Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
67/13.1TTBCL.P1.G1
Relator: MANUELA FIALHO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
SUBORDINAÇÃO JURÍDICA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/14/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário: 1 – A subordinação jurídica é o elemento que, por natureza, fundamenta a conclusão acerca da existência de um contrato de trabalho, sendo aferida pela ponderação da presença, na respetiva execução, de vários fatores indiciários.
2 – É de trabalho o contrato em que se evidencia sujeição à autoridade do empregador e está patente que a prestação se desenrola mediante sujeição a ordens e instruções, integrada numa cadeia hierárquica, mediante remuneração atribuída em função do número de horas prestadas no mês sem que a calendarização esteja na livre disponibilidade do trabalhador, inexistindo autonomia e existindo submissão a diretivas organizacionais e administrativas.
Decisão Texto Integral: Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Guimarães:

P.., autor, notificado do teor da sentença, e não se conformando com a mesma, vem interpor RECURSO DE APELAÇÃO.
Pede a revogação da sentença recorrida, substituindo a mesma por outra que julgue a ação totalmente procedente.
Após alegar, formula as seguintes conclusões:
1. Com o presente recurso o autor pretende obter a modificabilidade da decisão recorrida, impugnando a decisão sobre a matéria de facto, por reapreciação da prova documental e testemunhal gravada em sede de audiência e discussão de julgamento.
2. Por razões evidentes de economia processual dá-se por integralmente reproduzida a matéria provada, por acordo das partes, na audiência prévia.
3. De igual modo, também se dá por integralmente reproduzida a matéria que o tribunal recorrido deu como provada.
4. O tribunal recorrido deu como, não provada, além do mais a seguinte matéria:
a) O Autor trabalhou por conta da Ré, sob as suas ordens, direção e fiscalização.
b)No ano de 2011, o autor trabalhou às terças e quintas das 13H00 às 15H00.
c)Sempre o autor exerceu as suas funções de modo assíduo, ininterrupto e com elevado nível de profissionalismo.
d)O Autor devia obediência ao regulamento interno.
e)O Autor dependia e respondia perante o responsável do gabinete das atividades desportivas.
f)O trabalho do autor era organizado pela ré.
g)O contrato de trabalho manteve-se ininterruptamente até ao dia 30 de Julho de 2012.
h)Data em que a Ré procedeu ao despedimento verbal do Autor.
i)Pelo facto de ter sido despedido o Autor, desde então, tem andado triste e deprimido, sem expectativas de futuro.
j)O autor trabalhou ininterruptamente para a ré desde a data da sua admissão, 29 de Novembro de 2001 até ser despedido em 30 de Julho de 2012.
l)O autor não se apresentou mais nas instalações da ré porque foi despedido.
m)O autor nunca rececionou o comprovativo da aceitação da sua proposta.
n)O autor participou no procedimento de formação do contrato porque dependia da ré financeiramente, sujeitando-se e corroborando com as artimanhas da ré, por necessidade.
o)O registo das horas de serviço prestadas pelo autor, era feito para controlo dos horários de entrada e saída, o autor não podia chegar atrasado à aula, nem sair mais cedo da mesma.
p)Quem despediu o autor, de forma verbal, foi o coordenador geral da ré, à data, P.., no Pavilhão Municipal da Póvoa de Varzim.
4 – O apelante não se conforma com a resposta dada a estes factos, pois, ao contrário deveriam ser dados como provados com base na prova testemunhal produzida em audiência de julgamento e por serem vitais na apreciação da existência de subordinação jurídica e, consequentemente na qualificação do contrato celebrado entre autor e ré como contrato de trabalho.
5 – Deveriam ser dados como não provados os seguintes factos:
a) No âmbito do mencionado procedimento de ajuste direto, e conforme lhe incumbia, o autor comprovou perante a ré a titularidade do seguro de acidentes de trabalho, obrigatório para os prestadores de serviços, cujo prémio foi pago pelo autor, vindo tal procedimento de ajuste direto a ser adjudicado ao autor.
Quanto a este facto apenas se impugna a parte final vertida no mesmo - vindo tal procedimento de ajuste direto a ser adjudicado ao autor - uma vez que a restante factualidade foi aceite por acordo entre as partes.
b)“Era o autor quem planeava, programava, prescrevia e monitorizava os planos de treino dos utentes, fazendo-o do modo que entendia correto e adequado”.
