Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2949/18.5T8BRG.G1
Relator: ROSÁLIA CUNHA
Descritores: DANOS INDEMNIZÁVEIS
PRIVAÇÃO DO USO DE VEÍCULO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/05/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (da relatora):

I - A mera privação do uso de um veículo, ainda que desacompanhada de qualquer prejuízo patrimonial concreto, constitui um dano juridicamente ressarcível na medida em que implica a substração ao lesado de uma parte das faculdades que o direito de propriedade lhe confere, designadamente a faculdade de gozar o bem.

II - Nos contratos, concomitantemente com a obrigação típica, primária ou principal caraterizadora da relação obrigacional coexistem outros deveres de conduta designados como deveres acessórios, acidentais, laterais ou secundários, deveres esses que decorrem do princípio geral da boa fé consagrado no art. 762º, do CC, que estabelece que no cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé.

III - Nos termos do art. 153º, nº 1, do DL 147/2015, de 9.9, diploma que aprova o regime jurídico de acesso e exercício da atividade seguradora e resseguradora, as empresas de seguros devem atuar de forma diligente, equitativa e transparente no seu relacionamento com os tomadores de seguros, segurados, beneficiários e terceiros lesados.

IV – Apesar de o contrato de seguro facultativo não cobrir o risco de privação de uso do veículo, pode vir a ser atribuída uma indemnização por tal privação com fundamento na violação pela seguradora dos deveres acessórios de conduta, designadamente por não ter cumprido pontualmente a prestação indemnizatória relativa ao valor do veículo furtado.

V - A seguradora, ao não proceder ao pagamento da indemnização contratualmente devida pelo furto do veículo e ao não dar qualquer resposta definitiva à autora sobre a conclusão do processo, violou claramente os deveres acessórios de conduta posto que estava contratualmente obrigada a proceder ao pagamento da indemnização no prazo de 60 dias a contar de 26.6.2017. Mercê de tal violação dos deveres acessórios de conduta, a seguradora constitui-se na obrigação de indemnizar a autora pela privação do uso do veículo, posto que a autora o utilizava diariamente, para o exercício da sua atividade.

VI - A indemnização da privação do uso que não implica qualquer prejuízo patrimonial concreto deve ser fixada com recurso a critérios de equidade, nos termos do art. 566º, nº 3, do CC.

VII - A indemnização para ser justa e equitativa não se pode traduzir num enriquecimento do lesado. Por isso, a indemnização pela privação do uso deve ter como limite máximo o valor de aquisição de um veículo equivalente em novo com referência à data em que o mesmo foi furtado.
Decisão Texto Integral:
Acordam em conferência na 1ª seção cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

RELATÓRIO

(..) LDA., instaurou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra (…) S.A. pedindo a sua condenação a pagar-lhe as seguintes quantias:

- o valor de € 66.718,00, referente à indemnização pelo furto do veículo;
- o valor de € 87.185,00, referente à indemnização por privação de uso do seu veículo, contabilizado desde o dia 27 de junho de 2017 até ao dia 21 de maio de 2018;
- o montante diário de € 265,00, contabilizado desde o dia 22 de maio de 2018 até efetivo e integral pagamento do montante indemnizatório, a liquidar a final;
- o valor de € 265,00 referente ao valor dos objetos que foram furtados com o veículo e que estavam no seu interior;
- o valor de € 328,00, referente ao reembolso do prémio pago pela renovação do seguro, em momento posterior ao furto;
- tudo acrescido dos juros legais devidos até integral pagamento.

Como fundamento dos seus pedidos alegou, em síntese, que é proprietária do veículo automóvel ligeiros de passageiros, de matrícula OU, relativamente ao qual celebrou com a ré um contrato de seguro através do qual transferiu para a ré a responsabilidade pelo risco relativo ao referido veículo.
No âmbito desse contrato, a autora pagou à ré o prémio anual de € 1 142,51, inicialmente e aquando das suas renovações.
Nos termos das condições especiais do contrato de seguro ficou estipulado que, em caso de furto, roubo ou furto de uso, o valor segurado era de € 66.718,00, sem franquia.
O veículo foi furtado.
Não foi possível apurar a identidade dos autores do furto e o veículo nunca foi encontrado e, consequentemente, não foi devolvido à autora.
A ré não assumiu o pagamento da indemnização, nem facultou à autora um carro de substituição.
Desde a data da aquisição do veículo até à data do furto, a autora utilizou-o diariamente, para exercício da sua atividade, designadamente como meio de transporte do gerente H. M., que o utilizava ao serviço da empresa para visitar clientes e fornecedores e outros com quem se relacionava profissionalmente, para resolver assuntos administrativos e necessários inerentes à atividade da autora, como, por exemplo, deslocação aos serviços postais, à autoridade tributária, à segurança social, a conservatórias, a instituições financeiras e outras entidades públicas e privadas.
Para além de estar privada do uso do veículo, a autora está privada do montante da indemnização, montante este que lhe permitiria adquirir um novo veículo.
Em média, o custo diário do aluguer de um veículo com as características idênticas às do veículo da autora ascende a € 265,00.
Aquando do furto, encontravam-se no interior do veículo objetos no valor de € 265 e os documentos do veículo.
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Regularmente citada, a ré contestou alegando, em síntese, que o contrato de seguro contempla a cobertura de garantia do valor em novo, apesar de o veículo não o ser pois, à data da celebração do contrato de seguro, já tinha um ano de existência. Para além disso, o veículo foi importado do país de origem – França - com matrícula francesa – XX.
Não obstante, e na primeira anuidade, foi atribuído pela autora, e por danos sofridos pelo veículo seguro, em consequência de furto, roubo ou furto de uso o valor máximo de € 66.718,00, sem franquia.
Pela cobertura contratada, tal valor mantinha-se nas três primeiras anuidades, sendo que a partir 1 de julho de 2017, tal valor passaria para menos de metade, ou seja, para cerca de € 31.000,00.
A ré ignora se o veículo tinha, ou não, o valor pela autora declarado na proposta de seguro. Porém, à data do furto não poderia ter esse valor pois além de já ter percorrido mais de 180.000 quilómetros, tinha beneficiado de, pelo menos, três pedidos de assistência em viagem, datados de 10/03/2016, 28/09/2016 e de 05/05/2017, o primeiro por motivo de avaria e os outros dois por sinistros, e por já ter um historial de sinistros anteriores, os quais sucederam nos dias 08/04/2015, 28/09/2016 e 05/05/2017.
A ré ignora se o veículo foi furtado e tem sérias dúvidas que o furto tenha sido infortunístico, razão pela qual veio a declinar a sua responsabilidade no dia 24/07/2017.
Os riscos transferidos para a ré, através da apólice, não incluem a cobertura de paralisação (ou comummente chamada privação do uso), por não ter sido subscrita. Porém, a autora beneficiou de um veículo de substituição, por tal cobertura ter sido subscrita, desde o dia 28/06/2017 até ao dia 14/07/2017.
Quanto aos outros danos invocados, de acordo com o clausulado do contrato, a proteção às compras apenas pode ser considerada garantida, caso as mesmas tenham sido feitas pela autora, ou pelo seu legal representante, há 24 horas, o que não foi comprovado.
Pugna, assim, pela improcedência da ação.
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A autora apresentou articulado de resposta às exceções invocadas pela ré, alegando, em síntese, que não foi ela quem declarou o valor seguro pois o veículo foi avaliado pela ré e foi esta quem fez constar da respetiva apólice o valor da avaliação.
Cerca de um mês antes do furto, a ré aceitou e valorizou o veículo no valor de € 66.718,00, pois o mesmo sofreu um acidente relativamente ao qual a autora foi obrigada a pagar uma franquia de 2% sobre o valor seguro, e essa franquia foi paga sobre aquele valor.
Constituiria abuso de direito ou venire contra factum proprium, como definido do art. 334.º do Código Civil, pretender agora valer-se da invalidade parcial da cláusula que fixou o montante a indemnizar por correspondência ao capital seguro, com recurso à previsão do art. 132.º, n.º 1 e 128.º do Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de abril, quando é certo que a ré, pela sua atuação, deu causa a essa invalidade.
As partes acordaram, aquando da celebração do contrato, o montante concreto a indemnizar pela ré em caso de furto do veículo. Isto é, fixaram antecipadamente o valor da indemnização, pelo que está a autora dispensada de alegar e provar o valor real dos danos sofridos.
Ainda que assim não se entenda, o veículo seguro tinha o valor de, pelo menos, € 66.718,00, à data do sinistro, sendo certo que, o valor a indemnizar deverá corresponder não ao valor comercial do veículo seguro, mas sim ao valor que a autora teria de despender para adquirir um veículo com as características, o estado de conservação e funcionamento idênticas ao veículo furtado e lhe garanta um nível de utilização análogo.
Mesmo que se entendesse que existe uma situação de sobresseguro sempre haveria que reduzir os prémios pagos pela autora na respetiva proporção.
Uma vez que foi facultado à autora um veículo de substituição no período de 28/06/2017 a 14/07/2017, a ré deverá indemnizar a autora pela privação do uso do veículo, desde 14/07/2017, data em que deixou de usufruir do veículo de substituição.
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Foi proferido despacho saneador, definiu-se o objeto do processo e procedeu-se à seleção dos temas de prova.
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Procedeu-se a julgamento e a final foi proferida sentença com o seguinte teor decisório:

“Pelo exposto, o Tribunal julga parcialmente procedente a ação e, em consequência, condena a ré a pagar ao autor quantia de € 67.226,00 (sessenta e sete mil duzentos e vinte e seis euros), sendo que sobre as quantias de € 66.718,00 e de € 180,00 acrescem juros de mora desde 27.08.2017 e sobre a quantia de € 328,00 acrescem juros de mora desde 3.07.2019 (data do pagamento do prémio), ambos à taxa supletiva legal de 4% e até integral pagamento, absolvendo-se a ré do pagamento das demais quantias peticionadas.”
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A autora não se conformou e interpôs recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

“I. O Tribunal a quo, na sentença, condenou a R. no pagamento de juros a contar desde o ano de 2017. No entanto, no dispositivo, indicou como data de início para a contagem de juros o ano de 2019.
II. A R. deve ser condenada no pagamento à A. na quantia de € 67.226,00 (sessenta e sete mil duzentos e vinte e seis euros), sendo que sobre as quantias de € 66.718,00 e de € 180,00 acrescem juros de mora desde 27.08.2017 e sobre a quantia de € 328,00 acrescem juros de mora desde 3.07.2017 (data do pagamento do prémio), ambos à taxa supletiva legal de 4% e até integral pagamento, absolvendo-se a ré do pagamento das demais quantias peticionadas.”.
III. O Tribunal a quo entendeu julgar improcedente o pedido de indemnização formulado pela ora Recorrente contra a ora Recorrida decorrente da privação do uso do veículo furtado (cuja responsabilidade pelo ressarcimento do dano incumbe à ora Recorrida), socorrendo-se (o Tribunal a quo) de um Acórdão proferido em 2011, pelo Tribunal da Relação de Guimarães.
IV. Todavia, a jurisprudência recente, quer do Tribunal da Relação de Guimarães quer do Supremo Tribunal de Justiça tem considerado o dano de privação de uso do veículo como um dano autónomo indemnizável, bastando, para o efeito, que o lesado alegue e demonstre, para além da impossibilidade de utilização do bem, que esta privação gerou perda de utilidades que o mesmo lhe proporcionava.
V. O instituto jurídico da responsabilidade civil contratual, aqui em apreço, impõe que a seguradora seja responsabilizada pelo dano de privação de uso, caso se prove (como se provou neste processo) que incumpriu o seu dever de indemnizar, pagando ao segurado o valor da viatura sinistrada, em tempo oportuno, de molde a não lhe causar outros danos, nomeadamente os danos decorrentes da privação do uso de uma viatura idêntica à sinistrada.
VI. Esta solução não conflitua com as disposições consagradas no regime do contrato de seguro, porque não impõe à seguradora a cobertura de riscos além do que foi segurado, antes a responsabiliza pela reparação de um dano que decorre não do sinistro mas da inobservância da obrigação contratual de pagar pontual e atempadamente…
VII. O Supremo Tribunal vem decidindo, maioritariamente, que a privação do uso de um veículo automóvel constitui um dano autónomo indemnizável na medida em que o seu dono fica impedido do exercício dos direitos de usar, fruir e dispor inerentes à propriedade, que o artigo 1305º do Código Civil lhe confere de modo pleno e exclusivo, bastando para o efeito que o lesado alegue e demonstre (como a Autora, neste caso, fez), para além da impossibilidade de utilização do bem, que esta privação gerou perda de utilidades que o mesmo lhe proporcionava.
VIII. E a sua atribuição não implica violação do designado princípio indemnizatório; o princípio indemnizatório procura impedir que exista sobreposição de indemnizações, mas não obsta a que se cumulem indemnizações que se complementem por forma a abranger um leque mais vasto de danos do que aqueles que seriam ressarcidos unicamente com base na participação de um sinistro no âmbito de um contrato de seguro, no caso, facultativo (danos próprios).
IX. Neste sentido, vejam-se os seguintes Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Julho de 2007 (proc. nº 07B1849), de 12 de Janeiro de 2010 (proc. nº 314/06.6TBCSC.S1), de 16 de Março de 2011 (proc. 3922/07.2TBVCT.G1.S1), de 10 de Janeiro de 2012 (proc. nº 189/04.0TBMAI.P1.S1), de 9 de Julho de 2015 (proc. 13804/12.2T2SNT.L1.S1), os quais apreciam factos semelhantes aos dos presentes autos.

Nestes termos e nos demais de direito aplicável, deve este recurso ser julgado procedente, por provado, e, consequentemente, deve a sentença recorrida ser substituída por outra que julgue procedente o pedido de indemnização pela privação do uso de veículo.”
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A ré contra-alegou pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
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A ré também não se conformou e interpôs recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

“1. O enquadramento jurídico da matéria de facto supra enunciada assume os contornos que se passam a referir.
2. Os presentes autos fundam-se na responsabilidade civil contratual emergente do contrato de seguro automóvel celebrado entre as partes, e concretamente mediante accionamento da cobertura facultativa contratada (furto).
3. Com tal fundamento e alegando ter ocorrido um sinistro configurável como furto do veículo seguroveículo de matrícula OU, marca BMW - veio a A./Recorrida, e para o que aqui releva, ao abrigo da cobertura facultativa contratada (furto ou roubo), peticionar a condenação da Seguradora R. no pagamento do valor atinente ao valor do veículo seguro.
4. Em face da matéria de facto considerada provada, o douto Tribunal “a quo” proferiu a douta decisão ora posta em crise, de acordo com a qual julgou a acção parcialmente procedente, tendo considerado suficiente demonstrada a verificação do risco de furto contratado.
5. Ora, salvo o devido respeito por diversa opinião, não pode a Seguradora Apelante concordar com a apreciação da prova levada a cabo, discordando, consequentemente, dos fundamentos que suportam a douta decisão prolatada, quanto à matéria de facto e quanto à solução de direito.

I – DO ERRO DE JULGAMENTO REAPRECIAÇÃO DA PROVA:

6. O presente recurso sobre a douta decisão proferida quanto à matéria de facto funda-se na convicção da Apelante de que o Douto Tribunal “a quo” terá efectuado uma incorrecta apreciação da prova e, concretamente, na instrução da matéria factual plasmada nos arts. 12, 13, 14, 15, 19, 24 e 26 do elenco da factualidade considerada provada, os quais, pelos motivos que se infra se demonstrarão, deveriam ter sido considerados não provados ou parcialmente provados.
7. Salvo o devido respeito por diverso entendimento, a Seguradora Apelante está em crer que o Meritíssimo Tribunal “a quo” não ajuizou bem a prova produzida pois, ao contrário do doutamente decidido, a prova não se mostrou minimamente suficiente e credível, à luz das regras da experiência e do normal acontecer, para alicerçar a convicção aduzida na douta sentença proferida, no sentido do furto do veículo propriedade da Autora/apelada.
8. Jamais poderia o Meritíssimo Tribunal “a quo” considerar, sem mais, demonstrada a efetiva ocorrência e a dinâmica do alegado furto, quando, de forma clara ficou devidamente evidenciada a existência de variadas contradições e anómalas coincidências que, segundo as regras da experiência, levam a Seguradora Apelante forçosamente a crer que as circunstâncias em que terá ocorrido o sinistro participado jamais poderiam ser aquelas invocadas pela A./Apelada.
9. Face ao acervo probatório carreado aos presentes autos, jamais poderia ser considerada demonstrada a ocorrência do sinistro participado.
10. Da conjugação dos meios probatórios produzidos, nomeadamente testemunhais e documentais, impunha-se decisão diversa daquela que veio a ser proferida e que, presentemente, se impugna.
11. A Seguradora Apelante está, pois, em crer que o Meritíssimo Tribunal “a quo” incorreu em verdadeiro e manifesto erro de julgamento.
12. Os concretos meios probatórios que contrariam de forma cabal a matéria vertida nos artigos arts. 12, 13, 14, 15, 19, 24 e 26 dos factos provados, e cujo reexame se peticiona, são os seguintes:
Documento n.º 4, junto aos autos com a contestação
Depoimento da testemunha JOSÉ, prestado em audiência de julgamento de 25/05/2019, e gravado no Ficheiro Informático 20190527102600_5582962_2870509, e nos concretos minutos que se mostram retratados no corpo das alegações
Depoimento da testemunha B. F., prestado em audiência de julgamento de 30/04/2019, e gravado no Ficheiro Informático 20190430163916_5582962_2870509, e nos concretos minutos que se mostram retratados no corpo das alegações
13. Concatenando os depoimentos das testemunhas supra indicadas, com o teor do o histórico de sinistralidade da Autora/Apelada, aliado às concretas circunstâncias que rodearam o evento em apreço, impõe-se concluir que só uma desajustada apreciação da prova poderia levar à decisão aqui posta em crise.
14. Na verdade, a testemunha JOSÉ depôs de forma serena e clara, com foros de verdade, mostrando ter conhecimento direto dos factos, nomeadamente quanto às diligências que realizou, à caracterização do local indicado como o do sinistro, características do veículo, sinistros anteriores – aliás em conformidade com a extensa prova documental a este propósito carreada aos autos – e bem assim quanto à informação referente ao sistema anti-furto do veículo.
15. Depôs ainda de forma desinteressada e consentânea com as regras da experiência e do normal acontecer.
16. Inexistindo, pois, no modesto entendimento da Seguradora Apelante, qualquer motivo que justifique não ser tal meio de prova tido em linha de conta para a formação da convicção probatória do Mmo. Tribunal “a quo”.
17. O mesmo se dirá quanto ao depoimento da testemunha B. F. que, igualmente de forma clara e circunstanciada (note-se que a testemunha tinha peritado o veículo antes do evento dos autos, num outro sinistro) e com conhecimentos técnicos, explicou que o sistema de que o veículo vem equipado, no que concerne ao evitamento de furtos é muito fidedigno.
18. Assim, e circunstanciando o evento dos autos, constata-se que:
Curto hiato temporal entre a ocorrência do evento e o final da anuidade do contrato de seguro (4 dias)
Trata-se de um seguro de danos próprios que durante 3 anos cobria o valor do veículo em novo e que 4 dias após a data da ocorrência participada, o valor do veículo para efeitos ed contrato de seguro ia descer drasticamente
Histórico de sinistralidade da autora e do seu gerente
Inconsistências na versão avançada pelo gerente da autora quanto á aquisição do veículo e do uso das chaves suplentes
19. Factos esses que o Mmo. Tribunal “a quo” indevidamente desvalorizou, tendo apenas conferido relevo ao depoimento do gerente da autora, parte naturalmente interessadas no desfecho da demanda.
20. Discorda, pois, a Seguradora Apelante do entendimento manifestado pelo Meritíssimo Tribunal “a quo”, que julgou indevidamente provada a ocorrência do furto participado.
21. De todo o exposto decorre, e salvo o devido respeito por diverso entendimento, que o Mmo. Tribunal “a quo” não estava devidamente munido de prova bastante para considerar cabalmente demonstrado o vertido nos artigos 12, 13, 14, 15, 19, 24 e 26, do elenco da factualidade considerada provada
22. De facto, e face à prova produzida, é convicção da Seguradora Apelante que não logrou, de todo, a Apelada demonstrar ser minimamente plausível que o sinistro participado teve lugar, e nos termos por si alegados e participados à R. Seguradora, ora apelante.
23. Entende, pois, a Seguradora Recorrente que o Mmo tribunal “a quo” não deu o devido relevo a toda a prova carreada aos autos.
24. Escalpelizados os depoimentos das testemunhas inquiridas em sede de audiência de julgamento e supra enunciadas, bem como do acervo probatório documental referido a Seguradora Recorrente está em crer que, de forma evidente, jamais poderia o Meritíssimo Tribunal a quo fundar-se simplesmente nos depoimentos manifestamente parciais e interessados do gerente da autora e da sua namorada, para considerar cabalmente provada a matéria relativa ao invocado furto do veículo, quando dos autos ressaltam todas as evidências supra transcritas.
25. Assim, ao contemplar diverso entendimento, o Meritíssimo Tribunal “a quo” efetuou uma errada apreciação da prova, incorrendo, pois, em erro de julgamento.
26. A Seguradora Recorrente entende, assim, que da prova produzida, e supra indicada, impunha-se julgar os factos ora impugnados e constantes dos artigos 12, 13, 14, 15, 19, 24 e 26, dos factos provados, NÃO PROVADOS .
27. Ao contemplar diverso entendimento, o Mmo. Tribunal “a quo” incorreu em errada apreciação e valoração da prova e, portanto, em erro de julgamento no que diz respeito à decisão da matéria de facto, impondo-se a alteração da decisão proferida nos termos supra propugnados, e com a consequente alteração da decisão proferida.

II - DO DIREITO:

28. A propugnada alteração da decisão sobre a matéria de facto implica, como consequência direta e necessária e salvo o devido respeito por diverso entendimento, a improcedência da presente ação.
29. É convicção da Seguradora Apelante que não se logrou demonstrar que o veículo foi efetivamente furtado nos moldes participados.
30. E não estando demonstrados tais factos, a presente ação está votada ao insucesso.
31. Pois bem, das mais elementares regras sobre ónus da prova dimana que cabe ao Autor a alegação e prova dos factos em que assenta a sua pretensão (Cfr. art. 324º do Cód. Civil).
32. Cumpre salientar que, nos presentes autos, está-se perante uma relação contratual existente entre Apelada e Seguradora Apelante decorrente da celebração de um contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, válido em vigor à data do sinistro, e que abrange, entre o demais, a cobertura facultativa de vulgarmente designada de “danos próprios”, e que, para o que aqui releva, abrange a cobertura de sinistros configuráveis como furto ou roubo.
33. Tal como decorre dos presentes autos, a Seguradora Apelante, declinou a responsabilidade, recusando-se a proceder ao pagamento à Apelada da indemnização por esta peticionada, com base em elementos recolhidos em sede de averiguação, que lhe permitiram concluir que o sinistro não se teria dado conforme o participado.
34. Vindo, pois, a por em causa a ocorrência do evento em apreço, questões que acabaram com consumir a matéria controvertida e objeto de instrução probatória.
35. Contudo, não se logrou fazer prova da ocorrência do sinistro.
36. Ora, tem sido unanimemente entendido na nossa jurisprudência que nas situações em que existe um contrato de seguro válido e em vigor e em que o respetivo tomador ou seguro invoca a verificação de um evento suscetível de enquadrar um risco seguro ao abrigo da cobertura facultativa de furto e roubo, ao mesmo incumbe o ónus da prova da verificação deste risco coberto, enquanto facto constitutivo do seu direito à indemnização.
37. Indubitavelmente, a Apelada não cumpriu este ónus probatório que sobre si impendia.
38. E não tendo sido feita prova inequívoca e bastante de que o sinistro participado foi o evento do qual resultaram os danos que peticiona pela alegada perda do veículo, a presente ação encontra-se votada ao insucesso.
39. Ao contemplar diverso entendimento, o Meritíssimo Tribunal “a quo” incorreu em violação do disposto nos arts. 342º do Cód. Civil e 607º n.º 4 e 5 do Cód. Proc. Civil, entre outros, motivo pelo qual a douta decisão ora posta em crise se mostra, assim, inquinada, devendo, pois, ser revogada na íntegra.”
*
A autora contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida na parte não impugnada no recurso por si interposto, tendo formulado as seguintes conclusões:

“ I. A Recorrente veio impugnar a decisão sobre a matéria de facto, indicando, nas suas alegações, os concretos meios de prova que impunha decisão inversa e transcreveu (alguns) os depoimentos prestados, indicando as passagens da gravação. Todavia, fê-lo no início do seu recurso e não relativamente a cada facto cujo recurso incide.
II. Relativamente a cada facto, a Recorrente não indicou, como lhe competia, qual a passagem da gravação em que funda o seu recurso, pelo que, a Recorrida não sabe, sobre cada facto, quais os concretos meios de prova e quais as passagens de gravação que poderiam reconduzir a decisão diferente.
III. Os concretos meios de prova apresentados, designadamente os depoimentos transcritos e as passagens de gravação, apenas se podem referir aos factos nº 12, 13, 14 e 15, nada revelando quanto aos factos nºs 19, 24 e 26.
IV. Isto é, relativamente aos factos 19, 24 e 26, a Recorrida não apresentou qualquer meio de prova que imponha decisão diversa, pelo que, não cumprindo o art. 640.º do Cód. do Processo Civil, o recurso deve, nesta parte, ser rejeitado.
V. Não se vislumbra (e a Recorrente não concretiza) como pode o documento 4 junto com a contestação, impor decisão diversa. Isto é, não se consegue alcançar como poderá pôr em causa a prova da Recorrida, quanto ao furto e às circunstâncias em que o mesmo ocorreu. O documento em questão refere que no dia 24 para 25 de Junho (e não 24 e 25 de Junho) a viatura aqui em causa estava estacionada nas instalações da ora Recorrida (isto é, na noite anterior à noite do furto que ocorreu de 25 para 26 de Junho).
VI. O Tribunal a quo (e bem) não considerou como relevantes os factos apresentados pelas testemunhas JOSÉ e B. F., os quais não foram suficientes para pôr em causa a prova produzida pela Recorrida.
VII. A Recorrida provou, como lhe competia, o furto do veículo.
VIII. A testemunha J. C., com conhecimento directo dos factos, relatou, com pormenor, os factos que permitem concluir pelo furto do veículo, depoimento este que mereceu credibilidade, porquanto depôs com sinceridade, clareza, objetividade, respondendo a tudo o quanto lhe foi perguntado, não merecendo o seu depoimento qualquer desconfiança. Por outro lado, os demais elementos de prova, como o auto de participação às autoridades competentes e a participação do sinistro à seguradora, corroboram este depoimento prestado.
IX. Em súmula, andou bem o Tribunal a quo em considerar como provados os factos vertidos nos arts. 12, 13, 14 e 15 da matéria de facto.”
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Os recursos foram admitidos como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito devolutivo.
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Foram colhidos os vistos legais.

