Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2539/22.8T8GMR-A.G1
Relator: MARIA JOÃO MATOS
Descritores: EMBARGOS À EXECUÇÃO
LEGITIMIDADE ACTIVA EM ACÇÃO EXECUTIVA
OBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS
LITISCONSÓRCIO VOLUNTÁRIO
CRÉDITO POR CUSTAS DE PARTE
CASO JULGADO FORMAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/11/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. Tendo existido uma condenação de litisconsortes voluntários activos nas custas da acção que viram improceder, constitui-se uma obrigação solidária dos mesmos enquanto devedores de custas de parte, face aos litisconsortes voluntários passivos, seus credores; e, por isso, podia cada um destes exigir de qualquer um daqueles a prestação por inteiro, estando assegurada a respectiva legitimidade processual na acção excutiva que intentasse para o efeito.

II. O caso julgado formal refere-se à vinculação do Tribunal ao julgamento que fez sobre uma questão concreta da relação processual; e, por isso, será violado quando o Tribunal, no mesmo processo, com as mesmas partes e reportando-se aos mesmos factos, verificados e atendidos já na primeira decisão, volta a decidir a mesma questão, nesse mesmo contexto processual, de forma diversa (art. 620.º, do CPC).

III. O decurso do prazo de 10 dias previsto no art. 25.º, n.º 1, do RCP, sem a apresentação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte, preclude a possibilidade de praticar esse acto processual (isto é, de desencadear tal incidente, no âmbito do próprio processo a que respeitam as custas), mas não preclude a possibilidade de o direito de crédito correspondente ser exercido nos termos gerais da legislação processual (isto é, pela via executiva).
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

I - RELATÓRIO
1.1. Decisão impugnada

1.1.1. AA, BB, CC e DD (aqui Recorrentes), propuseram os presentes embargos à execução (movida contra eles por S... - Acabamentos Têxteis, S.A., invocando como título executivo uma sentença judicial, para haver a quantia de capital de € 7.752,00 - a título de custas de parte -, acrescida de juros de mora, de que estes autos são apenso), contra S... - Acabamentos Têxtis, S.A. (aqui Recorrida), pedindo que
· os mesmos fossem julgados procedentes e, em consequência, fosse declarada extinta a acção executiva que constitui os autos principais.

Alegaram para o efeito, em síntese: não ter a Exequente (S... - Acabamentos Têxtis, S.A.) legitimidade para propor sozinha a acção executiva, já que da Nota Discriminativa e Justificativa de Custas de Parte junta com o requerimento executivo constam ainda como credores EE e FF; inexistir título executivo, já que teria sido violada a autoridade de caso julgado, formada sobre decisão deferindo reclamação própria, apresentada na acção declarativa onde foi apresentada a dita Nota Discriminativa e Justificativa de Custas de Parte, considerando não serem devidas as ditas custas de parte aí reclamadas; e ter sido ainda a mesma Nota Discriminativa e Justificativa de Custas de Parte apresentada de forma extemporânea, pelo que não poderia ser invocada nos autos principais.

1.1.2. Recebidos liminarmente os embargos, e regularmente notificada a Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.), a mesma contestou, pedindo que os embargos fossem julgados improcedentes.
Alegou para o efeito, em síntese: verificar-se um litisconsórcio voluntário na acção declarativa onde foi apresentada a Nota Discriminativa e Justificativa de Custas de Parte, consubstanciando assim o crédito nela reflectido uma obrigação plural solidária e, por isso, podendo ser judicialmente exigida por qualquer um dos seus credores; ter sido apenas reconhecido, na acção declarativa onde aquela Nota Discriminativa e Justificativa de Custas de Parte foi emitida, a preclusão da liquidação incidental das custas de parte, não obstando essa decisão à reclamação posterior do mesmo crédito nos termos gerais, designadamente em sede de ação executiva (desde que aí liquidado previamente); e prescrever o crédito por custas processuais (onde se inserem as custa de parte) no prazo de cinco anos, pelo que estaria sempre em tempo para o exigir na acção executiva que constitui os autos principais (limitando-se a extemporaneidade arguida pelos Embargantes/Executados à preclusão da apresentação e liquidação, das custas de parte, na conta de custas da acção declarativa).

1.1.3. Em sede de audiência prévia, foi proferido despacho, anunciando-se às partes da possibilidade de conhecimento imediato do mérito da causa e concedendo-lhes prazo para, querendo, alegarem por escrito, o que apenas a Embargante/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.) fez, reiterando o teor da sua prévia contestação.

1.1.4. Foi proferido saneador-sentença, fixando o valor da causa em € 9.282,20, certificando tabelarmente a validade e regularidade da instância, e julgando os embargos totalmente improcedentes, lendo-se nomeadamente no mesmo:
«(…)
Dispositivo:
Pelo exposto, julgo:
a) totalmente improcedente a presente oposição à execução mediante embargos de executado e, em consequência, determino o prosseguimento da instância da acção executiva apensa.
Custas pelos embargantes.
(…)»
*
1.2. Recurso
1.2.1. Fundamentos
Inconformados com esta decisão, os Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD) interpuseram o presente recurso de apelação, pedindo que se julgasse o mesmo totalmente procedente e se revogasse a sentença recorrida, sendo os respectivos embargos julgados procedentes e extinta a acção executiva.
 
Concluíram as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo as respectivas conclusões ipsis verbis):

1 - Os Embargantes/Recorrentes, salvo o devido respeito e melhor opinião em contrário, discordam da Douta Sentença proferida nos presentes autos, a qual decidiu julgar totalmente improcedente a presente oposição à execução mediante embargos de executado e, em consequência, determinou o prosseguimento da instância da acção executiva apensa.

2 - A execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figura como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor, assim se configurando a legitimidade numa ação executiva (artigo 53º, n.º 1 do CPCivil).

3 -  Da (inexistente e extemporânea) Nota Discriminativa e Justificativa das Custas de Parte junta aos autos com o requerimento executivo de que a presente Oposição à Execução mediante Embargos de Executado são apensos, consta como pretensos credores S... - ACABAMENTOS TÊXTEIS, S.A., EE e FF.

4 - Sucede que, a execução de que a presente Oposição à Execução mediante Embargos de Executado são apensos, foi promovida apenas e tão só por um dos pretensos credores a saber S... - ACABAMENTOS TÊXTEIS, S.A., desacompanhada pelos demais.

5 - Pelo exposto a exequente S... - ACABAMENTOS TÊXTEIS, S.A. carece de legitimidade ativa para promover ela sozinha a execução de que os presentes embargos de executado são apensos.

6 - Pelo exposto deverá ser proferida decisão a julgar procedente a invocada excepção de ilegitimidade, declarando-se assim extinta a acção executiva de que a presente Oposição à Execução mediante Embargos de Executado são apensos.

7 - A Exequente com o seu douto requerimento executivo, omitiu de forma consciente e voluntária, factos e decisões que implicam de uma forma clara e cristalina a inexistência de título executivo nos autos executivos de que esta oposição à execução mediante embargos de executada é apensa, bem como a violação do caso julgado anterior.

8 - No âmbito da Ação de Processo Comum que com o processo n.º 40/18...., correu termos pelo Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo Central Cível ... - Juiz ..., em que os ora Embargantes foram Autores e a Exequente (conjuntamente com EE e FF) foram Réus, os Embargantes foram Notificados da Nota Discriminativa e Justificativa das Custas de Parte apresentada pelos aí Réus e ora Exequente em 13/12/2018, com a referência citus 7985426.

9 - No âmbito desse mesmo processo, os Embargantes em 21/12/2018, com a refªcitius ...51, RECLAMARAM dessa mesma da Nota Discriminativa e Justificativa das Custas de Parte, apresentada pelos aí Réus e ora Exequente em 13/12/2018, com a referência citus 7985426, por inobservância do formalismo a que a lei obriga nos termos do disposto no art.º 25º do RCP - envio da mesma à contraparte - deve-se considerar precludido o direito dos aí Réus e da ora Exequente, não se considerando devidas, por conseguinte, as custas de parte reclamadas pelos aí Réus e pela ora Exequente.

10 - No âmbito desse mesmo processo e na sequência dessa RECLAMAÇÃO apresentada pelos Autores ora Embargantes em relação à Nota Discriminativa e Justificativa das Custas de Parte apresentada pelos aí Réus e ora Exequente em 13/12/2018, com a referência citus 7985426, em 21/01/2019, foi proferida Douta Decisão com a refª citius ...32, JÁ TRANSITADA EM JULGADO, a qual se pronunciando-se sobre a RECLAMAÇÃO apresentada pelos Autores ora Embargantes relativamente Nota Discriminativa e Justificativa das Custas de Parte apresentada pelos aí Réus e pela ora Exequente em 13/12/2018, decidiu-se o seguinte:
“Pelo exposto, vai atendida a reclamação dos autores, não se considerando devidas, por conseguinte, as custas de parte reclamadas pelos réus.“

11 - A referida decisão judicial que recaiu sobre a reclamação dos Autores ora Embargantes em relação à Nota Discriminativa e Justificativa das Custas de Parte apresentada pelos aí Réus e pela ora Exequente em 13/12/2018, com a referência citus 7985426,

12 - Foi devidamente notificada ao mandatário dos aí Réus e da ora Exequente em 24/01/2029, com a refª citius ...44.