Quanto a este facto dado como provado o mesmo só faz sentido quando conjugado com o facto provado n.º 82 – “Era a ré que elaborava a ficha técnica para as salas de musculação, nomeadamente programas, níveis de treino, métodos de treino.”
6 – Os concretos meios de prova que justificam a divergência do recorrente, são os seguintes:
a) Todos os documentos juntos aos autos;
b)Depoimento das seguintes testemunhas:
- A.. – ata de julgamento de 20/11/2013 – Inicio da gravação
11:33:54 e fim da gravação 12:16:53.
- M.. - ata de julgamento de 20/11/2013 – Inicio da gravação 12:17:45 e fim da gravação 12:57:44.
- J.. - ata de julgamento de 27/01/2014 – Inicio da gravação 15:10:17 e fim da gravação 15:47:21.
- A.. - ata de julgamento de 27/01/2014 – Inicio da gravação 15:48:04 e fim da gravação 15:57:07.
- C.. - ata de julgamento de 27/01/2014 – Inicio da gravação 16:06:31 e fim da gravação 16:22:13.
- N.. - ata de julgamento de 27/01/2014 – Inicio da gravação 16:22:59 e fim da gravação 16:49:21.
- L.. - ata de julgamento de 27/01/2014 – Inicio da gravação 16:52:23 e fim da gravação 16:58:34.
- P.. - ata de julgamento de 27/01/2014 – concretamente na passagem 14:30 – 15:04.
- P.. - ata de julgamento de 12/03/2014 – Inicio da gravação 15:25:04 e fim da gravação 16:11:34.
7 – Numa posição critica sobre os aspetos concretos da decisão, diz-se o seguinte:
8 – A Meritíssima juiz a quo considerou não provado que o autor trabalhou por conta da ré, sob as suas ordens, direção e fiscalização, que devia obediência ao regulamento interno, que dependia e respondia perante o responsável do gabinete das atividades desportivas e que o trabalho do mesmo era organizado pela ré. Posição com a qual o recorrente, salvo o devido respeito, não concorda por entender que as provas existentes nos autos não foram convenientemente apreciadas e valoradas.
Atendendo aos documentos juntos e ao depoimento das testemunhas referidas supra, levaria necessariamente a uma resposta positiva.
9 – Depois seguindo-se o depoimento das testemunhas referidas constata-se que o autor trabalhou ininterruptamente para a ré desde a data da sua admissão, 29 de Novembro de 2001 até ser despedido em 30 de Julho de 2012, que o contrato de trabalho do autor manteve-se ininterruptamente até ao dia 30 de Julho de 2012, data em que a Ré procedeu ao despedimento verbal do Autor, de que quem despediu o autor, de forma verbal, foi o coordenador geral da ré, à data, P.., no Pavilhão Municipal da Póvoa de Varzim e que o autor não se apresentou mais nas instalações da ré porque foi despedido.
10 – Por outro lado, parte do horário do ano de 2011 não foi considerado provado, no entanto atendendo à prova testemunhal realizada, constata-se que o autor, no ano de 2011, trabalhou às terças e quintas das 13H00 às 15H00.
11 – Além disso, do depoimento das testemunhas referidas também se constata que o autor exerceu as suas funções de modo assíduo, ininterrupto e com elevado nível de profissionalismo.
12 – Que o registo das horas de serviço prestadas pelo autor, era feito para controlo dos horários de entrada e saída, o autor não podia chegar atrasado à aula, nem sair mais cedo da mesma.
13 – Que o autor participou no procedimento de formação do contrato porque dependia da ré financeiramente, sujeitando-se e corroborando com as artimanhas da ré, por necessidade.
14 – O procedimento de ajuste direto não foi adjudicado ao autor. Independentemente da convicção alegada pelo Tribunal “a quo”, não foi efetuada prova capaz neste sentido. Desde logo, a Meritíssima Juiz “a quo” não valorou corretamente o documento de fls. 286 e 287, enviado pela “V..”, referente ao procedimento de ajuste direto lançado na Plataforma Eletrónica V.., vem como o depoimento das testemunhas neste sentido.
