Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3007/19.0T8GMR.G1
Relator: RAQUEL BATISTA TAVARES
Descritores: OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
RESPONSABILIDADE DO COMITENTE
DANO PATRIMONIAL
DANO NÃO PATRIMONIAL
CULPA DO LESADO
LESADO CLIENTE DE INSTITUIÇÃO BANCÁRIA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/15/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- A instituição de crédito responde, nos termos do artigo 500º do Código Civil, solidariamente com o seu funcionário, gerente do Balcão, que aproveitando-se das suas funções e da relação de confiança que tinha com os Autores, passou a utilizar a conta de que os mesmos eram titulares, nela efectuando aplicações financeiras, resgates de aplicações financeiras, depósitos e levantamentos sem o conhecimento daqueles.
II- A instituição bancária, atenta a sua qualidade de comitente relativamente ao seu funcionário, responde objectivamente pelos danos causados por este na esfera dos Autores, não sendo essa responsabilidade afastada pelo facto dos Autores, por força da referida relação de confiança, não se preocuparem em analisar os extractos e, posteriormente, não desconfiar do não recebimento dos mesmos, e nem se deslocarem ao banco, não relevando tal conduta para efeitos de aplicação do disposto no artigo 570º do Código Civil.
III- A responsabilidade da instituição bancária relativamente aos danos de natureza patrimonial é também extensiva aos danos não patrimoniais, inexistindo fundamento para fazer qualquer distinção, sendo que estes, se configuram como relevantes para efeitos do disposto no artigo 496º do Código Civil.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I. Relatório

B. C. e J. C. intentaram a presente acção de processo comum contra Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A. (que integrou o Grupo X) e M. J., pedindo a condenação solidária das Rés na restituição aos Autores do montante de €74.640,62, acrescido de juros de mora à taxa legal de 4%, desde 22.07.2009 até efectivo e integral pagamento.
Mais pediram a condenação solidária das Rés a pagar aos Autores a quantia de €20.000,00, a título de dano não patrimonial.
Alegam para tanto e em síntese que em Julho de 2008 foram abordados pela 2ª Ré, à data gerente do Balcão de Vizela do X, propondo-lhes que aí abrissem uma conta, com vista a uma maior rentabilidade do que aquela de que beneficiavam na Caixa … e que confiando nessas informações, em 11/07/2008 procederam à constituição, no então X, Balcão de Vizela, da conta à ordem nº .........-1, e procederam a um depósito de €200.000,00, valor esse que foi aplicado numa conta de depósito a prazo associada à referida conta à ordem.
Mais alegam que considerando as movimentações de saldo, nessa conta deveria constar actualmente o saldo de €74,640,62, aplicado num depósito a prazo, conforme instruções dadas à 2ª Ré, mas foram informados em agosto de 2018 que a sua conta a prazo se encontrava saldada e que tinha passado para o Balcão de Vila das Aves, nunca tendo dado instruções à 2ª Ré, e nem a qualquer outro trabalhador da 1ª Ré, no sentido de alteração do Balcão onde tinham as suas contas de Vizela para Vila das Aves.
Que tendo requerido os extractos da referida conta, os quais lhe foram facultados em 17/10/2018, se aperceberam de movimentos que não reconhecem e nunca solicitaram, designadamente aplicações e resgates em títulos Y Invest 2009, e Unidades de Participação dos Fundos Xrendimento, Xpredial e XFundo Mercados Emergentes e de uma transferência a débito no valor de €80.000,00, processada em 07/07/2011, por débito da conta à ordem nº ........-1, com a descrição Transf.via TARGET2-Dest:..., a qual foi processada sem o seu conhecimento ou autorização; sendo igualmente desconhecida dos Autores uma transferência a crédito no valor de €10.020,00, proveniente de “M. T.”.
Que a 2ª Ré utilizou aquela conta à ordem, nela efectuando aplicações financeiras, resgates de aplicações financeiras, depósitos e levantamentos, aproveitando-se da relação de confiança com os Autores, sendo que por força dessa utilização abusiva os Autores ficaram privados da quantia de €74.640,42, resultante da diferença entre o saldo de conta a 22/07/2009 (€210.138,89) e os montantes, efectivamente, por si despendidos (€135.498,27).
Invocam ainda os Autores que em consequência do comportamento das Rés ficaram impedidos de utilizar o capital e respectivos juros, vivendo num permanente estado de preocupação e ansiedade, com o temor de não reaverem, ou de não saberem quando irão reaver o seu dinheiro, o que lhes tem provocado ansiedade, tristeza e dificuldades financeiras para gerir a sua vida, devendo tal dano não patrimonial ser indemnizado num mínimo de €20.000,00.
Devidamente citadas, as Rés contestaram.
A Ré Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A impugnou os factos, alegando que os movimentos bancários foram todos queridos pelos Autores, que foram recebendo os competentes extractos.
A Ré M. J. impugnou os factos e requereu a intervenção principal provocada de W – Sistemas Integrados, S.A.
Para tanto e em suma alegou ser verdade que a Ré sugeriu aos Autores que estes abrissem uma conta no X, sendo, contudo, falso que estes lhe tenham dado instruções no sentido de manter os valores depositados aplicados em depósitos a prazo, ou que não a tenham instruído para que aplicasse aqueles valores em produtos financeiros.
Alegou também que a compra de 30.000 títulos Y, no valor de €150.233,33, em 22/07/2009, foi do inteiro conhecimento dos Autores, que a autorizaram, tanto mais que ainda residiam na sua anterior morada, aí recebendo os extratos mensais, sem que nada tenham dito.
Que todos os investimentos foram comunicados pela Ré e autorizados pelos Autores, sendo que, depois de alguns investimentos bem sucedidos, com taxas de juro muito acima da média praticada pela banca, a Ré tomou conhecimento de que um outro cliente seu procurava investidores e sugeriu aos Autores que efectuassem um empréstimo à sociedade W – Sistemas Integrados, S.A., com sede na Zona Industrial …, Lote …, freguesia de …, da qual é accionista e administrador F. C..
Que os Autores procederam assim ao investimento do montante de €80.000,00, recebendo os competentes juros e que a responsabilidade de qualquer devolução daquele montante sempre será da sociedade comercial W – Sistemas Integrados, S.A.
Admitida a intervenção acessória desta sociedade veio a mesma contestar alegando não ter tido qualquer contacto com os Autores no momento da obtenção do empréstimo, tendo sido a Ré M. J. quem se propôs a emprestar-lhe, a título pessoal, a quantia de €80.000,00, numa altura em que precisou de financiamento e o então X não lho concedia; que nessa altura ficou convencionado que pagaria uma remuneração de 5% ao ano, não tendo sido definido um prazo para pagamento e que até à presente data liquidou à referida M. J. a quantia de €37.628,00, tendo consciência de dever ainda a quantia de €42.372,00, ainda que àquela M. J. e não aos ora Autores.
Foi dispensada a realização da audiência prévia e foi proferido despacho destinado à identificação do objecto do litígio e à enunciação dos temas da prova.

