Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
7339/21.0T8VNF.G1
Relator: ROSÁLIA CUNHA
Descritores: PER
CAUSA PREJUDICIAL
SUSPENSÃO E DESTITUIÇÃO DE GERENTE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/27/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Entende-se por causa prejudicial aquela onde se discute e pretende apurar um facto ou situação que é elemento ou pressuposto da pretensão formulada na causa dependente, de tal forma que a resolução da questão que está a ser apreciada e discutida na causa prejudicial irá interferir e influenciar a causa dependente, destruindo ou modificando os fundamentos em que esta se baseia.
II – A ação em que se peticiona a suspensão imediata do cargo de gerente da sociedade e, a final, a sua destituição desse cargo com justa causa e a nomeação de um sócio como gerente não constitui causa prejudicial relativamente ao processo especial de revitalização dessa sociedade o qual visa permitir à empresa que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização.
III – A procedência do pedido de suspensão do cargo de gerente e a subsequente destituição de tal cargo não tem efeitos retroativos pelo que apenas pode ter influência no processo de revitalização no que toca à futura representação da sociedade, não afetando a validade e eficácia dos atos que foram praticados pelo gerente quando o mesmo se encontrava em exercício de funções.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

RELATÓRIO

A..., LDA. veio, nos termos dos arts. 17º e ss do CIRE, intentar processo especial de revitalização alegando encontrar-se em situação económica difícil e reunir as condições necessárias para a sua recuperação.
O pedido foi formulado pelo Sr. Dr. AA o qual foi constituído mandatário da sociedade requerente por procuração datada de 23.12.2021 e assinada por BB, gerente da mesma.
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Em 6.1.2022, CC apresentou requerimento (ref. Citius ...64) no qual, invocando a sua qualidade de sócio da requerente, veio dizer que o processo foi instaurado sem que a gerência tenha previamente deliberado e comunicado ao sócio tal pretensão, não tendo o gerente legitimidade para, sem deliberação e conhecimento dos sócios, se apresentar a um PER, mais referindo que não há razões objetivas para a apresentação deste processo, que não seja a tentativa de prejudicar o ora requerente, acrescendo ainda que as contas dos dois últimos anos da empresa apresentam saldo positivo.
Com estes fundamentos pugnou pelo indeferimento liminar do processo.
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Foi proferido despacho em 12.1.2022 (ref. Citius ...17) que determinou a notificação da requerente devedora para se pronunciar sobre o referido requerimento, o que a mesma fez nos termos constantes do requerimento que apresentou em 13.1.2022 (ref. Citius ...18), pugnando pelo seu indeferimento.
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Em 19.1.2022 foi proferido despacho (ref. Citius ...03) que, referindo que ”[p]erante os esclarecimentos da devedora, passaremos a proferir despacho de admissão do processo, por não vislumbramos impedimento”, admitiu liminarmente o processo e nomeou administrador judicial provisório.
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Este despacho foi notificado a CC, na qualidade de interveniente acidental, com data de 20.1.2022 (ref. Citius ...10), não tendo sido objeto de recurso.
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Em 20.1.2022 foi ainda dada publicidade ao aludido despacho mediante anúncio e edital, nos termos dos arts. 17º-C, nº 5 e 37º, nº 8, do CIRE.
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Em 2.2.2022, CC apresentou requerimento (ref. Citius ...54) com o qual juntou procuração constituindo mandatários.
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Em 14.2.2022, o Sr. administrador judicial provisório (AJP) juntou aos autos a lista provisória de créditos.
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Na sequência da impugnação apresentada pelo Banco 1..., S.A., o Sr. AJP juntou aos autos, em 17.3.2022, lista provisória de credores atualizada.
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Em 6.6.2022 a requerente A..., Lda. juntou aos autos a versão atualizada do plano de revitalização e, em 7.6.2022, foi publicado o anúncio de junção dessa versão do plano.
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Em 17.6.2022, CC, invocando a sua qualidade de sócio da requerente, apresentou requerimento, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, no qual pediu:

a) que seja ordenada a suspensão da instância até decisão da providência cautelar nº 3690/22....;
b) que seja ordenada a extinção da instância, por uso indevido do processo;
c) ou, subsidiariamente, que seja recusada a homologação do plano na condição de depositar na conta da sociedade a quantia de € 40 000 e de ser nomeado como único gerente da mesma.
Requereu a notificação da sociedade para juntar elementos documentais aos autos e arrolou prova testemunhal.
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Em 21.6.2022, o Sr. AJP juntou aos autos documento com o resultado da votação do plano, referindo que o mesmo foi aprovado e requerendo que se proceda à sua homologação.
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Em 27.6.2022 foi proferida decisão que homologou o plano de revitalização de A..., Lda., considerando-o ineficaz relativamente aos créditos da Segurança Social por esta não ter consentido na sua modificação.
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CC não se conformou e interpôs recurso de apelação, o qual, por acórdão proferido, em 3.11.2022, no apenso B, foi julgado procedente tendo sido declarada nula a decisão proferida em 27.6.2022 e determinado que seja proferida nova decisão que proceda à apreciação integral do requerimento apresentado pelo recorrente em 17.6.2022.
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Com vista ao cumprimento do determinado no aludido acórdão, o tribunal a quo pediu informação sobre o estado do processo nº 3690/22...., invocado por CC como causa prejudicial com vista à suspensão da instância do processo de revitalização, a qual foi prestada em 20.12.2022 (ref. Citius ...49) constando que tais autos se encontram a aguardar a junção de vários documentos.
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Por requerimento de 20.12.2022 (ref. Citius ...86), a A... veio dizer que reproduz o requerimento que já havia junto em 27.6.2022, manifestando-se no sentido de que o plano seja homologado.
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Em 16.1.2023, foi proferido despacho (ref. Citius...25) que determinou a notificação do AJP para informar se, em situação de liquidação integral do património da devedora, é de presumir que não subsistiria qualquer remanescente a distribuir pelos sócios.
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Por requerimento de 25.1.2023 (ref. Citius ...61) veio o AJP dizer que, atento o valor dos créditos reconhecidos no processo, de € 357 621,10, e o valor contabilístico indicado pela devedora, de € 339 404,26, o qual não é expectável que se atinja num cenário de liquidação, conclui que o valor resultante da venda do património não seria suficiente para pagar a totalidade dos créditos reconhecidos pelo que presume que não subsistiria qualquer remanescente para distribuir pelos sócios.
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Em 3.2.2023, foi proferida decisão (ref. Citius ...74), que aqui se dá por integralmente reproduzida, que:

a) apreciou o requerimento apresentado em 17.6.2022 por CC, tendo-o indeferido;
b) homologou o plano de revitalização de A..., Lda aprovado nos autos, tendo-o considerado ineficaz relativamente aos créditos da Segurança Social por esta não ter consentido na sua modificação, violando o artigo 30º da Lei Geral Tributária que dispõe serem tais créditos indisponíveis.
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CC não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

“1 – Tendo indeferido a requerida suspensão da instância sem apreciar a questão da prejudicialidade e com o único fundamento que tal instituto não se aplica ao processo de revitalização, a sentença recorrida está ferida de nulidade por falta de fundamentação de direito e omissão de pronúncia.
2 – Tendo indeferido a produção da prova documental e testemunhal requerida pelo apelante, sem qualquer fundamento legal válido, a sentença está também ferida de nulidade, por preterição de prova e omissão de pronúncia sobre a razão de tal indeferimento.
3 – Tendo-se recusado a apreciar e decidir o pedido de extinção da instância por uso indevido do processo, com invocação de extemporaneidade não prevista na lei, a sentença está igualmente ferida de nulidade por falta de fundamentação de direito e omissão de pronúncia.
4 – Tendo decidido homologar o plano sem apreciar ou, sequer, se pronunciar sobre nenhum dos factos concretos alegados pelo apelante sobre tal questão, a sentença está, novamente, ferida de nulidade, por omissão de pronúncia.
5 – Os factos alegados pelo apelante, conjugados com os demais elementos constantes dos autos, demonstram, à evidência ,que
-a devedora não carece, nem nunca careceu, de revitalização
-os direitos dos credores estão assegurados com ou sem plano de revitalização
-o único lesado com o plano é o apelante que, por via dele, é esbulhado da sua quota, a custo zero
- e os únicos beneficiados são o gerente da devedora e os seus pais, que, estes si, é que ‘tomam a sociedade de assalto’ à custa do apelante!
o que é mais do que suficiente para que o plano não possa ser homologado.
6 – Ao decidir conforme decidiu, o tribunal a quo violou o disposto nas alíneas b), c) e d) do art. 615º do NCPC e, por erro de interpretação, nomeadamente, o disposto nos arts. 17º , 17º-a a j, 198º-3, 215º e 216º do CIRE e 272º-1”
*
A devedora A..., Lda. contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida, tendo apresentado as seguintes conclusões:
(…)
*
O recurso foi admitido na 1ª instância como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos, com efeito devolutivo, não tendo sido objeto de alteração neste Tribunal da Relação.
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Apesar de o tribunal a quo não ter proferido o despacho referido no art. 617º, nº 1, não tendo apreciado a nulidade da decisão invocada no recurso, por se ter entendido que não se verificava a situação de indispensabilidade referida no nº 5, do art. 617º, ambos do CPC, não se determinou a baixa à 1ª instância para tal efeito.
*
Foram colhidos os vistos legais.