15 - Quanto ao facto dado como provado - Era o autor quem planeava, programava, prescrevia e monitorizava os planos de treino dos utentes, fazendo-o do modo que entendia correto e adequado - o mesmo só faz sentido quando conjugado com o facto provado n.º 82 – Era a ré que elaborava a ficha técnica para as salas de musculação, nomeadamente programas, níveis de treino, métodos de treino. Uma vez que foi produzida prova neste sentido, tanto documental como testemunhal.
16 – Esse défice de apreciação e valoração resulta dos depoimentos das testemunhas indicadas pela ré, nomeadamente, P.. e A... A testemunha P.. quanto ao despedimento verbal do autor, no Pavilhão Municipal, é importante que o referir que o depoimento do mesmo a este respeito, não foi coerente e não deveria ter merecido credibilidade por parte do tribunal “a quo”. O depoimento, a este respeito, não foi preciso, coerente e bem explicado. Entendemos que o mesmo não iria admitir o que fez, e por isso mesmo (por estar a mentir) não foi seguro no mesmo.
De modo que não podemos aceitar a argumentação utilizada pela Meritíssima juiz do tribunal à quo, ao referir que “não só refere que, no sítio onde se encontravam, sozinhos, lhe parece difícil que a conversa pudesse ser ouvida por outrem”. O mesmo se diga quanto aos argumentos utilizados quanto às testemunhas A.. e M.. – “ …depoimentos isentos e coerentes”, “…”mas deixando dúvidas, ao tribunal, sobre o exato teor da conversa que o autor e um dos coordenadores da ré, P.., mantiveram…”. A este respeito veja-se um excerto do depoimento da testemunha P.., ao minuto 36:00 ao 37:00.
Relativamente ao depoimento da administradora da ré, A.., o mesmo a nosso ver não mereceu credibilidade nenhuma, prestou um depoimento sem isenção nenhuma, mostrou não ter conhecimento dos factos em discussão, uma vez que a instâncias da mandatária do autor disse que não costumava falar com o autor, falou com ele muitas poucas vezes, desconhecia o horário do mesmo, bem como o regulamento interno da ré (“ eu julgo que não devo saber essas normas de cor, não me pediu para trazer o regulamento interno” – minuto: 19:35), referiu a respeito do despedimento verbal que “eu achei esta história muito estranha, nesta altura” – minuto 35:00 a
35:04. Referiu ainda a instâncias da Meritíssima juiz que todos os anos faziam renovações do contrato de prestação de serviços, quando dos autos não resulta o mesmo.
17 – De referir, uma vez que resultou da audiência de discussão e julgamento que a ré tem 80%/80º e tal por cento dos trabalhadores ao seu serviço com contratos de prestação de serviço. De 30 e tal trabalhadores, como ficou dito, só 4 estão nos quadros.
18 - Constando dos autos todos os elementos probatórios necessários à boa decisão da causa, desde a prova testemunhal e documental às presunções e ilações que tais provas impõe que delas se retire, deveriam ter sido dadas respostas negativas quanto aos factos provados n.º 49, 53, 76 e 77 e respostas positivas quanto aos factos não provados n.º 1, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 13, 14, 15, 16, 17 e 18, por essa forma, deveria ter sido proferida decisão contrária à de que ora se recorre.
19 - Segundo a decisão recorrida, o que está em causa é a indagação sobre a qualificação do contrato celebrado entre o Autor e a Ré, como contrato de trabalho, como defendia aquele, ou como prestação de serviços, como defende esta. O contrato que integra a causa de pedir da presente ação foi celebrado em 29 de Novembro de 2001 e perdurou até Julho de 2012.
20 - Na execução desse contrato o autor dava aulas de musculação e cardiofitness nas salas de aulas e nas instalações da ré, com equipamentos, meios físicos e técnicos necessários ao desempenho das suas funções. As horas das aulas sempre foram marcadas pela ré. O autor tinha um cartão de
identificação de funcionário, estava obrigado a registar a hora de entrada e saída das instalações da ré, através de picagens manuais, bem como a elaborar um relatório mensal com o registo de frequência/assiduidade dos alunos. Participava em reuniões cuja realização era determinada pela ré.