Veio a efectivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva:
“Dispositivo:
Pelo exposto, vai a presente acção julgada parcialmente procedente, com a consequente condenação dos réus Caixa ... – Caixa ... Bancária, S.A. e M. J. a, solidariamente, pagarem aos autores a quantia de € 80.000,00 (oitenta mil euros), acrescida de juros à taxa de 4% contados desde 07.07.2011 até integral pagamento, sem prejuízo da limitação do total ao valor peticionado na alínea a) do petitório, nos termos do nº 1 do art. 609º do CPC.
Mais vão as referidas rés condenadas a pagar a cada um dos autores (B. C. e J. C.), solidariamente, a quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros), a título de dano não patrimonial, vencendo-se juros desde a prolação desta sentença até integral pagamento, à taxa de 4%.
Custas na proporção do decaimento, que se fixa em 1/10 para os autores e 9/10 para as rés – art. 527º do CPC.
*
Uma vez que, contrariamente ao alegado pela segunda ré, M. J., os autores não consentiram nos investimentos em Fundos, nem tampouco celebraram qualquer contrato com a ora chamada, no sentido do empréstimo da quantia de € 80.000,00, vai a mesma notificada para, querendo e em dez dias, se pronunciar quanto à sua condenação como litigante de má-fé, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 542º, nº 2, al. a), do CPC.
*
Atento o acima exposto quanto à falsificação das assinaturas do autor, remeta certidão desta sentença e cópia dos documentos juntos a fls. 40, verso, 67, verso, 73, verso e 82, verso (eles próprios, cópias, relegando-se para a investigação criminal, caso a haja, diligenciar pela obtenção os originais) ao Ministério Público, para os efeitos tidos por convenientes.
*
D.N.”
Inconformada, apelou a Ré Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A da sentença, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“III) CONCLUSÕES
A. Sobre a matéria de facto dada como provada por insuficiente, por reporte à matéria não provada fixada em f) de que também se recorre, por incongruente com acervo probatório reunido nos autos e a própria fundamentação utilizada na sentença recorrida
1. Considerou o tribunal de primeira instância, como não provado em f) que “os autores tivessem recebido os extratos bancários ao longo de todo o período compreendido entre a constituição da conta no X e o ano de 2018”
2. Ora, ultrapassando até o facto de os extratos de conta bancária que foram enviados ao A. terem sido juntos aos autos pela 2.ª R., sempre haverá que atentar ao depoimento de parte prestado em audiência pelo próprio A.;
3. O qual não se pautou pela isenção, e se apresentou cheio de incongruências, pois não ora recebia, ora até recebia extratos, ora dificilmente abria essas cartas do banco, ora afinal até as abria, ora só as abriu no inicio e só algumas vezes, ora até tem muitas na sua oficina ainda por abrir, que não as abre… (Vd. depoimento de parte do A. B. C. - gravação 20200113123443_5693970_2870528.wma);
4. Certo é que o depoimento prestado não deixa de demonstrar à evidência que, pelo menos até à data da sua mudança de residência, o que terá acontecido por volta de finais de julho de 2011, o A. recebeu as cartas com os extratos bancários que o banco lhe enviava,
5. Para o efeito, basta fazer uso das recorrer às regras da experiência comum para se perceber que nenhum sentido faria o banco (1.ª R), ora enviar, ora não enviar extratos bancários, ao A., até Julho de 2011, cuja emissão é automática.
6. Agora, isso sim, admitimos que não se revelou possível apurar quais cartas (que como confessou, recebeu) abriu o A., atentas as sucessivas incongruências do seu depoimento, como decorre da motivação da própria sentença recorrida (pág. 16 da sentença recorrida versão pdf), que a propósito do A. refere “ nem se dava trabalho de olhar bem para os que chegou a receber, designadamente antes de mudar de residência, como o próprio referiu em julgamento.”
7. Face ao mencionado de 1) a 6) deverá ser aditado um ponto aos factos provados (depois de 12) e antes de 13) onde de dê por assente:
“O A. desde 14/07/2008, data da abertura da conta e até mudar de residência, em finais de Julho de 2011, recebeu extratos da 2.ª R., tendo aberto alguns, não concretamente apurados.”
8. Face ao mencionado de 1) a 6) deverá ainda ser alterada a redação do facto f) da matéria não provada fixando-se os seguintes factos:
“Que a segunda ré tivesse efetivado a alteração de residência e que os autores tivessem recebido os extractos bancários depois dessa alteração de residência, em finais de Julho de 2011.”
B. Sobre a ausência de fundamentos de facto e direito, que justifiquem a condenação da 1.ª R., na qualidade de comitente, a indemnizar os A., a título de danos patrimoniais, em valor superior a 67.174,73€, ou no limite €69.980,00 de capital, sem prejuízo de juros – da nulidade da sentença quanto a este segmento decisório
9. Atentos os factos dados como provados nesta sede (4 a 11, 15 a 17, 21 e 24), a motivação apresentada de suporte, (pág. 11 e ss. da sentença recorrida versão pdf), a parte do direito acima mencionada, não podia o Tribunal “condenar os réus Caixa ... – Caixa ... Bancária, S.A. e M. J. a, solidariamente, pagarem aos autores a quantia de € 80.000,00 (oitenta mil euros), acrescida de juros à taxa de 4% contados desde 07.07.2011 até integral pagamento, sem prejuízo da limitação do total ao valor peticionado na alínea a) do petitório, nos termos do nº 1 do art. 609º do CPC.”, por duas ordens de razões:
a. A primeira, porque conforme consta dos factos provados, efetivamente atento o uso que o A. fez das verbas que tinha depositadas em conta, apenas ficou privado do valor de €67.174,73, resultante da diferença entre o valor referido em 11) e o valor referido em 17) – facto provado em 24) e decorre da análise dos extratos de conta juntos aos autos pela 1.ª R.
b. A segunda, porque ainda que atendêssemos ao raciocínio expendido da douta sentença recorrida - na dúvida, damos por bom o valor de €80.000,00, como sendo o prejuízo dos A. (considerando que era o valor que estava depositado à data da transferência de 07/07/2011, dita sem autorização dos A) - sempre se teria de se ter em conta que, já depois de Julho de 2011, mais concretamente em 10/01/2017, a 2.ª R depositou na conta dos A. €10.020,00, dinheiro que estes usaram em proveito próprio – conforme decorre de 15), 16), 17) e 22) dos factos provados – o que sempre ditaria uma condenação, de valor limite de capital de €69.680,00.
10. A sentença recorrida ao desconsiderar, a realização desta transferência a crédito, efetuada pela 2.ª R, para a conta dos A. em 10/01/2017, no valor de €10.020,00€, já depois da transferência a débito dos €80.000,00 e os factos em consonância, dados como provados em 15), 16), 17) e 22), está assim, a permitir o enriquecimento sem causa dos A. – 473.º do CC, e a penalizar a 1.ª R., condenando-a na qualidade de comitente, ao ressarcimento de uma importância que legalmente não é devida,
11. Esta decisão acarreta a nulidade da sentença, quanto a este segmento decisório, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, pois o Tribunal tem de fundamentar os despachos e as sentenças e, devendo esta constituir um silogismo lógico-jurídico, em que a decisão deverá ser a conclusão lógica da norma legal (premissa maior) com os factos (premissa menor), pressupostos que in casu, não se verificam.
12. Nulidade que desde já se invoca, a fim de que ser reconhecida e declarada, a fim de que este segmento decisório seja substituído por outro que condene solidariamente a recorrente, na qualidade de comitente, a pagar aos A. o valor máximo de capital de €67.174,73, ou no limite de €69.680,00, sem prejuízo do ressarcimento dos respetivos juros, calculados à taxa legal.
C. Sobre o recurso da matéria de direito por ausência de pressupostos de direito que justifiquem a condenação da 1.ª R. no que toca à indemnização dos A. por danos não patrimoniais
13. O Tribunal de 1.ª instância deu ainda, como provado o facto 25 que “os autores ficaram num permanente estado de preocupação e ansiedade, com o temor de não reaverem, ou de não saberem quando iriam reaver o seu dinheiro, o que lhes tem causado ansiedade, tristeza, dificuldades financeiras para gerir a sua vida, “stress”, indignação, perturbação do espírito e da motivação para viver e trabalhar, dificuldade em conciliar o sono e insónias”, sem que qualquer elemento de prova documental tivesse sido junta aos autos, sendo que a prova testemunhal produzida foi parca neste sentido.
14. Atento o mencionado na motivação da sentença (págs. 15 e 19 da sentença versão em pdf) e na parte do direito (pág. 28 sentença versão em pdf), o Tribunal não podia concluir pela condenação das RR a solidariamente “a pagar a cada um dos autores (B. C. e J. C.), solidariamente, a quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros), a título de dano não patrimonial, vencendo-se juros desde a prolação desta sentença até integral pagamento, à taxa de 4%.” (pág. 30 sentença versão em pdf).
15. Com efeito, tendo presente o principio da livre apreciação da prova (art. 607.º, n.º 5 do CPC) e os citados excertos da sentença recorrida, que a nosso ver, valoram corretamente a prova produzida em audiência de julgamento, no que à atuação do A. diz respeito (sem prejuízo naturalmente das responsabilidades que cabem aos demais sujeitos processuais), o Tribunal não podia concluir da forma indicada em 14,
Porquanto,
16. A relação estabelecida entre um cliente e um banco inicia-se genericamente, pela abertura de uma conta, por norma, uma conta de depósitos, o qual, atenta a sua natureza de negócio indireto, usualmente designado por “depósito irregular”, que na prática se traduz num tipo de depósito para fins que lhe não são típicos, mas que permite alcançar.
17. Assim, em circunstâncias normais correrá por conta do banco, o risco relativo à subtração dessas espécies monetárias, a partir do momento em que lhe são entregues.
18. Correndo a obrigação de restituição por conta do banqueiro, cabe ao banco o ónus de elisão da presunção legal que sobre ele impende, demonstrando a culpa do cliente depositante na não restituição do dinheiro.
19. “A pari”, para os bancos, decorrem deveres funcionais que se traduzem, nomeadamente, em assegurar aos seus clientes, em todas as atividades que exerçam, elevados níveis de competência técnica e de criação de condições de eficiência, diligência, neutralidade, lealdade, discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhe são confiados, de acordo com o princípio da segurança das aplicações, tendo em conta o interesse dos seus clientes.
20. Sendo que o cumprimento de tais regras de conduta não pode significar a plena demissão das obrigações dos clientes que com eles contratam, nem um entrave ao desenvolvimento da prática bancária.
21. Ora, revertendo ao caso concreto, como a sentença proferida em 1.ª instância espelha, o A. ao longo da relação comercial que estabeleceu com o banco, demitiu-se por completo das suas obrigações de cliente, seja como refere a douta sentença recorrida, procedendo de forma “caricata” quando: i) se “descomprometeu do controle das suas contas”, ii) “confiando, imprudentemente”, na gerente do balcão, iii) “não se questionando quanto às razões pelas quais recebia um tratamento tão personalizado” i iv) “Nunca ía ao Banco”.
22. Tendo até o Tribunal concluído, e bem, que “o funcionamento destes esquemas mirabolantes (…) não seria possível se, do outro lado, não estivesse alguém com as características do autor, que não desconfiava do facto de os extractos não lhe chegarem a casa, nem se dava trabalho de olhar bem para os que chegou a receber”,
23. O que revela bem, a citada: “incúria - na (não) análise dos extractos e/ou não reclamação pelo não recebimento dos mesmos...”, a que se refere a sentença.
24. É que, tudo analisado, sopesado e valorado, não podem restar dúvidas que foi a atuação do A., de total e absoluta renúncia ao controlo das suas contas, que como bem refere a sentença recorrida contribuiu para viabilizar a realização das operações bancárias em causa nos autos.
25. Sendo tal atuação completamente injustificada e desajustada, à luz do contexto sócio/económico/temporal e cultural que vivemos, critério que deve orientar a diligência que as circunstâncias exigem ao “bom pai de família”, ou ao dito “homem médio”.
26. Tal conduta descomprometida, “imprudente” e reveladora de total “incúria” não pode deixar de ser configurada como negligente, tendo funcionado como verdadeiro entrave à boa prática bancária.
27. Lembrar que bastaria o A. ter aberto e atentado ao teor dos extratos que recebeu, para perceber os movimentos que eram efetuados na sua conta, tanto mais que, conforme depoimento do próprio, só mudou de residência em finais de Julho de 2011 e quer as aplicações efetuadas em obrigações (sem prejuízo de lhe terem sido extremamente lucrativas), quer a transferência de €80.000,00 sindicada nestes autos, ocorreram antes dessa data.
28. Deveres de diligência pertinentes e básicos, que resultam nada menos que das regras da experiência comum, se encontravam ao alcance do A. e forma manifestamente desprezados.
29. Este desleixo e desmazelo para com os assuntos relacionados com as suas contas bancárias, ditou que não fosse ao balcão e nunca tivesse questionado o seu banco sobre movimentos que foram efetuados, ou extratos que deixou de receber,
30. O que não permitiu ao banco detetar/investigar eventuais irregularidades, como contribui/viabilizou as operações bancárias sindicadas nos autos.
31. Não obstante, com a condenação da 1.ª R no pagamento de €5.000,00, a título de danos não patrimoniais, quem vem a ser penalizado pela falta de zelo do A. é o banco,
32. O que não só contraria as mais elementares regras do bom senso, como as disposições legais que justificam a indemnização por danos não patrimoniais – 496.º, n.º 1 CC;
33. Termos em que a condenação da Caixa ... no pagamento de €5.000,00 ao A. a título de indemnização por danos não patrimoniais é injustificada e até mesmo temerária, posto que uma tal decisão viola ostensivamente os artigos 570º e 799º, ambos do Código Civil.
34. Devendo este segmento decisório ser revogado, absolvendo-se a apelante da condenação proferida a título de danos não patrimoniais”.
Pugna a Recorrente pela integral procedência do recurso e, consequentemente, pelo aditamento de um ponto aos factos provados (depois de 12) e antes de 13) onde de dê por assente que “O A. desde 14/07/2008, data da abertura da conta e até mudar de residência, em finais de julho de 2011, recebeu extratos da 2.ª R., tendo aberto alguns, não concretamente apurados” e pela alteração da redação do facto F) da matéria não provada fixando-se os seguintes factos: “que a segunda ré tivesse efetivado a alteração de residência e que os autores tivessem recebido os extractos bancários depois dessa alteração de residência, em finais de julho de 2011”, pela declaração de nulidade da sentença quanto ao segmento decisório que condenou a Recorrente a pagar a quantia de €80.000,00, sem prejuízo da limitação do total ao valor peticionado na alínea a) do petitório, e sua substituição por outro que condene solidariamente a recorrente, na qualidade de comitente, a pagar aos Autores o valor máximo de capital de €67.174,73, ou no limite de €69.680,00, sem prejuízo do ressarcimento dos respetivos juros, calculados à taxa legal e a absolva da condenação proferida a título de danos não patrimoniais.
Também a Interveniente W – Sistemas Integrados, S.A veio apelar da sentença, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“D) DAS CONCLUSÕES

DO ERRO MATERIAL DE QUE EIVA A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA

I - Na motivação da douta Sentença recorrida a Meritíssima Juiz a quo refere que “A fls. 138 ss. e 166, frente e verso, estão juntos os comprovativos da entrada, a crédito, dos valores referidos no artigo 34) dos factos provados, a favor da segunda ré. Esta documentação apenas atesta a entrega, pela W à autora, do valor de 4.500,00.”;
II - A Meritíssima Juiz a quo, no trecho transcrito, refere-se aos documentos pela Apelante juntos sob os nºs 2, 3, 4 e 5 da sua Contestação e à repetição da junção de que deles fez – por alegada ininteligibilidade da digitalização dos constantes da Contestação - através do requerimento que, com a referência 34539654, submeteu a juízo no dia 14/01/2020;
III - Tais documentos consubstanciam-se como sendo comprovativos de depósitos pela Apelante efectuados na conta bancária da segunda Ré e nos seguintes termos: a quantia de 2.200,00 €, em 18/12/2015; a quantia de 1.000,00, em 11/09/2015; a quantia de 1.500,00 €, em 07/07/2016; e a quantia de 800,00 €, em 08/04/2016;
IV - O artigo 34 dos factos dados como provados, para cujos valores remete o trecho transcrito, reza “Mais procedeu aos seguintes depósitos na conta bancária da ora segunda ré: 2.200,00, em 18.12.2015; 1.000,00, em 11.09.2015; 1.500,00, em 07.07.2016; 800,00, em 08.04.2016, em absoluta consonância com o teor dos documentos em causa;
V - A soma dos apontados valores importa o resultado do montante de 5.500,00 e não do valor de 4.500,00 €, como, erradamente, consta da douta Sentença recorrida;
VI - Constata-se, pois, que a Meritíssima Juiz a quo incorreu em lapso de cálculo aritmético, que se reconduz a um erro material que é corrigível e sanável;
VII - Desta feita, deverá o apontado erro material ser corrigido e ser conferida nova redacção ao trecho acima transcrito, sendo que, de onde consta “Esta documentação apenas atesta a entrega, pela W à autora, do valor de 4.500,00”, (negrito nosso), deverá passar a constar “Estadocumentação apenas atestaaentrega, pelaW àautora, do valor de 5.500,00”;