13 - Não obstante o valor da Nota Discriminativa e Justificativa das Custas de Parte apresentada pelos aí Réus e ora Embargantes ser de € 7.752,00 e como tal admitir recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães nos termos do artigo 644º, n.º 2 do CPC,

14 - A mesma decisão judicial não foi objeto de qualquer reclamação ou recurso por parte dos aí Réus e da ora Exequente, para o Tribunal da Relação de Guimarães,

15 - Tendo assim os aí Réus e a ora Exequentes se conformado com a decisão constante da mesma decisão proferida relativamente à reclamação dos aí Autores ora Embargantes em relação à Nota Discriminativa e Justificativa das Custas de Parte apresentada pelos aí Réus e pela ora Exequente em 13/12/2018, com a refereência citus 7985426, no que concerne a “não se considerarem devidas, por conseguinte, as custas de parte reclamadas pelos réus.“

16 - Tendo dessa forma a mesma decisão judicial que recaiu sobre a reclamação dos autores ora Embargantes em relação à Nota Discriminativa e Justificativa das Custas de Parte apresentada pelos aí Réus e ora Exequente em 13/12/2018, com a referência citus 7985426, transitado em julgado,

17 - Ocorrendo assim a figura AUTORIDADE DE CASO JULGADO nos termos e para os efeitos previstos nas artigos 581, 619 e 621 do C.P.Civil,

18 - Motivo pelo qual verifica-se assim a INEXISTÊNCIA DE TITULO EXECUTIVO na execução de que estes autos de oposição à execução mediante embargos de executado, são apensos,

19 - Julgada certa questão em acção que correu entre determinadas partes esta impõe-se necessariamente em todas as acções que venham a correr termos entre as mesmas partes, ainda que incidindo sobre um objecto diverso, desde que a sua apreciação dependa decisivamente do objecto previamente julgado, perspectivado como relação condicionante da relação material controvertida na acção posterior.

20 - A autoridade do caso julgado veda, assim, a reclamação de novos pedidos assentes em questão conexa ou prejudicial discutida entre as partes em anterior acção.

21 - A autoridade de caso julgado implica uma aceitação de uma decisão proferida numa ação anterior, decisão esta que se insere, quanto ao seu objeto, no objeto da segunda ação, enquanto questão prejudicial, constituindo, assim, uma vinculação à decisão de distinto objeto posterior.

22 - Ao abrigo da autoridade do caso julgado não é admissível a repetição de uma causa, não pode ser novamente apreciada a mesma questão, estando o tribunal vinculado à primeira decisão.

23 - Pelo supra exposto, devem os Embargantes ser absolvidos de todo o Pedido Executivo, nada devendo aos Exequentes relativamente a título de custas de parte reclamadas pelos Exequentes no âmbito da Ação de Processo Comum que com o processo n.º 40/18...., correu termos pelo Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo Central Cível ... - Juiz ..., em que os ora Embargantes foram Autores e a Exequente (conjuntamente com EE e FF) foram Réus.

24 - O artigo 25º, n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais, estipula o seguinte:
Até 10 dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respetiva nota discriminativa e justificativa, sem prejuízo de esta poder vir a ser retificada para todos os efeitos legais até 10 dias após a notificação da conta de custas

25 - A nota discriminativa e justificativa de custas de parte junta à execução de que a presente Oposição à Execução mediante Embargos de Executado são apensos foi remetida apenas em 04/03/2022.

26 - O acórdão do STJ que pôs termo a Ação de Processo Comum que com o processo n.º 40/18...., correu termos pelo Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo Central Cível ... - Juiz ..., foi notificado às partes no dia 12.11.2018, tendo transitado em julgado no dia 27.11.2018,

27 - Pelo que, se contados cinco dias a partir dessa data, a nota discriminativa e justificativa de custas de parte foi extemporaneamente apresentada, já que o foi apenas em 04/03/2022, ou seja, bem mais de 1.194 dias após o trânsito em julgado da decisão.

28 - Pelo exposto, deve ser julgada extemporânea e improcedente a nota discriminativa e justificativa de custas de parte apresentada pelos aí Réus e ora Exequente aos ora Embargantes em 04/03/2022.

29 - Pelo exposto, deverá ser proferida decisão a julgar procedente a invocada excepção da extemporaneidade da Nota Discriminativa e Justificativa de Custas de Parte apresentada pelos aí Réus e pela ora Exequente aos ora Embargantes em 04/03/2022, declarando-se assim extinta a acção executiva de que a presente Oposição à Execução mediante Embargos de Executado são apensos.

30 - Foram assim violados os artigos:
• Artigo 53º, n.º 1 do CPC,
• Art.º 25º, n.º 1 do RCP,
• Artigo 644º, n.º 2 do CPC,
• Artigos 581, 619 e 621 do C.P.C.

31 - Pelas razões de facto e de direito supra expostas, deverá a Douta Sentença ora recorrida ser revogada e substituída por Douto Acórdão que julgue totalmente procedente a presente Oposição à execução mediante embargos de executado e, em consequência, determine que os Embargantes/Executados sejam absolvidos totalmente de todos os pedidos deduzidos contra eles pela Embargada/Exequente, devendo ser julgada totalmente extinta a acção executiva apensa, com as demais consequências legais daí decorrentes.
*
1.2.2. Contra-alegações
A Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.) contra-alegou, pedindo que se julgasse o recurso totalmente improcedesse.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo as respectivas conclusões ipsis verbis):

1 - A obrigação exequenda consiste assim numa obrigação plural solidária quer da parte activa, quer da parte passiva. Na medida em que, existe pluralidade de sujeitos, quer na relação obrigacional passiva, quer na relação obrigacional activa.

2 - Por força do disposto no art. artigo 512.º do CC, qualquer dos Exequentes/credores das custas de parte tem a faculdade de exigir dos Executados/devedores das custas de parte a prestação por inteiro e, assim sendo, a prestação efetuada pelos Executados a qualquer dos Exequentes libera os restantes.

3 - A Recorrida. pode promover sozinha a execução contra os aqui Recorridos por ter legitimidade ativa para o efeito, nos termos do art. 512º do C.C. observando-se, assim, o disposto no artigo 53.º do CPC, uma vez que foi promovida por quem figurava como credor, no título executivo, contra quem detinha a posição de devedor, no mesmo título executivo.

SEM PRESCINDIR

• Da alegada violação da autoridade de caso julgado

4 - É a partir do momento em que é proferida sentença de condenação em custas, que se constitui a obrigação, tornando-se esta suscetível de ser executada, uma vez que tal condenação é, nos termos e para os efeitos do artigo 703.º do CPC, título executivo.

5 - A nota justificativa e discriminativa das custas de parte constitui o requerimento inicial do incidente de liquidação das custas de parte, previsto nos artigos 25.º a 26º A do RCP.

6 - Dispõe o art. 621º do CPC, que os despachos/sentenças constituem caso julgado nos precisos limites e termos em que julga e se a parte decaiu por não ter sido praticado determinado facto, a sentença não obsta a que o pedido se renove quando o facto se pratique.

7 - Como a sentença proferida no âmbito da reclamação da nota discriminativa não incidiu sobre mérito da causa, mas apenas se manteve no âmbito da relação processual, o caso julgado formal, não estende a produção dos seus efeitos aos presentes autos, seja pela via do caso julgado, ou autoridade do caso julgado, pelo que não se verifica a alegada exceção.

AINDA SEM PRESCINDIR

• Da alegada extemporaneidade/caducidade da nota discriminativa

8 - A apresentação tardia da nota discriminativa e justificativa das custas de parte não implica nem a caducidade do direito a reclamar as custas de parte, nem a prescrição do correspondente direito de crédito. Apenas gera a preclusão do ato processual de apresentação da nota no próprio processo.

9 - O prazo de apresentação da nota discriminativa aos vencidos prevista no artigo 25.º do RCP é um prazo processual e adjetivo e a falta de remessa da nota de custas, no prazo estabelecido pelo art.º 25.º do RCP, não conduz à prescrição do direito de crédito da parte vencida, podendo o Credor, fazê-lo valer em sede executiva.

10 - O direito de crédito da Recorrida sobre os Recorrentes não se extinguiu, dispondo a primeira de título executivo, composto pela sentença judicial condenatória e pela nota de liquidação, pelo que se impõe, declarar totalmente improcedente o recurso interposto pelos Executados/Embargados.
*
II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR

2.1. Objecto do recurso - EM GERAL

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC) [1].
Não pode igualmente este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida) [2], uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de prévias decisões judiciais (destinando-se, por natureza, à sua reapreciação/reponderação e consequente alteração e/ou revogação, e não a um novo reexame da causa).
*
2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar

Mercê do exposto, e do recurso de apelação interposto pelos Embargantes/ Executados (AA, BB, CC e DD), 03 questões foram submetidas à apreciação deste Tribunal ad quem:

1.ª - Fez o Tribunal a quo uma errada interpretação e aplicação do Direito, nomeadamente por a Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.) não ter legitimidade para interpor sozinha a acção executiva, devendo ser alterada a decisão de mérito proferida, por forma a que se julgue extinta aquela com esse fundamento ?
 
2.ª - Fez o Tribunal a quo uma errada interpretação e aplicação do Direito, nomeadamente por ocorrer violação da autoridade de caso julgado formado sobre decisão anterior (que teria julgado inexigíveis as custas de parte reclamadas nos autos principais), devendo ser alterada a decisão de mérito proferida, por forma a que se julgue inexigível a obrigação exequenda e extinta a acção executiva com esse fundamento ?

