Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
294/07-2
Relator: CARVALHO MARTINS
Descritores: DECLARAÇÃO
NULIDADE
CASAMENTO CATÓLICO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/22/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO
Sumário: O Código Civil no seu artigo 1625.° continua a determinar que sobre a validade do casamento canónico e a dispensa de casamento rato e não consumado decidem os Tribunais eclesiásticos e o artigo 1626°.°, referindo-se ao respectivo processo, prescreve que as Relações tornarão executórias aquelas decisões independentemente de revisão e confirmação.
Permanecendo, como permanece, ainda em vigor a reserva de competência conferida aos tribunais eclesiásticos para conhecerem da dispensa de casamento rato e não consumado e a competência, nos termos indicados, do Tribunal da Relação para simplesmente ordenar a executoriedade daquelas decisões deverá concluir-se que este último Tribunal só poderá recusar a referida executoriedade quando as decisões não venham acompanhadas ou revestidas de todos os requisitos meramente formais.
Para tal não terá a Relação de olhar para outras normas de direito interno que não sejam os citados textos do artigo XXV da Concordata e dos artigos 1625.° e 1626.° do Código Civil.
Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:



I - A Causa:


Na acção declarativa de simples apreciação, com processo ordinário, n.° 1006/06. 1TBFLG., em que é Autora Eduarda C..., com residência na Rua Condessa M..., lugar das T..., freguesia de M..., Felgueiras, e Réu Marco C..., residente na Avenida General S... P..., da mesma freguesia, foi pedido que se declare que o casamento civil que ela celebrou com Marco C... deixou de produzir efeitos civis; e que, consequentemente, a Autora deixou de ser casada com o aqui Requerido. Baseava-se, para o efeito, no seguinte circunstancialismo:

1.- A autora e o réu mantiveram relações sexuais, de que resultou, em 20 de Agosto de 1994, o nascimento do menor JOÃO M... que foi registado como filho da Autora e do Requerido.
2.- Nem a Autora, nem o Requerido, por serem ambos estudantes, reuniam condições económicas para constituírem família, nem podiam contar para isso com o apoio dos respectivos pais, por falta de recursos.
3.- Estas circunstâncias sujeitavam a Autora a viver na condição, socialmente desvalorizada, de mãe solteira.
4.- Para atenuar o impacte desta situação no meio em que vivia, e poder, ao menos, baptizar o filho já no estado de casada, a Autora propôs ao

Demandado a celebração de casamento civil, embora sem o propósito de constituírem, por essa forma, a família que idealizavam.
5.- E esse casamento realizou-se em 11 de Janeiro de 1995, na Conservatória do Registo Civil de Felgueiras, sem precedência de convenção antenupcial.
6. - Só em 13 de Janeiro de 1996, as partes celebraram casamento católico na igreja paroquial de Margaride.
7.- Em 27 de Outubro de 1997, a Autora propôs no Tribunal Eclesiástico do Porto, uma acção de nulidade do casamento católico que contraíra com o Requerido em 13.01.1996.
8.- Essa acção foi julgada procedente por sentença do Tribunal Eclesiástico do Porto de 24 de Fevereiro de 1999 e confirmada por Decreto do Tribunal Metropolitano de Braga de 12 de Outubro de 1999.
9.- Por acórdão de da Relação do Porto, essa decisão de 16 de Maio de 2000, foi “ executória e averbada no assento de casamento, em conformidade com o disposto no artigo 1626° do Código Civil.
10.- Em Outubro de 2002, a Autora requereu aos Serviços de Identificação Civil da Direcção Geral dos Registos e do Notariado a emissão de novo Bilhete de Identidade de Cidadão Nacional.
11.- Esperava ela que, nesse novo Bilhete, o seu estado civil fosse identificado pela categoria de “SOLTEIRA”, mas a que lhe puseram foi a de “CASADA”.
12.- Ao pedir esclarecimento, por julgar tratar-se de um erro, foi-lhe dito que a declaração de nulidade se referia apenas ao casamento católico e que se mantinha em vigor o casamento civil anterior.
13.- Esta posição assenta na ideia de que as Partes, após a celebração do casamento católico posterior, ficaram unidas por dois vínculos conjugais, juridicamente autónomos, e que a subsequente declaração de nulidade do casamento católico não teve qualquer repercussão sobre o casamento civil.

14.- A vingar tal posição, sujeitar-se-ão as Partes a terem de recorrer ao divórcio para recuperarem a liberdade civil, por muito que eventualmente lhes desagrade a condição civil de “divorciados”.

