Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1708/15.4T8VRL.G1
Relator: MANUELA FIALHO
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
CITAÇÃO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/12/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário: Em presença de pedido de apoio judiciário com nomeação de patrono a ação considera-se proposta na data de apresentação deste pedido, devendo, em consequência, considerar-se que na mesma data foi requerida a citação do réu e, assim, verificada a interrupção da prescrição nos termos do disposto no Artº 323º/2 do CC.
Decisão Texto Integral: Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Guimarães:
B., Autora, não se conformando com o teor da decisão proferida que pôs termo ao processo e por via da qual se julgou procedente a exceção de prescrição invocada pela Ré, julgando-se consequentemente extinto o direito que a A. pretendia fazer valer e absolvendo-se em conformidade a R. dos pedidos formulados e a condenação em custas da aqui Recorrente, vem da mesma interpor recurso.
Pede que se revogue a sentença, substituindo-a por outra que declare improcedente a exceção de prescrição arguida pela recorrida e não extinto o direito aos créditos laborais da Autora aqui Apelante, com todas as legais consequências, ou seja, determinando-se o prosseguimento da ação.
Apresentou as seguintes conclusões:
Discute-se, nos autos em epígrafe, a verificação da exceção da prescrição dos créditos reclamados pela Apelante.
Nos termos do n.º 4 do art.º 33º da Lei do Acesso ao Direito e aos Tribunais (Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, doravante designada LADT), «a ação considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono», considerando o legislador que esse é o momento em que, de acordo com o preceituado no artigo 26.º n.º 5 do Código de Processo do Trabalho, se inicia a instância.
Com a devida vénia, não se pode entender que, conforme dispõe a alínea a) do n.º 5 do art.º 24º da LADT «o prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior inicia-se, a partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação» (sublinhado nosso).

O prazo concedido ao patrono oficioso para intentar a ação ou o recurso, de 30 dias ou mais, é prazo meramente disciplinador, nunca funcionando em prejuízo do assistido que requereu o apoio judiciário.

Tendo a Autora formulado, cerca de 1 mês antes do termo do prazo para reclamar judicialmente os seus créditos, pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono para a propositura de ação, esta não só se considera proposta na data em aquele pedido deu entrada em juízo, como se deve considerar requerida a citação da Ré nesse mesmo momento (em que se considera proposta a ação) e, por isso, ter-se por verificada a interrupção da prescrição, nos termos do art.º 323º, nº 2 do Código Civil.

Torna-se irrelevante o prazo que decorra entre a data em que foi formulado o pedido de nomeação de patrono e a data da propositura da ação pelo patrono que vier a ser nomeado e, por outro, que a interrupção da prescrição em curso se dá cinco dias após ter sido requerido o pedido de nomeação de patrono, nos termos do art.º 323º, nº 2 do C. Civil, sendo que, a partir desta data, se inicia um novo prazo de prescrição que começa imediatamente a correr, tendo tal causa interruptiva efeito instantâneo, de que beneficia a Autora/Apelante. Isto é, a prescrição, nos autos e na situação em crise, operar-se-á apenas em 1/06/2016 (tendo, nos termos acima descritos, iniciado a sua contagem, por efeito da interrupção da prescrição inicialmente decorria, em 1/06/2015), e não em 10/09/2015, conforme entendeu – em nosso entender, erradamente – o douto Tribunal a quo. Ora,

Com a devida vénia, entende a A. que, intentando como intentou a presente ação no tempo em que o fez, fê-lo na tempestivamente e sem qualquer preclusão dos direitos da A., e também de acordo com aquela que é a esteira da Jurisprudência maioritária da doutrina portuguesa e dos nossos Tribunais Superiores.

Desta feita, não poderá nunca o douto Tribunal a quo declarar verificar-se a exceção da prescrição dos créditos laborais vindos reclamar pela A., como veio declarar, uma vez que tal prescrição não se verificou nos termos conjugados designadamente dos arts. 33º/4 da LADT (Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho), 24º/4 e 5, a contrario sensu, da LADT, 323º/2 e 326º do Código Civil.