3.ª - Fez o Tribunal a quo uma errada interpretação e aplicação do Direito, nomeadamente por o crédito exequendo estar a ser exigido de forma extemporânea, devendo ser alterada a decisão de mérito proferida, por forma a que se julgue inexigível a obrigação exequenda e extinta a acção executiva com esse fundamento ?
*
III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

3.1. Factos Provados
O Tribunal a quo considerou provados os seguintes os factos (não impugnados por qualquer das partes e, por isso, definitivamente assentes), aqui apenas reordenados (lógica e cronologicamente), renumerados e completados (nos termos do art. 607.º, n.º 4, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, ambos do CPC):

1 - AA, BB, CC e DD (aqui Embargantes/Executados) intentaram uma acção declarativa contra S... - Acabamentos Têxteis, S.A. (aqui Embargada/Exequente), BB e FF (acção que correu termos sob o n.º 40/18...., pelo Juízo Central Cível ..., Juiz ...), pedindo a condenação solidária dos aí co-Réus no pagamento da quantia global de € 445.000,00, a título de indemnização por um acidente de que resultou a morte do marido da 1.ª Embargante/Executada e pai dos demais Embargantes/Executados.
(facto enunciado no saneador-sentença recorrido sob o número 4)

2 - No Processo n.º 40/18.... (do Juízo Central Cível ..., Juiz ...) foi proferida decisão pelo Supremo Tribunal de Justiça, que transitou em julgado no dia 27 de Novembro de 2018.
(facto enunciado no saneador-sentença recorrido sob o número 7)

3 - Em 13 de Dezembro de 2018, no Processo n.º 40/18.... (do Juízo Central Cível ..., Juiz ...), a Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.), BB e FF (todos co-réus) apresentaram nos autos a sua nota discriminativa (que é documento junto a fls. 12, que aqui se dá por integralmente reproduzido), no valor de € 7.752,00, nos termos do disposto no art. 25.º, do RCP, nos seguintes termos:
. Taxa de justiça paga pela parte contrária:
a) € 2448,00 - taxa de justiça 1.ª instância - € 816,00, por cada co-réu;
b) Taxa de justiça 2.ª instância - € 816,00;
c) Taxa de justiça 3.ª instância - € 816,00;
. Honorários
d) 1.ª instância por cada co-réu - € 680,00;
e) 2.ª instância - réu que contra-alegou - € 816,00;
f) 3.ª instância - réu que contra-alegou- € 816,00;
g) - Decaimento:
h) 1.ª instância – 100%;
i) 2.ª instância – 100%;
j) 3.ª instância -100%;
. Valor total da nota justificativa e discriminativa:
k) Custas de parte devidas a BB - € 1496,00;
l) Custas de parte devidas a FF - € 1496,00;
m) 1.ª instância S..., S.A. - € 1496,00;
n) 2.ª instância S..., S.A. - € 1632,00;
o) 3.ª instância S..., S.A. - € 1632,00.
(facto enunciado no saneador-sentença recorrido sob o número 3)

4 - Os Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD) apresentaram reclamação à nota discriminativa apresentada Processo n.º 40/18.... (do Juízo Central Cível ..., Juiz ...), alegando o incumprimento dos requisitos previstos no art. 25.º, do RCP, designadamente a falta de remessa da mesma directamente à parte vencida, lendo-se nomeadamente na dita reclamação:
«(…)
O mandatário dos Autores foi notificado pelo Ilustre mandatário dos Réus, via mail e via citius Citius, do requerimento junto aos autos em 13/12/2018, com a referência citus 7985426.
Nesse requerimento, parece ser intenção do Réus, solicitar o pagamento de custas de parte aos Autores.
Sucede que,
Dispõe o nº 1 do Art.º 25 do RCP (Regulamento das Custas Processuais), introduzido pela Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, que “Até cinco dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respectiva nota discriminativa e justificativa”.
E nos termos do nº 1 do art. 31º da Portaria 419-A/2009 de 17 de Abril “As partes que tenham direito a custas de parte devem enviar para o tribunal e para a parte vencida a respectiva nota discriminativa e justificativa, nos termos e prazos previstos no artigo 25º do RCP”.
Acrescenta o n.º 2 deste normativo que “Quando a parte vencedora beneficie de conversão de taxa de justiça a título de pagamento antecipado de encargos, nos termos do artigo 22.º do RCP, identifica separadamente, na nota justificativa das custas de parte:
a) A quantia paga a título de taxa de justiça;
b) A quantia convertida a título de pagamento antecipado de encargos;
c) A quantia efectivamente paga a título de encargos;
d) O valor da soma da alínea a) com a alínea b) deduzido da alínea c) que corresponde ao valor pago a título de taxa de justiça e de encargos”.
Resulta dos autos que os Réus enviaram um requerimento para o Tribunal com a nota discriminativa e justificativa das quantias devidas a título de custas de parte tendo o mandatário dos Autores sido notificado, via mail e via citius, da apresentação dessa nota discriminativa e justificativa.
Entendem os Autores, que deveriam ter sido interpelados pessoalmente, uma vez que não estamos perante um acto processual, não se aplicando o disposto nos artigos 221 e 225 do CPC, relativo às notificações entre Mandatários.
Veja-se a este titulo o recente Acórdão de 9 de Janeiro de 2017 da Relação do Porto proferido no Processo n.º 1388/09.3TBPVZ-A.P1, no qual se decidiu que a comunicação referida nos normativos supra citados deve obrigatoriamente ser efectuada não só ao mandatário da parte vencida mas também á própria parte.
A lei - preceitos supra citados - é bem clara quando impõe que seja remetida a nota discriminativa e justificativa para o tribunal e também para a parte vencida (e, quando for o caso, elabora outra comunicação e envia-a para o agente de execução).
Afigura-se-nos que a lei não permite à parte vencedora remeter apenas a nota discriminativa e justificativa ao tribunal e notificar (via mail ou citius) a parte contrária desta remessa.
A letra da lei não permite a interpretação feita pela decisão recorrida, impondo expressamente o envio de comunicações autónomas para o Tribunal e para a parte.
Como se afirma no Acórdão da Relação do Porto citado, esta interpretação é aquela que deve ser seguida “por ser aquela que:
a) Está mais próxima do texto da lei;
b) Gera menos dúvidas na mente do destinatário a quem a lei se dirige.
c) Não tem aptidão para gerar prejuízos às partes (caso da falta de reclamação a fazer dentro do prazo de 10 dias a contar da data da comunicação), por estas seguirem uma interpretação que depois o tribunal poderá considerar ter sido indevida”.
Atento a redacção do nº 1 do Art.º 25 do RCP (Regulamento das Custas Processuais), supra citado, a parte vencedora tem de notificar a parte vencida não podendo considerar-se como notificação validamente efectuada o facto de se dar conhecimento (via mail e via notificação electrónica) através da plataforma citius ao mandatário da parte vencida da reclamação apresentada em Tribunal.
Desta forma podemos afirmar que não obstante o mandatário da parte vencida ter acesso ao citius e ter conhecimento, por mail e por essa via, da reclamação, a lei (art. 25º, n.º 1 do RCP) não se basta com esse conhecimento, antes exige que a notificação seja feita, não pelo tribunal ou por via citius, mas pela própria parte vencedora à própria parte vencida.
Assim, não basta que a parte credora das custas comunique a nota discriminativa e justificativa ao tribunal e notifique (via mail ou via citius), na pessoa do Mandatário, esta comunicação à parte devedora das custas.
Dito de outro modo, sendo o mandatário da parte vencida notificado, via mail ou via citius, da apresentação em Tribunal da nota discriminativa e justificativa das custas de parte a mesma não pode valer como se o envio tivesse sido efectuado para a parte que representa, pois que a lei impõe o envio daquela nota para a própria parte vencida.
Por isso “O envio para o Tribunal de nota discriminativa e justificativa de custas de parte dando-se conhecimento desse facto (notificação electrónica) ao mandatário da parte vencida, não vale como se o envio daquela nota discriminativa e justificativa de custas de parte tivesse sido efectuado para a própria parte, não devendo a mesma considerar-se interpelada para pagar”.
Não tendo os Réus cumprido o que a lei estabelece, está irremediavelmente, precludida a possibilidade de exercer o direito.
Pelo que se afigura aos Autores, que ao ser apreciado o requerimento supra identificado, deve V. Exa., por inobservância do formalismo a que a lei obriga nos termos do disposto no art.º 25º do RCP - envio da mesma à contraparte - proferir decisão que ordene o desentranhamento do mesmo.
Mais se requerendo a V. Exa. se digne considerar precludido o direito dos Réus ao exercício do direito, na medida em que há muito decorreu o prazo de que dispunham para interpelação dos ora Reclamantes Autores.
Veja-se a esse propósito o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, processo n.º 13884/14.6T8PRT-A.P1, de 18-04-2017, Relator SOUSA LAMEIRA, o qual decidiu o seguinte: ”A mera notificação à parte vencida da apresentação em tribunal da nota discriminativa e justificativa de custas de parte não vale como envio à própria parte da mesma nota para efeitos de interpelação para pagar”.
(…)»
(facto enunciado no saneador-sentença recorrido sob o número 5)

