Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
972/17.6T8VFX.L1-2
Relator: MARIA JOSÉ MOURO
Descritores: EXCLUSÃO DE SÓCIO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/07/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – O CSC comporta uma cláusula geral de exclusão de sócio na sociedade por quotas, a exclusão judicial prevista no seu art. 242, dependendo a mesma da verificação de dois pressupostos: quanto ao sócio um comportamento desleal ou francamente perturbador do funcionamento da sociedade; quanto à sociedade prejuízos relevantes, efectivos ou possíveis.
II - Sendo ainda sócio da A., praticando embora actos tendentes a deixar de o ser ou a passar a ter outra situação social, o R. constituiu outra sociedade (da qual é gerente) para desenvolvimento de actividade similar à da A. – logo desenvolvendo com esta actividade concorrente.
III – No que concerne aos sócios não gerentes das sociedades por quotas, em regra não estão os mesmos sujeitos a um dever de não concorrência; a concorrência não constituirá por si só, desacompanhada de factos que a qualifiquem nesse sentido, um comportamento desleal por parte do sócio, integrando a previsão da cláusula geral constante do nº 1 do art. 242 do CSC.
IV – No caso dos autos não estamos nem perante concorrência ilícita nem perante concorrência desleal e considerando o comportamento do R. enquanto sócio da A. (e não enquanto trabalhador subordinado da mesma) não temos factos suficientes para caracterizar um comportamento do R. violador do dever de lealdade para com a sociedade A..
V – Acresce que não resulta dos factos provados que o comportamento do R., na sua qualidade de sócio, haja sido gravemente perturbador do funcionamento da sociedade.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Cível (2ª Secção) do Tribunal da Relação de Lisboa:
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I - «T..., Lda.» intentou acção declarativa com processo comum - acção de exclusão de sócio - contra N....
Alegou a A., em resumo:
A A. é uma sociedade por quotas que tem como objecto social a “formação profissional na área técnica e tecnológica, prestação de serviços de consultoria, não jurídica, às empresas na referida área. Desenvolvimento de Software”. Com o capital social de € 2.000,00 a A. tem dois sócios: a sociedade «E..., Lda.», titular de uma quota no valor de € 1.800,00, e o R., titular de uma quota de € 200,00.
Para além de ser sócio da A. o R. desempenhou naquela o cargo de gestor de empresa, desde a constituição da sociedade.
O R. comunicou a denúncia do seu contrato de trabalho, com efeitos a partir de 30 de Setembro de 2016. Referiu na ocasião estar disponível para a venda da sua quota, bem como apresentou proposta para a aquisição da totalidade das quotas da A., o que não se veio a concretizar. Entretanto o R. antecipou a data dos efeitos da sua demissão para o dia 12 de Setembro de 2016.
Alguns trabalhadores da A. cessaram o vínculo laboral com a mesma e por comunicação electrónica enviada no dia 22-12-2016, E..., representante da N..., S.A., comunicou à gerência da A. que esta empresa deixaria de colaborar com a mesma. A A. teve conhecimento que o R. havia apresentado à N..., S.A. uma nova empresa para prestar serviços em substituição da A., apresentando melhores preços e condições, bem como que o R. já tinha concedido à N..., S.A., por conta da nova empresa, os programas e a plataforma de exames que a A. tinha criado e que usava na prestação dos seus serviços, razão pela qual a N..., S.A. optou por passar a trabalhar com a nova empresa do R., em detrimento da A..
Em 19-9-2016, o R. constituíra uma sociedade por quotas denominada «B..., Lda.» a qual tem como objecto social a prestação de serviços de auditoria, consultoria e desenvolvimento de aplicações técnicas, tecnológicas e informáticas, formação técnica, comercial e comportamental, tratamento e transcrição de suportes de áudio e vídeo. O R. é sócio gerente desta sociedade detendo 80% do capital social. No site http://www.o....com/ consta que o R. é manager da marca/empresa O..., sendo que ex-colaboradores da A. integram a equipa da O..., havendo o R. aliciado e contratado colaboradores da A. que tinham posição fulcral na sua actividade, impedindo-a de prestar os serviços com a mesma celeridade e excelência com o que tinha feito até então.
A constituição da sociedade «B..., Lda.» e da marca O... ocorreu em articulação e com o intuito de desenvolver a mesma actividade da A., fazendo uso de clientes subtraídos, apropriando-se o R. não só de clientes da A. como de produtos e serviços por ela desenvolvidos.
O R. ao abandonar as suas funções laborais levou consigo todo o material comercial que estava ao seu alcance, apropriando-se de programas informáticos e plataformas de trabalho, brochuras, informação comercial, base de clientes e preçários. A O... passou a utilizar na promoção da sua actividade comercial material comercial igual ao da Autora e criado por esta; o objectivo do R. era o de subtrair clientela e conquistar o mercado de trabalho da A..
A imagem de grande profissionalismo e confiança junto dos clientes que a A. possuía foi denegrida pelo R. que manchou o seu bom nome e reputação numa área de mercado e de negócio onde ela já tinha o seu lugar consolidado.
O R. desviou o principal cliente da A., a empresa N..., S.A., sendo que a não continuidade do trabalho com a empresa N..., S.A. conduziu a um prejuízo patrimonial para a A. de valor não inferior a € 64.611,51 por ano.
O R. está a utilizar ao serviço das novas empresas que criou o know how da A. e o segredo do seu negócio, disponibilizando informação e programas criados pela A. e os termos e condições da sua utilização.
O R. causou a desvalorização das quotas sociais da empresa, tendo estas actualmente um valor muito inferior ao que detinham antes.
A A. deliberou a exclusão do R..
Concluiu a A. que o R. agiu em prejuízo da A., que lhe subtraiu clientela essencial ao seu bom funcionamento socorrendo-se de meios desleais para o fazer, e que associando-se o dever de lealdade à obrigação de não concorrência, o R. violou esta obrigação, causando prejuízos à A..
Pediu a A. a exclusão do sócio aqui R., bem como a condenação deste no pagamento à A. de uma indemnização, a título de danos patrimoniais, no valor de € 64.611,51, acrescido das quantias que vierem a ser apuradas em sede de execução de sentença, respeitante aos prejuízos sofridos em virtude da concorrência desleal, aproveitamento de informação, programas e documentação da empresa, incluindo a plataforma para exame, subtracção do principal cliente da Autora, desvalorização de quotas, por todas as perdas e danos e no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais a arbitrar pelo tribunal, tudo acrescido de juros de mora até efectivo e integral pagamento.
O R. contestou. Invocou a prescrição do direito de exclusão judicial de sócio dizendo que a A. teve conhecimento integral dos factos que invoca como fundamento da exclusão desde finais de Setembro de 2016, ocorrendo a prescrição no prazo de 90 dias a contar desse conhecimento. Impugnou, também, factos alegados pela A. apresentando deles uma diversa versão.
Concluiu pela procedência da excepção e pela improcedência da acção.
O processo prosseguiu vindo a ser proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:
«1 - Julgo improcedente a excepção de prescrição do direito de exclusão judicial do Réu de sócio da Autora.
2 - Julgo totalmente improcedente, por totalmente não provada, a presente acção e absolvo o Réu do pedido de exclusão de sócio da Autora e do pedido da sua condenação no pagamento de uma indemnização à Autora».
Apelou a A., concluindo nos seguintes termos a respectiva alegação de recurso:
1. Erra o Tribunal a quo na decisão sobre a matéria de facto constante da segunda parte do ponto 42 e sobre a matéria de facto que constante dos pontos 43 e 44 da Sentença recorrida, pois não reflete a prova produzida em julgamento.
2. Com efeito, relativamente à matéria de factos contantes do ponto 42 da Decisão recorrida, concretamente, que“(…) em simultâneo com a Autora, que estava a dar formação ao mesmo cliente, numa sala contígua”, não existe qualquer elemento probatório que permita dar como provada esta parte da matéria de facto,
3. Nenhuma testemunha conseguiu afirmar que em outubro quando o Autor deu formação nas instalações do cliente N..., S.A. por conta da sociedade B..., Lda. a Autora estivesse a dar formação nesse cliente.
4. O único facto provado, como nessa parte decidiu bem o Tribunal a quo, foi que o em Outubro de, o Réu esteve a dar formação nas instalações do cliente N..., S.A., representando a sociedade B..., Lda.
5. Atenta, a ausência de prova, confirmada pela própria fundamentação da sentença recorrida, pelo que se impõe alterar tal decisão, dando-se aquela parte da matéria de facto como não provada.
6. Relativamente à matéria de facto constante do ponto 43 dos factos provados da Decisão recorrida, “Nos primeiros contactos dos gerentes da Autora com o cliente N..., S.A.
Comunicações S.A. foi sendo dito inúmeras vezes que a Autora era uma empresa certificada para executar formação profissional, o que não correspondia à verdade.”, cumpre dizer que, igualmente, não existe prova de tal factualidade.
7. Ao contrário do sufragado na sentença recorrida, não resulta provada, tal matéria de facto, do depoimento da testemunha E..., conforme se verifica pela transcrição supra citado, nas alegações deste recurso.
8. A testemunha E... relatou que o primeiro contacto que teve foi com a E..., Lda. que decidiu constituir a Autora para trabalhar com o cliente N..., S.A.
9. Referindo essa mesma testemunha conforme depoimento supracitado, nas alegações deste recurso, que os primeiros contactos foram estabelecidos com L... e o Réu, ao contrário da factualidade dada como provada.
10. Não resultando do depoimento daquela testemunha que a Autora nos primeiros contactos tenha faltado à verdade quanto à certificação para prestar formação profissional.
11. Acresce que, a certificação que é discutida nestes autos não é a certificação para prestar formação profissional.
12. Nestes autos, quando se falou em certificação, estava-se a falar sempre em certificação dos cursos pela DGERT, o que não se pode confundir com certificação para executar formação profissional, conforme resulta demonstrado dos depoimentos supra
transcritos.
13. Erra, assim, de forma notória, o Tribunal a quo, ao dar como provada a factualidade constante do ponto 43 dos factos provados,
14. Pois, resulta do depoimento desta mesma testemunha E..., gravada e citada nas alegações supra, que ele enquanto cliente N..., S.A. sabia que a Autora estava a tratar da certificação, que era um processo que demorava algum tempo, pelo que se impõe dar este facto como não provado.
15. Dos Factos constantes do ponto 44 dos factos provados da Decisão recorrida, concretamente, que Em Agosto de 2016, o Réu, não querendo continuar a pactuar com essa desconformidade com o cliente N..., S.A., até porque à data já tinham uma relação de grande proximidade e confiança, decidiu pôr fim ao seu contrato de trabalho com a Autora.”, cumpre referir que erra manifestamente o Tribunal a quo na apreciação da prova, uma vez que
16. Não existe qualquer prova de tal factualidade.
17. Da análise do depoimento da testemunha E..., única testemunha e elemento probatório citado na fundamentação desta decisão, resulta claro que esta testemunha desconhece o motivo que levou o Réu a pôr fim ao seu contrato de trabalho com a Autora.
18. Pois, na verdade, quando questionado diretamente, a testemunha E... disse que não sabia os motivos de tal decisão.
19. Deste modo, não existe qualquer prova que permita dar como provado o facto constante do ponto 44 dos factos provados, pelo que se impõe alterar tal decisão dando-se como não provado.
20. Tanto mais, que o Réu continua a prestar os serviços para o cliente N..., S.A., por conta da B..., Lda. nos mesmos moldes em que a Autora vinha prestando,
21. Ou seja, sem a certificação da DGERT que invocou ser o motivo da cessação do seu contrato de trabalho com a Autor e ser uma “desconformidade com a qual não queria pactuar”.
22. Com efeito, ao contrário do sufragado na página 23 da sentença, ficou provado nestes autos que o problema da certificação se mantém com a nova sociedade do Réu a B..., Lda./O..., que, também, não tem a certificação da DGERT.
23. Tal ficou provado, quer pelas declarações e depoimento de parte do Réu, quer pelo depoimento da testemunha E..., transcritas nas alegações do presente recurso.
24. Não se pode, assim, aceitar a decisão do Tribunal a quo, quanto ao ponto 44 da matéria de facto provada, que se impõe dar como não provada.
25. O Tribunal a quo não deu como provados factos relevantes para a decisão da presente causa, pelo que se impõe corrigir, também, essa parte da decisão sobre a matéria de facto, alterando-se em conformidade com a prova produzida.
26. Com efeito, impunha-se ao Tribunal a quo ter dado como provado os constantes na primeira parte do art. 32º e no art. 33º da petição inicial: “ Que o Réu, perante a proposta da gerência da Autora no sentido de agendar uma reunião com o cliente N..., S.A., tivesse protelado o agendamento da referida reunião.” E, “ Que, a partir do dia 12/09/2016, o Réu tivesse recusado categoricamente todas as tentativas de agendamento da reunião com o cliente N..., S.A.e tivesse alegado não ter agenda para o efeito.”
