Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
5001/19.2T8VNF.G1
Relator: ALDA MARTINS
Descritores: EMPREGADO BANCÁRIO
CÁLCULO DA PENSÃO
PENSÃO PAGA PELO CENTRO NACIONAL DE PENSÕES
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/10/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
Sumário (elaborado pela Relatora):

Nos termos da Cláusula 94.ª do ACT para o Sector Bancário, publicado no BTE n.º 29, 1.ª série, de 08/08/2016, a instituição de crédito pode descontar a parte da pensão atribuída ao trabalhador pelo Centro Nacional de Pensões relativa ao período em que o mesmo esteve a trabalhar no sector bancário efectuando descontos para a Segurança Social, apenas na proporção da respectiva duração, tanto mais que o tempo atendido no cálculo daquela pensão e no cálculo da pensão devida pela instituição de crédito nos termos daquele ACT é o único factor em que há inequívoca sobreposição.

Alda Martins
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães:

1. Relatório

A. M. intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra Banco ..., S.A., pedindo a condenação do réu:

a) a reconhecer ao autor o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 29,41%, correspondente aos 4 anos e 8 meses de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
b) a pagar ao autor o valor de 453,54€ (quatrocentos e cinquenta e três euros e cinquenta e quatro cêntimos), correspondente ao ilícito desconto respeitante ao mês de Julho de 2019 e respectivo subsídio de férias;
c) a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efectuados pelo autor para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
d) a pagar ao autor todas as quantias que ilicitamente venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em c) do pedido, desde a propositura da presente acção até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar em execução de sentença;
e) a reconhecer que só tem direito, a título de retroactivos pagos pelo CNP ao autor, a receber deste a quantia de 2.089,76€ (dois mil e oitenta e nove euros e setenta e seis cêntimos), ou seja, a 29,41% do montante por este recebido a esse título.

Alega, para fundamentar o seu pedido, em síntese, que foi trabalhador do réu entre 07/01/1981 e 09/07/2015, data em que passou à situação de reforma, tendo em 29/11/2018 sido informado pelo Centro Nacional de Pensões de que lhe tinha sido atribuída por tal instituição uma pensão de reforma no valor mensal de 376,60€. O réu paga-lhe uma pensão de reforma (14 vezes por ano) no valor mensal de 1.198,59€ e diuturnidades de 283,78€, mas deduz à pensão de reforma do Centro Nacional de Pensões a quantia mensal de 226,77€, correspondente a 60,22% do total. O autor entende, porém, que por força da sua carreira contributiva apenas deveria ser-lhe descontada a percentagem de 29,41%, ou seja, 110,76€.
O réu contestou, admitindo os factos alegados pelo autor, com excepção do período de tempo relativo a serviço militar (que alega ter o autor requerido que fosse sujeito a descontos), mas defende que o cálculo que faz do desconto na pensão paga pelo Centro Nacional de Pensões se mostra correcto. Termina pedindo a improcedência da acção, com a sua absolvição dos pedidos.
Foi convocada audiência preliminar, na qual o autor admitiu o alegado pela ré quanto ao período de serviço militar.

Seguidamente, foi proferido despacho saneador-sentença, que terminou com o seguinte dispositivo:

«Assim, e nos termos expostos, julgo a presente ação totalmente procedente por provada e, consequentemente, condeno o réu Banco ..., S.A.:
a) a reconhecer ao autor A. M. o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 29,41%, correspondente aos 4 anos e 8 meses de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
b) a pagar ao autor A. M. o valor de 453,54€ (quatrocentos e cinquenta e três euros e cinquenta e quatro cêntimos), correspondente ao desconto respeitante ao mês de julho de 2019 e respetivo subsídio de férias;
c) a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao banco, respeitante aos descontos efetuados pelo autor A. M. para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
d) a pagar ao autor A. M. todas as quantias que tenha retido e venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em c), desde a propositura da presente ação até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar posteriormente;
e) a reconhecer que só tem direito, a título de retroativos pagos pelo CNP ao autor A. M., a receber deste a quantia de 2.089,76€ (dois mil e oitenta e nove euros e setenta e seis cêntimos), ou seja, a 29,41% do montante por este recebido a esse título.
*
Custas integralmente pela ré – art.º 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil.»