5 - Em 22 de Janeiro de 2019, no Processo n.º 40/18.... (do Juízo Central Cível ..., Juiz ...), o Tribunal considerou que no caso dos autos a parte vencedora se limitara efectivamente a comunicar à parte vencida de que enviara a nota justificativa para Tribunal, que mais não era do que a comunicação a este (sem menção de que, com a notificação desse requerimento, a parte vencida deveria considerar igualmente efectuada a notificação que o n.º 1, do art. 25.º, do RCP, determina que seja feita, também, a si); e, por isso, atendou a reclamação dos aí Autores, considerando não serem devidas naquela instância as custas de parte reclamadas no processo, lendo-se nomeadamente no seu despacho:
«(…)
Os autores reclamantes alegam também que a nota não lhes foi enviada pessoalmente, entendendo, por conseguinte, não estarem verificados os pressupostos para atribuição, à autora, de quaisquer verbas a este título – nº 1 do art. 25º do RCP, a contrario.
Considero que neste ponto lhes assiste razão, muito embora não concorde inteiramente com interpretação que fazem da jurisprudência que citam.
Concretizando, no Ac. do TRP de 09.01.2017 (Rel. ALBERTO RUÇO), decidiu-se que “[q]uando no n.º 1 do artigo 25.º do Regulamento de Custas Processuais se dispõe que “…as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respectiva nota discriminativa e justificativa», o intérprete e destinatário da norma adquire a convicção de que a parte passiva receberá da parte vencedora uma comunicação pessoal (autónoma, em relação às comunicações também previstas quanto ao tribunal e ao agente de execução), do tipo “Exmo. Sr./Sra. …”, seguindo-se depois o nome da parte em questão e o texto com a finalidade da comunicação. (…) Não basta, por isso, que a parte credora das custas comunique a nota discriminativa e justificativa ao tribunal e notifique desta comunicação a parte devedora das custas, salvo se conjuntamente exarar uma declaração em que declare à parte devedora das custas que, com a comunicação em causa, também já está a fazer à parte devedora a comunicação prevista no n.º 1 do referido artigo 25. do RCP”.
Isso não significa que a comunicação à parte vencida não possa operar através do seu mandatário, como representante da mesma: a notificação à parte através do mandatário é perfeitamente válida, sendo essa, de resto, a prática corrente. O que parte vencedora não pode é abster-se de efectuar essa notificação, limitando-se a enviar a comunicação para o tribunal e notificando o mandatário da contraparte desse envio.
No mínimo, impõe-se consignar, nessa notificação, que, por via desta, está também a efectuar a comunicação à parte a que alude o art. 25º do RCP.
Também no TRP de 18.04.2017 (Rel.: SOUSA LAMEIRA) se afirma que «[o] envio para o Tribunal de nota discriminativa e justificativa de custas de parte dando-se conhecimento desse facto (notificação electrónica) ao mandatário da parte vencida [não] vale como se o envio daquela nota discriminativa e justificativa de custas de parte tivesse sido efectuado para a própria parte, devendo considerar- e interpelada para pagar.
Como se referiu, isso não significa que a notificação à parte não possa ser efectuada através do seu mandatário.
Contudo, essa notificação há-de ser distinta da comunicação ao tribunal ou, pelo menos, há-de estar autonomizada em termos que permitam à parte vencida perceber que está em causa uma interpelação para pagamento.
Como se desenvolve no primeiro dos citados arestos, “[a] interpretação mais benigna é (…): a parte credora deve remeter uma comunicação dirigida pessoalmente à parte (ao seu advogado) devedora exigindo o pagamento, só então se iniciando o prazo para a impugnação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte” - sublinhado acrescentado. Isto porque, desde logo, «(…) a comunicação da nota discriminativa e justificativa das custas é uma interpelação para pagamento. Ora, uma interpelação para pagamento ainda que feita de modo tácito, tem de ser pessoal e inequívoca quanto à exigência do pagamento imediato. Porém, comunicar-se à outra parte que foi remetida a tribunal aquela nota discriminativa e justificativa, não configura uma exigência de pagamento imediato e daí que não valha como declaração tácita; não é o mesmo que declarar à parte «estou-lhe a exigir, desde já, esta quantia, pague-me», mas apenas comunicar-lhe a quantia que comunicou ao processo como sendo a devida.
No caso dos autos, a parte vencedora limitou-se efectivamente a comunicar à parte vencida de que enviou a nota justificativa para o tribunal – veja-se o requerimento de fls. 429 ss., que mais não é do que a comunicação ao tribunal, sem menção, no próprio, de que, com a notificação desse requerimento, a parte vencida deveria considerar igualmente efectuada a notificação que o nº 1 do art. 25º do RCP determina seja feita, também, a si.
Pelo exposto, vai atendida a reclamação dos autores, não se considerando devidas, por conseguinte, as custas de parte reclamadas pelos réus.
Notifique.
(…)»
(facto enunciado no saneador-sentença recorrido sob o número 6)

6 - Em 04 de Março de 2022, a Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.) reclamou o pagamento do seu crédito através de missiva registada, na qual interpelou os Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD) para o pagamento da quantia de € 7.752,00.
(facto enunciado no saneador-sentença recorrido sob o número 8)

7 - Em 4 de Maio de 2022, a Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.) intentou uma acção executiva com o n.º 2539/22...., de que os presentes autos são apenso, contra os Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD), para cobrança da quantia de € 7.752,00, acrescida de juros vencidos até efectivo e integral pagamento.
(facto enunciado no saneador-sentença recorrido sob o número 1)

8 - A Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.) deu à execução três decisões judiciais, transitadas em julgado, proferidas no Processo n.º 40/18.... (do Juízo Central Cível ..., Juiz ...), nas quais os Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD) foram condenados a pagar as custas da acção e dos recursos.
(facto enunciado no saneador-sentença recorrido sob o número 2)

9 - Em 31 de Maio de 2022, por auto de penhora, e para pagamento da quantia exequenda de € 7.752,00, acrescida de despesas prováveis, no valor de € 1.530,20, foi efectuada a penhora:

· Verba 1 - saldo da conta bancária de depósitos a prazo, com a identificação  ...00, no valor de € 8.915,71, que a 1.ª Embargante/Executada (AA) detém junto da Banco 1..., S.A..

· Verba 2 - saldo da conta bancária de depósitos a prazo com a identificação  ...00, no valor de € 4.641,10, que o 4.º Embargante/Executado (DD) detém junto da Banco 1..., S.A..
(factos enunciados no saneador-sentença recorrido sob os números 9,10 e 11)
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3.2. Factos não provados

Na mesma decisão, o Tribunal a quo considerou que, com «relevância para a decisão da causa não resultou demonstrado mais nenhum facto».
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IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

4.1. Legitimidade activa em acção executiva
4.1.1.1. Legitimidade do exequente (em geral)

Lê-se no art. 10.º, n.º 5, do CPC, que toda «a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva».
Mais se lê, no art. 53.º, n.º 1, do mesmo diploma, que a «execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor».
«Apela-se, assim, à literalidade do título executivo, seja ele sentença, contrato, título de crédito ou qualquer outro. Num certo sentido, a legitimidade singular executiva apura-se por confronto entre o título executivo e as partes da causa» (Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL Editora, Junho de 2018, pág. 278, com bold apócrifo).
Compreende-se, por isso, que se afirme, não se dizendo «no preceito em causa que são partes legítimas, como exequente e executado, credor e devedor, respectivamente, mas aqueles que no título figurem nessas qualidades», «vale por dizer que uma pessoa pode aparecer no título na posição de credor ou de devedor sem que seja realmente titular de um direito de crédito ou sujeito de uma obrigação. Apenas o título executivo faz presumir a existência de um crédito e de uma dívida» (Fernando Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 12.ª edição, Almedina, Janeiro de 2010, pág. 74).
«Daqui resulta que há ilegitimidade singular na ação executiva se o exequente ou o executado, apesar de partes processuais, não são os sujeitos do título executivo». Já se a dívida exequenda não existe efectivamente, «isso não tolhe a legitimidade inicial das partes, sendo já do domínio da procedência da pretensão do autor, executiva» (Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL Editora, Junho de 2018, pág. 293).
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4.1.1.2. Obrigações solidárias - Litisconsórcio voluntário
4.1.1.2.1. Obrigações solidárias

Lê-se no art. 512.º, do CC, que a «obrigação é solidária, quando cada um dos devedores responde pela prestação integral e esta a todos libera, ou quando cada um dos credores tem a faculdade de exigir, por si só, a prestação integral e esta libera o devedor para com todos eles».
Recorda-se, a propósito, que, no «âmbito do direito civil, as obrigações são singulares (aquelas em que tem apenas um titular do lado activo - um credor - e um só titular do lado passivo - um devedor) ou plurais (aquelas em que são dois ou mais os titulares do lado activo ou do lado passivo da relação, ou de um e outro simultaneamente), podendo a pluralidade ser activa (quando são vários os credores) ou passiva (quando são vários os devedores) ou activa e passiva (quando são vários os sujeitos de um e outro lado da relação obrigacional)» (Antunes Varela, Das obrigações em Geral, Volume I, 10.ª edição, Almedina, 2000, pág. 744).
Ora, perante uma obrigação solidária plural, com pluralidade de sujeitos, sendo: activa, existe o direito a toda a prestação por parte dos credores, e extingue-se a obrigação com o cumprimento pelo devedor de toda a obrigação assumida perante os credores solidários a um desses credores; e sendo passiva, existe o direito de exigir toda a prestação de qualquer devedor, e extingue-se a obrigação do credor em relação a todos os devedores solidários com o cumprimento da obrigação ao credor por um dos devedores solidários
Compreende-se, por isso, que se afirme que «as obrigações solidárias identificam-se pela especial participação dos sujeitos nos débitos e nos créditos: cada devedor pode ser chamado a satisfazer a totalidade da prestação e cada credor pode exigir a realização da totalidade da prestação; o cumprimento feito por um dos condevedores e a realização da prestação a um dos credores extingue o vínculo em relação aos restantes» (Ana Afonso, Comentário ao Código Civil. Direito das Obrigações: das Obrigações em Geral, Universidade Católica Editora, 2018).

