Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4420/15.8T8VCT.G1
Relator: VERA MARIA SOTTOMAYOR
Descritores: ABSOLVIÇÃO DA INSTÂNCIA
ALCANCE
EFEITOS
PRESCRIÇÃO
INTERRUPÇÃO
CITAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/04/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário: I – O Autor não pode beneficiar duas vezes do mecanismo previsto no n.º 2 do artigo 279º do CPC e por isso a presente acção não deveria ter sido admitida, com a consequente absolvição da Ré da instância, por verificação de excepção dilatória inominada, em face da propositura, pela terceira vez, de nova acção, com o mesmo objecto das demais – cfr. artigos 279º n.º 1 e 2, 278º n.º 1 al. e), 576º e 577º do CPC.
II - Se em caso de absolvição da instância por verificação de qualquer excepção dilatória, o demandante pudesse instaurar sucessivas acções sobre o mesmo objecto até acertar, o princípio da economia processual também subjacente ao preceito perderia relevância, além de que deixa de ter justificação que o demandante continue a gozar das vantagens que lhe são concedidas pelo citado preceito legal.
III – Havendo interrupção da prescrição verifica-se a inutilização do primeiro prazo, começando a correr um segundo e último prazo.
IV – Quer face à razão de ser do instituto da prescrição, quer face ao disposto no artigo 326º do Código Civil, a prescrição é insusceptível de interrupção, por nova citação, quando já tenha sido interrompida uma vez.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães

APELANTES: - AA…
- BB… – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, LDA

I – RELATÓRIO
AA…, residente na Rua do …, freguesia de Cabaços, Ponte de Lima instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra “BB… – Sociedade de Construções, Ldª.”, com sede na Rua de Santa Catarina, … 4000-458 Porto, pedindo a condenação da Ré no pagamento:
- da quantia de €2.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais;
- da quantia de €42.840,0 de indemnização pelo despedimento ilícito;
- da quantia de €340,00 a título de proporcional de subsídio de Natal do ano da cessação do contrato;
- da quantia de €1.360,00 a título de retribuição de férias vencidas em 1/1/2013;
- da quantia de €816,00 de proporcionais de férias e subsídio de férias do ano referentes ao trabalho prestado no ano da cessação da relação laboral;
- juros de mora, à taxa de 4%, desde a citação.
- juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%.
Alegou em síntese, que no período compreendido de 02/05/2000 até 08/04/2013, trabalhou por conta da Ré, ininterruptamente, mediante retribuição, desempenhando as funções, inicialmente como carpinteiro de 2.ª, depois como carpinteiro de 2.ª e finalmente, como manobrador de nível III, tendo o contrato de trabalho a termo incerto terminado por iniciativa da Ré, que na data supra referida lhe comunicou que não tinha mais trabalho. Reclama por isso o pagamento das quantias devidas em face da ilicitude do despedimento e da cessação do contrato de trabalho.
Teve lugar a audiência de partes, onde não foi possível a conciliação.
A Ré contestou defendendo a inadmissibilidade da presente acção, por já ter sido utilizada uma vez faculdade prevista no artigo 279º do CPC, deduziu a excepção da prescrição e da sua ilegitimidade, arguiu a ineptidão da petição inicial e impugnou a existência do contrato de trabalho, concluindo pela improcedência da acção.
O Autor respondeu às excepções concluindo pela sua improcedência.
Os autos prosseguiram com a sua normal tramitação e por fim foi proferida sentença pelo Mmo. Juiz, que terminou com o seguinte dispositivo:
“Condenar a R. a pagar ao A. a quantia de €730,30, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa de 4%, absolvendo-a de tudo o resto peticionado.
Custas por A. e R. na proporção do respectivo decaimento e sem prejuízo do apoio judiciário.
Registe e notifique.”
*
Inconformado com esta sentença, dela veio o Autor AA… interpor recurso para este Tribunal da Relação de Guimarães e posteriormente veio a Ré interpor recurso subordinado, para este tribunal.
O Autor apresentou as suas alegações que terminam mediante a formulação das seguintes conclusões:
I. O Recorrente prestou trabalho para a Recorrida por conta e sob autoridade, ordens, direcção e fiscalização do Senhor CC, entre os dias 02.05.2000 e 08.04.2013, respectivamente, durante 13 anos, o Recorrente desempenhou funções inicialmente como carpinteiro de 2.ª, depois como carpinteiro de 2.ª e, finalmente, como manobrador de nível III, no sector da construção civil.
II. O Recorrente prestava trabalho a tempo inteiro, sendo remunerado a €8,50/hora (oito euros e meio por hora). Nos termos acordados pelas partes, o local da prestação de trabalho estava fixado no Conselho de Viana do Castelo.
III. Posto isto, no dia 08.04.2013, o Senhor CC, dirigiu-se ao Recorrente, dizendo-lhe que teria que prestar trabalho no estrangeiro. Como se não bastasse o facto de ter que se deslocar para fora do seu país, deixando para trás a sua família e os seus pertences, ainda foi comunicado ao Recorrente que a sua retribuição seria reduzida face ao valor/hora anteriormente estipulado.
IV. Face ao disposto nunca mais o Recorrente prestou trabalho para a Recorrida, nem esta voltou a convocar o Recorrente para trabalhar, tendo-lhe entregue a respectiva declaração para o desemprego, tendo sido despedido.
V. Pois que, quando o Recorrente se mostrou desagradado com a alteração inesperada do seu local de trabalho e com a redução do valor da sua retribuição, o Senhor CC acabou por dispensá-lo.
VI. Perante o sucedido, o Recorrente ficou em casa aguardar a reiteração pela sua entidade empregadora da decisão de cessação do contrato de trabalho, imperativo legal que até hoje ainda não foi cumprido, nos termos dos art.s 351.º e ss do Código de Trabalho.
VII. Tendo o Recorrente, desde a data de 08.04.2013, permanecido em casa conforme ordem da sua entidade patronal, à espera ou de ser convocado para trabalhar ou da formalização do despedimento por iniciativa do empregador.
VIII. A Recorrida, com a atitude descrita, mostrou uma absoluta falta de consideração pelo Recorrente, bem sabendo que este, perante a repentina alteração das condições de trabalho que até ali tinha desempenhado, nomeadamente, com a obrigação deste ter que prestar trabalho no estrangeiro e ainda ver a sua retribuição reduzida face ao valor/hora anteriormente estipulado, não concordava. Decidiu então, sem motivo para tal, dispensar o trabalhador nunca mais o convocando para trabalhar.
IX. O presente recurso tem por objecto a douta decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, Instância Central, Secção de Trabalho J1, de 27.05.2016 na qual, foi decidido condenar a Recorrida a pagar ao aqui Recorrente a quantia €730,30, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa de 4%, absolvendo-a de tudo o resto peticionado.
