Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
56/14.9TBCBT.G1
Relator: RAQUEL REGO
Descritores: COMPETÊNCIA MATERIAL
CONTRATO DE EMPREITADA
PESSOA COLECTIVA DE DIREITO PÚBLICO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/04/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: É da competência dos tribunais administrativos o julgamento da acção respeitante a questões derivadas da execução de um contrato de empreitada celebrado entre uma associação de utilidade pública e um empreiteiro, para a construção de um Centro Comunitário financiado pelo Instituto da Segurança Social.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães


I – RELATÓRIO.


“B…, SA,” propôs a presente acção declarativa comum contra “Casa do Povo de F…”, pedindo a condenação da ré a restituir-lhe o valor correspondente à garantia bancária prestada, por incumprimento do contrato de empreitada e por abuso de direito, bem como valores relativos a danos daí decorrentes, incluindo juros.
Para tanto e em suma, invoca que, no âmbito da sua actividade comercial, celebrou com a ré – pessoa colectiva de utilidade pública - um contrato de empreitada para construção do “Centro Comunitário da Mota”, no âmbito do qual teve de prestar caução, sob forma de garantia bancária, que esta fez accionar sem fundamento.

2. Na contestação apresentada, a ré invoca, além do mais, a excepção da incompetência material do tribunal, com fundamento de o contrato de empreitada celebrado constituir um acto administrativo, concluindo, por isso, que a lide é do foro administrativo.

3. Foi proferida a decisão ora recorrida, que conclui pela procedência da excepção, basicamente por entender que, nos termos em que foi proposta a presente acção, a causa de pedir se reconduz ao incumprimento de um contrato de empreitada de obras públicas, a cujo regime o mesmo foi submetido pelas partes contratantes, por via da violação dos deveres e obrigações do mesmo emergente e que a situação ora em apreço encontra arrimo legal nas al. e) e f) do artº 4º do ETAF.
Que visto ainda os artºs 4º e 5º do DL 18/2008, de 29/01 (código dos Contratos públicos, que aqui se aplica atendendo que a celebração deste contrato ocorreu em momento posterior à entrada em vigor do DL), este contrato não está expressamente excluído do seu âmbito de aplicação e que, sendo a ré é uma pessoa colectiva de utilidade pública (fls. 28) – art. 2º, n.º 2 al. a) do DL 18/2008, o contrato em causa reconduz-se à previsão do artº 6º, nº1, al. a).
Que tendo as próprias partes querido atribuir ao contrato que constitui a causa de pedir a natureza de contrato público e submetê-lo a tal regime (veja-se a clausula 6ª do contrato de fls. 30 e ss.), não cabe ao contencioso judicial o conhecimento dos pedidos formulados, mas ao contencioso administrativo.