Recebia a remuneração habitualmente ao dia 15 pelo trabalho prestado. Exerceu as suas funções sob as ordens, direção e fiscalização da ré. Obedecia ao regulamento interno, respondia perante o responsável do gabinete das atividades desportivas, recebendo instruções, participando em reuniões, Recebia diretivas sobre a gestão de atividades desportivas.
Sendo nesta orgânica que o autor cumpria toda a sua atividade laboral, ou seja, sem liberdade ou autonomia para estabelecer qualquer outra forma de procedimento, quer para si e também para os alunos que lhe eram destinados, estando-lhe vedada qualquer liberdade para orientar por si a sua atividade.
21 - Como refere Meneses Cordeiro, in “Manual de Direito do Trabalho”, no confronto entre as figuras do contrato de prestação de serviços e contrato de trabalho verificam-se duas diferenças essenciais: “na prestação de serviço trata-se de proporcionar certo resultado do trabalho, enquanto no trabalho se refere o prestar uma atividade: na prestação de serviços não há qualquer referência à “autoridade e direção”… de outrem”.
Ou seja, no contrato de trabalho é a atividade que é adquirida pelo outro contratante que a organiza e dirige com vista à obtenção de um resultado para além do contrato. Ao invés, na prestação de serviços o que a outra parte adquire é o resultado de uma atividade (artigo 1154º do Código Civil).
22 - No caso concreto dos autos podemos afirmar, da matéria de facto provada, que existem fortes indícios de laboralidade do contrato mantido entre as partes suficientemente consistentes e bastantes para se afirmar que, num juízo de globalidade, se deve qualificar o contrato celebrado entre autor e ré como contrato de trabalho.
23 - Ao decidir como decidiu o Tribunal “a quo” interpretou e aplicou incorretamente as normas substantivas relativas ao contrato de trabalho, nomeadamente o disposto no artigo 11º do Código do trabalho e 1152º do Código Civil, as relativas ao contrato de prestação de serviços previsto no artigo 1154º do Código Civil.

V.., EM, contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.

O MINISTÉRIO PÚBLICO emitiu parecer segundo o qual o recurso não merece procedência.

Segue um breve resumo dos autos para melhor compreensão.
P.. acionou V.., EEM.
O autor pede que a ré reconheça que entre ambos vigorava contrato de trabalho sem termo e, como tal, que se venha a declarar nulo o despedimento de que foi alvo e se condene a ré a pagar-lhe a quantia global de € 39.687,63 a título de indemnização por despedimento ilícito e demais créditos salariais.
Para tanto alega que trabalha para a ré desde 29 de Novembro de 2001, como professor de educação física e que, não obstante o contrato celebrado ter sido denominado como Contrato de Prestação de Serviços, a verdade é que exerceu as suas funções sob as ordens, direção e fiscalização da ré, com remuneração variável em função do número de horas que prestava nas instalações da ré, com os equipamentos e meios por esta, disponibilizados. Alega ainda que se encontrava obrigado a registar hora de entrada e de saída, a elaborar relatórios mensais, a obedecer ao regulamento interno, a responder perante o responsável do gabinete das atividades desportivas, recebendo instruções e participando em reuniões determinadas pela ré, de quem recebia diretivas sobre a gestão de atividades desportivas sendo, igualmente, da responsabilidade da ré, a elaboração da ficha técnica para as salas de musculação. Mais invoca que gozava férias anuais e que tinha de assegurar a sua substituição por outro professor sempre que faltava. Invoca, por fim, que foi alvo de despedimento verbal no dia 30 de Julho de 2012, sem qualquer processo disciplinar e sem que, alguma vez, a ré lhe tenha pago qualquer quantia a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal e, bem ainda, que se encontra triste e deprimido desde então.
A ré defendeu-se, dizendo que não celebrou com o autor qualquer contrato de trabalho, mas sim um contrato de prestação de serviços, concluindo pela sua absolvição do pedido.