OBJETO DO RECURSO

(…)
Neste enquadramento, as questões relevantes a decidir, elencadas por ordem de precedência lógico-jurídica, são as seguintes:

I – saber se a sentença é nula;
II – saber se existe fundamento legal para que seja decretada a suspensão da instância por o processo nº 3690/22.... constituir causa prejudicial do processo de revitalização.
                                                                  
FUNDAMENTAÇÃO

FUNDAMENTOS DE FACTO

Os factos a considerar são os que se mostram descritos no relatório, sendo que na decisão proferida na 1ª instância não foi elencada factualidade de forma autónoma.
Os factos descritos no relatório resultam da consulta dos atos praticados no processo e dos elementos documentais existentes nos autos.

FUNDAMENTOS DE DIREITO

I - Nulidade da decisão

O recorrente invoca que a decisão recorrida é nula e invoca a violação do disposto no art. 615º, nº 1, als. b), c) e d), do CPC.

Dispõe o art. 615º, nº 1, do CPC, (diploma ao qual se referem todas as normas subsequentemente citadas sem menção de diferente origem) que é nula a sentença quando:

a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.

As nulidades da decisão são vícios formais e intrínsecos de tal peça processual e encontram-se taxativamente previstos no normativo legal supra citado.
Os referidos vícios, designados como error in procedendo, respeitam unicamente à estrutura ou aos limites da decisão.
As nulidades da decisão, como seus vícios intrínsecos, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com erros de julgamento (error in judicando), que são erros quanto à decisão de mérito explanada na sentença, decorrentes de má perceção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error juris), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou normativa, com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento estes a sindicar noutro âmbito (cf. Acórdão desta Relação de 4.10.2018, Relatora Eugénia Cunha, in www.dgsi.pt).