4. Inconformada, desta decisão recorreu a autora, concluindo as suas doutas alegações nos seguintes termos:
- Em nenhuma cláusula do contrato de empreitada celebrado a Autora, aqui Recorrente, manifestou a sua vontade em submeter o contrato ao regime substantivo do direito administrativo, designadamente, parte III do Código dos Contratos Públicos.
- Ambas as partes acordaram na cláusula 13.a que seriam competente o foro da comarca de Celorico de Basto, excluindo assim deliberadamente o foro administrativo e optando por submeter o contrato ao regime de direito civil.
- Não estando expressamente prevista ou acordada pelas partes a submissão às regras da parte III do Código dos Contratos Públicos, não podia o Tribunal a quo extrair um sentido que o texto do próprio contrato de empreitada não comporta.
- O Tribunal a quo errou, assim, salvo o devido respeito, na interpretação e qualificação jurídica do contrato em causa, tendo violado as regras dos artigos 236°, 237° e 238° do Código Civil.
- Sendo a Ré, ora recorrida, uma pessoa colectiva de direito privado, não se verifica, para além do necessário acordo de vontades, outro dos pressupostos legais exigidos pelo artº 1º, nº6 do Código dos Contratos Públicos, ou seja, que uma das partes seja "contraente público".
- A Ré, ora recorrida, não alegou nem demonstrou que constitui uma das entidades elencadas no artº 2°, n1 e 2 do Código dos Contratos Públicos, como lhe competia segundo as regras do ónus da prova, pelo que jamais podia ser considerada "entidade adjudicante".
- Ainda que tivesse feito tal prova, e não fez, tendo em conta o disposto no artº 1º, nº5 e 3º, nº2 do Código dos Contratos Públicos, que o Tribunal a quo devia ter aplicado, o contrato de empreitada em causa não poderia ser submetido ao "regime substantivo dos Contratos Públicos" por falta de vontade das partes.
- Por fim, a Sentença proferida é nula nos termos do artigo 615º, nº1, b) do CPC, uma vez que o Sr. Juiz não fundamentou de facto a aplicação do disposto nas alíneas e) e f) do artº 4º do ETAF, limitando-se a dizer que o caso dos autos encontra "arrimo legal nas alíneas e) e f)", sem contudo esclarecer o seu entendimento de acordo com as várias hipóteses previstas nas duas normas.
- O Tribunal a quo interpretou e aplicou, ainda, erradamente o referido artº 4º, e) e f) do ETAF, por ser inaplicável à situação em apreço, uma vez que falta lei, acordo de vontades ou uma entidade pública ou concessionário que seja parte no contrato.
- Em face do exposto, deveria salvo o devido respeito, o Tribunal a quo considerar o contrato em causa um típico contrato de empreitada, regulado pelo artigo 1207º do Código Civil, julgando-se competente para decidir a presente questão.

Termina pela procedência do recurso e pela revogação da sentença que deverá ser substituída por outra que julgue o Tribunal materialmente competente para julgar a presente acção, prosseguindo a mesma os seus ulteriores trâmites até final.

2. Foram apresentadas contra-alegações pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
3. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO.