27. Pois, tal factualidade resulta provada pelas próprias declarações do Réu e pelo depoimento das testemunhas I... e E..., transcritas supra nas alegações.
28. Impondo-se, também, dar como provados os factos constantes da primeira parte do art.56º da Petição Inicial, que o Réu aliciou os colaboradores da Autora, uma vez que
29. Ao contrário da fundamentação constante da sentença recorrida, resulta provado pelas declarações e depoimento de parte do Réu, conjugadas com o depoimento da
testemunha I... e MS..., supra transcritos, que efetivamente o Réu aliciou.
30. Deste modo, dúvidas não devem existir que andou mal o Tribunal a quo na decisão sobre este ponto da matéria de facto, pelo que se impõe alterar e dar como provada tal factualidade, quanto ao aliciamento, uma vez que quanto à contratação o Tribunal deu corretamente como provada tal factualidade, conforme facto provado n.º 26.
31. Errou, igualmente, o Tribunal a quo ao não dar como provados os factos constantes do art. 34º e 53º da Petição Inicial: “Os trabalhadores da Autora cessaram o vínculo laboral com a mesma” e que “O colaborador I... informou a Autora da sua intenção de denunciar o seu contrato de trabalho, tendo formalizado a intenção por escrito no dia 28 de setembro de 2016.”
32. Pois, tal factualidade ficou provada pelo depoimento da testemunhal I... que se citou supra, nas alegações deste recurso, e pelo documento n.º10 junto com a petição inicial, a folhas dos autos, documento não impugnado.
33. Assim, estes dois elementos probatórios impõe dar como provada a referida matéria de facto incorretamente julgada pelo Tribunal a quo.
34. Mais se diga, que igualmente, errou o Tribunal a quo na decisão sobre a matéria de factos constante do art. 57º, 71º, e 76º da Petição Inicial, que se impõe dar como
provada,
35. Concretamente, dar como provado o “Que o Réu impediu a Autora de prestar os serviços com a mesma celeridade e excelência com o que tinha feito até então.”, “Que, em virtude da conduta do Réu, a Autora deixou de conseguir prestar o trabalho nos mesmos termos e condições em que o fazia até então.” e “Que a atuação do Réu tivesse vindo a incapacitar a Autora de desenvolver a sua atividade.”
36. Pois, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, a factualidade supracitada está provada pelos depoimentos das testemunhas I..., E... e L..., supra transcritos, nas alegações deste recurso.
37. Devendo, também, aqui ser corrigida a sentença recorrida, dando-se estes factos como provados,
38. Tal como, a matéria de facto constante da última parte do art. 58º, 59º, 63º, 64º e 86º todos da Petição Inicial,
39. Ou seja, “ Que a sociedade B..., Lda. faz uso de clientes subtraídos.”;“ Que o Réu se apropriou de clientes da Autora e de produtos e serviços desenvolvidos pela mesma.”, “ Que o Réu desviou o principal cliente da Autora, a empresa N..., S.A..”, “ Que o Réu teve o objetivo de subtrair clientela e conquistar o mercado de trabalho da Autora.” e que “ Que o Réu, para o desenvolvimento da sociedade B..., Lda., se encontre a utilizar informação privilegiada da Autora, em proveito próprio e dessa sociedade e da marca O....”.
40. Pois, estes factos estão provados pelas próprias declarações de parte do Réu e prova testemunhal supra transcrita e ainda documental.
41. Acresce, inclusive, que já está provado no ponto 23 dos factos provados da sentença recorrida que “A constituição da sociedade B..., Lda. e a marca O... ocorreu em articulação e com o intuito de desenvolver a mesma atividade da Autora.”
42. Resultando claro do depoimento supra transcrito da testemunha E..., que o “ Que o Réu, para o desenvolvimento da sociedade B..., Lda., se encontre a utilizar informação privilegiada da Autora, em proveito próprio e dessa sociedade e da marca O....”,
43. Pois, fez logo uso dessa informação privilegiada aquando da apresentação de proposta para trabalhar com o cliente N..., S.A., em nome da B..., Lda.. Lda., em substituição da Autora, conforme depoimento que citado, a que acresce todo o Know-How da Autora que utiliza em proveito desta sociedade.
44. A referida matéria de facto encontra-se provada, assim, pelo depoimento das testemunhas J..., I..., E... e L..., transcritos supra, pelo que
45. Verifica-se, indubitavelmente, que a sociedade B..., Lda. faz uso de cliente subtraído à Autora, concretamente, o cliente N..., S.A.
46. Mais se verifica, pela prova supracitada, que o Réu se apropriou e desviou o principal cliente da Autora, a empresa N..., S.A., fazendo uso de informação privilegiada, pelo que
47. Deve ser tal factualidade dada como provada, pois corresponde à conclusão lógica da apreciação da prova, conjugada com os factos dados como provados nos pontos 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 29, 30, 35, 40, 42 e 45 dos factos provados.
48. Quanto aos factos constantes dos artigos 61º, 62º, 84º e 85º todos da Petição Inicial, erra o Tribunal a quo ao não dar os mesmos como provados, uma vez que ficaram provados.
49. Com efeito, ficou provado que “Que o Réu se apropriou de programas informáticos e plataformas de trabalho, brochuras, informação comercial, base de clientes e
preçários.”, “Que a O... tenha passado a utilizar, na promoção da sua atividade comercial, material comercial igual ao da Autora e criado por esta, nomeadamente software de gestão de recursos humanos, elearning e plataforma de exames e formação de telecomunicações.”, “Que o Réu esteja a utilizar ao serviço da B..., Lda. o know how da Autora e o segredo do seu negócio, ao disponibilizar informação e programas criados por esta e os termos e conduções da sua utilização.” E “Que em virtude do acesso que tenha a todos os elementos de identificação dos clientes da Autora e à faturação e respetivas contas correntes, seja possível ao Réu obter uma posição de destaque na área comercial com a sua nova empresa e marca, com o consequente prejuízo para a Autora.”
50. Com efeito, tal resulta do depoimento gravado e transcrito supra, das testemunhas I..., E... e L....
51. Resultando provado que existe uma apropriação de informação comercial, base de clientes, preçário, todo o Know-how da Autora e segredo de negócio em benefício próprio e da nova sociedade que constituiu a B..., Lda., em detrimento da Autora.
52. E, que o Réu utilizou logo para efeitos de apresentação de proposta à N..., S.A. em nome da B..., Lda. as informações comerciais, segredo de negócio e preçários.
53. Utilizando todo o Know-how da Autora ao serviço e no interesse dessa nova sociedade B..., Lda., conforme prova supra citada e que se reitera, para alteração da decisão quanto a estes pontos da matéria de facto, que se impõe dar como provados.
54. Impõe-se, assim, dar como provada a factualidade supra citada e impugnada, atenta a prova produzida e transcrita nestes autos,
55. Pois, tendo o Réu, por conta e em nome da nova empresa que constituiu, com o mesmo objeto social, continuado a prestar o mesmo tipo de formação e serviço que a Autora prestava ao cliente N..., S.A., dúvidas não podem existir de que o mesmo fez e continua a fazer uso de todo o know how da Autora e de toda a informação comercial e segredo de negócio da mesma, que se aproveito para subtrair o referido cliente.
56. Quanto aos factos constantes da alínea 65º, 66º e 77º da Petição Inicial: “Que a B..., Lda. esteja a utilizar com o cliente N..., S.A.a mesma plataforma de exames desenvolvida pela Autora.”, “Que seja impossível que o Réu tivesse desenvolvido uma nova plataforma de exames, com as mesmas características, em tão curto período de tempo.” e “Que a plataforma para exames da Autora tivesse tido um custo inicial de € 10.000,00, a que acrescem os custos da manutenção.”, foram incorretamente julgados,
57. Igualmente, se diga que os mesmos resultam provados pelo depoimento transcrito supra, da testemunha E..., na sessão de julgamento de dia 18.10.2017, que afirmou que em Outubro o Réu usou a plataforma da Autora.
58. Impõe, assim, a prova testemunhal supra citada dar como provado, que “Em outubro o Réu, por conta da B..., Lda. utilizou com o cliente N..., S.A.a mesma plataforma de exames desenvolvida pela Autora.”
59. Quanto aos outros dois pontos da matéria de facto verifica-se da análise de toda a prova testemunhal, que está provado que era impossível fazer uma plataforma similar à da Autora em tão curto espaço de tempo, tanto mais que o Réu não conseguiu provar a autoria dessa plataforma, quem a criou, uma vez que
60. Quanto a esse facto, os depoimentos foram todos contraditórios, conforme nas alegações se demonstra, não tendo nenhuma testemunha corroborado o que o Réu afirmou, em que foi ele quem a construir sozinho aquela plataforma de gestão de e-learning no espaço de 24 dias, 25”.
61. Pelo que, atenta a prova supra citada, conjugada com o depoimento da testemunha M..., prestado na sessão de julgamento de 25.10.2017, transcrito supra, considera-se que deve ser dada como prova esta matéria de facto.
62. Pois, esta testemunha foi bem clara no seu depoimento, tendo de demonstrado de forma coerente e segura que é impossível desenvolver nova plataforma de exames, de raiz, em tão curto espaço de tempo, conforme transcrito supra.
63. Quanto aos factos constante dos artigos 70º, 72º, 73º, 74º e 75º da Petição Inicial: “ Que o Réu tivesse denegrido a imagem da Autora para com o cliente N..., S.A.e restantes clientes.”, “ Que o Réu tivesse criado a convicção no cliente N..., S.A. de que a Autora não possuía capacidade para continuar a prestar os serviços, e que prejudicasse irremediavelmente a imagem da Autora.”, “ Que o Réu tivesse manchado o bom nome e reputação da Autora numa área de mercado e de negócio onde a mesma já tinha o seu lugar consolidado.” E “ Que a atuação do Réu tenha prejudicado e continue a prejudicar o bom nome e imagem da Autora.”, considera-se, igualmente, que o tribunal errou ao não dar como provados,
64. Pois tal factualidade resulta provada pelos depoimentos transcritos supra, a respeito da matéria de facto constante do ponto onde conata a matéria do art. 57º da petição inicial e ainda por outros excertos transcritos supra do depoimento da testemunha E…
65. Tendo, ficado demonstrado de forma inequívoca que o Réu criou a convicção no cliente N..., S.A. de que a Autora não possuía capacidade para continuar a prestar os serviços, prejudicando irremediavelmente a sua imagem, suscitando suspeitas relativamente à certificação, para assim conseguir subtrair o principal cliente da Autora, para a sua nova empresa, a quem presta os mesmos serviços e nos mesmos moldes propostos pela Autora, nomeadamente com o mesmo tipo de certificação, conforme demonstrado pela prova citada supra quanto à impugnação dos pontos 43 e 44 dos factos provados.
66. Pelo que, não pode deixar de se considerar provado que o Réu denegriu a imagem da Autora prejudicando-a irremediavelmente,
67. Pois, a testemunha E... da N..., S.A., quando questionado sobre esta matéria não deixou de referir que o Réu lhe disse que não estava de acordo como a Autora estava a gerir o tema da certificação,
68. Pelo que, tal afirmação junto do principal cliente da Autora, o cliente N..., S.A. não pode deixar de ser interpretado como uma forma de denegrir a imagem da Autora e prejudicá-la.
69. Relativamente à matéria de facto constantes do art. 80º, 89º e 91º da Petição Inicial: “ Que foi, em virtude do comportamento do Réu, a Autora tivesse deixado de obter os proveitos provenientes do cliente N..., S.A..”, “ Que o Réu tivesse causado repercussões devastadoras na situação financeira da Autora, que provocasse acentuada quebra de receitas, que colocasse a Autora em enormes dificuldades económicas e financeiras, temendo-se pelos eu encerramento” e “ Que o Réu tivesse causado a desvalorização das quotas sociais da empresa, tendo as mesmas atualmente um valor muito inferior ao que detinham antes do comportamento do Réu.”
70. Tal matéria foi, também, incorretamente julgada pelo Tribunal a quo, pois encontra-se provada pelo depoimento das testemunhas E... e S..., transcritos nas alegações supra,
71. Resultando dessa prova que o Réu com o seu comportamento fez com que a Autora tivesse deixado de obter os proveitos provenientes do cliente N..., S.A., causando repercussões devastadoras na situação financeira da Autora, pois ficou provado que a empresa não fatura desde novembro de 2017.
72. Nestes termos, impõe esta prova alterar a decisão do Tribunal a quo quanto estes três factos da matéria dada como não provada, dando-se como provado que o comportamento do Réu causou elevadíssimos prejuízos à Autor, determinou a perda do seu principal cliente e praticamente único, para o qual foi constituída, o cliente N..., S.A..