X. e XI. (…)
XII. O Recorrente deu entrada à presente Acção Emergente de Contrato de Trabalho com Processo Comum, contra a Recorrida BB….- Sociedade de Construção, Lda., peticionando a quantia global de 47.356,00 €, a título de créditos laborais e de indemnização.
XIII a XVII (…)
XVIII. Alegando-se ainda que o Tribunal “a quo” não terá apreciado convenientemente a matéria alegada e carreada para os autos, invoca-se para isso o erro de julgamento na apreciação dos factos e na consideração que o Tribunal fez no que toca à suficiência de factos alegados que comprovem a ilicitude do despedimento.
XIX. Pelo que deverá a douta sentença ser revogada e ser substituída por outra que de facto considere todos os factos constantes da petição inicial, quer para os factos, quer para a prova e, consequentemente, para a decisão da matéria de facto, para os efeitos previstos nos art.ºs 80.º, n.º 3, 72.º e 73.º, todos do CPT.
XX. (...)
XXI. Foi considerada não provada a seguinte matéria de facto, considerando-se incorretamente julgada:
“-que o CC “acabou por dispensar” o A.”, bem como o quesito 37.º da petição inicial
“-Com efeito, quando o Autor se mostrou desagradado com a alteração inesperada do seu local de trabalho e com a redução do valor da sua retribuição, o Senhor CC acabou por dispensá-lo, não mais o convocando para trabalhar” .
XXII. Salvo o devido respeito, considera-se que tal facto deveria considerar-se provado, atenta as declarações das testemunhas, inclusive as declarações de parte. Considera-se do mesmo modo, que a prova de tal elemento se considera relevante para a correcta decisão da causa.
XXIII. (…)
XXIV. Ora, resulta da prova gravada que o Recorrente não concordou com a decisão unilateral por parte da empresa de ter que ir trabalhar para mais longe nem com o facto de ver o seu ordenado reduzido. Perante a insatisfação do Recorrente, a Recorrida não esteve com meias medidas, solicitando ao Recorrente que se deslocasse ao escritório da Recorrida, tendo esta entregue o “papel para o fundo de desemprego” e expressamente disse: “ides embora, à vossa vida”.
XXV. Com esta atitude da Recorrida não podia o Recorrente muito mais fazer, pois que, deixando-o numa posição fragilizada, assumindo uma posição de supremacia que não raras vezes a entidade empregadora se reveste, não teria outra forma de actuar.
XXVI. e XXVII. – (…)
XXVIII. Ficou, assim, demonstrado que a atitude da Recorrida se materializou numa atitude de dispensa do Recorrente, de forma tácita, do ponto de vista do trabalhador tal resultou em despedimento de facto.
XXIX. Discordando do que na douta sentença se considerou, a entrega do “papelinho para entregar na segurança social para terem direito ao fundo de desemprego” configura um comportamento por parte da entidade patronal que do ponto de vista do trabalhador resulta inequívoco que aquela já não pretende mais a sua prestação laboral.
XXX. Também andou mal a decisão o Tribunal “a quo” ao desconsiderar a prova documental, mais propriamente a declaração de situação de desemprego, junta com a Petição Inicial em 02.12.2015.
XXXI. Pois da análise do referido documento, preenchido pela Recorrida, assinala-se a opção de caducidade do contrato por termo de contrato a termo. Ora, é evidente que da análise do documento não retira o Tribunal qualquer conclusão nem consequência jurídica, pois se o contrato de trabalho caducou deveria a entidade empregadora ter junto ao processo
aviso prévio.
XXXII. Assim, deverá o quesito 37.º da Petição Inicial, considerando não provado na douta sentença, considerar-se provado no que se refere à parte:
“(…) o Senhor CC acabou por dispensá-lo (…)”.
XXXIII. Se se entende que o CC nunca mais convocou o Recorrido para trabalhar, é porque a forma como as partes da referida relação laboral operavam, havendo necessidade de convocação pela entidade empregadora ao trabalhador para desempenhar certa função ou tarefa, pelo que, a entidade empregadora ao nunca mais convocar o trabalhador aqui Recorrente para trabalhar, é porque reitera de forma inequívoca, do ponto de vista do trabalhador de que não pretende manter a relação contratual, configurando-se assim, do ponto de vista do trabalhador em despedimento.
XXXIV. E muito menos, tendo omitido a compatibilização de toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções da regra da experiencia, nos termos do artigo 607.º, n.º 4, ocorrendo também nestes termos erro de julgamento.
XXXV. Bem como e pelo exposto, se deverá considerar provados os seguintes quesitos 6.º, 7.º, 8.º, 36.º, 37.º e 38.º da petição inicial, com todos os devidos efeitos legais.
XXXVI. Relativamente às questões de direito, considerou o tribunal “a quo” que as únicas questões relevantes a decidir eram:
-se o A. foi objecto de um despedimento ilícito, com todas as consequências legais;
- quais os créditos laborais que lhe são devidos pela cessação do contrato de trabalho.
XXXVII. Relativamente à primeira questão, considerou-se que não houve por parte da Recorrida qualquer declaração expressa de despedimento, mas debruçando-se a decisão sobre a questão do “despedimento de facto”.
XXXVIII. O Tribunal “a quo”, julgando erradamente, considerou que a factualidade dada como provada foi insuficiente para se poder afirmar esse comportamento susceptível de poder ser entendido pelo trabalhador como a manifestação de uma vontade.
XXXIX. Entende-se que a atitude de convocar o Recorrido para comparecer no escritório, entregar a declaração para o fundo de desemprego e ainda dizendo: “ides embora, à vossa vida”, não poderá ter outro entendimento senão a intenção de despedir o aqui Recorrente.
XL. Posição reiterada com o facto dado como provado, de que nunca mais foi o Recorrente convocado para trabalhar. Ora todo o exposto resulta inequívoco para o trabalhador de que a factualidade descrita se traduz em despedimento.
XLI. Assim andou mal o Tribunal “a quo” ao considerar erradamente que não houve despedimento de facto, justificando a posição liminarmente com o não preenchimento do artigo 217.º, n.º1, pois que se considera haver declaração negocial tácita que se traduz no despedimento.
XLII. O Tribunal “a quo” não terá assim apreciado convenientemente a matéria alegada e carreada para os autos, nem sequer aplicado correctamente as normas jurídicas aplicáveis e identificadas supra.
XLIII. Pelo que deverá a douta sentença ser revogada e ser substituída por outra que de facto considere todos os factos constantes da petição inicial, quer para os factos, quer para a prova e, consequentemente, para a decisão da matéria de facto, para os efeitos previstos nos art.ºs 80.º, n.º 3, 72.º e 73.º, todos do CPT.
Termina pedindo a revogação da sentença recorrida com a sua substituição por outra que considere o despedimento ilícito, condenando ainda a Recorrida a pagar ao Recorrente indemnização a título de danos não patrimoniais pelo despedimento ilícito.