DA LEGITIMIDADE E MOTIVAÇÃO DA APELANTE NA INTERPOSIÇÃO DO PRESENTE RECURSO

VIII - Os fundamentos do presente recurso e as razões de discordância da Apelante com a douta Sentença proferida pela Meritíssima Juiz a quo não contendem com a decisão de mérito que foi proferida quanto àquele que foi decidido ser o objecto do litígio e que naquela se encontra definido e delimitado pelo seu Thema Decidendum;
IX - Quanto a este conspecto, a douta Sentença é exemplar, tendo a Meritíssima Juiz a quo julgado com acerto, brilhantismo e perfeita observância da Lei aplicável os elementos constantes dos autos e a prova produzida em sede de audiência final de discussão e julgamento;
X - As razões da discordância da Apelante com a decisão recorrida prendem-se com a decisão proferida quanto à matéria de facto que a ela é atinente dados os termos do seu chamamento à presente acção: intervenção acessória provocada, (cfr. despacho proferido em 11/09/2019, com a referência 164741266);
XI - Tal decisão quanto à matéria de facto que a ela é atinente poderá ter reflexos naeventual acção de regresso que a segunda Ré possa vir a intentar contra a ora Recorrente face à procedência da acção e da pretensão dos Autores;
XII - Parte substancial da matéria pela Apelante arguida na sua Contestação, foi julgada como provada pela Meritíssima Juiz a quo na decisão que proferiu quanto à matéria de facto – vide artigos 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32 e 35 dos factos provados;
XIII - Quanto à matéria pela Apelante arguida na sua Contestação e que constitui matéria de excepção ao direito que a Segunda Ré queira fazer valer em eventual acção de regresso que contra si venha a interpor e que se reporta aos pagamentos/restituições que a Recorrente efectuou à segunda Ré por conta da quantia de 80.000,00 € que por esta lhe havia sido emprestada/mutuada – na Sentença a Meritíssima Juiz a quo proferiu a seguinte decisão: a) julgou como provados os factos que constam dos artigos 33) e 34) da respectiva matéria; e b) julgou como não provado o facto h da respectiva matéria;
XIV - A Apelante discorda relativamente à decisão quanto à matéria de facto pela Meritíssima Juiz a quo proferida quanto ao artigo 34 dos factos provados e quanto à alínea h) dos factos não provados, os quais padecem de erro de julgamento, face aos elementos constantes do processo e da prova produzida em sede de audiência final de discussão e julgamento, como mais pormenorizadamente se expendeu em sede de alegações;
XV - Face ao estatuto específico por que foi admitida a intervenção da Apelante na presente acção – por via da intervenção acessória provocada -, dela não pode resultar qualquer sua condenação nestes autos, já que não é sujeito da relação jurídica que aqui se debate entre os Autores e Rés – como, de resto, resulta do disposto nos arts. 321º e 323º, nº 1 do C.P.C.;

CONTUDO,
XVI - Atento o que prescrevem os arts. 321, nº 2, 323º, nº 4 e 332º do C.P.C., decorre que, muito embora o interveniente acessório não seja condenado nesta primeira acção, fica vinculado a aceitar os factos dos quais derivou a condenação do primitivo réu, estendendo-se-lhe os efeitos do caso julgado da sentença final – os factos e o direito que a decisão judicial tenha estabelecido;
XVII - O incidente da intervenção acessória provocada permite, assim, que se estendam ao chamado os efeitos do caso julgado da sentença, de modo a que não seja possível, nem necessário, que na subsequente acção de indemnização proposta pelo réu contra ele – por via do direito de regresso - se voltem a discutir as questões já decididas no anterior processo, salvo se se verificarem as situações previstas nas als. a) e b) do art. 332º do C.P.C.;
XVIII - Na nova acção de indemnização em que figure como réu o chamado à intervenção no primeiro processo, fica este vinculado ao conteúdo da sentença proferida neste último como prova plena dos factos nela estabelecidos relativamente ao direito definido e no que concerne às questões de que a acção de regresso dependa;
XIX - De todas as disposições legais acima citadas resulta inequívoco que o chamado, por via da intervenção acessória provocada, embora beneficie do seu estatuto não é um assistente, nos termos em que esta figura processual está delineada nos arts. 326 e ss. do C.P.C.;
XX - Nos termos do nº 2, do art. 321º do C.P.C. determina-se que a intervenção processual do Chamado se circunscreve à discussão das questões que tenham repercussão na acção de regresso invocada como fundamento do chamamento; XXI - Deverá, pois, entender-se que a lei processual admite que, na sua intervenção processual, o Chamado poderá introduzir a discussão de todas as questões que tenham, ou possam vir ater, repercussão na futura acção de regresso, podendo, pois, o Chamado deduzir defesa por impugnação motivada em termos distintos do da parte requerente do Chamamento;
XXII - Foi o que ocorreu no caso vertente, como decorre do teor da Contestação pela Apelante apresentada, na qual esta introduziu factos que se consubstanciam como excepções ao direito de regresso que a segunda Ré contra ela pretenda accionar – precisamente a restituição/pagamento parcial da quantia de 80.000,00 € que por ela lhe foi disponibilizada;

DESTA FEITA,
XXIII - Coloca-se a questão de, quanto a tal conspecto – ou seja, o quantum dos montantes pela Apelante restituídos/pagos à segunda Ré -, a decisão sobre a matéria de facto proferida pela Meritíssima Juiz a quo formar caso julgado com eficácia externa na eventual futura acção de regresso, ficando esta, logo e ab initio, vinculada ao conteúdo da sentença proferida nestes autos como prova plena do julgamento dos factos nela estabelecidos;
XXIV - Em tal caso, de se verificar a formação de caso julgado material relativamente à decisão da matéria de facto proferida acerca da matéria exceptiva arguida pela Apelante relativamente à segunda Ré na sua Contestação – o que, data venia e s.m.o., parece decorrer de todo o regime legal acima invocado -, não poderá a Recorrente voltar a invocá-las na eventual acção de regresso que futuramente venha a ser contra si intentada;
XXV - Decorre que, muito embora a Sentença recorrida não comporte – como não poderia nunca comportar – a condenação da Apelante que, assim, não é parte vencida na causa, os erros de julgamento que a Recorrente crê terem sido cometidos pela Meritíssima Juiz a quo na decisão que proferiu sobre a matéria de facto prejudicam-na directa e efectivamente, como se demonstrou, o que legitima a sua impugnação pela presente via recursiva, (cfr. art. 631º, nº 2 do C.P.C.);

DAS RAZÕES DA DISCORDÂNCIA DA APELANTE RELATIVAMENTE À DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO PROFERIDA PELO TRIBUNAL A QUO
XXVI - O presente recurso visa a impugnação da decisão sobre a matéria de facto proferida pela Meritíssima Juiz a quo já acima identificada, porquanto considera a Apelante verificar-se erro de julgamento por parte do Tribunal recorrido quanto a tal conspecto;

ASSIM,
XXVII - Pelos fundamentos contidos no corpo das alegações, designadamente os meios probatórios invocados – os documentos constantes do processo e os depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento (cujos excertos foram devidamente identificados e transcritos) –, fazendo uma análise conjugada e crítica dessa convocada prova e demonstrando o erro do iter decisório e o erro de julgamento na sua valoração e da motivação por parte da Meritíssima Juiz a quo, devem ser alterados os seguintes factos:

a) O facto dado como provado no artigo 34 da decisão da matéria de facto deverá ser alterado e passar a ter a seguinte redacção:
34) Por conta e para a restituição parcial da quantia referida em 32), a W entregou à segunda Ré, por meio de depósitos por si efectuados na conta bancária daquela, as seguintes quantias: 2.200,00, em 18.12.2015; 1.000,00, em 11.09.2015; 1.500,00, em 07.07.2016; 800,00, em 08.04.2016.
b) O facto dado como não provado constante da alínea h) da decisão da matéria de facto, deverá ser dado como provado, propondo-se que passe a constar do acervo respectivo através do aditamento de um novo artigo (depois do 34 e antes do 35, sugerindo-se passe a ser o 34-A) onde se dê por assente/provado o facto com a seguinte redacção:
34-A) Por conta e para a restituição parcial da quantia referida em 32), a W entregou à segunda Ré, por meio de numerário e em mão, as seguintes quantias: 3.000,00 , no ano de 2012; 5.000,00 €, no ano de 2013; 5.000,00 €, no ano de 2014; 1.000,00 , no ano de 2015.

Mais deverá, em consequência, ser alterada a redacção da alínea h) dos factos não provados, nos seguintes termos:
h) Que, para além das quantias mencionadas no artigo 34-A dos factos provados, a W
tenha entregado mais quaisquer quantias à segunda ré, em mão”.
c) Na procedência da impugnação da matéria de facto objecto do presente recurso, será necessário conformar a redacção da alínea i) dos factos não provados.
O presente recurso não teve por objecto, nem beliscou, a relação jurídico litigiosa estabelecida entre Autores e Rés.
Na douta Sentença recorrida foi dado como não provado na sua alínea i) que as quantias referidas em 34) tenham sido entregues aos autores.

Na procedência deste recurso, e porque os respectivos pressupostos se mantêm, deverá ser alterada a redacção da alínea i) dos factos não provados, nos seguintes termos:
i) Que as quantias referidas em 34) e em 34-A) tenham sido entregues aos autores”;

DA CONFORMAÇÃO DA ALTERAÇAO DA MATÉRIA DE FACTO PROPUGNADA COM O DIREITO APLICÁVEL
XXVIII - Atendendo ao que decorre dos artigos 32 e 35 dos factos dados como provados, a relação estabelecida entre a Apelante e a segunda Ré reconduz-se a um contrato de mútuo, porquanto estão presentes todos os seus elementos constitutivos previstos no art. 1142º do C.C., sendo-lhe, assim, aplicável a respectiva disciplina;
XXIX - Atendendo ao valor da quantia entregue pela segunda Ré à Apelante – 80.000,00 € -, o mútuo em causa estava sujeito, obrigatoriamente, a ser celebrado por escritura pública, como condição da sua validade, atento o que prescreve o art. 1143º do C.C.: o que não ocorreu no caso vertente;
XXX - Em consequência, o contrato de mútuo celebrado entre Apelante e Ré é nulo, por inobservância de formalidade ad substantiam, (cfr. arts. 1143º e 220º ambos do C.C.), o que se requer seja declarado, tanto mais que foi invocado em sede de Contestação por parte da Recorrente e é matéria de conhecimento oficioso deste Tribunal;
XXXI - A declaração de nulidade do mútuo, por falta de forma, tem como consequência a restituição, pelo mutuário, de tudo o que tiver sido prestado, nos termos do artº 289º nº 1 do C.C.;
XXXII - A declaração de nulidade do mútuo oneroso – como é o caso -, atinge, necessariamente, a convenção de juros acordada entre Apelante e Apelada;

ASSIM,
XXXIII - Deve considerar-se que as apuradas quantias já entregues pela Apelante à segunda Ré devem ser imputadas a restituição de capital, independentemente do título a que tenham sido feitas – como, designadamente, consta do documento nº 1 pela Recorrente junto com a sua Contestação;
XXXIV - Daí que, na alteração propugnada da decisão da matéria de facto, quanto ao artigo 34 e o inovador artigo 34-A dos factos provados, deva constar as expressões propostas para as respectivas redacções de ambos Por conta e para a restituição parcial da quantia referida em 32)…”;
XXXV - A Sentença recorrida padece de manifesto e demonstrado erro de julgamento, devendo ser alterada, quanto à decisão da matéria de facto, nos termos propugnados pela Apelante;
XXXVI - A Sentença recorrida violou os arts. 607º, nºs 4 e 5 do C.P.C. e os arts. 1143º, 220º e 289º ambos do C.C..”