O réu, inconformado, interpôs recurso do despacho saneador-sentença, formulando as seguintes conclusões:

«1. Não podia a Ré ser condenada nos termos que foi na sentença, agora trazida a subida ponderação de V. Exas., Venerandos Desembargadores.
2. Porque, para aquela condenação julgou o Tribunal que segundo o elemento literal e o elemento teleológico da cláusula 94ª do ACT, para o Sector Bancário, publicado no BTE, 1ª série, n.º 29, de 08/08/2016, em vigor à data da passagem do Autor à reforma, que sucede ao anteriormente publicado no BTE, 1.ª série, n.º 3, de 22/01/2011 (com as alterações publicadas no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 8, de 29/02/2012), cuja cláusula 136.ª tinha teor idêntico, nunca podia a Ré descontar na pensão de velhice do Autor, que foi atribuída pela Segurança Social, no montante de 376,60 €, a quantia de 226,77 €, correspondente a 60,22% do total, referente ao período que esteve a trabalhar no sector bancário entre Janeiro de 2011 e 01/09/2015, não nos conduzem no sentido de ser interpretado que na ponderação do valor a descontar na pensão seja levado em linha de conta não apenas o tempo mas também o valor das contribuições.
3. Não nos parece que assim seja. Porque, conforme resulta do texto da cláusula 94ª, como da pretérita cláusula 136ª, que aqui se consideram reproduzidas para todos os efeitos legais, as partes outorgantes do instrumento de regulamentação colectiva nunca manifestaram naqueles textos qualquer necessidade de deixar expresso a forma de cálculo do valor a deduzir, mas unicamente a referência ao tempo e à contribuição, porque isso não se impunha em virtude da realidade que se visava garantir e/ou acautelar, uma vez que os benefícios dos mesmos resultantes estavam inscritos e ponderados dentro da realidade bancária, para a qual as pensões pagas aos trabalhadores, através dos respectivos fundos de pensões, tinham na sua determinação uma base contributiva correspondente ao nível (remuneração) no activo do trabalhador, para efeitos de reforma – anexo V do ACT -, projectado para o período de tempo segundo a qual o mesmo trabalhador teria direito ao acesso da sua pensão. Razão, essa, que o instrumento de regulamentação colectiva determine duas formas distintas do cálculo das pensões dos trabalhadores bancários, uma para o trabalhador que termine a sua vida contributiva na Banca e, outra, quando termine fora da Banca.
4. Tanto assim é, que aquela posição ou necessidade das partes outorgantes daquele instrumento de regulamentação colectiva não veio a sofrer qualquer alteração, nem mesmo quando foi aprovado o novo instrumento de regulamentação colectiva, no qual os mesmos fizeram permanecer com a mesma redacção o que anteriormente já vigorava, mesmo sabendo que há muito que os trabalhadores bancários tinham integrado a Segurança Social por força da aplicação do Decreto-Lei 1-A/2011, de 03 de Janeiro.
5. Em igual sentido nos orienta o seu elemento teleológico. Isto porque, apesar de tanto a cláusula 94ª como a cláusula 136ª pretenderem acautelar um duplo benefício, ainda assim, não nos conduz quanto ao conteúdo desse benefício, em virtude da construção do benefício nunca assentar apenas no factor tempo, isto porque o “tempo” sem contribuições de nada valeria senão para a sua contabilização para o atingimento do direito a uma pensão.
6. Isto é, para se ajuizar quanto a uma duplicidade ou não de benefício mostra-se necessário conhecer esse benefício em concreto, o qual se materializa num montante maior ou menor consoante a contribuição num determinado período de tempo, significando deste modo que unicamente com este binómio, tempo vs. contribuições, o trabalhador vê reflectido no tempo o quantum do seu contributo para o benefício que quer ver reflectido na pensão.
7. Por isso, se as contribuições não acompanharem todo o tempo em referência o benefício nunca poderá ser potenciado pelo simples factor tempo. Ou seja, a falta de contribuições nunca pode ser compensada pelo tempo, dado que perante uma base contributiva de quantitativo inferior, nunca o benefício a receber, máxime pensão, poderá ser maior e vice-versa.
8. Razão pela qual que, partindo do teor literal, nada na sua letra, no seu elemento gramatical, apontam para a interpretação no sentido de que tal benefício deve ser calculado segundo um critério de proporcionalidade temporal (pro-rata temporis), como se sustenta.
9. Tanto assim é, que se nos socorrermos do que dispõe o Decreto-Lei 187/2007, de 10 de Maio, que estabelece e regulamenta o Regime Jurídico de Protecção nas Eventualidades Invalidez e Velhice do Regime Geral da Segurança Social, para onde nos remete o enunciado linguístico da norma, convoca a interpretação no sentido de que o benefício a considerar deve ser apurado segundo as regras do regime geral da segurança social, uma vez que aí se refere “benefícios decorrentes de contribuições para Instituições ou Serviços de Segurança Social”,