O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso.
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A factualidade a ter em conta é a que resulta do relatório supra, acrescida de:
- a ré é uma pessoa colectiva de utilidade pública, de base associativa, com o objectivo de promover o desenvolvimento e bem-estar da comunidade local, desenvolvendo actividades de carácter social, cultural, desportivo, recreativo ou outras, em colaboração com o Estado, as autarquias e INATEL, por forma a contribuir para a resolução de problemas da população na respectiva área.
- teor do contrato de empreitada de fls.30 e seguintes, junto com a petição sob documento nº3.
- teor do contrato de comparticipação financeira de fls.107, junto com a contestação sob documento nº1.
O direito:
A primeira das questões a ponderar é a da invocada nulidade da decisão, alegadamente sustentada no artº 615º, nº1, b), do Código de Processo Civil.
Diz a apelante que o tribunal a quo não fundamentou de facto a aplicação do disposto nas alíneas e) e f) do artº 4º do ETAF, limitando-se a dizer que o caso dos autos encontra nelas arrimo legal, sem contudo esclarecer o seu entendimento de acordo com as várias hipóteses previstas nas duas normas.
Conforme se tem repetidamente escrito, os vícios determinantes da nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade, como é a falta de assinatura do juiz, ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender conhecer questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia)… São, sempre, vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afectada.
Nos termos do citado preceito, a sentença é nula, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão - alínea b).
Todavia, têm a doutrina e a jurisprudência unanimemente entendido, que só a absoluta falta de fundamentação de facto ou de direito, determina a nulidade prevista naquela al. b) do nº1 do artº668º [Cf. Manual de Processo Civil, de A. Varela, J. M. Bezerra e S e Nora, 2ª Ed. pág. 687; Ac. S.T.J, de 5/01/84, Rev. Leg. Jur., Ano 121º, pág. 303; Ac. S.T.J., de 5/06/85].
Ora, mesmo a dar-se como certa a argumentação aduzida, nunca a decisão em crise padeceria do aludido vício uma vez que das próprias razões da recorrente resulta que não se verifica absoluta falta de fundamentação. Improcede, pois.
Cumpre, agora, apreciar do mérito da apelação, o mesmo é dizer, se a causa é, ou não, da competência dos tribunais administrativos como conclui a decisão recorrida.
De acordo com a doutrina, a competência em razão da matéria determina-se pelo conteúdo da lide, tendo em conta o pedido e a causa de pedir – veja-se, entre outros, Alberto dos Reis, no Comentário ao Código de Processo Civil, vol.I, pag.10 e Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pag.88.
Também a jurisprudência se tem orientado no mesmo sentido, sendo exemplo disso o Ac. RP de 08.04.02, publicado no respectivo “site”, onde se decidiu que “para responder a esta questão importa ter presente a pretensão formulada pela autora e os fundamentos em que a mesma se baseia...e deve olhar-se aos termos em que a acção foi posta, seja quanto aos seus elementos objectivos (natureza da providência solicitada ou direito para o qual se pretende a tutela jurídica, facto ou acto donde teria resultado esse direito, bens pleiteados, etc.), seja quanto aos seus elementos subjectivos (identidade das partes)”.
Nos termos do artº 1º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei 20/2012, de 14/05, os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.