73. Deste modo, face toda a prova produzida, não pode deixar de se considerar que o Tribunal a quo andou mal ao concluir que não existe fundamento legal para a exclusão do Réu da qualidade de sócio da Autora e que não é possível estabelecer um nexo causal entre a conduta do Réu e os prejuízos sofridos pela Autora.
74. Não se compreendendo nem aceitando o entendimento do Tribunal a quo ao considerar que não ficou demonstrado que o Réu tenha tido um qualquer comportamento desleal enquanto sócio da Autora.
75. Pois, inclusive, os factos dados como provados pelo Tribunal a quo, e não impugnados, já demonstram esse comportamento desleal e gravemente perturbador ao funcionamento da Autora, que lhe causa levadicíssimo prejuízos, conforme se pode confirmar pela análise dos mesmos, que aqui se dão por reproduzidos, pelo que
76. Erra o Tribunal a quo na apreciação e enquadramento da matéria de facto e no Direito.
77. Pois, resulta da prova produzida e dos factos provados que o comportamento do Réu é desleal, não se aceitando a interpretação que o Tribunal a quo faz dos factos, pois erra na interpretação dos mesmos, retirando ilações desconformes com a matéria de facto.
78. Com efeito, não se pode aceitar o entendimento sufragado na sentença recorrida que diz que “ não obstante ter ficado provado que o Réu a partir de 19/09/2016 (data da constituição da sociedade B..., Lda.), passou a exercer atividade concorrente com a Autora (cfr. Factos provados n.ºs 16, 17, 18 e 23), o certo é que também ficou provado que o Réu, ao cessar o seu contrato de trabalho com a Autora, pretendeu vender a sua quota pelo valor nominal «, isto é, por € 200,00, mas tal proposta não foi aceite e que as negociações desenrolaram-se entre 31 de agosto de 2016 até finais de dezembro de 2016, sem que tenham terminado com o acordo ( crf. Factos provados n.º 5, 6, 7, 10, 11, 12, 13, 31 e 32.
79. E que nesse contexto não se nos afigura que a constituição pelo Réu de uma sociedade em 19.09/2016 com o mesmo objeto da Autora se traduza num comportamento desleal ou gravemente perturbador nesse.
80. Conclusão errada, que não se pode aceitar, pois Tribunal a quo não só erra na interpretação dos factos como na sua avaliação.
81. Ao contrário do sufragado na sentença recorrida, diga-se em primeiro lugar que em 31 de agosto de 2016 não se iniciou qualquer negociação, conforme se verifica pela matéria já provada.
82. Por outro lado, o facto de o Réu ter cessado o seu contrato de trabalho e de ter manifestado a disponibilidade para vender a sua quota, seja por que preço fosse, não justifica, nem pode justificar B..., Lda. o seu comportamento, que vai muito para além da mera constituição da sociedade, Lda..
83. Tanto mais que o Réu nunca alegou tal facto e/ou contexto para tentar justificar o seu comportamento.
84. O que Réu sempre afirmou foi tão só que agiu da forma descrita, porque não queria pactuar com a desconformidade em que a Autora prestava o seu serviço à N..., S.A., relativamente à certificação.
85. Pelo que, não se pode aceitar as ilações o Tribunal a quo, quando diz que no contexto da cessação do contrato de trabalho e proposta de venda de quota justifica a constituição da nova sociedade, pelo réu.
86. Com efeito, tal conclusão não constitui uma interpretação compatíveis com os factos provados,
87. Pois, a Autora só soube que o Réu tinha constituído a B..., Lda. e que estava a trabalhar para a Autora, por conta dessa empresa, em 22 de dezembro de 2016 (cfr. Facto provado n.º 37).
88. A Autora, T..., Lda., foi constituída em 29 de abril de 2015 (cf. Facto provado n.º 1).
89. Em 31 de agosto de 2016, o Réu denunciou o seu contrato de trabalho com a Autora, com efeitos a partir de 30 de setembro de 2016. /cfr. Factos provado n.º 5)
90. No dia 31 de agosto de 2016, o Réu avisou a empresa N..., S.A. que iria deixar de trabalhar para a Autora.”( cfr. Facto provado n.º 9)
91. No dia 05 de setembro de 2016, o Réu apresentou uma proposta para aquisição da totalidade das quotas da Autora.(cfr. Facto provado n.º 10)
92. No dia 06 de setembro de 2016, o Réu antecipou a data dos efeitos da sua demissão, para a semana seguinte, dia 12 de setembro de 2016 e propôs a venda da sua quota. (cfr. Facto provado n.º 12 e 13)
93. No dia 19 de setembro de 2016, o Réu constitui a sociedade por quotas denominada B..., Lda., sem o conhecimento da Autora, e da qual passa o Réu a ser sócio maioritário e gerente. (cfr. Factos provados n.º 16, 17 e 18 )
94. Pelo que, atenta a factualidade, verifica-se que o Réu constituiu a sociedade
B..., Lda., quando apenas tinham decorrido. 4 (quatro) dias úteis, da cessação dos efeitos do seu contrato de trabalho. (cfr. factos provados n.º 13 e 16)
95. E, quando apenas tinham decorrido 9 (oito) dias uteis, da primeira proposta apresentada pelo Réu, para este comprar a totalidade das quotas da Autora e oito dias uteis da proposta de venda da sua quota pelo valor nominal de € 200,00. (cfr. Factos provados n.º m10, 12 e 16)
96. Sendo que, não ficou provado nestes autos a data em que as propostas do Réu não foram aceites, nem os motivos da sua recusa.
97. Não tendo sido produzida prova dessa factualidade, pelo que é impossível retirar conclusões sobre essa matéria, como erradamente o Tribunal a quo faz.
98. Logo, não se pode aceitar o entendimento sufragado na sentença recorrida que refere que: “não se nos afigura razoável que o Réu tivesse que aguardar indefinidamente pela obtenção de um acordo quanto à alteração da sua posição societária na Autora e ficasse impedido de constituir uma sociedade com o mesmo objeto social e em que assumisse o cargo de gerente na nova sociedade”.
99. Pois, o Réu não aguardou, nem perto, nem de longe indefinidamente.
100. Sendo certo, que ficou provado conforme supra transcrito que já antes de constituir a sociedade B..., Lda. já tinha contactado o principal cliente N..., S.A., sem o conhecimento da Autora, para trabalhar com o mesmo, por conta da nova sociedade, subtraindo a clientela à Autora, conforme resulta do depoimento transcrito supra da testemunha E...,
101. A que acresce que, durante todo o processo de cessação de contrato de trabalho do Réu e a negociação de alteração societária, não concretizada, a Autora, ora Recorrente, desconhecia as intenções do Réu e que este em 19.09.2016 já tinha outra sociedade com objeto social igual ao seu e que já tinha contactado, por conta dessa empresa o seu principal cliente, para oferecer os mesmos serviços da Autora.
102. Facto que por si só já consubstancia um comportamento desleal, que se impunha ter sido valorado pelo Tribunal a quo, e decretado a exclusão do Réu como sócio da Autora.
103. Falha o Tribunal a quo quando diz que a perda do cliente N..., S.A. pela Autora se deveu a razões comerciais e à falta de certificação da Autora,
104. Pois não há falta de certificação. Havia um acordo aceite pelo cliente, acordo que se mantem nos mesmos moldes mas ora com a B..., Lda., que subtraiu o cliente à autora.
105. Era o Réu quem contactava diretamente com os clientes, em nome da Autora, cujos projetos geria, designadamente com a N..., S.A., e com quem os mesmos estabeleciam relações de proximidade e confiança (cfr. facto provado n.º 30)
106. Com a constituição da nova sociedade, o Réu passou a ser um sócio maioritário, quando na Autora é um sócio minoritário, obtendo à custa da usurpação do negócio desta um enriquecimento ilícito que não tinha por conta da Autora, atenta a sua participação social, pelo que
107. Ficou provado no ponto 23 dos factos provados que a constituição da sociedade B..., Lda. e da marca O... ocorreu em articulação e com o intuito de desenvolver a mesma atividade da Autora, facto que por si só consubstancia um comportamento desleal.
108. Todos estes atos e factos, nomeadamente, recusa de passagem de pasta, aliciamento e contratação de funcionários da Autora, apresentação de proposta ao principal cliente da Autora, o cliente N..., S.A., determinaram, sem qualquer sombra de dúvidas, que a Autora não tivesse conseguido prestar os serviços com a mesma celeridade e excelência com que o tinha feito até então.
109. Ora, o comportamento do Réu é ilícito, ostensivamente violador do dever de lealdade e de não concorrência, estando a causar prejuízos à Autora que, com o decurso do tempo, se vão acentuando.
110. A atuação do Réu incapacitou a Autora de desenvolver a sua atividade, causando-lhe elevadíssimos prejuízos, nomeadamente o provado no ponto 45 da sentença recorrida.
111. O Réu adotou um comportamento evidentemente preparatório e inerente a um real desvio de clientela, pelo que não se aceita o entendimento do Tribunal a quo quando tenta justificar a atuação do Réu, na alegada negociação da participação social, que é incompreensível.
112. Pois, ficou amplamente provado da prova supra citada e dos factos provados, que Réu está a utilizar ao serviço das novas empresas que criou o know how da Autora e o segredo do seu negócio da Autora
113. Tendo dessa forma inclusive desviado o principal cliente da Autora, a empresa N..., S.A..
114. Pelo que houve efetivamente uma quebra do dever de lealdade, bem como uma violação grosseira da obrigação de não concorrência.
115. Pois, o Réu enquanto sócio deveria agir diligentemente tendo em conta os interesses da Autora, pelo menos, de forma a não prejudicar a mesma, contudo o seu comportamento demonstra precisamente o contrário.
116. No caso em apreço não está só em causa o facto de o Réu ter constituído sociedade com objeto similar ao da Autora, que já é grave, mas também o facto de lhe ter subtraído clientela que sabia ser essencial para o bom funcionamento da mesma.
117. Bem como o facto de se ter socorrido de meios desleais para o fazer, entrando em contacto direto com o principal cliente, invocando a incapacidade da Autora de cumprir as suas obrigações para com o mesmo, aliciando trabalhadores da Autora para integrarem o seu projeto, deixando a Autora despojada de meios e, por fim, socorrendo-se de produtos e materiais da Autora para suprir as necessidades da empresa que, entretanto, constituiu.
118. Disponibilizando aos clientes os mesmos materiais e produtos utilizados pela Autora, fornecendo um serviço idêntico ao da Autora e apropriando-se dos seus meios para o efeito.
119. Tudo numa atitude premeditada e concertada, altamente violadora de qualquer noção de dever de lealdade,
120. Pelo que, não pode deixar de se considera que o Tribunal ao decidir como decidiu aplicou erradamente o Direito, ao considerar que não existe fundamento legal para a exclusão de sócio e nexo causal entre o comportamento do Réu e os prejuízos sofridos pela autora.
121. Nestes termos, atento o disposto nos art. 317º do Código da Propriedade Industrial, Artigo 483º do Código da Propriedade Industrial, Art. 990º do Código Civil aplicável ex vi pelo art. 3º do Código Comercial e Art. 2º do Código das Sociedades Comerciais., arts. 563º e 564º, nº 2 do Código das Sociedades Comerciais, que o Tribunal a quo ao decidir como decidiu violou, deve ser determinada exclusão do Réu de sócio da Autora, condenando-se o mesmo no pagamento dos prejuízos que causou à Autora,
122. Pois, o dever de lealdade associando-se à obrigação de não concorrência, de não se aproveitar em benefício próprio de eventuais oportunidades de negócio, de não atuação em conflito de interesses com a sociedade, impõe, salvo melhor entendimento, tal decisão.
123. Por tudo o exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e revogar-se a decisão na parte recorrida, substituindo-se nessa parte por nova decisão, que condene o Réu na totalidade do pedido da Autora, ora recorrente.
O R. contra alegou nos termos de fls. 450 e seguintes.
*
I – 1 - O Tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos:
1. A Autora, T..., Lda., Ld.ª, foi constituída em 29/04/2015 e tem como objecto social a formação profissional na área técnica e tecnológica, prestação de serviços de consultoria, não jurídica, às empresas na referida área. Desenvolvimento de Software.
2. A Autora tem o capital social de € 2.000,00.
3. A Autora tem dois sócios: a sociedade E..., Lda., titular de uma quota no valor de € 1.800,00, e o Réu, N..., titular de uma quota de € 200,00.
4. Os gerentes da Autora são L... e MJ....
5. No dia 31 de Agosto de 2016, os gerentes da Autora receberam uma comunicação electrónica do Réu, na qual o Réu comunicou a denúncia do seu contrato de trabalho, com efeitos a partir de 30 de Setembro de 2016.