Pugna a Recorrente pela procedência do recurso e, consequentemente, pela alteração da decisão da matéria de facto constante da Sentença recorrida nos termos por si expostos.
Os Autores apresentaram contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso interposto pela Ré Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A.
Relativamente ao lapso de cálculo aritmético referido pela Recorrente, cuja correcção requereu, para que na decisão recorrida passe a constar: “Esta documentação apenas atesta a entrega, pela W à autora, do valor de € 5.500,00”, foi proferido pelo Tribunal a quo o seguinte despacho: “A rectificação solicitada pela chamada reporta-se a uma referência feita na motivação da matéria de facto. Não afecta, nem o facto elencado no artigo pertinente [34)], nem qualquer segmento decisório.
Sem prejuízo, porque, efectivamente, a fls. 180 dos autos (1º parágrafo) se referiu € 4.500,00 em lugar de € 5.500,00, defiro o requerido nesta parte – art. 614º, nº 1, do CPC”.
O Tribunal a quo pronunciou-se ainda no sentido de não existirem nulidades, nem erros materiais, a suprir.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
***
II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso (artigo 639º do CPC).

As questões a decidir, tendo em conta o teor das conclusões formuladas pelos Recorrentes, são as seguintes:

A) Relativamente ao recurso interposto pela Ré Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A.:

1 - Saber se a sentença é nula nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil;
2 - Saber se houve erro no julgamento da matéria de facto relativamente ao ponto f) dos factos não provados e se deve ser aditado um novo ponto aos factos provados;
3 - Saber se houve erro na subsunção jurídica dos factos;

B) Relativamente ao recurso interposto pela Interveniente W – Sistemas Integrados, S.A:

1- Saber se houve erro no julgamento da matéria de facto relativamente ao ponto 34) dos factos provados e ao ponto h) dos factos não provados.
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III. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Os factos
Factos considerados provados em Primeira Instância:

1) Por escritura outorgada no Cartório Notarial de …, o X, SA, pessoa colectiva nº ........., matriculado na Conservatória do Registo Comercial ... sob o mesmo número, procedeu ao trespasse à Caixa ..., PCUP, pessoa colectiva nº ........., matriculada na Conservatória do Registo Comercial ... sob o mesmo número, do “estabelecimento comercial que constitui a universalidade de activos (intangíveis e fixos tangíveis) e passivos, nomeadamente, contratos de depósito, contratos de mútuo e, de uma forma geral, a totalidade dos direitos e obrigações de que é titular o trespassante no âmbito da sua actividade bancária”, tendo sido transmitida, pelo X S.A., à CAIXA ..., a qualidade de entidade depositária dos mencionados contratos, nos quais se incluem os referentes aos ora autores.
2)Em Julho de 2008, os ora autores eram clientes da Caixa ..., Agência de Pevidém, tendo sido abordados pela 2ª ré, M. J., à data gerente do Balcão de Vizela do X, que lhes sugeriu que abrissem uma conta no então X, o que lhes permitiria obter maior rentabilidade, designadamente mais juros.
3)Confiando nas informações que lhe foram transmitidas pela 2ª ré, os autores, em 11.07.2008, procederam à abertura da conta à ordem nº .........-1, no então X, Balcão de Vizela.
4)Em 14.07.2008 os autores procederam ao depósito da quantia de € 200.000,00, valor esse que foi aplicado numa conta de depósito a prazo associada à referida conta à ordem.
5)Até 15.07.2009, a conta a prazo referida em 4) rendeu juros no valor de € 12.673,61.
6)No ano 2010, o autor marido comunicou à 2ª ré que iria necessitar de movimentar a quantia de € 100.000,00 da conta a prazo para fazer face a despesas com a construção de uma nova casa.
7)Para o efeito, através da 2ª ré, requisitou os módulos de cheques nº ......45 (contendo os cheques nºs ......04 a ......08), nº ......05 (contendo os cheques nºs ......28 a ......37) e nº ......31 (contendo os cheques nºs ......66 a ......75).
8) Os autores procederam à emissão de todos os cheques constantes do módulo nº ......45, no montante total de € 51.630,00.
9)De igual modo, os autores procederam à emissão de todos os cheques constantes do módulo ......05, no montante total de € 60.498,27.
10) Os autores procederam também à emissão dos cheques nºs ......666 e ......67, nos valores de € 4.500,00 – em 10.08.2011 -e € 18.870,00 – em 11.09.2012 - respectivamente.
11) Após o referido em 7) a 10), dados os valores referidos em 4) e 5), a conta a prazo poderia estar provida, no mínimo, com o capital de € 77.174,73.
12) Os autores nunca deram qualquer indicação à 2ª ré ou a qualquer outro funcionário do Banco para aplicar os seus valores em produtos financeiros que não os depósitos a prazo e à ordem.
13) Em data não concretamente apurada, os autores solicitaram à segunda ré que procedesse à alteração da residência, o que a mesma, prontamente, se predispôs a fazer, tendo-se deslocado à oficina do autor marido para colher a assinatura dos documentos necessários.
14) Apesar da 2ª ré ter informado os autores que havia efectuado a alteração de residência, estes não receberam os extractos da sua conta.
15) Em Janeiro de 2017, o autor marido entrou em contacto com a 2ª ré, informando-a de que necessitava de colocar à ordem a quantia de € 10.000,00, uma vez que iria comprar um carro para a filha.
16) A 2ª ré informou o autor marido que transferiria a quantia de € 10.000,00 da conta a prazo para a conta à ordem.
17) Os autores procederam à emissão do cheque nº ......14, no valor de € 10.000,00, o qual foi emitido à ordem da Car... e destinado à compra de um veículo automóvel, tendo sido a segunda ré quem lhes colocou essa verba na conta sacada.
18) Em Agosto de 2018, os autores souberam que a sua conta tinha passado para o Balcão de Vila das Aves e estava saldada.
19) Os autores não deram instruções à 2ª ré e ou a qualquer outro trabalhador da 1ª ré no sentido de alteração do Balcão onde tinham as suas contas de Vizela para Vila das Aves.
20) Em 17.10.2018 foram facultados ao autor extractos da sua conta, tendo aquele constatado que a mesma foi palco de movimentos que os autores não reconhecem e nunca solicitaram, designadamente aplicações e resgates em títulos “Y Invest 2009”, e Unidades de Participação dos Fundos “Xrendimento”, “Xpredial” e “XFundo Mercados Emergentes”;
21) Os autores constataram também que a segunda ré, M. J., na qualidade de funcionária da primeira ré, Caixa ..., procedeu a uma transferência no valor de € 80.000,00, processada em 07.07.2011, por débito da conta à ordem nº ........-1, com a descrição “Tranf.via TARGET2-Dest:...”, sem o seu conhecimento ou autorização.
22) E ainda a transferência a crédito, no valor de € 10.020,00, proveniente de “M. T.”.
23) Com a consulta do extracto, os autores viram que a sua conta teve um movimento normal até 22.07.2009, mas, a partir daquela data, passou a ter um movimento intenso e anómalo, provocado pela segunda ré, M. J., que se aproveitou da relação de confiança que tinha com os autores, passando a utilizar aquela conta à ordem, nela efectuando aplicações financeiras, resgates de aplicações financeiras, depósitos e levantamentos sem o conhecimento daqueles.
24) Por força da movimentação das verbas que estavam depositadas nas contas tituladas pelos autores, os autores ficaram privados, pelo menos, € 67.174,73, resultante da diferença entre o valor referido em 11) e o valor referido em 17).
25) Por causa do referido em 24), os autores ficaram num permanente estado de preocupação e ansiedade, com o temor de não reaverem, ou de não saberem quando iriam reaver o seu dinheiro, o que lhes tem causado ansiedade, tristeza, dificuldades financeiras para gerir a sua vida, “stress”, indignação, perturbação do espírito e da motivação para viver e trabalhar, dificuldade em conciliar o sono e insónias.
26) A sociedade W Sistemas Integrados, S.A., dedica-se profissionalmente e com intuito lucrativo a instalações eléctricas e de sistemas integrados de áudio e vídeo profissional, de alarme e segurança e telecomunicações, aquecimento, ventilação, ar condicionado, refrigeração e comércio a retalho de instrumentos e artigos musicais, aparelhos de som, televisão e vídeo, edição e reprodução de gravações de som, produção, gestão, gestão e organização de espectáculos teatrais e musicais.
27) A W é cliente da Caixa ... (Caixa ...), tendo conta domiciliada na sua agência/balcão de Vizela.
28) O representante legal da W conheceu a segunda ré, M. J., quando esta prestava a sua actividade na identificada agência/balcão ao serviço da primeira ré.
29) Até 2018, a W e os autores não tiveram qualquer contacto entre si, directamente ou por interposta pessoa, designadamente pela segunda ré.
30) No ano de 2011, a W, cuja actividade é complementar da das empresas de construção civil, passou uma fase de dificuldades de liquidez e de tesouraria e estava a ser pressionada pelo Banco ..., do qual era também cliente, para regularizar um descoberto bancário, sob pena de comunicação do incumprimento ao Banco de Portugal.
31) Para resolver essa situação, a W contactou a Caixa ..., na pessoa da segunda ré, no sentido de obter um financiamento que lhe permitisse liquidar o descoberto de conta junto do Banco ....
32) Nessa ocasião, a ora segunda ré disponibilizou-se para facultar à W a quantia de € 80.000,00, desde que esta lhe pagasse juros à taxa de 5% ao ano.
33) Por conta da quantia referida em 32), a W entregou à segunda ré um piano vertical da marca Kawai, modelo K-3 M, de valor não concretamente apurado.
34) Mais procedeu aos seguintes depósitos na conta bancária da ora segunda ré: € 2.200,00, em 18.12.2015; € 1.000,00, em 11.09.2015; € 1.500,00, em 07.07.2016; € 800,00, em 08.04.2016.
35) Quando do movimento referente a transferência bancária, no montante de € 80.000,00, realizado no dia 07.07.2011, a W estava convicta que havia sido efectuada pela segunda ré com dinheiros próprios.
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Factos considerados não provados em Primeira Instância:

a) Que aquando do referido em 3) o depósito a prazo rendesse juros no valor de € 300,00/ano.
b) Que, tendo a 2ª ré tomado conhecimento de que um outro cliente seu procurava investidores, tenha sugerido aos autores um investimento que passaria pelo empréstimo à sociedade “W – Sistemas Integrados, S.A.” da quantia de € 80.000,00.
c) Que os autores tenham aceitado proceder como referido em b), mediante o recebimento de juros à taxa de 5%.
d) Que a segunda ré conhecesse o volume de facturação e a sustentabilidade da “W – Sistemas Integrados, S.A.”, bem como a sua capacidade para gerar meios financeiros para devolver a totalidade da quantia investida, pagando juros.
e) Que os autores alguma vez tenham dado indicação às rés para procederem aos investimentos referidos em 20).
f) Que a segunda ré tivesse efectivado a alteração de residência em e que os autores tivessem recebido os extractos bancários ao longo de todo o período compreendido entre a constituição da conta no X e o ano de 2018.
g) Que o valor do piano fosse de € 6.808,00.
h) Que a W tenha entregado várias quantias à segunda ré, em mão.
i) Que as quantias referidas em 34) tenham sido entregues aos autores.
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3.2. Da nulidade da sentença

Conforme supra delimitamos é objecto do presente recurso aferir da nulidade da decisão recorrida.
De facto, sustenta a Recorrente Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A. que a decisão recorrida é nula nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil.
Vejamos.

Dispõe o n.º 1 do referido artigo 615º que:

1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido”.