Este normativo consubstancia-se numa transcrição dos artºs 202º, nº1 e 212º, nº3, da Constituição, o que implica que o artº 64º do Código de Processo Civil segundo o qual «são da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional» “seja lido em conformidade com o citado artº 212º, n3º”, isto é, “de que a jurisdição comum do direito administrativo é a administrativa e que as causas juridico-administrativas só saem da esfera dos tribunais administrativos se uma lei dispuser (validamente) em sentido contrário” – Código de Processo nos Tribunais Administrativos, vol.I, pag.21, de Mário Esteves de Oliveira.
Nas palavras do Tribunal dos Conflitos, por acórdão datado de 07 de Outubro de 2010, este artº 212º, nº3, «consagra uma reserva material de jurisdição atribuída aos tribunais administrativos. E o primeiro problema que a sua interpretação suscita é o de saber se a reserva é absoluta, quer no sentido negativo, quer no sentido positivo, implicando, por um lado, que os tribunais administrativos só poderão julgar questões de direito administrativo e, por outro lado, que só eles poderão julgar tais questões. (...) é dominante a interpretação com o sentido de que a cláusula consagra uma reserva relativa, um modelo típico, que deixa à liberdade do poder legislativo a introdução de alguns desvios, aditivos ou subtractivos, desde que preserve o núcleo essencial do modelo de acordo com o qual o âmbito regra da jurisdição administrativa corresponde à justiça administrativa em sentido material.
(…)Esta última linha de leitura, que não é repelida pelo texto (que não diz explicita e inequivocamente que aos tribunais administrativos competem apenas questões administrativas e que estas só a eles estão atribuídas) assenta na ideia de que a finalidade principal que presidiu à inserção da norma constante do nº3 do artº 214º foi a abolição do carácter facultativo da jurisdição administrativa e não a consagração de uma reserva de competência absoluta dos tribunais administrativos, tem sido acolhida pela jurisprudência do Tribunal Constitucional [vide, entre outros, os acórdãos n.º 372/94
(in DR II Série, n.º 204, de 3 de Setembro de 1994), 347/97 (in DR II Série, n.º 170, de 25 de Julho de 1997) e 284/2003, de 29 de Maio de 2003].
Este entendimento é, também o da jurisprudência maioritária do STA (vide, por exemplo, os acórdãos do Pleno de 1998.02.18 - recº n.º 40247 e da Secção de 2000.06.14 - rec. n.º 45633, de 2001.01.24– rec. n.º 45636, de 2001.02.20 – rec. n.º 45431 e de 2002.10.31 – rec. n.º 1329/02).
Não se vê razão para divergir desta interpretação.
Consideramos, pois, que o legislador ordinário, desde que não descaracterize o modelo típico, segundo o qual a regra é que o âmbito da jurisdição administrativa corresponde à justiça administrativa em sentido material, pode sem ofensa à lei constitucional, alargar o perímetro da jurisdição dos tribunais administrativos a algumas relações jurídicas não administrativas».
No caso que ora nos ocupa, deparamo-nos com uma ré que se qualifica como uma pessoa colectiva de utilidade pública, de base associativa, com o objectivo de promover o desenvolvimento e bem-estar da comunidade local, desenvolvendo actividades de carácter social, cultural, desportivo, recreativo ou outras, em colaboração com o Estado, as autarquias e o Inatel, como resulta do Diário da República cuja cópia está inserta a fls.28.
Esta qualificação está, de resto, de acordo com o que sobre a matéria se estatui no DL 460/77, alterado e republicado pelo DL 391/2007.
No âmbito da actividade a que se votou, após parecer favorável do Instituto da Segurança Social, a ré celebrou com a autora o contrato de empreitada ora em litígio.
Para tanto, obteve concessão de financiamento público, tendo a Segurança Social uma comparticipação financeira no valor de €498.488,00.