Mais se lê, no art. 513.º, do CC, que a «solidariedade de devedores ou credores só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes».
Por fim, lê-se no art. 497.º, n.º 1, do CC, que, se «forem várias as pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade».
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4.1.1.2.2. Litisconsórcio voluntário

Lê-se no art. 32.º, n.º 1, do CPC, que, se «a relação material controvertida respeitar a várias pessoas, a ação respetiva pode ser proposta por todos ou contra todos os interessados; mas, se a lei ou o negócio for omisso, a ação pode também ser proposta por um só ou contra um só dos interessados, devendo o tribunal, nesse caso, conhecer apenas da respetiva quota-parte do interesse ou da responsabilidade, ainda que o pedido abranja a totalidade».
Mais se lê, no n.º 2, do mesmo preceito, que, se «a lei ou o negócio permitir que o direito seja exercido por um só ou que a obrigação comum seja exigida de um só dos interessados, basta que um deles intervenha para assegurar a legitimidade».
Precisa-se ainda que o «conceito e o regime do litisconsórcio são, na ação executiva, os mesmos que na ação declarativa» (José Lebre de Freitas, A Ação Executiva Depois da Reforma da Reforma, Coimbra Editora, 5.ª edição, pág. 135).
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4.1.1.3. Crédito por custas de parte

Lê-se no art. 527.º, n.º 1, do CPC, que a «decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito».
O mesmo é reiterado no art. 607.º, n.º 6, do CPC, onde se lê que, no «final da sentença, deve o juiz condenar os responsáveis pelas custas processuais, indicando a porporção da respetiva responsabilidade».

Mais se lê, no art. 529.º, n.º 1, do CPC, que as custas processuais (lato sensu) «abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte».
Do mesmo modo se dispõe no art. 3.º, n.º 1, do RCP, onde se lê que as «custas processuais compreendem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte».
Com efeito, está pacificamente aceite que a garantia constitucional do acesso ao Direito (art. 20.º da CRP) não postula a gratuidade no acesso à justiça: a actividade jurisdicional não é exercida gratuitamente, impendendo sobre os litigantes o ónus de pagar determinadas taxas para que possam pôr em marcha a máquina da justiça; e têm de satisfazer, no final do processo, todas as quantias de que o Tribunal se não haja embolsado por meio daquele adiantamento (conforme José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume II, Coimbra Editora, 1981, pág. 199).
Reconhece-se, assim, uma certa liberdade ao legislador, na determinação dos concretos encargos (espécie e montantes) a suportar pelo utente do serviço [3].
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Precisando, lê-se no art. 529.º, n.º 2, do CPC, que a «taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa, nos termos do Regulamento das Custas Processuais» [4].
Do mesmo modo se dispõe no art. 6.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais [5], onde se lê que a «taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A, que faz parte integrante do presente Regulamento».
Mais se lê, no art. 530.º, n.º 1, do CPC, que a «taxa de justiça é paga apenas pela parte que demande na qualidade autor ou réu, exequente ou executado, requerente ou requerido, recorrente e recorrido, nos termos do disposto no Regulamento das Custas Processuais».
Logo, a taxa de justiça é suportada exclusivamente pelo requerente (para promoção de acções e recursos, bem como de determinados incidentes, ou para os contraditar), enquanto impulsionador do processo (isto é, quer do lado activo, quer do lado passivo) e à medida que o faz [6]. A obrigação do seu pagamento não é, por isso, exclusiva da parte vencida: a parte vencedora também está obrigada ao seu pagamento, como contrapartida da prestação de um serviço público [7].
Ora, sendo a taxa de justiça suportada exclusivamente pelo requerente, enquanto impulsionador do processo, e à medida que o faz, vindo o mesmo a obter vencimento na acção, terá então o direito a ser ressarcido pela parte vencida das custas que teve de suportar (ocorrendo esse ressarcimento precisamente no quadro do regime das custas de parte) [8].

Com efeito, lê-se no art. 529.º, n.º 4, do CPC que as «custas de parte compreendem o que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada em virtude da condenação da parte contrária, nos termos do Regulamento das Custas Processuais».
Logo, as custas de parte são integradas pelas despesas que as partes são obrigadas a fazer para garantirem o impulso processual necessário ao desenvolvimento da lide, idónea à prolação de uma decisão que potencialmente as beneficia [9]; e, por isso, no final do pleito, deverão tais despesas ser restituídas, pela parte que tenha decaído à parte que tenha tido ganho de causa (já que, precisamente para o ter, se viu na necessidade de as suportar).
Mais se lê, no art. 533.º, do CPC, que «as custas da parte vencedora são suportadas pela parte vencida, na proporção do seu decaimento e nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais» (n.º 1), nelas se compreendendo as «taxas de justiça pagas», os «encargos efectivamente suportados pela parte», as «remunerações pagas ao agente de execução e as despesas por este efectuadas» e os «honorários do mandatário e as despesas por este efectuadas» (n.º 2).
Do mesmo modo se dispõe no art. 26.º, n.º 3, do RCP, onde se lê que nas custas de parte - em que é condenada a parte vencida - se contêm: os valores de taxa de justiça pagos pela parte vencedora, na proporção do vencimento; os valores pagos pela parte vencedora a título de encargos, incluindo as despesas do agente de execução; 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, para compensação a esta última das despesas com honorários do mandatário judicial, desde que sejam discriminados na nota justificativa e não excedam aquele montante; e os valores pagos a título de honorários de agente de execução [10].
Logo, a parte vencedora pode proceder ao acerto da distribuição das custas em função do vencimento verificado a final, sendo este apenas apurado com o trânsito em julgado da decisão que o defina; e repercutindo-se (v.g. alterando-as) nas custas provisórias das eventuais e anteriores instâncias, inclusive recursivas. Exigirá, então, da parte vencida aquilo que pagou em excesso (face ao dito vencimento).
Compreende-se, assim, que se leia no art. 26.º, n.º 1, do RCP, que as «custas de parte integram-se no âmbito da condenação judicial por custas».
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Por fim, lê-se no art. 537.º, n.º 3, do CPC, que, no «caso de condenação por obrigação solidária, a solidariedade estende-se às custas»; e lê-se no art. 528.º, n.º 1, do CPC, que, tendo «ficado vencidos, na totalidade, vários autores ou vários réus litisconsortes, estes respondem pelas custas em partes iguais».
Precisa-se, apenas, que a decisão judicial condenatória assim proferida, constitutiva do crédito de custas e correspondente débitos, constitui título executivo, para efeito de exigência desta obrigação imputada à parte vencida (conforme art. 703.º, n.º, al. a), do CPC).
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4.1.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)

Concretizando, verifica-se os Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD) demandaram a  Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A), juntamente com  BB e FF, pedindo a condenação solidária dos co-Réus no pagamento de uma indemnização pelo acidente que vitimou o marido da 1.ª Embargante/Executada e pai dos demais Embargantes/Executados, com fundamento em responsabilidade civil.
Logo, a obrigação em causa era, por disposição expressa da lei, solidária, tendo os ali Autores actuado o seu direito em litisconsórcio voluntário, quer activo, quer passivo.
Vindo a acção a ser julgada improcedente, em todas as instâncias de recurso ordinário, foram os seus Autores condenados nas custas respectivas, nelas se incluindo as custas de parte.
Logo, constituiu-se então uma obrigação solidária dos ali Autores, enquanto devedores, relativa ao pagamento das ditas custas de parte; e, por isso, podia cada um dos ali Réus, enquanto credores respectivos, exigir de qualquer um daqueles primeiros a prestação por inteiro, sendo que a prestação efetuada por qualquer deles liberaria todos os demais.
                       
Improcede, assim, o primeiro fundamento do recurso de apelação dos Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD), relativo à alegada ilegitimidade da Embargada/Exequente.
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4.2. Caso julgado
4.2.1.1. Caso julgado material versus caso julgado formal

Lê-se no art. 619.º, n.º 1, do CPC, que, transitada «em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º».
Mais se lê, no art. do 628.º, do CPC, que uma decisão judicial «considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação».
Quando assim seja, segundo o critério da eficácia e nos termos dos arts. 619.º, n.º 1 e 620.º, n.º 1, ambos do CPC, terá força obrigatória: dentro do processo e fora dele, se for sentença ou despacho saneador que decida do mérito da causa (caso julgado material); ou apenas dentro do processo, se for sentença ou despacho que haja recaído unicamente sobre a relação processual (caso julgado formal).

Melhor precisando o caso julgado formal, enfatiza-se que «as decisões de forma desfrutam de força vinculativa de caso julgado apenas dentro do processo», excepto no caso previsto no n.º 1 do art. 101.º do CPC (Remédio Marques, A acção declarativa à luz do Código revisto, Coimbra Editora, pág. 646).
Logo, a questão só se levanta se existir uma primeira decisão proferida (de forma) no mesmo processo em que venha ser proferida uma segunda com o mesmo objecto. Compreende-se, por isso, que se afirme que o caso julgado formal «só é vinculativo no próprio processo (e respectivos incidentes que correm por apenso) em que a decisão foi proferida, obstando a que o juiz possa na mesma acção, alterar a decisão proferida - mas não impede que a mesma questão processual seja decidida em outra acção, de forma diferente pelo mesmo tribunal ou por outro tribunal» (Remédio Marques, A acção declarativa à luz do Código revisto, Coimbra Editora, pág. 644) [11].
 