10. Encontramos que o montante mensal da pensão estatutária é igual ao produto da remuneração de referência pela taxa global de formação da pensão e pelo factor de sustentabilidade (artigo 26º, n.º 2), e que o valor das remunerações registadas a considerar para a determinação da remuneração de referência são actualizados por aplicação do índice geral de preços no consumidor, sem habitação (artigo 27º, n.º 1).
11. Ou seja, os elementos de cálculo do montante da pensão têm sempre na sua base uma remuneração, que a norma anteriormente citada refere ao produto da mesma.
12. Como tal, a interpretação a fazer, tanto da cláusula 94ª como da pretérita cláusula 136ª, deve ser segundo as regras atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem susceptíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros, as quais fazem apelo aos critérios de interpretação dos negócios jurídicos (artigos 236.ºss do Código Civil).
13. Razão que faz com que seja afastado o critério preconizado pela Autor, no sentido de o cálculo do benefício dever ser feito por um método de pro-rata temporis, que a sentença acompanhou, pela assimetria na pensão calculada que esse método trás consigo por não ter na sua base o produto das contribuições, mas unicamente o tempo.
14. Além de que, no texto das identificadas cláusulas, não se encontra qualquer expressão que nos aproxima à aplicação do princípio da proporcionalidade do tempo, porque das mesmas apenas resulta “benefícios decorrentes de contribuições”.
15. Nem mesmo a norma do artigo 64º da CRP, que aponta no sentido de contar como igual peso todos os anos de tempo de trabalho “nos termos da lei” (n.º 4).
16. Razão pela qual que os artigos 26.º e 28.º do Dec.Lei n.º 187/2007, por via da remuneração de referência, confere um “peso diferente” a cada ano da carreira contributiva.
17. Assim, tratando-se de um negócio formal, não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso (cfr. art.º 238.º, n.º 1 do CC), prevalecendo, em caso de dúvida sobre o sentido da declaração, nos negócios onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das prestações (cfr. art.º 237.º do CC).
18. Deste modo, o benefício a que se alude na cláusula 94ª corresponde ao benefício concedido pelo Centro Nacional de Pensões (CNP) pelo tempo de carreira ao serviço do Banco, que resulte das contribuições feitas no período em apreço, apurado segundo as regras do regime geral da segurança social, que são as regras aplicáveis ao cálculo do benefício a pagar pelo CNP, que ao abrigo do disposto no artigo 26º do Decreto-Lei 187/2007 para o cálculo desse benefício concorrem não só o tempo mas também as remunerações, por via da remuneração de referência (artigo 28º, do mesmo diploma).
19. De tudo resulta, que tendo o Autor auferido o maior valor das retribuições na parte final da sua carreira tal factualidade terá de ser levado em linha de conta na determinação do benefício, pensão, a pagar pelo CNP, pelo que o desconto de 60,22% que a Ré faz na pensão paga se apresenta como a correcta, porque para a determinação daquela percentagem foi levado em linha de conta o tempo e as retribuições para se aferir do seu peso (%) naquela pensão que é, repita-se, 60,22%, que está correcto e traduz o verdadeiro equilíbrio das prestações.
20. Por o método da pro-rata temporis equivaler a considerar os anos em que as contribuições foram feitas sobre remunerações mais baixas com o mesmo peso, na repartição do benefício, que os anos em que as contribuições foram feitas sobre remunerações mais elevadas, o que naturalmente contraria, não só o regime legal em vigor, mas constituir um claro desequilíbrio prestacional para as partes.
21. Como tal, os cálculos feitos pela Ré, e que constam do artigo 56º da sua contestação, que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais, se mostram correctos e devem manter-se.
22. Assim, o Autor tem direito a auferir mensalmente a pensão de 1.198,59 €, correspondente ao nível 10 que detinha à data da sua passagem á reforma, ao que acrescem as diuturnidades (283,78 €), pagável 14 vezes por ano - cláusula 137ª, e Anexos V e VI, do ACT para o Sector Bancário -, e 149,81 € da pensão atribuída pela Segurança Social (depois de descontar 60,22% - 226,77 € - na pensão de 376,60 €).»
O autor apresentou resposta ao recurso do réu, pugnando pela sua improcedência.
O recurso foi admitido como apelação, tendo efeito meramente devolutivo.
Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, pelo Ministério Público foi emitido parecer no sentido da improcedência do recurso.
Vistos os autos pelas Senhoras Desembargadoras Adjuntas, cumpre decidir.