Invoca que o autor, no último ano, até foi contratado no âmbito de procedimento de ajuste direto, para o que foi, previamente, convidado a apresentar proposta que veio a merecer a aceitação da ré e que, durante a vigência do contrato de prestação de serviços que a ligava ao autor desde 2001, este esteve coletado como profissional liberal e inscrito na Segurança Social como trabalhador independente, sendo ele quem planeava, organizava e prescrevia os planos de treino dos utentes, sem que, para tanto, se mostrasse sujeito a ordens ou instruções da ré ou do seu poder disciplinar; para além disso, não integrava a estrutura hierárquica da ré e o registo de horas era apenas para controlo da retribuição. Estriba-se ainda no facto de nunca ter procedido a quaisquer descontos/contribuições para a Segurança Social relativamente á atividade prestada por ele, sendo certo que, o autor sempre deu quitação dos honorários recebidos através dos chamados “recibos verdes”. Por fim, invoca que o autor não mais se apresentou nas instalações da ré para prestar serviços apesar de lhe terem sido enviados os horários que lhe estavam atribuídos para a época desportiva a iniciar em 1 de Setembro de 2012.
Na sua resposta o autor limita-se a reforçar a factualidade propugnada na petição inicial no sentido de reforçar a tese da vigência de contrato de trabalho e do seu despedimento, pronunciando-se, a fls. 213/214, sobre a inexistência de qualquer litigância de má-fé.
Realizou-se audiência de julgamento, finda a qual se proferiu sentença que
julgou improcedente por não provada a presente a ação e, consequentemente:
1. Absolveu a ré “V.., EEM” dos pedidos contra si formulados pelo autor P..
2. Absolveu o autor do pedido de condenação por litigância de má-fé formulado pela ré.
***
Sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso, as conclusões delimitam o objeto do recurso, o que decorre do que vem disposto nos Art.º 608º/2 e 635º/4 do CPC. Nestes termos, considerando a natureza jurídica da matéria visada, são as seguintes as questões a decidir, extraídas das conclusões:
1ª – O Tribunal errou no julgamento da matéria de facto?
2ª – Deve qualificar-se o contrato celebrado entre autor e ré como contrato de trabalho?

Iniciemos, então, a discussão, pela 1ª questão que elencámos – o erro de julgamento da matéria de facto.
Defende o Recrte. que se mostram incorretamente julgados os pontos 1, 3 a 10, 13 a 18 (dados como não provados) e 49, 53 e 76 (dados como provados) da matéria de facto.
Em causa diversos documentos e depoimentos cuja reapreciação é reclamada.
Consta daqueles pontos a seguinte matéria:
1) O Autor trabalhou por conta da Ré, sob as suas ordens, direção e fiscalização.
3)No ano de 2011, o autor trabalhou às terças e quintas das 13H00 às 15H00.
4)Sempre o autor exerceu as suas funções de modo assíduo, ininterrupto e com elevado nível de profissionalismo.
5)O Autor devia obediência ao regulamento interno.
6)O Autor dependia e respondia perante o responsável do gabinete das atividades desportivas.
7)O trabalho do autor era organizado pela ré.
8)O contrato de trabalho manteve-se ininterruptamente até ao dia 30 de Julho de 2012.
9)Data em que a Ré procedeu ao despedimento verbal do Autor.
10)Pelo facto de ter sido despedido o Autor, desde então, tem andado triste e deprimido, sem expectativas de futuro.
13)O autor trabalhou ininterruptamente para a ré desde a data da sua admissão, 29 de Novembro de 2001 até ser despedido em 30 de Julho de 2012.
14)O autor não se apresentou mais nas instalações da ré porque foi despedido.
15)O autor nunca rececionou o comprovativo da aceitação da sua proposta.
16)O autor participou no procedimento de formação do contrato porque dependia da ré financeiramente, sujeitando-se e corroborando com as artimanhas da ré, por necessidade.
17)O registo das horas de serviço prestadas pelo autor, era feito para controlo dos horários de entrada e saída, o autor não podia chegar atrasado à aula, nem sair mais cedo da mesma.
18)Quem despediu o autor, de forma verbal, foi o coordenador geral da ré, à data, P.., no Pavilhão Municipal da Póvoa de Varzim.
49) No âmbito do mencionado procedimento de ajuste direto, e conforme lhe incumbia, o autor comprovou perante a ré a titularidade do seguro de acidentes de trabalho, obrigatório para os prestadores de serviços, cujo prémio foi pago pelo autor, vindo tal procedimento de ajuste direto a ser adjudicado ao autor.
53) Era o autor quem planeava, programava, prescrevia e monitorizava os planos de treino dos utentes, fazendo-o do modo que entendia correto e adequado.