Mais se lê, no art. 625.º, do CPC, que, havendo «duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumpre-se a que passou em julgado em primeiro lugar» (n.º 1); e é «aplicável o mesmo princípio à contradição existente entre duas decisões que, dentro do processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual» (n.º 2).
Logo, ocorrendo casos julgados contraditórios, a lei resolve apelando ao critério da anterioridade: vale a decisão contraditória sobre o mesmo objecto que tenha transitado em primeiro lugar, e ainda que estejam em causa decisões que, dentro do mesmo processo, versem sobre a mesma questão concreta [12].
Reforça-se, assim, com este artigo, a ideia de que o caso julgado formal previsto no 620º do CPC se refere à vinculação do Tribunal ao julgamento que fez sobre uma questão concreta da relação processual. Compreende-se, por isso, que se afirme que existe «violação do caso julgado formal, previsto no art. 620º, do Código de Processo Civil, quando o Tribunal, no mesmo processo, com as mesmas partes e reportando-se aos mesmos factos, verificados e atendidos já na primeira decisão, volta a decidir a mesma questão, nesse mesmo contexto processual, de forma diversa», outro tanto não sucedendo em hipótese inversa (Ac. da RG, de 17.05.2018, José Flores, Processo n.º 1053/15.2T8GMR-C.G1). 
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4.2.1.2. Efeitos de caso julgado

Do caso julgado decorrem dois efeitos essenciais (distintos, mas provenientes da mesma realidade jurídica): um negativo (excepção dilatória de caso julgado), de impossibilidade de qualquer tribunal, incluindo o que proferiu a decisão, voltar a emitir pronúncia sobre a questão decidida, isto é, impedindo que a causa seja novamente apreciada em juízo; e um positivo (força e autoridade de caso julgado), de vinculação do mesmo tribunal e, eventualmente de outros (estando em causa o caso julgado material), à decisão proferida [13].
Logo (e face aos arts. 576.º, n.º 1 e n.º 2, 577.º, al. i), 580.º e 581.º, todos do CPC), a excepção dilatória de caso julgado pressupõe o confronto de duas acções (uma delas contendo uma decisão já transitada em julgado), e a tríplice identidade entre ambas de sujeitos, de causa de pedir e de pedido; e visa o efeito negativo da inadmissibilidade da segunda acção, por forma a evitar a repetição de causas.
Já a força e autoridade de caso julgado decorre de uma anterior decisão que haja sido proferida, designadamente no próprio processo, sobre a matéria em discussão, e prende-se com a sua força vinculativa; e visa o efeito positivo de impor a primeira decisão, como pressuposto indiscutível da segunda decisão de mérito (podendo funcionar independentemente da tríplice identidade exigida pela excepção) [14].
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O caso julgado é, então, um instituto com raízes no direito fundamental, constitucional, intimamente ligado ao princípio do Estado de Direito Democrático, por ser uma garantia basilar dos cidadãos onde deve imperar a segurança e a certeza; é hoje um valor máximo de justiça, aliado ao princípio da separação de poderes (Miguel Pimenta de Almeida, A intangibilidade do Caso Julgado na Constituição (Brevíssima Análise), pág. 18, disponível em http://miguelpimentadealmeida.pt/wp-content/uploads/2015/06/A-INTANGIBILIDADE-DO-CASO-JULGADO-NA-CONSTITUI%C3%87%C3%83O.pdf).
«O fundamento do caso julgado reside, por um lado, no prestígio dos tribunais, o qual “seria comprometido em alto grau se mesma situação concreta uma vez definida por eles em dado sentido, pudesse depois ser validamente definida em sentido diferente” e, por outro lado, numa razão de certeza ou segurança jurídica [15], pois “sem o caso julgado estaríamos caídos numa situação de instabilidade jurídica verdadeiramente desastrosa. (…) Seria intolerável que cada um nem ao menos pudesse confiar nos direitos que uma sentença lhe reconheceu”.
“Se assim não fosse, os tribunais falhariam clamorosamente na sua função de órgãos de pacificação jurídica, de instrumentos de paz social”» (Ac. da RG, de 17.05.2018, José Flores, Processo n.º 1053/15.2T8GMR-C.G1, citando inicialmente Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pág. 306, e depois Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, pág. 705).
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4.2.1.3. Exigência de custas de parte (incidente de liquidação das custas de parte)
4.2.1.3.1. Elaboração da conta

Lê-se no art. 29.º, n.º 1, do RCP, que a «conta de custas é elaborada pela secretaria do tribunal que funcionou em 1.ª instância no prazo de 10 dias após o trânsito em julgado da decisão final, após a comunicação pelo agente de execução da verificação de facto que determine a liquidação da responsabilidade do executado, ou quando o juiz o determine».
A dita conta é elaborada, segundo o art. 30.º do RCP, «de harmonia com o julgado em última instância, abrangendo as custas da acção, dos incidentes, dos procedimentos e dos recursos» (n.º 1); e deve «elaborar-se uma só conta por cada sujeito processual responsável pelas custas, multas, e outras penalidades, que abranja o processo principal e os apensos» (n.º 2).
Com efeito, integrando a «decisão em matéria de custas (…) a sentença (art. 607º, nº 6), e «devendo o Juiz, quando for o caso, assumir expressamente o modo como serão repartidas as custas», esta «decisão de natureza tributária é extensiva aos recursos de apelação e de revista, devendo nestes ser adotada a posição que resultar das regras comuns, na certeza de que o resultado pode não ser equivalente ao que foi assumido no acórdão ou na sentença precedente. Aliás, quando o acórdão do tribunal superior revogar total ou parcial[mente] [d]a decisão recorrida, justificar-se-á que seja redefinida a responsabilidade global pelas custas nas diversas instâncias, de acordo com as regras gerais» (António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Volume I, Almedina, Setembro de 2018, pág. 580).
 
Reitera-se, porém, que, actualmente, esta conta final do processo já não determina o que as partes devem pagar em função do respectivo vencimento, limitando-se a discriminar o que cada uma das partes deveria ter pago ao longo do processo (em função do dito vencimento), nomeadamente para o impulsionar, apurando-se o saldo dessa relação.
O mesmo será depois reclamado directamente pela parte vencedora à parte vencida, em sede de custas de parte (art. 26.º, n.º 2, do CRP).
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4.2.1.3.2. Nota discriminativa e justificativa (de custas de parte)
Lê-se no art. 533.º, n.º 3, do CPC, que as quantias que integram as custas de parte deverão ser «objeto de nota discriminativa e justificativa».
Mais se lê, no art. 25.º, n.º 2, do RCP, que da mesma devem nomeadamente constar a indicação, «em rubrica autónoma, das quantias efectivamente pagas pela parte a título de taxa de justiça», «das quantias efectivamente pagas pela parte a título de encargos ou despesas previamente suportadas pelo agente de execução», e «das quantias pagas a título de honorários de mandatário ou de agente de execução, salvo, quanto às referentes aos honorários de mandatário, quando as quantias em causa sejam superiores ao valor indicado na alínea c) do n.º 3 do artigo 26.º», acrescendo ainda a indicação «do valor a receber, nos termos do presente Regulamento».
 
Elaborada desta forma, lê-se no art. 25.º, n.º 1, do RCP, que, até «10 dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respetiva nota discriminativa e justificativa, sem prejuízo de esta poder vir a ser retificada para todos os efeitos legais até 10 dias após a notificação da conta de custas».
Do mesmo modo se dispõe no art. 2.º da Portaria n.º 284/2013, de 30 de Agosto, o qual revogou parcialmente o art. 31.º, n.º 1 da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de Abril (que regula o modo de elaboração, contabilização, liquidação, pagamento, processamento e destino das custas processuais, multas e outras penalidades), eliminando o segmento «após notificados da totalidade dos montantes pagos a título de taxa de justiça e de encargos».
Trata-se, pois, de uma remessa simultânea para o tribunal onde deva ser elaborado o acto de contagem, final ou definitivo do processo, e para a parte responsável pelo seu pagamento (parte vencida), servindo quanto a esta última como necessária liquidação e interpelação para pagamento [16].

Lê-se ainda, no art. 26.º-A, do RCP, que a «reclamação da nota justificativa é apresentada no prazo de 10 dias, após notificação à contraparte, devendo ser decidida pelo juiz em igual prazo e notificada às partes» (n.º 1).
            De forma conforme lê-se no art. 33.º da Portaria n.º 419.º-A/2009, de 17 de Abril, que a «reclamação da nota justificativa é apresentada no prazo de 10 dias, após notificação à contraparte, devendo ser decidida pelo juiz em igual prazo e notificada às partes» (n.º 1); e está «sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota».
Por fim, lê-se, quer no n.º 4, do art. 26.º-A, do RCP, quer no n.º 4, do art. 33.º, da Portaria n.º 419.º-A/2009, de 17 de Abril, que, para «efeitos de reclamação da nota justificativa são aplicáveis subsidiariamente, com as devidas adaptações, as disposições relativas à reclamação da conta constantes do artigo 31.º» do RCP [17].
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4.2.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)

Concretizando, verifica-se que,  transitada em julgado a decisão de mérito proferida na acção declarativa proposta pelos Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD) contra  a Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.) e Outros, e elaborada a respectiva conta, estes, como parte vencedora, apresentaram nos autos a sua nota discriminativa e justificativa de custas de parte, reclamando a este título a quantia de € 7.752,00.
Mais se verifica que, tendo os Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD) reclamado da mesma, por entenderem que eles próprios, e não apenas o seu mandatário, deveriam ter sido notificados do seu teor, viram deferida a sua reclamação, embora com distinto fundamento.
Com efeito, o Tribunal considerou que a parte vencedora se limitara a comunicar à parte vencida o envio a juízo da nota discriminativa e justificativa de custas; e que a lei exigiria para a sua reclamação eficaz mais do que esta singela comunicação de envio ao Tribunal, já que a referida nota teria de ter sido, ela própria, enviada à parte vencida. Ora, se a liquidação e o vencimento da obrigação só ocorre com a notificação da nota justificativa à parte devedora (sob pena de falta de interpelação e de não se poder ter por vencida a dívida de custas), veio o mesmo Tribunal a atender «a reclamação dos autores, não se considerando devidas, por conseguinte, as custas de parte reclamadas pelos réus».

Contudo, esta decisão (de que o pagamento do valor das custas de parte não era devido no âmbito daquele processo, uma vez que tinha sido omitida a notificação pessoal à parte vencida da nota discriminativa e justificativa) incide sobre uma questão processual, e não sobre o mérito da causa.
Com efeito, o que foi objecto da decisão foi a mera preclusão da liquidação incidental no processo declarativo (e da interpelação do devedor, para pagamento, no mesmo); e, consequentemente, a preclusão da faculdade da parte credora obter de forma célere e simplificada a liquidação do seu crédito naquele processo, mas não também a preclusão da possibilidade de tal direito ser exercido nos termos gerais da legislação processual (isto é, pela via executiva).
Dir-se-á, por isso, que a dita decisão apenas permitiu a formação de caso julgado formal, obrigatório no âmbito daqueles autos e não fora deles, não estando por isso a Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.) impedida de reclamar nos autos principais o seu crédito de custas de parte.