6. Na mesma comunicação, o Réu referiu: “Peço-vos também que decidam qual o futuro da empresa, sendo que estou disponível para a venda da minha quota”.
7. O Réu remeteu à Autora carta registada com o mesmo conteúdo, denunciando o contrato de trabalho com efeitos a partir de 30 de Setembro de 2016.
8. Perante o teor destas comunicações, a gerência da Autora tentou indagar junto do Réu os motivos da denúncia do contrato de trabalho.
9. No dia 31 de Agosto de 2016, o Réu avisou a empresa N..., S.A. que iria deixar de trabalhar para a Autora.
10. No dia 5 de Setembro de 2016, o Réu enviou aos gerentes da Autora uma nova comunicação electrónica, renovando a denúncia do seu contrato de trabalho e apresentou uma proposta para aquisição da totalidade das quotas da Autora.
11. Proposta que não mereceu a aprovação da E..., Lda., motivo pelo qual o Réu não logrou adquirir a totalidade das quotas da Autora.
12. No dia 6 de Setembro de 2016, o Réu propôs a venda da sua quota de 10% pelo seu valor nominal - € 200,00, venda que nunca aconteceu, mantendo o Réu a sua qualidade de sócio da Autora.
13. No dia 6 de Setembro de 2016, o Réu antecipou a data dos efeitos da sua demissão para o dia 12 de Setembro de 2016, mencionando que «tal acontece para mais rapidamente poder preparar o meu futuro e projectos vindouros».
14. Atendendo à posição assumida pelo Réu, foi-lhe comunicado pela gerência da Autora que deveria agendar-se uma reunião com o cliente N..., S.A., principal cliente da sociedade, na qual seria dado conhecimento que o Réu, apesar de permanecer sócio da Autora, deixaria de exercer pessoalmente as funções que até aí vinha desempenhando, apresentando-se substituto para a execução desse trabalho e fazendo-se nessa reunião a “passagem de pasta”, reunião essa que não se chegou a realizar.
15. Por mail enviado em 22/12/2016 ao gerente da Autora L..., com o assunto «RE: ATEC – Parceria», E..., representante do cliente N..., S.A., escreveu o seguinte:
«Olá L...,
Conforme falado há pouco vamos deixar de colaborar com a Excel Formação/TB no âmbito dos cursos técnicos de credenciação, tendo em conta que:
- A plataforma para exames teria custos acrescidos ao valor hora de formação;
- A formação técnica seria “repassada” a uma terceira entidade.
Continuaremos, no entanto, em contacto para se eventualmente avançarmos com uma segunda fase da formação a chefes de equipa».
16. Em 19/09/2016, foi constituída a sociedade por quotas denominada B..., Lda., Ldª, pessoa colectiva 514 117 818.
17. A sociedade B..., Lda., Ldª tem como objecto social a prestação de serviços de auditoria, consultoria e desenvolvimento de aplicações técnicas, tecnológicas e
informáticas. Formação técnica, comercial e comportamental. Tratamento e transcrição de suportes de áudio e vídeo.
18. Os gerentes da sociedade B..., Lda., Ld.ª são N..., aqui Réu, e Cristiano Devesa Dias, sendo o Réu titular da quota de € 3.200,00 e o outro gerente titular da quota de € 800,00.
19. No site http://www.O....com/ consultado em 16/03/2017 consta que o Réu é manager da marca/empresa O....
20. Consta no site da O... a seguinte informação:
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(Profissional, personalizada e certificada)
Somamos mais de 20 anos de experiência formativa nas mais diversas áreas da formação técnica e comportamental, num universo de clientes de diversos sectores.
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Na área das telecomunicações, trabalhamos com os principais players nacionais, o que nos coloca como referência na capacitação técnica dos seus quadros internos e parceiros externos.
Somos mais do que uma “caixa” de formadores. A O... forma pessoas e profissionais capacitando-os para enfrentarem os principais desafios com a mais alta eficiência e motivação.
Como sabemos tudo isto? Porque na O... acompanhamos personalizadamente todo o processo, desde o diagnóstico das necessidades, até a medição da efectividade do investimento.
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Somos uma empresa que acumula mais de 12 anos de experiência no desenvolvimento de aplicações orientadas à formação. Developers full-stack analisam, desenham e implementam a sua ideia eficientemente.
Transformamos ideias em soluções, criando aplicações que facilitam a vida tanto aos formandos como aos formadores.
Estas aplicações são únicas visto que são desenvolvidas em articulação com as entidades que as patrocinam.
Aplicações para gestão da Formação e RH, Elearning e Plataforma de Exames, Simuladores de Negócio e Soluções Out of the box, como por exemplo realidade aumentada e virtual são apenas algumas das características e soluções que nos definem e que nos tornam únicos.
21. O ex-colaborador da Autora, I..., faz parte da equipa da O..., constando no site da mesma como “Academy Director”.
22. O ex-colaborador da Autora, J..., também foi ali indicado como membro da equipa O... como “Projects & Social Networks”.
23. A constituição da sociedade B..., Lda., Ld.ª e da marca O... ocorreu em articulação e com o intuito de desenvolver a mesma actividade da Autora.
24. O colaborador I... exerceu na Autora as funções inerentes à categoria profissional de “Formador e Consultor”.
25. O colaborador J... exerceu as funções de “Programador Informático” na Autora.
26. O Réu contratou dois colaboradores da Autora, os quais tinham posição fulcral na sua actividade.
27. Entre 01/01/2016 e 31/12/2016, a Autora facturou com o cliente N..., S.A. Madeira a quantia de € 17.342,61 (dezassete mil trezentos e quarenta e dois euros e sessenta e um cêntimos).
28. Entre 01/01/2016 e 31/12/2016, a Autora facturou com o cliente N..., S.A., S.A. a quantia de € 47.268,90 (quarenta e sete mil duzentos e sessenta e oito euros e noventa cêntimos).
29. O Réu foi simultaneamente funcionário da Autora com funções de gestor de projectos, na área da formação profissional.
30. Era o Réu quem contactava directamente com os clientes, cujos projectos geria (designadamente, com a N..., S.A.) e com quem os mesmos clientes estabeleciam relações de proximidade e confiança.
31. Em face da cessação do contrato de trabalho do Réu para com a Autora, foram colocadas várias hipóteses:
i) a venda da participação do Réu ao outro sócio;
ii) a compra pelo Réu da quota do outro sócio;
iii) a dissolução e extinção total da Autora.
32. O Réu e os gerentes da Autora estiveram até finais de Dezembro de 2016 a ponderar e a negociar cada uma das hipóteses referidas no facto provado anterior.
33. Durante o tempo em que a Autora trabalhou para o cliente N..., S.A., este teve sempre a Autora e uma outra empresa chamada P… a dar-lhe formação profissional.
34. Em 10/11/2016, o gerente da A. MJ... acedeu ao site da O..., preencheu um formulário de contacto e enviou uma mensagem a dizer “Liga qd
puderes sff”, pretendendo falar com o Réu.
35. A partir de Outubro de 2016, o Réu foi trabalhar com a N..., S.A., devido à relação de grande proximidade e confiança que tinha com aquele cliente.
36. Atenta a redução de pessoal/trabalhadores, a Autora reuniu com o seu principal cliente, a empresa N..., S.A., dando-lhe conta da alteração de pessoal e da necessidade
de se encontrar uma solução provisória para assegurar a continuidade e a qualidade dos serviços prestados.
37. Pelo menos no dia 22/12/2016, a gerência da Autora tomou conhecimento da existência da sociedade B..., Lda..
38. Por mail datado de 28/09/2016 enviado ao gerente da Autora L..., I... escreveu o seguinte:
«De modo a formalizar o assunto.
No seguimento do que falámos, venho por este meio comunicar a minha saída da T..., Lda..
A posteriori seguirá a carta de denúncia de contrato, cumprindo o prazo de aviso prévio de 30 dias que devo à entidade empregadora».
39. J... deixou de trabalhar para a Autora em Outubro de 2016.
40. A partir de Janeiro de 2017, a Autora deixou de prestar serviços para o cliente N..., S.A..
41. A Autora aprovou deliberação em 27/02/2017, que excluiu o Réu de sócio da mesma.
42. Em Outubro de 2016, o Réu esteve a dar formação nas instalações do cliente N..., S.A., representando a sociedade B..., Lda., Ld.ª, em simultâneo com a Autora, que estava a dar formação ao mesmo cliente, numa sala contígua.
43. Nos primeiros contactos dos gerentes da Autora com o cliente N..., S.A. foi sendo dito inúmeras vezes que a Autora era uma empresa certificada para executar formação profissional, o que não correspondia à verdade.
44. Em Agosto de 2016, o Réu, não querendo continuar a pactuar com essa desconformidade com o cliente N..., S.A., até porque à data já tinham uma relação de grande proximidade e confiança, decidiu pôr fim ao seu contrato de trabalho com a Autora.
45. A não continuidade do trabalho com a empresa N..., S.A., causou na Autora uma perda de receitas não inferior a € 64.611,51, ano.
*
II – 2 - O Tribunal de 1ª instância não considerou provados os seguintes factos:
a) Que os gerentes da Autora soubessem desde finais de Setembro de 2016 que o Réu tinha constituído a sociedade B..., Lda., e qual o seu objecto social.
b) Que o Réu tivesse falado sobre o assunto várias vezes com os gerentes da Autora.
c) Que o Réu tivesse desempenhado na Autora o cargo de Gestor de Empresa, desde a constituição da sociedade.
d) Que nenhuma das tentativas da gerência da Autora no sentido de indagar junto do Réu os motivos da denúncia do contrato de trabalho tivesse tido sucesso e que o Réu se tivesse limitado a reiterar a sua intenção de quebrar o vínculo laboral que detinha com a Autora.
e) Que o Réu, perante a proposta da gerência da Autora no sentido de agendar uma reunião com o cliente N..., S.A., tivesse protelado o agendamento da referida reunião.
f) Que, a partir do dia 12/09/2016, o Réu tivesse recusado categoricamente todas as tentativas de agendamento da reunião com o cliente N..., S.A. e tivesse alegado não ter agenda para o efeito.
g) Que J... tivesse cessado o contrato de trabalho com a Autora mediante acordo de revogação datado de 18/10/2016.
h) Que o Réu tivesse aliciado os colaboradores da Autora I... e J... para deixarem de trabalhar para a Autora e passarem a trabalhar para a B..., Lda..
i) Que o Réu tivesse impedido a Autora de prestar os serviços com a mesma celeridade e excelência com o que tinha feito até então.
j) Que a sociedade B..., Lda. fizesse uso de clientes subtraídos.
k) Que o Réu se tivesse apropriado de clientes da Autora e de produtos e serviços desenvolvidos pela mesma.
l) Que o Réu, ao abandonar as funções laborais com a Autora, tivesse levado consigo todo o material comercial que estava ao seu alcance.
m) Que o Réu se tivesse apropriado de programas informáticos e plataformas de trabalho, brochuras, informação comercial, base de clientes e preçários.
n) Que a O... tenha passado a utilizar, na promoção da sua actividade comercial, material comercial igual ao da Autora e criado por esta, nomeadamente software de gestão de recursos humanos, elearning e plataforma de exames e formação de telecomunicações.
o) Que o Réu tivesse o objectivo de subtrair clientela e conquistar o mercado de trabalho da Autora.
p) Que o Réu, para o desenvolvimento da sociedade B..., Lda., se encontre a utilizar informação privilegiada da Autora, em proveito próprio e dessa sociedade e da marca O....
q) Que a B..., Lda. esteja a utilizar com o cliente N..., S.A. a mesma plataforma de exames desenvolvida pela Autora.
r) Que seja impossível que o Réu tivesse desenvolvido uma nova plataforma de exames, com as mesmas características, em tão curto período de tempo.
s) Que, até à data em que o Réu denunciou o seu contrato de trabalho, a Autora tivesse uma imagem de grande profissionalismo e confiança junto dos clientes.
t) Que o Réu tivesse denegrido a imagem da Autora para com o cliente N..., S.A. e restantes clientes.
u) Que, em virtude da conduta do Réu, a Autora tivesse deixado de conseguir prestar o trabalho nos mesmos termos e condições em que o fazia até então.
v) Que o Réu tivesse criado a convicção no cliente N..., S.A. de que a Autora não possuía capacidade para continuar a prestar os serviços, e que prejudicasse irremediavelmente a imagem da Autora.
w) Que o Réu tivesse manchado o bom nome e reputação da Autora numa área de mercado e de negócio onde a mesma já tinha o seu lugar consolidado.
x) Que a actuação do Réu tivesse vindo a incapacitar a Autora de desenvolver a sua actividade.
