Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4490/16.1T8GMR-A.G1
Relator: JOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Descritores: HABILITAÇÃO DE CESSIONÁRIO
SUBSTITUIÇÃO INTEGRAL DA PARTE PRIMITIVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/24/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (do relator):

1- O incidente de habilitação é o mecanismo processual que visa operar uma alteração subjetiva da instância, em caso de falecimento ou extinção de uma das partes ou de transmissão da coisa ou do direito em litígio por ato entre vivos.

2- Trata-se de incidente que produz efeitos exclusivamente processuais, sem interferir com a discussão do direito que constitui o objeto da ação principal.

3- Enquanto a habilitação incidental com fundamento em morte ou extinção da parte tem natureza obrigatória, uma vez que a morte ou extinção da parte opera a suspensão da instância até ao trânsito em julgado da sentença que habilite os respetivos sucessores, a habilitação de adquirente ou cessionário tem natureza meramente facultativa, uma vez que a transmissão da coisa ou do direito em litígio não opera a suspensão da instância da ação em curso e o transmitente continua a ter legitimidade para a causa até ao seu termo.

4- É incompatível com o incidente de habilitação de adquirente ou cessionário que, em consequência da procedência da habilitação, o adquirente ou o cessionário fique na causa, juntamente com o transmitente (parte primitiva na causa) para que este último faça nela valer direitos que não foram alvo daquela transmissão.

5- A habilitação de cessionário apenas é possível se substituir integralmente o autor primitivo, pelo que na situação descrita em 4), a habilitação improcede, prosseguindo a causa até final com o autor primitivo.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

Recorrente: (…)
Recorridos: (…)

(…) e (..) instauraram ação declarativa, com processo comum, contra Banco (…) E OUTROS pedindo a condenação solidária destes a pagar-lhes:

a- a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos, a quantia de 100.000,00 euros, acrescida de juros remuneratórios desde 28/10/2013 a 27/10/2014, no montante de 4.487,67 euros, bem como de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, desde 27/10/2014 até integral e efetivo pagamento, ascendendo os vencidos a 7.000,00 euros;
b- a título de compensação pelos danos morais sofridos, a quantia de 15.000,00 euros;
c- Subsidiariamente, quanto aos danos patrimoniais sofridos, a condenação do Réu Fundo de Resolução, a pagar-lhes a quantia de 31.000,00 euros, acrescida de juros remuneratórios desde 28/10/2013 a 27/10/2014, no montante de 1.426,50 euros, e de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, desde 27/10/2014 até integral e efetivo pagamento, ascendendo os já vencidos à quantia de 2.496,38 euros.

Veio (..), gerida por (..)., com sede na Rua (…) andar, …, Lisboa, por apenso àquela ação declarativa, deduzir incidente de habilitação de cessionário, requerendo que se declare o (…) habilitado, na qualidade de cessionário, do crédito peticionado, seguindo com ele a causa.

Para tanto alega, em síntese, que os Autores celebraram com o (…) um contrato de adesão, mediante o qual transmitiram para o último, o papel comercial emitido pela (…);

Na sequência da celebração desse contrato, o (…) é atualmente titular de todos os créditos atuais, futuros, contingentes, litigiosos ou de qualquer outra natureza, que os Autores detenham ou possam a vir a deter, decorrentes do papel comercial emitido pela (…) e pela (..).

Notificadas as partes primitivas, apenas a (…) contestou, pugnando pela improcedência do incidente.

Para tanto alega, em síntese, que atentos os factos alegados na petição inicial pelos autores na ação principal, estes invocam como fundamento da responsabilidade da contestante danos que tem a ver com a alegada conduta culposa desta, no exercício da atividade de auditora e ROC do (…), na fiscalização e certificação das contas deste, não estando, por isso, em causa créditos que resultem ou estejam relacionados com a detenção de papel comercial da (…) pelos Autores, mas com alegadas más práticas da contestante enquanto auditora e (…) do (…);

Acresce que os Autores deduzem contra a contestante, a título principal, pedido de indemnização por alegados danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em consequência dessas más práticas que lhe imputa enquanto auditora e (…) do (…), quando do contrato de adesão invocado pela requerente exclui-se expressamente os créditos indemnizatórios por danos morais, os quais, consequentemente, não foram transmitidos àquela;

Finalmente, as normas contidas na Lei n.º 69/2017, de 01/08, conduzem que o requerente, caso se substitua aos Autores como adquirente dos alegados créditos contra a contestante, fique a beneficiar de uma posição mais vantajosa do que aquela que é a dos Autores, como é o caso do art. 10º da citada Lei, que estabelece um regime especial de que beneficiaria o requente em matéria de contagem do prazo de prescrição, bem do art. 59º, n.º 2, que impediria a contestante de invocar contra o requerente meios de defesa que seriam oponíveis aos Autores e que proviessem de factos anteriores ao conhecimento pela contestante da cessão, contanto que posteriores ao momento em que alegadamente a cessão se torna eficaz entre os Autores e o requerente.

Conclui pedindo que se julgue improcedente o incidente.

O requerente respondeu, sustentando que o incidente não compreende a discussão do direito substantivo da causa principal e que na oposição ao incidente, os oponentes apenas podem impugnar a validade do ato de cessão, com qualquer fundamento de nulidade ou de anulabilidade da lei substantiva, ou com fundamento que a transmissão teve por finalidade dificultar a posição processual do contestante, não bastando, por isso, que se alegue e prove que, em consequência da substituição, se agrava a posição do oponente, mas é imprescindível que se alegue e prove que a transmissão foi feita para atingir esse resultado;

Acontece que a contestante não invoca qualquer fundamento de invalidade da cessão de créditos, sequer alega que esta tivesse sido realizada com o objetivo de prejudicar ou agravar a posição processual desta ou de qualquer um dos requeridos, pelo que os fundamentos de oposição que invoca carecem de improceder.

Proferiu-se sentença julgando o incidente improcedente, a qual consta da seguinte parte dispositiva:

“Pelo exposto, julgo improcedente a habilitação de cessionário requerida por (…)
Custas a cargo da Requerente nos termos do artigo 539º, n.º 1 do Código de Processo Civil”.

Inconformado com o assim decidido, veio o requerente (…) interpor o presente recurso de apelação, em que apresenta as seguintes conclusões:

A) O presente recurso é interposto da decisão de indeferimento do incidente de habilitação, deduzido pelo ora Recorrente, que impediu que operasse a modificação subjetiva do cessionário na ação principal cujos presentes autos estão apensos.
B) O fundamento acolhido pelo tribunal a quo, que entendeu que a modificação subjetiva na ação principal não seria possível uma vez que o contrato de adesão não implicou a transmissão dos créditos relativos aos danos não patrimoniais, não devia impedir a habilitação do Recorrente.
C) A jurisprudência invocada pelo tribunal a quo na qual baseia a sua decisão refere-se a situações diversas do presente caso, designadamente a situações em que nos autos principais foi admitido um pedido reconvencional e que tal constitui um obstáculo à procedência da habilitação.
D) Aquela fundamentação não pode estar na base da sentença do tribunal a quo, atendendo ao caso concreto.
E) De todo o modo, seria sempre possível o deferimento parcial da habilitação, na medida em que o cessionário se poderia substituir ao cedente na ação, exceto no pedido relativo aos danos não patrimoniais (por natureza intransmissíveis), e com o afastamento do cedente.
F) A não transmissão dos mencionados créditos poderia apenas determinar nos autos principais a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide relativamente ao pedido pelos danos não patrimoniais, nos termos do artigo 277.º, al. e), do CPC.
G) Os Autores/Requeridos notificados para contestar, não se opuseram à habilitação, pois perderam o interesse no prosseguimento dos autos e nas suas pretensões indemnizatórias após a celebração do contrato de adesão e da transmissão dos créditos.
H) A manutenção do pedido por danos não patrimoniais apenas interessaria aos cedentes/autores originários, pelo que apenas aos mesmos caberia manifestar a intenção no seu prosseguimento e a sua manutenção como partes na lide.
I) Tendo sido deduzido um incidente com vista transpor a realidade material para o processo, parece lógico que a perecer algum elemento processual deveria ser o pedido relativo aos danos não patrimoniais, que é obviamente suplantado nesta ação pela transmissão dos créditos indemnizatórios no valor de €100.000,00 e pela manifesta perda do interesse dos autores originários em prosseguir qualquer um dos pedidos formulados na ação.
J) Já não se verificam os fundamentos para a decisão proferida pelo tribunal a quo uma vez que os Autores apresentaram a desistência do pedido relativo aos danos não patrimoniais na ação cujos presentes autos estão apensos.
K) Consequentemente, e não havendo fundamentos para a improcedência do incidente deduzido pelo Recorrente, deverá a decisão que ora se recorre ser revogada e alterada por uma que julgue o Recorrente habilitado.
L) Ao julgar improcedente a habilitação, o Tribunal a quo errou, pelo que se impõe a revogação da sentença ora recorrida.

Nestes termos e nos melhores de Direito, deve o presente recurso ser admitido, apreciado e julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida, substituindo-se por outra em que se declara habilitado o Fundo, para prosseguir no processo principal em substituição dos Autores.

Apenas a apelada, (…) contra-alegou, pugnando pela improcedência da apelação e deduzindo recurso subsidiário, prevenindo a possibilidade dos fundamentos de recurso aduzidos pelo apelante virem a proceder, concluindo as suas contra-alegações nos termos que se seguem:

1.ª - Diferentemente do que pretende o Recorrente, o que foi julgado decisivo, na jurisprudência invocada na sentença recorrida, não foi o facto de estar em causa um pedido reconvencional, mas antes o facto de a admissão da habilitação não implicar a substituição integral, para todos os efeitos, do cedente pelo cessionário, e de, portanto, ela implicar que passassem a coexistir na ação o cedente e o cessionário, mantendo-se o primitivo autor ainda que só para efeitos de parte do objeto da ação.
2.ª - Foi isso que foi julgado inadmissível, por contrário ao objeto da habilitação, na jurisprudência da Relação e foi isso, também, que foi rejeitado na sentença recorrida, tendo em conta que a pretendida habilitação nunca poderia ocorrer relativamente ao pedido indemnizatório referente aos danos não patrimoniais e que daí decorreria que se teriam de manter na ação os Autores e o Recorrente.
3.ª - É que os Autores peticionaram nos autos a condenação dos Réus no pagamento de uma indemnização não só por danos patrimoniais mas também por danos não patrimoniais, e estes, como o Recorrente acaba por admitir, não foram objeto do Contrato de Adesão celebrado entre aqueles.
4.ª - Donde resulta que a jurisprudência invocada na decisão recorrida é aplicável ao caso em apreço, não tendo fundamento a censura que lhe foi dirigida pelo Recorrente.
5.ª - A apresentação pelos Autores de requerimento a desistir do pedido quanto aos danos não patrimoniais não releva para o presente recurso, porquanto tal requerimento foi apresentado posteriormente à decisão proferida no incidente de habilitação, não tendo sido nela considerado, e não foi sequer ainda admitido.
6.ª - Ainda que não se entenda que o recurso deve improceder pelas razões que antecedem, no que não se concede, sempre teria de improceder a habilitação do Recorrente pelos fundamentos expostos pela Recorrida na contestação oportunamente deduzida.
7.ª - Tais fundamentos não foram, segundo se julga, apreciados na decisão recorrida, em face da diferente fundamentação que esta tomou. De todo o modo, caso assim se entenda, ou caso se entenda, diferentemente, que tais fundamentos não foram atendidos pelo Tribunal a quo, a Recorrente requer a sua apreciação, a título subsidiário, prevenindo a necessidade da mesma, atento o disposto no art. 636.º, n.º 1, do C.P.C..
8.ª - Primeiramente, está em causa o facto de os alegados créditos relativos à (…) não estarem abrangidos pela Lei n.º 69/2017, de 1 de Agosto.
9.ª - A Lei n.º 69/2017, de 1 de Agosto, visou apenas abranger os créditos emergentes ou relacionados com vendas culposas de produtos financeiros não adequadas às necessidades dos clientes, pelo que somente os créditos indemnizatórios daí emergentes podem ser objeto de cessão ao Fundo, não tendo sido propósito da lei abranger todas e quaisquer pretensões indemnizatórias que os clientes do (…) pudessem invocar contra a (…) enquanto ROC e auditor desse Banco.
10.ª - Os créditos que o Fundo diz ter adquirido aos Autores relativamente à (…) não são créditos que resultem ou estejam relacionados com a aquisição ou detenção de papel comercial da (…) pelos Autores, mas antes com alegadas más práticas da (…) enquanto auditora e ROC do (…) -, o que afasta a aplicação das normas da Lei n.º 69/2017, de 1 de Agosto, e impede a aquisição de tais supostos créditos pelo Fundo.
11.ª - Nenhum facto é alegado pelos Autores que relacione a (…) com a subscrição do papel comercial da (…) e que permita afirmar, com um mínimo de segurança, que se discutem na presente ação pretensos créditos contra a (…) que estejam relacionados com esse facto.
12.ª - Os Autores invocaram na petição inicial um engano de que dizem ter sido vítimas por parte do (…) na subscrição de papel comercial emitido pela (…) - são esses os factos que são alegados relativamente à aquisição do papel comercial da (…), aos quais a (…) é alheia.
13.ª - Uma vez que a aquisição dos pretensos créditos sobre a (…) não é autorizada pela Lei n.º 69/2017, de 1 de Agosto, nem pelo Regulamento de Gestão do Fundo, a aquisição pelo Fundo é nula e ineficaz relativamente à (…) - conforme se alegou em sede de contestação, dando satisfação ao requisito do art. 356.º, n.º 1, al. a), do CPC.
14.ª - Sendo inválida e ineficaz a aquisição dos alegados créditos sobre a (…), justifica-se plenamente que seja indeferida na totalidade a pretendida habilitação do Fundo.
15.ª - A rejeição do pedido de habilitação justifica-se também pelo facto de a substituição processual requerida prejudicar a posição processual da (…).
16.ª - Na situação dos autos não é exigível que fique demonstrada a existência de um propósito malicioso na transmissão dos alegados créditos para que seja indeferido o pedido de substituição dos Autores pelo Fundo.
17.ª - Isto porque o que está em causa não é apurar se se justifica proteger a (…) contra a substituição dos Autores por um contendor mais forte ou aguerrido; do que se trata é, antes, de a proteger contra uma substituição do cedente pelo cessionário que em si mesma, objetivamente, é capaz de a prejudicar por força do regime legal mais favorável de que o cessionário pode beneficiar.
18.ª - Assim, o facto de a cessão dos créditos ter sido alegadamente feita ao abrigo de um regime legal estabelecido com vista a permitir a recuperação de parte do montante investido em papel comercial, mesmo que se entenda que afasta o propósito malicioso, não preclude o direito da (…) de impedir a substituição dos Autores pelo Fundo por esta a prejudicar.
19.ª - Sem prejuízo do que antecede, o facto de a constituição do Fundo e a transmissão de créditos se inserir numa solução global tendente à redução das perdas sofridas por investidores não qualificados em papel comercial não afasta o propósito de dificultar a tarefa de defesa dos Réus.
20.ª - Pelo contrário, decorre de algumas passagens do “Modelo de Solução” que o objetivo da transmissão foi precisamente o de tornar mais eficiente a cobrança dos alegados créditos, através da substituição dos vários Autores por uma entidade profissional capaz de promover uma recuperação maior e mais eficaz desses mesmos pretensos créditos - e, consequentemente, de tornar mais difícil a posição dos Réus nos processos judiciais em curso (cfr. capítulo IV, §34, al. vi.).
21.ª - A Lei n.º 69/2017, de 1 de Agosto, contém normas que conduzem a que o Fundo, caso se substitua aos Autores como adquirente dos alegados créditos contra a (…) , beneficie de uma posição mais vantajosa do que a dos Autores.
22.ª - Em particular, está em causa a norma do art. 10.º da Lei n.º 69/2017, de 1 de Agosto, que pretende estabelecer um regime especial de que beneficiaria o adquirente dos créditos em matéria de contagem do prazo de prescrição.
23.ª - No entender da (…), esta norma é clamorosamente inconstitucional, por violação, entre outros, do princípio da proteção da confiança nas expectativas legítimas, designadamente previsto no artigo 2.º da Constituição.
24.ª - No entanto, o facto de o Fundo, caso se substituísse aos Autores, poder surgir a fazer valer na ação um alegado direito aparentemente sujeito a um prazo prescricional cujo termo inicial é determinado em termos que lhe são muito mais favoráveis do que aqueles que resultam do regime geral - e que conduz, na prática, a um significativo alargamento do período temporal dentro do qual os alegados créditos indemnizatórios poderiam ser exercidos - constitui uma vantagem significativa para o Fundo e um prejuízo notório para a posição processual da (..).
25.ª - Outra norma da Lei n.º 69/2017, de 1 de Agosto, que concede benefícios especiais ao adquirente dos alegados créditos, com prejuízo para a posição processual da Ré (…), é a do art. 59.º, n.º 2, que limita a oponibilidade ao adquirente de meios de defesa que poderiam ser opostos ao cedente em maior medida do que o que resulta do regime geral do art. 585.º do Código Civil, e de cuja aplicação decorre que a (…) ficaria impedida de invocar contra o Requerente meios de defesa que seriam oponíveis aos Autores e que proviessem de factos anteriores ao conhecimento do contrato de cessão pela (..), contanto que posteriores ao momento em que alegadamente a cessão se terá tornado eficaz entre os Autores e o Requerente (que o art. 59.º, n.º 1, diz não depender do conhecimento, aceitação ou notificação dos alegados devedores).
26.ª - É, por conseguinte, manifesto que a posição processual da (…) (e dos demais Réus) é agravada pelo facto de o Requerente/Recorrente se substituir aos Autores na presente ação, pelo que, também por esta via, se impõe a improcedência do presente recurso e a manutenção da decisão recorrida.