O vício da sentença decorrente da não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, abreviadamente designado como vício de falta de fundamentação, encontra-se diretamente relacionado com a obrigação de o juiz fundamentar as suas decisões que não sejam de mero expediente, obrigação essa que lhe é imposta pelos arts. 154º e 607º, nºs 3 e 4, do CPC, e pelo art. 205º, nº 1, da CRP.
A exigência de fundamentação exerce a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao ato jurisdicional (José Lebre de Freitas, in A Ação Declarativa Comum À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª edição, pág. 317).
Impõe-se ao juiz não só que explicite o que decidiu, mas também que indique os motivos que determinaram tal decisão, esclarecendo porque assim decidiu.
Na verdade, só sabendo os concretos fundamentos que justificaram a prolação da decisão as partes terão a possibilidade real e efetiva de proceder à sua impugnação e suscitar a sua sindicância por um tribunal superior. E o tribunal superior só pode sindicar a decisão se conhecer os fundamentos de facto e de direito que subjazem à decisão proferida.
Todavia, é entendimento pacífico e consolidado quer da doutrina, quer da jurisprudência, que só a falta absoluta da indicação dos fundamentos de facto ou de direito será geradora da nulidade em causa, não ocorrendo tal vício nas situações de mera deficiência, insuficiência ou mediocridade de fundamentação.
Assim, como já afirmava o Prof. Alberto dos Reis, (in Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 140) “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade”.
Em idêntico sentido, referem Antunes Varela e outros (in Manual de Processo Civil, 2ª edição, p. 687), que, “para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente e incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”.
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Relativamente à nulidade prevista na al. c, do nº 1, do art. 615º, de acordo com os ensinamentos de Alberto dos Reis (in Código de Processo Civil Anotado, Volume V, pág. 151) “a sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos. É evidente que, em última análise, a ambiguidade é uma forma especial de obscuridade. Se determinado passo da sentença é suscetível de duas interpretações diversas, não se sabe ao certo, qual o pensamento do juiz”.
Na mesma linha de raciocínio, escreve Remédio Marques (in Ação Declarativa À Luz Do Código Revisto”, 3.ª Edição, pág. 667) que a ambiguidade da sentença “exprime a existência de uma plurissignificação ou de uma polissemia de sentidos (dois ou mais) de algum trecho, seja da sua parte decisória, seja dos respetivos fundamentos”. A obscuridade, no entendimento do mesmo autor, “traduz os casos de ininteligibilidade da sentença”.
Portanto, é “obscuro” o que não é claro, aquilo que não se entende; e é “ambíguo” o que se preste a interpretações diferentes. Num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos.
Em qualquer caso, fica o destinatário do acórdão sem saber ao certo o que efetivamente se decidiu, ou quis decidir. Mas não é qualquer obscuridade, ou ambiguidade, que é sancionada com a nulidade do acórdão, mas apenas aquela que torne a decisão ininteligível (cf. Acórdãos do STA, de 12.2.2014 e 8.11.2018 in www.dgsi.pt).
E acresce dizer que a ininteligibilidade da decisão não deve ser apreciada do ponto de vista subjetivo do concreto sujeito que leu a decisão e alega que não a compreendeu, mas antes de acordo com um padrão objetivo por forma a verificar se a mesma, do ponto de vista objetivo, é ou não percetível, compreensível e inteligível.
Finalmente, importa ainda salientar que a decisão proferida tem de ser lida e interpretada à luz da sua fundamentação, com vista a aquilatar da existência de obscuridade ou ambiguidade geradora de ininteligibilidade.
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O vício da decisão decorrente da omissão de pronúncia relaciona-se com o dispositivo do art. 608º, designadamente, com o seu nº 2, que estabelece as questões que devem ser conhecidas na sentença, havendo, assim, de por ele ser integrado.
Desta conjugação de normativos resulta que a nulidade da decisão com fundamento na omissão de pronúncia apenas se verifica quando uma questão que devia ser conhecida nessa peça processual não teve aí qualquer tratamento, apreciação ou decisão, sem que a sua resolução tenha sido prejudicada pela solução, eventualmente, dada a outras.
Importa, porém, não confundir questões com factos, argumentos ou considerações. A questão a decidir está intimamente ligada ao pedido da providência e à respetiva causa de pedir. Relevam, de um modo geral, as pretensões deduzidas e os elementos integradores do pedido e da causa de pedir.
Neste sentido, veja-se o Acórdão do STJ, de 9.2.2012, segundo o qual “a nulidade resultante de omissão de pronúncia verifica-se quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (...), sendo certo que não se tem por verificada quando o tribunal deixa de apreciar algum ou alguns dos argumentos invocados pela parte tendo em vista a decisão da questão ou questões que a mesma submete ao seu conhecimento, só ocorrendo quando o tribunal deixa de se pronunciar sobre a própria questão ou questões que lhe são colocadas ou que tem o dever de oficiosamente apreciar, entendendo-se por questão o dissídio ou problema concreto a decidir e não os simples argumentos, razões, opiniões ou doutrinas expendidos pela parte na defesa da sua pretensão.
O conceito (questões) terá ser considerado num sentido amplo, ou seja, englobando tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir e às controvérsias que sobre elas as partes hajam suscitado” (Acórdão da Relação de Guimarães, de 5.4.2018, Relator Jorge Teixeira, in www.dgsi.pt).
Uma vez que as questões a decidir não se confundem com os argumentos fáctico-jurídicos apresentados, a não pronúncia sobre factos, em princípio, não é geradora de nulidade, integrando antes uma situação de erro de julgamento sindicável em sede de impugnação da matéria de facto.
Neste sentido escreve Rui Pinto (in CPC Anotado, Vol. II, págs. 178/179), citando em abono desta posição o Acórdão do STJ de 23.3.2017, Relator Tomé Gomes, que “as questões de mérito a resolver não se confundem com a apreciação dos factos em cuja decisão assenta a resolução daquelas. Se nos fundamentos da sentença ou acórdão o tribunal não atende a um facto que se encontre provado ou se considera facto que não devesse ser atendido em face dos requisitos do art. 5º, nº 1 e 2, não há omissão de pronúncia ou excesso de pronúncia, mas um erro de julgamento da matéria de facto, merecedora de recurso”.
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O disposto no art. 615º é aplicável aos despachos, com as devidas adaptações, por via do estabelecido no art. 613º, nº 3, sendo as normas do CPC aplicáveis ao PER por força das disposições conjugadas dos arts. 17º, nº 1 e 17º-A, nº 3, ambos do CIRE.
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O recorrente considera que a decisão é nula, na parte em que indeferiu a suspensão da instância, por falta de fundamentação de direito e omissão de pronúncia.