A Ré apresentou contra alegação, arguiu a nulidade da sentença e apresentou alegação do recurso subordinado formulando as seguintes conclusões:
Da nulidade da sentença
1- Nos termos e para os efeitos do preceituado no nº 1, alínea d) do artigo 615º do C. P. Civil, invoca-se expressamente a NULIDADE da douta sentença recorrida.
2- Com fundamento em que o Meritíssimo juiz procedeu à prolação da decisão, sem que se pronunciasse sobre as exceções arguidas pela Ré na sua contestação.
3- Conhecimento das exceções cuja decisão foi relegada para final pelo Mmº Juiz “a quo”, através de despacho que foi notificado à Ré, com data de 8/04/2016.
4- A decisão não contemplou tais questões suscitadas pela Ré, sendo que a falta de pronúncia sobre as exceções invocadas pela Ré, por parte do Mmº Juiz, constitui uma nulidade suscetível de influir na decisão da causa, cfr. artigo 195º nº 1, que deste modo se argui, cfr. parte final artigo 196º do Cód. Proc. Civil.
Da impossibilidade de o autor propor uma segunda ação judicial ao abrigo do disposto no artigo 279º do cod. proc. civil.
5- Embora o nº 1 do artigo 279º refira que “A absolvição da instância não obsta a que se proponha outra ação sobre o mesmo objeto” (sublinhado nosso), todavia, o Autor apenas poderá propor uma segunda ação judicial, e não um conjunto indeterminado de ações até que que uma delas venha a ser considerada procedente, como o fez o Autor.
6- Tal significa que o Autor, proposta uma ação judicial que termina com decisão de absolvição da instância da Ré por ineptidão da petição inicial, apenas e só poderá, com base nesta disposição legal, propor outra nova ação aproveitando os efeitos derivados da proposição da primeira ação, e não outras ações (tantas quantas entender por bem).
7- Posição da Ré que é confirmada pelo disposto nos nºs 2 e 3 do mesmo artigo 279º quando aí se refere:
nº 2 “(…) os efeitos civis derivados da primeira causa (…), (sublinhado nosso).
nº 3 “(…) as provas produzidas no primeiro processo (…), (sublinhado nosso).
8- Acontece que o autor, antes de propor a presente ação judicial já tinha proposta uma segunda ação judicial ao abrigo do disposto no artigo 279º, ação que tomou o nº 983/15.6T8VCT – J1 sendo que a primeira tomou o nº 278/14.2TTVCT – J2.
9- Tendo feito uso dessa faculdade, como fez, ao propor uma segunda ação judicial, ação nº 983/15.6T8VCT – J1, depois de ter interposto a primeira ação que tomou o nº 278/14.2TTVCT – J2, não pode mais fazê-lo sob pena de estar a fazer uma interpretação abusiva da norma.
10- Razão pela qual, não sendo assim admissível a presente ação judicial, deveria a mesma ter sido rejeitada liminarmente.
Da prescrição do prazo para interposição de uma nova ação judicial com fundamento no artigo 279º do cód. proc. civil
11- A cessação da relação laboral do Autor, independentemente da identidade da sua empregadora, remonta a 08/04/2013, ponto 1 dos fatos provados, pelo que decorreram mais de dois anos desde a data em que cessou a relação laboral entre Autor e Ré, até à entrada em juízo da presente ação judicial.
12- Sendo que o prazo prescricional terminaria, se não fosse interrompido, no dia 7 de Abril de 2014.
13- O prazo prescricional dos direitos do Autor, exercitados nessa outra e na presente ação, interrompeu-se, por consequência, em 7 de Abril de 2014 (cf. nº 2 do art. 323º do C. Civil).
14- Na ação que tomou o nº 278/14.2TTVCT – J2, a ora Ré foi absolvida da instância por decisão transitada em julgado em 23 de Fevereiro de 2015 (cf. art. 1º da p.i. e doc. nº1 a que o Autor se refere).
15- Nessa conformidade e nos termos do nº 2 do art. 327º do C. Civil, o novo prazo prescricional, subsequente à interrupção ocasionada pela propositura da antecedente ação nº 278/14.2TTVCT – J2, começou a correr logo após o ato interruptivo verificado em 7 de Abril de 2014.
16- Desde então (7 de Abril de 2014 – data de início do novo prazo prescricional) até à data de propositura da presente ação judicial – segunda ação judicial proposta com fundamento no disposto no artigo 279º do Código Processo Civil (02 de Dezembro de 2015) - decorreu mais de um ano.
17- À luz do disposto no nº 1 do art. 337º do Cód. Trabalho, estão, assim, extintos, por prescrição, todos os direitos exercitados pelo Autor na presente ação (que caducou).
18- Sendo certo que ao Autor não aproveita a estatuição contida no nº 3 do art. 327º do C. Civil em virtude de a absolvição da instância, decretada na primeira ação judicial e também na segunda ação, ser imputável ao próprio Autor.
19- Pois que, no que se refere aos pedidos formulados na referida ação nº 278/14.2TTVCT – J2 e também na ação que tomou o nº 983/15.6T8VCT – J1 (e que também vêm formulados na presente ação), decidiu-se que a p.i. era inepta por falta de causa de pedir e contradição entre o pedido e a causa de pedir, originando exceção dilatória conducente à absolvição da instância por ineptidão da petição inicial.
20- A decisão proferida na antecedente e primeira ação nº 278/14.2TTVCT – J2, e também na posterior e segunda ação que tomou o nº 983/15.6T8VCT – J1, evidencia que a absolvição da Ré da instância aí decretada e, bem assim, os vícios que a motivaram são exclusivamente imputáveis ao Autor, que poderia e deveria ter agido de outro modo.
21- E não o fez, mesmo depois de em cada uma das ações que se vem de referir ter sido convidado ao aperfeiçoamento das p.i., com indicação expressa das insuficiências verificadas, não lhe aproveitando, por isso, a extensão do prazo prescricional a que se refere o nº 3 do art. 327º do C. Civil (cf. também o nº 1 do art. 332º do C. Civil).
22- Razão pela qual deve considerar-se procedente a exceção ora invocada de prescrição e caducidade, atendendo ao disposto nos artigos 279º do Código Processo Civil, 323º, 327º e 332º do Código Civil.
Da ilegitimidade da ré
23- O Autor não assinou, nem poderia ter assinado com a ora Ré BB… Sociedade de Construções, Ldª, o contrato de trabalho a que se refere no artigo 11 da P.I. e pelo fato de que a ora Ré, BB… Sociedade de Construções, Ldª, só foi constituída em três de Novembro de 2005 por escritura outorgada no 1º Cartório Notarial de Competência Especializada de Matosinhos, cfr. doc. nº 1 junto aos autos com a contestação.
24- O Autor não foi nunca trabalhador da BB… Sociedade de Construções, Ldª, desde o dia 2 de Maio de 2000 e, de forma ininterrupta, até 8 de Abril de 2014.