76) Era o autor quem planeava, programava, prescrevia e monitorizava os planos de treino dos utentes, fazendo-o do modo que entendia por correto e adequado.
Vejamos, então!
Começamos por esclarecer que, estando em causa o preenchimento do conceito de contrato de trabalho, não responderemos ao facto nº 1, porquanto nestas circunstâncias aquele tem de ter-se como absolutamente conclusivo. O mesmo acontece com os pontos 8, 9, 14 e 18, todos eles contendo conceitos jurídicos – estes últimos relativos ao conceito de despedimento, também em causa na ação - cuja resposta não cabe no âmbito da valoração fática.
No que concerne ao ponto 49, tal como esclarece o Recrte., apenas se impugna a parte final vertida no mesmo - vindo tal procedimento de ajuste direto a ser adjudicado ao autor - uma vez que a restante factualidade foi aceite por acordo entre as partes.
Centra o apelante a sua discórdia na circunstância de não ter sido valorado corretamente o documento de fls. 286 e 287, enviado pela “V..”, referente ao procedimento de ajuste direto lançado na Plataforma Eletrónica V.., onde se refere expressamente que:
“De acordo com o referido registo de acessos, não temos registo da ação de admissão ou exclusão da proposta na plataforma, bem como não temos registo de envio de mensagens pela Entidade Adjudicante (a aqui Ré) no procedimento em apreço.
Após o ato de abertura de propostas, realizado a 20 de Setembro de 2011 às 11:14:07 horas, a ação seguinte realizada pela Entidade Adjudicante no âmbito do procedimento em apreço, foi o cancelamento do procedimento, realizada a 20 de Dezembro de 2011 às 10:39:33 horas.”
Invoca ainda a nulidade a nulidade do contrato por ajuste direto por falta de cumprimento dos requisitos do regime da contratação pública.
Como é óbvio, esta última circunstância não interfere com a prova da factualidade em presença. Mas, efetivamente a comunicação referida é impeditiva da prova do facto.
Tal matéria eliminar-se-á, pois, do elenco dos factos provados.
Passemos, agora, à reapreciação dos depoimentos testemunhais invocados.
Nesta sede, desde já salientamos a irrelevância para a matéria em questão do depoimento de P.., que se identificou como responsável pelo gabinete de atividades desportivas na V.., porquanto as perguntas da mandatária do A. se centraram mais nas funções desempenhadas por este e em situações hipotéticas, do que no relato dos autos.
Já os demais depoimentos são importantes no com texto da decisão e impõem diversa resposta à matéria fática impugnada. Vejamos porquê!
A.. frequentava o ginásio e, preferencialmente, o horário do A. Identificou-o como sendo professor de musculação e cardiofitness, no horário entre as 5/6 até ao fecho das instalações, durante todos os anos que a mesma frequentou o espaço. Sabe que houve 1 ano que ele fez o horário entre a uma e as três da tarde, durante 2 tardes e que trabalhou ali cerca de dez anos. O A. fazia cumprir o regulamento de utentes, que estava afixado á entrada da sala de musculação e obedecia ao regulamento. Por exemplo, não permitia treinos sem toalha ou o uso de chinelos, o que ocorria por força de tal regulamento. Quem coordenava era o P... O A. tinha uma folha onde reportava o que aconteceria nas aulas, obedecendo a tudo o que lhe era solicitado pelo coordenador. Usava equipamento identificativo da empresa. Sabe que o A. saiu em final de Julho de 2012, data em que o ginásio, pela 1ª vez, encerrou em Agosto. Sabe que ele não saiu por livre vontade. Assistiu a uma conversa, em 30/07/2012, tendo-se apercebido que a mesma era no sentido de o P.. deixar de ali prestar funções. O ginásio encerraria a 1/08 e ele deixaria, a partir de então, de ali prestar funções. Era o A. quem orientava o seu plano de treino. Depois de ter saído da empresa ficou abalado. P.. foi-lhe apresentado como sendo o coordenador de atividades.
J.. também trabalhou para a empresa, mantendo boas relações com ambas as partes. Explicou que havia uma metodologia e procedimentos criados pela empresa, a que obedeciam. Havia um coordenador técnico, a quem obedeciam – o P.., responsável por acompanhar e verificar se os procedimentos e métodos eram implementados ou não. Se não fossem, reunia com os professores/monitores para acertarem modos de atuação. Também acompanhava o trabalho desenvolvido, estando presente na sala. Casos particulares, reunia com o professor. Tinham que comparecer a reuniões para ver se as metodologias implementadas eram as certas. Esteve 7 anos na empresa, partilhando esse período com o A. Recebiam orientações para as aulas, para a atitude, sobre pontualidade… Era descontada uma hora se houvesse atraso. Havia um regulamento interno, que sabiam que era para cumprir, sendo que tratavam diretamente com P... O A. dependia e respondia diretamente perante este. Usavam uniforme. A metodologia era definida em reunião de equipa e depois implementada. O P.. avaliava a atitude do A. perante os utentes.
M.. frequenta o ginásio desde 2004. O autor era o professor desde as 17h30m até ao encerramento, de 2ª a 6ª. Era o professor residente. Por vezes também substituía professores noutros horários. Sabe que ele reportava a terceiros e recebia instruções, sendo o ele o de ligação dos utentes ao coordenador P... Apercebeu-se que A. gozava férias (1 ou 2 semanas), até porque ele lhes comunicava. Referiu que foi despedido em Julho de 2012, tendo ouvido uma conversa entre o mesmo e P.. em que este lhe comunicava que ia prescindir dos serviços dele e que a partir de Setembro ele não iria trabalhar mais ali. Muita gente abandonou o ginásio por causa da saída do autor. Ele não estava contente com a situação. Ficou triste, desanimado, pois já lá trabalhava há 11 anos.
A.. também, frequenta o ginásio desse 2009, sendo o A. seu professor. Este fazia o horário de depois das seis, tirando uma ou duas semanas de férias por ano. Estranhou que ele trabalhasse a recibos verdes, porque ele estava lá há tanto tempo. Era um funcionário, que se encontrava lá sempre á mesma hora. Isto era a forma de sustento dele.
C.. frequenta o ginásio e frequentou as aulas do A. desde 2002. Nunca chegou atrasado. Não tem noção de ele ter faltado. Extremamente profissional. Cumpria todas as regras instituídas para sala, exigindo o cumprimento de regras aos utentes – toalhas, sapatilhas. O A. segui ordens do Sr. P.., que se apresentava como coordenador do ginásio. Ia lá algumas vezes às aulas falar com o autor. Qualquer pedido nosso era feito ao A. que reportava ao P... No final de Julho de 2012, o A. deixou de ali exercer funções. Disse que tinha sido despedido. Ele está mais em baixo, triste com a situação.
L.. frequenta o ginásio desde Dezembro de 2003. O A. foi seu monitor até ter saído, fazia o horário da tarde. Chegava a horas (18 até ao fecho). Pontual, assíduo, profissional diligente (“aprendi muito com ele, eu e toda a gente”). Rigoroso. Estava lá sempre, todos os dias.
N.. frequenta o ginásio há 10/11 anos. O A. foi sempre o seu monitor de musculação. Fazia o horário do final da tarde até às 9 ou 9 e meia. Houve um período que trabalhou no horário do início d atarde. Pontual. Nada a apontar ao seu profissionalismo. Assíduo. O A. fazia o treino para aca utente, seguindo um protocolo estipulado pela hierarquia superior. Era evidente que havia hierarquia estipulada entre ele e o P... O autor cumpria os programas definidos pela empresa. Dada a regularidade com que o via lá, pensava que ele fazia parte dos quadros. Mas ele disse que estava a recibos verdes. Não tinha nenhuma outra atividade. Houve um período em que foi convidado a deixar de dar aulas com uma proposta de voltar a ser admitido através de uma plataforma eletrónica de acesso. Por uma questão de contabilidade. Deixaram de o ver durante 4 semanas, que coincidiram com o mês de Agosto. Quando voltou. Deu-lhes essa explicação. Fê-lo com a expetativa de passar para os quadros.
P.. frequenta o ginásio desde 2008 e trabalhou lá de 2000 a 2007. P.. era o coordenador da sala de musculação. O A. estava sujeito a ordens e horários da empresa. A testemunha bestava nos quadros. O tratamento dispensado ao A. era o lhe dispensavam a si. Ele fazia o horário da parte da tarde, até ao fecho. Prescrevia o treino segundo orientações padrão. Usava farda por força do regulamento interno. Não saba se ele fazia picagens, mas sabe que havia sanção para os atrasos: não era paga 1 hora.