Improcede, assim, o segundo fundamento do recurso de apelação dos Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD), a verificação da excepção de autoridade de caso julgado, formada sobre alegada decisão a julgar inexigível o crédito de custas de parte reclamado/executado nos autos principais.
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4.3. Prazo para exigência das custas de parte
4.3.1.1. Incidente de liquidação (das custas de parte)
Recorda-se que se lê no art. 25.º, n.º 1 do RCP (tal como no art. 2.º da Portaria n.º 284/2013, de 30 de Agosto), que, até «10 dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respetiva nota discriminativa e justificativa, sem prejuízo de esta poder vir a ser retificada para todos os efeitos legais até 10 dias após a notificação da conta de custas».
Logo, o envio simultâneo (para o tribunal e para a parte contrária) da nota discriminativa de custas de parte terá que ocorrer nos estritos termos e prazos a que se reporta o citado art. 25.º, n.º 1, do RCP, sem qualquer dilação (conforme Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais, 5.ª edição, Almedina, 2013, pág. 313).
Terá o legislador ponderado para o efeito que, tendo o processo culminado na sentença que decidiu o conflito e condenou o responsável no pagamento das custas, o que se segue à sentença é a função residual de liquidar as custas e desencadear o seu pagamento voluntário: está-se perante um aspecto secundário da função do próprio processo, que justifica uma tramitação simples e célere, permitindo o rápido  arquivamento dos autos; e, sendo as custas de parte pagas directamente entre as partes, o processo não terá de se ocupar com essa tarefa.
Tendo em conta a exiguidade do prazo, compreende-se que se defenda que nada obsta a que a apresentação da nota discriminativa tenha lugar após ser proferida a sentença que determinou a condenação em custas, ainda que em momento anterior ao trânsito em julgado de tal decisão: sendo o prazo de tal modo curto, o credor de custas de parte, a esperar pelo trânsito, corre o risco de o deixar ultrapassar, nomeadamente, face a um diferente modo de contagem do mesmo por parte do tribunal [18].
Pacificamente se aceita, porém, que se está perante um prazo processual e adjectivo, destinado a regular a distância entre os actos do processo (apresentação da nota discriminativa e justificativa, a elaboração da conta de custas pela secretaria e a possibilidade da parte vencedora obter o pagamento das custas de parte).
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4.3.1.2. Efeitos do incumprimento (do dito prazo)
Lê-se, no art. 35.º, n.º 5, do RCP, que a «execução por custas de parte rege-se pelas disposições previstas no artigo 626.º do Código de Processo Civil», isto é, os termos do processo ordinário de execução para pagamento de quantia certa.
Mais se lê, no art. 37.º, n.º 1, do RCP, que o «crédito por custas e o direito à devolução de quantias depositadas à ordem de quaisquer processos prescreve no prazo de cinco anos, a contar da data em que o titular foi notificado do direito a requerer a respectiva devolução, salvo se houver disposição em contrário em lei especial».

Ora, face ao exposto, defende-se que, ainda que a parte vencedora não reclame as custas de parte no referido e exíguo prazo de 10 dias de que dispõe para o efeito, não se verifica qualquer extinção (v.g. por caducidade, ou por prescrição) daquele seu direito de crédito, limitando-se a preclusão em causa à disciplina processual do incidente de liquidação e pagamento das custas de parte no âmbito do próprio processo: o decurso do dito prazo conduz a que esse incidente já não possa ser despoletado no âmbito do próprio processo a que respeitam as custas, mas não faz precludir a faculdade de exercer o direito de crédito nos termos gerais de direito (processual) [19].
Pondera-se, nesse sentido, que, não sendo pagas as custas de parte, a parte vencedora dispõe sempre de um título executivo (não necessitando de instaurar qualquer acção para obter a condenação do devedor a pagá-las, já que dispõe da sentença do próprio processo a que elas respeitam, que condenou o vencido a satisfazê-las), devendo a execução ser instaurada por ela própria.
Acresce que, dispondo a lei expressamente que o crédito por custas (onde se contêm as custas de parte) prescreve no prazo de cinco anos, não faria sentido que, contraditoriamente, permitisse a preclusão da exigência do crédito de custas de parte num reduzido e adicional prazo de dez dias. Esta interpretação violaria, inclusivamente, o disposto no art. 311.º, n.º 2, do CC, segundo o qual o direito sujeito a um prazo de prescrição mais curto que o prazo ordinário fica sujeito a este último se existir sentença transitada em julgado que reconheça o crédito ou outro título executivo.
Pondera-se ainda que a sujeição do crédito de custas a um prazo extintivo do direito (de caducidade ou de prescrição) de apenas 10 dias, para mais contado a partir de um evento alheio ao credor (o trânsito em julgado da sentença), seria manifestamente inconstitucional por violação do princípio do Estado de Direito (na dimensão da proibição do excesso, da violação da proporcionalidade e adequação e da ofensa ao valor da segurança jurídica).
Com efeito, tratando-se de um prazo que não dá ao credor um tempo mínimo, adequado e suficiente para exercer o seu direito, actuando com o zelo e a diligência exigíveis (mas, ao invés, lhe impõe de forma injustificada uma urgência e celeridade de actuação totalmente desfasadas da justa ponderação dos interesses conflituantes, dele próprio, do devedor, ou mesmo da administração da justiça), não se poderá deduzir do seu comportamento omissivo uma renúncia ao respectivo direito de crédito, ou uma falha ou negligência no seu exercício [20]. Inexiste, ainda, qualquer interesse do devedor digno de tutela, que justifique a vantagem da respectiva desoneração, quando a sua responsabilidade já se encontra judicialmente fixada e a prescrição de que poderá beneficiar exige o decurso de um prazo de cinco anos.
Por fim, afasta-se qualquer diminuição dos direitos de defesa do devedor: se é certo que, sendo o incidente deduzido no próprio processo, a parte pode opor-se ao conteúdo da nota apresentada pelo credor, caso em que caberá ao juiz decidir a reclamação e fixar em definitivo o valor das custas de parte (corrigindo-o, sendo caso disso), certo é igualmente que, em sede de oposição à execução, o executado pode também questionar a composição e os valores do crédito exequendo, caso em que caberá ao juiz decidir a oposição definindo o que integrará as custas de partes e os valores que lhe correspondem.
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4.3.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)

Concretizando, verifica-se que, tendo a decisão de mérito proferida na acção declarativa intentada pelos Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD), contra a Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.) e Outros transitado em julgado em 27 de Novembro de 2018, esta apresentou no prazo legal de que dispunha para o efeito a sua nota discriminativa e justificativa de custas de parte.
Mais se verifica que, sendo a mesma reclamada, viria a ser rejeitada, por falta de cumprimento dos requisitos processuais dispostos na lei para o efeito.
Logo, e perante essa decisão, ficou definitivamente precludida a faculdade de reclamar nos autos em que fora proferida decisão condenatória de custas aquele seu crédito (por custas de parte).

Por fim, verifica-se que em 4 de Maio de 2022, a Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.) intentou a acção executiva que constitui os autos principais, nela reclamando o pagamento coercivo daquele seu crédito.
Logo, não tendo ainda decorrido o prazo de cinco anos desde a constituição do crédito de custas (ocorrido com o trânsito em julgado da sentença que condenou a parte vencida no seu pagamento), podia a Embargada/Exequente (S... - Acabamentos Têxteis, S.A.) exigi-lo em acção executiva que intentasse para o efeito, conforme expressamente a lei o afirma.
 
Improcede, assim, o terceiro fundamento do recurso de apelação dos Embargantes/ Executados (AA, BB, CC e DD), a verificação da excepção de extemporaneidade na exigência do crédito de custas de parte reclamado/executado nos autos principais.
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Deverá decidir-se em conformidade, pela improcedência total do recurso de apelação dos Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD).
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V - DECISÃO

Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto pelos dos Embargantes/Executados (AA, BB, CC e DD), e, em consequência, em

· Confirmar integralmente a sentença recorrida.
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Custas da apelação pelos Executados/Embargantes (art. 527.º, n.º 1, do CPC).
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Guimarães, 11 de Maio de 2023.

O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos

Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos;
1.º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias;
2.ª Adjunta - Alexandra Maria Viana Parente Lopes.