25- Tal contrato de trabalho foi celebrado com uma empresa distinta e autónoma da ora Ré e com personalidade jurídica distinta, a SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES DD, LDª, para quem sob as suas ordens, direção e fiscalização o Autor trabalho desde o ano de 2000 e até 28 de Janeiro de 2008, altura em que celebrou contrato de trabalho com a ora Ré.
26- Daí que a Ré BB…. Sociedade de Construções, Ldª não seja parte da relação contratual decorrente desse contrato de trabalho, não sendo portanto titular da relação material controvertida, donde resulta nítida falta de interesse em contradizer, pelo que terá de ser considerada parte ilegítima (art. 30º, nº 1, C. P. Civil).
Da prescrição dos créditos laborais
27- O autor celebrou um contrato de trabalho com a ora Ré em 28 de Janeiro de 2008.
28- A presente ação judicial, para efeitos de prescrição, tendo em conta a anterior ação judicial sobre a mesma matéria que tomou o nº 278/14.2TTVCT – J2 e do disposto no artigo 279º, nºs 1 e 2 do CPC, considera-se entrada em juízo apenas no dia 02 de Abril de 2014.
29- Decorreu assim mais de um ano sobre a data em que terminou o prazo previsto na lei para que o Autor reivindicasse eventuais direitos daí resultantes.
30- Pelo que, não restam dúvidas, relativamente ao contrato referido, que a Ré não reconhece, os eventuais créditos do A. se encontram prescritos.
31- Pelo que qualquer relação laboral com a Ré BB. - Sociedade de Construções, Ldª, já teria prescrito nos termos do disposto no art. 337º do Código do Trabalho, o que desde já se invoca.
32- A decisão viola além do mais o disposto no nº 1, alínea d) do artigo 615º do C. P. Civil.
II - DAS CONTRA-ALEGAÇÕES
33- O Meritíssimo Juiz "a quo" fundamentou clara, exaustiva e seguramente a decisão imerecidamente posta em crise que se aplaude, carecendo de qualquer fundamento as doutas alegações apresentadas pelo recorrente.
34- O Autor não logrou provar em sede de audiência de discussão e julgamento factos que por si fundamentem a sua pretensão, prova de um despedimento ilícito por parte da Ré.
35- O Autor nunca conseguiu colmatar a falta de alegação de fatos concretos em que fundamentasse a sua pretensão, como diz o Mmº Juiz “a quo” e bem, “apesar dos múltiplos convites para aperfeiçoamento dos seus articulados que lhe foram efetuados pelo tribunal”.
36- Tendo o Autor confessado, artigos 11º e 15º da douta p.i., que foi ele próprio quem se despediu quando alega “… a Ré intimou o ora Autor para trabalhar no estrangeiro, mas com diminuição da sua remuneração/retribuição, pelo que o ora trabalhador e ora Autor viu-se obrigado a procurar novo trabalho”, e entrado em contradição na matéria por si alegada.
37- Posição que foi assumida por todas as testemunhas arroladas pelo Autor nos seus curtíssimos depoimentos em que afirmaram, sem margem para qualquer dúvida, em resposta à pergunta feita pelo Mmº Juiz, “… e vocês não quiseram ir”, afirmando todos, “… não e viemos embora”.
38- Nem o motivo alegado que o local para a prestação do trabalho era Viana do Castelo, pois que, e como decorre do doc. junto com a contestação como doc. nº 2, na sua cláusula 5ª, “em caso de deslocação temporária do local de trabalho, para qualquer outro local de Portugal ou do estrangeiro, o segundo outorgante não poderá recusar a prestação do mesmo (…)”.
39- O que claramente demonstra a recusa do trabalhador em continuar a prestar o seu trabalho à sua entidade patronal, tendo-se recusado por sua livre iniciativa e vontade.
40- Não houve, assim, contrariamente ao sustentado pelo Autor qualquer despedimento ilícito do Autor por parte da sua entidade patronal.”
Termina pugnando pela improcedência do recurso e pela procedência do recurso por si interposto devendo a sentença ser substituída por outra que absolva a Ré da totalidade dos pedidos.
*
Contra alegou o Autor concluindo pela improcedência do recurso subordinado.
*
Na sequência da arguição de nulidade da sentença, por omissão de pronúncia – cfr. artigo 615º n.º 1, alínea d), 1ª parte do CPC, suscitada no recurso subordinada, veio a mesma a ser suprida por despacho proferido a 19/12/2016, o qual apreciou as excepções deduzidas pela Ré e se fez constar o seguinte:
“Alega a R. que o A. apenas poderia aproveitar, por uma vez, do disposto no artº. 279, nº. 1, do C. P. Civil, o qual dispõe:
“A absolvição da instância não obsta a que se proponha outra acção sobre o mesmo objecto.”
Embora com profundo respeito por opinião contrária, afigura-se-nos que a lei não estabelece qualquer limite para a utilização dessa faculdade e não vemos como se poderá interpretar a norma em causa com esse sentido.
Nessa medida, a circunstância do A. já ter proposto uma anterior acção, aproveitando o disposto naquele normativo, nada obsta a que, ocorrendo nova absolvição da instância, ou seja, uma decisão que não se debruça sobre o fundo da causa, possa novamente recorrer a tribunal para apreciação da matéria objecto de litígio, aproveitando a faculdade supra referida e respectivos efeitos.
Por outro lado, e quanto à prescrição alegada pela R., dir-se-á, em primeiro lugar que, entre o fim da relação laboral com a R. – 8/4/2014, data em que o A. não mais trabalhou para aquela – e a citação para a primeira acção (278/14.2TTVCT), não decorreu o prazo de um ano previsto no artº. 337, nº. 1, do C. Trabalho.
Por outro lado, nos termos do artº. 327 do C. Civil, quando se verifique a absolvição da instância, o prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo.
O que significa, para o que aqui nos interessa, que após cada uma das absolvições da instância começou a correr um novo prazo de um ano, o qual não se esgotou antes da citação da R. para a acção 983/15.6T8VCT e para a presente acção.
O que significa que também não se verifica aqui a excepção invocada pela R.
Por último, a questão que a R. intitula de ilegitimidade prende-se não com a problemática processual invocada, mas antes com a procedência ou não da acção quanto a si.
Registe e notifique, ficando o presente despacho a fazer parte integrante da sentença já proferida nos autos.”
Tal despacho em conformidade com o estabelecido pelo artigo 617º n.º 2 do CPC passou a ser complemento e parte integrante da sentença recorrida e por dele discordar veio a Ré ao abrigo do disposto no artigo 617º n.º 3 do CPC, alargar o âmbito do recurso subordinado inicialmente apresentado terminando com as seguintes conclusões recursórias.
“1 - A relação laboral do autor com a sua entidade patronal, aqui Ré, terminou em 8/4/2013 e não em 8/4/2014 como consta da fundamentação do despacho que retificou a douta sentença.