A decisão recorrida sobre esta matéria refere que:
“No dia 17-6-2022 CC veio invocar a sua qualidade de sócio da devedora para pedir que seja ordenada a suspensão da presente instância até que seja decidido o procedimento cautelar nº 3690/22....; (...)
Notificada a devedora para se pronunciar sobre a requerida suspensão dos autos, veio opor-se à mesma. (...)
Sendo o processo de insolvência um processo de natureza urgente, o processo especial de revitalização assume uma urgência acrescida, conforme decorre das normas que regulam o mesmo. Assim, a requerida suspensão do processo de revitalização não é compaginável com a própria natureza destes processos, não estando por isso prevista de forma alguma na lei.”
Com base nestes fundamentos, indeferiu o pedido de suspensão da instância.

Ora, daqui resulta que não ocorreu qualquer omissão de pronúncia, pois a questão da suspensão da instância foi apreciada e indeferida, e não existe falta absoluta de fundamentação de direito, pois está explicado o motivo jurídico do indeferimento da pretensão de suspensão da instância.
A bondade e o acerto ou desacerto da decisão jurídica proferida do ponto de vista do seu mérito é matéria que se prende unicamente com a existência de erro de julgamento, mas que não é geradora do vício de nulidade da decisão.
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O recorrente alega que a decisão, na parte em que indeferiu todos os meios de prova não documentais requeridos, está ferida de nulidade por preterição de prova e por omissão de pronúncia sobre a razão para a não inquirição das testemunhas arroladas pelo requerente e não admissão dos documentos por ele requeridos.

As nulidades da decisão encontram-se taxativamente elencadas no art. 615º, nº 1, als. a) a e).
Lendo as mesmas verifica-se que em nenhuma delas se encontra referência a “preterição de prova”, razão pela qual esta não constitui causa de nulidade da decisão.

A decisão recorrida, na parte relativa aos meios de prova, refere que CC “[r]equereu ainda a notificação da sociedade para juntar elementos documentais e arrolou prova testemunhal. (...)
Na verdade, a principal caraterística deste processo é a celeridade para dar à devedora a possibilidade de negociar com os seus credores antes de ficar em estado de insolvência.
Do disposto no art. 17º-D, nº 3 do CIRE resulta que após a apresentação da lista provisória de créditos na secretaria do tribunal e publicação no portal Citius, pode ser impugnada no prazo de cinco dias úteis, dispondo o juiz de idêntico prazo para decidir sobre as impugnações formuladas.
Não prevê o CIRE que o credor visado pela impugnação possa responder ou a possibilidade pelas partes de indicação de meios de prova não documentais (seja no requerimento de reclamação, seja no de impugnação), pois deve o juiz de imediato apreciar as impugnações apresentadas (nesse sentido, Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código da Insolvência e Recuperação de Empresas Anotado, 2ª Edição, pág. 157).
Assim, desde já se indeferem, por isso, todos os meios de prova não documentais requeridos.”
Termina dizendo que “[p]elo exposto, outra solução não resta que decidir pela improcedência do requerimento apresentado.”

Lendo esta fundamentação, e abstraindo do seu acerto jurídico, o qual, como já explicámos, não constitui vício gerador de nulidade, conclui-se que não ocorre omissão de pronúncia sobre a razão da não inquirição das testemunhas arroladas, estando explicado o motivo pelo qual o tribunal a quo entendeu não ser admissível essa inquirição e que conduziu ao seu consequente expresso indeferimento.

Quanto ao pedido de notificação da sociedade para juntar elementos documentais a decisão não prima pela clareza e não é expressa quanto a esta matéria, pois, embora refira que esses elementos documentais foram requeridos, na parte decisórias diz apenas que “se indeferem, por isso, todos os meios de prova não documentais requeridos”.
Numa primeira análise poderíamos considerar que a decisão não indeferiu os elementos documentais requeridos e que não se pronunciou sobre a matéria.
Porém, lendo a decisão, e interpretando-a, verifica-se que o fundamento do indeferimento se prende com a natureza urgente do processo de revitalização o qual não se compadece com diligências probatórias que vão além da prova documental, mas que deve ser junta, e não requerida a sua junção por terceiro, pois isso colidiria com a celeridade e urgência de que o processo se reveste.
Portanto, as considerações que são feitas na decisão explicam e justificam que o único meio de prova que é considerado admissível é a prova documental junta e por isso indefere os meios de prova que excedam a mesma, ou seja, a prova documental requerida à sociedade e a prova testemunhal e é por isso que, na parte final, se refere “decidir pela improcedência do requerimento apresentado” o que só se compreende precisamente com o sentido e alcance referidos de inadmissibilidade de qualquer outro meio de prova para além da prova documental junta.