Neste sentido veja-se, a título meramente exemplificativo mas com grande importância atenta a sua análoga aplicação prática à situação em crise, na seguinte jurisprudência: Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 01-07- 2013 (Processo n.º 704/12.5TTOAZ.P1), Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-01-2007 (Proc. 9401/06 4ª Secção), Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 9 Mai. 2007 (Processo 0646850), entre muitos outros mais neste sentido, acessíveis todos in www.dgsi.pt.

C., R. nos autos, contra-alegou, pugnando pela manutenção da sentença.

O MINISTÉRIO PÚBLICO emitiu parecer pronunciando-se pela procedência da apelação.

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Nos presentes autos a aqui R. veio invocar a exceção de prescrição dos créditos laborais, alegando para o efeito que a data da cessação do contrato de trabalho que vigorou entre as partes é de 30/06/2014 e que a presente ação deu entrada em juízo em 26/10/2015, tendo a R. sido citada em 04/11/2015. Mais alega que a A. deu entrada de pedido de concessão do benefício de apoio judiciário em 26/05/2015, na modalidade de nomeação e pagamento de honorários a patrono oficioso, tendo a patrona oficiosa que subscreve a petição inicial sido nomeada, após a concessão daquele benefício, em 04/08/2015, pelo que conclui que o prazo para a prescrição dos créditos laborais se interrompeu em 26/05/2015, mas que já se encontrava findo aquando da interposição da ação, dado que não foi interposta no prazo de 30 dias concedido para o efeito.
Regularmente notificada a A. veio, em articulado de resposta à contestação, pronunciar-se a respeito desta exceção e para tanto contrapôs que ao abrigo do disposto no art. 33º nº 4 da LADT a ação considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono, sendo que o prazo de 30 dias concedido para a interposição da ação no nº 1 deste mesmo preceito legal, sendo inobservado apenas tem consequências disciplinares. Deste modo conclui que a ação se considera proposta em 26/05/2015, não se verificando a exceção em apreço.
Foi proferida decisão que julgou procedente a exceção de prescrição invocada, julgando-se em conformidade extinto o direito que a A. aqui pretendia fazer valer, absolvendo-se em conformidade a R. dos pedidos formulados.

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As conclusões delimitam o objeto do recurso, o que decorre do que vem disposto nos Art.º 608º/2 e 635º/4 do CPC. Apenas se exceciona desta regra a apreciação das questões que sejam de conhecimento oficioso.
Nestes termos, considerando a natureza jurídica da matéria visada, é a seguinte a questão a decidir, extraída das conclusões:
- Tendo a Autora formulado, cerca de 1 mês antes do termo do prazo para reclamar judicialmente os seus créditos, pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono para a propositura de ação, esta não só se considera proposta na data em aquele pedido deu entrada em juízo, como se deve considerar requerida a citação da Ré nesse mesmo momento (em que se considera proposta a ação) e, por isso, ter-se por verificada a interrupção da prescrição, nos termos do art.º 323º, nº 2 do Código Civil?

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FACTUALIDADE:

O Tribunal recorrido considerou relevantes os seguintes factos:
1 - A A. rescindiu o seu contrato de trabalho com efeitos a partir de 30/06/2014, considerando-se esta data como a da cessação do contrato de trabalho, de acordo com o alegado pela A. – cfr. art. 5º da p.i.;
2 - Em 26/05/2015 a A. apresentou aos serviços sociais competentes pedido de concessão do benefício de apoio judiciário, o qual lhe foi concedido em 04/08/2015, tendo a patrona oficiosa que subscreve a p.i. sido nomeada nessa mesma data – cfr. art. 4º do articulado de resposta à contestação e documentos de fls. 34 e 35;
3 - A ação em apreço deu entrada em juízo em 26/10/2015 e a R. foi citada em 04/11/2015 – cfr. doc. de fls. 35 vº e A/r de fls. 59.

