Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
59/12.8GDVVD.G1
Relator: DOLORES SILVA E SOUSA
Descritores: INQUÉRITO
NULIDADE
OMISSÃO DE DILIGÊNCIAS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/25/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I) Apenas a omissão de acto que a lei prescreva como obrigatório, como seja o interrogatório de arguido quando seja possível notificá-lo, pode consubstanciar a nulidade de insuficiência de inquérito prevista na al. d) do nº 2 do artº 120º do CPP.
II) A omissão de diligências, nomeadamente de produção de prova, cuja obrigatoriedade não resulte de lei não dá origem àquela nulidade.
III) Assim, não sendo as diligências em causa, meios de prova legalmente impostos, sempre seria improcedente a arguição da nulidade invocada, mesmo que a mesma tivesse sido atempadamente arguida, que não foi, atento o disposto no artº 120º, nº 3, al. c) do CPP.
Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.
Secção criminal.

I-Relatório.
No Processo Comum Singular n.º 59/12.8GDVVD da Instância Local de Vila Verde foi submetido a julgamento o arguido Luís A., melhor identificado na sentença a fls. 220.
A sentença de 27.05.2015, depositada no mesmo dia, tem o seguinte dispositivo:
«Julgar a acusação particular improcedente e, em consequência absolver o arguido Luís A. da prática do crime de injúria que lhe foi imputado.
Condenar a assistente no pagamento quatro U.C. de taxa de justiça e nos respetivos encargos, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia - artigo 518.º do Código de Processo Penal.
A) Parte cível:
a) Julgar o pedido cível feito por Maria F. improcedente absolvendo o demandado Luís A. do pedido.
Custas do pedido cível pela demandante, sem prejuízo da isenção revista no artigo 4.º n.º 1 n) do Regulamento das Custas Processuais e do apoio judiciário concedido – artigo 537.º do Código de Processo Civil.»
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Inconformada com a decisão, a assistente Maria F. interpôs recurso apresentando a motivação de fls. 233 a 253, que remata com as seguintes conclusões:
«A) O Tribunal a quo formou a sua convicção apenas com base nas declarações da assistente quando, a prova documental junta aos autos era essencial para a determinação da autoria daquela mensagem escrita, dando como não provado que a “chamada telefónica”, ou seja, mensagem escrita recebida pela assistente do telemóvel com o n.º …, foi feita pelo arguido Luís A.. Apesar de, o número de telemóvel do qual foi enviada a SMS estar desde Julho de 2007 até, pelo menos, ao dia em que foi enviada a SMS, registado em nome do arguido, cuja titularidade estava provada nos autos pelo documento emitido pela Vodafone junto a fls.17 e 18 dos autos.
B) Entendeu o Tribunal a quo não dar credibilidade às declarações da Assistente por as mesmas terem sido prestadas” . . .de modo imponderado e alterado”. Entende a recorrente que tal apreciação do Tribunal não corresponde de todo à realidade do que aconteceu em audiência de julgamento.
C) Foi elaborado pela G.N.R o “Auto de Leitura de Telemóvel”, constante dos autos a fls. 28 no qual foi transcrita integralmente a mensagem recebida pela assistente no seu telemóvel proveniente do n°… no dia 4 de Abril de … pelas 12h31.
D) A utilização pelo arguido de tal n° …, foi comprovada com a informação da Vodafone de … junta a fls. 108 e ssg. dos autos, na qual são patentes os carregamentos sucessivos daquele cartão desde a data da aquisição do mesmo até aquela data, demonstrando bem que aquele n° de telemóvel é usado com frequência pelo seu titular.
E) Verifica-se nítida insuficiência das diligências feitas em sede de Inquérito, o que gera a NULIDADE prevista no art. 120º nº 2 do C.P.P., pois, deveria o Ministério Público ter apurado junto das entidades competentes de que forma eram feitos os ditos carregamentos naquele cartão telefónico, nomeadamente, se eram feitos através de cartão multibanco pertencente ao arguido Luís A..
F) Ocorreu um erro de julgamento pois foi dado como não provado um facto apesar de existir prova documental do mesmo e ter sido produzida prova em sede de julgamento.
G) O tribunal não podia formar a sua convicção e apoiar a sua decisão na apreciação negativa das declarações da assistente prestadas em julgamento e formular uma hipótese para justificar que não foi arguido a enviar a SMS até dada a prova a titularidade daquele número de telemóvel. Ac do TRG 68/10.1GCBRG.G1 de 15-10-2012, in DGSI.pt.
H) Há fatos circunstanciais que se harmonizam e são coerentes com o que disse a Assistente - as más relações entre o arguido e assistente, o fato de ter aquele número, de saber da quezília da assistente com os “empreiteiros” explicam o comportamento do arguido. A prova deveria, por isso, ser toda conjugada e relacionada.
I) O Tribunal a quo conjecturou a hipótese de alguém, que não o arguido, ter enviado a mensagem do telemóvel em causa, como afirma a sentença tal fato não seria suficiente para concluir pela prática do crime, pois alguém poderia ter-se apoderado do telefone do arguido.” O que, no entender da recorrente extravasa as competências do julgador e do princípio da livre convicção na apreciação da prova.
J)Acresce que, o Tribunal a quo deu como provado no ponto 5 dos factos provados, que o arguido reside na Alemanha, ora, mais um elemento que prova que aquela mensagem foi enviada por ele. É do conhecimento geral que, quando uma chamada ou mensagem é proveniente de um telemóvel que se encontra fora do território nacional, o número do mesmo é precedido do indicativo nacional. O que efectivamente aconteceu neste caso, dado que no telemóvel da Assistente apareceu a indicação do n.° …, ou seja, o n° de telemóvel com indicativo nacional.
K) De entre vários factos dados como não provados, destacam-se essencialmente três, os quais, segundo a Recorrente, deveriam ter sido considerados provados;
L)Ao longo das suas declarações, a Assistente é peremptório em afirmar que só podia ser o arguido a efectuar aquela mensagem pois, era a única pessoa que tinha aquele seu número de telemóvel pois, o mesmo foi adquirido pela assistente para o fornecer ao arguido, pai da sua filha menor, à data da resolução do processo das responsabilidades parentais e que, as chamadas anónimas já vinham muito antes de dar esse número a outras pessoas.
M) A assistente refere que antes do recebimento da SMS, tinha recebido várias chamadas de número não identificado e que, posteriormente recebe a SMS do n° … pois, certamente, o arguido não contava que nas mensagens o número do remetente aparecesse identificado!
N) A Assistente afirma ainda que desconfiou sempre que o autor daquela SMS era o ex-marido, aqui arguido, porque sempre foi o modus operandi do arguido mandar mensagens, telefonemas e ameaças. Sabendo que era o pai dos seus filhos, depois de falar com os mesmos decidiu avançar com a apresentação da queixa-crime.
O) A Assistente requereu a inquirição da testemunha Joana C., por entender, naquele momento, ser essencial e imprescindível o seu depoimento, não a tendo indicado anteriormente por se tratar da filha do arguido e por ser menor de 16 anos, o que foi indeferido.
P) Ao indeferir o requerimento para a inquirição da testemunha, filha da Assistente e do arguido, ao abrigo do art.° 340 C.P.P., o Tribunal a quo vedou o acesso à descoberta da verdade material.
Q) Como resulta das declarações da assistente esta testemunha teria conhecimento dos fatos vertidos na acusação e, como tal, seria essencial para o apuramento da verdade material. Tal inquirição para além de essencial para a descoberta da verdade, nunca seria demasiada dada a ausência de prova testemunhal nos autos, atendendo ao conhecimento que a mesma tinha dos fatos. Além do mais, tornava-se essencial a inquirição da testemunha para a conjugação do seu depoimento com as declarações da assistente.
R) O Pedido de Indemnização Civil improcedeu em virtude de no entender do Julgador inexistir prova quanto à prática de um facto ilícito pelo Arguido, dando como não provado nomeadamente os seguinte fatos essenciais para a condenação como: “As expressões proferidas pelo denunciado apresentam-se objectivamente adequadas a colocar em causa a reputação social e pessoal da ofendida e ( ) a assistente sofreu desgosto moral, humilhação e vergonha.”
S) O que não se coaduna com a prova produzida pois, o longo de todo o depoimento da Assistente é bem patente o medo que a mesma sente do arguido e que o mesmo se intensifica sempre que de, alguma forma, o arguido mostra a sua presença.
T) A assistente relatou que quando recebeu a SMS e teve a certeza que eta do seu ex- marido até mandou trancar as portas todas de casa, respondeu inequivocamente que ficou muito sentida com aquelas expressões. Acrescentado que vêm da pessoa com quem foi casada e tem três filhos.
Termina pedindo que seja concedido provimento ao recurso, com a condenação do arguido pela prática de um crime de injuria na pessoa da assistente e, consequentemente, ser julgado totalmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pela recorrente
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O recurso foi admitido por despacho constante de fls. 259.
Respondeu o arguido, consoante resposta de fls. 278 a 296, que sumariou com as seguintes conclusões:
«I. Carece, salvo melhor opinião e o devido respeito, de absoluto fundamento a tese advogada pela Recorrente. E, na realidade, não tem qualquer suporte de facto e de direito. Ao invés, a aliás douta, decisão recorrida que absolveu o arguido, em consequência, é justa e legal.
II. A análise da prova não pode ser feita isoladamente, mas deve ser vista no seu conjunto.
III. Existem aspetos comportamentais ou reações dos depoentes que apenas podem ser percecionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro Tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores.
IV. Como se afere, nomeadamente, das declarações prestadas em audiência de julgamento pela Assistente, aqui Recorrente, a conclusão só pode ser que a matéria dada como provada foi correta e legalmente julgada, tendo a Mm.a Juiz formado a sua prudente convicção segundo critérios de lógica e valoração racional.
V. Vale isto para dizer e advogar que, salvo melhor opinião e o devido respeito, nenhuma censura merece a, aliás douta, sentença, não devendo, por conseguinte, merecer qualquer alteração.
VI. As objeções apontadas pela Recorrente nas suas alegações não são consistentes com o resultado da prova.
VII. A Recorrente, nas suas declarações, demonstrou total incoerência e instabilidade.
VIII. Quer na fase de inquérito, quer em audiência de julgamento, nunca a Recorrente concretizou algum episódio em que descrevesse que teria sido, com toda a certeza e com base em provas que pudessem sustentar cabalmente a sua tese, o Recorrido a telefonar em privado para a mesma e a enviar a mensagem (SMS) em causa.
IX. A recorrente nunca desconfiou do arguido, aqui recorrido, tanto mais que apresentou a queixa declarando que desconhecia o autor da mensagem recebida, julgando mesmo tratar-se de uma pessoa do sexo feminino” pelos termos utilizados na mensagem.
X. Referiu ainda a recorrente, em julgamento que, para além da mensagem constante dos autos, recebeu durante vários dias inúmeras chamadas de um número anónimo (antes e depois do recebimento do sms), que também não considerava serem da autoria do arguido.
XI. A discordância da Recorrente quanto ao sentenciado baseia-se única e simplesmente em suspeitas infundadas, sem qualquer prova que as justifique.
XII. Em audiência de julgamento, a Recorrente deu mais ênfase aos aludidos “toques” que recebia com regularidade, do que propriamente a teor da mensagem em discussão.
XIII. A Recorrente admitiu que o número que atualmente possui e no qual recebeu a mensagem é o que utiliza na sua profissão, sendo que vários clientes e fornecedores a contactam através do mesmo. Logo, qualquer das muitas pessoas que detêm o seu número, poderiam ser os autores dos tão citados “toques”.
XIV. A Recorrente reconhece que tinha uma quezília com uns empreiteiros, podendo os mesmos também serem os responsáveis pelas inúmeras chamadas rececionadas pelo seu telemóvel.
XV. Dispõe o artigo 120.º, n.º 3, alínea c), do Código de Processo Penal que tratando se de nulidade respeitante ao inquérito ou à instrução, deve ser a mesma arguida até ao encerramento do debate instrutório ou, não havendo lugar a instrução, até cinco dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito, pelo que está vedado à Recorrente arguir, em sede de recurso, a nulidade invocada por extemporânea.
XVI. O registo do número em nome do arguido, aqui Recorrido, não é por si suficiente para imputar ao mesmo a autoria do crime. Não existem regras de vivência comum que permitam, a partir unicamente do registo do número de telemóvel associado a determinada pessoa, concluir, para além de uma dúvida razoável, que foi aquele o autor da mensagem enviada para outra pessoa.
XVII. A Mma Juiza atendeu a todos os meios de prova e de forma absolutamente convicta e consciente, valorou-os corretamente, concluindo inevitavelmente pela absolvição do arguido do crime de que vinha acusado pela Assistente.
XVIII. Dispõe o artigo 340.°, do Código de Processo Penal que o Tribunal pode ordenar, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade material.
XIX. O indeferimento da inquirição da testemunha JOANA C. resultou da simplicidade da matéria em causa a provar, da circunstância de a testemunha ser filha da Recorrente e da oportunidade que a mesma teve para a arrolar como testemunha, em tempo oportuno.
XX. Assim, não o tendo feito, não vislumbrou o Tribunal interesse na produção de tal prova.
XXI. O demandado foi absolvido do pedido de indemnização civil, porquanto os pressupostos e sua admissibilidade não estavam verificados.
XXII. Não se encontrava preenchido o pressuposto fundamental do instituto da responsabilidade civil, ou seja, a prática de um facto voluntário (por ação ou por omissão) ilícito pelo agente.
XXIII. Para além disso, não ficou provado, conforme consta do texto da própria sentença, que a Recorrente sofreu desgosto moral, humilhação e vergonha.
XXIV. Refere o artigo 44.° da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário) que em matéria criminal não há alçada, sem prejuízo das disposições processuais relativas à admissibilidade de recurso.
XXV. No entanto, dispõe o artigo 400.º, n.º 2 do Código de Processo Penal que o recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil só é admissível desde que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade desta alçada.
XXVI. Não é admissível o recurso pela improcedência do pedido de indemnização civil, porquanto deduziu a Recorrente um pedido civil no valor de € 800,00.
XXVII. Do transcrito e exposto, resulta não padecer a douta sentença recorrida de qualquer vício, por não violar qualquer norma quer de Direito substantivo, quer de Direito adjetivo, sendo portanto legal e justa porque espelha a verdade e a ela foi corretamente aplicada a Lei. Termina pedindo que o recurso seja julgado improcedente e, consequentemente, a decisão integralmente confirmada.»
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Também o Digno Magistrado do MP, junto do tribunal a quo, ofereceu a sua resposta conforme a fls. 263 a 277, sumariando as seguintes conclusões:
«1. A nulidade por insuficiência de inquérito prevista no artigo 120º, n.º 2, alínea d) do Código Penal, configura uma nulidade sanável, devendo ser arguida até ao encerramento do debate instrutório, ou não havendo instrução, até 5 dias após a notificação do despacho de encerramento de inquérito (artigo 120º, n.º 3, alínea c) do Código de Processo Penal).
2. Se nada for arguido no referido prazo a nulidade tem-se por sanada.
3. A assistente só em sede de recurso arguiu a referida nulidade.
4. Por conseguinte, a actual arguição é extemporânea, devendo improceder nesta parte o recurso apresentado pela assistente.
5. Alega a recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro na apreciação da prova, ao dar como não provado ter sido o arguido a remeter a mensagem escrita em crise nos autos.
6. Salvo o devido respeito, entendemos que a sentença recorrida não procedeu a um incorrecto julgamento da matéria de facto, não resultando, do texto em si ou em conjugação com as regras da experiência, de modo ostensivo e notório, que outra decisão se impunha ao caso.
7. A sentença recorrida não violou, assim, o princípio da livre apreciação da prova, estabelecido no artigo 127° do Código de Processo Penal.
8. Pelo que nestes moldes é insindicável a livre convicção formada pelo julgador, alicerçada nas regras de experiência comum, quando respeitadora das normas de prova vinculada, e motivada de forma lógica, objectiva, clara, como sucedeu.
9. De todo o modo sempre se dirá que não se poderá extrair, sem mais, a autoria da mensagem escrita dos autos do facto de o telemóvel remetente se encontrar registado a favor do arguido.
10. Da simples leitura da referida mensagem escrita decorre, além do mais, que terá sido escrita por alguém do sexo feminino.
11. A recorrente referiu nas suas declarações ter fornecido a terceiros, que não apenas o arguido, o contacto de telemóvel onde recepcionou a referida mensagem.
12. A assistente não soube explicar de forma coerente e concreta onde baseia a sua convicção da autoria da mensagem escrita por parte do arguido.
13. O artigo 340° do Código de Processo Penal estabelece uma possibilidade extraordinária de inquirição e novas testemunhas, fundando-se na estrita necessidade da requerida inquirição, que se mostra essencial e indispensável à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, justificando-se em circunstâncias supervenientes ao momento próprio para indicação de prova.
14. O indeferimento de tal requerimento em violação do disposto no artigo 340° do Código de Processo Penal configurará uma nulidade sanável, nos termos do artigo 120°, n.º 3, alínea a) do Código de Processo Penal, que deverá ser arguida nos termos do disposto no artigo 120°, n.° 3, alínea a).
15. A recorrente após o indeferimento da requerida inquirição nada fez nem requereu até ao final da audiência de discussão e julgamento, pelo que conformou-se com tal decisão de indeferimento.
16. Assim, tal arguição nesta fase é extemporânea, pelo que deve improceder nesta parte o recurso da assistente.
17. Sem contudo prescindir sempre se dirá que não basta ser requerida a inquirição alegando que a testemunha conhece os factos em discussão nos autos, necessário se torna que se justifique a natureza superveniente do arrolamento e o porquê da necessidade da sua inquirição.
18. Ora, a recorrente nada justificou.
19. Assim, pelo exposto, entendemos dever improceder o recurso do assistente.
Termina pedindo a improcedência do recurso
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Nesta Relação, o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto Público emitiu parecer, no sentido da rejeição quanto às nulidades arguidas pela intempestividade da sua arguição, devendo manter-se imodificada a matéria de facto, confirmando-se, consequentemente, a absolvição do arguido.

Cumprido o artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal não houve resposta.

Colhidos os vistos, e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.


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II- Fundamentação.

1.Objecto do recurso e questões a decidir.

Como é jurisprudência assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – vícios decisórios e nulidades referidas no artigo 410.º, n.º s 2 e 3, do Código de Processo Penal – é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objecto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior.

Assim, face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, pela ordem em que são enunciadas, são as seguintes as questões decidir:

- Nulidade de inquérito.
- Violação do artigo 340º do CPP:
- Impugnação da matéria de facto não provada, visando a sua prova e consequente condenação do arguido pela prática do crime de injúria na pessoa da assistente.

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2. Enumeração dos factos provados, não provados [a motivação será oportunamente reproduzida].
«A) De facto:
Resultou provado que:
1 - No dia …, cerca das 12,31 horas, a ofendida/assistente recebe uma mensagem (sms) no seu telemóvel, proveniente do telemóvel ….
2 - Apelidando-a de “sua puta, sua baca…es uma puta vadia…paga aos empreiteiros minha puta…minha baca não tem boi serto”.
3 – Considerou as expressões de “sua puta, sua baca…es uma puta vadia…paga aos empreiteiros minha puta…minha baca não tem boi serto” ofensivas da sua honra, bom nome e consideração.
4 - A ofendida/assistente teve de se deslocar por diversas vezes de e para a sua residência, ao escritório do seu advogado para prestar esclarecimentos.
5 - O arguido reside com uma companheira na …, auferindo rendimentos não apurados por virtude da profissão que ali exerce, pagando 100,00 mensais a título de prestação de alimentos.
O arguido tem os seguintes antecedentes criminais:
- crime de condução sob efeito de álcool, praticado em 19-12-1998, pelo qual foi condenado em 21-12-1998 na pena de 60 dias de multa, no Processo Sumário n.º… do Tribunal Judicial de Valença.
- crime de condução de veículo em estado de embriaguez, praticado em 17-04-2003, pelo qual foi condenado em 19-04-2003 na pena de 110 dias de multa e na pena de 6 meses de proibição de conduzir veículos, no Processo Sumário n.º… do Tribunal Judicial de Braga.
- crime de condução de veículo em estado de embriaguez, praticado em 13-10-2007, pelo qual foi condenado em 05-07-2010 na pena de 6 meses de prisão, substituída por 180 dias de multa e na pena acessória de 1 ano e 6 meses de proibição de conduzir veículos, no Processo Sumário n.º…do Tribunal Judicial de Vila Verde.
- crime de condução de veículo em estado de embriaguez, praticado em 22-01-2012, pelo qual foi condenado em 17-09-2012 na pena de 10 meses de prisão, suspensa por 1ano e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo prazo de 2 anos, no Processo Sumário n.º… Judicial de Amares.
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MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA
- A ofendida/assistente é uma pessoa bem considerada e conceituada na terra onde vive e desenvolve a sua atividade.
- Nas freguesias de …, onde residem familiares seus os clientes a procuram.
- É uma pessoa educada e sensível.
- Ao apodar a ofendida/assistente coma as expressões acima mencionadas o denunciado Luís A. pretendeu ofendê-la na honra e consideração que lhe são devidas, como efetivamente ofendeu.
- As expressões proferidas pelo denunciado apresentam-se objetivamente adequadas para colocar em causa a reputação social e pessoal da ofendida.
- Embora sabendo que a sua conduta é proibida e lhe esta vedada por lei, o denunciado levou-a a cabo, consciente livre e deliberadamente.
- Com todas essas deslocações e tempo perdido, sofreu um prejuízo acrescido de montante seguramente não inferior a €50,00 (cinquenta euros).
- Efetivamente, em virtude da conduta do denunciado a ofendida/assistente sofreu desgosto moral, humilhação e vergonha.
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3.- Apreciação do recurso.
3.1. - Nulidade de inquérito.
Alega a recorrente que o Ministério Público em sede de inquérito não procurou apurar junto das entidades competentes como foram efectuados os carregamentos do cartão com o número de telemóvel, n.º…, nomeadamente, se através de cartão multibanco pertencente ao arguido; e que tal falta de indagação configura a nulidade de insuficiência das diligências de inquérito prevista no artigo 120º, n.º 2, alínea d) do Código Penal.