OBJETO DOS RECURSOS

Nos termos dos artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC, o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado ao Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso, sendo que o Tribunal apenas está adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso.
Nessa apreciação o Tribunal de recurso não tem que responder ou rebater todos os argumentos invocados, tendo apenas de analisar as “questões” suscitadas que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respetivo objeto, excetuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras.
Por outro lado, o Tribunal não pode conhecer de questões novas, uma vez que os recursos visam reapreciar decisões proferidas e não analisar questões que não foram anteriormente colocadas pelas partes.

Neste enquadramento, as questões relevantes a decidir, elencadas por ordem de precedência lógico-jurídica, são as seguintes:

I – saber se a matéria de facto deve ser alterada;
II – na hipótese afirmativa, saber se tal alteração implica a absolvição da ré da totalidade dos pedidos formulados na ação;
III – em caso de resposta negativa às anteriores questões, saber se a autora tem direito a ser indemnizada pela privação do uso do veículo.

FUNDAMENTAÇÃO

FUNDAMENTOS DE FACTO

Na 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos:

1. A ré é uma companhia de seguros legalmente autorizada para a exploração do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.
2. A autora é proprietária do veículo automóvel ligeiros de passageiros, com a matrícula OU, da marca BMW, modelo 520d, de cor cinzenta.
3. Este veículo era, muitas das vezes (mas não em exclusividade), conduzido por H. M., gerente da autora.
4. A autora e a ré celebraram um contrato de seguro automóvel que vigorou desde o dia 1 de julho de 2014, através do qual a autora transferiu para a ré a responsabilidade pelo risco relativo ao veículo supra indicado.
5. No âmbito do referido contrato de seguro, foi emitida a apólice nº 4101491403913, referente ao período de 1 de julho de 2014 a 1 de julho de 2015.
6. A referida apólice foi renovada, vigorando, então, de 1 de julho de 2015 a 1 de julho de 2016, data em que foi, novamente, renovada, por igual período de um ano, vigorando, ainda, desde 1 de julho de 2016 a 1 de julho de 2017.
7. A autora pagou à ré o prémio anual fixado, seja no vencimento inicial, seja em todas as suas renovações, até ao final do contrato que ocorreu em 1 de outubro de 2017.
8. Nos termos das condições especiais do referido contrato de seguro, designado por “prestige”, estavam incluídas além das coberturas de responsabilidade civil obrigatória, a responsabilidade civil facultativa (CE001), o risco de furto, roubo ou furto de uso (CE004), o veículo de substituição (CE012) e proteção às compras (CE022), tendo ficado estipulado, quanto às “coberturas, condições especiais, valores seguros e franquias”, que:
- quanto furto, roubo ou furto de uso: “Capital: sem franquia - 66.718,00 Eur.”;
- quanto ao veículo de substituição: “Capital: sem franquia – ligeiro alta gama até 2000 cc;
- quanto a proteção às compras: “Capital: com franquia fixa de 20,00 Eur - 200,00 Eur.”.
9. Acresce que, está estipulado no art. 1.º das condições especiais do contrato de seguro, na parte relativa a CE001 responsabilidade civil facultativa – CE04 furto, roubo ou furto de uso (pág. 93 e 93 verso e pág. 94 verso dos autos, págs. 24, 25 e 27 da apólice) que: “Esta cobertura garante em caso de furto, roubo ou furto de uso (tentado, frustrado ou consumado) do veículo seguro, a indemnização por desaparecimento total do veículo, das suas peças, acessórios, ou extras ou por danos sofridos pelos mesmos em consequência desses atos”.
10. As referidas condições especiais referem, ainda, nos n.ºs 2 e 3 do art. 3.º (nas mesmas páginas 94 verso dos autos e 27 da apólice) que: “2. Em caso de sinistro coberto de desaparecimento do veículo seguro, a W obriga-se ao pagamento da indemnização, decorridos que sejam 60 (sessenta) dias sobre a última das seguintes datas – data da participação por escrito à W ou data da participação às autoridades – se ao fim desse período o veículo não tiver sido encontrado (…). 3. A indemnização corresponderá ao valor seguro do veículo, contante da apólice à data do sinistro.”.
11. Na cláusula CE11 sob a epígrafe de “paralisação do veículo” das mencionadas condições especiais (fls. 96 verso dos autos e pág. 31 da apólice) encontra-se previsto no seu art. 1.º (“âmbito”) que: “1. Esta cobertura garante o pagamento do valor diário indicado nas Condições Particulares, em caso de paralisação do veículo seguro, devido a acidente participado à W e garantido por uma das seguintes coberturas (…) Furto, Roubo ou Furto de Uso (CE04) … desde que contratadas. 4. No caso de Furto, Roubo ou Furto de Uso (CE04), considera-se como paralisação o período em que o veículo está desaparecido, contado após a participação às autoridades e à W (…)”.
12. No dia 25 de junho de 2017, por volta das 19.00 horas, H. M., gerente da autora, estacionou o veículo na Rua …, no estacionamento em frente à pastelaria “...”, com a frente virada para o prédio e a traseira para a via pública.
13. O referido H. M. deslocou-se para a residência da sua namorada, sita na Rua …, n.º …, em Barcelos, onde pernoitou.
14. No período compreendido entre as 19.00 horas do dia 25 de junho de 2017 e as 8.45 horas do dia 26 de junho de 2017, o veículo OU foi furtado.
15. Na manhã do dia 26 de junho de 2017, pelas 8.45 horas, quando se preparava para se deslocar para iniciar a sua jornada de trabalho, dirigindo-se para o seu veículo, acompanhado da namorada, o referido H. M. constatou que o veículo não se encontrava no local onde o havia estacionado.
16. De imediato, a autora, na pessoa do seu gerente, estabeleceu ligação telefónica com a PSP, deslocando-se, seguidamente, à Esquadra da PSP de Barcelos a fim de participar o sucedido, formalizando-se uma denúncia criminal contra incertos.
17. A autora participou, em 26 de junho de 2017, o sinistro/“furto” à ré, tendo sido preenchida a “declaração amigável de acidente automóvel”.
18. O processo criminal foi arquivado, porquanto “não obstante as diligências efetuadas no âmbito do presente inquérito, não foi possível apurar a identidade dos autores”, isto não obstante a autora ter autorizado a PSP a ativar e utilizar o GPS-localizador, para efeitos de investigação.
19. O veículo automóvel ainda não foi encontrado e, consequentemente, não foi devolvido à autora.
20. Em 14 de novembro de 2017, a autora enviou à ré um email com o seguinte teor: “Bom dia, Vimos por este meio solicitar esclarecimento sobre a situação do processo da viatura OU furtada no dia 26/06/2017, uma vez que até à data não nos foi comunicado qualquer ponto da situação.”
21. Em 16 de novembro de 2017, atenta a ausência de resposta, a autora insistiu, por email.
22. No dia 22 de novembro de 2017, a ré respondeu afirmando que: “Damos de nossa posse os dois e-mails anexos que mereceram a nossa melhor atenção. Considerando o valor intrínseco do veículo e as demoras intrínsecas ao expediente de averiguação deste tipo de delito junto das autoridades, não nos foi possível ainda concluir o nosso processo. Todavia, estamos a desenvolver todas as diligências no sentido de, com brevidade, desfecharmos o nosso processo.”.
23. Por email de 21 de dezembro de 2017, 2 de fevereiro de 2018 e 8 de fevereiro de 2018, a autora veio a insistir numa resposta.
24. Desde a data da aquisição do veículo até à data do furto, a autora utilizou-o diariamente, para exercício da sua atividade, designadamente: meio de transporte do gerente H. M., que o utilizava ao serviço daquela para visitar clientes e fornecedores e outros com quem se relacione profissionalmente, deslocar-se para resolver assuntos administrativos e necessários inerentes à atividade da autora, como por exemplo, deslocação aos serviços postais, à autoridade tributária, à segurança social, a conservatórias, a instituições financeiras e outras entidades públicas e privadas.
25. Em média, o custo diário do aluguer de um veículo com as características idênticas às do veículo propriedade da autora ascende a € 265,00.
26. Aquando do furto, encontravam-se no interior do veículo uns óculos de sol, um saco de desporto, um cabo usb, um powerbank e os documentos do veículo, tudo no valor global de € 265,00 (duzentos e sessenta e cinco euros).
27. A primeira matrícula deste veículo data de 26 de julho de 2013.
28. Este veículo foi importado do país de origem – França - com matrícula francesa – XX).
29. A partir do dia 1 do mês de julho de 2017, o valor da cobertura garantida pelo seguro passaria para 31.490,90 Eur. (trinta e um mil, quatrocentos e noventa euros e noventa cêntimos).
30. O veículo referido em 2. é da série 5 Touring Diesel, 520D, modelo F.
31. À data do furto, o veículo já tinha percorrido mais de 180.000 quilómetros.
32. Tinha beneficiado de três pedidos de assistência em viagem, datados de 10/03/2016, 28/09/2016 e de 05/05/2017, o primeiro por motivo de avaria e os outros dois por acidente, e já tinha um historial de três sinistros anteriores, os quais sucederam nos dias 08/04/2015, 28/09/2016 e 05/05/2017.
33. A ré encarregou um gabinete externo para proceder a diligências de averiguação das circunstâncias da ocorrência do sinistro.
34. Existem alguns grupos organizados a operar na zona do Norte, e que se dedicam ao furto de veículos automóveis, essencialmente, entre outras, da marca BMW e RENAULT.
35. O veículo possuía Via Verde, e não há conhecimento de qualquer passagem registada após o furto.
36. O gerente da autora facultou à ré as duas chaves do veículo, para a respetiva análise junto de um concessionário oficial da marca, o que foi feito.
37. A ré decidiu declinar a sua responsabilidade a 24 de julho de 2017, emitindo uma carta dirigida à autora.
38. O veículo de matrícula QN, em que H. M. figurou como tomador em período não apurado, tem registo de sinistros ocorridos a 10/11/2011, 19/03/2012, 21/03/2012, 15/05/2012, 21/10/2012, 23/10/2012.
39. A autora não subscreveu a cobertura de paralisação (CE11).
40. Entre o dia 28 de junho de 2017 e o dia 21 de maio de 2018, a autora beneficiou de um veículo de substituição, tendo a ré despendido com tal a quantia de 1.043,29 Eur. (mil quarenta e três euros e vinte e nove cêntimos).
41. O veículo foi avaliado pela “S.”, mediante os procedimentos e instruções definidos pela ré, por forma a determinar o valor a constar da apólice para cobertura de valor em novo.
42. Foi com base neste valor que a autora pagou os prémios de seguro a que estava obrigada em virtude do contrato celebrado.
43. Cerca de um mês antes do sinistro dos autos, a ré considerou o valor de € 66.718,00 (sessenta e seis mil setecentos e dezoito euros), para calcular a franquia de 2% a suportar pela autora, em face de um acidente ocorrido com o mesmo veículo.
44. Os prémios pagos pela autora à ré ascenderam, ao valor de € 1.062.66 em 17.07.2014, de € 1.064,17 em 5.07.2015, de € 1.142,51 em 7.07.2016 e de € 328,00 em 3.07.2017.
45. Na Condição Especial 12 ficou estipulado que “esta cobertura garante o aluguer de um veículo de substituição caso o segurado fique privado do uso do veículo seguro por imobilização ocasionada por Perda (…) Total em consequência de sinistro garantido pelas coberturas de (…) Furto (…).”.
46. A autora pagou pela aquisição do veículo em França o preço de € 25.000,00 (vinte cinco mil euros), acrescido das despesas com a legalização e a atribuição de matrícula no valor de € 6.679,01 (seis mil seiscentos e setenta e nove euros e um cêntimo).
*
Na 1ª instância foram considerados não provados os seguintes factos:

1. Os objetos referidos em 26. encontravam-se no porta-luvas do veículo, o qual se encontrava fechado e na bagageira, sendo que nenhum era visível do exterior.
2. Foi a autora que declarou à seguradora o valor de € 66.718,00, para efeitos de cobertura de danos próprios.
3. A autora tem de despender o valor de € 66.718,00 (sessenta e seis mil setecentos e dezoito euros), para adquirir um veículo de características idênticas ao OU.
4. No local e no período temporal do furto, jamais esteve algum grupo organizado em furto de automóveis a operar nas imediações de Barcelos.
5. A tecnologia do modelo e a versão do veículo não é passível de furto.
6. O autor informou a ré, no âmbito das declarações que prestou ao perito averiguador, que o veículo foi adquirido novo num concessionário da BMW de Vila Nova de Famalicão, com recurso a crédito e que as manutenções e revisões eram efetuadas na HENDO de Vila Nova de Famalicão.
7. A autora recebeu a carta referida no ponto 37 dos factos provados.
8. O veículo seguro tinha o valor de € 66.718,00 (sessenta e seis mil setecentos e dezoito euros), à data do sinistro.
9. Os veículos que se passam a referir, em que tanto a autora, como o seu sócio gerente, figuraram como tomadores, sofreram sinistros, embora se ignore se foi na vigência dos contratos de seguro dos aludidos tomadores:
Outono Azul:
• VB – 03/12/2007, 30/06/2008 e 15/09/2011;
• QQ – 26/04/2013;
• NV – 08/06/2004, 14/11/2006 e 07/05/2010;
H. M.:
• QN – 11/09/2013, 13/11/2013, 02/02/2015 e 08/04/2018;
• UV – 19/08/2010, 18/09/2011, 03/09/2014 e 15/05/2015.
10. De acordo com o clausulado do art. 1.º do contrato de seguro (pág. 57 das Condições Gerais da Apólice), a proteção às compras (CEO22) apenas pode ser considerada garantida, caso as compras tenham sido efetuadas pela autora, ou pelo seu legal representante, há 24 horas.
*
FUNDAMENTOS DE DIREITO

Cumpre apreciar e decidir.

Questão prévia

Nos nºs I e II das alegações de recurso, a autora refere que no dispositivo da sentença deve constar que os juros devem ser contabilizados desde 27.8.2017, e não desde 2019.
Inicialmente, no dispositivo da sentença, constava que os juros eram devidos desde 27.8.2019.
Porém, por despacho de 11.9.2019, a sentença foi retificada, com fundamento na existência de lapso de escrita, e passou a constar da mesma que os juros eram devidos desde 27.8.2017.
Face à retificação da sentença no sentido pretendido pela autora, ficou prejudicada a apreciação da questão suscitada nos nºs I e II das conclusões, razão pela qual esta matéria não foi elencada como questão a decidir.

I – Alteração da matéria de facto

Dispõe o artigo 662º, n º 1 ,do C.P.C. que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
A norma em questão alude a meios de prova que imponham decisão diversa da impugnada e não a meios de prova que permitam, admitam ou apenas consintam decisão diversa da impugnada.

Por seu turno, o art.º 640.º do C.P.C. que tem como epígrafe o “ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, dispõe que:

1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”

Como se escreveu no Acórdão deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 19.6.2019 (in www.dgsi.pt):

Importa referir que no nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade do julgador ou da prova livre, consagrado no n.º 5 do artigo 607º do CPC (…), segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em conformidade com a convicção que tenha formado acerca de cada um dos factos controvertidos, salvo se a lei exigir para a prova de determinado facto formalidade especial, ou aqueles só possam ser provados por documento, ou estejam plenamente provados, quer por documento, quer por acordo ou confissão das partes.
Sobre a reapreciação da prova impõe-se assim toda a cautela para não desvirtuar, designadamente o princípio referente à liberdade do julgador na apreciação da prova, bem como o princípio de imediação que não podem ser esquecidos no convencimento da veracidade ou probabilidade dos factos. Não está em causa proceder-se a novo julgamento, mas apenas examinar a decisão da primeira instância e respetivos fundamentos, analisar as provas gravadas, se for o caso, e procedendo ao confronto do resultado desta análise com aquela decisão e fundamentos, a fim de averiguar se o veredicto alcançado pelo tribunal recorrido quanto aos concretos pontos impugnados assentou num erro de apreciação.
Em suma, a alteração da matéria de facto pelo Tribunal da Relação tem de ser realizada ponderadamente, em casos excecionais, pontuais e só deverá ocorrer se, do confronto dos meios de prova indicados pelo recorrente com a globalidade dos elementos que integram os autos, se concluir que tais elementos probatórios, evidenciando a existência de erro de julgamento, sustentam, em concreto e de modo inequívoco, o sentido pretendido pelo recorrente. Tal sucede quando a convicção do tribunal de 1.ª instância assentou em erro tão flagrante que o mero exame das provas gravadas revela que a decisão não pode subsistir.

Tendo por base estes critérios, analisemos então se a matéria de facto deve ser alterada nos termos pretendidos pela ré.
A ré pretende que os factos nºs 12, 13, 14, 15, 19, 24 e 26 sejam dados como não provados.
Os factos nºs 12, 13, 14, 15 e 19 referem-se ao furto do veículo.

Tais factos têm a seguinte redação:

12. No dia 25 de junho de 2017, por volta das 19.00 horas, H. M., gerente da autora, estacionou o veículo na Rua ..., no estacionamento em frente à pastelaria “...”, com a frente virada para o prédio e a traseira para a via pública.
13. O referido H. M. deslocou-se para a residência da sua namorada, sita na Rua ..., n.º ..., em Barcelos, onde pernoitou.
14. No período compreendido entre as 19.00 horas do dia 25 de junho de 2017 e as 8.45 horas do dia 26 de junho de 2017, o veículo OU foi furtado.
15. Na manhã do dia 26 de junho de 2017, pelas 8.45 horas, quando se preparava para se deslocar para iniciar a sua jornada de trabalho, dirigindo-se para o seu veículo, acompanhado da namorada, o referido H. M. constatou que o veículo não se encontrava no local onde o havia estacionado.
19. O veículo automóvel ainda não foi encontrado e, consequentemente, não foi devolvido à autora.
Segundo a ré estes factos devem ser dados como não provados com base no documento nº 4 junto com a contestação e com base nos depoimentos das testemunhas B. F. e JOSÉ.
O documento nº 4 junto com a contestação é uma declaração subscrita por H. M., gerente da autora, na qual o mesmo descreve como ocorreu o desaparecimento do veículo.
Da leitura desta declaração não resulta de forma alguma que o furto não ocorreu. Bem pelo contrário, nessa declaração H. M. relata que estacionou o veículo na rua onde mora a sua namorada e no dia seguinte o veículo não se encontrava no local onde o tinha deixado.
O tribunal procedeu à audição integral dos depoimentos prestados em audiência pelas testemunhas B. F. e JOSÉ.
A testemunha B. F., que é perito avaliador e trabalha para a ré desde 2006, nada sabe sobre a ocorrência do furto. O mesmo referiu que o veículo em questão se encontrava equipado com o sistema F 11, que é um sistema de imobilização do veículo. Relatou que se trata de um dos sistemas mais eficazes e mais evoluídos no que toca a evitar furtos uma vez que o código é alterado em cada utilização. Pese embora se admita que o sistema F11 possa efetivamente ser dos mais eficazes existentes no mercado, a verdade é que não existem sistemas anti-roubo perfeitos e inexpugnáveis, sendo sempre possível, ainda que com maior dificuldade, furtar veículos com sistemas de imobilização eletrónica.
Assim, do depoimento desta testemunha nada resulta em abono da tese da ré de que o veículo não foi furtado.
A testemunha JOSÉ é perito averiguador e foi quem efetuou a averiguação do sinistro para a ré através da empresa … Expert, Lda.
Esta testemunha referiu a existência de incongruências que o levaram a concluir que não existe prova inequívoca de que o furto ocorreu.
Tais incongruências consistem no facto de H. M. lhe ter referido que atestou o veículo antes de o mesmo ter sido furtado, mas o veículo só tinha 43 litros no depósito, o qual tem uma capacidade de 55 litros.
Esta invocada incongruência em nada contribui para concluir se o veículo foi ou não furtado. Desconhece-se onde atestou o veículo e quantos quilómetros percorreu desde que colocou combustível. Por outro lado, mesmo admitindo que H. M. tenha declarado que atestou o veículo e não o tenha feito não se vê como é que daqui se pode concluir que o furto não ocorreu.
Outra incongruência relatada pela testemunha refere-se ao facto de H. M. lhe ter dito que tinha as duas chaves do veículo, mas que só utilizava uma. Porém, no relatório CBS verifica-se que utilizou as duas chaves.
Em primeiro lugar, saliente-se que na declaração subscrita por H. M. que constitui o documento nº 4 da contestação consta que estava na posse das duas chaves do veículo e “utilizava com maior frequência a chave que se encontra com maior desgaste”. Ora, utilizar com maior frequência não é sinónimo de apenas utilizar uma chave.
Daqui também nada de útil se retira no sentido de concluir que o veículo não tenha sido furtado.
A testemunha referiu ainda a inexistência de passagens do veículo na Via Verde.
Desta inexistência de passagens também nada se retira quanto ao furto porque consta do documento nº 4 que H. M., na própria manhã em que verificou o desaparecimento do veículo, anulou o dispositivo da Via Verde. Por outro lado, quem se dedica ao furto de veículos sabe quais os procedimentos a evitar com vista à localização do veículo, razão pela qual é compreensível que não utilize a Via Verde pois se o fizer de imediato tal passagem fica registada e sabe-se que o veículo esteve em determinado local.
A testemunha referiu também o sistema anti-roubo com o qual o veículo se encontrava equipado. Já supra abordámos esta questão e explicámos que a alta eficácia do sistema não permite concluir pela impossibilidade de furto. Por outro lado, a própria testemunha não referiu que é impossível furtar veículos com este sistema, mas sim que se trata de um veículo mais difícil de furtar mercê da constante alteração dos códigos.
A testemunha referiu ainda que o seguro iria ser renovado daí a poucos dias e que aquando da renovação o valor do veículo desceria cerca de 40% a 50%. Mais referiu o histórico de sinistralidade a autora e do seu gerente.
Também destas afirmações não se pode concluir que o furto não ocorreu.
Aliás, a própria testemunha referiu que não formulou nenhuma conclusão no relatório de averiguação do sinistro, tendo-se limitado a relatar os factos a fim de a seguradora tomar uma decisão. No depoimento prestado a testemunha afirmou ainda que dadas as situações relatadas “não obteve prova inequívoca da ocorrência do furto”. Ora esta afirmação de ausência de prova inequívoca do furto é muito diferente de se concluir que o furto não ocorreu.
Conjugados os depoimentos das testemunhas B. F. e JOSÉ com a declaração que constitui o documento nº 4 da contestação, o Tribunal não pode concluir que este elementos probatórios imponham decisão diversa quanto aos factos 12, 13, 14, 15 e 19 que foram dados como provados na 1ª instância. Ora, nos termos do art. 662º, nº 1, do CPC, e como já supra explanado, a Relação só deve alterar a decisão sobre a matéria de facto se os elementos probatórios existentes impuserem decisão diversa. Tal não sucede no caso apreço, como se vem de explanar, sendo ainda de referir que, conforme consta da fundamentação da decisão da 1ª instância, os factos em questão foram confirmados por H. M., gerente da autora, e J. C., namorada do mesmo.
Assim sendo, conclui-se que os elementos probatórios constantes dos autos não impõem decisão diversa sobre a matéria de facto, não devendo os factos 12, 13, 14, 15 e 19 ser considerados não provados.
*
Os factos 24 e 26 referem-se, respetivamente, à utilização que a autora fazia do veículo e aos objetos que se encontravam no interior do mesmo, tendo tais factos a seguinte redação:

24. Desde a data da aquisição do veículo até à data do furto, a autora utilizou-o diariamente, para exercício da sua atividade, designadamente: meio de transporte do gerente H. M., que o utilizava ao serviço daquela para visitar clientes e fornecedores e outros com quem se relacione profissionalmente, deslocar-se para resolver assuntos administrativos e necessários inerentes à atividade da autora, como por exemplo, deslocação aos serviços postais, à autoridade tributária, à segurança social, a conservatórias, a instituições financeiras e outras entidades públicas e privadas.
26. Aquando do furto, encontravam-se no interior do veículo uns óculos de sol, um saco de desporto, um cabo usb, um powerbank e os documentos do veículo, tudo no valor global de € 265,00 (duzentos e sessenta e cinco euros).
Quanto aos factos 24 e 26, o documento nº 4 da contestação nada contém no sentido de estes factos não terem ocorrido e as testemunhas B. F. e JOSÉ nada disseram sobre esta matéria. Bem pelo contrário, o documento nº 4 aponta no sentido da veracidade do facto nº 26 pois aí são referidos os objetos que se encontravam no interior do veículo.
Como consta da fundamentação da decisão da 1ª instância, os factos em questão foram confirmados por J. C., L. C. e P. C., a par do depoimento de parte do próprio gerente da autora.
Consequentemente, conclui-se que os elementos probatórios constantes dos autos não impõem decisão diversa sobre a matéria de facto, não devendo os factos 24 e 26 ser considerados não provados.

Face a estas conclusões, improcede na totalidade a apelação da ré na parte referente à impugnação da matéria de facto.
*
II – Absolvição da ré da totalidade dos pedidos formulados na ação

Como supra referido, esta questão só se colocaria em caso de alteração da matéria de facto no sentido pretendido pela ré, pois, se não se provasse a ocorrência do furto, a ré não teria que indemnizar a autora pelos danos sofridos no âmbito do contrato de seguro entre ambas celebrado.
Tendo-se concluído pela improcedência da alteração da matéria de facto provada, fica naturalmente prejudicada a apreciação desta questão.

III – Indemnização pela privação do uso do veículo

A autora considera que a seguradora a deve indemnizar pela privação do uso do veículo por a mesma ter inobservado a sua obrigação contratual de pagar pontual e atempadamente a indemnização no âmbito do contrato de seguro entre ambas celebrado.
A ré entende que não tem que proceder ao pagamento dessa indemnização porque a cobertura referente à privação do uso do veículo não estava contratada e não houve da sua parte nenhuma violação de qualquer dever acessório de conduta que imponha tal obrigação de ressarcimento.
A sentença absolveu a ré do pedido de pagamento de indemnização pela privação do uso do veículo considerando que a autora não contratou com a ré a cobertura de indemnização pela privação do uso de veículo, sendo que a obrigação da seguradora é uma obrigação pecuniária e não uma obrigação de indemnização, e que a indemnização que poderá ser equacionável pelo atraso no pagamento da quantia correspondente ao prejuízo sofrido corresponde ao pagamento dos juros moratórios, à taxa supletiva legal, desde o momento em que se considere que a indemnização devia ter sido colocada à disposição do segurado.

Quid juris?