y) Que a plataforma para exames da Autora tivesse tido um custo inicial de € 10.000,00, a que acrescem os custos da manutenção.
z) Que, em virtude do comportamento do Réu, a Autora tivesse deixado de obter os proveitos provenientes do cliente N..., S.A..
aa) Que o Réu esteja a utilizar ao serviço da B..., Lda. o know how da Autora e o segredo do seu negócio, ao disponibilizar informação e programas criados por esta e os termos e conduções da sua utilização.
bb) Que em virtude do acesso que tenha a todos os elementos de identificação dos clientes da Autora e à facturação e respectivas contas correntes, seja possível ao Réu obter uma posição de destaque na área comercial com a sua nova empresa e marca, com o consequente prejuízo para a Autora.
cc) Que o Réu tenha desviado o principal cliente da Autora, a empresa N..., S.A..
dd) Que o Réu tivesse causado repercussões devastadoras na situação financeira da Autora, que provocasse acentuada quebra de receitas, que colocasse a Autora em enormes dificuldades económicas e financeiras. (facto de teor conclusivo)
ee) Que o Réu tivesse causado a desvalorização das quotas sociais da empresa, tendo as mesmas actualmente um valor muito inferior ao que detinham antes do comportamento do Réu.
ff) Que a actuação do Réu tenha prejudicado e continue a prejudicar o bom nome e imagem da Autora.
gg) Que o representante do cliente N..., S.A., E..., tivesse transmitido à gerência da Autora que o Réu já tinha concedido à empresa N..., S.A., por conta da nova empresa, os programas e a plataforma de exames que a Autora tinha criado e que usava na prestação dos seus serviços e que, por esse motivo, a N..., S.A. tivesse optado por passar a trabalhar com a nova empresa do Réu, em detrimento da Autora.
hh) Que a Autora tivesse apresentado à N..., S.A. S.A. e à N..., S.A. Madeira os concretos termos e condições para a continuação da prestação dos serviços. (facto de teor vago, genérico e conclusivo)
*
III - São as conclusões da alegação de recurso, no seu confronto com a decisão recorrida, que determinam o âmbito da apelação, salvo quanto a questões de conhecimento oficioso que possam ser decididas com base nos elementos constantes do processo. Assim, face ao teor das conclusões de recurso as questões colocadas pela apelante são, essencialmente, as seguintes: se deverá ser alterada a decisão sobre a matéria de facto nos termos propostos pela apelante; se a factualidade apurada demonstra um comportamento do R. desleal e gravemente perturbador ao funcionamento da A. causando-lhe relevantes prejuízos, devendo ter lugar a sua exclusão da sociedade; se o R. está obrigado a indemnizar a A., atenta aquela mesma factualidade.
*
IV – 1 - Na impugnação da decisão sobre a matéria de facto a apelante começa por impugnar a decisão referente aos pontos 42 (parte final), 43 e 44 dos factos provados que pretende que deveriam ter sido considerados não provados.
Diz-se ali:
42. ...em simultâneo com a Autora, que estava a dar formação ao mesmo cliente, numa sala contígua.
43. Nos primeiros contactos dos gerentes da Autora com o cliente N..., S.A. foi sendo dito inúmeras vezes que a Autora era uma empresa certificada para executar formação profissional, o que não correspondia à verdade.
44. Em Agosto de 2016, o Réu, não querendo continuar a pactuar com essa desconformidade com o cliente N..., S.A., até porque à data já tinham uma relação de grande proximidade e confiança, decidiu pôr fim ao seu contrato de trabalho com a Autora».
No que respeita a estes factos o Tribunal de 1ª instância fundamentou a sua decisão nos seguintes termos:
«Quanto ao facto provado nº 42, no teor das declarações de parte do Réu concordantes com o depoimento das testemunhas E..., gestor da N..., S.A., e P..., formadora e actual prestadora de serviços para a E..., Lda. (esta sociedade é sócia da T..., Lda., aqui Autora).
É de salientar, a respeito do depoimento da testemunha P..., que a mesma afirmou que, através da T..., Lda. (Autora), a última vez que deu formação na N..., S.A. foi em Outubro de 2016, numa fase inicial do seu depoimento, e mais tarde disse que foi em Setembro ou em Outubro de 2016, e à pergunta sobre se não houve uma altura em que deram formação na N..., S.A. ao mesmo tempo, depois do Réu ter cessado a sua relação laboral com a Autora, a testemunha P... pela T..., Lda. e o Réu N..., sem ser pela T..., Lda., a testemunha respondeu «É possível, talvez, mas não consigo dizer com certeza». Ou seja, a testemunha admitiu a possibilidade de ter trabalhado na N..., S.A. pela T..., Lda. (aqui Autora), ao mesmo tempo do que o Réu, após este ter cessado o seu contrato de trabalho com a Autora, e afirmou que deu formação na N..., S.A. através da T..., Lda. em Outubro ou em Setembro de 2016. Tal depoimento conjugado com as declarações de parte do Réu demonstram o facto provado nº 42.
Quanto ao facto provado nº 43, no teor do depoimento da testemunha E..., gestor da N..., S.A., o qual é concordante com as declarações de parte do Réu.
Quanto ao facto provado nº 44, no teor das declarações de parte do Réu concordantes com o depoimento da testemunha E..., gestor da N..., S.A..
Como acima se referiu, a testemunha E... prestou um depoimento coerente, espontâneo e sincero, tendo afirmado que havia um problema de certificação dos cursos dados pela T..., Lda., sentiu-se, em nome da N..., S.A., enganado pois foi surpreendido e só veio a saber que a T..., Lda. não podia emitir certificados depois de trabalhar com a mesma há algum tempo, o que criou mau estar, constrangimento e quebra de confiança. Mais disse que, sempre que apanhava o N... (ora Réu), perguntava-lhe pelos certificados. Mais disse que, quando descobriu que a Autora não podia emitir certificados, o L... disse-lhe que tinha outra empresa para emitir os certificados enquanto o processo de certificação da T..., Lda. não terminasse, mas não aceitou esta solução pois a mesma não lhe fazia sentido, preferindo aguardar pelos certificados emitidos pela Tangente, quando esta viesse a ser certificada, sendo que nunca recebeu os certificados.
Mais afirmou que desconhece se este problema da certificação se mantém ou não com a B..., Lda./O..., pois não está na área da formação da N..., S.A. desde Janeiro/Fevereiro de 2017.
É de salientar que o facto de se desconhecer se a B..., Lda. pode emitir actualmente certificados reconhecidos pela entidade competente não retira credibilidade ao depoimento prestado pela testemunha E... e às declarações de parte do Réu, porquanto desconhece-se se o processo com vista à obtenção de tal certificação da B..., Lda. está em curso e, na afirmativa, qual o seu estado, sendo certo que o Réu não era gerente da T..., Lda. (Autora) e é gerente da B..., Lda., o que lhe dá o poder de diligenciar nesse sentido, ao contrário do que sucedia com a T..., Lda., em que era apenas sócio e não era gerente».
Consoante refere Abrantes Geraldes ([1]) as diferentes circunstâncias em que se encontra o Tribunal de 1ª instância e o Tribunal de 2ª instância «deverão ser ponderadas na ocasião em que a Relação procede à reapreciação dos meios de prova, evitando a introdução de alterações quando, fazendo actuar o princípio da livre apreciação das provas, não seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de erro de apreciação relativamente aos concretos pontos de facto impugnados».
Ora, analisados os depoimentos e declarações referidos pelo Tribunal de 1ª instância – na conjugação por ele mencionada - em confronto com a argumentação deduzida pela A. afigura-se que no que tange a esta matéria não se evidencia um erro de julgamento por parte daquele Tribunal, sendo admissível a convicção atingida.
Efectivamente a testemunha P... disse achar que o último curso que dera trabalhando para a A., na N..., S.A., fora em Setembro ou Outubro de 2016 e que em Setembro/Outubro encontrara o R. nas instalações da N..., S.A. a dar um curso o que terá confirmado a afirmação do R. no sentido constante da parte final do ponto 42 dos factos provados.
Quanto aos pontos 43 e 44, para além das declarações do R. temos o depoimento da testemunha E... que afirmou que “o L...” - um dos sócios gerentes da A., L... (ver fls. 147 e seguintes) - só posteriormente a estarem a trabalhar há algum tempo, lhe disse que a A. não estava credenciada para passar os certificados com o reconhecimento da DGERT, o que fora para ele uma surpresa, só então se apercebendo de que a A. não era certificada para passar certificados reconhecidos pela DGERT; não tinha antes pedido à A. que lhe mostrasse a certificação, porque não achara que fosse necessário fazê-lo.
Deste modo, não sendo verdade que a A. fosse empresa certificada (pela DGERT) para executar formação profissional ([2]), como afirmado pela testemunha os certificados emitidos pela A., relativos a quem frequentava os seus cursos, não eram reconhecidos pela DGERT.
A testemunha referiu, igualmente, que o R. lhe dissera que a questão da certificação era um dos temas que não estava a gostar da forma como estava a ser tratada pela A. corroborando o que o R. afirmara nas suas declarações.
Também a testemunha I... mencionou que quando foi feito o acordo com a N..., S.A. a certificação era um dos requisitos.
Entende-se, assim, serem de manter estes factos julgados provados.
*
IV – 2 - Na impugnação deduzida a apelante optou por impugnar a matéria de facto julgada não provada por referência aos artigos da petição inicial e não por referência aos factos considerados não provados na própria sentença – quando, afinal, o recurso é dirigido ao decidido na sentença, sendo mais directo dizer aquilo de que discordava relativamente à mesma.
O que terá contribuído para manifestas imprecisões; assim, declara a apelante impugnar a decisão por não ter sido julgado provado o artigo 53 da p.i. quando essa matéria corresponde ao ponto 38 dos factos provados. Bem como impugna a decisão por não estar provada a 1ª parte do artigo 58 da p.i. que está compreendida no ponto 23 dos factos provados. Nesta assinalada parte, obviamente a impugnação não procede.
Tendo em consideração, aliás, que havemos de ponderar a fundamentação aduzida pelo Tribunal de 1ª instância, reportar-nos-emos aos factos não provados aludidos na sentença, consoante ali elencados (por alíneas) e que sejam correspondentes àqueles a que a apelante se refere nas conclusões de recurso.
Começa a apelante por pôr em causa não terem sido julgados provados os factos constantes das alíneas e) e f): Que o Réu, perante a proposta da gerência da Autora no sentido de agendar uma reunião com o cliente N..., S.A., tivesse protelado o agendamento da referida reunião; Que, a partir do dia 12/09/2016, o Réu tivesse recusado categoricamente todas as tentativas de agendamento da reunião com o cliente N..., S.A. e tivesse alegado não ter agenda para o efeito.
Segundo a apelante tais factos resultam das declarações do R. e dos depoimentos das testemunhas I... e E....
As declarações do R. não permitem tal entendimento, referindo ele que sempre mostrou disponibilidade, embora a partir de 12 de Setembro só mostrasse disponibilidade depois das 6 h da tarde. A testemunha I... também disse que o R. lhe comunicara que tinha mais liberdade ao fim do dia, não se detectando no depoimento de E... elementos que nos permitam concluir como a apelante.
Quanto ao facto não provado constante da alínea h) (que o Réu tivesse aliciado os colaboradores da Autora I... e J... para deixarem de trabalhar para a Autora e passarem a trabalhar para a B..., Lda.) considerou o Tribunal de 1ª instância: (...) «cumpre referir não foi produzido nenhum meio de prova consistente que sustente que o Réu tivesse aliciado J... e I... a deixarem de trabalhar para a Autora e passarem a trabalhar para a B..., Lda..
Acresce que a testemunha J..., não obstante trabalhar actualmente para o Réu, prestou um depoimento coerente e espontâneo, afirmando que, em Outubro de 2016, a Autora rescindiu o contrato de trabalho consigo, tendo o Sr. MJ... lhe telefonado a dizer que não iriam precisar mais dos seus serviços, que era uma questão de gestão, que os últimos projectos não tinham tido muita saúde, e passou a receber subsídio de desemprego. Mais disse que no final de Novembro de 2016, início de Dezembro de 2016 mandou um mail a um ex-chefe de outra empresa e outros consultores e ligou também ao N... (aqui Réu) para saber se ele tinha trabalho para si, e passou a trabalhar para o Réu desde Março ou Maio de 2017.
O facto de a testemunha não se recordar ao certo do mês em que começou a trabalhar para o Réu, situando tal facto entre Março e Maio de 2017, e o facto de constar o seu nome no site da O... em 07/02/2017 (doc. 9 da p.i., fls. 46), e de ter deixado de constar em 08/03/2017 (doc. 8 da p.i., fls. 43), não afecta a sua credibilidade, atenta a justificação que apresentou (o Réu pediu-lhe para pôr no site a sua fotografia, tal como a sua fotografia se manteve no site da E..., Lda. depois de ter deixado de trabalhar para tal empresa, mas não fazia sentido manter-se lá pois estava a receber subsídio de desemprego).