2. Objecto do recurso

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, a questão que se coloca a este tribunal é a da forma de cálculo da parte da pensão atribuída ao autor pelo Centro Nacional de Pensões que o réu tem direito a deduzir, tendo em conta o estabelecido na cláusula 94.ª do ACT para o Sector Bancário, publicado no BTE n.º 29, 1.ª série, de 08/08/2016.

3. Fundamentação de facto

Os factos provados são os seguintes:

A) O réu é uma instituição de crédito e exerce a actividade bancária;
B) Participou nas negociações e outorgou o ACT para o sector bancário, cuja versão integral se encontra publicada no BTE, 1.ª série, n.º 29, de 08/08/2016, p. 2339 e ss., instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que aplicou e aplica aos trabalhadores integrados nos seus quadros ou que deles fizeram parte;
C) O autor encontra-se filiado no Sindicato dos Bancários do Norte (SBN), onde figura como sócio n.º …;
D) O autor foi admitido ao serviço do réu a -/01/1981;
E) Por carta datada de 09/07/2015, o réu informou o autor da sua passagem à situação de reforma;
F) O autor recebeu a carta do Centro Nacional de Pensões, datada de 29/11/2018, junta a fls. 11 v.º e que aqui se dá por integralmente reproduzida, na qual lhe foi transmitido que “o requerimento de pensão oportunamente apresentado foi deferido”, sendo que “A pensão por VELHICE tem início em 2017-09-05, sendo o seu valor actual 376,60 Euros” e que “o pagamento dos valores a que tem direito será efetuado no mês de 2019-01, através de Banco …, a partir de 2019-01-08”, mais tendo calculado a quantia de 7.105,17€ a título de “pensão mensal, complementos, atrasados e deduções” pelo período entre 05/09/2017 e 31/12/2018 (fls. 13);
G) O autor passou então à situação de reforma integrado no nível 10 do ACT para o sector bancário;
H) Na presente data, o réu entrega ao autor uma pensão de reforma, pagável 14 vezes por ano, com a pensão base de 1.198,59€ e diuturnidades no valor de 283,78€;
I) O autor, em 11/12/2018, enviou uma carta ao réu que dizia o seguinte:
“Exmos. Srs.,
Conforme tinha sido solicitado pela carta cuja fotocópia anexo, junto remeto, fotocópia do ofício acabado de receber do C.N. Pensões.
A aguardar as vossas notícias sobre o assunto, subscrevo-me, com os melhores cumprimentos, e
Atentamente”.
J) Em resposta, o réu enviou uma carta ao autor, datada de 26/06/2019, que dizia o seguinte:
“Exmº Senhor,
Informamos que procedemos ao recálculo da pensão de reforma relativa ao período em que se encontrou ao serviço do Banco ..., nos termos previstos da “Cláusula 94ª – Garantia de benefícios e articulação de regimes”, do Acordo Colectivo do Trabalho Para o Sector bancário (ACT).