Começamos por precisar que as decisões judiciais podem encontrar-se viciadas por causas distintas, sendo a respectiva consequência também diversa: se existe erro no julgamento dos factos e do direito, a respectiva consequência é a revogação, se foram violadas regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou que respeitam ao conteúdo e limites do poder à sombra do qual são decretadas, são nulas nos termos do referido artigo 615º.
As causas de nulidade taxativamente enumeradas no artigo 615º não visam o chamado erro de julgamento e nem a injustiça da decisão, ou tão pouco a não conformidade dela com o direito aplicável, sendo coisas distintas, mas muitas vezes confundidas pelas partes, a nulidade da sentença e o erro de julgamento, traduzindo-se este numa apreciação da questão em desconformidade com a lei.
Não deve por isso confundir-se o erro de julgamento com os vícios que determinam as nulidades em causa.
A nulidade prevista na alínea c) pressupõe que os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Esta nulidade está relacionada com a obrigação imposta pelos artigos 154º e 607º, n.ºs 3 e 4, ambos do Código de Processo Civil, do juiz fundamentar as suas decisões e com o facto de se exigir que a decisão judicial constitua um silogismo lógico-jurídico, em que a decisão final seja a consequência ou conclusão lógica da aplicação da norma legal aos factos.
Por outras palavras, “os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, funcionam na estrutura expositiva e argumentativa em que se traduz a sentença, como premissas lógicas necessárias para a formação do silogismo judiciário”. Logo, “constituirá violação das regras necessárias à construção lógica da sentença que os fundamentos da mesma conduzam logicamente a conclusão diferente da que na mesma resulta enunciada” (Acórdão da Relação de Guimarães, de 14/05/2015, Processo nº 414/13.6TBVVD.G; no mesmo sentido, Acórdão da Relação de Coimbra, de 11/01/1994, Cardoso Albuquerque, BMJ nº 433, pg. 633, onde se lê que “entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica pelo que se, na fundamentação da sentença, o julgador segue determinada linha de raciocínio apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decide em sentido divergente, ocorre tal oposição”; e ainda, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 13/02/1997, e de 22/06/1999, BMJ nº 464, página 524 e CJ, 1999, Tomo II, página 160, respectivamente).
Quanto a esta questão parece-nos de linear clareza que a Ré não tem a razão, pois que não vislumbra que se verifique contradição entre os fundamentos e a decisão, e nem qualquer ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível.
Sustenta a Recorrente que se deve ter em consideração a transferência da quantia de €10.000,00 ocorrida em janeiro de 2017 e que ao desconsiderar tal transferência a sentença recorrida incorre em nulidade; contudo, tal questão prende-se com a existência de eventual erro no julgamento, cuja consequência, a verificar-se, será a revogação, e não com a nulidade da sentença.
Não se verifica pois a invocada nulidade da decisão recorrida prevista na alínea c) do n.º 1 do referido artigo 615º, improcedendo desde já, e nessa parte, o recurso interposto pela Ré Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A..
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3.3. Da modificabilidade da decisão de facto

Os recursos interpostos pela Ré Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A. e pela Interveniente W – Sistemas Integrados, S.A visam a reapreciação da decisão de facto.
Decorre do n.º 1 do artigo 662º do Código de Processo Civil que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
E a impugnação da decisão sobre a matéria de facto é expressamente admitida pelo artigo 640º, n.º 1 do Código de Processo Civil, segundo o qual o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, os concretos meios de prova, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre essas questões de facto.
Incumbe à Relação, como se pode ler no acórdão deste Tribunal de 7/04/2016 (disponível em www.dgsi.pt) “enquanto tribunal de segunda instância, reapreciar, não só se a convicção do tribunal a quo tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova e os outros elementos constantes dos autos revelam, mas também avaliar e valorar (de acordo com o princípio da livre convicção) toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objecto de impugnação, modificando a decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento na matéria de facto”.
Não nos podemos aqui esquecer da aplicação dos princípios gerais da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova, sendo certo que o juiz da 1ª Instância, perante o qual a prova é produzida, está em posição privilegiada para proceder à sua avaliação, e, designadamente, surpreender no comportamento das testemunhas elementos relevantes para aferir da espontaneidade e credibilidade dos depoimentos que frequentemente não transparecem da gravação.
Assim, a alteração da matéria de facto só deve pois ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando este conclua, com a necessária segurança, que a prova produzida aponta em sentido diverso e impõe uma decisão diferente da que foi proferida em 1ª instância.
Como salienta Ana Luísa Geraldes (Ob. Cit. página 609) “Em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte”.
Tendo por base tais considerandos analisemos então os argumentos dos Recorrentes.
*
A) Do recurso interposto pela Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A.:

Sustenta a Recorrente que houve erro no julgamento quanto ao ponto f) dos factos não provados e que deve ser aditado um ponto aos factos provados (depois de 12) e antes de 13) onde de dê por assente que “O A. desde 14/07/2008, data da abertura da conta e até mudar de residência, em finais de Julho de 2011, recebeu extratos da 2.ª R., tendo aberto alguns, não concretamente apurados” e alterada a redação do referido ponto f) para que o mesmo passe a ter a seguinte redacção: “Que a segunda ré tivesse efetivado a alteração de residência e que os autores tivessem recebido os extractos bancários depois dessa alteração de residência, em finais de Julho de 2011.”

O referido ponto da matéria de facto não provada tem a seguinte redacção:

“Que a segunda ré tivesse efectivado a alteração de residência em e que os autores tivessem recebido os extractos bancários ao longo de todo o período compreendido entre a constituição da conta no X e o ano de 2018”.
A discordância da Recorrente prende-se no essencial com o recebimento dos extractos pelos Autores no período anterior à sua alteração de residência.
Sustenta a Recorrente, invocando em particular o depoimento do próprio Autor, que resulta demonstrado que até à mudança de residência, ocorrida por volta de finais de julho de 2011, o Autor recebeu as cartas que o banco lhe enviava com os extractos bancários.
Vejamos.
Resulta do depoimento do Autor que efectivamente recebia as cartas do banco antes de ter mudado de residência, o que terá ocorrido em julho de 2011, e que depois nunca mais recebeu correspondência do banco.
Também na motivação constante da sentença recorrida consta que “(…) o funcionamento destes esquemas mirabolantes empreendidos pela segunda ré no Banco onde trabalhava também não seria possível se, do outro lado, não estivesse alguém com as características do autor, que não desconfiava do facto de os extractos não lhe chegarem a casa, nem se dava trabalho de olhar bem para os que chegou a receber, designadamente antes de mudar de residência, como o próprio referiu em julgamento”.
Pelo Tribunal a quo foi julgado provado que em data não concretamente apurada, os Autores solicitaram à segunda Ré que procedesse à alteração da residência, o que a mesma, prontamente, se predispôs a fazer, tendo-se deslocado à oficina do Autor marido para colher a assinatura dos documentos necessários (ponto 13 dos factos provados) e que apesar da 2ª Ré ter informado os Autores que havia efectuado a alteração de residência, estes não receberam os extractos da sua conta (ponto 14 dos factos provados).
Do exposto decorre que o próprio Autor reconheceu ter recebido as “cartas do banco” até ter mudado de residência e não ter recebido mais correspondência daquele após tal mudança.
Assim, e em conformidade, justifica aditar-se um novo ponto à matéria de facto que passará a ser o 14-A) e terá a seguinte redacção: “14-A) Os Autores desde a data da abertura da conta e até a alteração de residência, em Julho de 2011, receberam extratos da sua conta”; devendo ainda ser alterado o ponto f) dos factos não provados para que passe a ter a seguinte redacção: “f) Que a segunda ré tivesse efetivado a alteração de residência”, pois que, o facto de os Autores não terem recebido os extractos depois dessa alteração consta já dos factos provados (ponto 14).
***
B) Relativamente ao recurso interposto pela Interveniente W – Sistemas Integrados, S.A:

Sustenta a Interveniente que houve erro no julgamento quanto ao ponto 34) dos factos provados e ao ponto h) dos factos não provados.

O ponto 34) tem a seguinte redacção:

“34) Mais procedeu aos seguintes depósitos na conta bancária da ora segunda ré: € 2.200,00, em 18.12.2015; € 1.000,00, em 11.09.2015; € 1.500,00, em 07.07.2016; € 800,00, em 08.04.2016”.
Quanto a esta matéria sustenta a Recorrente que devia ser outra a redacção e passar a constar o seguinte: “Por conta e para a restituição parcial da quantia referida em 32), a W entregou à segunda Ré, por meio de depósitos por si efectuados na conta bancária daquela, as seguintes quantias: € 2.200,00, em 18.12.2015; € 1.000,00, em 11.09.2015; € 1.500,00, em 07.07.2016; € 800,00, em 08.04.2016.”
A discordância da Recorrente consiste no essencial em fazer constar a menção a que os referidos depósitos foram por conta e para restituição da quantia de €80.000,00.

Porém, tal menção expressa mostra-se desnecessária no contexto de toda a factualidade jugada provada pelo Tribunal a quo nos artigos 32) a 35), onde consta que:

“32) Nessa ocasião, a ora segunda ré disponibilizou-se para facultar à W a quantia de € 80.000,00, desde que esta lhe pagasse juros à taxa de 5% ao ano.
33) Por conta da quantia referida em 32), a W entregou à segunda ré um piano vertical da marca Kawai, modelo K-3 M, de valor não concretamente apurado.
34) Mais procedeu aos seguintes depósitos na conta bancária da ora segunda ré: € 2.200,00, em 18.12.2015; € 1.000,00, em 11.09.2015; € 1.500,00, em 07.07.2016; € 800,00, em 08.04.2016.
35) Quando do movimento referente a transferência bancária, no montante de € 80.000,00, realizado no dia 07.07.2011, a W estava convicta que havia sido efectuada pela segunda ré com dinheiros próprios”.

De facto, o ponto 34) tem de ser entendido na sequência do que consta no ponto 33): por conta da quantia em causa a W entregou o piano e mais procedeu aos depósitos ali elencados na conta bancária.
Não se vislumbra, por isso, interesse na alteração da redacção do ponto 34) dos factos provados.

Quanto ao facto dado como não provado na alínea h) da matéria de facto, entende a Recorrente que deve ser dado como provado, sugerindo o aditamento do ponto 34-A) e a alteração da redacção da alínea h), bem como d alínea i), nos seguintes termos:
“34-A) Por conta e para a restituição parcial da quantia referida em 32), a W entregou à segunda Ré, por meio de numerário e em mão, as seguintes quantias: 3.000,00 €, no ano de 2012; 5.000,00 €, no ano de 2013; 5.000,00 €, no ano de 2014; 1.000,00 €, no ano de 2015”;
“h) Que, para além das quantias mencionadas no artigo 34-A dos factos provados, a W tenha entregado mais quaisquer quantias à segunda ré, em mão”;
“i) Que as quantias referidas em 34) e em 34-A) tenham sido entregues aos autores”.
Entende a Recorrente que deve dar-se como provada a entrega por si de numerário e em mão, as seguintes quantias: 3.000,00 €, no ano de 2012; 5.000,00 €, no ano de 2013; 5.000,00 €, no ano de 2014; 1.000,00 €, no ano de 2015, fazendo apelo ao depoimento da Ré M. J., ao depoimento do seu legal representante e aos documentos por si juntos, em particular o documento de fls. 137 (pois que os demais se reportam aos depósitos bancários).
O Tribunal a quo entendeu que da factualidade dada como não provada sob as alíneas d), f), h) e i) não se fez prova minimamente sólida, julgando não provado que a Recorrente tenha entregado várias quantias em mão à Ré M. J.; e quanto ao documento de fls. 137 consignou que “nada prova, já que foi unilateralmente elaborado, não está assinado e não foi corroborado por elementos probatórios minimamente sólidos. Ademais, foi impugnado pelos autores (vd. fls. 144) e pelo Caixa ... (vd. fls. 146)”.
De facto, o documento em causa por si só não prova as entregas em numerário e em mão, designadamente nos montantes que do mesmo constam, pois para além de ter sido unilateralmente elaborado, não foi corroborado por elementos probatórios minimamente sólidos, pois mesmo a considerar-se o depoimento prestado pela Ré M. J. os valores não têm qualquer correspondência; acrescentamos apenas que para além de impugnado pelos Autores e pelo Réu Caixa ..., foi também impugnado pela Ré M. J..
Reconhece a Recorrente que as declarações da Ré não têm valor confessório, mas entende que tendo valor probatório, sujeito à livre apreciação do tribunal, devem concorrer para a formação da convicção do tribunal no sentido de confirmarem que a Interveniente entregou à Ré M. J. quantias em mão, ainda que se mantenha como não provado que a Ré as não entregou aos Autores, não interferindo, por isso, na decisão de mérito proferida, antes relevando para efeitos da posição da Recorrente numa futura acção.
De facto, a Ré M. J. reconheceu expressamente no seu depoimento ter recebido da Interveniente quantias em mão e em depósitos, tendo afirmado que esta pagou de 2012 a 2015 cerca de €20.000,00, e pretendendo ainda ter entregue também ao Autor tal quantia correspondendo a €5.000,00 por ano, a título de juros, não obstante afirmar que a taxa de juro era de 5%. A tese da Ré não mereceu (e bem) credibilidade por parte do Tribunal a quo que considerou por não ter resultado demonstrado que aquela tivesse efectivamente entregue ao Autor a quantia de €5.000,00 a título de juros, ou qualquer outra quantia, até porque a taxa de 5% que referiu (e que foi confirmada pelo legal representante da Interveniente) corresponderia a um valor de juros de €4.000,00, não se percebendo a que titulo teria entregue em cada um dos referidos anos ao Autor a quantia de €5.000,00.
Porém, não podemos deixar de relevar as suas declarações quando expressamente reconheceu que a Interveniente lhe pagou nos anos de 2012 a 2015 a quantia de €20.000,00, o que interessa efectivamente à Interveniente para efeitos de apurar o valor eventualmente em divida para com a Ré M. J. uma vez que reconhece que esta lhe emprestou a quantia de €80.000,00 e que ainda não liquidou a totalidade do valor.
Assim, considerando os valores que a Interveniente alega ter entregue em numerário à Ré M. J. em cada um dos referidos anos, os valores reconhecidos por esta como lhe tendo sido entregues e o peticionado pela Recorrente, será efectivamente de aditar o seguinte ponto à matéria de facto provada:
“34-A) Por conta da quantia referida em 32), a W entregou ainda à segunda Ré, por meio de numerário e em mão, a quantia de €3.000,00 no ano de 2012, €5.000,00 no ano de 2013; €5.000,00 no ano de 2014 e €1.000,00 no ano de 2015”.

