanto transportadora aérea de passageiros, realidade que o Autor não poderia olvidar enquanto no desempenho das suas funções.
Na verdade, no nosso entendimento, fosse qual fosse a idade da passageira em causa, de forma alguma se pode entender como adequada ou normal a abordagem que, pelo menos por três vezes, lhe foi feita pelo aqui Autor durante o mencionado voo e enquanto no desempenho das suas funções de «Comissário de Bordo» ao serviço da Ré, sendo assaz relevantes os termos em que essa abordagem foi feita, ou seja, a completo despropósito por quem tem por missão a de prestar uma assistência em viagem isenta de quaisquer reparos aos passageiros transportados pela sua empregadora, comportamento que, em si e ao invés disso, se mostra revelador de todo um nítido intuito da parte do Autor em estabelecer com a passageira CCC, pessoa jovem e a viajar sozinha, um contacto mais próximo e um relacionamento pessoal após o “términus” da viagem.
É certo que a referida matéria de facto também indicia que, em determinado momento do contacto do Autor com a referida passageira, esta terá como que alimentado, de alguma forma, aquele intuito do Autor, permitindo-lhe, designadamente e ao que tudo indica, a visualização das suas fotografias de férias de verão. Contudo, nunca o Autor poderia esquecer as funções de «Comissário de Bordo» que, no momento, se encontrava a desempenhar ao serviço da Ré, as quais lhe não permitiam o tipo de abordagens à aludida passageira que também decorrem da mencionada matéria de facto, sendo certo que o comportamento do Autor acabou por levar a que a passageira em causa se sentisse importunada e a, terminado o voo, dirigir-se à Delegacia Especial da Polícia Federal existente no Aeroporto de São Paulo/Guarulhos, local onde apresentou queixa-crime contra o Autor com fundamento no “importúnio” causado por este durante a referida viagem, circunstância que, posteriormente, levou a Polícia Federal Brasileira a dirigir à Ré o ofício de que se dá conta no ponto 19 dos factos provados.
Deste modo e contrariamente ao entendimento a que se chegou na 1ª instância, afigura-se-nos que todo o comportamento, com aspetos bastante inusitados, assumido culposamente pelo Autor/apelado em relação à mencionada passageira no voo (…) realizado no referido dia 28 de julho de 2018, se mostra, em si mesmo e ainda pela circunstância de causar sempre mossa nos padrões de prestígio ou bom nome sempre almejados pela empresa Ré/apelante ao ser alvo de contactos pela Polícia Federal Brasileira na sequência desse comportamento, de gravidade suficiente para nos levar a concluir pela verificação de uma absoluta quebra de confiança da Administração da empresa Ré em relação à futura postura do Autor no desempenho das suas funções de «Comissário de Bordo», porquanto se trata de um comportamento suscetível de criar no espírito daquela uma legítima dúvida sobre a idoneidade da conduta deste em relação a passageiros que futuramente viajassem nos seus aviões em circunstâncias idênticas às da passageira aqui em causa, deixando, desse modo, de existir o suporte psicológico mínimo por parte da Administração da Ré para manter um normal desenvolvimento da relação contratual laboral estabelecida com o Autor.
Mostra-se, pois e a nosso ver, justificada a sanção disciplinar de despedimento do Autor por parte da Ré, procedendo, nesta parte, o recurso interposto por esta, com as consequências daí decorrentes, quais sejam, as de se concluir pela licitude desse despedimento.
DECISÃO
Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social deste Tribunal da Relação de Lisboa em:
A) Julgar improcedente a impugnação de matéria de facto deduzida pela Ré/apelante;
B) Julgar procedente o recurso de apelação interposto por esta e, em consequência, declarando lícito o despedimento do Autor AAA levado a efeito por parte da Ré BBB., decidem revogar a sentença recorrida, absolvendo a Ré da pretensão deduzida pelo Autor.
Custas a cargo do Autor/apelado em ambas as instâncias.
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Lisboa, _2019/07/11
                                              
José António Santos Feteira (Relator)
Filomena Maria Moreira Manso
José Manuel Duro Mateus Cardoso

[1] Proc. n.º 686/07.5TTPRT.P1.S1, igualmente acessível em www.dgsi.pt.
Decisão Texto Integral: