Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
310/13.7TCGMR-A.G1
Relator: JOSÉ RAÍNHO
Descritores: CONTESTAÇÃO
PRORROGAÇÃO DO PRAZO
IRRECORRIBILIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/20/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I - A irrecorribilidade do despacho que prorroga o prazo para a contestação, nos termos do nº 6 do art. 569º do CPC, reporta-se tão-somente ao juízo acerca das razões (o motivo ponderoso que impede ou dificulta anormalmente a organização da defesa) que alicerçam o pedido de prorrogação, e não já ao juízo acerca da legalidade processual do requerimento.
II - A norma do nº 5 do art. 569º do CPC é aplicável também aos procedimentos cautelares.
III - O prazo objeto da prorrogação conta-se desde o termo final do prazo normal para a contestação.
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

A… e Outros instauraram procedimento cautelar comum contra H… e Outros.
Os Requeridos foram citados em 20-12-2013, 23-12-2013 e 30-12-2013.
Em 26-12-2013 os Requeridos requereram, sob invocação do nº 5 do art. 569º do CPC, a prorrogação do prazo para a apresentação da sua oposição.
O tribunal, em 27-12-2013, decidiu a propósito o seguinte:
«Defere-se à requerida prorrogação de prazo por 20 dias, os quais se iniciarão com a notificação deste despacho».
Entretanto, a oposição veio a ser apresentada em 16-1-2014.

Inconformados com o assim decidido, apelam os Requerentes.

Da respetiva alegação extraem as seguintes conclusões:

1- O douto despacho em crise não se pode manter por violar o regime adjectivo previsto para a dedução da oposição e seu prazo;
2- O douto e quase telegráfico despacho do Tribunal a quo, encerra em si três decisões e respetivas implicações, assentes em entendimentos da lei que, salvo o devido e muito respeito não encontram arrimo no melhor entendimento da lei nem no sentido da jurisprudência
3- O despacho em crise aplicou o regime geral do processo declarativo ao regime especial do processo cautelar;
4- Concede 20 dias de prazo para os requeridos adicionais ao prazo inicial de10 dias que resulta do artºs372º;
5- Declarou que o mesmo prazo de 20 dias se iniciaria com a notificação despacho que os concedeu. (isto é o despacho ora em crise)
6- Face à urgência do procedimento cautelar não se aplicam as regras do processo declarativo “normal” havendo regras estritas que se afastam do princípio do dispositivo;
7- Por exemplo não é possível em sede cautelar marcar diligências por acordo (artº 151º do NCPC ex artº 155º da anterior versão do Código de Processo Civil)
8- Do mesmo passo não seria nunca possível ao Tribunal prorrogar, com ou sem acordo da parte contrária, o prazo para deduzir a oposição (ou recorrer) nos termos do artº 372º do NCPC
9- No artº 138º, do NCPC, estabelece-se a regra da continuidade dos prazos processuais.
10- O decurso do prazo perentório extingue o direito de praticar o acto (artº 139º, nº 3, do NCPC).
11- Estatui-se no nº 2, do artº 147º, do Código de Processo Civil anterior, no respeitante à prorrogabilidade dos prazos em que «Havendo acordo das partes, o prazo é prorrogável por uma vez e por igual período».
12- In casu não houve acordo nem sequer os requerentes foram ouvidos exatamente em obediência à urgência cautelar que não se compadece com atrasos ou prazos mais dilatados que os previstos na lei.
13- despacho em crise muito embora não refira parece remeter para o artº 569 nº 3 do NCPC invocado no requerimento dos recorridos.
14- No entanto afigura-se claro e pacifico que o regime cautelar não segue o regime previsto para a generalidade dos processos. (processo declarativo)
15- E como tal à semelhança do processo falimentar não se suspende em férias e apenas o justo impedimento se aceita para a prática do acto fora do prazo.
16- A própria sistemática das disposições invocadas concorre para essa mesma constatação, Por exemplo também não se pode suspender a instância fora dos casos expressamente previstos na lei seja no processo cautelar seja no falimentar
17- Por isso devemos entender antes que a intervenção do Tribunal neste particular é vinculada estritamente à lei e esta não prevê tal possibilidade.
18- Mesmo se houvesse acordo o prazo em causa não se poderia prorrogar face aos valores e tutela urgente e imediata que a justiça cautelar protege.
19- Em violação da lei o Tribunal concedeu 20 dias de prazo quando o prazo previsto para deduzir oposição à providência decretada é de 10 dias.
20- Tal prazo resulta, à míngua de disposição expressa, do prazo supletivo previsto no artº 149º do NCPC
21- Assim e sem conceder mesmo que fosse possível a prorrogação esta sempre teria como limite os referidos 10 dias e nunca 20 dias conforme foi requerido e deferido no despacho em crise
22- O que implicaria sempre a intempestividade da oposição dos requeridos
23- Em último lugar o douto despacho declara que os 20 dias concedidos se iniciam apenas com a notificação deste mesmo despacho.
24- Salvo o devido respeito é quase unanime a jurisprudência no sentido em que a prorrogação se conta sempre a partir do fim prazo inicial e nunca a partir da notificação do despacho que defere a prorrogação
25- Neste sentido veja-se Ac do Tribunal da Relação do Porto de 15-03-2010, publicado in www.dgsi.pt com a referência de número convencional JTRP00043626, relatado pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Caimoto Jácome que por tão claro e aplicável aos presentes autos dada a similitude dos factos aqui se reproduz na íntegra o seu sumário:
26- “Os novos períodos de tempo resultantes de prorrogações de prazos fixados pelo juiz, correm seguidamente ao período anterior, a partir do termo inicialmente fixado, não dependendo, por isso, o seu início da notificação do despacho prorrogativo Isto, quer o prazo prorrogado provenha de pedido de prorrogação apresentado nos termos do art. 486º nº 5 do CPC, quer provenha de pedido de prorrogação efectuado ao abrigo do art. 147º nº 2 do mesmo Código.”
27- Ao apresentarem os requerido e ora recorridos o articulado de oposição em 16/01/2014, fizeram-no extemporaneamente, pois que tal prazo terminou decorridos 10 + 3 dias a contar da data da citação (multa -artº 145º, nº 5, do CPC), como tal a decisão recorrida não pode manter-se devendo o articulado em causa (oposição) ser dado sem efeito por extemporâneo, com as consequências legais.

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A Requerida H… contra-alegou, dizendo que o recurso não é legalmente admissível e, em todo o caso, concluindo pela improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir, tendo-se sempre presentes as seguintes coordenadas:
- O teor das conclusões define o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, sem prejuízo para as questões de oficioso conhecimento, posto que ainda não decididas;
- Há que conhecer de questões, e não das razões ou fundamentos que às questões subjazam;
- Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.

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Questão prévia:
Sustenta-se na contra-alegação que a decisão de que se recorre é legalmente irrecorrível, e daqui que não há que conhecer do presente recurso.
Vejamos:
É verdade que o nº 6 do art. 569º do CPC prescreve que a decisão sobre o pedido de prorrogação do prazo da contestação não admite recurso.
Mas parece ser de entender, e isto decorre da conjugação de tal norma com a do antecedente nº 5, que tal inadmissibilidade de recurso se reporta tão-somente ao juízo acerca das razões (pressupostos de fato, ou seja, o motivo ponderoso que impede ou dificulta anormalmente a organização da defesa) que alicerçam o pedido de prorrogação, e não já ao juízo acerca da legalidade processual do requerimento. Pois que se quanto àquele se antolha alguma lógica na limitação ao direito de recurso (está em causa apenas a aferição de uma mera questão circunstancial de fato), já quanto a este assim não acontece, estando-se aqui antes perante uma decisão cuja conformidade jurídica não tem por que não puder ser escrutinada nos termos gerais.
Julgamos, deste modo, que o recurso é admissível.
Improcede pois a suscitada questão prévia.

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São questões a conhecer:
- As isoladas nos itens que seguem.