Termos em que deve julgar-se improcedente o presente recurso e, em consequência, manter-se a decisão recorrida ou, ainda que com diverso fundamento, rejeitar-se o pedido de habilitação do Recorrente.
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O apelante não respondeu ao recurso subsidiário interposto pela apelada ....
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante e, bem assim, quanto ao recurso subsidiário, pelas apresentadas nas contra-alegações da apelada ..., não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cf. artigos 635.º, nº 4 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.

No seguimento desta orientação as questões submetidas à apreciação desta Relação consistem no seguinte:

Recurso do apelante:

a- se a sentença recorrida padece de erro de direito quanto à decisão de mérito nela proferida ao julgar improcedente a habilitação do apelante com fundamento de que esta implicaria a manutenção na lide, em conjunto, dos Autores e do apelante, quando:
a.1- essa circunstância não constitui fundamento legal para a improcedência do incidente de habilitação de cessionário;
a.2- sempre seria legalmente admissível o deferimento parcial da habilitação de cessionário, na medida em que o cessionário se poderia substituir ao cedente na ação, exceto quanto ao pedido relativo aos danos não patrimoniais;
a.3- perante a impossibilidade legal dessa habilitação parcial de cessionário, perante a não contestação pelos Autores desse incidente, únicos com interesse na manutenção do pedido indemnizatório por danos não patrimoniais, impunha-se concluir pela extinção da instância por inutilidade superveniente da lide relativamente ao pedido pelos danos não patrimoniais que formularam e julgar procedente o incidente de habilitação; e
a.4- os fundamentos em que se ancorou a sentença recorrida para julgar improcedente o incidente, já não se verificam, uma vez que os Autores desistiram do pedido de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos;

Recurso subsidiário da apelada (…)

b.1- a habilitação não é possível dado que os créditos invocados pelos Autores relativos àquela apelada, (…) , não estão abrangidos pela Lei n.º 69/2017, de 01/08, sendo a cessão de créditos invocada pelo apelante nula e ineficaz relativamente à mesma; e
b.2- por a habilitação processual requerida prejudicar a posição processual dessa apelada.
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A- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A 1ª Instância julgou provados os seguintes factos:

1. Em escrito datado de 27 de março de 2018, assinado pelos Autores e pelo representante do Requerente, os primeiros declararam ceder ao segundo, que declarou aceitar, todos os créditos atuais, futuros, contingentes, litigiosos ou de qualquer outra natureza que detivessem ou pudessem vir a deter sobre o (…) e quaisquer outros eventuais responsáveis, juntamente com todas as garantias e quaisquer direitos acessórios aos mesmos, resultantes ou relacionados com a aplicação identificada no Anexo I, sujeitando a produção dos efeitos à verificação da condição suspensiva de adesão de, pelo menos, 50% dos INQPC do total do capital investido em papel comercial até ao fim do período de adesão, a aferir até às 24h do último dia do período de verificação, com divulgação por comunicado no sitio da internet da sociedade gestora [documento de fls. 1650 vº a 1661 do processo principal].
2. No anexo I, referido em 1) consta que na conta títulos nº (…) associada à conta à ordem nº (…), aberta junto do (…)., estavam registados, naquela data, valores mobiliários referentes a papel comercial emitido pela (…) em 28 de outubro de 2013, com o código (…) , com data de reembolso em 27 de outubro de 2014, correspondentes a uma aplicação de capital de € 100.000 [documento de fls. 1650 vº a 1661 do processo principal].
3. O preço de cessão foi fixado em € 75.000, a pagar em três prestações:
a) € 30.000, no prazo máximo de cinco dias úteis após a sociedade gestora ter divulgado no seu sítio da internet o comunicado informando a verificação da condição suspensiva;
b) € 22.500, decorrido um ano sobre a data do pagamento da primeira;
c) € 22.500, decorridos dois anos sobre a data do pagamento da primeira [documento de fls. 1650 vº a 1661 do processo principal].
4. Os Autores declararam subscrever 25.000 unidades de recuperação, representativas do capital do Fundo, pelo preço de € 25, correspondentes ao capital remanescente de € 25.000, pagas por dedução à primeira prestação do preço, registadas na conta fundos nº (…), aberta junto do Banco ..., associada à conta de depósitos à ordem com o IBAN (…) [documento de fls. 1650 vº a 1661 do processo principal].
5. Em 15 de junho de 2018 o comunicado aludido em 1) foi publicado no site https://www.patrisinvestimentos.pt/.
6. No processo principal os Autores pediram, além do mais, a condenação solidária dos Réus a pagar-lhes a quantia de € 15.000 a título de compensação pelos danos morais.
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B- FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

Já se enunciaram supra quais as concretas questões que o apelante submete à apreciação desta Relação.