Regularmente citado o réu não contestou.

Oportunamente, foi proferida decisão, onde se consagrou que:

Posto isto, e não tendo sido invocada qualquer causa para a invalidade do casamento civil celebrado entre autora e réu (cfr. artigos 1623.0, 1624.0, e 1625.0, do C. C.), é manifesto que a pretensão da autora tem de improceder.
Em face do exposto, julgo a presente acção improcedente.

Eduarda C... notificada da sentença que julgou a acção improcedente, veio dela interpor recurso de Apelação, alegando e concluindo que:

a) Os efeitos civis dos casamentos católicos e das decisões dos tribunais eclesiásticos sobre a nulidade desses casamentos constituem matéria da competência exclusiva do Estado;
b) O casamento católico contraído pela Recorrente após ter contraído casamento civil e sem que este tenha sido dissolvido era permitido pelo artigo 1589°, n° 1 do Código Civil;
c) Esse casamento católico foi averbado ao assento de casamento lavrado no registo civil, em conformidade com o referido n° 1 do artigo 1589°;
d) Embora o matrimónio católico seja considerado pela Igreja Católica um sacramento e, como tal, um meio de santificação, o Estado reconhece-o como casamento por ser também um contrato e se integrar no conceito de casamento do artigo 1577° do Código Civil;

e) A situação resultante da celebração do casamento católico posterior ao civil deve ser concebida como mera opção por outra modalidade de vínculo matrimonial e não como um segundo casamento;
O A lei portuguesa consagra a unicidade do vinculo matrimonial (artigo 157 7° do Código Civil), embora admita duas modalidades de vínculo (artigo 15 87°, O 1 do Código Civil - “O casamento é católico ou civil”);
g) As duas modalidades não são cumuláveis - o casamento é católico civil - nem foi admitida qualquer modalidade mista;
h) Foi apenas permitida que quem optava pela modalidade civil podia, posteriormente, substituir essa modalidade pela do casamento católico;
i) A sentença recorrida limitou-se a tomar uma posição decorrente da ideia de total autonomia do casamento civil anterior em relação ao casamento católico posterior, sem tentar sequer fundamentá-la como eventual conclusão de normas jurídicas;
j) Ora, essa posição revela-se insustentável perante a necessidade de interpretar ou integrar normas aplicáveis de acordo com os critérios normativos fixados pelos artigos 9° e 10.0 do Código Civil;
1) Não pode negar-se a relevância jurídica do casamento católico contraído pela Recorrente porque ela decorre do artigo XXII da Concordata, do n° 2 do art° 1587° do Código Civil e do próprio n° 1 do artigo 1589° do mesmo Código que o autoriza e o qualifica como “casamento”;
rn) Não pode igualmente negar-se a relevancia da decisão que o declarou nulo porque é o próprio artigo 1626° do Código Civil que prevê a sua comunicação ao Estado e o exame pelo tribunal da Relação para o respectivo acórdão de “Exequatur”;
n) A posição adoptada na sentença ignora o regime concordatário e articula se com o da total separação da Igreja e do Estado;
o) O casamento católico posterior previsto no n° 1 do artigo 1589° deverá ser entendido como a única modalidade de casamento que passa a vigorar após a respectiva celebração;
p) Esta interpretação é a que decorre da aplicação dos critérios normativos do art° 9° do Código Civil às normas aplicáveis ao casamento;
q) A declaração de nulidade do casamento católico da Recorrente implica o regresso ao seu estado de solteira;
r) Caso se entenda que existe uma lacuna da lei para apreciar e decidir a situação decorrente da nulidade do casamento, deverá então integrar-se a alegada lacuna pela recurso à norma sugerida pelo artigo 206°, n° 2 do Código de Registo Civil de 1957 (DL. 4167 de 22.11.1958), mas com a seguinte redacção:
“o averbamento do casamento católico posterior à celebração do casamento civil, os cônjuges serão havidos como casados apenas catolicamente desde a celebração do casamento católico”
s) Integrada essa lacuna, e considerada a declaração de nulidade subsequente, segue-se o desenvolvimento já apontado.
Pelos fundamentos alegados, deve julgar-se procedente a Apelação e revogar-se a sentença, assim se fazendo JUSTIÇA.

Não foram proferidas contra-alegações.