Por conseguinte, e embora se reitere que a decisão não prima pela clareza e que padece de alguma ambiguidade, nem há omissão de pronúncia relativamente ao pedido de notificação da sociedade para juntar documentos, nem a ambiguidade existente torna a decisão ininteligível, pois compreende-se que o aludido pedido foi indeferido nos moldes explanados.
Deste modo, não se verificam as causas de nulidade previstas nas als. c) e d) do nº 1 do art. 615º.
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O recorrente alega que a “sentença recorrida indeferiu o pedido de extinção da instância por uso indevido do processo, com o único fundamento que o mesmo ‘é extemporâneo porque o requerente devia ter levantado tal questão logo que foi notificado do despacho de admissão dos autos” o que, em seu entender, acarreta a “nulidade da sentença por falta de fundamentação de direito e omissão de pronúncia, em virtude de não ter apreciado e decidido tal pedido”.
Aduz ainda que não foi notificado do despacho de admissão dos autos.

Pese embora esta última afirmação não influencie a apreciação da nulidade da sentença, importa precisar que o recorrente labora seguramente em erro quando a faz pois verifica-se que foi efetivamente notificado do despacho de admissão liminar do processo e nomeação do AJP, despacho esse proferido em 19.1.2022 (ref. Citius ...03), tendo-lhe a notificação sido efetuada com data de 20.1.2022 (ref. Citius ...10), na qualidade de interveniente incidental, como resulta do histórico dos atos processuais praticados nos autos.

No que concerne à apreciação da nulidade invocada, verifica-se que na decisão recorrida, quanto a este ponto, consta que “o pedido de extinção da instância por uso indevido do processo já em fase de pronúncia e votação sobre o plano apresentado é extemporâneo. O requerente pôde, na fase anterior do processo levantar tal questão, logo que foi notificado do despacho de admissão dos autos, mas não recorreu do mesmo, deixando-o transitar, fazendo caso julgado formal. Assim, não pode vir agora pôr em causa os pressupostos de admissão a processo de revitalização.
Termina decidindo pela improcedência do requerimento apresentado, onde se inclui esta questão.

Assim, foi proferida decisão quanto à matéria do uso indevido do processo, decisão essa que consistiu em considerar o requerimento extemporâneo quanto a tal questão, com a fundamentação jurídica que se transcreveu, de onde se tem de extrair a ilação de que nem há omissão de pronúncia nem há falta de fundamentação jurídica.
Com efeito, quando se considera que um requerimento não é admissível por razões de ordem formal, designadamente por ser intempestivo, tal implica necessariamente que a pretensão de mérito nele apresentada não tem que ser apreciada. Essa não apreciação de mérito, com base em tais fundamentos, não consubstancia qualquer omissão de pronúncia, sendo uma consequência jurídica necessária da decisão de inadmissibilidade do requerido com base na sua intempestividade.
Deste modo, a decisão não padece de nulidade por falta de fundamentação jurídica ou por omissão de pronúncia.
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O recorrente invoca que a decisão recorrida não se pronunciou sobre os concretos factos por si alegados com vista a impedir a homologação do plano, o que constitui nulidade, por omissão de pronúncia.

Já acima explicámos que ao tribunal compete apreciar as questões suscitadas, de acordo com os critérios que acima delineámos, sendo que as questões a decidir não se confundem com os argumentos fáctico-jurídicos apresentados e que a não consideração de determinados factos alegados não constitui causa de nulidade, por omissão de pronúncia, mas antes uma situação de erro de julgamento a corrigir através da dedução de impugnação da matéria de facto, a qual, no caso concreto, não foi deduzida pelo recorrente.
Ora, no caso concreto, a questão a decidir refere-se à não homologação do plano e a decisão recorrida pronunciou-se sobre a mesma dizendo que “CC veio invocar a sua qualidade de sócio da devedora para pedir (...) subsidiariamente, que seja recusada a homologação do plano na condição de o requerente depositar na conta da sociedade € 40.000,00 e ser nomeado único gerente da mesma. (...)
 “...nada nos autos indicia o que o requerente alega. Antes o seu pedido de que seja nomeado único gerente da sociedade devedora parece mostrar a vontade de tomar aquela de assalto, com a injeção de € 40.000,00.
Por outro lado, o sócio requerente tem uma quota de € 2.500,00 e alega que com a homologação do plano ficaria prejudicado pois ficaria excluído da sociedade com a redução do capital social a zero e a sua transformação em sociedade unipessoal.
Contudo, o artigo 198º, nº3 do CIRE, dispõe expressamente que a redução do capital a zero só é admissível se for de presumir que, em liquidação integral do património da sociedade, não subsistiria qualquer remanescente a distribuir pelos sócios.
De facto, o requerente é um sócio, não é um credor da sociedade, pelo que não se lhe aplicam as normas do artigo 17º-F, nº7 CIRE, que visam proteger os credores sociais.
Ademais, o administrador provisório explicou que o valor contabilístico do património indicado pela devedora é de € 339.404,26 e não é expectável que seja atingido em liquidação de insolvência. Como os créditos reconhecidos ascendem a € 357.621,10, o resultado da venda do património não seria suficiente para pagar todos os créditos reconhecidos pelo que não subsistiria remanescente para distribuir pelos sócios.
Assim, é admissível a redução do capital social a zero pois apenas assim não seria se fosse de perspetivar a suficiência do ativo para satisfação integral do passivo, com sobras, que seriam a distribuir pelos sócios. Também assim entendem Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª edição, Quid Iuris, sociedade editora, Lisboa, 2015, página 728: “Em diversos pontos, o CIRE manifesta especial preocupação pela tutela da posição do devedor, nomeadamente com vista a prevenir que o processo conduza a um empobrecimento indevido. Expoente máximo desse intento é o regime fixado no artigo 216º. Ora, situa-se também neste contexto a exigência constante do nº3, que condiciona o poder de os credores, substituindo-se aos titulares do capital, procederem à sua redução a zero, afastando-os, consequentemente, do corpo social”.
Termina decidindo pela improcedência do requerimento apresentado, no qual se inclui a questão da não homologação do plano suscitada pelo recorrente.