Na sentença recorrida julgou-se improcedente o incidente de habilitação de cessionário deduzido pelo apelante com fundamento na circunstância dessa habilitação, a ser deferida, implicar a manutenção na lide, em conjunto, os Autores e do cessionário, isto porque o crédito compensatório por danos não patrimoniais reclamado pelos primeiros contra os Réus da ação principal, não se transmitiram para o cessionário por via do contrato de cessão celebrado entre Autores e apelante, o que, na perspetiva do tribunal a quo, não é legalmente possível, por contrariar os fundamentos do incidente da habilitação de cessionário, o qual visa substituir uma das partes primitivas no pleito pelo cessionário, ou dito por outras, palavras, “a decisão do incidente terá como efeito o afastamento do alienante ou cedente”, pelo que a habilitação não pode proceder “sempre que o âmbito da transmissão ou cessão implique a manutenção na ação da parte primitiva por necessidade de apreciação de parte do seu objecto”.

Em abono desta sua posição, o tribunal a quo invoca os arestos do Tribunal da Relação do Porto, de 30/01/2012, Proc. 115/09.0TBCHV-A. P1, relatado pela Senhora Desembargadora Maria Adelaide Domingos, e de 26/06/2017, Proc. 1701/15.4T8PVZ-A.P1, relatado pelo Senhor Desembargador Augusto de Carvalho.

Esteirado nestas considerações, o tribunal a quo julgou improcedente o incidente, decisão esta com a qual não se conforma o apelante, sustentando que o incidente de habilitação de cessionário não tem como requisito legal que ocorra uma substituição integral do cedente (parte primitiva na ação) pelo cessionário, sendo sempre legalmente possível que se determine uma simples habilitação parcial, e que as situações fácticas sobre que se debruçaram aqueles arestos nada têm a ver com a situação dos autos, pelo que a jurisprudência desses arestos não é aplicável à situação dos autos, concluindo, que a sentença recorrida padece de erro de direito quanto à decisão de mérito nela proferida.

Vejamos se assiste razão ao apelante nas críticas que faz à sentença recorrida, o que passa pela análise do instituto da habilitação, seus pressupostos e finalidades.

Como é sabido, um dos princípios basilares da lei processual civil nacional é o princípio da estabilidade de instância, princípio este que se encontra consagrado no art. 260º do CPC, onde se estabelece que citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei.

No entanto, não olvidando as realidades da vida e que poderão ter ocorrido, desde logo, vícios na propositura da ação, nomeadamente, porque esta não foi proposta por todos os sujeitos ou contra todos os sujeitos da relação material controvertida, ou então que, nessa ação já proposta, podem ter sido desatendidos interesses de terceiros, titulares de relações jurídicas diversas daquela que se encontra em litígio, mas que mantém com ela pontos de conexão de prejudicialidade ou dependência, que poderão justificar que a sua relação seja julgada conjuntamente com aquela que está em litígio, e que levam, respetivamente, à necessidade de suprir esses vícios ou de se dever acautelar os interesses desses terceiros, assim como não esquecendo que durante a pendência da causa podem ocorrer múltiplos fenómenos, como seja a morte ou a extinção de uma das partes ou a transmissão, por ato inter vivos, da coisa ou do direito em litígio, a lei estabelece no próprio normativo que consagra o princípio da estabilidade da instância que este não tem natureza absoluta, posto que sofre as exceções consignadas na lei.

Essas exceções podem fazer-se sentir ao nível do pedido, da causa de pedir ou das partes.

As exceções ao princípio da estabilidade da instância quanto ao pedido e à causa de pedir encontram-se consagradas nos artºs. 264º e 265º do CPC e sobre elas não versam os prestes autos, pelo que nos abstemos de tecer mais considerações a esse respeito.

Também as exceções que se relacionam com vícios que tenham ocorrido ao nível da propositura da ação, por não figurarem como demandantes ou demandados todos os sujeitos da relação material controvertida em juízo, ou por nela terem sido desconsiderados os interesses de terceiros, titulares de relações jurídicas conexas com a controvertida, que levam a que as partes ou esse terceiros possam ter interesse que a relação jurídica destes seja julgada conjuntamente com aquela que se encontra em juízo, situações essas cujos vícios ou a desconsideração de interesses desses terceiros carecem de ser solucionados mediante recurso aos mecanismos dos incidentes da intervenção de terceiros a que se reportam os artºs. 261º e 311º a 341º do CPC, não versam os presentes autos, pelo que nos abstemos de desenvolver esta problemática.

Já importa a questão das modificações subjetivas da instância ocorridas em consequência da substituição de alguma das partes, por sucessão ou por ato entre vivos na relação substantiva em litígio a que se reportam os artºs. 262º, al. a), 263º e 351º a 357º do CPC.

Com efeito, durante a pendência da causa, como referido, pode acontecer que uma parte, pessoa singular, faleça, ou sendo pessoa colectiva, se extinga.

Também poderá acontecer que durante a pendência da causa a coisa ou o direito em litígio seja transmitido a um terceiro, por ato inter vivos.

Como referido, porque o legislador não se pode manter à margem destas realidades ontológicas quando estas ocorram, e desconsiderar os reflexos que as mesmas têm, ou podem ter, no processo em curso, o mesmo previu e regulou as consequências jurídicas decorrentes desses fenómenos e os mecanismos processuais que coloca ao dispor das partes para obviar às consequências jurídicas decorrentes desses fenómenos e, bem assim, para acautelar os interesses do transmitente e/ou do adquirente da coisa ou do direito em litígio.

Quanto às consequências jurídicas decorrentes dessas realidades, ponderando que são princípios angulares do processo civil nacional, os princípios do dispositivo e do contraditório, a morte de uma parte que seja pessoa singular, ou a extinção de uma parte que seja pessoa coletiva, tem como consequência jurídica necessária e inelutável a suspensão da instância (art. 269º, n.º 1, al. a) do CPC), já que não é compaginável com esses princípios que a causa pudesse prosseguir com uma pessoa que já é ontologicamente e juridicamente inexistente e cuja personalidade jurídica e judiciária se extinguiu com a morte ou com a extinção da pessoa coletiva.

Já tratando-se de transmissão de coisa ou do direito em litígio, durante a pendência da causa, em consequência de ato inter vivos, o legislador ponderou que fruto que estando o transmitente na ação, estão acautelados os princípios do dispositivo e do contraditório, pelo que essa transmissão não opera a suspensão da instância, mas antes por conferir ao transmitente legitimidade ad causam (art. 263º, n.º 1 do CPC), continuando, assim, a partir da transmissão, este, que já não é titular da situação jurídica transmitida, a litigar em nome próprio, mas na prossecução dum interesse que só indiretamente é seu (1).

Consequentemente, em caso de transmissão da coisa ou do direito em litigio, essa transmissão, por ato inter vivos, nunca opera a suspensão da instância, continuando o transmitente a ter legitimidade para a causa, enquanto o adquirente não for, por meio de habilitação, admitido a substituí-lo (art. 263º, n.º 1 do CPC).