           

[1] «Trata-se, aliás, de um entendimento sedimentado no nosso direito processual civil e, mesmo na ausência de lei expressa, defendido, durante a vigência do Código de Seabra, pelo Prof. Alberto dos Reis (in Código do Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 359) e, mais tarde, perante a redação do art. 690º, do CPC de 1961, pelo Cons. Rodrigues Bastos, in Notas ao Código de Processo Civil, Vol. III, 1972, pág. 299» (Ac. do STJ, de 08.02.2018, Maria do Rosário Morgado, Processo n.º 765/13.0TBESP.L1.S1, nota 1 - in www.dgsi.pt, como todos os demais citados sem indicação de origem).
[2] Neste sentido, numa jurisprudência constante, Ac. da RG, de 07.10.2021, Vera Sottomayor, Processo n.º 886/19.5T8BRG.G1, onde se lê que questão nova, «apenas suscitada em sede de recurso, não pode ser conhecida por este Tribunal de 2ª instância, já que os recursos destinam-se à apreciação de questões já levantadas e decididas no processo e não a provocar decisões sobre questões que não foram nem submetidas ao contraditório nem decididas pelo tribunal recorrido».
[3] Neste sentido, Ac. do TC, n.º 227/2007, de 28.03.2007, Paulo Mota Pinto (in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos, como todos os demais citados deste Tribunal).
[4] O dito «impulso processual» «é, grosso modo, a prática do ato de processo que dá origem a núcleos relevantes de dinâmicas processuais, designadamente, a ação, a execução, o incidente, o procedimento, incluindo o cautelar, e o recurso» (Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais Anotado e Comentado, 2012, 4.ª edição, Almedina, pág. 73).
[5] O Regulamento das Custas Processuais - doravante aqui RCP - foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro (e logo rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 22/2008, de 24 de Abril).
[6] Neste sentido, Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais Anotado e Comentado, 2012, 4.ª edição, Almedina, pág. 229, onde se lê que, «como regra geral, (…) os interessados directos no objeto do processo, quer quando impulsionem o seu início, quer quando formulem em relação a ele um impulso de sentido contrário, são responsáveis pelo pagamento da taxa de justiça».
[7] Compreende-se, por isso, que se afirme que, por «via deste normativo inseriu-se no sistema de custas a mais significativa alteração, ou seja, a autonomização da responsabilidade pelo pagamento da taxa de justiça em relação à responsabilidade pelo pagamento de encargos e de custas de parte»: «o responsável pelo pagamento da taxa de justiça é sempre a parte ou sujeito processual autor do impulso processual, independentemente de a final ser vencedor ou vencido».
Pretendeu-se, assim, «que a taxa de justiça seja o valor que cada interveniente lato sensu deve prestar por cada processo ou parte dele, por referência ao respetivo impulso, como contrapartida relativa ao serviço de justiça envolvente» (Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais. Anotado e Comentado, 4.ª edição, Almedina, Abril de 2012, págs. 73 e 76).
[8] Neste sentido, Ac. da RE, de 18.10.2018, Tomé de Carvalho, Processo n.º 367/10.2T2SNS-F.E1, onde se lê que, não obstante o regime legal da taxa de justiça, a lei não deixou de introduzir «mecanismos correctores e de reequilíbrio da relação tributária processual, podendo» a parte vencedora «reclamar a quota-parte devida pelos outros interessados em sede de custas de parte, conforme resulta da interpretação sistemática das regras presentes nos artigos 529º, nº 2 e 530º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil e 6º, nº 1, 13º, nº 1, 25º, nº 2, alínea b) [5], do Regulamento das Custas Processuais».
[9]  No mesmo sentido, Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais, 4.ª edição, Almedina, 2012, pág. 384, onde se lê que «as custas de parte, terceiro elemento do conceito de custas, em paralelo com os encargos, compreendem, grosso modo, essencialmente, as despesas que as partes são forçadas a fazer com vista à implementação da tramitação do processo».
[10] Precisando (apud Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais, 4.ª edição, Almedina, 2012, págs. 396 e 397, com bold apócrifo):  a «taxa de justiça prevista neste normativo é aquela que a parte vencedora, independentemente de ter figurado do lado ativo ou do lado passivo, nas acções, nos incidentes em geral, nos recursos ou em outros procedimentos, tenha pago no âmbito do referido processo»; os encargos, «versa, em suma, sobre os montantes que as partes vencedoras pagaram efetivamente a título de encargos, nos termos dos artigos 20º e 23º deste Regulamento»; e quanto aos honorários de mandatário efectivamente constituído, «a parte vencedora, no todo ou em parte, que tenha pago ao seu mandatário judicial os referidos honorários, com base na respectiva nota ou fatura elaborada pelo último, em conformidade com as respectivas regras estatutárias, deve proceder à junção do respectivo recibo».
[11] No mesmo sentido, Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, pág. pág. 704, onde se lê que «o caso julgado formal tem força obrigatória apenas dentro do processo, obstando a que o Juiz possa na mesma acção, alterar a decisão proferida, mas não impedindo que, noutra acção, a mesma questão processual concreta seja decidida em termos diferentes pelo mesmo Tribunal ou por outro entretanto chamado a apreciar a causa».
[12] Fica paralisada a eficácia decisão contraditória proferida em segundo lugar, conforme Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, pág. 196, não sendo contudo pacífica a qualificação do vício de que padece.
[13] Neste sentido, Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume III, Coimbra Editora, págs. 92-93.
[14] No mesmo sentido, José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, págs. 713 e 714, onde nomeadamente se lê que, seja «qual for o seu conteúdo, a sentença produz, no processo em que é proferida, o efeito de caso julgado formal, não podendo mais ser modificada (…). Mas, quando constitui uma decisão de mérito (“decisão sore a relação material controvertida”), a sentença produz também, fora do processo, o efeito de caso julgado material: a conformação das situações jurídicas substantivas por ela reconhecidas como constituídas impõe-se, com referência à data da sentença, nos planos substantivo e processual (…), distinguindo-se, neste, o efeito negativo da inadmissibilidade duma segunda acção (proibição de repetição: excepção de caso julgado) e o efeito positivo da constituição da decisão proferida em pressuposto indiscutível de outras decisões de mérito (proibição de contradição: autoridade de caso julgado)».
Ainda Miguel Teixeira de Sousa, «O Objecto da Sentença e o Caso Julgado Material», BMJ, n.º 325, pág. 49, onde se lê - com bold apócrifo - que «a excepção de caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional duplicando as decisões sobre idêntico objecto processual, contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior», enquanto que «quando vigora como autoridade e caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade de caso julgado é o comando de acção, a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva à repetição do processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão anterior».
[15] O art. 2502.º do CC de Seabra, de 1867, afirmava cristalinamente que o caso julgado é o facto ou o direito, tornado certo por sentença de que não há recurso.
O art. 580º, n.º 2 do CPC dispõe hoje no mesmo sentido, quando afirma que tanto «a excepção da litispendência como a do caso julgado têm por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior».
[16] Fala-se de uma remessa de nota discriminativa bifronte, ou seja, para o Tribunal e para a parte vencida (conforme Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais. Anotado e Comentado, 2.ª edição, 2009 Almedina, 2009, pág. 321).
[17] Logo, e após a sua apresentação, «o funcionário judicial que tiver efectuado a conta pronuncia-se no prazo de cinco dias, depois o processo vai com vista ao Ministério Público, após o que o juiz decide» (n.º 4, do art. 31.º, do RCP).
Da «decisão proferida cabe recurso em um grau se o valor da nota exceder 50 UC» (n.º 3, do art. 26.º-A, do RCP, e n.º 3, do art. 33.º, da Portaria n.º 419.º-A/2009, de 17 de Abril).
[18] Neste sentido, Ac. da RC, de 08.03.2016, Maria João Arias, Processo n.º 224/09.5TBCBR-B.C1.
[19] Neste sentido, na doutrina:
. Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais Anotado, 5.ª edição, Almedina, 2013, pág. 313, onde se lê que, no «caso de a parte vencedora não enviar à parte vencida, no respectivo prazo, a nota discriminativa e justificativa das custas de parte, espécie de liquidação e interpelação para pagamento, parece que a consequência é a preclusão do seu direito de o realizar por essa via no âmbito do procedimento que a lei prevê. Todavia, propendemos a considerar que a referida omissão não exclui que a pate vencedora ainda possa realizar o seu direito de crédito das custa de parte em acção executiva baseada no título executivo sentença condenatória (artigos 607.º, n.º 6, do CPC e 26.º, n.º 3, deste Regulamento)»
. Custas Processuais - Guia Prático, CEJ, 4.ª edição - Junho de 2016, pág. 188, nota 172, onde se lê: « Coloca-se a questão de saber se a inobservância desse prazo faz precludir ou caducar o direito às custas de parte ou se, pelo contrário, o pagamento ainda poderá vir a ser exigido. Em abono desta última tese, é de assinalar que a sentença constitui título executivo para a cobrança coerciva das custas de parte, as quais se integram, em regra, no âmbito da condenação judicial por custas (cf. artigos 26.º, n.º 1, e 36.º, n.º 3, do RCP). Além disso, a imposição de prazo legal tão curto para apresentação da nota discriminativa de custas de parte parece estar mais relacionada com a necessidade duma tramitação processual célere, designadamente com a possibilidade de a parte vencedora requerer que as custas de parte a que tenha direito sejam liquidadas através do remanescente a devolver à parte vencida (cf. artigo 29.º, n.º 2, da Portaria n.º 419-A/2009, de 17-04), do que com a fixação de prazo de caducidade.
Na jurisprudência: Ac. da RP, de 14.06.2017, Aristides Rodrigues de Almeida, Processo n.º 462/06.2TBLSD-C.P1; Ac. da RG, de 07.12.2017, João Diogo Rodrigues, Processo n.º 1359/06.1TBFAF-B; Ac. da RC, de 12.06.2018, Jorge Arcanjo, Processo n.º 720/06.6TBFIF-A.G1; Ac. da RC, de 28.06.2018, Fonte Ramos, Processo n.º 1148/16.5T8GRD-B.C1; Ac. da RG, de 28.03.2019, Maria Purificação Carvalho, Processo n.º 2524/13.0TBVCT.G2-A; ou Ac. da RC, de 28.06.2002, Fonte Ramos, Processo n.º 1148/16.5T8GRD-B.C1.
[20] No mesmo sentido, Manuel Barros Mouro, Código das Custas Judiciais, 3.ª edição, Livraria Petrony, 1981, pág. 109, onde se lê que o «não oferecimento da nota discriminativa, não significa que o interessado renuncia ou perde o direito a tudo quanto despendeu. Não recebe através da conta, mas quer judicialmente, quer na execução que venha a instaurar, pode pedir o montante de tais despesas».