2 - A primeira ação judicial que o Autor instaurou contra a sua entidade patronal, aqui Ré, entrou em juízo no dia 2 de Abril de 2014 e correu termos sob o nº 278/14.2TTVCT-J2, com fundamento em despedimento ilícito.
3 - Caso a relação laboral entre Autor e Ré tivesse terminado apenas em 8/4/2014, nunca tal ação judicial poderia ter dado entrada em juízo, com fundamento em despedimento ilícito, no dia 2 de Abril de 2014.
4 - Tendo a relação laboral do autor com a Ré terminado no dia 8/4/2013 a matéria de fato dada como provada no ponto 5 – dos fatos provados, “No dia 8/4/2014, o já citado Orlando (…)”, enferma, com o devido respeito, de manifesto lapso de escrita quanto à data e concretamente quanto ao ano.
5 - Tal ponto da matéria de fato dada como provada deverá, pois, ser alterada e onde consta o ano de 2014 deverá passar a constar o ano de 2013, em consonância, aliás, com a matéria de fato dada como provada e constante do ponto 1- dos fatos provados.”
O Autor apresentou contra alegação ao abrigo do disposto do n.º 3 do artigo 617º do CPC. concluindo que deve ser negado provimento quer ao recurso interposto pela Ré, quer ao complemento de recurso por aquela apresentado.
*
Admitidos os recursos na espécie própria e com o adequado regime de subida e efeito, foram os autos remetidos a esta 2ª instância.
Foi determinado que se desse cumprimento ao disposto no artigo 87º n.º 3 do C.P.T., tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido o douto parecer de fls. 254 a 261 no sentido da procedência do recurso subordinado.
Notificados os Recorrentes para responder, querendo, ao parecer do Ministério Público, nada vieram dizer.

Foi dado cumprimento ao disposto na primeira parte do nº 2 do artigo 657º do Código de Processo Civil e foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II – DO OBJECTO DOS RECURSO
São dois os Recursos trazidos à nossa apreciação, um interposto pelo Autor e outro, o recurso subordinado, interposto pela Ré, pelo que iremos analisar cada um dos recursos, iniciando a apreciação pelo recurso subordinado, uma vez que o objecto deste recurso se cinge a apreciação de excepções que têm prioridade sobre as questões que são objecto do recurso independente e que a procederem, ficará prejudicado o conhecimento do recurso interposto pelo Autor – cfr artigos 278º n.º 1, 595º n.º 1 e 608º n.º 1 do CPC.
Delimitado o objeto dos recursos pelas conclusões dos recorrentes (artigos 608º n.º 2, 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 3, todos do Código de Processo Civil), não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nela não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, que aqui se não detetam, colocam-se à apreciação deste Tribunal da Relação as seguintes questões:
Apelação da Ré
1 - Da possibilidade/impossibilidade da propositura de uma segunda ação judicial com fundamento no artigo 279º do CPC;
2 - Da prescrição dos créditos laborais;
3 – Da ilegitimidade da Ré;
Apelação do Autor
1 - Da impugnação da decisão da matéria de facto e consequências daí decorrentes;
2 – Da impugnação da decisão de direito;
III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Em 1ª instância considerou-se provada a seguinte matéria de facto:
1 – Desde 2/5/2000 a 8/4/2013, o A. desempenhou a sua actividade profissional, primeiro como pedreiro de 2ª, depois como carpinteiro de 2ª e, por fim, como manobrador nível III, sendo que a direcção e fiscalização do seu trabalho foi sempre, durante este lapso temporal, efectuada por CC, pessoa que igualmente lhe transmitia as ordens.
2 – O processamento dos seus salários foi efectuado em nome das seguintes sociedades:
- desde Maio de 2000 até 2006 – pela “Sociedade de Construções DD, Ltª.”;
- entre 2006 e 2008 – ora pela R., ora pela “Sociedade de Construções DD, Ltª.”;
- a partir de 2008 – pela R.
3 – O referido CC era sócio e gerente da “Sociedade de Construções DD, Ltª.”, bem como o é da R.
4 – Em 25/1/2008, o A. e a R. assinaram o documento escrito de fls. 45-verso e 46, intitulado “Contrato de Trabalho”, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
5 – No dia 8/4/2013, o já citado CC comunicou ao A. que ele teria que ir prestar trabalho para o estrangeiro e que a sua retribuição lhe seria reduzida, pelo que o A. não mais prestou trabalho para a R. (retificada a data).
6 – O CC, desde a data referida em 5), não mais convocou o A. para trabalhar.
7 – O A. auferia, como retribuição, a quantia de €8,50/hora, prestando 8 horas de trabalho por dia e 40 por semana.
8 – A R. pagava ao A. o subsídio de Natal em duodécimos.
9 – No ano da cessação da relação laboral, a R. proporcionou ao A. o gozo de 22 dias úteis de férias.
10 – A R. não pagou os proporcionais de férias e subsídio de férias relativos ao trabalho prestado no ano da cessação da relação laboral.
IV – APRECIAÇÃO DOS RECURSOS
QUESTÃO PRÉVIA
No tocante à matéria de facto, apesar da mesma não ter sido impugnada pela Ré, ora Apelante, veio esta invocar que o ponto 5 do elenco dos factos provados padece de lapso manifesto de escrita no que respeita à data aí mencionada, já que aí se fez contar 8/04/2014, em vez de 8/04/2013, pelo que se impõe a respectiva retificação.
Com efeito, resulta dos factos apurados que o Autor trabalhou ininterruptamente por conta da Ré até 8/04/2013, razão pela qual ao ter-se consignado no ponto 5 dos factos dados como provados 8/04/2014, como sendo a data em que o autor não mais trabalhou para a Ré, só pode trata-se de um lapso de escrita que se passará a retificar passando assim a ler-se “8/04/2013” onde anteriormente se lia “8/04/2014”.
Da Apelação da Ré
1 - Da possibilidade/impossibilidade e da propositura de uma segunda ação judicial com fundamento no artigo 279º do CPC.
Insurge-se a Recorrente quanto ao facto do tribunal a quo ter considerado que a lei não estabelece qualquer limite para a utilização da faculdade prevista no artigo 279º n.º 1 do CPC e que nessa medida o facto de o A. já ter proposto uma anterior acção aproveitando o disposto naquele normativo, não obsta, a que ocorrendo nova absolvição da instância, possa novamente recorrer a tribunal para apreciação da matéria objecto de litígio, aproveitando-se de tal faculdade e dos respectivos efeitos.
Discorda o Recorrido, defendendo a manutenção da decisão do tribunal a quo referente a esta questão, já que a lei não estabelece qualquer limite para o número de vezes respeitante ao uso do direito conferido pelo artigo 279º do CPC.
A questão a apreciar respeita à aplicabilidade e ao alcance a dar ao disposto no n.º 2 do artigo 279º do CPC, para que possamos apurar se em caso de absolvição da instância por verificação de excepção dilatória, o demandante pode instaurar apenas uma outra ou várias outras acções sobre o mesmo objecto.