Acresce que se não for deduzido o incidente de habilitação do adquirente ou do cessionário ou, no caso positivo, ainda que o adquirente ou cessionário não intervenha no processo, a sentença que nele venha a ser proferida produz efeitos jurídicos quanto àquele, operando, desde logo, o efeito do caso julgado, exceto no caso de se tratar de ação sujeita a registo e o adquirente registar a transmissão antes de feito o registo da ação (n.º 3 do art. 263º), exceção esta que apenas tem em vista acautelar os efeitos do registo.

Quanto aos mecanismos processuais consagrados pelo legislador com vista a suprir as consequências jurídicas decorrentes da morte de uma das partes, pessoa singular, ou da extinção de uma das partes, pessoa coletiva, durante a pendência da causa, situações essas que, como referido, operam a suspensão da instância, ou para acautelar os legítimos interesses da parte transmitente ou adquirente da coisa ou do direito em litigio, que poderão naturalmente, quanto à primeira (a transmitente) não ter interesse em continuar na causa após a transmissão, e a segunda (a adquirente) ter interesse em passar a ser ela a intervir nesta após essa transmissão, na defesa dos seus direitos e interesses, esse mecanismo processual é o incidente da habilitação a que se reportam os arts. 351º a 357º do CPC.

Na verdade, o incidente da habilitação é o mecanismo processual que o legislador coloca à disposição das partes para em caso de morte de parte, pessoa singular, ou de extinção de parte, pessoa coletiva (seja autor ou réu), ou em caso de transmissão da coisa ou direito em litigio, colocar o sucessor na posição jurídico-processual que antes era ocupada pela parte falecida ou extinta ou para colocar o adquirente da coisa ou do direito em litígio na posição jurídico-processual que antes era ocupada pelo transmitente.

Deste modo, em processo civil, a habilitação tem por objetivo necessário colocar o sucessor no lugar que o falecido ou o transmitente ocupava no processo pendente, e certificar que determinada pessoa sucedeu a outra na posição jurídica em que esta se encontrava (2), ou como escreve Lebre de Freitas, “a sua finalidade é promover a substituição da parte primitiva (autor ou réu) pelo seu sucessor na situação jurídica litigiosa, esteja em causa a sucessão universal de pessoa singular ou singular. Produzindo assim, quando procedente, a modificação subjetiva da instância, mediante a legitimação sucessiva do sucessor, enquanto tal, para a causa (…)”, concluindo que “… a habilitação (…) visa sempre colocar o sucessor no lugar do antecessor, independentemente da legitimidade desta para a causa” (3).

Na mesma linha, Salvador da Costa, escreve que “a habilitação é, fundamentalmente, a prova da aquisição, por sucessão ou transmissão, da titularidade de um direito ou de um complexo de direitos ou de uma situação jurídica ou complexo de situações jurídicas, independentemente da sua existência efetiva (…)”, implicando a habilitação incidente “…a modificação da instância quanto às pessoas, ou seja, a substituição de alguma das partes na relação substantiva em litígio por sucessão ou por ato entre vivos”, tratando-se “…pois, de uma exceção ao princípio da estabilidade da instância, por via da qual ela é suscetível de se modificar quanto às pessoas, por virtude da substituição de alguma das partes na relação substantiva em litigio, seja, por sucessão, seja por ato entre vivos” (4).

Note-se que atentas as finalidades prosseguidas pelo incidente de habilitação, que como se disse, se reconduzem a efeitos meramente processuais, na medida em que visa tão somente, produzir a modificação subjetiva dos sujeitos em determinada lide pendente, sem interferir com a discussão do direito que constitui o objeto daquela , tal como é configurado pelo pedido e causa de pedir (5), não comportando, por isso, a discussão e decisão sobre o direito que constitui o próprio objeto da causa, estando, aliás, os habilitados, uma vez habilitados por sentença transitada em julgado, obrigados a aceitar a causa no estado em que esta se encontrar, compreende-se que quando se trate de habilitação motivada pelo falecimento de parte, pessoa singular, ou extinção de parte, pessoa coletiva, a procedência da habilitação apenas esteja dependente da apreciação se os habilitando detêm ou não da qualidade de sucessores da parte extinta, segundo a lei substantiva. Inclusivamente, se a qualidade de herdeiro ou aquela que legitimar o habilitando para substituir a parte falecida já estiver declarada noutro processo, por decisão transitada em julgado, ou reconhecida em habilitação notarial, os interessados para quem a decisão constitua caso julgado ou que intervieram na escritura de habilitação, não possam impugnar a qualidade que lhes é atribuída no título de habilitação, salvo se alegarem que o título não preenche as condições exigidas nos n.ºs 1 e 3 do art. 353º do CPC, ou enferma de vício que o invalida (art. 353º, n.º 2 do CPC).

Também se compreende que em relação à habilitação do adquirente ou cessionário da coisa ou do direito em litígio, apenas possa ser deduzida contestação com dois fundamentos, a saber: 1º- impugnação do ato de transmissão da coisa ou direito em litigio do transmitente para o adquirente, com qualquer fundamento de nulidade ou de anulabilidade da lei substantiva e/ou 2º- que a transmissão foi feita com a finalidade de dificultar, isto é, tornar mais difícil, a posição processual do contestante (art. 356º, n.º 1, al. a) do CPC), estando, pois, a contestação, neste incidente, atento as finalidades deste, “limitada ao referido núcleo de factos relativos à validade formal ou material do ato de cessão ou de transmissão, ou à circunstância de ele apenas visar a dificultação da posição do contestante na causa principal” (6).

Igualmente se compreende que havendo contestação (a qual, reafirma-se, apenas pode assentar naqueles dois fundamentos), após resposta do requerente e produzida as provas, se siga a decisão, em que o juiz apenas pode julgar improcedente a habilitação, com um ou ambos desses enunciados fundamentos, sem prejuízo de se encontrar obrigado a conhecer oficiosamente dos fundamentos de nulidade do ato de transmissão (art. 356º, n.º 1, al. b), parte final, do CPC).

É que não havendo contestação ou havendo-a, o tribunal encontra-se sempre obrigado a conhecer oficiosamente dos fundamentos de nulidade desse ato, mas já não lhe é permitido o conhecimento ex. officio dos fundamentos de anulabilidade dos mesmos (art. 287º, n.º 1 do CC), sequer conhecer se este foi praticado com o propósito malicioso de dificultar a posição processual da parte contrária, fundamentos estes que carecem, assim, de ser arguidos para que o tribunal deles possa conhecer (7).

Finalmente, atentos os efeitos meramente processuais do incidente de habilitação e as finalidade processuais que prossegue de substituir alguma das partes na relação substantiva em litígio pelos respetivos sucessores ou pelo adquirente da coisa ou direito em litigio por ato entre vivos, compreende-se que a improcedência da habilitação não obste a que o requerente deduza outra habilitação, com fundamento em factos diferentes ou em provas diferentes, indo o legislador ao ponto, quanto a este último aspeto, de afastar a regra do caso julgado formal, ao permitir que o requerente possa deduzir nova habilitação com fundamento nos mesmos factos que antes alegara no incidente que viu improceder, mas oferecendo outras provas, estabelecendo que, neste caso em que a nova habilitação se funda nos mesmos factos, esta pode ser deduzida no processo da primeira, mantendo-se, contudo, o dever de pagamento dos encargos relativos à primeira habilitação (n.º 3 do art. 352º do CPC).