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Plano Fatual:

Damos aqui por reproduzidas as incidências fático-processuais acima indicadas.

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Plano Jurídico-conclusivo:

Pretendem os Apelantes que a decisão recorrida é ilegal, e que deve ser revogada.
Vejamos:
a) Dizem os Apelantes que a norma do nº 5 do art. 569º do CPC não se aplica à presente espécie processual, que é um procedimento cautelar.
Discordamos.
Os procedimentos cautelares, não sendo embora ações especiais em sentido próprio, funcionam para todos os efeitos como processos especiais. Aliás, até podem funcionar como se verdadeiras ações se tratasse, isto no caso da inversão do contencioso (art. 369º do CPC).
Deste modo, aplicam-se-lhes, no que não contenda com a sua regulamentação específica, as disposições processuais gerais e comuns, bem como o que se acha estabelecido para o processo comum (art. 549º nº 1 do CPC).
Donde, não há razão alguma para que se lhes não aplique a regra do nº 5 do art. 569º do CPC, prevista no processo comum de declaração, da prorrogação do prazo da oposição.
Improcedem assim as conclusões do recurso aí onde se sustenta o contrário.

b) Mais dizem os Apelantes que o prazo não podia ter sido prorrogado pelo tempo em que o foi, 20 dias.
Também aqui discordamos dos Apelantes.
Pois que a prorrogação, por aplicação precisamente do nº 5 do art. 569º do CPC, podia ir até ao limite máximo de 30 dias. Tempo este que, a nosso ver, é justificado apenas por uma circunstância objetiva, independente do tipo de processo, esta circunstância é: o impedimento ou dificuldade na organização da defesa. O que nada tem a ver com a circunstância de que, por sinal, também o prazo normal para a contestação (no processo declarativo comum) ser de 30 dias (nº 1 do art. 569º do CPC). Daqui que in casu a prorrogação pudesse ir em até ao limite de 30 dias, e não apenas até ao limite do prazo normal da oposição no procedimento cautelar (10 dias). Ou seja, o prazo não muda de figura pelo fato de se estar perante um processo comum ou pelo fato de se estar perante um procedimento para o qual a lei prevê um prazo menor para a dedução da oposição. Não encontramos assim qualquer razão minimamente fundada para concluir que a prorrogação só podia ser por prazo de até 10 dias.
Improcedem pois as conclusões do recurso na parte em que se sustenta o contrário disto.

c) Afirmam os Apelantes, por último, que se decidiu mal ao ter-se estabelecido que o prazo prorrogado se iniciaria com a notificação da decisão.
Tratando-se, como se trata, da prorrogação de um prazo pré-existente, a lógica manda que o novo prazo se conte desde o termo final desse prazo pré-existente. E dizer isto é o mesmo que dizer que até concordamos com as considerações a propósito tecidas pelos Apelantes e com a jurisprudência que citam, com o que julgamos que não se decidiu bem neste ponto particular.
Simplesmente, o que foi decidido acaba por não ter qualquer rebate prático, acaba por ser como que inócuo, de modo que a revogação da decisão carece de sentido.
Isto é assim porque o prazo foi prorrogado por 20 dias (e já vimos que podia ser), e daqui que quando a oposição foi apresentada (16-1-2014) ainda não haviam transcorrido tais 20 dias sobre o termo do prazo anterior, atenta a data em que foram citados os Requeridos (rectius, a data da última citação, pois que também se aplica ao caso o nº 2 do art. 569º do CPC). Nesta situação, não tendo a infração cometida qualquer impacto prático - e este só poderia ser a declaração da extemporaneidade da oposição, que é isso que obviamente move os Apelantes - , não pode ser provida a apelação (art. 660º do CPC, por analogia). A revogação seria como que um ato iconoclasta e inútil.

Improcede pois a Apelação.

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Decisão:

Pelo exposto acordam os juízes nesta Relação em julgar improcedente a apelação.

Regime de custas:

Os Apelantes são condenados nas custas da apelação.

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Guimarães, 20 de março de 2014
José Rainho
Carlos Guerra
José Estelita de Mendonça