Devendo ainda alterar-se, no sentido da coerência na matéria de facto julgada provada e não provada, a redacção das alíneas h) e i) dos factos não provados no sentido pretendido pela Recorrente para que passe a constar:
“h) Que, para além das quantias mencionadas no artigo 34-A dos factos provados, a W tenha entregado quaisquer outras quantias à segunda ré, em mão;
i) Que as quantias referidas em 34) e em 34-A) tenham sido entregues aos autores”.
Procede, desta forma, ainda que parcialmente o recurso da Interveniente.
Entendemos ainda que, em face da factualidade provada, e estando em causa apurar do valor da indemnização devida aos Autores a título de danos patrimoniais, deverá ainda alterar-se a redacção do ponto 22) para que passe ainda a constar a data da transferência a crédito:
“22) E ainda a transferência a crédito em 10/01/2017, no valor de €10.020,00, proveniente de “M. T.”.
*
Passará, assim a matéria de facto a ter a seguinte formulação:

I. Factos Provados

1) Por escritura outorgada no Cartório Notarial de Lisboa, o X, SA, pessoa colectiva nº ........., matriculado na Conservatória do Registo Comercial ... sob o mesmo número, procedeu ao trespasse à Caixa ..., PCUP, pessoa colectiva nº ........., matriculada na Conservatória do Registo Comercial ... sob o mesmo número, do “estabelecimento comercial que constitui a universalidade de activos (intangíveis e fixos tangíveis) e passivos, nomeadamente, contratos de depósito, contratos de mútuo e, de uma forma geral, a totalidade dos direitos e obrigações de que é titular o trespassante no âmbito da sua actividade bancária”, tendo sido transmitida, pelo X S.A., à Caixa ..., a qualidade de entidade depositária dos mencionados contratos, nos quais se incluem os referentes aos ora autores.
2)Em Julho de 2008, os ora autores eram clientes da Caixa ..., Agência de Pevidém, tendo sido abordados pela 2ª ré, M. J., à data gerente do Balcão de Vizela do X, que lhes sugeriu que abrissem uma conta no então X, o que lhes permitiria obter maior rentabilidade, designadamente mais juros.
3)Confiando nas informações que lhe foram transmitidas pela 2ª ré, os autores, em 11.07.2008, procederam à abertura da conta à ordem nº .........-1, no então X, Balcão de Vizela.
4)Em 14.07.2008 os autores procederam ao depósito da quantia de € 200.000,00, valor esse que foi aplicado numa conta de depósito a prazo associada à referida conta à ordem.
5)Até 15.07.2009, a conta a prazo referida em 4) rendeu juros no valor de € 12.673,61.
6)No ano 2010, o autor marido comunicou à 2ª ré que iria necessitar de movimentar a quantia de € 100.000,00 da conta a prazo para fazer face a despesas com a construção de uma nova casa.
7)Para o efeito, através da 2ª ré, requisitou os módulos de cheques nº ......45 (contendo os cheques nºs ......04 a ......08), nº ......05 (contendo os cheques nºs ......28 a ......37) e nº ......31 (contendo os cheques nºs ......66 a ......75).
8) Os autores procederam à emissão de todos os cheques constantes do módulo nº ......45, no montante total de € 51.630,00.
9)De igual modo, os autores procederam à emissão de todos os cheques constantes do módulo ......05, no montante total de € 60.498,27.
10) Os autores procederam também à emissão dos cheques nºs ......666 e ......67, nos valores de € 4.500,00 – em 10.08.2011 -e € 18.870,00 – em 11.09.2012 - respectivamente.
11) Após o referido em 7) a 10), dados os valores referidos em 4) e 5), a conta a prazo poderia estar provida, no mínimo, com o capital de € 77.174,73.
12) Os autores nunca deram qualquer indicação à 2ª ré ou a qualquer outro funcionário do Banco para aplicar os seus valores em produtos financeiros que não os depósitos a prazo e à ordem.
13) Em data não concretamente apurada, os autores solicitaram à segunda ré que procedesse à alteração da residência, o que a mesma, prontamente, se predispôs a fazer, tendo-se deslocado à oficina do autor marido para colher a assinatura dos documentos necessários.
14) Apesar da 2ª ré ter informado os autores que havia efectuado a alteração de residência, estes não receberam os extractos da sua conta.
14-A) Os Autores desde a data da abertura da conta e até a alteração de residência, em Julho de 2011, receberam extratos da sua conta.
15) Em Janeiro de 2017, o autor marido entrou em contacto com a 2ª ré, informando-a de que necessitava de colocar à ordem a quantia de € 10.000,00, uma vez que iria comprar um carro para a filha.
16) A 2ª ré informou o autor marido que transferiria a quantia de € 10.000,00 da conta a prazo para a conta à ordem.
17) Os autores procederam à emissão do cheque nº ......14, no valor de € 10.000,00, o qual foi emitido à ordem da Car... e destinado à compra de um veículo automóvel, tendo sido a segunda ré quem lhes colocou essa verba na conta sacada.
18) Em Agosto de 2018, os autores souberam que a sua conta tinha passado para o Balcão de Vila das Aves e estava saldada.
19) Os autores não deram instruções à 2ª ré e ou a qualquer outro trabalhador da 1ª ré no sentido de alteração do Balcão onde tinham as suas contas de Vizela para Vila das Aves.
20) Em 17.10.2018 foram facultados ao autor extractos da sua conta, tendo aquele constatado que a mesma foi palco de movimentos que os autores não reconhecem e nunca solicitaram, designadamente aplicações e resgates em títulos “Y Invest 2009”, e Unidades de Participação dos Fundos “Xrendimento”, “Xpredial” e “XFundo Mercados Emergentes”;
21) Os autores constataram também que a segunda ré, M. J., na qualidade de funcionária da primeira ré, Caixa ..., procedeu a uma transferência no valor de € 80.000,00, processada em 07.07.2011, por débito da conta à ordem nº ........-1, com a descrição “Tranf.via TARGET2-Dest:...”, sem o seu conhecimento ou autorização.
22) E ainda a transferência a crédito em 10/01/2017, no valor de €10.020,00, proveniente de “M. T.”.
23) Com a consulta do extracto, os autores viram que a sua conta teve um movimento normal até 22.07.2009, mas, a partir daquela data, passou a ter um movimento intenso e anómalo, provocado pela segunda ré, M. J., que se aproveitou da relação de confiança que tinha com os autores, passando a utilizar aquela conta à ordem, nela efectuando aplicações financeiras, resgates de aplicações financeiras, depósitos e levantamentos sem o conhecimento daqueles.
24) Por força da movimentação das verbas que estavam depositadas nas contas tituladas pelos autores, os autores ficaram privados, pelo menos, € 67.174,73, resultante da diferença entre o valor referido em 11) e o valor referido em 17).
25) Por causa do referido em 24), os autores ficaram num permanente estado de preocupação e ansiedade, com o temor de não reaverem, ou de não saberem quando iriam reaver o seu dinheiro, o que lhes tem causado ansiedade, tristeza, dificuldades financeiras para gerir a sua vida, “stress”, indignação, perturbação do espírito e da motivação para viver e trabalhar, dificuldade em conciliar o sono e insónias.
26) A sociedade W Sistemas Integrados, S.A., dedica-se profissionalmente e com intuito lucrativo a instalações eléctricas e de sistemas integrados de áudio e vídeo profissional, de alarme e segurança e telecomunicações, aquecimento, ventilação, ar condicionado, refrigeração e comércio a retalho de instrumentos e artigos musicais, aparelhos de som, televisão e vídeo, edição e reprodução de gravações de som, produção, gestão, gestão e organização de espectáculos teatrais e musicais.
27) A W é cliente da Caixa ... (Caixa ...), tendo conta domiciliada na sua agência/balcão de Vizela.
28) O representante legal da W conheceu a segunda ré, M. J., quando esta prestava a sua actividade na identificada agência/balcão ao serviço da primeira ré.
29) Até 2018, a W e os autores não tiveram qualquer contacto entre si, directamente ou por interposta pessoa, designadamente pela segunda ré.
30) No ano de 2011, a W, cuja actividade é complementar da das empresas de construção civil, passou uma fase de dificuldades de liquidez e de tesouraria e estava a ser pressionada pelo Banco ..., do qual era também cliente, para regularizar um descoberto bancário, sob pena de comunicação do incumprimento ao Banco de Portugal.
31) Para resolver essa situação, a W contactou a Caixa ..., na pessoa da segunda ré, no sentido de obter um financiamento que lhe permitisse liquidar o descoberto de conta junto do Banco ....
32) Nessa ocasião, a ora segunda ré disponibilizou-se para facultar à W a quantia de € 80.000,00, desde que esta lhe pagasse juros à taxa de 5% ao ano.
33) Por conta da quantia referida em 32), a W entregou à segunda ré um piano vertical da marca Kawai, modelo K-3 M, de valor não concretamente apurado.
34) Mais procedeu aos seguintes depósitos na conta bancária da ora segunda ré: € 2.200,00, em 18.12.2015; € 1.000,00, em 11.09.2015; € 1.500,00, em 07.07.2016; € 800,00, em 08.04.2016.
34-A) Por conta da quantia referida em 32), a W entregou ainda à segunda Ré, por meio de numerário e em mão, a quantia de €3.000,00 no ano de 2012, €5.000,00 no ano de 2013; €5.000,00 no ano de 2014 e €1.000,00 no ano de 2015.
35) Quando do movimento referente a transferência bancária, no montante de € 80.000,00, realizado no dia 07.07.2011, a W estava convicta que havia sido efectuada pela segunda ré com dinheiros próprios.
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Factos considerados não provados em Primeira Instância:

a) Que aquando do referido em 3) o depósito a prazo rendesse juros no valor de € 300,00/ano.
b) Que, tendo a 2ª ré tomado conhecimento de que um outro cliente seu procurava investidores, tenha sugerido aos autores um investimento que passaria pelo empréstimo à sociedade “W – Sistemas Integrados, S.A.” da quantia de € 80.000,00.
c) Que os autores tenham aceitado proceder como referido em b), mediante o recebimento de juros à taxa de 5%.
d) Que a segunda ré conhecesse o volume de facturação e a sustentabilidade da “W – Sistemas Integrados, S.A.”, bem como a sua capacidade para gerar meios financeiros para devolver a totalidade da quantia investida, pagando juros.
e) Que os autores alguma vez tenham dado indicação às rés para procederem aos investimentos referidos em 20).
f) Que a segunda ré tivesse efetivado a alteração de residência.
g) Que o valor do piano fosse de € 6.808,00.
h) Que, para além das quantias mencionadas no artigo 34-A dos factos provados, a W tenha entregado quaisquer outras quantias à segunda ré, em mão.
i) Que as quantias referidas em 34) e em 34-A) tenham sido entregues aos autores.
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3.3. Reapreciação da decisão de mérito da acção