Vejamos.
Dispõe o artigo 120º, do CPP:
1 - Qualquer nulidade diversa das referidas no artigo anterior deve ser arguida pelos interessados e fica sujeita à disciplina prevista neste artigo e no artigo seguinte.
2 - Constituem nulidades dependentes de arguição, além das que forem cominadas noutras disposições legais:
(…)
d) A insuficiência do inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios, e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade.
3 - As nulidades referidas nos números anteriores devem ser arguidas:
(…)
c) Tratando-se de nulidade respeitante ao inquérito ou à instrução, até ao encerramento do debate instrutório ou, não havendo lugar a instrução, até cinco dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito;
Cumpre referir em primeiro lugar, usando a palavra do Prof. Germano Marques da Silva “Curso de Direito Processual Penal”, vol. III 2ª ed. pag. 91 que «a insuficiência de inquérito é uma nulidade genérica que só se verifica quando se tiver omitido a prática de um acto que a lei prescreva como obrigatório e desde que para essa omissão a lei não disponha de forma diversa e que a omissão de diligências de investigação não impostas por lei, não determina a nulidade do inquérito por insuficiência, pois a apreciação da necessidade dos actos de inquérito é da competência exclusiva do Ministério Público».
A revisão de 2007, com a alteração da redacção da alínea d) do nº 2 do art. 120º do C.P.P. consagrou o entendimento que era corrente na doutrina e na jurisprudência – o de que a insuficiência do inquérito ou da instrução só se verifica quando o acto omitido for prescrito pela lei como obrigatório – tendo em vista promover a aceleração das fases preliminares e evitar a proliferação de recursos interlocutórios – vide os Acs. S.T.J. de 15 de Junho de 2005, Proc. 1556/05; de 7 de Dezembro de 2005 Proc.1008/05 e de 23 de Maio de 2012, proc. 687/10.6TAABSF.S1; Acs. do TRP de 11 de Maio de 2005, Proc. 0512294; de 24 de Maio de 2006, Proc. 0546478; Acs. do TRL de 30 de Novembro de 2006, Proc.10402/05, e de 4 de Janeiro de 2007, Proc.8076/06.
É este entendimento jurisprudencial e doutrinal maioritário, que se traduz em apenas a omissão de acto que a lei prescreva como obrigatório, como seja o interrogatório de arguido quando seja possível notificá-lo, poder consubstanciar a nulidade de insuficiência de inquérito prevista na al. d) do n.º 2 do art. 120.º do CPP.
A omissão de diligências, nomeadamente de produção de prova, cuja obrigatoriedade não resulte de lei não dá origem àquela nulidade.
Assim, as diligências que, na alegação da recorrente, deviam ter sido realizadas em inquérito e não o foram, são a indagação junto das entidades competentes sobre o modo como foram efectuados os carregamentos do cartão com o número de telemóvel, n.º …, não são meios de prova legalmente impostos, razão pela qual sempre seria improcedente a arguição da nulidade invocada, mesmo que a mesma tivesse sido atempadamente arguida, que não foi, atento o disposto no art. 120º, n.º3 al. c) do CPP.
Assim, sem necessidade de maiores considerações, a arguição ora feita pela recorrente é claramente improcedente.
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3.2.Violação do artigo 340º do CPP.
Alega a recorrente que, o tribunal a quo, ao indeferir o requerimento, feito em audiência de discussão e julgamento, para inquirição de uma testemunha (filha da assistente e do arguido), ao abrigo do disposto no artigo 340º do Código de Processo Penal, vedou o acesso à descoberta da verdade material.
Vejamos.
Dispõe o artigo 340º, n.º 1 do Código de Processo Penal:
O Tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa”.
E o seu n.º 4, alínea a) que “os requerimentos de prova são ainda indeferidos se for notório que (...) as provas requeridas já podiam ter sido juntas ou arroladas com a acusação ou a contestação, excepto se o tribunal entender que são indispensáveis à descoberta da verdade e boa decisão da causa”.
Dispõe o artigo 120º do CPP.
1 - Qualquer nulidade diversa das referidas no artigo anterior deve ser arguida pelos interessados e fica sujeita à disciplina prevista neste artigo e no artigo seguinte.
2 - Constituem nulidades dependentes de arguição, além das que forem cominadas noutras disposições legais:
(…)
d) (…) a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade.
3.- As nulidades referidas nos números anteriores devem ser arguidas:
a)Tratando-se de nulidade de acto a que o interessado assista, antes que o acto esteja terminado;