Verifica-se assim que, independentemente do acerto da fundamentação jurídica e da decisão proferida pelo tribunal a quo, matéria que, repisa-se, não releva enquanto causa de nulidade da decisão, na decisão foi apreciada e decidida a questão suscitada atinente à pretensão de não homologação do plano.
A não pronúncia do tribunal a quo sobre determinados factos invocados pelo recorrente não constitui causa de nulidade da decisão, como também já explicitámos, só sendo sindicável por via de impugnação da matéria de facto a qual, no caso, não foi deduzida.
Destarte, conclui-se que não se verifica a invocada nulidade.
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II - Suspensão da instância por existência de causa prejudicial

O recorrente alegou, com vista a obter a suspensão da instância por existência de causa prejudicial, que instaurou contra a sociedade A... e contra o seu gerente BB a ação nº 3690/22.... na qual pediu que este último seja de imediato suspenso do cargo de gerente da sociedade ré e condenado a abster-se de praticar qualquer ato em representação da ré, usar de qualquer dos seus bens e deslocar-se e permanecer nas instalações desta, peticionando ainda a sua nomeação como gerente e destituição do réu do cargo de gerente, por justa causa.

Considera que o julgamento desta ação influi no julgamento dos presentes autos pois se for decretada a destituição de gerente o mesmo carece de legitimidade para prosseguir os autos e ver homologado o plano. Pede a suspensão com base no estatuído no art. 272º, nº 1, do CPC.

Partindo do princípio de que é possível a suspensão da instância no âmbito do PER - o que admitimos apenas para efeitos de raciocínio pois temos sérias dúvidas de que, dada a natureza célere e urgente do mesmo, possa ocorrer a suspensão prevista no art. 272º, nº 1, do CPC, tratando-se de norma que estará excluída de aplicação ao PER por ser incompatível com a sua natureza, nos termos do art. 17º-A, nº 3 e 17º, nº 1, do CIRE - o certo é que no caso não se verifica a existência de qualquer relação de prejudicialidade entre a ação nº 3690/22.... e os presentes autos.

Expliquemos porquê.

Estabelece o art. 272º, nº 1, que o tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado.
Assim, esta norma estabelece duas causas de suspensão da instância: a existência de causa prejudicial e a ocorrência de outro motivo justificado sendo que, para o caso, apenas releva a primeira.
Uma ação é prejudicial doutra sempre que naquela se ataca um ato ou facto jurídico que é pressuposto necessário desta. A relação de dependência entre uma ação e outra, como causa de suspensão da instância, assenta no facto de numa ação se discutir, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da outra, em termos de a decisão proferida numa ser suscetível de inutilizar os efeitos pretendidos na outra, por a resolução da primeira - a prejudicial -, por si só, poder modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para a decisão da segunda - a dependente.
Como entendido nos Acórdãos do Tribunal da Relação de Évora, do Porto e de Lisboa, de 21.1.2016, 18.12.2018 e 24.10.2019 (in www.dgsi.pt) entende-se por causa prejudicial aquela onde se discute e pretende apurar um facto ou situação que é elemento ou pressuposto da pretensão formulada na causa dependente, de tal forma que a resolução da questão que está a ser apreciada e discutida na causa prejudicial irá interferir e influenciar a causa dependente, destruindo ou modificando os fundamentos em que esta se baseia.