No que se refere especificamente à decisão jurídica da causa, e considerando a alteração no quadro factual julgado provado e não provado, importa agora apreciar se a mesma será de manter e se se mostra adequada e correcta face à factualidade apurada e aos normativos aplicáveis, analisando agora o erro de julgamento invocado pela Recorrente Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A. quanto ao valor da indemnização devida a título de danos patrimoniais e que se considerou não constituir qualquer nulidade da sentença.
Importa ainda precisar, quanto ao recurso da Interveniente, que atenta a posição que assume nos presentes autos não cumpre aqui apreciar e nem qualificar juridicamente a relação que estabeleceu com a Ré M. J. e nem a validade do contrato que celebraram, extravasando, por isso, dos autos a declaração de nulidade do mesmo ou se as quantias entregues devem ser imputadas a título de capital, até porque como bem reconhece nas suas alegações (cfr. conclusão XV) não poderia resultar a sua condenação nestes autos, não sendo sujeito da relação jurídica debatida entre os Autores e as Rés.
Analisemos então os demais argumentos da Recorrente Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A.
Em primeiro lugar importa referir que não vem questionado nos autos que a relação jurídica estabelecida entre os Autores e a Recorrente se iniciou com a abertura da conta, com a celebração do contrato de depósito de disponibilidades monetárias e que este vem sendo maioritariamente qualificado na doutrina e na jurisprudência como um depósito irregular, tal como considerado na decisão recorrida.
Não questiona também a Recorrente Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A. a sua obrigação de indemnizar os Autores, na qualidade de comitente, por danos patrimoniais.
Sustenta, contudo, que em face dos factos julgados provados inexistem fundamentos de facto e de direito que suportem a sua condenação a indemnizar os Autores por danos patrimoniais em valor superior a €67.174,73, ou no limite €69.680,00 de capital, sem prejuízos de juros.
E questiona ainda a existência de pressupostos de direito que justifiquem a sua condenação a indemnizar os Autores por danos não patrimoniais.
Vejamos.
A Ré M. J., à data dos factos, era a gerente do Balcão de Vizela do X, e foi ela que abordou os Autores em Julho de 2008, para abrirem a conta, o que lhes permitiria obter maior rentabilidade, designadamente mais juros.
Conforme decorre do artigo 165º do Código Civil (de ora em dante designado apenas por CC) as pessoas colectivas respondem civilmente pelos actos ou omissões dos seus representantes, agentes ou mandatários nos mesmos termos em que os comitentes respondem pelos actos ou omissões dos seus comissários.
E o artigo 500º (responsabilidade do comitente) do CC preceitua que aquele que encarrega outrem de qualquer comissão responde, independentemente de culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaia também a obrigação de indemnizar (n.º 1), que a responsabilidade do comitente só existe se o facto danoso for praticado pelo comissário, ainda que intencionalmente ou contra as instruções daquele, no exercício da função que lhe foi confiada (n.º 2) e que o comitente que satisfizer a indemnização tem o direito de exigir do comissário o reembolso de tudo quanto haja pago, excepto se houver também culpa da sua parte; neste caso será aplicável o disposto no n.º 2 do artigo 497º.
A este propósito afirma-se (e bem) na sentença recorrida que “Apesar de ter sido a segunda ré quem levou a cabo a actuação culposa (já que podia e devia ter actuado de outra forma, praticando apenas os actos convencionados ou autorizados pelos autores) e danosa, a primeira ré, Caixa …, responde pelos danos causados aos autores, ainda que não se tenha apurado a sua culpa (seria uma culpa in elegendo, in instruendo ou in vigilando, que não foi sequer alegada). Isto porque, a responsabilidade do agente prescinde, por vezes e em certos termos, da culpa do lesante. Não exige sequer a ilicitude da conduta. É o que sucede nos casos de responsabilidade do comitente. (…) Não importa, por conseguinte, que o comissário actue intencionalmente contra as instruções do comitente. Desde que os actos danosos se compreendam no quadro geral da competência ou dos poderes conferidos ao comissário, o comitente responderá”.
Assente que sobre a Recorrente, na qualidade de comitente, recai a obrigação de indemnizar os Autores por danos patrimoniais (o que a mesma não questiona) vejamos então se o montante dessa indemnização deve ser fixado em €80.000,00, acrescida dos juros, ou em €67.174,73 ou ainda em €69.980,00 conforme pretende a Recorrente.
O Tribunal a quo entendeu, quanto ao valor concreto da perda dos Autores, que não tendo sido possível apurar, com rigor, o que foi sendo disponibilizado a título de rendimento ou capital, deveria atender-se como critério ao montante de €80.000,00, correspondente à última verba utilizada pela segunda Ré, e que emprestou à W, por não haver dúvidas de que os Autores nessa data tinham pelo menos esse valor em conta, contabilizando os juros desde 07/07/2011.
Também nós entendemos que considerar o montante de €80.000,00, que a Ré M. J. utilizou para emprestar à W e cuja transferência foi processada em 07/07/2011, é o critério mais seguro, por não se suscitarem dúvidas que nessa data a conta dos Autores se encontrava provida pelo menos com essa quantia (e dizemos pelo menos pois conforme consta do ponto 10) dos factos provados, após a data da transferência da quantia de €80.000,00 em 07/07/2011, os Autores procederam ainda à emissão de dois cheques nos valores de €4.500,00 e €18.870,00, respectivamente em 10/08/2011 e 11/09/2012, o que indicia efetivamente que a conta poderia estar provida com quantia superior) e deixou de a ter.
É certo que no ponto 11) consta que após os movimentos elencados em 7) a 10), e tendo por base a soma do valor de €200,000,00 que os Autores depositaram em 14/07/2008 e dos juros que rendeu até 15/07/2009 no montante de €12.673,61, a conta a prazo poderia estar provida, no mínimo, com o capital de €77.174,73; mas este valor considera o movimento dos referidos cheques de 10/08/2011 e 11/09/2012, posteriores à transferência, e desconsidera qualquer outro rendimento, pois apenas tem em consideração os juros do primeiro ano, tal como expressamente é salientado na motivação da sentença recorrida.
E o ponto 24), onde consta que os Autores ficaram privados de pelo menos €67.174,73, é apenas a constatação da diferença entre o referido valor, que como já vimos desconsidera qualquer outro rendimento para além dos juros do primeiro ano, e o valor de €10.000,00 do cheque emitido pelos Autores para pagamento de um veículo automóvel, por ter sido a Ré a colocar tal quantia na conta dos Autores.
Temos assim como certo o critério seguido pelo Tribunal a quo por ser efectivamente, e não tendo sido possível apurar, com rigor, o que foi sendo disponibilizado a título de rendimento ou capital, o critério mais seguro, uma vez que não se suscitam dúvidas que em 07/07/2011 a conta dos Autores estava provida com pelo menos €80.000,00 e que deixou de o estar.
Contudo, entendemos que assiste razão à Recorrente quando sustenta que a esse valor deve ser deduzido o de €10.020,00 da transferência a crédito efectuada para a conta dos Autores pela Ré M. J., ainda que da conta de um terceiro, o que é do conhecimento dos Autores, tanto mais que, como se reconhece na sentença recorrida o Banco, Recorrente, teve depois de repor essa quantia na conta do cliente terceiro.
Conforme decorre dos factos provados os Autores constataram que Ré M. J., na qualidade de funcionária da Ré Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A., procedeu à transferência de €80.000,00 por débito, sem o seu conhecimento ou autorização, e ainda à transferência a crédito, no valor de €10.020,00, proveniente de “M. T.”, ficando dessa forma a sua conta provisionada com esta quantia de forma a que o cheque por si emitido para pagamento do veiculo automóvel obteve pagamento.
Assim, devem as Rés ser condenadas a pagar aos Autores a quantia de €69.980,00, acrescida de juros de mora à taxa de 4% contados desde 10/01/2017, mas também no pagamento dos juros de mora à taxa de 4% contados desde 07/07/2011 e até 09/01/2017 sobre a quantia de €80.000,00, sem prejuízo da limitação do total ao valor peticionado na alínea a) do petitório, alterando-se a sentença recorrida em conformidade (nos termos do disposto no artigo 634º n.º 2 alínea c) do Código de Processo Civil o recurso aproveita à Ré M. J. por estar em causa condenação como devedores solidários, e o recurso não respeitar unicamente à pessoa do recorrente).
A Recorrente Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A. questiona ainda a existência de pressupostos de direito que justifiquem a sua condenação a indemnizar os Autores por danos não patrimoniais.
Sustenta para o efeito que o Autor ao longo da relação comercial que estabeleceu com o banco se demitiu das suas obrigações de cliente e que a sua incúria contribuiu para viabilizara realização das operações levadas a cabo pela Ré M. J.; caracteriza a conduta do Autor como imprudente e completamente injustificada e desajustada em face da diligência exigível ao “bom pai de família”, ao homem médio, entendendo que a sua condenação a pagar uma indemnização por danos não patrimoniais viola os artigos 570º e 799º do CC.
O artigo 570º do CC preceitua que quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída (n.º 1), sendo que se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar (n.º 2).
O artigo 799º do CC respeita à presunção de culpa e sua apreciação desta, dispondo que incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua (n.º 1) e que a culpa é apreciada nos termos aplicáveis à responsabilidade civil (n.º 2).
A este propósito considerou-se na sentença recorrida, quanto ao Autor, que “a sua incúria - na (não) análise dos extractos e/ou não reclamação pelo não recebimento dos mesmos -não conduz à aplicação do art. 570º do CC. Pois se é certo que a segunda ré apenas procedeu nos termos acima referidos porque percebeu que aquele cliente não iria detectar os movimentos na sua conta, sabendo e querendo agir contra a sua vontade e o teor do contrato, não haverá qualquer dúvida de que actuou dolosamente. Ora, tendo em conta que é com base nas circunstâncias do caso concreto que se afere da pertinência da aplicação do art. 570º do CC, o simples facto de a segunda ré ter actuado com dolo basta à exclusão de qualquer co-responsabilização do autor – vd., a este propósito, VAZ SERRA, in: BMJ nº 86, p. 139”.
Também nós perfilhamos o mesmo entendimento, isto é, que no caso concreto não tem aplicação o referido artigo 570º do CC.
A este propósito cabe desde logo salientar que, a haver concorrência, seria entre dolo e culpa.
Vaz Serra (BMJ n.º 86, páginas 138 a 140) afirma efectivamente que se o dolo for do prejudicado não pode o mesmo exigir indemnização ao causador do dano simultaneamente culposo, e que se o dolo for do causador do dano, a culpa do prejudicado pode ou não, consoante a sua gravidade, ser tida em conta, visto que aquele dolo não basta para esta culpa ser havida por inexistente, mas quando o responsável procedeu com dolo, parece que a simples culpa do prejudicado não deve, em regra, ter influência, cabendo ao juiz ponderar a gravidade das respectivas culpas, para decidir se deve reduzir a indemnização, não a reduzir ou afastá-la.
Antunes Varela (apud Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15/12/2011, Relator Conselheiro Salazar Casanova, www.dgsi.pt), a este propósito salienta que o Código de 1966 preferiu adoptar no artigo 570.º uma fórmula mais flexível que tem a vantagem não despicienda de cobrir não só as hipóteses mais correntes de concurso da negligência do lesado com a negligência do lesante, mas também os casos mais controvertidos na doutrina anterior, que eram os da concorrência do dolo de um dos lados com a negligência do outro.
Antunes Varela (Código Civil Anotado, Volume I, 4º edição, página 588) salienta ainda que “a culpa do lesado tanto pode reportar-se ao facto ilícito causador dos danos, como directamente aos danos provenientes desse facto. Falando no concurso do facto culposo para a produção dos danos ou para o agravamento deles, a lei pretende sem dúvida abranger os dois tipos de situações”.
Em regra, no caso de concorrência de dolo com culpa a indemnização não deve ser em princípio reduzida e, a considerar-se a concorrência esta deve essencialmente ter em atenção os actos do lesado que obstem ao agravamento dos danos.
No caso dos autos a censura que a Recorrente pretende dirigir ao Autor assenta essencialmente no facto de ter confiado na gerente do balcão, de não se questionar por que recebia um tratamento tão personalizado, de não ir ao banco, de não analisar os extractos e posteriormente de não desconfiar do não recebimento dos mesmos, descomprometendo-se do controle das suas contas.
No que a Recorrente entende ser uma conduta negligente por parte do Autor, que contribuiu para possibilitar as operações levadas a cabo pela Ré M. J. e inviabilizou que detectasse eventuais irregularidades.
É certo que tal como se refere na decisão recorrida os actos praticados pela Ré M. J., que escapam em absoluto ao “normal proceder e à experiencia comum” só foram possíveis “pelo encontro de 3 pessoas que tinham um modo muito caricato de proceder: desde logo, a segunda ré, que se embrenhou em malabarismos com as contas dos clientes, totalmente descomprometida das exigências éticas da função que desempenhava (foi entretanto despedida por justa causa); depois, o autor marido, que também se descomprometeu do controle das suas contas, confiando, imprudentemente, na gerente do balcão, e não se questionando quanto às razões pelas quais recebia um tratamento tão personalizado (nunca ia ao Banco, sendo antes a gerente de balcão quem o visitava na sua oficina); por fim, o representante legal da W, F. C., que, vendo a oportunidade de receber o dinheiro que pretendia, também não se questionou onde é que uma gerente de balcão iria buscar € 80.000,00 para lhe emprestar a título pessoal, nem tampouco porque razão o faria”.
Mas deverá o Autor ser penalizado, e ver afastado o seu direito a indemnização, por ter confiado na gerente do balcão do Banco e se ter, talvez, deslumbrado com o tratamento personalizado que recebia, e pelo facto de não ter de se deslocar ao banco mas “ter um banco” que se deslocava até si?
Entendemos que a resposta deverá ser negativa.
Não nos podemos esquecer desde logo que os Autores, que eram clientes da Caixa ..., é que foram abordados pela Ré M. J., à data gerente do Balcão de Vizela, para que abrissem uma conta no então X, incentivando-os com a oferta de uma maior rentabilidade, designadamente mais juros e que foi por confiarem nela, nas informações que lhes transmitiu, que em 11/07/2008, procederam à abertura da conta no então X, Balcão de Vizela, procedendo ao depósito em 14/07/2008 da quantia de €200.000,00.