II. Os Fundamentos:

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

Matéria de Facto assente na 1 Instância e que consta da sentença recorrida:
1.- Autora e réu celebraram casamento civil em 11 de Janeiro de 1995, na Conservatória do Registo Civil de Felgueiras, sem precedência de convenção antenupcial.
2. - Posteriormente, em 13 de Janeiro de 1996, as partes celebraram casamento católico na igreja paroquial de Margaride.
3.- O casamento católico foi averbado no assento de casamento da autora e do réu.


4- Por Acórdão da Relação do Porto, datado de 16 de Maio de 2000, foi conferida força executória à declaração de nulidade do casamento católico celebrado entre autora e réu.
5- Esta decisão foi averbada no assento de casamento da autora e do réu.
6- Em 18-1 1-2004 foi emitido o Bilhete de identidade da Autora, no qual consta no seu estado civil “CASADA”.

Nos termos do art. 684°, n°3, e 690°,n°1, do CPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões da recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n°2, do art. 660°, do mesmo Código.

Das conclusões, ressalta a seguinte questão:

1. A declaração de nulidade do casamento católico da Recorrente implica o regresso ao seu estado de solteira?

Apreciando dir-se-á, pressuponentemente, que a citação, na sentença, do Ac. STJ, de 20.09.1965, BMJ 149, pág. 396, não se configura como inteiramente rigorosa, em termos de transcrição, e decorrência, pois o que aí se consagra - em circunstâncias de lide perfeitamente diferenciadas e ultrapassadas, temporal e conceitualmente, pela nova realidade legislativa -, para além do início (e apenas isso) da narratividade factual, é, por remissão intertextual expressiva, que:

1 - O adultério do marido é equiparado, em carácter e gravidade, ao adultério da mulher como causa do divórcio ou de separação de pessoas e bens. II - Nos termos do artigo 61.0 da Lei do Divórcio, o adultério do marido ou da mulher só é criminoso quando ocorrer durante a vida dos cônjuges em comum, mas os cônjuges separados de pessoas e bens não estão dispensados do dever de fidelidade que o adultério não deixa de constituir causa de separação ou divórcio. III - O mesmo facto de adultério que deu causa à separação de pessoas e bens de cônjuges casados canonicamente após o casamento civil, não pode servir de base ao divórcio pedido depois da anulação do casamento canónico, a não ser no próprio processo de separação e ao abrigo do artigo 46.º do Decreto de 3 de Novembro de 1910.

O que se julga ter feito inflectir a decisão para consagração que se não considera a mais consentânea com a legislação vigente, nem com a própria mens legislatoris, no que respeita às ordens jurídicas “concordatárias”.

Na verdade, por efeito da Concordata com a Santa Sé, confirmada e ratificada em 1/6/1940 (D.G. de 10/7/1940) passou a existir no nosso pais uma coordenação de dois ordenamentos - o civil e o canónico — relativamente ao acto matrimonial, coordenação que foi seguida em diplomas fundamentais sobre a matéria e atingiu o Código Civil de 1966.

O texto da Concordata mantém-se, ainda, em vigor.

Com efeito, e depois da revolução de 25 de Abril - no que importa fazer ressumar -, apenas sofreu alteração a cláusula XXIV pelo Protocolo de 15/2/1975, aprovado pelo Dec.-Lei n° 185/75 de 4/4 (que pôs termo à proibição do divórcio civil para os casados canonicamente sob a égide do regime concordatário) e só vozes isoladas sustentam a derrogação da cláusula XXV pelo art. 36 n° 2 da nova Constituição Política e que prescreve que a lei (civil) regula os requisitos e os efeitos do casamento e da sua dissolução por morte ou divórcio, independentemente da sua forma de celebração (é o caso de Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, 1980, 106, e que tem contra si a generalidade dos autores, entre eles Antunes Varela, Direito de Famílía, 1987, Curso de Direito de Família,1981, 358, bem como a jurisprudência dominante e de que são exemplo os Acórdãos do S.T.J. de 29/6/78, B.M.J. 278°, 228 e de 22.2.83, BMJ 324°, 590).

Ora, a cláusula XXV em vigor, portanto, estabelece:

«O conhecimento das causas concernentes à nulidade do casamento católico e à dispensa do casamento rato e não consumado é reservado aos tribunais e repartições eclesiásticas competentes. As decisões e sentenças dessas repartições, quando definitivas, subirão ao Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica para verificação e transmitidas por via diplomática ao Tribunal da Relação territorialmente competente que as tornará executórias, e mandará - sejam averbadas nos registos do estado civil à margem do casamento».