Por força do artigo 4º, nº1, do ETAF (Âmbito da jurisdição), compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham nomeadamente por objecto:
a) (…)
b) (…)
c) (…)
d) (…)
e) Questões relativas à validade de actos pré-contratuais e à interpretação, validade e execução de contratos a respeito dos quais haja lei específica que os submeta, ou que admita que sejam submetidos, a um procedimento pré-contratual regulado por normas de direito público;
f) (…)
g) (…)
h) (…)
i) (…)
j) (…)
l) (…)
m) (…)
n) (…).
Na necessidade de proceder à transposição das Directivas 2004/17/CE e 2004/18/CE, ambas do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, bem como da Directiva 2005/51/CE, da Comissão, de 7 de Setembro, e ainda da Directiva 2005/75/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Novembro, fundamentalmente relativas a procedimentos pré-contratuais públicos impôs-se a criação do Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado pelo Decreto-lei nº18/2008.
Como ensina Vieira de Andrade (As Formas Principais da Actividade Administrativa: Regulamento, Acto e Contrato Administrativo, Sumários das Lições de Direito Administrativo, II, 1ª TURMA, Ano Lectivo 2009/2010), diferentemente do Código do Procedimento Administrativo que fazia estabelecia a distinção entre contrato administrativo e contrato de direito privado da Administração consoante a natureza da relação jurídica em causa, através da adopção de um critério estatutário, associado ao objecto, com base em diversos tópicos doutrinais (sujeitos públicos, relação de sujeição, finalidade de interesse público, “ ambiência” de direito público), «o Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado pelo Decreto-lei nº18/2008, de 29 de Janeiro, segue um caminho diferente: adopta dois conceitos polarizadores, embora parcialmente sobreponíveis, para efeitos de delimitação do respectivo âmbito de aplicação, que abrange, por um lado, a contratação administrativa (formação do contrato) e, por outro, o regime substantivo da relação contratual (execução do contrato).
Este conceito legal de “contrato público” (artigo 1º, nº2) abrange todos os contratos celebrados no âmbito da função administrativa, independentemente da sua designação e da sua natureza (isto é, mesmo que sejam de direito privado), desde que sejam outorgados pelas “entidades adjudicantes” referidas na lei (artigo 2º)».
Portanto, para efeitos de atribuição de competência jurisdicional, mais importante que determinar a natureza ou designação do contrato dos autos, é averiguar se algum dos outorgante é, ou não, uma entidade adjudicante a que se reporta o código de que falamos.
Como se dispõe no artº1º, do CCP, o seu regime estabelece a disciplina aplicável à contratação pública e o regime substantivo dos contratos públicos que revistam a natureza de contrato administrativo – nº1 – e o regime da contratação pública estabelecido na sua parte II é aplicável à formação dos contratos públicos, entendendo -se por tal todos aqueles que, independentemente da sua designação e natureza, sejam celebrados pelas entidades adjudicantes em tal Código referidas – nº2.
Ora, como resulta do artº 2º, nº1, alínea f), as associações públicas fazem parte do elenco legal de “entidades adjudicantes”.
Sendo assim e sendo a ré uma associação de utilidade pública, é aplicável aos contratos por ela celebrados, entre os quais se inclui o dos autos, o regime da contratação pública.
A propósito de contratos celebrados por instituições privadas de solidariedade social, por força de lei sujeitas a controlo do Estado, entendia já o STA que se tratava de “contratos praticados a coberto de uma ambiência de direito público, resultando do predomínio de preocupações de interesse público, que prosseguem, que as leva a não poder adoptar procedimentos diferentes dos nele tipificados e a actuar numa posição de supra ordenação que lhes possibilita o estabelecimento de cláusulas exorbitantes, ou seja, são contratos administrativos” (ac. do STA de 8.10/02, Procº 1308/02).
Também no sentido de que «são competentes os tribunais administrativos para apreciar acção respeitante a questão/ões derivada/s da execução de um contrato de empreitada (regulada pelo DL 59/99, de 2 de Março) para a construção de um Centro Social e Paroquial, celebrado entre uma Instituição Particular de Solidariedade Social e um Empreiteiro», veja-se o acórdão do Tribunal dos Conflitos de 19.12.2006 (Procº 025/05).
E, embora atribuindo competência aos tribunais comuns, veja-se o acórdão do STJ de 05.01.2002 (itij), donde parece resultar à contrario (salvo erro de interpretação) que não fora a circunstância de, ao tempo do contrato não ser aplicável o regime do DL 59/99 (hoje revogado pelo CCP) e estaria sujeito à disciplina dos contratos administrativos de empreitada de obras públicas e, portanto, à jurisdição administrativa.
Em conclusão, «os contratos cuja interpretação, validade ou execução pertence à jurisdição dos tribunais administrativos, nos termos da alínea e) são assim quaisquer contratos, administrativos ou não, que uma lei específica submeta ou admita que sejam submetidos a um procedimento contratual regulado por normas de direito administrativo…
Assim, e ao abrigo da alínea e) do nº1 do artº 4º do ETAF, basta que exista uma qualquer lei … a dispor que um contrato privado está ou pode estar sujeito a tal procedimento para que a estatuição desta alínea já funcione. Neste âmbito assumem especial relevância os contratos celebrados na sequência dos procedimentos pré-contratuais actualmente previstos e regulados no CCP para que amiúde são remetidas as pessoas colectivas de direito privado por efeitos de mecanismo de financiamento ou atribuição de apoios públicos. Em tais casos, os litígios respeitantes … ao contrato de natureza privada, celebrado entre dois sujeitos privados, mas que uma lei tenha sujeito ou tenha admitido que fosse sujeito a um procedimento pré-contratual público são da competência dos Tribunais Administrativos» - “A Amplitude da Competência Material dos Tribunais Administrativos em sede de Acções Relativas a Responsabilidade Civil Contratual”, Maria Helena Canelas, “Julgar”, nº15, 2011.
Por tudo, é não há qualquer censura quanto à solução encontrada na 1ª instância.


III- Decisão.
Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida.
Custas pela apelante.

Guimarães, 4 de dezembro de 2014
Raquel Rego
António Sobrinho
Isabel Rocha
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Sumário (da responsabilidade da relatora):
I –É da competência dos tribunais administrativos o julgamento da acção respeitante a questões derivadas da execução de um contrato de empreitada celebrado entre uma associação de utilidade pública e um empreiteiro, para a construção de um Centro Comunitário financiado pelo Instituto da Segurança Social.