Acresce que tal facto não assume relevância para a decisão da causa, pois o que releva é saber o modo como a ora testemunha deixou o seu vínculo laboral com a Autora, sendo a testemunha peremptória em afirmar que foi o gerente da Autora MJ... que lhe disse que não iriam renovar o contrato de trabalho com ele, sendo que não foi produzido nenhum meio de prova que contrariasse tal afirmação.
Por seu turno, a testemunha I..., não obstante trabalhar actualmente para o Réu, prestou um depoimento coerente e espontâneo, afirmando que trabalhou para a Autora de Junho de 2015 a Setembro de 2016, trabalha actualmente para o Réu, o que sucede desde Dezembro de 2016, e deixou de trabalhar para a Autora em Setembro de 2016 por iniciativa própria, propuseram-lhe ficar com todo o trabalho que o N... fazia, mas não conhecia todo o trabalho que ele fazia, não se via um rumo para a empresa (Autora), a questão da certificação era um problema.
A testemunha O... afirmou que a Autora despediu-o em Outubro de 2016 e que contactou com o Réu, só tendo começado a trabalhar para ele em Março de 2017.
A testemunha MS..., colaboradora da E..., Lda., afirmou que jantou com o Réu no Porto no final de 2016 ou início de 2017 em que este lhe perguntou se, caso a sua carteira de clientes crescesse, ela estaria disponível para trabalhar para a B..., Lda..
Todas as testemunhas que exerceram funções para a T..., Lda. (Autora), incluindo aquelas que exercem actualmente funções para a E..., Lda., sócia da Autora (como são as testemunhas P... e MS...), foram unânimes em afirmar que o Réu nunca as aliciou para deixarem de trabalhar para a Autora e passarem a trabalhar para a B..., Lda.».
Alicerça a apelante a sua impugnação nas declarações do R. e no depoimento da testemunha I.... Contudo, dos referidos depoimentos apenas resulta que a testemunha I... – que comunicara a sua saída da A. por mail enviado em 28-9-2016, aludido em 38 dos factos provados – passou a trabalhar para a B..., Lda., dizendo o A. que começou em negociações com ele no final de Outubro/Novembro e o contratou em Dezembro e afirmando I... que o R. não o aliciou (enquanto ainda estava na A.) para ir trabalhar com ele e que foi convidado pelo R. para ir para a nova empresa em Novembro.
Nem do depoimento de MS... resulta que tenha sido diferentemente.
Quanto ao artigo 34 da petição inicial ele é impreciso – a que trabalhadores é feita referência? Se se trata de I... e J... o que se passou com eles está já analisado e retratado nos autos.
Prossegue a apelante com o que consta das alíneas i), u) e x), do seguinte teor:
i) Que o Réu tivesse impedido a Autora de prestar os serviços com a mesma celeridade e excelência com o que tinha feito até então.
u) Que, em virtude da conduta do Réu, a Autora tivesse deixado de conseguir prestar o trabalho nos mesmos termos e condições em que o fazia até então.
x) Que a actuação do Réu tivesse vindo a incapacitar a Autora de desenvolver a sua actividade.
Segundo a apelante tais factos estão provados por força dos depoimentos das testemunhas I..., E... e L....
O que resultou apurado foi que o R. deixou de trabalhar para a A. cessando o contrato de trabalho que o vinculava perante aquela. Na sequência, dada a relevância das funções que estavam atribuídas ao R. a A. teve algumas dificuldades ficando a testemunha I... a desempenhar aquelas funções, com as referidas dificuldades; I..., todavia, também se foi embora, consoante já mencionado. A testemunha E... referiu que não conseguiu fazer cursos com a A. no período entre Agosto e Outubro, porque esta não tinha formadores. Disse, também, que quando o A. lhe contou que tinha criado uma empresa de formação quase lhe agradeceu porque estava desesperado, com muitos cursos atrasados para arrancar e que entre Outubro e Dezembro continuou sem conseguir ter cursos ministrados pela A., havendo comunicado ao gerente da A., em Dezembro, as razões porque deixariam de contar com a A., sendo uma delas a de não estar a assegurar a formação técnica.
A testemunha L... não acrescentou nada de relevante, pelo que da conjugação destes depoimentos não concluímos pela alteração da decisão quanto a estes pontos da matéria de facto.
Alegara a A. que a constituição da sociedade B..., Lda., Ld.ª e da marca O... ocorreu em articulação e com o intuito de desenvolver a mesma actividade da A., o que veio a corresponder ao ponto 23 dos factos provados.
Todavia, o Tribunal de 1ª instância não julgou provado:
«j) Que a sociedade B..., Lda. fizesse uso de clientes subtraídos.
k) Que o Réu se tivesse apropriado de clientes da Autora (...).e de produtos e serviços desenvolvidos pela mesma».
«o) Que o Réu tivesse o objectivo de subtrair clientela e conquistar o mercado de trabalho da Autora.
p) Que o Réu, para o desenvolvimento da sociedade B..., Lda., se encontre a utilizar informação privilegiada da Autora, em proveito próprio e dessa sociedade e da marca O...».
«cc) Que o Réu tenha desviado o principal cliente da Autora, a empresa N..., S.A.».
Impugnando a apelante a decisão que se traduz nestas alíneas - j),k),o), p) e cc) – dos factos não provados.
Reportando-se a parte desta matéria considerou o Tribunal de 1ª instância:
«Quanto ao facto não provado constante da alínea cc) (que o Réu tivesse desviado o principal cliente da Autora, a empresa N..., S.A.), refira-se que a prova produzida vai no sentido de que a perda do cliente N..., S.A. pela Autora se deveu a razões comerciais e à falta de certificação da Autora (cfr. factos provados nºs 15, 43 e 44), no contexto de rescisão do contrato de trabalho do Réu com a Autora e de tentativa de venda da sua quota, não sendo razoável exigir, por não ter havido acordo quanto à venda da sua quota nem quanto às outras duas hipóteses que foram discutidas (compra pelo Réu da quota pertencente à outra sócia – E..., Lda. - ou dissolução e extinção total da Autora), que o Réu, tendo cessado o seu vínculo laboral com a Autora, ficasse impedido de trabalhar na mesma área e com o cliente N..., S.A., quando é certo que a relação de proximidade e confiança da N..., S.A. era apenas com o Réu (cfr. factos provados nºs 30 e 35) e que havia a convicção da parte, designadamente, dos gerentes da Autora de que, caso o Réu deixasse de trabalhar para a Autora, esta perdia o cliente N..., S.A., conforme se extrai dos depoimentos das testemunhas P... e S..., só assim se compreendendo que, em face da cessação do contrato de trabalho do Réu para com a Autora, tivesse sido ponderada pela Autora e pelo Réu a própria dissolução e extinção total da Autora e a compra pelo Réu da quota do outro sócio (esta última hipótese pressuporia que o Réu iria manter a mesma actividade). A comunicação que o Réu fez à N..., S.A. em 31/08/2016 em como iria deixar de trabalhar para a Autora revela-se compreensível, em face da relação de grande proximidade e confiança que o Réu tinha com aquele cliente (cfr. factos provados nºs 9, 30 e 35), não se podendo extrair de tal facto que o Réu tenha subtraído/desviado o cliente N..., S.A. à Autora. Decorre da prova produzida que a Autora perdeu o cliente N..., S.A. porque estava dependente apenas do trabalho desenvolvido por um único trabalhador – do Réu – para manter tal cliente e, com a cessação do vínculo laboral do Réu para com a Autora, não encontrou ninguém que o substituísse, sendo que o cliente N..., S.A. tinha sempre, pelo menos, duas empresas ao mesmo tempo a prestar-lhe serviços de formação (cfr. facto provado nº 33)».
A apelante sustenta o seu entendimento nos depoimentos de E..., J..., I... e J..., bem como nas declarações do R., afirmando que dessa prova resulta que o R. tinha o objectivo de subtrair clientela e conquistar o mercado de trabalho da A..
O cliente principal da A. era a N..., S.A. pelo que a subtracção/desvio de clientela se colocava relevantemente no que a esta concerne.
No que respeita a esta matéria, considerados os depoimentos e declarações acima aludidos, no confronto com a fundamentação apresentada pelo Tribunal de 1ª instância não se manifesta que tenha ocorrido um erro de julgamento.
Não iremos, deste modo, além do que resulta do ponto 23 dos factos provados.
O Tribunal de 1ª instância também não julgou provado, no âmbito da alínea k) «Que o Réu se tivesse apropriado (...) de produtos e serviços desenvolvidos» pela A.. Bem como não julgou provados os factos constantes das alíneas m), n), aa) e bb):
«m) Que o Réu se tivesse apropriado de programas informáticos e plataformas de trabalho, brochuras, informação comercial, base de clientes e preçários.
n) Que a O... tenha passado a utilizar, na promoção da sua actividade comercial, material comercial igual ao da Autora e criado por esta, nomeadamente software de gestão de recursos humanos, elearning e plataforma de exames e formação de telecomunicações».
«aa) Que o Réu esteja a utilizar ao serviço da B..., Lda. o know how da Autora e o segredo do seu negócio, ao disponibilizar informação e programas criados por esta e os termos e conduções da sua utilização.
bb) Que em virtude do acesso que tenha a todos os elementos de identificação dos clientes da Autora e à facturação e respectivas contas correntes, seja possível ao Réu obter uma posição de destaque na área comercial com a sua nova empresa e marca, com o consequente prejuízo para a Autora».
Referiu, a propósito (incluindo esta matéria), o Tribunal de 1ª instância:
«Quanto aos factos não provados constantes das alíneas k), l), m), n), p), q) e aa) (que o Réu se tivesse apropriado de produtos, serviços e material comercial e informático da Autora ao serviço da sociedade que constituiu), não foi produzido nenhum meio de prova consistente que os demonstrasse, sendo que as testemunhas E..., gestor da N..., S.A., L..., gestor de formação para a N..., S.A., e C..., coordenador de formação da N..., S.A., afirmaram com determinação e clareza, recorrendo a exemplos para melhor esclarecimento, que a plataforma para exames utilizada pela B..., Lda. é totalmente diferente da plataforma de exames desenvolvida pela Autora, existindo diferenças substanciais entre uma e outra, designadamente na forma como os exames eram criados e nas informações prestadas (ex. a plataforma utilizada pela B..., Lda./O... permite assinalar a pergunta que tinha maior número de respostas erradas e permite criar automaticamente vários exames diferentes a partir do momento em que o formando faz o login, o que não sucedia com a plataforma que era utlizada pela T..., Lda. ou pela E..., Lda.)».
Insiste a A., no que a tal concerne, nos depoimentos de I..., E... e L.... Todavia, analisados os depoimentos destas testemunhas (de que a apelante transcreveu excertos, oferecendo a apelada a transcrição completa), não concluímos que tenha ocorrido aqui um erro na decisão sobre os factos. Como referido pela testemunha E... a A. tinha o know-how, mas na «pessoa do N...» - portanto na pessoa do R., trabalhador e sócio da A.. A testemunha I... explicou que os conteúdos que na B..., Lda./O... utilizam para dar formação são os conteúdos da N..., S.A., bem como o material da sala de formação é material da N..., S.A. e a testemunha E... que os conteúdos foram escritos pela Excel Formação mas vendidos à N..., S.A..
Insurge-se a apelante, na mesma linha, contra a circunstância de não terem sido julgados provados os factos elencados sob as alíneas q), r) e y), do seguinte teor:
«q) Que a B..., Lda. esteja a utilizar com o cliente N..., S.A. a mesma plataforma de exames desenvolvida pela Autora.
r) Que seja impossível que o Réu tivesse desenvolvido uma nova plataforma de exames, com as mesmas características, em tão curto período de tempo».
«y) Que a plataforma para exames da Autora tivesse tido um custo inicial de € 10.000,00, a que acrescem os custos da manutenção».
Baseia-se no depoimento da testemunha E... no que concerne ao ponto q) e nos depoimentos contraditórios de J..., I..., O..., bem como no depoimento de M... quanto ao demais.
Justificou o Tribunal de 1ª instância: «Quanto ao facto não provado indicado na alínea y), refira-se que o depoimento da testemunha M... se revela, por si só e desacompanhado de nenhum meio de prova, designadamente documental, insuficiente para demonstrá-lo».
Efectivamente assim é. Perguntado à testemunha qual o valor ela disse não conseguir dizer e perguntado concretamente se teria sido 10.000,00 € a testemunha respondeu «não conseguir mesmo dizer», mas que «não deve andar muito longe daí, talvez».