Realce-se contudo que, conforme já referido, a morte de uma parte, pessoa singular, ou a extinção de uma parte, pessoa coletiva, opera a suspensão da instância até à habilitação dos respetivos sucessores (artºs. 269º, n.º 1, al. a) e 270º, n.º 1 do CPC), sendo nulos os atos praticados no processo posteriormente à data em que ocorreu o falecimento ou a extinção dessa parte que, nos termos do n.º 1 do art. 270º, devia ter determinado a suspensão da instância, em relação aos quais fosse admissível o exercício do contraditório pela parte que faleceu ou se extinguiu, exceto se os respetivos sucessores os ratificarem (n.ºs 3 e 4 do art. 270º).

Deste modo, determinando o falecimento ou a extinção da parte a suspensão da instância e não podendo a ação prosseguir enquanto não forem habilitados os respetivos sucessores, a habilitação incidental fundada em morte ou extinção da parte a que se reportam os artºs. 351º a 355º do CPC, tem natureza obrigatória, porquanto tem de ser necessariamente requerida pelos sucessores ou pelas partes da ação pendente e suspensa (n.º 1 do art. 351º), uma vez que, de contrário, essa ação não prossegue os seus termos legais enquanto esses sucessores não forem habilitados por sentença transitada em julgado.

Pelo contrário, a habilitação do adquirente ou cessionário da coisa ou direito em litígio por ato entre vivos, a que se reporta o art. 356º do CPC, tem natureza facultativa, dado que a transmissão da coisa ou do direito para terceiro não opera a suspensão da causa pendente, sequer nela tem quaisquer efeitos jurídicos, continuando, reafirma-se, o transmitente a ter legitimidade para a causa até ao seu termo, produzindo a sentença que venha a ser proferida no processo os seus efeitos jurídicos, incluindo o de caso julgado em relação ao terceiro adquirente da coisa ou do direito em litigio, com a já enunciada exceção prevista na parte final do n.º 3 do art. 263º do CPC (8).

Deste modo, enquanto a habilitação com fundamento em morte ou extinção da parte é obrigatória e daí que, inclusivamente, se confira legitimidade para promover o incidente de habilitação a qualquer parte sobreviva da causa pendente ou a qualquer sucessor da parte falecida ou extinta (n.º 1 do art. 351º do CPC), já a habilitação do adquirente ou cessionário da coisa ou do direito em litigio é facultativa, e apenas dispõem de legitimidade para deduzir o incidente de habilitação o transmitente ou cedente, o adquirente ou cessionário ou a parte contrária (n.º 2 do art. 356º).

Essas pessoas que dispõem de legitimidade para promover o incidente de habilitação do adquirente ou cessionário podem naturalmente promover ou não essa habilitação, conforme os seus interesses.

No entanto, caso não o façam, daí não decorre qualquer consequência ao normal prosseguimento da causa e para os efeitos jurídicos da sentença que nela venha a ser proferida (com a já enunciada exceção quanto ao registo).

Acresce dizer que ainda que as pessoas com legitimidade para deduzir o incidente, o deduzam e possam ter interesse na substituição processual do anterior titular da coisa ou do direito em litígio (que figura na causa) pelo atual titular dessa coisa ou direito, esse seu interesse pode vir a ser desconsiderado, no confronto com os interesses da parte contrária que figura no processo, isto é, “quem na lide está em posição contrária ao cedente ou transmitente ou ao adquirente ou cessionário” (9).

Com efeito, como já referido, sendo deduzido o incidente de habitação, essa parte contrária poderá deduzir oposição à habilitação com fundamento na invalidade do ato de cessão ou de transmissão, mas também com fundamento que esse ato foi realizado com o propósito malicioso de tornar mais difícil a sua posição na causa principal.

A procedência de qualquer um destes fundamentos gera a improcedência do incidente de habilitação.

Ora, se assim é, no caso de procedência daquele segundo fundamento, isto é, se o incidente de habilitação pode ser recusado com fundamento de que o ato de cessão ou de transmissão foi praticado com o escopo de tornar mais difícil a posição da parte contrária na causa principal (que alegara e provara esse fundamento impeditivo da procedência do incidente), então daqui deriva que o direito do adquirente ou cessionário em ser habilitado, não é um direito absoluto, podendo e devendo ser recusado sempre que ocorram situações que impeçam essa habilitação, caso em que o processo prosseguirá os seus legais termos com o transmitente da coisa ou do direito em litigio, embora este possa já não ter interesse na ação, por já não ser sujeito ativo da relação substantiva, mas que nela tem de prosseguir como substituto processual do adquirente até ao termo da ação (10).

Entre essas situações impeditivas da habilitação do adquirente ou cessionário, conta-se o caso já referido da parte contrária vir a deduzir oposição à habilitação do adquirente ou cessionário, alegando e provando factos de onde decorram que esse ato obedeceu ao propósito malicioso de tornar mais difícil a sua posição na causa principal, mas, também, naturalmente, aqueles casos em que fruto de uma transmissão parcial das coisas ou dos direitos em litigio, a procedência do incidente de habilitação, determina apenas uma habilitação parcial do adquirente ou cessionário, tendo como consequência que a parte originária permaneça na lide, a par do adquirente ou cessionário habilitado.

Na verdade, tal como entendeu o tribunal a quo, e resulta dos fundamentos jurídicos que acima já se explanaram, é indiscutível que o incidente da habilitação tem por finalidade promover a substituição da parte primitiva, seja ela autor ou réu, pelo sucessor dessa parte, seja motivada pela morte ou extinção dessa parte primitiva, seja porque essa parte primitiva transmitiu para terceiro a coisa ou o direito em litígio, sendo incompatível com o incidente de habilitação a manutenção na ação principal do primitivo autor, ainda que para apreciar parte do objeto da ação em curso.

Com efeito, “substituição da parte primitiva”, conforme se pondera no Ac. do TCAN de 12/10/2018, “significa “troca de um por outro”, “em termos processuais, a substituição de um sujeito processual implicará sempre duas consequências, a saída definitiva do processo do sujeito que figura(va) como parte no processo e a entrada do novo sujeito no lugar do primitivo sujeito processual e no estado em que o processo se encontra” e onde se conclui que “a ideia de substituição, designadamente de sujeitos processuais, é avessa à ideia de manutenção da parte substituída no processo” (11).

Este foi igualmente o entendimento que foi defendido pela Relação do Porto (12), nos dois arestos citados na sentença recorrida e que aqui também se perfilha, cujas considerações jurídicas, contrariamente ao pretendido pelo apelante, têm plena aplicação ao caso presente.

Com efeito, não obstante esses dois acórdãos respeitem a casos em que nas respetivas ações foram deduzidas reconvenções, situação essa que não é efetivamente a que se verifica nos autos, conforme resulta da simples leitura dos mesmos (bastando, aliás, ler os respetivos sumários, que infra se transcreveram), o fundamento da improcedência do incidente de habilitação foi efetivamente o facto de, nos respetivos processos, ter sido deduzida reconvenção e a substituição da autora pela cessionária inviabilizar a apreciação desse pedido reconvencional, isto porque, não existe a possibilidade legal de em consequência da procedência do incidente de habilitação da cessionária, esta e a Autora-reconvinda permanecerem na lide, sequer a possibilidade de, por via da procedência desse incidente, se cindir o objeto da ação, excluindo-se a apreciação do pedido reconvencional.

De resto, neste último aresto, na esteira do primeiro, escreve-se que “a habilitação do cessionário apenas é possível se este substituir integralmente o autor primitivo. Não é possível a habilitação do cessionário da qual resulte a manutenção na ação do primitivo autor, ainda que para apreciação de parte do seu objeto. O incidente de habilitação do cessionário permite apenas duas opções: ou a cedente continua na lide, já que a habilitação decorrente da transmissão entre vivos da coisa ou direito litigioso é facultativa; ou a cedente, adquirindo a posição processual in totum que a mesma tinha no pleito. Não há possibilidade de ambas permanecerem na lide, nem a possibilidade de se cindir o objeto da mesma (…)”.