Estabelece o art.º 279º n.º 1 do CPC que a absolvição da instância não obsta a que se proponha outra acção sobre o mesmo objecto; e o n.º 2 estabelece que sem, prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos, os efeitos civis derivados da propositura da primeira causa e da citação do réu mantêm-se quando seja possível, se a nova acção for intentada ou o réu for citado para ela dentro de trinta dias a contra do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância.
A instância inicia-se pela propositura da acção e esta considera-se proposta, intentada ou pendente logo que seja recebida na secretaria a respectiva petição inicial, sem prejuízo do disposto no art.º 144 do CPC que regula a forma de envio das peças processuais.
Proferida uma decisão de conteúdo puramente formal, pode ainda o requerente continuar a beneficiar da tutela cautelar, desde que proponha uma nova acção dentro de 30 dias a contar do trânsito em julgado nos termos do art.º 279, n.º 2 do CPC
A apresentação da nova petição, desde que obedeça aos requisitos processuais, corresponde à propositura de uma nova acção com o intuito e renovar a anterior.
Importa antes de mais consolidar os elementos de facto e de direito que relevam para apreciação da questão da admissibilidade da acção.
Na presente acção está em causa matéria que se consubstancia na cessação de um contrato de trabalho celebrado entre as partes, o que ocorreu em 8/04/2013 e nas consequências patrimoniais daí decorrentes.
- Com os mesmos fundamentos invocados na presente ação, o Autor demandou a Ré em acção instaurada em 3 de Abril de 2014, que correu termos sob o nº 278/14.2TTVCT – J2 no extinto Tribunal do Trabalho de Viana do Castelo, tendo a Ré sido citada em 9/04/2014 e sido absolvida da instância, por decisão proferida em 16-01-2015, em face da procedência da excepção dilatória por si invocada de ineptidão da petição inicial. Tal decisão transitou em julgado em 11/02/2015 (certidão de fls. 226 e ss.). No âmbito desta acção o Autor foi convidado a juntar nova petição inicial que suprisse as deficiências assinaladas pelo juiz a quo, não tendo no entanto apresentado nova petição.
- Com os mesmos fundamentos invocados na presente ação, o Autor demandou a Ré em ação instaurada em 10 de Março de 2015, que correu termos sob o nº 983/15.6T8VCT – J1 no Tribunal da Comarca de Viana do Castelo, Instância Central, Secção do Trabalho, tendo a Ré sido citada em 17/03/2015 e sido absolvida da instância, em face da procedência da excepção dilatória por si invocada de ineptidão da petição inicial. Tal decisão transitou em julgado em 02/11/2015. No âmbito desta acção o Autor foi convidado a juntar nova petição inicial que suprisse as deficiências assinaladas pelo juiz a quo, correspondeu ao convite juntando nova petição que enfermava dos mesmos vícios da inicial.
- A presente acção foi instaurada no dia 2/12/2015, tendo a Ré sido citada no dia 11/12/2015.
Destes factos resulta claro que foram propostas pelo Autor três acções sobre o mesmo objecto e pelos mesmos fundamentos, sendo certo que nas duas primeiras a Ré foi absolvida da instância por ineptidão da petição inicial.
A absolvição da instância unicamente extingue a relação jurídica processual, pois a relação jurídica substancial mantém-se intacta, podendo ser objecto de nova acção.
Importa salientar que a sentença de absolvição da instância não origina caso julgado material mas tão-somente formal, pelo que nada impede que numa outra acção a mesma questão venha a ser apreciada, desde que seja proposta dentro de 30 dias a contar do trânsito em julgado – cfr. n.º 2 do artigo 279º do CPC.
Questão diferente e que importa apreciar é de saber quais os efeitos decorrentes da propositura de acções sucessivas que tenham terminado com a absolvição da instância.
No que respeita à possibilidade de apresentação de nova petição inicial ao abrigo do disposto no artigo 476º do CPC, na redacção anterior à reforma do DL 329-A/95, de 12/12, o acórdão da Relação de Lisboa de 29 de Abril de 2004, proferido no Proc n.º 1556/2004-2 (relatora Maria José Mouro) refere o seguinte:
Em termos lógicos apenas duas hipóteses poderão ser consideradas: ou aquele benefício poderia ser usado somente uma vez em cada processo, ou poderia ser usado um número infinito de vezes, tantas quantos os sucessivos indeferimentos o proporcionassem, no mesmo processo. Por outras palavras: se defendermos que tal benefício poderá ter lugar mais do que uma vez, não poderemos limitá-lo a uma ocorrência de duas ou três vezes. Ora, assim sendo, nesta última hipótese o princípio da economia processual subjacente ao preceito perde relevância, além de que deixa de ter justificação que o A. continue a gozar das acima aludidas vantagens - aproveitando-lhe a proposição tempestiva da acção, a distribuição efectuada e o pagamento já realizado do preparo inicial - por tempo indefinido, sucedendo-se as várias petições.
Nestas circunstâncias, entende-se que, em rigor, a lei não terá querido prever a utilização sucessiva, no mesmo processo daquele benefício, pelo que no despacho recorrido (o despacho de fls. 80) não foi feito qualquer agravo à recorrente ao não se admitir a apresentação de um terceiro requerimento inicial.”
Consideramos que estas reflexões valem relativamente à utilização do mecanismo previsto no art. 279º, nº 2 do CPC, (artigo 289º n.º 2 do CPC na anterior redacção), pois se em caso de absolvição da instância por verificação de qualquer excepção dilatória, o demandante pudesse instaurar sucessivas acções sobre o mesmo objecto até acertar, o princípio da economia processual também subjacente a preceito perderia relevância, além de que deixa de ter justificação que o demandante continue a gozar das vantagens que lhe são concedidas pelo citado preceito legal.
Se por um lado de acordo com o estabelecido no n.º1 do artigo 279º do CPC. ocorrendo absolvição da instância nada obsta a que seja proposta uma nova acção com o mesmo objecto, relativamente aos demais efeitos decorrentes da absolvição da instância teremos de entender que os mesmos apenas se aplicam e verificam relativamente à primeira acção, pois tal como decorre dos números 2 e 3 do artigo 279º do CPC os efeitos civis (excluindo os decorrentes da prescrição e da caducidade) derivados da propositura da primeira causa e citação do réu, bem como as provas produzidas no primeiro processo, mantêm-se e podem ser aproveitadas desde que verificados os demais requisitos aí previstos.
Os efeitos que de alguma forma podemos apelidar de renovação da instância que decorrem da previsão normativa ínsita no artigo 279º do CPC apenas se verificam relativamente à segunda acção.