Quanto ao ponto q) a testemunha E... referiu que a plataforma que lhe foi apresentada para trabalharem com a N..., S.A. - como B..., Lda. - era uma plataforma completamente diferente daquela da A.. O que foi confirmado por outras testemunhas que depuseram sobre tal (consoante referido pelo Tribunal de 1ª instância e acima transcrito) não estando demonstrado que a B..., Lda. esteja a utilizar com o cliente N..., S.A. a mesma plataforma de exames desenvolvida pela Autora, designadamente tendo em conta a ocasião em que a acção foi proposta. Assim, também a testemunha L... afirmou que foi desenvolvida uma nova plataforma, mais avançada, quando a O... começou a assegurar os cursos.
Pelo que também aqui se mantém o decidido pelo Tribunal de 1ª instância.
Dirige-se seguidamente a apelante às alíneas t), v), w) e ff) dos factos não provados, das quais consta não se haver provado:
«t) Que o Réu tivesse denegrido a imagem da Autora para com o cliente N..., S.A. e restantes clientes».
«v) Que o Réu tivesse criado a convicção no cliente N..., S.A. de que a Autora não possuía capacidade para continuar a prestar os serviços, e que prejudicasse irremediavelmente a imagem da Autora.
w) Que o Réu tivesse manchado o bom nome e reputação da Autora numa área de mercado e de negócio onde a mesma já tinha o seu lugar consolidado».
«ff) Que a actuação do Réu tenha prejudicado e continue a prejudicar o bom nome e imagem da Autora».
Baseia-se no depoimento da testemunha E..., remetendo ainda para os meios de prova a que aludira a propósito de anteriores matérias. Ponderando sobre os factos aqui em causa, considerando os depoimentos em referência, afigura-se-nos que não assiste razão à apelante, não havendo prova em que possam assentar aqueles factos.
No que concerne aos factos reage seguidamente a apelante contra o Tribunal de 1ª instância não ter julgado provado o conteúdo das alíneas z), dd) e ee):
«z) Que, em virtude do comportamento do Réu, a Autora tivesse deixado de obter os proveitos provenientes do cliente N..., S.A.».
«dd) Que o Réu tivesse causado repercussões devastadoras na situação financeira da Autora, que provocasse acentuada quebra de receitas, que colocasse a Autora em enormes dificuldades económicas e financeiras. (facto de teor conclusivo).
ee) Que o Réu tivesse causado a desvalorização das quotas sociais da empresa, tendo as mesmas actualmente um valor muito inferior ao que detinham antes do comportamento do Réu».
Como aludido na sentença recorrida o teor de dd) é conclusivo, recorrendo-se a conceitos não concretizados e de contornos vagos.
A relevância destas alíneas reduzir-se-á, assim, às alíneas z) e ee).
Sendo certo que, em consonância com o supra expendido não se retira daqui um erro de julgamento. Como referiu a testemunha S..., a A. deixou de facturar à N..., S.A. porque o R. - que era a pessoa que “estava alocada” ao projecto N..., S.A. - deixou de trabalhar ao serviço da A..
Deste modo, mantem-se nos seus precisos termos o decidido pelo Tribunal de 1ª instância no que à matéria de facto respeita.
*
IV – 3 - O Tribunal de 1ª instância entendeu que no caso dos autos não estava prescrito o direito de exclusão de sócio. Por outro lado, entendeu aquele Tribunal que importando apurar se o R. adoptou um comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade e se era possível estabelecer um nexo de causalidade entre as condutas do R. e os prejuízos sofridos pela A. (não se exigindo, todavia, um prejuízo efectivo mas a capacidade de provocar danos) tal não se poderia extrair dos factos provados. Isto, designadamente, porque o R. apenas iniciou o exercício de actividade concorrente com a da A. após ter cessado a sua relação laboral com esta, num contexto de discussão e ponderação da sua posição societária (sendo sócio minoritário e não gerente) na A., havendo o R. diligenciado por deixar de ser sócio da A. antes da constituição da outra sociedade.
As discordâncias da apelante quanto à aplicação de Direito hão-de fundar-se, na relação do mesmo com os factos efectivamente provados e supra elencados.
Fundamentalmente, defende a apelante que o dever de lealdade, associando-se à obrigação de não concorrência, impõe que seja determinada a exclusão do R..
A A. é uma sociedade por quotas – pelo que é no âmbito das regras aplicáveis a estas sociedades que nos situamos.
Consoante refere Menezes Cordeiro ([3]) a exclusão de um sócio traduz o acto e o efeito de o irradicar da sociedade, tratando-se nos termos do direito privado de uma operação muito delicada: para além de pôr em causa o princípio da estabilidade dos contratos, implica a supressão, contra a vontade do visado de uma sua posição patrimonial e pessoal. Acrescenta que encontramos: hipóteses legais específicas de exclusão de sócio; um preceito de enquadramento que fixa algumas regras gerais sobre a exclusão (o art. 241); uma cláusula geral de exclusão, a que se chama “exclusão judicial” (art. 242).
Teremos, então, de considerar o preceituado no art. 242 do CSC cujo nº 1 determina: «Pode ser excluído por decisão judicial o sócio que, com o seu comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade lhe tenha causado ou possa vir a causar prejuízos relevantes».
Verificamos, assim, dois pressupostos: quanto ao sócio um comportamento desleal ou francamente perturbador do funcionamento da sociedade; quanto à sociedade prejuízos relevantes, efectivos ou possíveis.
Salienta Menezes Cordeiro ([4]), no que respeita à deslealdade, que «a deslealdade grave anda, na prática, em torno de questões de sigilo e de concorrência». Concretizando, na aplicação da cláusula geral do nº 1 art. 242, atenta a jurisprudência, com vista a integrá-la:
- «um sócio com conhecimentos importantes a respeito da empresa, coloca tais atributos ao serviço da concorrência e, ainda por cima, incita os funcionários da sociedade à deserção»;
- «um sócio, pouco tempo depois da renúncia à gerência da sociedade, começa a vender os mesmos produtos num seu estabelecimento, a utilizar os catálogos e os preçários da sociedade e a conquistar-lhe clientes, com prejuízos para ela»;
- «um sócio desenvolve uma actividade concorrencial com a da sociedade, procurando angariar mercado através da utilização de meios técnicos e do know how da própria sociedade».
Já Coutinho de Abreu ([5]) exemplificava como comportamentos desleais ou gravemente perturbadores do funcionamento da sociedade «o aproveitamento em benefício próprio de oportunidades de negócios da sociedade, a frequente propositura de acções chicaneiras contra a sociedade, a difusão de opiniões desabonatórias sobre a sociedade, a apropriação ilícita de bens sociais, a utilização em benefício próprio do património da sociedade, a revelação de segredos da organização empresarial da sociedade, actos de concorrência desleal contra a sociedade, provocação culposa de desavenças graves entre os sócios, assédio sexual a trabalhadores da sociedade».
Dizendo Raúl Ventura ([6]) que, em conformidade com o nº 1 do art. 242, o tribunal para decidir a exclusão do sócio deve dar como provados factos de duas ordens: «factos respeitantes ao comportamento do sócio que sejam qualificados ou como desleais ou como gravemente perturbadores de funcionamento da sociedade; factos relativos ao prejuízo causado à sociedade por aquele comportamento, prejuízo que deve ser relevante e que tanto pode já ter ocorrido como vir a ocorrer».
Escrevendo a propósito Carolina Cunha ([7]) que na dinâmica da cláusula geral do nº 1 do art. 242 os «factos relevantes restringem-se a certas condutas dos sócios – condutas em si mesmas já passíveis de um juízo de desvalor, quer por violarem princípios de lealdade, quer por entravarem o funcionamento da sociedade. Mas somos de opinião que a nota essencial, aquela que no seio do tipo sociedade por quotas confere sentido à opção legislativa pela prevalência do interesse da sociedade e que alicerça a concomitante inexigibilidade da permanência do sócio, reside no prejuízo actual ou potencial, que tais condutas provocam. Na ausência de prejuízo, o desvalor contido no comportamento dos sócios não bastará para fundar a respectiva exclusão».
Foi referido na sentença recorrida:
«O que se provou foi que o Réu, que não é gerente da Autora e é titular de uma quota de € 200,00 da Autora (sendo o outro sócio, a sociedade E..., Lda., Ldª, titular de uma quota no valor de € 1800,00, tendo a sociedade Autora o capital social € 2.000,00), cessou o seu contrato de trabalho com a Autora e pretendeu vender a sua quota ou comprar a quota da E..., Lda. em finais de Agosto de 2016 e que as negociações duraram desde 31 de Agosto de 2016 até finais de Dezembro de 2016 – cfr. factos provados nºs 5, 6, 7, 10, 11,12, 13, 31 e 32.
Não obstante ter ficado provado que o Réu, a partir de 19/09/2016 (data da constituição da sociedade B..., Lda.), passou a exercer actividade concorrente com a Autora (cfr. factos provados nºs 16, 17, 18 e 23), o certo é que também ficou provado que o Réu, ao cessar o seu contrato de trabalho com a Autora, pretendeu vender a sua quota pelo seu valor nominal, isto é, por € 200,00, mas tal proposta não foi aceite, porquanto as negociações desenrolaram-se entre 31/08/2016 e finais de Dezembro de 2016, sem que tenham terminado com acordo (cfr. factos provados nºs 5, 6, 12, 31 e 32).
Ou seja, resultou demonstrado que decorreram negociações entre os gerentes da Autora e o Réu, a partir de 31 de Agosto de 2016 (cfr. facto provado nº 5), em que foi ponderada não só a hipótese da venda da quota do Réu proposta por este, como a hipótese de aquisição pelo Réu da quota da outra sócia da Autora – E..., Lda. - e a hipótese da dissolução e extinção total da Autora (cfr. factos provados nºs 6, 10, 12, 31 e 32).
Isto é, o Réu apenas iniciou o exercício de actividade concorrente com a Autora após ter cessado a sua relação laboral com a Autora e após o início das negociações tendentes à alteração da sua posição societária, em que se discutiu a venda da sua quota ao outro sócio da Autora, a compra pelo Réu da quota do outro sócio e a dissolução e a extinção total da Autora.
Neste contexto de discussão e ponderação da posição societária do Réu na Autora (sócio minoritário e não gerente), em que se ponderou não só a venda da quota do Réu ao outro sócio da Autora – a E..., Lda., como a compra pelo Réu da quota do outro sócio e como até a própria dissolução e extinção total da Autora, numa altura em que o Réu já havia cessado o seu contrato de trabalho com a Autora, não se nos afigura razoável que o Réu tivesse que aguardar indefinidamente pela obtenção de um acordo quanto à alteração da sua posição societária na Autora e ficasse impedido de constituir uma sociedade com o mesmo objecto e em que assumisse o cargo de gerente na nova sociedade.
Ou seja, no contexto supra enunciado, não se nos afigura que a constituição pelo Réu de uma sociedade em 19/09/2016 com o mesmo objecto da Autora se traduza num comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da Autora».
Argumenta a apelante no sentido de o R. haver tido um comportamento desleal e gravemente perturbador ao funcionamento da A., causando-lhe elevados prejuízos, retirando o Tribunal ilações desconformes com a matéria de facto, desde logo resultando dos factos provados que o comportamento do R. foi desleal, que se trata de um comportamento ilícito «ostensivamente violador do dever de lealdade e de não concorrência».
Vejamos.
O R. para além de sócio minoritário da A. era seu trabalhador subordinado, situação esta a que pôs fim com a rescisão do contrato de trabalho. A A. concretizava a sua actividade junto da N..., S.A. com a actuação desenvolvida pelo A. como seu trabalhador subordinado, com as funções de gestor de projectos na área da formação profissional, sendo ele quem contactava directamente com os clientes e com quem os mesmos estabeleciam relações de proximidade e confiança – com diminuta relevância, nesta parte, da sua qualidade de sócio detentor de uma quota que nem a 10% do capital social correspondia e que não era gerente da sociedade.
Com a cessação da sua relação laboral com a A. o R. pretendeu, também, pôr fim à relação societária nos termos em que esta se desenvolvia, propondo hipóteses várias – venda da sua participação, compra da participação da outra sócia, vindo a ser colocadas para além destas hipóteses a da dissolução e extinção da A.. Hipóteses estas que o R. e os gerentes da A. ponderaram e negociaram até final de Dezembro de 2016, sem que a negociação tivesse sucesso.
Foi neste contexto, que o R. constituiu em 19-9-2016 a sociedade B..., Lda. – que, em termos próximos da A., tem como objecto social a prestação de serviços de auditoria, consultoria e desenvolvimento de aplicações técnicas, tecnológicas e informáticas, formação técnica, comercial e comportamental, tratamento e transcrição de suportes de áudio e vídeo. Como se provou, a constituição da sociedade B..., Lda., Ld.ª e da marca O... ocorreu em articulação e com o intuito de desenvolver a mesma actividade da Autora.