Nos autos está plenamente assente que o contrato de seguro celebrado entre autora e ré não incluía a cobertura da privação do uso do veículo.
Como tal, é manifesto que, ao abrigo do risco coberto pelo contrato de seguro celebrado entre as partes, não assistiria à autora o direito a ser indemnizada pelo dano de privação do uso do veículo.
Porém, a pretensão que é formulada pela autora não radica na existência de um contrato de seguro com esta cobertura, mas antes no incumprimento culposo por parte da ré da obrigação de pagamento da indemnização por furto do veículo (cf. arts. 27º a 35º da contestação).
Em primeiro lugar, importa salientar, que, consideramos que a mera privação do uso de um veículo, ainda que desacompanhada de qualquer prejuízo patrimonial concreto, constitui um dano juridicamente ressarcível na medida em que implica a substração ao lesado de uma parte das faculdades que o direito de propriedade lhe confere, designadamente a faculdade de gozar o bem.
Neste mesmo sentido se tem pronunciado o STJ, designadamente no seu Acórdão de 14.12.2016 (in www.dgsi.pt) onde é referido que o Supremo Tribunalvem decidindo, maioritariamente, no domínio da responsabilidade civil extracontratual emergente de acidente de viação que a privação do uso de um veículo automóvel constitui um dano autónomo indemnizável na medida em que o seu dono fica impedido do exercício dos direitos de usar, fruir e dispor inerentes à propriedade, que o artigo 1305º do Código Civil lhe confere de modo pleno e exclusivo, bastando para o efeito que o lesado alegue e demonstre, para além da impossibilidade de utilização do bem, que esta privação gerou perda de utilidades que o mesmo lhe proporcionava. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Julho de 2007 (proc. nº 07B1849), de 12 de Janeiro de 2010 (proc. nº 314/06.6TBCSC.S1), de 16 de Março de 2011 (proc. 3922/07.2TBVCT.G1.S1) e de 10 de Janeiro de 2012 (proc. nº 189/04.0TBMAI.P1.S1), disponíveis em www.dgsi.pt/jstj.
É consabido que nos contratos, concomitantemente com a obrigação típica, primária ou principal caraterizadora da relação obrigacional coexistem outros deveres de conduta designados como deveres acessórios, acidentais, laterais ou secundários, deveres esses que decorrem do princípio geral da boa fé consagrado no art. 762º, do CC, que estabelece que no cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé.
Trata-se, no dizer do Prof. Antunes Varela, (in “Das Obrigações em Geral”, 7ª edição, págs. 124/125) daqueles deveres que, “não interessando diretamente à prestação principal, nem dando origem a qualquer ação autónoma de cumprimento (cfr. art.ºs 817º e segs.) são todavia essenciais ao correto processamento da relação obrigacional em que a prestação se integra”.
Os deveres acessórios não têm por objeto uma prestação, sendo usualmente agrupados em deveres de informação ou esclarecimento, em deveres de lealdade e em deveres de proteção ou segurança. A sua violação apenas pode originar uma pretensão indemnizatória (Acórdão do STJ, de 13.10.2016 in www.dgsi.pt).
Nos termos do art. 153º, nº 1, do DL 147/2015, de 9.9, diploma que aprova o regime jurídico de acesso e exercício da atividade seguradora e resseguradora, as empresas de seguros devem atuar de forma diligente, equitativa e transparente no seu relacionamento com os tomadores de seguros, segurados, beneficiários e terceiros lesados.
Tem vindo a obter acolhimento jurisprudencial maioritário, embora não unânime, a tese de que, sendo a seguradora a parte mais forte na relação contratual, a mesma está obrigada a uma conduta leal e cooperante com o segurado, conforme ao princípio da boa-fé. Nesse contexto e não cumprindo pontualmente a prestação indemnizatória que legitimamente lhe é exigida pelo segurado, a mesma responde perante o segurado pelos danos que tal mora lhe causou.
A indemnização que assim tem vindo a ser conferida, funda-se, não no cumprimento de uma obrigação contratual – na medida em que o risco não foi expressamente incluído no contrato – mas antes no incumprimento contratual da seguradora de proceder ao pagamento da indemnização que legitimamente lhe tenha sido reclamada (Acórdão da Relação de Guimarães, de 4.4.2017 in www.dgsi.pt).
Na esteira do constante do sumário do Acórdão da Relação de Coimbra, de 28.5.2019 (in www.dgsi.pt) as seguradoras estão obrigadas “a deveres de averiguação, confirmação e resolução dum sinistro, em prazo razoável, deveres estes que configuram verdadeiros deveres acessórios de conduta, pelo que, quando a indemnização devida não é paga no prazo previsto no contrato (ou, caso este não exista, em prazo razoável), são violados tais deveres acessórios de conduta – que impõem à seguradora o dever de tomar todas as providências necessárias para que a obrigação a seu cargo satisfaça o interesse do segurado/beneficiário na prestação – obrigando tal violação à indemnização pelos danos que assim hajam sido causados ao segurado/beneficiário. (...)
Não cobrindo o contrato o risco de privação de uso do veículo, não há uma violação do princípio indemnizatório (constante do art. 128.º do RJCS), nem uma sobreposição de indemnizações – desta indemnização com os juros incidentes sobre a obrigação pecuniária principal – uma vez que do que se trata aqui é de indemnizar, com fundamento na violação dos deveres acessórios de conduta, a não satisfação do interesse do credor. É pois indemnizável, em tal hipótese, com fundamento na violação dos deveres acessórios de conduta, o chamado dano de privação de uso.
Finalmente, chama-se ainda à colação o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.12.2016, (in www.dgsi.pt) nos termos do qual “no âmbito de um contrato de seguro de responsabilidade civil facultativo (danos próprios), se a seguradora se demora injustificadamente na resolução do caso, resultando dessa mora danos para o segurado, responde por esse inadimplemento. (...)
É de concluir pelo reconhecimento do direito do autor à indemnização pela privação do uso do seu veículo, uma vez que ficou provado que a ré não lhe entregou, até sessenta dias após a participação do sinistro, a indemnização garantida pela cobertura do risco, situação que ainda hoje o leva a ter de se socorrer de veículos de familiares e amigos para as suas deslocações de trabalho e lazer, para além de estar impedido de adquirir outro veículo para poder circular, por não ter dinheiro para tal.
Tal atribuição não viola o designado princípio indemnizatório posto que este apenas procura impedir a existência de sobreposição de indemnizações, não obstando a que se cumulem indemnizações que se complementam por forma a abranger um leque mais vasto de danos do que aqueles que seriam ressarcidos unicamente com base na participação de um sinistro no âmbito de um contrato de seguro facultativo (no caso, de danos próprios).”
Vejamos, então, no caso concreto, se a ré violou algum dever acessório de conduta que justifique a pretensão indemnizatória do autor relativamente à privação do uso do veículo.
A ré obrigou-se, em caso de sinistro coberto de desaparecimento do veículo seguro, a efetuar o pagamento da indemnização, decorridos que sejam 60 dias sobre a última das seguintes datas – data da participação por escrito à W ou data da participação às autoridades – se ao fim desse período o veículo não tiver sido encontrado (facto nº 10).
Em 26.6.2017 foi feita participação do furto à PSP (facto 16).
Na mesma data foi feita a participação à ré (facto 17).
O veículo nunca foi encontrado (facto 19).
Em 14 de novembro de 2017, a autora enviou à ré um email solicitando esclarecimento sobre a situação do processo da viatura (facto 20).
Em 16 de novembro de 2017, atenta a ausência de resposta, a autora insistiu, por email (facto 21).
Em 22 de novembro de 2017, a ré respondeu dizendo ainda não ter sido possível concluir o processo (facto 22).
Por emails de 21 de dezembro de 2017, 2 de fevereiro de 2018 e 8 de fevereiro de 2018, a autora veio a insistir numa resposta (facto 23).
Não só não existe evidência de que a ré tenha dado qualquer resposta após 22 de novembro de 2017, como até à presente data não procedeu ao pagamento da indemnização atinente ao valor do veículo furtado.
É verdade que no facto 37 consta que a ré decidiu declinar a sua responsabilidade a 24 de julho de 2017, emitindo uma carta dirigida à autora.
Porém, foi dado como não provado (facto 7) que a autora recebeu a carta referida no ponto 37 dos factos provados.
Parece-nos até muito duvidoso, à luz das regras da experiência comum e face à troca de emails atrás referidos, que a carta tenha sequer sido enviada. Com efeito, se a ré já tivesse efetivamente enviado a carta a declinar a responsabilidade não faria sentido a autora em data posterior a 24.7.2017 enviar mails a pedir informações sobre o estado do processo e a ré responder em 22.11.2017 que ainda não havia decisão sobre o processo de averiguações.
Ora, a ré, ao não proceder ao pagamento da indemnização contratualmente devida pelo furto do veículo e ao não dar qualquer resposta definitiva à autora sobre a conclusão do processo, violou claramente os deveres acessórios de conduta posto que estava contratualmente obrigada a proceder ao pagamento da indemnização no prazo de 60 dias a contar de 26.6.2017.
A não disponibilização da verba que iria permitir à autora adquirir um veículo de substituição, impediu-a de utilizar a viatura no período em que não lhe foi facultada viatura de substituição, sendo o dano a indemnizar consistente na perda de tais utilidades e proveitos.