E na verdade, não é (e não deve ser) a relação de confiança uma das bases da relação bancária?
Conforme se escreve no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18/11/2008 (disponível em www.dgsi.pt) “entre as partes – banqueiro e cliente – haverá deveres de conduta, decorrentes da boa-fé, em articulação com os usos ou os acordos parcelares que venham a celebrar, designadamente deveres de lealdade, com especial incidência sobre a parte profissional, o banqueiro. Como decorre do que já ficou referido, este fica vinculado a deveres de actuação conformes com aquilo que é expectável da parte de um profissional tecnicamente competente, que conhece e domina as regras da ars bancaria, e que deve ter na mira a defesa e o respeito dos interesses do seu cliente. A tutela da confiança é um dos valores fundamentais a ter em conta no desenvolvimento da relação bancária (…) esta especial relação obrigacional complexa, de confiança mútua e dominada pelo intuitus personae, imporá à instituição financeira, mesmo no silêncio do contrato, «padrões profissionais e éticos elevados numa política de “conhece o teu cliente”, traduzidos em deveres de protecção dos legítimos interesses do cliente (…).”
Deverá a confiança depositada pelo Autor na gerente do balcão do Banco ser susceptível de determinar a sua penalização e a desresponsabilização do Banco?
Entendemos que não; atente-se aliás que em causa não está um qualquer funcionário do banco mas a gerente do balcão, não sendo minimamente expectável que um funcionário de um banco, em particular o gerente do balcão, tenha a atuação levada a cabo pela Ré M. J.. De facto, o Autor depositou a sua confiança em alguém que detinha uma posição de especial relevo na agência bancária.
Neste sentido afirma-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12/05/2016 (Relator Conselheiro Abrantes Geraldes, também disponível em www.dgsi.pt) que não faz sentido penalizar os clientes pelo facto de acreditarem, como se deve acreditar, que os funcionários bancários são pessoas honestas e confiáveis, designadamente para lidarem com operações bancárias e com os interesses dos clientes e que “Não é de supor que as instituições bancárias não actuem com rigor no exercício da sua actividade e nem que os seus funcionários se aproveitem das suas funções e do conhecimento que delas lhes advém para burlarem aqueles que lhes confiaram os seus haveres”.
De facto, e em primeira linha, o que possibilitou a atuação da Ré M. J., a par é certo da confiança que nela o Autor depositou, foi a qualidade de funcionário da agência bancária, aliás numa posição de chefia, de gerente do balcão; e foi esta posição que desde logo lhe permitiu/facilitou executar na conta dos Autores, a partir de 22/07/2009, um movimento intenso e anómalo, sem o conhecimento daqueles, passando a utilizar a conta à ordem como se fosse sua, nela efectuando aplicações financeiras, resgates de aplicações financeiras, depósitos e levantamentos sem o conhecimento dos Autores.
Entendemos, por isso, inexistir não só motivo para exonerar a Recorrente da responsabilidade objectiva que lhe advém da relação de comissão estabelecida com a Ré M. J., sua funcionária, mas também para reduzir ou excluir a indemnização devida ao Autor, não sendo de aplicar o artigo 570º, e nem o artigo 799º do CC.
E a responsabilidade da Recorrente relativamente aos danos de natureza patrimonial, e que esta aceita, é também extensiva aos danos não patrimoniais, inexistindo fundamento para fazer qualquer distinção, sendo certo que estes, conforme decorre dos factos provados, se configuram como relevantes para efeitos do disposto no artigo 496º do CC.
Improcede, por isso, nesta parte o recurso da Ré Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A..
Em face do exposto impõe-se pois julgar parcialmente procedentes os recursos interpostos pela Ré Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A. e pela Interveniente W – Sistemas Integrados, S.A., e, consequentemente alterar-se a matéria de facto julgada provada e não provada em conformidade com o supra exposto e condenar-se as Rés Caixa ... – Caixa ... Bancária, S.A. e M. J. a, solidariamente, pagarem aos Autores a quantia de €69.980,00 (sessenta e nove mil novecentos e oitenta euros), acrescida de juros de mora à taxa de 4%, contados desde 07/07/2011 e até 09/01/2017 sobre a quantia de €80.000,00, e desde 10/01/2017 sobre a quantia de €69.980,00, sem prejuízo da limitação do total ao valor peticionado na alínea a) do petitório, mantendo-se no mais a sentença proferida.
As custas do recurso da Ré Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A. são da responsabilidade da Recorrente e dos Autores na proporção do respetivo decaimento que se fixa em 2/3 e 1/3, respectivamente, as custas do recurso da Interveniente W – Sistemas Integrados, S.A. são da sua responsabilidade e as custas da ação são da responsabilidade dos Autores e das Rés mantendo-se a proporção do decaimento fixado na sentença recorrida (artigo 527º n.º 1 do Código de Processo Civil).
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SUMÁRIO (artigo 663º n.º 7 do Código do Processo Civil):

I - A instituição de crédito responde, nos termos do artigo 500º do Código Civil, solidariamente com o seu funcionário, gerente do Balcão, que aproveitando-se das suas funções e da relação de confiança que tinha com os Autores, passou a utilizar a conta de que os mesmos eram titulares, nela efectuando aplicações financeiras, resgates de aplicações financeiras, depósitos e levantamentos sem o conhecimento daqueles.
II - A instituição bancária, atenta a sua qualidade de comitente relativamente ao seu funcionário, responde objectivamente pelos danos causados por este na esfera dos Autores, não sendo essa responsabilidade afastada pelo facto dos Autores, por força da referida relação de confiança, não se preocuparem em analisar os extractos e, posteriormente, não desconfiar do não recebimento dos mesmos, e nem se deslocarem ao banco, não relevando tal conduta para efeitos de aplicação do disposto no artigo 570º do Código Civil.
III - A responsabilidade da instituição bancária relativamente aos danos de natureza patrimonial é também extensiva aos danos não patrimoniais, inexistindo fundamento para fazer qualquer distinção, sendo que estes, se configuram como relevantes para efeitos do disposto no artigo 496º do Código Civil.
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IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação:

A) Julgar parcialmente procedente o recurso Interveniente W – Sistemas Integrados, S.A., e, consequentemente
1. Aditar um novo ponto à matéria de facto provada que passará a ser o 34-A) e terá a seguinte redacção: “34-A) Por conta da quantia referida em 32), a W entregou ainda à segunda Ré, por meio de numerário e em mão, a quantia de €3.000,00 no ano de 2012, €5.000,00 no ano de 2013; €5.000,00 no ano de 2014 e €1.000,00 no ano de 2015”.
2. Alterar o ponto h) dos factos não provados para que passe a ter a seguinte redacção: “h) Que, para além das quantias mencionadas no artigo 34-A dos factos provados, a W tenha entregado quaisquer outras quantias à segunda ré, em mão”;
3. Alterar o ponto i) dos factos não provados para que passe a ter a seguinte redacção: “i) Que as quantias referidas em 34) e em 34-A) tenham sido entregues aos autores”.
B) Alterar a redação do ponto 22) dos factos provados: “22) E ainda a transferência a crédito em 10/01/2017, no valor de €10.020,00, proveniente de “M. T.”.
C) Julgar parcialmente procedente a apelação da Ré Caixa ... – Caixa ... Bancária, S.A. e consequentemente:
1. Aditar um novo ponto à matéria de facto provada que passará a ser o 14-A) e terá a seguinte redacção: “14-A) Os Autores desde a data da abertura da conta e até a alteração de residência, em Julho de 2011, receberam extratos da sua conta”;
2. Alterar o ponto f) dos factos não provados para que passe a ter a seguinte redacção: “f) Que a segunda ré tivesse efetivado a alteração de residência”;
3. Condenar as Rés Caixa ... – Caixa ... Bancária, S.A. e M. J. a, solidariamente, pagarem aos Autores a quantia de €69.980,00 (sessenta e nove mil novecentos e oitenta euros), acrescida de juros de mora à taxa de 4%, contados desde 07/07/2011 e até 09/01/2017 sobre a quantia de €80.000,00, e desde 10/01/2017 sobre a quantia de €69.980,00, sem prejuízo da limitação do total ao valor peticionado na alínea a) do petitório;
D) Confirmar, no mais, a sentença proferida.
As custas do recurso da Ré Caixa ... - Caixa ... Bancária, S.A. são da responsabilidade da Recorrente e dos Autores na proporção do respetivo decaimento que se fixa em 2/3 e 1/3; as custas do recurso da Interveniente W – Sistemas Integrados, S.A. são da sua responsabilidade e as custas da ação são da responsabilidade dos Autores e das Rés, mantendo-se a proporção do decaimento fixado na sentença recorrida.
Guimarães, 15 de outubro de 2020
Texto elaborado em computador e integralmente revisto pela signatária

Raquel Baptista Tavares (Relatora)
Margarida Almeida Fernandes (1ª Adjunta)
Margarida Sousa (2ª Adjunta)