Ora, dispõe o art. 17º-A, nº 1, do CIRE, sob a epígrafe “finalidade e natureza do processo especial de revitalização” que tal processo se destina a permitir à empresa que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização.
Portanto, o que se pretende com este processo é possibilitar à empresa que se encontre nas referidas situações a possibilidade de negociar com os seus credores por forma a conseguir fazer aprovar um plano de recuperação que permita a sua revitalização e evite a sua declaração de insolvência.

O processo nº 3690/22.... é uma ação de destituição, com procedimento de suspensão e nomeação, de titular de órgão social prevista no art. 1055º, do CPC (cf. cópia da p.i. junta no requerimento de 17.6.2022).

E com o mesmo pretende o aqui recorrente obter a suspensão imediata de BB do cargo de gerente da ré e, a final, a sua destituição desse cargo com justa causa e a nomeação do recorrente como gerente.
Ora, atentas as finalidades dos dois processos e aquilo que em ambos se discute e peticiona, consideramos que não existe entre ambos a relação de prejudicialidade tal como supra a definimos pois no processo nº 3690/22.... não se discute, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão do processo de revitalização, em termos de a decisão aí proferida ser suscetível de inutilizar os efeitos pretendidos no PER  e de, por si só, poder modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para a decisão do PER.
O resultado do processo nº 3690/22.... pode ter influência no presente processo de revitalização no que toca à futura representação da sociedade, mas não existe entre as duas ações a relação de prejudicialidade de acordo com o conceito delineado supra.
Na verdade, se for deferido o pedido de suspensão de BB do cargo de gerente da A..., a partir desse momento - visto que a suspensão não tem efeitos retroativos, apenas operando após a data em que vier a ser decretada – a sociedade deixa de poder ser representada em juízo pelo aludido gerente e passará a sê-lo pela pessoa que vier a ser nomeada para exercer tal cargo. Porém, a validade e eficácia dos atos anteriormente praticados pelo gerente entretanto suspenso não é afetada pela decisão de suspensão nem pela subsequente decisão de destituição, posto que quer uma quer outra só produzem efeitos para o futuro.
Por isso, diversamente do que invoca o recorrente, mesmo que o gerente venha a ser suspenso e posteriormente destituído, os atos que o mesmo anteriormente praticou no presente processo de revitalização permanecem válidos e eficazes, não sendo afetados pela procedência da referida ação, a qual só produzirá efeitos para o futuro.
Consequentemente, não existindo entre ambas as ações uma relação de prejudicialidade não há fundamento legal para declarar a suspensão da instância com esse fundamento (partindo do princípio de que a mesma seria possível no âmbito do PER, o que estamos apenas a pressupor para efeitos de raciocínio).
Nestes termos, improcede a presente questão recursória.
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Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º, do CPC, a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte que a elas houver dado causa, entendendo-se que lhes deu causa a parte vencida, na respetiva proporção, ou, não havendo vencimento, quem do processo tirou proveito.
Tendo o recurso sido julgado improcedente na totalidade, é o recorrente responsável pelo pagamento das custas, em conformidade com a disposição legal citada.

DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente.
Custas da apelação pelo recorrente.
Notifique.
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Sumário (da responsabilidade da relatora, conforme art. 663º, nº 7, do CPC):

I - Entende-se por causa prejudicial aquela onde se discute e pretende apurar um facto ou situação que é elemento ou pressuposto da pretensão formulada na causa dependente, de tal forma que a resolução da questão que está a ser apreciada e discutida na causa prejudicial irá interferir e influenciar a causa dependente, destruindo ou modificando os fundamentos em que esta se baseia.
II – A ação em que se peticiona a suspensão imediata do cargo de gerente da sociedade e, a final, a sua destituição desse cargo com justa causa e a nomeação de um sócio como gerente não constitui causa prejudicial relativamente ao processo especial de revitalização dessa sociedade o qual visa permitir à empresa que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização.
III – A procedência do pedido de suspensão do cargo de gerente e a subsequente destituição de tal cargo não tem efeitos retroativos pelo que apenas pode ter influência no processo de revitalização no que toca à futura representação da sociedade, não afetando a validade e eficácia dos atos que foram praticados pelo gerente quando o mesmo se encontrava em exercício de funções.
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Guimarães, 27 de abril de 2023

(Relatora) Rosália Cunha
(1ª Adjunta) Lígia Venade
(2º Adjunto) Fernando Barroso Cabanelas