A segunda parte da alínea d) do n.º1 do artigo 120º do CPP, abrange a omissão de actos ou diligências processuais na fase de julgamento e de recurso, já que para a fase de inquérito ou instrução se dirige a primeira parte da mesma alínea, como vimos na questão anterior. Aliás tal decorre inequivocamente da expressão «omissão posterior de diligências» inserida na referida alínea. Assim, verifica-se esta nulidade quando se omite a prática de actos processuais probatórios que a lei classifica como “indispensáveis” ou “necessários” no artigo 340º e “essenciais” na al. d) do art. 120º, ambos do CPP, nas fase de julgamento e de recurso.
O juízo sobre a essencialidade ou indispensabilidade de diligência de prova cabe ao tribunal, e está vinculado aos princípios da necessidade [art. 340º, n.º1], legalidade [arts. 340º, n.º3 e 125º], adequação [art. 340º, n.º4, als. a) e c)] obtenção [art. 340º, n.º4 al. b)] da prova.
Estabelece, assim, este normativo uma possibilidade, extraordinária, de inquirição de novas testemunhas não indicadas com a acusação ou com a contestação, fundando-se na estrita necessidade da requerida inquirição, que se mostre essencial ou indispensável à descoberta da verdade e da boa decisão da causa, justificando-se quando circunstâncias supervenientes o exijam.
No caso em apreço o tribunal a quo tendo sido requerida a inquirição de testemunha, filha da assistente e do arguido, indeferiu a inquirição, ao abrigo do artigo 340º do CPP.
Não demonstrou a recorrente, através de razões bastantes, que a audição daquela sua filha, pudesse ser um elemento de prova indispensável ou essencial à descoberta da verdade material.
Por outro lado, sucede que na senda de jurisprudência maioritária, entendemos que o indeferimento de requerimento, efectuado no decurso da audiência de discussão e julgamento, de inquirição de novas testemunhas à luz do disposto no artigo 340º do Código Penal, quando se entender que assim se omitem diligências essenciais à descoberta da verdade, constitui a nulidade sanável, prevista no artigo 120º, n.º 2, alínea d) do Código de Processo Penal, que deverá ser previamente reclamada antes que o acto onde foi praticada esteja terminado, nos termos prescritos no artigo 120º, n.º 3, alínea a) do Código de Processo Penal, o que no caso ocorreria até ao termo da audiência de discussão e julgamento.
Só depois de suscitada a nulidade perante o tribunal a quo poderá a mesma servir de fundamento de recurso, não sendo suscitada no decurso da audiência de julgamento deve considerar-se sanada tal como dispõe o art. 121º do CPP.
Ora, retomando o caso nos autos, a recorrente após o indeferimento da requerida inquirição da testemunha, filha da assistente e do arguido, nada fez, conformando-se dessa forma com a decisão tomada, pelo que, não poderá agora reagir invocando que o Tribunal a quo vedou o acesso à descoberta da verdade material, pois tal arguição neste momento é já extemporânea.
Pelo exposto é claramente de desatender, por intempestividade, à nulidade invocada.
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3.3.Impugnação da matéria de facto.
Pretende a assistente impugnar essencialmente o facto não provado de o arguido ser o autor da mensagem provada nos factos.
Sustenta a assistente que a sentença recorrida padece de erro na apreciação da prova, relativamente à não provada autoria da mensagem constante dos factos provados enviada via telemóvel; mais sustenta ter sido violado o disposto no artigo 127º do Código de Processo Penal, entendendo que a prova documental junta aos autos era suficiente para provar a autoria da mensagem escrita em causa nos autos e recebida pela assistente, em conjugação com as declarações da assistente que foi peremptória em afirmar que foi o arguido a remeter a referida mensagem.
Considera, portanto, a recorrente ter sido a prova incorrectamente apreciada pelo tribunal a quo e, conclui pela modificação da matéria de facto, nomeadamente da autoria da mensagem ser do arguido e, por isso pede a sua condenação.
O Tribunal a quo motivou a sua decisão de facto pelo modo que segue:
«A prova produzida resume-se às declarações da assistente, aliás única prova indicada na acusação particular.
A assistente prestou depoimento de forma instável, relatando episódios ocorridos noutras fases da sua vida. Alega que o arguido a persegue e lhe atira pedras à casa, contudo o divórcio sucedeu há cerca de nove anos e o arguido reside na …, aliás tem uma companheira, conforme foi dito pela assistente. No dia em que recebeu a alegada mensagem, a assistente alega que tinha recebido chamadas de n.º privado, que não atendera, aliás, não obstante diga que o arguido a importuna por telefone, não logrou concretizar qualquer episódio em que tivesse identificado o arguido, dizendo que os telefonemas que recebe são de números diferentes ou não identificados.
As suas declarações, pelo modo imponderado e alterado como foram prestadas não mereceram qualquer credibilidade por parte do Tribunal.
Ainda que efetivamente a chamada telefónica tivesse sido feita de um n.º registado em nome do arguido, conforme alegou a assistente, sem contudo juntar prova do que alega, tal facto não seria suficiente para fazer concluir pela prática do crime, pois alguém poderia ter-se apoderado do telefone do arguido. Glória P. disse que o arguido é pessoa considerada no local onde habitam, contudo também não mereceu credibilidade por parte do Tribunal atento o teor vago e generalista das suas declarações.»