E nem se diga que estamos perante uma obrigação pecuniária e não diante de uma obrigação de indemnização pelo que o incumprimento dessa obrigação apenas daria lugar ao pagamento de juros de mora nos termos do art. 806.º, n.º 1 do Cód. Civil.
Na verdade, como pensamos ter demonstrado, não se trata de indemnizar a mora na realização da prestação debitória principal, mas sim de indemnizar um dano que resulta da violação de deveres legais que a seguradora não observou.
Não se está a impor à seguradora a cobertura de riscos além do que foi segurado, mas sim a responsabilizá-la pela reparação de um dano que decorre, não do sinistro, mas da inobservância da obrigação contratual de pagar pontual e atempadamente.
Por isso, a obrigação da seguradora é uma obrigação de indemnização, e não uma mera obrigação pecuniária.
Por conseguinte, não há violação do princípio indemnizatório constante do art. 128.º, do RJCS, nem sobreposição da indemnização pela privação do uso com os juros incidentes sobre a obrigação pecuniária principal, uma vez que o que se está a indemnizar é a violação dos deveres acessórios de conduta conexionados com a boa-fé na execução do contrato.
Mercê de tal violação dos deveres acessórios de conduta, a ré constitui-se na obrigação de indemnizar a autora pela privação do uso do veículo, posto que a autora o utilizava diariamente, para o exercício da sua atividade nos termos descritos no facto 24.
A autora beneficiou de veículo de substituição no período de 28.6.2017 a 21.5.2018 (facto 40), pelo que esteve privada do uso do veículo no dia 27.6.2017 e no período de 22.5.2018 em diante.
No caso, não se está perante uma cobertura contratada, tratando-se antes de uma obrigação de indemnização por violação de deveres acessórios de conduta, pelo que se considera que a indemnização não pode abranger o dia 27.6.2017. Com efeito, o fundamento da obrigação de indemnização consiste em a ré não ter atempadamente pago o valor devido pela perda total do veículo e não ter dado qualquer resposta em tempo útil sobre os pedidos de informação sobre o estado do processo. Ora, uma vez que, como acordado contratualmente, a ré dispunha do prazo de 60 dias para efetuar o pagamento da indemnização contratual quanto à perda total do veículo, no dia 27.6.2017 ainda não se verificava qualquer violação dos deveres acessórios de conduta, posto que o furto ocorreu no dia 26.6.2017.
Assim sendo, face ao fundamento da obrigação de indemnização e tendo em conta que a ré usufruiu de veículo de substituição até 21.5.2018, a indemnização pela privação do uso só é devida quanto ao período de 22.5.2018 em diante até que ocorra o pagamento da indemnização devida pelo furto do veículo.
Importa agora determinar qual o valor diário da indemnização pela privação do uso sendo certo que no caso em apreço não se provou que a autora tenha tido qualquer prejuízo patrimonial concreto por ter estado privada do uso do veículo.
Dada a ausência de prejuízo patrimonial concreto parece-nos que o único caminho possível para fixar o montante indemnizatório é o recurso à equidade, nos termos do art. 566º, nº 3, do CC, que estabelece que, se não puder ser averiguado o valor exato dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados.

No sentido de se dever recorrer à equidade para fixação da indemnização por não uso vejam-se:

- o Acórdão da Relação de Coimbra, de 6.2.2018, (in www.dgsi.pt) segundo o qual “a medida da indemnização terá que ser encontrada com recurso à equidade, pois que deve concluir-se pela existência de um dano que se traduziu na impossibilidade do lesado o utilizar nas suas deslocações diárias, profissionais e de lazer, havendo que encontrar em termos quantitativos um valor que se mostre adequado a indemnizar o lesado pela paralisação diária de um veículo que satisfaz as suas necessidades básicas diárias” (...)

Concluindo-se pelo dano e não sendo possível quantificá-lo em valores certos face aos factos provados, o tribunal deverá recorrer à equidade para fixar a indemnização, nos termos previstos no artigo 566º, n. 3, do Código Civil.
Para este efeito pode tomar-se como ponto de referência, por exemplo, a quantia necessária para o aluguer de um bem de características semelhantes, devendo realizar-se em abstrato uma ponderação global das várias situações por forma a chegar-se a um valor concreto, nomeadamente que tal valor deve ser sempre tomado como simples referência e não em termos absolutos, que deve do mesmo ser excluída a normal taxa de lucro obtida por estas entidades por forma a evitar-se um benefício injustificado por parte do lesado, tendo-se sempre presente o uso concreto que o lesado fazia do veículo em causa.

- o Acórdão da Relação de Lisboa, de 12.7.2018 (in www.dgsi.pt) em cujo sumário se lê :

“I - A mera privação do uso do veículo configura um dano patrimonial específico e autónomo que atinge o direito de propriedade, por retirar ao proprietário lesado a possibilidade de utilizar a coisa e a capacidade de dispor materialmente dela quando e como melhor lhe aprouver.
II - A lesão patrimonial decorrente da perda dessa possibilidade de utilização do veículo é passível de avaliação pecuniária, devendo recorrer-se à equidade na falta de prova de danos efetivos causados pela privação do uso do veículo.”

- o Acórdão desta Relação de Guimarães, de 19.1.2017, (in www.dgsi.pt) segundo o qual “não se provando prejuízos concretos consequência da privação do uso de veículo, a indemnização por tal privação será encontrada com recurso à equidade dentro dos limites do que se tiver provado (art. 566, n.º 3, do CC), o que nos remete para uma ponderação das circunstâncias reais, e não para uma resposta em abstrato. Mesmo considerando que se trata de uma viatura de 7 lugares e que o titular, apesar de dono de outras, não as tem disponíveis, € 15 diários são suficientes para ressarcir as eventuais consequências da indisponibilidade do veículo.”

No caso em análise, provou-se que a viatura era utilizada pela autora no âmbito da sua atividade, tratando-se de uma viatura para uso profissional (facto 24).
O valor médio de aluguer diário de uma viatura idêntica é de € 265.
Porém, entende-se que não pode ser este o valor referência para fixação da indemnização pela privação do uso. Este valor de € 265 reporta-se a uma viatura praticamente nova e com poucos quilómetros pois é do conhecimento geral que as empresas de aluguer de veículos utilizam viaturas com tais características, procedendo à renovação regular e contínua da sua frota automóvel. Ora, a viatura em questão tinha cerca de 4 anos à data do furto, pois tinha sido matriculada em 26.7.2013, e tinha mais de 180 000 quilómetros.
No valor do aluguer está incluído o lucro da empresa e as despesas de manutenção.
Por outro lado, a ré facultou à autora uma viatura de substituição no período de 28.6.2017 a 21.5.2018, tendo despendido a quantia de € 1 043,29, ou seja, valor que fica muito aquém do pretendido valor de aluguer diário.
Assim, o valor diário de € 265 reputa-se extraordinariamente desajustado, por excessivo, considerando-se equitativo, atenta a lesão sofrida pela autora, as regras da boa fé e os valores arbitrados jurisprudencialmente para situações idênticas, fixar a indemnização no valor diário de € 40.
Porém, a fixação deste valor diário não pode representar um enriquecimento patrimonial por via da atribuição da indemnização. Ou seja, a autora não pode receber a título de indemnização pela privação do uso valor superior ao custo do veículo em novo. Só assim haverá uma fixação justa e equitativa da indemnização.
Neste sentido, veja-se o Acórdão do STJ, de 13.7.2017 (in www.dgsi.pt) o qual, numa situação em que estava em causa uma indemnização por privação do veículo acima de € 49 000 relativamente a um veículo que tinha um valor comercial de € 14 478,74, sendo que o preço do veículo em novo, nos últimos anos em que foi produzido era de € 41 000, considerou que “compreendendo-se o período de privação do uso do veículo entre 04-01-2013 e a data da entrega efetiva da indemnização pela perda total do veículo (que se desconhece se já ocorreu), uma vez que o valor acumulado da indemnização pela privação de uso ascenderá presentemente a um nível extremamente elevado e desproporcionado, tanto em relação ao valor devido pela perda total do veículo sinistrado, como em relação ao preço de um veículo novo nos últimos anos em que foi o mesmo foi produzido, deve o valor da indemnização a atribuir ter como limite máximo este último valor”.
Aderindo-se a esta orientação do Tribunal Superior, considera-se que a indemnização pela privação do uso de veículo deve ter como limite máximo o valor que, em 26.6.2017, data em que ocorreu o furto, tinha um veículo novo marca BMW, série 5 Touring Diesel, 520D, modelo F. Entendimento diverso permitiria, em abstrato, que a autora pudesse receber mais pela privação do uso do que o valor de aquisição de um veículo idêntico o que representaria um enriquecimento e, em consequência, implicaria que não houvesse equidade na fixação dessa indemnização.
Ao valor da indemnização acrescem juros de mora à taxa supletiva legal de 4%.
Assim, a apelação da autora procede parcialmente.

DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação:

A) em julgar a apelação da ré improcedente, confirmando a sentença recorrida na parte por esta impugnada:
B) em julgar parcialmente procedente a apelação da autora e, em consequência, revogam a sentença recorrida na parte em que absolveu a ré do pagamento das demais quantias peticionadas, condenando a ré a pagar à autora a quantia diária de € 40, a título de indemnização pela privação do uso do veículo, no período de 22.5.2018 em diante até que a ré efetue o pagamento da quantia de € 66 718, acrescida de juros à taxa supletiva legal de 4%, tendo esta indemnização como limite máximo o valor que, em 26.6.2017, tinha um veículo novo marca BMW, série 5 Touring Diesel, 520D, modelo F.
*
As custas da apelação da ré serão suportadas pela mesma e as custas da apelação da autora serão suportadas por autora e ré, na proporção dos respetivos decaimentos.
Notifique.
*
Guimarães, 5 de dezembro de 2019

(Relatora) Rosália Cunha
(1ª Adjunta) Lígia Venade
(2º Adjunto) Jorge Santos