Acresce referir que além de ser contrária ao instituto da habilitação, que tem por escopo operar uma substituição de partes, isto é, a permuta de uma da partes pelo habilitando, substituição processual essa que, no caso, nunca seria alcançada em consequência da procedência da habilitação, porquanto o apelante (cessionário) e os autores permaneceriam, em simultâneo, na ação em curso, os últimos limitados, é certo, ao exercício do direito indemnizatório por danos morais que exercem contra os réus (não abrangidos pelo contrato a que se reporta o ponto 1º dos factos apurados) mas também ao exercício da totalidade dos direitos indemnizatórios que exercem contra os apelados (…) e (…) (não transmitidos para a apelante, já que, conforme decorre daquele ponto 1º dos factos apurados, a cedência feita pelos autores para a apelada apenas abrange os créditos destes sobre o (…), a permanência do apelante e dos autores, só por si, caso fosse legalmente possível (que não é), dificultaria a posição processual de todos os réus nos autos principais.

Com efeito, ainda que o apelante, em consequência da procedência da habilitação, tivesse de aceitar o estado do processo na situação em que se encontrasse à data do trânsito em julgado da sentença que deferisse a sua habilitação, natural e indiscutivelmente, que desse facto decorreria, de per se, um agravamento da posição processual dos réus nos autos principais, que mais que não fosse, ver-se-iam confrontados com duas partes (autores e apelante) em julgamento, em sede de recurso, etc.

Aliás, esse entendimento, que é o que o apelante sufraga nas suas alegações de recurso, onde propugna ser sempre legalmente admissível a habilitação parcial de cessionário, levaria a que se tivesse de concluir ter o legislador incorrido num manifesto contrasenso.

É que caso fosse admissível essa possibilidade, então, por um lado, o legislador permitiria que fruto da habilitação parcial de adquirente ou cessionário, este e os autores permanecessem, em simultâneo, na lide, o que, de per se, teria o condão de indiscutivelmente agravar a posição processual dos réus e, por outro, previa, na al. a), do n.º 1 do art. 356º do CPC, como possibilidade de oposição ao incidente de habilitação desse cessionário, a alegação e prova pelos réus que o ato de transmissão visou tornar mais difícil a posição dos mesmos no processo principal, incongruência essa que não se pode consentir.

Deste modo, não podemos deixar de subscrever a sentença recorrida, quando nela se pondera que “…sempre que o âmbito da transmissão ou cessão implique a manutenção na ação da parte primitiva por necessidade de apreciação de parte do seu objeto, a habilitação não pode ser deferida”, e quando se conclui que no caso sobre que versam os autos “estamos perante uma das situações que impede a procedência do incidente de habilitação do cessionário na medida em que a cessão de créditos, restringindo-se apenas a uma parte do objeto do litígio, implica a manutenção da lide, em conjunto, dos Autores e do cessionário, o que é contrário ao seu objetivo”.

Prosseguindo. Argumenta o apelante que perante a impossibilidade legal de ser habilitado parcialmente se impunha julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide relativamente ao pedido de indemnização formulado pelos autores por danos não patrimoniais e julgar procedente a habilitação que deduziu, isto porque, tendo os autores sido notificados para se oporem à habilitação, aqueles não deduziram oposição “pois perderam o interesse no prosseguimento dos autos e nas suas pretensões indemnizatórios após a celebração do contrato de adesão e de transmissão dos créditos”.

Continua o apelante sustentando que a manutenção do pedido de compensação por danos não patrimoniais apenas interessaria aos cedentes/autores originários, pelo que apenas aos mesmos caberia manifestar a intenção no seu prosseguimento e a sua manutenção como parte da lide, concluindo que “parece lógico que a perecer algum elemento processual deveria ser o pedido relativo aos danos não patrimoniais, que é obviamente suplantado nesta ação pela transmissão dos créditos indemnizatórios no valor de 100.000,00 euros e pela manifesta perda do interesse dos autores originários em prosseguir qualquer um dos pedidos formulados na ação”.

Ao assim argumentar, sem dúvida alguma que o apelante incorre em vários equívocos que importa deslindar.

O primeiro equívoco em que incorre o apelante é o de pretender que tendo deduzido o incidente de habilitação de cessionário, teriam os autores de manifestar a sua intenção em prosseguirem com a lide, nomeadamente, para efeitos do exercício do direito indemnizatório por danos não patrimoniais que deduziram contra os réus, argumento isto que é manifestamente improcedente.

Com efeito, ao instaurarem a ação principal contra os réus e ao formularem nela os pedidos que deduziram contra aqueles, onde consta o pedido de condenação solidária daqueles a indemnizá-los pelos danos não patrimoniais (sem que se olvide que deduziram todos os pedidos indemnizatórios que formulam, também contra a apelada (…) e (…), não abrangidos, na nossa perspetiva, pelo contrato de cedência de créditos celebrado), os autores já manifestaram a sua intenção de prossecução da lide e de nela permanecerem para apuramento da responsabilidade pelos pretensos danos que alegadamente sofreram e cuja responsabilidade assacam aos réus, pretensão essa de que não desistiram.

O outro manifesto equívoco em que incorre o apelante naquela sua argumentação é a de não atentar no caráter facultativa da habilitação de cessionário que deduziu e que, consequentemente, os autores, independentemente da transmissão de créditos que tenham feito para o mesmo, mantém sempre a sua legitimidade ad causam, até à habilitação do apelante, por sentença transitada em julgado, nos casos em que essa habilitação seja naturalmente legalmente possível, o que não é o caso da presente habilitação.

O terceiro equívoco em que incorre o apelante é não levar em devida conta que apenas “a parte contrária” daquele podia deduzir contestação ao incidente de habilitação de cessionário que deduziu, ou seja, no caso, os réus na ação principal, e não os aí autores, que são “cedentes” (13), pelo que estes nem sequer tinham de ser notificados para contestar o incidente e, muito menos, lhes assiste o direito a deduzir contestação ao incidente.

O quinto equívoco em que incorre o apelante é o de pretender extrair do silêncio dos autores (no caso, decorrente de pretensamente não terem contestado o incidente de habitação, quando, esse direito, reafirma-se, nem sequer lhes assistia) consequências jurídicas processuais, quando o silêncio, no sistema jurídico civil nacional, incluindo, processual civil, não vale como declaração negocial, exceto nos casos em que esse valor lhe seja atribuído por lei, uso ou convenção (art. 218º do CC), o que não é manifestamente o caso dos autos, uma vez que os autores nunca foram notificados (sequer o tinham, ou podiam, ser), para virem informar se mantinham interesse em prosseguir com a lide quanto aos danos não patrimoniais (e quanto aos restantes pedidos que formularam contra os apelados (…) e …), com a advertência de que nada dizendo, se concluiria que perderam esse interesse.