Assim, o Fundo de Pensões do Banco ... passará a garantir a partir de julho de 2019 apenas a diferença entre a pensão calculada nos termos previstos no ACT que é de 1.482,37€ e a importância de 226,77€ correspondente a 60,22% da pensão atribuída pela Segurança Social.
Para regularização do montante de retroactivos reportados a 05 de Setembro de 2017 que ascendem a 5.939,10, agradecemos o favor de nos enviar a respectiva autorização de débito.
Mais alertamos para a necessidade de comunicar ao DCH do Banco ... as actualizações que ocorram na pensão da Segurança Social, por forma a procedermos ao recálculo dos valores agora apurados.
Com os melhores cumprimentos, subscrevemo-nos,
Atentamente
DEPARTAMENTO DE CAPITAL HUMANO”;
K) Na presente data, o réu deduz à pensão de reforma do Centro Nacional de Pensões o valor de 226,77€, tendo descontado no mês de Julho de 2019 a quantia de 453,54€, respeitante a tal mês e subsídio de férias (nos termos que constam do documento junto a fls. 14 v.º e que aqui se dá por integralmente reproduzido);
L) O autor teve a seguinte carreira contributiva:
a. de 1968 a 1972, o autor efectuou descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de actividade dependente remunerada a entidade não bancária;
b. de 10/1972 a 05/1975, o autor prestou serviço militar obrigatório, tendo efectuado descontos para o fundo de pensões do réu;
c. de 10/1976 a 06/01/1981, o autor efectuou novos descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de actividade dependente remunerada a entidade não bancária;
d. de 07/01/1981 a 12/2010, o autor, enquanto trabalhador bancário, efectuou os descontos obrigatórios para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB) e para o Fundo de Pensões do banco;
e. em Janeiro de 2011, após extinção da CAFEB e sua integração no Instituto de Segurança Social, I.P., pelo Decreto-Lei n.º 1-A/2011, de 3 de Janeiro, e art. 2.º do Decreto-Lei n.º 247/2012, de 19 de Novembro, o autor passou a descontar para a Segurança Social, até passar à situação de reforma (em 01/09/2015).

4. Apreciação do recurso

Como se referiu, a questão que se coloca a este tribunal é a da forma de cálculo da parte da pensão atribuída ao autor pelo Centro Nacional de Pensões que o réu tem direito a deduzir, tendo em conta o estabelecido na cláusula 94.ª do ACT para o Sector Bancário, publicado no BTE n.º 29, 1.ª série, de 08/08/2016, vigente à data em que aquele passou à situação de reforma, sendo certo que o seu teor é idêntico ao da cláusula 136.ª do anterior ACT.