Temos, pois, que sendo ainda sócio da A., praticando embora actos tendentes a deixar de o ser (designadamente com a proposta de venda da sua quota pelo valor nominal da mesma) ou a passar a ter outra situação social (com a proposta de compra da quota da outra sócia) o R. constituiu outra sociedade (da qual é gerente) para desenvolvimento da mesma actividade da A. – logo desenvolvendo com esta actividade concorrente.
Enquanto o art. 180 do CSC determina que os sócios das sociedades em nome colectivo têm o dever de não exercer por conta própria ou alheia actividade concorrente com a da sociedade, salvo expresso consentimento desta, o art. 254 do mesmo Código prevê, quanto às sociedades por quotas, a proibição de não concorrência por conta própria ou alheia dos gerentes destas sociedades, sem consentimento dos sócios. Em seguimento, no que concerne às sociedades em nome colectivo, o art. 186 do CSC prevê que a sociedade possa excluir um sócio quando lhe seja imputável violação grave das suas obrigações para com a sociedade, “designadamente da proibição de concorrência prescrita pelo artigo 180º”.
Explica Oliveira Ascensão ([8]) que esta causa de exclusão «é restrita a estas sociedades, por nas restantes os sócios não estarem sujeitos a um dever de não concorrência. É todavia discutível se o contrato da sociedade por quotas o pode estabelecer» ([9]).
Brito Correia ([10]) refere, a propósito, haver autores que defendem que os sócios de responsabilidade limitada estão também obrigados a não fazer concorrência à sociedade, por força do dever geral de colaboração. Citando Avelãs Nunes faz menção a não haver nestes casos uma obrigação de não concorrência, mas parecer que «poderá fazer-se a prova de que o sócio se vale da sua posição de sócio para fazer concorrência à sociedade, impedindo ou dificultando a realização do escopo social. E, sendo assim (...), pode justificar a exclusão do sócio concorrente». Acrescentando parecer ser de concordar com esta solução, embora o CSC não seja explícito acerca dela.
Neste contexto, a concorrência – no caso dos autos através da sociedade entretanto constituída, B..., Lda., e da criação da marca O..., constituição e criação ocorridas em articulação e com o intuito de desenvolver a mesma actividade da A. – não constituirá por si só, desacompanhada de factos que a qualifiquem nesse sentido, um comportamento desleal por parte do sócio, integrando a previsão da cláusula geral constante do nº 1 do art. 242.
Considerou o STJ no seu acórdão de 20-3-2018 ([11]): «Numa sociedade comercial por quotas, as características pessoais dos sócios, a comunhão de objectivos, a fidelidade, a solidariedade e coesão entre os sócios e a sociedade, em vista da prossecução do objectivo social, affectio societatis, ou bona fides societatis, são valores cívicos e jurídicos que exprimem lealdade, assumindo primordial relevância».
Referindo igualmente, agora no acórdão de 15-2-2005 ([12]): o sócio está «obrigado a não violar deveres de conduta que possam causar prejuízos à sociedade. Entre estes deveres acessórios apontam-se os de esclarecimento, de colaboração e de lealdade, deveres que fazem parte do conteúdo das obrigações, como exigências gerais do sistema jurídico (cfr. MENEZES CORDEIRO, "Direito das Obrigações", I, 1994, 149).
A violação desses deveres acessórios de conduta é, nas sociedades por quotas, o fundamento de exclusão acolhido pelo art. 242 n.º1 citado.
Por um lado, tem de demonstrar-se factos atinentes ao comportamento do sócio violadores do dever de lealdade ou gravemente perturbadores do funcionamento da sociedade e factos respeitantes ao prejuízo causado, que tem de ser significativo».
Factos respeitantes ao comportamento do sócio conduzirem à qualificação desse comportamento de desleal «depende das circunstâncias concretas da sociedade e do próprio modo como os factos ocorreram»; diz-nos, também, Raul Ventura ([13]) deverão ser separados, para um sócio gerente, o seu comportamento como gerente (sancionado com a destituição da gerência) e o seu comportamento como sócio, ao qual pode corresponder a exclusão». Salientando mais adiante ([14]) a propósito do preenchimento dos requisitos previstos no nº 1 do art. 242, ser indispensável que «o fundamento invocado respeite ao comportamento do sócio, como sócio, contraposto ao comportamento que ele tenha (ou à influência que o facto relativo à pessoa possa ter) nalgum cargo social...»
Deveremos, assim e também, considerar aqui o comportamento do R. enquanto sócio da A. e não enquanto trabalhador subordinado da mesma.
O R. constituiu a nova sociedade, quando sócio da A. mas numa ocasião em que, depois da desvinculação como trabalhador, se encontrava em processo (que não veio a ter sucesso) de alterar a sua posição naquela sociedade com a venda da sua participação ou a compra da participação da outra sócia (vindo a ser colocadas para além destas hipóteses a da dissolução e extinção da A.), hipóteses estas que o R. e os gerentes da A. ponderaram e negociaram até final de Dezembro de 2016.
Mesmo que o R. não tenha comunicado à A. que ia constituir outra sociedade, de todo o seu comportamento retirava-se que pretendia seguir por uma via que não incluía a A., nos termos em que até então sucedera. Aliás, em Outubro de 2016 o R. – já afastado da A. - e a A. estiveram a dar formação ao mesmo cliente, bem como o R. na comunicação enviada à A. em 6 de Setembro aludira a querer rapidamente preparar o seu futuro e projectos vindouros.
É certo que o R., em 31 de Agosto avisou a N..., S.A. de que iria deixar de trabalhar para a A. – mas tal não é desprovido de sentido, uma vez que o R. exerceu actividade na N..., S.A. por conta da A., tendo neste âmbito e com este cliente uma relação de proximidade e confiança.
A partir de Outubro de 2016 o R. foi trabalhar para a N..., S.A. atenta a já aludida relação de proximidade e confiança que tinha com a cliente e houve trabalhadores da A. que cessaram os respectivos contratos de trabalho e passaram a trabalhar com o R. na nova empresa deste.
Entre outra factualidade alegada pela A., não se provou, que a B..., Lda./O... utilizasse na promoção da sua actividade comercial material comercial igual ao da A. e criado por esta, havendo o R. ao abandonar as suas funções laborais, levado consigo todo aquele material que estivesse ao seu alcance, bem como que o R. se tivesse apropriado de produtos e serviços desenvolvidos pela A., de programas informáticos e plataformas de trabalho, brochuras, informação comercial, base de clientes e preçários e que o R. se encontre a utilizar informação privilegiada da A.; tal como não se provou que o R. houvesse denegrido a imagem da A. junto do cliente N..., S.A. e dos restantes clientes.
Afigura-se-nos, neste contexto, que não teremos factos suficientes para caracterizar um comportamento do R., como sócio, violador do dever de lealdade para com a sociedade A..
O que temos, essencialmente, é que através de outra sociedade de que o R. é sócio é exercida actividade concorrente com a da A. - bem, como referimos, alguns trabalhadores da A. foram colaborar com o R. e este a partir de Outubro de 2016 passou a trabalhar com a N..., S.A., cliente com quem tinha relação de proximidade e confiança, deixando a A. a partir de Janeiro de 2017 de prestar serviços para a N..., S.A..
Ressalve-se que a concorrência levada a cabo, atentos os factos provados, não se reconduz a concorrência desleal com a A. – a qual conformaria, então, um comportamento violador do dever de lealdade para com esta.
O acto de concorrência desleal é, desde logo, um acto de concorrência, ou seja um acto de que decorre a obtenção ou desenvolvimento de uma clientela própria em detrimento de uma clientela alheia, efectiva ou em perspectiva potencial.
Segundo o nº 1 do art. 317 do CPI constitui concorrência desleal «todo o acto de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de actividade económica». Visam-se, aqui os comportamentos desonestos e censuráveis entre concorrentes e não a concorrência. Carlos Olavo ([15]) refere a distinção entre concorrência desleal e «concorrência proibida ou ilícita», esclarecendo que pressupondo o «instituto da concorrência desleal uma situação de liberdade de concorrência, estão fora do seu âmbito todas aquelas normas que excluem a própria existência de concorrência», dando como exemplo o art. 180 do CSC que proíbe os sócios das sociedades em nome colectivo de exercerem por conta própria ou alheia actividade concorrente com a da sociedade e de serem sócios de responsabilidade ilimitada noutra sociedade (salvo consentimento de todos os sócios).
No caso dos autos não estamos perante concorrência desleal nem perante concorrência ilícita, reafirmando-se que entendemos não terem resultado provados factos susceptíveis de nos fazer concluir pelo comportamento desleal do R..
Falhando a razão à apelante quando afirma que o «comportamento do Réu é ilícito, ostensivamente violador do dever de lealdade e de não concorrência».
Lateralmente, sempre se dirá que se afigura não resultar dos factos provados que o comportamento do R., designadamente na sua qualidade de sócio, haja sido gravemente perturbador do funcionamento da sociedade.
O R. não exercia na sociedade A. qualquer cargo social. Todavia, era trabalhador da mesma, executando (como trabalhador subordinado) funções relevantes na área da formação profissional, contactando directamente com os clientes cujos projectos geria e estabelecendo com eles relações de proximidade e confiança. O que terá perturbado o funcionamento da sociedade A. foi o R. ter rescindido o contrato de trabalho, deixando de trabalhar para a sociedade (bem como posteriormente outros trabalhadores terem deixado de trabalhar para a A. como é o caso de I... que rescindiu o contrato com efeitos a final de Outubro de 2016, tendo J... deixado de trabalhar para a A. em Outubro de 2016). Provou-se, aliás, que atenta a redução de pessoal a A. reuniu com o seu principal cliente, a N..., S.A., dando-lhe conta da alteração de pessoal e da necessidade de encontrar uma solução provisória para a assegurar a continuidade e qualidade dos serviços. Aparentemente a A. ter-se-á debatido com algumas dificuldades decorrentes da redução de pessoal, mas não era por ser sócio em simultâneo com a sua situação de trabalhador subordinado que o R. estaria cerceado na sua liberdade de fazer cessar o contrato de trabalho, como o fez, não nos cumprindo, embora, debruçar sobre as questões emergentes da relação de trabalho subordinado que teve lugar entre as partes.
Referimos acima a necessidade de verificação de dois pressupostos para que, na sociedade por quotas, tenha lugar a exclusão judicial: quanto ao sócio um comportamento desleal ou francamente perturbador do funcionamento da sociedade; quanto à sociedade prejuízos relevantes, efectivos ou possíveis.
Faltando-nos, desde logo, o primeiro pressuposto enunciado a pretensão de exclusão havia de improceder.
Do mesmo modo, não estando demonstrado um acto ilícito por parte do R., este não está sujeito à obrigação de indemnizar a A..
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V – Face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela apelante.
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Lisboa, 7 de Fevereiro de 2019

Maria José Mouro
Jorge Vilaça
Vaz Gomes

[1] Na já mencionada obra «Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2013, pag. 235.
[2] Consoante o site da DGERT (Direcção Geral do Emprego e das Relações de Trabalho) a «certificação da entidade formadora é um reconhecimento global da capacidade da entidade executar formação profissional, de acordo com um referencial de qualidade específico para essa atividade». A certificação da entidade formadora significará um reconhecimento externo da qualidade da sua prestação de serviços de formação.
[3] Em «Código das Sociedades Comerciais Anotado», coordenação de Menezes Cordeiro, Almedina, 2ª edição, pags. 703-704. Bem como em «Direito das Sociedades», II vol., Almedina, 2017, pags. 333-334.
[4] Em «Sociedades por Quotas», vol. II, Almedina, 1989, pag. 706.
[5] Em «Curso de Direito Comercial», Almedina, 2004, vol. II pag. 431.
[6] Obra citada, pag. 60.
[7] No «Código das Sociedades Comerciais em Comentário», coordenado por Coutinho de Abreu, vol. III, Almedina, pags. 583-584;
[8] Em «Direito Comercial» - vol. IV, «Sociedades Comerciais – Parte Geral», 2000, pag. 377.
[9] Itálico nosso.
[10] Em «Direito Comercial – Sociedades Comerciais» (II vol.) edição da AAFDL, 1989, pag. 470, nota 32.
[11] Ao qual se pode aceder em www.dgsi.pt, proc. 982/13.2TYVNG.P1.S1.
[12] Ao qual se pode aceder em www.dgsi.pt, proc. 04A4369.
[13] Obra citada, pag. 60.
[14] Pag. 66.
[15] Em «Propriedade Industrial», vol. I, Almedina, 2ª edição, pag.254.