Finalmente, o último equívoco em que indiscutivelmente incorre o apelante nessa sua argumentação é o de pretender que perante o impedimento legal de se julgar procedente uma habilitação parcial de cessionário, se impunha sacrificar direitos das partes da ação e que, nesse caso, se impunha sacrificar o pedido indemnizatório por danos não patrimoniais nela formulado pelos autores, perante o maior valor do crédito que aqueles cederam à apelante, esquecendo ou desvalorizando que exceto declaração de quem exerce esses direitos (no caso, os autores), no sentido de desistirem da instância ou do pedido (arts. 283º, 285º e 286º do CPC), o tribunal não pode desvalorizar o que quer que seja, antes estando obrigado a conhecer de todos os pedidos e de todas as causas de pedir invocadas pelas partes para os ancorarem, seja proferindo, quanto a eles, decisões processuais, em caso de procedência de qualquer exceção dilatória (art. 576º, n.º 2 do CPC) ou de mérito.

Finalmente, sustenta a apelante que o fundamento em que o tribunal a quo estribou a improcedência do incidente de habilitação de cessionário que deduziu já não se verifica, uma vez que os Autores desistiram do pedido relativo aos danos não patrimoniais.

Acontece que conforme se vê de fls. 63 verso a 65, essa desistência do pedido deu entrada em juízo em 29/01/2019 e, por conseguinte, já após a prolação, em 12 de dezembro de 2018, da sentença recorrida, pelo que essa desistência jamais podia ter sido atendida nessa sentença, sequer pode ser atendida por esta Relação, dado tratar-se de questão nova.

Na verdade, sendo os recursos os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, através dos quais o recorrente obtém o reexame da matéria apreciada pela decisão recorrida, tratando-se, por isso, de meios que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova, neles não podem ser versadas questões que não tenham sido suscitadas perante o tribunal recorrido, exceto aquelas que são do conhecimento oficioso do tribunal (14), e muito menos, como acontece no caso, questões que nem sequer podiam ter sido suscitadas perante aquele tribunal, por se tratar de questão ocorrida em momento posterior à prolação dessa decisão.

Em sede de recurso, o que se coloca ao tribunal a quo é o reexame das questões que foram suscitadas e apreciadas (ou não apreciadas pelo tribunal, não obstante as dever ter apreciado – omissão de pronúncia) na decisão recorrida e com cujo julgamento o recorrente não se conforma e daí que aquele recorra, pedindo ao tribunal de recurso o reexame dessas questões que submeteu ao tribunal recorrido e com cujo julgamento não se conforma.

Logo, nessas questões que o apelante pode submeter a este tribunal de recurso não cabe naturalmente a questão da desistência do pedido dos autores, dado tratar-se de desistência que teve lugar já após a prolação da decisão recorrida.

Essa desistência do pedido dos autores poderá servir de fundamento para o apelante deduzir eventualmente novo pedido de habilitação de cessionário (parte inicial do n.º 3 do art. 352º do CPC), caso naturalmente entenda que, perante a mesma, nenhum óbice legal se suscita agora à sua habilitação (designadamente, o decorrente dos pedidos indemnizatórios formulados pelos autores o terem sido, também, contra os apelados … e …).

Aqui chegados, impõe-se concluir improcederem todos os fundamentos de recurso deduzidos pelo apelante e pela consequente improcedência da presente apelação, o que determina que o conhecimento do recurso subsidiário interposto pela apelada … fique necessariamente prejudicado (15), impondo-se a confirmação da sentença recorrida.
*
*
Decisão:

Nesta conformidade, os Juízes Desembargadores desta 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, acordam em julgar a presente apelação improcedente e, em consequência:

- confirmam a sentença recorrida.
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Custas pelo apelante (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
Notifique.
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Guimarães, 24 de abril de 2019
Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores:

Dr. José Alberto Moreira Dias (relator)
Dr. António José Saúde Barroca Penha (1º Adjunto)
Dra. Eugénia Maria Marinho da Cunha (2ª Adjunta)


1. Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1º, Coimbra Editora, 1999, pág. 480.
2. Ac. RL. de 23/02/2017, Proc. 640/10.0TBPDL-AA.L1-8, in base de dados da DGSI.
3. Lebre de Freitas, ob. cit., págs. 631 e 632.
4. Salvador da Costa, “Os Incidentes da Instância”, 5ª ed., Almedina, págs. 243 e 244.
5. Ac. RP. de 26/02/2008, Proc. 0726574, in base de dados da DGSI e Salvador do Costa, ob. cit., pág. 278.
6. Salvador da Costa, ob. cit., pág. 284; no mesmo sentido, Lebre de Freitas, ob. cit., pág. 645.
7. Lebre de Freitas, ob. cit., pág. 646.
8. Salvador da Costa, ob. cit., págs. 244 e 278. No mesmo sentido, Lebre de Freitas, ob. cit., pág. 645.
9. Salvador da Costa, in ob. cit., pág. 282.
10. Salvador da Costa, in ob. cit., pág. 278.
11. Ac. TCAN de 12/10/2018, Proc. 02861/14.7BEBRG-B, in base de dados da DGSI.
12. Ac. RP. de 30/01/2012, Proc. 115/09.0TBCHV-A.P1, in base de dados da DGSI, cujo sumário consta do seguinte: I- O incidente de habilitação da cessionária permite apenas duas opções: ou a cedente continua na lide, já que a habilitação decorrente da transmissão entre vivos da coisa ou direito litigioso, é facultativa, ou a cessionária intervém na lide, através da habilitação e, nesse caso, substitui a cedente adquirindo a posição processual in totum que a mesma tinha no pleito. II- Não há possibilidade de ambas permanecerem na lide, nem a possibilidade de cindir o objeto da mesma, excluindo a apreciação do pedido reconvencional, por força da substituição do sujeito processual cedente pelo sujeito processual cessionário, quando este não adquiriu, na totalidade, por via do negócio transmissivo, a posição contratual do cedente. III- Para efeitos do n.º 7 do art. 713º do CPC, tendo a autora apenas cedido a terceiro, através de uma dação pro solvendo, o direito de crédito que invoca sobre a ré, a cessionária não pode ser habilitada por daí decorrer a impossibilidade de apreciação da reconvenção que já tinha sido deduzida contra a cedente em momento anterior à celebração”. E Ac. RP. de 26/06/2017, Proc. 1701/15.4T8PVZ-A.P1, na mesma base de dados, que consta do seguinte sumário: “I- O interveniente principal assume uma posição processual que lhe atribui direitos idênticos aos da parte principal e, como associado ao réu, oferecendo articulado próprio, pode deduzir reconvenção. II- Face ao disposto no art. 266º, n.º 2, al. c) do CPC, a compensação de créditos terá sempre de ser operada por via da reconvenção, independentemente do valor dos créditos a compensar. III- A habilitação do cessionário apenas é possível se este substituir integralmente o autor primitivo. Não é possível a habilitação do cessionário da qual resulte a manutenção na ação do primitivo autor, ainda que para apreciação de parte do seu objecto. IV- A substituição da autora pela cessionária, em virtude da habilitação desta, inviabilizaria a apreciação do pedido principal” (destacado nosso).
13. Neste sentido, Salvador da Costa, in ob. cit., pág. 282, onde se lê: “A parte contrária é, (…), quem na lide está em posição contrária ao cedente ou transmitente ou ao adquirente ou cessionário, pelo que não é aquela que litigar em litisconsórcio ou em coligação com o cedente ou o transmitente ou com o cessionário ou o transmitente, conforme os casos. Assim, a co-parte de um ou de outro não tem de ser notificada, tal como não deve ser notificado o cedente ou o transmitente se a habilitação for requerida pelo adquirente ou pelo cessionário, nem o adquirente ou o cessionário, se a habilitação for requerida pelo transmitente ou pelo cedente” (destacado nosso).
14. Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. II, 2015, Almedina, págs. 395 e 396.
15. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª ed., Almedina, pág. 115.