E, em consonância com este dispositivo, o Código Civil determinava e continua a determinar no seu art. 1625° que sobre a validade do casamento canónico e do casamento rato e não consumado, decidem os tribunais eclesiásticos e no art. 1626°, que as Relações territorialmente competentes tornarão executórias aquelas decisões, independentemente de revisão e confirmação.
Quer isto dizer - na temporalidade em causa - que, o presente Tribunal apenas tem que conferir o preenchimento dos requisitos formais pela decisão a executar, e verificar, igualmente, se ela versa sobre as matérias atrás referidas, não lhe cabendo revê-la ou confirmá-la e sendo a competência da Relação determinada, como explica Antunes Varela (Código Civil Anotado, vol. IV, 2 ed., 152) pela área onde se situa a Conservatória em que a transcrição do casamento foi efectuada.
E preenchidos tais requisitos, mandará a Relação averbar a decisão nos livros de registo civil, de acordo com o disposto nos arts. 85°, 87°, n°1 ai. b), 990 n°s 1 e 2 e 100° n°s 1 e 2 do Código respectivo.
No caso vertente, mostram-se, como atrás se viu, preenchidos todos os pressupostos indicados, incluindo o da competência desta Relação, em cujo distrito judicial se a integra a Conservatória do Registo Civil em causa (cfr. mapa anexo 1 do Dec.-Lei n°214/88 de 17/6) (cf Ac. RC., de 28 de Março de 1995, CJ, Ano XX, 1995, II ,pp.20-21).

Neste sentido e sobre competência para o conhecimento da nulidade e dissolução do casamento católico, leiam-se Mário de Figueiredo, O Casamento e a Concordata, págs. 91 e segs., o despacho do Ministro da Justiça, de 3 de Março de 1945, no Boletim Oficial do Ministério da Justiça, ano 5.°, pág. 173, os acórdãos das Relações de Coimbra e de Lisboa, de 7 de Julho de 1959, 22 de Novembro de 1960, e 6 de Março de 1974 (sumário), aqueles na Jurisprudência das Relações, respectivamente ano 5.°, pág. 793, e ano 6.°, pág. 1064, e este no Boletim, n.° 235, pág. 343, e ainda o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5 de Fevereiro de 1974, também no Boletim, n.° 234, pág. 258.

Após a vigência da Constituição Política de 1976, cujo artigo 36.°, n.° 2 — na redacção inicial e depois da revisão de 1982 — preceitua que «a lei regula os requisitos e os efeitos do casamento e da sua dissolução, por morte ou divórcio, independentemente da forma de celebração, tem-se questionado, com efeito, sobre a vigência da cláusula XXV da Concordata com a Santa Sé, de 1 de Junho de 1940, e do próprio artigo 1625.” do Código Civil.
Assim, enquanto Gomes Canotilho, Vital Moreira, e Soares Martinez, se pronunciam pela sua revogação, Antunes Varela, Pereira Coelho e o Supremo Tribunal de Justiça, sustentam a respectiva vigência — cfr., respectivamente, a Constituição da República Portuguesa Anotada, 1980, pág. 106, Comentários à Constituição Portuguesa de 1976, pág. 53, a
Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 113.°, págs. 330 a 333, o Curso de Direito de Família, 1981, pág. 358, e o acórdão de 29 de Junho de
1978, no Boletim, n.° 278, pág. 228.