Aí se estabelece:
Cláusula 94.ª
Garantia de benefícios e articulação de regimes
1- As instituições de crédito garantem os benefícios constantes da presente secção aos trabalhadores referidos no número 3 da cláusula 92.ª, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas instituições ou seus familiares, apenas é garantida pelas instituições de crédito a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos nesta secção.
2- Para efeitos da segunda parte do número anterior, apenas são considerados os benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de Segurança Social com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador nos termos da cláusula 103.ª.
3- Os trabalhadores ou os seus familiares devem requerer o pagamento dos benefícios a que se refere o número 1 da presente cláusula junto das respectivas instituições ou serviços de Segurança Social a partir do momento em que reúnam condições para o efeito sem qualquer penalização e informar, de imediato, as instituições de crédito logo que lhes seja comunicada a sua atribuição, juntando cópia dessa comunicação.
(…)
Vejamos.
Conforme decorre da alínea L) da factualidade provada, o autor efectuou descontos para a Segurança Social de 1968 a 1972, de 10/1976 a 06/01/1981 e de 01/2011 a 01/09/2015, em função dos quais o Centro Nacional de Pensões lhe atribuiu uma pensão de reforma.
Ora, as contribuições efectuadas para a Segurança Social entre 01/2011 e 1/09/2015 tiveram por base retribuições auferidas pelo autor por trabalho prestado no sector bancário, ou seja, durante período de tempo que foi tido em conta na antiguidade do mesmo atendida para efeitos do cálculo da pensão de reforma que o banco réu lhe atribuiu.
Assim, nos termos da cláusula sobredita, o réu pode descontar ao autor a parte da pensão que lhe foi atribuída pelo Centro Nacional de Pensões relativa ao período em que o mesmo esteve a trabalhar no sector bancário efectuando descontos para a Segurança Social, ou seja, de 01/2011 a 01/09/2015, de modo a impedir que tal período seja contabilizado para as duas pensões de reforma, acarretando uma duplicação de benefícios.
Concretiza-se, assim, o disposto no art. 67.º, n.º 1 da Lei n.º 4/2007, de 16/01 (revista pela Lei n.º 83-A/2013, de 30/12), segundo o qual, salvo disposição legal em contrário, não são cumuláveis entre si as prestações emergentes do mesmo facto, desde que respeitantes ao mesmo interesse protegido.
Sendo esta premissa pacífica, o cerne da questão prende-se com a forma de cálculo da quantia a descontar, sustentando o autor que apenas releva para o efeito o tempo de referência e o réu que deve ainda efectuar-se uma adequada ponderação do valor das retribuições auferidas durante o mesmo.

Precisando, e como se diz na sentença recorrida:

«- o autor defende que a contabilização de tal valor deve ser feita apenas em função do tempo, ou seja, deve ser descontada a parte que corresponde à proporção dos 5 anos no total de 17 considerado pela Segurança Social (29,41%);
- a ré entende que não deve ser tido em consideração apenas o tempo, mas também o valor das retribuições auferidas em cada um dos períodos, o que, atento o maior valor da retribuição auferida pelo autor na parte final da sua carreira, leva a um desconto de 60,22%.»

A posição defendida pelo autor foi a acolhida pelo tribunal a quo, com a seguinte justificação:

«Da leitura da cláusula acima transcrita (tal como da anterior cláusula 136.ª) não me parece que seja correta a interpretação feita pela ré quanto à ponderação não apenas do tempo mas também do valor das contribuições. O elemento literal da interpretação aponta no sentido defendido pelo autor, pois partindo-se do princípio de que as partes outorgantes do instrumento de regulamentação coletiva em análise souberam exprimir de forma correta a sua vontade, não se compreenderia que não tivessem feito constar da referida cláusula uma referência expressa à ponderação quer do tempo, quer do valor das retribuições. Isto para mais quando no n.º 2 se mencionam as contribuições para especificar qual o tempo de serviço a considerar – não se compreenderia que as mencionassem para esse fim e não o fizessem para expressamente determinar a forma de cálculo do valor a deduzir. Por outro lado, o elemento teleológico da interpretação também leva a concluir no mesmo sentido – a finalidade da norma é, como se disse, apenas impedir o duplo benefício, levando a que pelo mesmo período contributivo não esteja o beneficiário a receber pensão de duas fontes. Isso é garantido com a aplicação de uma regra de proporcionalidade simples do tempo considerado, que assim é apenas contabilizado para a pensão da Segurança Social.
Mais se diga em abono da tese defendida pelo autor que dos arts. 26.º e ss. do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, decorre que o cálculo das remunerações a ter em consideração para contabilização da pensão de reforma não se resume ao valor da retribuição, antes sendo tidos em consideração inúmeros outros fatores que não apenas o valor, o que faz com que não exista uma relação direta entre o valor da retribuição e o da pensão final atribuída. Assim, à luz desta realidade, mais lógico será que na interpretação da cláusula 94.ª a que vimos aludindo se tenha apenas em conta o tempo e não também o valor da retribuição.»
Este entendimento está em conformidade com a jurisprudência dominante dos tribunais superiores, designadamente a consolidada no Supremo Tribunal de Justiça, plasmada nos seus Acórdãos de 12/05/2010, proferido no processo n.º 160/07.0TTBCL.P1.S1, de 06/12/2016, proferido no processo n.º 4044/15.0T8VNG.P1.S1, de 22/02/2018, proferido no processo n.º 9637/16.5T8LSB.L1.S1, e de 12/07/2018, proferido no processo n.º 3312/16.8T8PRT.P1S1 (1), não se vislumbrando motivo válido para o seu afastamento.
Na verdade, a cláusula em apreço estabelece que as instituições de crédito garantem a diferença entre o valor dos benefícios atribuídos por instituições ou serviços de Segurança Social, decorrentes de contribuições com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador, e o valor dos benefícios devidos pelas primeiras nos termos do ACT, não aludindo a que em tal operação deva ser efectuada qualquer ponderação do valor das retribuições sobre que incidiram aquelas contribuições.
Por outro lado, tal asserção resultante da letra da norma justifica-se plenamente porque a pensão atribuída pelo Centro Nacional de Pensões teve em conta o disposto no DL n.º 187/2007, de 10 de Maio, nos termos de cujo art. 26.º a pensão estatutária é a que resulta da aplicação das regras de cálculo da pensão (n.º 1), sendo o seu montante mensal igual ao produto da remuneração de referência pela taxa global de formação da pensão e pelo factor de sustentabilidade (n.º 2), sendo certo que a remuneração de referência é calculada nos termos do art. 28.º, tendo como base as remunerações anuais de toda a carreira contributiva, revalorizadas nos termos do art. 27.º, e o número de anos civis com registo de remunerações, com as correcções e ajustamentos que aquele dispositivo consagra.
Isto é, no cálculo do valor da pensão atribuída pelo Centro Nacional de Pensões já interveio uma pluralidade de factores, não existindo proporcionalidade directa entre o mesmo e o valor das remunerações registadas para cálculo da remuneração de referência, pelo que, independentemente do peso que as contribuições decorrentes da prestação de serviço bancário possa ter tido, não se justifica que o mesmo constitua factor de ponderação ou correcção do valor a descontar pela instituição de crédito, sob pena de – então, sim – poder ocorrer uma sobreposição valorativa, em prejuízo do trabalhador.
Em suma, quer o elemento literal, quer o elemento teleológico da norma apontam no sentido de que o réu pode descontar a parte da pensão atribuída ao autor pelo Centro Nacional de Pensões relativa ao período em que o mesmo esteve a trabalhar no sector bancário efectuando descontos para a Segurança Social, apenas na proporção da respectiva duração, ou seja, de 5 anos no total de 17 considerados pelo Centro Nacional de Pensões (29,41%), uma vez que o tempo atendido no cálculo das duas pensões em apreço é o único factor em que há inequívoca sobreposição.
Improcede, pois, o recurso.

5. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação improcedente, e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo Apelante.
Em 10 de Setembro de 2020

Alda Martins
Vera Sottomayor
Maria Leonor Barroso


1 - Disponíveis em www.dgsi.pt.