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O DIREITO:

A decisão recorrida considerou verificada a prescrição e, nessa medida, extinto o direito da A.
Ponderou, para tanto, que “…o prazo de um ano de prescrição previsto no art. 337º do Cód. do Trabalho se interrompeu em 26/05/2015 e começou novamente a decorrer a partir de 04/08/2015, tendo terminado 36 dias depois, ou seja, em 10/09/2015. Mas e quanto à ação se considerar proposta em 26/05/2015? É um facto que assim é, mas não se pode deixar de considerar que não basta a interposição da ação para a interrupção da prescrição, é necessário que tenha sido requerida a citação da demandada cinco dias antes do prazo prescricional terminar, ou seja, a A. deveria ter apresentado a p.i. em juízo, onde termina requerendo a citação da R. para contestar, cinco dias antes de 10/09/2015, já que quando o fez em 26/10/2015 aquele prazo de prescrição estava há muito esgotado.”
Importa, então, aquilatar do bem ou mal fundado desta decisão.
O Artº 337º/1 do CT dispõe que o crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente (Artº 323º/1 do CC).
O contrato de trabalho que existiu entre as partes em litígio cessou em 30/06/2014, vindo a R. a ser citada em 4/11/2015.
Ocorre, porém, que em 26/05/2015 a A. apresentou, nos serviços competentes, pedido de apoio judiciário tendo em vista também a nomeação de patrono.
Decorre de quanto se dispõe no Artº 33º/4 da L 34/2004 de 29/07 – lei que contém o regime de acesso ao direito e aos tribunais – que, estando em causa nomeação de patrono, a ação se considera proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono.
Donde, no caso, a presente ação considera-se proposta em 26/05/2015.
Como dissemos acima, o prazo prescricional interrompe-se ou com a citação ou com notificação judicial.
Contudo, tal como emerge do Artº 323º/2 do CC, se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
Reside aqui a solução para o pleito.
Na verdade, considerando a lei que, requerendo-se nomeação de patrono a ação se considera proposta na data de entrada daquele pedido, esta ação – há que ficcioná-lo – é exatamente a mesma que vem a ser interposta subsequentemente, pelo que se ficciona igualmente que o pedido de citação inerente á ação se considera efetuado.
Assim, tendo o pedido de nomeação de patrono sido efetuado bem antes do decurso do prazo prescricional, há que ter a prescrição como interrompida nos cinco dias subsequentes á data de entrada daquele pedido e, logo, muito antes de decorrido o prazo de um ano estabelecido no Artº 337º/1 do CT.
Isto mesmo vem sendo decido pela jurisprudência dos tribunais superiores, designadamente pela do STJ, conforme emerge de quanto se decidiu no Acórdão de 17/04/2013, onde se consignou que há que conjugar o regime consignado no Artº 33º/4 da Lei 34/2004 com o da interrupção da prescrição, que só ocorre com citação do Réu para a ação, ou com a notificação de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito. E, assim, impõe-se uma equiparação entre o pedido de nomeação de patrono e o requerimento de citação do R., devendo considerar-se que a prescrição se tem por interrompida decorridos cinco dias depois daquele pedido, conforme consagra o nº 2 do referido artigo 323°do Código Civil (www.dgsi.pt). Em questões não absolutamente coincidentes, mas a partir das quais se extrai idêntica conclusão, os Acórdãos do STJ de 29/11/2006 e 24/11/2004 (idem).
Por último, uma palavra apenas para consignar que, por não se verificarem os respetivos pressupostos, não tem aplicação ao caso o disposto no Artº 24º/4 da L 34/2004.
Termos em que procede a apelação.

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Em conformidade com o exposto, acorda-se em julgar a apelação procedente e, em consequência, revogar o despacho recorrido, julgando improcedente a exceção de prescrição e ordenando-se o prosseguimento dos autos.
Custas pela Apelada.
Notifique.
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Elabora-se o seguinte sumário, da autoria da relatora:

Em presença de pedido de apoio judiciário com nomeação de patrono a ação considera-se proposta na data de apresentação deste pedido, devendo, em consequência, considerar-se que na mesma data foi requerida a citação do réu e, assim, verificada a interrupção da prescrição nos termos do disposto no Artº 323º/2 do CC.


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MANUELA BENTO FIALHO


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ALDA MARIA DE OLIVEIRA MARTINS


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SÉRGIO ALMEIDA