Serve isto, também, para dizer que, por efeito da Concordata com a Santa Sé, confirmada e ratificada em 1 de Junho de 1940 (Diário do Governo, de 10 de Julho daquele ano), passou a existir a coordenação de dois ordenamentos — o civil e o canónico — relativamente ao acto matrimonial e tal coordenação em razão das respectivas normas convencionais de direito internacional, foi seguida em diplomas fundamentais sobre a matéria e atingiu o Código Civil de 1966.
O texto da Concordata - no que se destaca -mantém-se ainda em vigor.
Apenas sofreu alteração a cláusula XXIV pelo Protocolo de 5 de Fevereiro de 1975, aprovada pelo Decreto-Lei n.° 187/75, de 4 de Abril do mesmo ano, alteração esta que veio a tornar possível a atrás referida revogação do artigo 1790.° do Código Civil.
Em vigor está, pois, a cláusula XXV que, efectivamente, estabelece que o conhecimento das causas concernentes à nulidade do casamento católico e à dispensa do casamento rato e não consumado é reservada aos tribunais e repartições eclesiásticos competentes. As decisões e sentenças destas repartições e tribunais, quando definitivas, subirão ao Supremo Tribunal de Assinatura Apostólica para verificação e serão, depois, com os respectivos decretos daquele Supremo Tribunal, transmitidas, pela via diplomática, ao Tribunal da Relação do Estado, territorialmente competente, que as tornará executivas e mandará sejam averbadas nos registos do estado civil, à margem do casamento.
Paralelamente, o Código Civil no seu artigo 1625.° continua a determinar que sobre a validade do casamento canónico e a dispensa de casamento rato e não consumado decidem os Tribunais eclesiásticos e o artigo 1626°.°, referindo-se ao respectivo processo, prescreve que as Relações tornarão executórias aquelas decisões independentemente de revisão e confirmação.
Permanecendo, como permanece, ainda em vigor a reserva de competência conferida aos tribunais eclesiásticos para conhecerem da dispensa de casamento rato e não consumado e a competência, nos termos indicados, do Tribunal da Relação para simplesmente ordenar a executoriedade daquelas decisões deverá concluir-se que este último Tribunal só poderá recusar a referida executoriedade quando as decisões não venham acompanhadas ou revestidas de todos os requisitos meramente formais.
Para tal não terá a Relação de olhar para outras normas de direito interno que não sejam os citados textos do artigo XXV da Concordata e dos artigos 1625.° e 1626.° do Código Civil.
A actividade daquele tribunal exerce-se independentemente de revisão e de confirmação, como estabelece o último dos preceitos citados, não sendo, pois, aplicáveis as normas dos artigos 1094.° e segs. do Código de Processo Civil e, por isso, em caso algum, se examinará o mérito da decisão.
Negar o exequatur, por outro fundamento que não seja meramente formal nos termos ditos, e pronunciar «in limine» a inutilização da decisão proferida dentro dos limites de um ordenamento no qual o Estado Português convencionou não pretender intervir, será desrespeitar as normas do direito internacional.
Perante tal sistema é indiferente o interesse, maior ou menor, que na ordem estadual assuma a decisão da dissolução do casamento pronunciada pelos tribunais eclesiásticos.

Para além do interesse confessional que está na base desse sistema e que a requerente pode legitimamente querer atingir com a dissolução do casamento obtida por via eclesiástica, deverá ponderar-se o caso do n.° 2 do artigo 1859.° do Código Civil sobre dualidade de casamento, no sentido de efeitos que a requerente pode pretender apagar na ordem social. A lei permite-lhe e não lhe incompatibiliza o exercício desse direito.
No caso dos presentes autos, tendo em atenção tudo o que já foi descrito a seu propósito, encontram-se preenchidos todos os requisitos exigidos pela legislação em vigor para que possa ser concedida a pretendida executoríedade, nos termos solicitados.
Impõe-se, assim, mandar que seja lavrado o competente averbamento na Conservatória do Registo Civil competente, do assento de casamento ali regulado e em referência (Cf. Ac. STJ., de 29 de Junho, de 1978, BMJ 278, pp.228-231).
Decorrentemente, a declaração de nulidade do casamento católico da Recorrente implica o regresso ao seu estado de solteira.

Pode, assim, concluir-se que:

1. Para além do interesse confessional que está na base desse sistema e que a requerente pode legitimamente querer atingir com a dissolução do casamento obtida por via eclesiástica, deverá ponderar-se o caso do n.° 2 do artigo 1 859.° do Código Civil sobre dualidade de casamento, no sentido de efeitos que a requerente pode pretender apagar na ordem social. A lei permite-lhe e não lhe incompatibiliza o exercício desse direito.

2.No caso dos presentes autos, tendo em atenção tudo o que já foi descrito a seu propósito, encontram-se preenchidos todos os requisitos exigidos pela legislação em vigor para que possa ser concedida a pretendida executoriedade, nos termos solicitados.

3 .Impõe-se, assim, mandar que seja lavrado o competente averbamento na Conservatória do Registo Civil competente, do assento de casamento ali regulado e em referência.

4.Decorrentemente, a declaração de nulidade do casamento católico da Recorrente implica o regresso ao seu estado de solteira.

III. A Decisão:

Pelas razões expostas, concede-se provimento ao recurso interposto, revogando-se a decisão recorrida.

Sem Custas.

Guimarães, 22 de Março de 2007