Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | MANUELA PAUPÉRIO | ||
Descritores: | COMETIMENTO DE NOVO CRIME REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA NÃO REALIZAÇÃO DE DILIGÊNCIAS PROBATÓRIAS | ||
Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 10/19/2015 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
Sumário: | I) O cometimento de novo crime no decurso do período da suspensão revela sempre que uma das finalidades da punição não foi alcançada, na medida em que não se conseguiu o afastamento do condenado da prática de novos crimes. II) No entanto porque a revogação não ocorre de forma automática, há que averiguar se, com o cometimento de novo crime, ficou infirmado, de forma irremediável e definitiva, o juízo de prognose favorável em que a suspensão se baseou ou se, pelo contrário, ainda é possível esperar fundadamente que daí para a frente o condenado se afaste da prática de outros crimes. III) No caso em apreço, é clara a conclusão a que o tribunal recorrido chegou de que as finalidades que se visavam com a suspensão não se alcançaram, sendo, assim, desnecessária a efetivação de quaisquer outras diligências de prova pois mesmo a aceitar-se como verdadeiro tudo o que recorrente refere - que se encontra abstinente, que tem família que o apoia incondicionalmente - nada infirma os factos que se analisam e que demonstram que a suspensão da execução da pena de prisão decretada neste processo não serviu de advertência bastante para que o arguido não voltasse a cometer crimes. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães: I)- Relatório No processo acima identificado que correu termos pela Secção Criminal da Instância Local da Comarca de Braga (Juiz 3), foi proferida decisão que revogou a suspensão da execução da pena aplicada ao arguido Carlos N.. Inconformado com a decisão proferida dela veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte: (transcrição) «1. Para aferir sobre o juízo de prognose quanto ao futuro comportamento favorável do arguido, para efeitos de revogação ou no da suspensão da pena de prisão, será necessário e obrigatório a recolha de prova nesse sentido. 2. Bem como é obrigatório a audição do técnico que acompanha e fiscaliza o cumprimento da pena. Cfr. fAc. do TRG, de 11.6.2008, in CJ, XXXIII, 3, 297), o que no caso dos autos no se verificou, quando é imposto pela Lei. 3. O Tribunal recorrido não cuidou tomar declarações ao arguido na presença do técnico da reinserção social que o apoiou, conforme artigo 495.° n.°2 do CPP, no querendo saber os motivos que estiveram na base da sua conduta durante o período da suspensão, sem qualquer consideração pelo comportamento posterior do recorrente ao cometimento do novo crime, no efectuando assim qualquer Juízo de prognose sobre o futuro comportamento do recorrente, existindo clara insuficiência de fundamentação individualizada do despacho que se recorre. 4. O despacho que revoga a suspensão da pena de prisão sem a audição do perito, ou seja, preterição de prova, 495.° n.°2 do CPP, constituí uma irregularidade processual - inobservância da lei processual não integrada no elenco das nulidades, (artigos 118.° n.°1, 119.°, 120.°, do CPP) - que afecta o valor do acto praticado e, como tal, pode ser conhecida oficiosamente em sede de recurso. Cfr. artigo 123.°, n.°2 do CPP. 5. Consequentemente, deve ser declarado irregular o despacho que revogou a suspenso da execução da pena, determinando-se, que o tribunal recorrido proceda a nova recolha de prova, nomeadamente da audição do técnico da reinserção social, de forma a averiguar se as finalidades que estavam na base da suspensão da execução da pena não puderam, por meio dela ser alcançadas. 6. Antes de ser proferida decisão sobre a eventual revogação da suspensão da execução da pena, previamente deveria ter sido recolhida Junto do IRS ou de outra entidade oficial vocacionada para o efeito, informação sobre as condições sócio/familiares, comportamento e inserção social, laboraI e familiar do recorrente. 7. Ou seja, o Tribunal a quo deveria ter conhecido que o recorrente se encontra abstinente de qualquer estupefaciente, prosseguindo, assim, com sucesso o tratamento à sua toxicodependência. 8. Ainda, o Tribunal a quo deveria ter conhecido que o recorrente reatou o relacionamento com a sua companheira, filhos e restante família, que o apoiam permanentemente e incondicionalmente, bem como tem a possibilidade de voltar a trabalhar e viver uma vida profissional e social estável. 9. O tratamento de desintoxicação a que foi sujeito, o facto de estar abstinente de estupefacientes, só factos bastantes para que o juízo de prognose quanto ao futuro comportamento do arguido seja favorável. 10.A condenação sofrida pelo arguido (ainda que posterior) não é por si só suficiente para se ter por seguro a frustração das finalidades que serviram de base para a suspensão. 11. A suspensão da pena de prisão insere-se numa filosofia jurídico penal assente num princípio de subsidiariedade da pena privativa da liberdade e que pressupõe que, no momento da decisão, um juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido, pelo que o juiz terá de verificar se o cometimento do novo crime infirmou definitivamente o juízo de prognose que justificou a suspensão da execução da pena. 12.beveria ter indagado os motivos que conduziram o recorrente a delinquir novamente (indagaço oficiosa que deve ser cuidada e rigorosa, atenta a ultima ratio da sanção penal que daí pode advir e tendo em vista a demonstração de que as finalidades que subjazem à suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas, isto é, de que aquelas finalidades se encontram comprometidas. 13.A revogação da pena suspensa na sua execução pelo cometimento de um crime terá que ter na sua basecausas que “deverão perfilar indiciariamente o fracasso, em definitivo, da prognose inicial que determinou a sua aplicação, a infirmação, certa, da esperança de, por meio daquela, manter o delinquente, no futuro, afastado da criminalidade. 14.0 Tribunal a quo se fundamentou, exclusivamente no teor do CRC do arguido, ou seja, limitou-se a considerar que a simples prática de um crime da mesma natureza durante o período de suspensão, era suficiente para concluir pela douta revogação dc suspensão. 15.Pelo que se exigível ao Tribunal a quo que tivesse reunido mais elementos indispensáveis para tomar tal decisão, nomeadamente devia ter examinado a factualidade dada por provada nas sentenças em crise e, se as mesmas não se mostrassem absolutamente eloquente quanto ao naufrágio das finalidades que estiveram na base da suspensão, deveria ter indagada dos motivos que conduziram o recorrente a delinquir novamente. 16.Necessário que o Tribunal indague se, a suspenso ainda se mostra apta a evitar que o condenado torne a delinquir, isto porque, a revogação da suspensão tem de ser olhada como um expediente in extremis e sempre subordinada a apertadas limitações. 17.0 despacho recorrido viola os artigos 55.° do C.P e 495.° n°2 do CPP, violando os mais elementares direitos e garantias constitucionais, desde logo o artigo 1º, 9º, 27.°, 29.° e 30.° da Constituição da República Portuguesa, na vertente da preterição de formalidades probatórias essenciais na defesa, para além da violcção do princípio da legalidade previsto no artigo 1.º e 40.° do C.P..» A este recurso respondeu o Ministério Público junto do tribunal recorrido, conforme se constata de folhas 25 a 28 destes autos que ora aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os legais efeitos, sufragando o entendimento de que a decisão proferida deverá ser mantida. A mesma posição tomou o Digno Procurador Geral Adjunto, neste tribunal, no douto parecer que elaborou, dizendo inclusive que é tão notória a improcedência do recurso que este poderia ser apreciado em decisão sumária por ser manifesta a sua improcedência. Cumprido o preceituado no artigo 417º nº 2 do Código de Processo Penal nada veio a ser acrescentado no processo. Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos a conferência. Nada obsta ao conhecimento do mérito. II) Fundamentação: A questão a decidir no presente recurso reside apenas em saber se, deve manter-se ou ser alterado o despacho que decidiu revogar a suspensão da execução da pena de prisão neste processo aplicada ao arguido. Para melhor compreensão da questão em apreciação cumpre passar em revista a decisão recorrida, cujo teor integral é o seguinte: «-------- O arguido CARLOS N., por sentença transitada em julgado no dia 1 de julho de 2013, foi condenado na pena de 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 01 (um) ano, sujeita a regime de prova, pela prática de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal. ------------------------ * -------- Da certidão junta aos autos a fls. 323 e seguintes resulta que no âmbito do processo comum singular n.º 11/14.9PEBRG da Instância Local de Braga – Secção Criminal - J3, por sentença transitada em julgado no dia 20 de outubro de 2014, relativamente a factos praticados no dia 15 de fevereiro de 2014, o arguido foi condenado na pena de 12 (doze) meses de prisão efetiva pela prática de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal. ---------- * -------- Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 495.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, tendo-se procedido à audição pessoal do arguido (cfr. fls. 362). ------ * -------- A Digna Magistrada do Ministério Público promoveu a revogação da suspensão da execução da pena de prisão (cfr. fls. 366). -------------------------------------- * -------- A defensora do arguido foi notificada da promoção do Ministério Público, nada tendo requerido (cfr. fls. 368). -------------------------------------------------------------------------- * -------- O arguido pronunciou-se por escrito a fls. 365. ------------------------------------------- * -------- Cumpre apreciar de decidir. ----------------------------------------------------------------- -------- Tendo em conta o factualismo supra referido, é de concluir que o arguido CARLOS N., no decurso do prazo da suspensão, cometeu mais um crime doloso de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal. -------------- -------- Pelo tipo de crime que praticou e a factualidade inerente ao mesmo, o arguido demonstrou claramente que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas. ----------------------------------------------------------- -------- Com efeito, o arguido demonstrou uma absoluta incapacidade de reger a sua vida de acordo com os normativos jurídico-penais que protegem o património, mais demonstrando uma absoluta incapacidade em respeitar a suspensão aplicada. -------- -------- Com efeito, conforme já referido na sentença proferida no âmbito do processo comum singular n.º 11/12.9PEBRG, “não obstante as anteriores condenações em prisão suspensa aplicadas nos processos 1607/11.6PBBRG, 1518/11.5PBBRG e 1007/11.8PCBRG, o arguido renovou uma incapacidade para conduzir a sua vida de acordo com os normativos jurídico-penais, praticando novamente um crime de furto em pleno decurso de três prazos de suspensão de execução de pena de prisão. ------ -------- O arguido CARLOS N. demonstrou igualmente uma absoluta indiferença para com a sentença proferida no processo comum singular n.º 1607/11.6PBBRG deste mesmo 2.º Juízo Criminal, onde expressamente se referiu que a suspensão da prisão aí aplicada era uma última oportunidade, ficando obrigado a não consumir produtos estupefacientes como dever ligado especificamente à suspensão da execução da pena de prisão. ------------------------------ -------- Tal sentença transitou em julgado no dia 1 de julho de 2013, tendo o arguido não só prosseguido com o consumo diário de heroína e cocaína, como cometido novo crime de furto simples para sustentar tal vício e no decurso do prazo da suspensão.----------------------------------- -------- Assim, impõe-se a aplicação de uma pena de prisão efetiva ao arguido CARLOS N., sob pena de absoluta descredibilização da norma punitiva do crime de furto simples, bem como da própria justiça jurídico-penal e das três sentenças condenatórias supra referidas.”. ----------------------- -------- Assim, ao abrigo do disposto no artigo 56.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2, do Código Penal, determino a revogação da suspensão da execução da pena de prisão em que o arguido foi condenado, devendo o arguido cumprir a pena de 10 (dez) meses de prisão em que foi condenado nos presentes autos. ---------------------------------------------- »
Cumpre conhecer: São as conclusões apresentadas pelo recorrente que balizam e limitam as questões a decidir. 19 de outubro de 2015 |