A propósito de se saber se em caso de absolvição da instância por verificação de excepção dilatória pode ser instaurada mais do que uma acção, decidiu-se no Acórdão da Relação de Lisboa, de 25 de Junho de 2009, proferido no Processo n.º 1872/07.3TVLSB-C.L1-6 (relatora Fátima Galante) em cujo sumário se fez consignar o seguinte:
“ I - Proferida decisão de absolvição da instância, pode o autor, em nova acção intentada, beneficiar da manutenção dos efeitos civis derivados da primeira causa, quando seja possível, desde que essa nova acção seja proposta no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado daquela decisão.” (sublinhado nosso).
Tudo isto para concluirmos que o Autor não pode beneficiar duas vezes do mecanismo previsto no n.º 2 do artigo 279º do CPC e por isso a presente acção não deveria ter sido admitida, com consequente absolvição da Ré da instância, por verificação de excepção dilatória inominada em face da propositura, pela terceira vez, de nova acção, idêntica e com o mesmo objecto das demais – cfr. artigos 279º n.º 1 e 2, 278º n.º 1 al. e), 576º, e 577º do CPC.
Procedem assim as conclusões do recurso subordinado enumeradas de 5 a 10.
Mas caso assim não entendêssemos e porque no caso em apreço os efeitos que se pretende salvaguardar respeitam à prescrição e estes de alguma forma estão ínsitos da previsão normativa do artigo 279º do CPC, que a este respeito remete para a lei civil, importa ainda assim indagar, tendo presente a posição por nós assumida relativamente ao alcance dos efeitos da absolvição da instância, se aquando da propositura da presente acção já se encontravam prescritos os direitos que o Autor pretendia fazer valer.
2 - Da prescrição dos créditos laborais
Da análise conjugada do n.º 2 do art.º 279º do CPC com os artigos 323º e 327º do Código Civil iremos encontrar resultado semelhante no que respeita ao insucesso da presente desta vez, em face da verificação da excepção da prescrição deduzida pela Ré.
Vejamos porquê:
Como é consabido, quer a prescrição, quer a caducidade assentam no não exercício do não direito durante determinado período de tempo prescrição, com a diferença que em regra na primeira o direito foi criado sem prazo de vida, mas extingue-se pelo não exercício duradouro e a caducidade prende-se com a morte de um direito já criado com um certo prazo de vida. O fundamento específico da prescrição reside na negligência do titular do direito em exercita-lo durante o período de tempo que o legislador considerou razoável para tal, sendo certo que o não exercício do direito dentro do prazo legal faz presumir que o titular do direito quis renunciar ao mesmo. Contudo outras razões justificam este instituto, designadamente a segurança jurídica, para que cada um saiba com o que pode contar, bem como a necessidade de proteger os devedores contra as dificuldades de prova e exercer pressão para que o titular do direito não descure o seu exercício.
As prescrições extintivas estão sujeitas a causas de suspensão e interrupção – cfr. artigos 318º a 327º do Código Civil.
Debrucemo-nos sobre os efeitos da interrupção da prescrição.
Dispõe o art.º 326 do Código Civil, sob e epigrafe “efeitos da interrupção”:
“1. A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos nºs 1 e 3 do artigo seguinte.
2. A nova prescrição está sujeita ao prazo da prescrição primitiva, salvo o disposto no artigo 311º.”
E estabelece o artigo 327º do CC. com a epígrafe “Duração da interrupção
“1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.
2. Quando, porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada deserta, ou fique sem efeito o compromisso arbitral, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo.
3. Se, por motivo processual não imputável ao titular do direito, o réu for absolvido da instância ou ficar sem efeito o compromisso arbitral, e o prazo da prescrição tiver entretanto terminado ou terminar nos dois meses imediatos ao trânsito em julgado da decisão ou da verificação do facto que torna ineficaz o compromisso, não se considera completada a prescrição antes de findarem estes dois meses.”
Deste regime resulta desde já que com a interrupção da prescrição, por regra geral, começa a correr novo e último prazo de interrupção, ficando assim inutilizado o primeiro prazo.
Tal como tem vindo a ser defendido pela jurisprudência, a prescrição só pode ser interrompida uma vez, já que permitir sucessivas interrupções da prescrição seria atentar contra as razões que constituem fundamento do instituto da prescrição, algumas delas por nós acima elencadas.
Como refere no voto de vencido, lavrado pelo Conselheiro Martins da Costa, no acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 3/98, do STJ de 26-03-98, publicado no DR, 1ª série de 1-12-98 “em face dos interesses visados pelo instituto da prescrição: a regra geral é a prescrição dos direitos, destinada a evitar o seu exercício depois de decorrido certo período de tempo; a sua interrupção da prescrição reveste carácter excepcional e só é, por isso, admitida em circunstâncias especiais”.
E como bem se observa a este respeito no Acórdão da Relação do Porto, proferido no Proc. 253/02, em 14-07-2003, (relator Sousa Peixoto) “É claro que a proibição de sucessivas interrupções não resulta directamente da letra da lei, mas da letra da lei também não resulta o contrário. Por isso, temos de lançar mão do elemento teleológico e esse aponta, claramente, no sentido de que a interrupção da prescrição só pode ocorrer uma vez. Tal conclusão não é repudiada pela letra da lei e podemos mesmo dizer que nela tem algum apoio, uma vez que a interrupção a que a lei se refere parece ser inequivocamente a interrupção do prazo inicial e não a interrupção do novo prazo de prescrição (vide artigos 323.º a 327.º do CC).
No mesmo sentido, veja-se o acórdão da Relação do Porto, de 7.11.2002, in CJ, T.º V, pág.167, onde se fez consignar o seguinte a este propósito “Com efeito, a admissibilidade de sucessivas interrupções criava um factor de insegurança na ordem jurídica, que, como no caso em análise, permitiria que um acidente ocorrido há treze anos ainda viesse a ser objecto de julgamento, com todos os prejuízos do decurso do tempo para a utilidade da produção de prova, etc.”. E ainda o Acórdão da Relação de Lisboa de 26-02-2014, proferido no Proc. n.º 76/04.1TTVFX-b.l1-4 (relator Sérgio Almeida), no qual se sumariou o seguinte: “I. Quando há lugar à interrupção da prescrição verifica-se a inutilização do primeiro prazo, começando a correr um segundo e último prazo”.
Na verdade, quer face à razão de ser do instituto da prescrição, quer face ao disposto no artigo 326º do Código Civil, a prescrição é insuscetível de interrupção, por nova citação, quando já tenha sido interrompida uma vez.
No caso dos autos cumpre apreciar a prescrição dos direitos de que Autor se arroga, tendo presente que o Autor já havia intentado uma acção anterior com o objecto da presente, importando assim apurar que efeito este facto teve sobre a prescrição.