Vejamos.
Atento o disposto no artigo 428.º, n.º 1, do Código Processo Penal, as Relações conhecem de facto e de direito, acrescentando o artigo 431.º que “Sem prejuízo do disposto no artigo 410.º, a decisão do tribunal de 1ª instância sobre matéria de facto pode ser modificada: a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que lhe serviram de base; b) Se a prova tiver sido impugnada, nos termos do n.º 3, do artigo 412.º; ou c) Se tiver havido renovação da prova.”
Assim e de acordo com o artigo 412.º, n.º 3, “Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas”.
Acrescenta-se no seu n.º 4 que “Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 364, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação.”
Para se proceder à revisão da factualidade apurada em julgamento, deve o recorrente indicar os factos impugnados, a prova que impõe decisão diversa, identificando ainda o vício revelado pelo julgador aquando da sua motivação na livre apreciação da prova. Convém, no entanto, ter presente que o reexame da matéria de facto não visa a realização de um novo julgamento, mas apenas sindicar aquele que foi efectuado, despistando e sanando os eventuais erros procedimentais ou decisórios cometidos e que tenham sido devidamente suscitados em recurso (ac. STJ de 22.06.2006 Rec. n.º 1426/06).
Por outro lado, o recurso sobre a matéria de facto não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso de todos os elementos de prova que foram produzidos e que serviram de fundamento à sentença recorrida, mas somente a reapreciação da razoabilidade da convicção formada pelo tribunal “a quo”, a incidir sobre os pontos de factos impugnados e com base nas provas indicadas pelo recorrente (ac. do STJ de 10.01.2007).
Daí que o reexame esteja sujeito ao ónus de impugnação, sendo através da impugnação que se fixam os pontos de controvérsia e se possibilita o seu conhecimento pelo Tribunal da Relação (ac. STJ de 08.11.2006).
Como é sabido nos termos do artigo 127.º, do CPP, o tribunal aprecia a prova de acordo com a sua livre convicção e as regras da experiência, sem prejuízo de diferentes disposições da lei.
Por tudo isto, o princípio da livre apreciação das provas não tem carácter arbitrário nem se circunscreve a meras impressões criadas no espírito do julgador, estando antes vinculado às regras da experiência e da lógica comum, bem como às provas que não estão subtraídas a esse juízo, sendo imprescindível que este seja motivado, estando ainda sujeito aos princípios estruturantes do processo penal, como o da legalidade das provas e “in dubio pro reo”.
Assim a decisão da matéria de facto só é susceptível de ser alterada, em sede de recurso, quando o juízo (vertido na motivação) correspondente ao julgamento dessa matéria corresponda, de um modo objectivo, a um juízo desrazoável ou mesmo arbitrário da apreciação da prova produzida.
O recorrente especifica de forma medianamente perceptível que o facto que impugna é a não provada autoria da mensagem pelo arguido.
As provas que alinha são o depoimento da ofendida, e os documentos juntos aos autos, nomeadamente o de fls. 28, auto de leitura de telemóvel, e o de fls. 18, indicação do proprietário do telemóvel com o n.º …, provas que não constavam da prova indicada na acusação particular [que não foi acompanhada pelo MP].
Feita a leitura dos documentos supra mencionados e ouvido o depoimento da assistente prestado em audiência, cumpre referir que mesmo que tivéssemos o depoimento da assistente por um exemplo de clareza, assertividade e credibilidade, que não temos [nomeadamente, e no que respeita ao número de pessoas que tinham conhecimento de que o telemóvel onde foi recebida a mensagem era da sua titularidade e, bem assim, relativamente às razões de imputar a autoria da mensagem ao arguido], ainda assim a convicção formada pelo tribunal, suficientemente explicitada, mostra-se razoável face ao facto de a operadora que indicou o arguido como titular do telemóvel emissor da mensagem, o ter feito por referência a 20 de Julho de 2007, quando a mensagem em causa foi enviada para o telemóvel da assistente a …, cerca de 5 anos depois; e, principalmente, por a mensagem que foi enviada para o telemóvel da assistente deixar fundadas dúvidas que possa ser atribuída a um individuo do sexo masculino, pois a mesma tem o seguinte teor: «Sua puta sua baca não chegam os amantes que tens também queres o meu homem sua baca deixaste o teu marido porque es uma puta vadia paga o que deves aos empreiteiros minha puta eu quando vos apare juntos vouvos matar os dois minha baca não não tem boi serto».(Sublinhado nosso)
Em face da totalidade da mensagem recebida decorre que muito provavelmente o seu emissor é um indivíduo do sexo feminino, com a consequência de que fazendo uso do princípio in dubio pro reo sempre a autoria da mensagem pelo arguido haveria de ser facto a dar-se como não provado em homenagem àquele princípio.
Finalmente impõe-se referir que o argumento que a recorrente invocou em recurso de que «o número de telemóvel vinha identificado com o indicativo internacional de Portugal o que apenas sucederia se a mensagem escrita fosse remetida do estrangeiro», pois resultou que o arguido viverá atualmente na …, não tem qualquer valor, pois não corresponde à verdade que o indicativo internacional de Portugal apareça no telemóvel recetor apenas quando as mensagens escritas sejam remetidas de um local situado fora de território nacional; pois, é do conhecimento geral, baseado na experiência diária comum, que tal sucede independentemente do local de onde se remeta a mensagem escrita, bastando apenas, por exemplo (o exemplo mais comum), que o número remetente não se encontre gravado na memória do número recetor da mesma mensagem.
Pelo exposto, não foi apresentada qualquer prova que imponha decisão diversa, pelo que assim é de manter a decisão escrutinada, com a consequência de improceder o recurso na sua totalidade.
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III- Decisão.

Pelo exposto, acordam os juízes desta secção criminal do Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
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Custas pela recorrente, assistente, nos termos dos artigos 515º, n.º1 al. b) do Código de Processo Penal (e artigo 8º, n.º9 do Regulamento das custas processuais e, bem assim, tabela anexa n.º III), fixando-se a taxa em 5 [cinco] UC.
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Notifique.
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Elaborado e revisto pela relatora – artigo 94º, n.º 2, do CP.P.
Guimarães, 25 de Janeiro de 2016

[Maria Dolores Silva e Sousa - Relatora]

[Fernando Monterroso – Adjunto]