Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
5307/17.5T8VNF-B.G1
Relator: MARIA LUÍSA RAMOS
Descritores: LITISPENDÊNCIA
ACÇÃO EXECUTIVA
INVENTÁRIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/19/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (da relatora):

Não se verifica a excepção de litispendência entre a acção executiva para cobrança coerciva de crédito e o processo de inventário em qual tal crédito haja sido relacionado como dívida e reclamado e reconhecido.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

(…) , veio por apenso aos autos principais de execução que lhe move a exequente (…) , CRL, deduzir embargos à execução, nomeadamente, invocando a verificação de excepção de litispendência entre os autos de execução e o processo de inventário n.º 2521/15, subsequente ao divórcio dos executados, no âmbito do qual já havia a exequente reclamado créditos, incluindo os decorrentes dos dois empréstimos objecto do processo principal, concluindo que a presente execução mais não é do que uma duplicação de títulos em que a exequente vem tentar executar a alegada dívida duas vezes, pedindo se declare a absolvição da instância da executada/embargante.

A exequente veio apresentar contestação, deduzindo oposição á excepção.

Tendo vindo a ser proferida decisão final, a julgar os embargos improcedentes, inconformada, de tal decisão veio a embargante recorrer, interpondo recurso de apelação.

O recurso foi recebido como recurso de apelação, com nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresenta, a apelante formula as seguintes Conclusões:

a) O tribunal a quo não aplicou devidamente a lei processual, julgando não verificada a excepção de litispendência e, nessa conformidade, improcedentes os embargos;
b) Existe identidade de sujeitos, de pedidos e de causas de pedir em ambos os processos;
c) Apesar de se tratar de processos diferentes, a finalidade pretendida pela embargada – o pedido formulado – é a mesma em ambos os processos: a cobrança efectiva de valores pecuniários;
d) O princípio da auto-suficiência do processo de inventário possibilita a venda em execução no próprio processo, sem necessidade de recurso a execução autónoma para o mesmo efeito;
e) Entendendo dever lançar mão da via executiva, a embargada podia e devia ter desistido do pedido que formulou no primeiro processo, avançando, então, para este meio;
f) A litispendência é uma excepção peremptória que origina a absolvição da instância, a qual devia ter sido julgada verificada;
g) A decisão proferida violou os Arts. 577º, al. i), 580º, 581º e 582º, todos do Código de Processo Civil, devendo ser revogada e substituída por outra que julgue verificada a excepção de litispendência, absolvendo-se a embargante da instância.

Foram proferidas contra – alegações, tendo a apelada invocado a extemporaneidade do recurso.

O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação nos termos e com efeitos fixados pelo Tribunal de 1ª instância, verificando-se ser o recurso o próprio e tempestivo, pois que tendo-se procedido à notificação às partes da decisão recorrida em 25/2/2019, o recurso veio a ser interposto no 1º dia útil subsequente ao prazo legal de 30 dias, em 1 de Abril de 2019 (artº 248º, 132º e 638º-nº1 do CPC ).

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Delimitação do objecto do recurso: Questões a decidir.

Atentas as conclusões do recurso de apelação deduzidas, e supra descritas, são as seguintes as questões a apreciar:

- invocada excepção de litispendência


FUNDAMENTAÇÃO ( de facto e de direito ):

I . Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos, de interesse para a decisão:

1) Nos autos de que os presentes embargos são apenso, o exequente propôs-se executar os empréstimos nº (..) e (..) , o primeiro no valor de € 113.000,00 e o segundo no montante de € 35.000,00.
2) Na sequência do divórcio entre os executados encontra-se pendente inventário para partilha de bens, com o n.º (…) , no cartório notarial do Dr. (…) , onde a embargada foi citada, na qualidade de credora do ex-casal, para intervir no mesmo.
3) Daí que, enquanto credora hipotecária dos interessados, a embargada por requerimento apresentado em 07.03.2016, reclamou ali os seus créditos, incluindo os decorrentes dos 2 empréstimos objecto da execução apensa.
II. Alega a embargante/apelante que está verificada excepção de litispendência entre a acção principal executiva e o processo de inventário n.º (…) , subsequente ao divórcio dos executados no âmbito do qual já havia a exequente reclamado créditos, incluindo os decorrentes dos dois empréstimos objecto do processo principal, concluindo existir identidade de sujeitos, de pedidos e de causas de pedir em ambos os processos, e, mais alegando que o princípio da auto-suficiência do processo de inventário possibilita a venda em execução no próprio processo, sem necessidade de recurso a execução autónoma para o mesmo efeito, interpondo o presente recurso de apelação da decisão que julgou improcedente a excepção invocada e determinou o prosseguimento dos autos.

Nos termos do disposto no artº 577º- al. i), do Código de Processo Civil, a Litispendência, a par do caso julgado, constitui uma excepção dilatória que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa, determinando a absolvição da instância do Réu ou requerido, definindo o artº 580º, do citado diploma legal, os conceitos de litispendência e caso julgado, dispondo: “1 – As excepções da litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência; se a repetição se verifica depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, há lugar à excepção do caso julgado. 2 – Tanto a excepção da litispendência como a do caso julgado têm por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior; Nos termos do artº 581º, do mesmo código, se estabelecendo os legais “Requisitos” da excepção, nos seguintes termos:

“1 – Repete-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
2 – Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
3 – Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.
4 – Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico (…) “.

Considerou-se na decisão recorrida inexistir no caso sub judice identidade do pedido caracterizadora da excepção de litispendência, fundamentando-se: “ … no identificado processo de inventário e na sequência da sua citação, enquanto credor, o que a aqui embargada fez foi deduzir reclamação, passando a anunciar e enunciar a existência do seu crédito sobre os bens que constitui o património a partilhar do ex-casal, marcando uma posição no inventário. (…) Já no processo executivo, e como é próprio do mesmo, o pedido é o do pagamento coercivo e imediato do crédito através da execução/venda dos bens”, nestes termos se concluindo serem os “Pedidos, assim, diversos do ponto de vista do efeito jurídico pretendido”, conclusão que, igualmente, reiteramos pois que, desde logo, nada obriga no P. Inventário o credor reclamante a exigir naqueles autos o imediato pagamento do crédito reclamado e reconhecido na Conferência de Interessados, sendo juridicamente distinto o objecto dos processos em referência.

No mesmo sentido se tendo já decidido em Ac. deste TRG de 30/6/2011- P. 106/09.0TBPCR-B.G1 – “Não se verifica a excepção de litispendência entre a reclamação que o credor de uma herança, ao abrigo do disposto no art.º 1348.º, apresenta em sede de inventário (para que de tais créditos sejam relacionados como dívidas da herança para posterior aprovação ou verificação) e a acção executiva em que o mesmo credor, munido de título executivo, instaura ou prossegue contra os herdeiros do inventariado, para obter o pagamento efectivo dos mesmos créditos através da execução do património da herança.”, e, P. 106/09.0TBPCR-C.G1 – “Não ocorre a excepção da litispendência – por não haver identidade dos pedidos formulados – entre a reclamação efectuada pelo credor contra a relação de bens organizada por cabeça-de-casal no processo de inventário e a execução instaurada por aquele contra o herdeiro que recebeu os bens do inventariado, e relativa ao crédito que fora objecto daquela reclamação”, ambos in www.dgsi.pt

Conclui-se, nos termos expostos, pela confirmação da decisão recorrida, sendo ainda que inexiste na tramitação do Processo de Inventário qualquer determinação legal á realização de pagamento e de execução específica em sede de P. Inventário, ou de proibição ao uso dos meios coercitivos comuns para cobrança dos reconhecidos créditos.
Nestes termos improcedendo os fundamentos da apelação.

DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal, em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela apelante.
Guimarães, 19 de Junho de 2019

Maria Luísa Ramos
António Júlio Costa Sobrinho
Ramos Lopes