O contrato de trabalho cessou no dia 8/04/2013, completando-se por isso o prazo de prescrição às 24 horas do dia 9/04/2014 (cfr. artigo 337º n.º 1 do CT e artigos 279º alínea c) e 306º, ambos do CC). Sucede que tal prazo se interrompeu no dia 8/04/2014, em face da citação para a primeira acção - Proc n.º 278/14.2TTVCT e de acordo com o previsto no n.º 2 do artigo 323º do CC, ou seja antes de decorrido o prazo de um ano previsto no n.º 1 do artigo 337º do CT.
Com aquela citação e de acordo com as disposições constantes dos artigos 323º n.º 1 e 326º n.º 1, ambos do Código Civil, o prazo prescricional atinente aos créditos reclamados têm de considerar-se interrompido, ficando assim inutilizado todo o tempo anteriormente decorrido e começando a correr novo prazo a partir da data da citação.
Importa referir que ainda de acordo com aquele n.º 1 do artigo 326º do CC, aquelas situações de interrupção do tempo anteriormente decorrido e começo de novo prazo sucedem sem prejuízo do que estabelecem os números 1 e 3 do artigo 327º do CC.
Todavia, na primitiva acção instaurada pelo Autor contra a Ré, foi proferida em 16/01/2015 decisão que absolveu a Ré da instância, decisão essa que transitou em julgado no dia 11/02/2015, o que nos poderia levar a concluir numa primeira aparência, que atento o disposto no n.º1 do artigo 327º do CC., como a acção a presente acção foi instaurada em 2/12/2015 somente a partir da data em que aquela decisão transitou em julgado – 11-02-2015 – é que começava a correr o novo prazo de prescrição, tendo o anterior sido interrompido pela citação da Ré para a primeira acção, simplesmente o n.º 2 do artigo 327º afasta a regra ínsita no seu n.º 1 ao prever, além do mais que quando se verifique a absolvição da instância o novo prazo prescricional começa a corre logo após o acto interruptivo.
Ora, tendo na primitiva acção a Ré sido absolvida da instância, o novo prazo prescricional começou a correr desde a data da citação para tal acção de acordo como disposto no artigo 327º n.º 2 do CC. aplicável, designadamente, por força do disposto no n.º 2 do artigo 279º do CPC, que no caso da prescrição remete para a lei civil.
Nos termos do artigo 327º n.º 2 do CC. o novo prazo prescricional começou a correr logo após o acto interruptivo, a citação, ou seja, em 9-04-2014, tendo-se por isso completado em 09-04-2015, ou seja em data muito anterior à da instauração da presente acção.
Importa mencionar que no caso em apreço tendo a absolvição da instância da primitiva acção ocorrido por ineptidão da petição inicial e sendo certo que o Autor foi convidado a corrigir tal petição, não tendo aceite tal convite, não podemos deixar de considerar a absolvição da instância ocorreu por motivo totalmente imputável ao autor, que não cuidou de em tempo corrigir o seu articulado, pelo que não tem aplicação o n.º 3 do artigo 327º do CC.
Neste sentido se refere o Acórdão do STJ de 1/07/2009, proferido no Proc. n.º 571/07.TTPRT.S1 ao fazer consignar o seguinte:
“Consta dos presentes autos (cfr. fls. 32 a 37) que a decisão de absolvição da instância das rés na primeira acção – decisão essa que, como já se assinalou, transitou em julgado e, precisamente por isso, não poderá ser questionada –, fundada na ineptidão da respectiva petição inicial, se deveu à circunstância de se ter entendido que existia ambiguidade, ininteligibilidade e incompatibilidade substancial dos pedidos formulados – designadamente o pedido constante da alínea a) –, vícios esses que, não obstante a autora, anteriormente, ter sido convidada a esclarecer, não foi possível ultrapassar, dado que ela, na sequência do convite, veio dizer naquele processo que não via necessidade de correcção do seu petitório.
Neste circunstancialismo, não se lobriga como seja possível defender que a decretada absolvição da instância se não deveu a uma actuação imputável à autora naquela acção, agora também titular dos direitos que pretende exercer na acção de que emerge este recurso.
Efectivamente, se a mesma, no seguimento do convite que lhe foi endereçado, tivesse suprido os vícios detectados na sua petição, não teria havido lugar à decidida absolvição da instância esteada na ineptidão daquela peça processual.
Ora, sendo de imputar à autora da primeira acção a causa da absolvição da instância – causa essa de natureza processual –, não pode a mesma, como titular dos direitos intentados exercer na presente acção, gozar do prazo ou da ficção que deflui do nº 3 do artº 327º do Código Civil"
Em suma, ainda que se considerasse o prazo de um ano a contar do dia seguinte ao da cessação do contrato se interrompeu com a citação para os termos da primitiva acção que correu termos no 2º juízo do extinto Tribunal do Trabalho de Viana do Castelo, em 9/04/2014, tendo a presente acção sido instaurada em 3/12/2015, já estavam prescritos os direitos nela queridos exercer.
Da Apelação do Autor
Da impugnação da decisão da matéria de facto e consequências daí decorrentes e da impugnação da decisão de direito
Em face da procedência do recurso subordinado interposto pela Ré, fica prejudicado o conhecimento da apelação interposta pelo Autor.

DECISÃO
Pelo exposto, e ao abrigo do disposto nos artigos 87º do C.P.T. e 663º do C.P.C., acorda-se, neste Tribunal da Relação de Guimarães em dar provimento ao recurso de apelação subordinado interposto por BB… - SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, LDA., revogar a sentença recorrida, declarar procedente por provada a excepção dilatória inominada deduzida pela Ré/Recorrente e consequentemente absolver da instância a BB… – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES.
Declara-se prejudicado o conhecimento do recurso de apelação interposto por AA….
Custas dos Recursos a cargo do Recorrente AA…, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário.
Guimarães, 4 de Maio de 2017
Vera Maria Sottomayor
Antero Veiga
Alda Martins

Sumário – artigo 663º n.º 7 do C.P.C.
I – O Autor não pode beneficiar duas vezes do mecanismo previsto no n.º 2 do artigo 279º do CPC e por isso a presente acção não deveria ter sido admitida, com a consequente absolvição da Ré da instância, por verificação de excepção dilatória inominada, em face da propositura, pela terceira vez, de nova acção, com o mesmo objecto das demais – cfr. artigos 279º n.º 1 e 2, 278º n.º 1 al. e), 576º e 577º do CPC.
II - Se em caso de absolvição da instância por verificação de qualquer excepção dilatória, o demandante pudesse instaurar sucessivas acções sobre o mesmo objecto até acertar, o princípio da economia processual também subjacente ao preceito perderia relevância, além de que deixa de ter justificação que o demandante continue a gozar das vantagens que lhe são concedidas pelo citado preceito legal.
III – Havendo interrupção da prescrição verifica-se a inutilização do primeiro prazo, começando a correr um segundo e último prazo.
IV – Quer face à razão de ser do instituto da prescrição, quer face ao disposto no artigo 326º do Código Civil, a prescrição é insuscetível de interrupção, por nova citação, quando já tenha sido interrompida uma vez.
Vera Sottomayor