Pudemos ainda verificar os documentos invocados, a saber, os múltiplos r4ecibos de honorários (doc. 2 a 50 juntos com a PI) e mapas de honorários relativos aos anos 2002, 2005, 2006, 2007, 2008, 2009 e 2010 (doc. 8 a 14 juntos pela R.)
Da análise destes depoimentos, não restam dúvidas de que o A. observava um horário estipulado, que era assíduo e bom profissional, obedecia a um regulamento, respondia perante uma estrutura hierárquica, trabalhou naquele espaço ininterruptamente desde a admissão, havia controle de assiduidade…
Deste modo, modificam-se as repostas em reapreciação nos seguintes termos:
Provado que:
4)Sempre o autor exerceu as suas funções de modo assíduo, ininterrupto e com elevado nível de profissionalismo.
5)O Autor devia obediência ao regulamento interno.
6)O Autor dependia e respondia perante o responsável do gabinete das atividades desportivas.
7)O trabalho do autor era organizado pela ré.
13)O autor trabalhou ininterruptamente para a ré desde a data da sua admissão, 29 de Novembro de 2001 até 30 de Julho de 2012.
17)O registo das horas de serviço prestadas pelo autor, era feito para controlo dos horários de entrada e saída, o autor não podia chegar atrasado à aula, nem sair mais cedo da mesma.
49) No âmbito do mencionado procedimento de ajuste direto, e conforme lhe incumbia, o autor comprovou perante a ré a titularidade do seguro de acidentes de trabalho, obrigatório para os prestadores de serviços, cujo prémio foi pago pelo autor.
Resulta daqui que consideramos não provada a matéria mencionada no ponto 10, visto que as testemunhas não foram convincentes, respondendo conforme a mandatária do A. pretendia. Também não se provou a matéria reportada nos pontos 15 e 16, por falta de prova. E, do mesmo modo, nenhuma conclusão podemos retirar quanto ao ponto 3.
Relativamente aos pontos 53 e 76, não se percebe muito bem o que é pretendido. Nas suas conclusões o apelante começa por mencionar que deveriam ter sido dados como não provados estes factos. Mas, depois, parece pretender compatibilizá-los com o ponto 82 da matéria de facto, de modo a contextualizá-lo Mantém-se as respostas, visto que nada se provou em contrário.

FACTUALIDADE PROVADA:
1. A ré exerce, com intuito lucrativo a atividade de gestão dos equipamentos
desportivos municipais e correspondentes infraestruturas, bem como da sua
utilização, e ainda a promoção e organização de eventos desportivos ou recreativos.
2. O autor foi admitido, por contrato escrito, ao serviço da ré, em 29 de Novembro de 2001.
3. O referido contrato foi apelidado de Contrato de Prestação de Serviços.
4. Pelo exercício da atividade de professor de musculação, o autor recebia um montante mensal variável em função do número de horas de aulas ministradas.
5. Para formalização do pagamento do que a ré lhe pagou, o autor emitiu recibos verdes, após a contabilização informática feita pela ré, relativamente às aulas ministradas pelo autor.
6. Em Janeiro de 2012 a ré pagou ao autor a quantia de € 700,00.
7. Durante o mês de Fevereiro e Março de 2012 a ré pagou ao autor a quantia de € 740,00 mensais.
8. Já em Abril de 2012 pagou a quantia de € 700,00.
9. No mês de Maio de 2012 pagou a quantia de €630,00.
10. No mês de Junho de 2012 pagou a quantia de € 770,00.
11. Em Julho de 2012 pagou a quantia de € 690,00.
12. Em Agosto de 2012 pagou a quantia de € 770,00.
13. De Janeiro a Dezembro de 2011 a ré pagou ao autor o valor global de € 9.504,00, respeitante aos seguintes recibos:
-Recibo n.º 0959515, de 15/01/2011, no valor de € 869,00.
-Recibo n.º 0959516, de 15/02/2011, no valor de € 924,00.
-Recibo n.º 0959517, de 17/03/2011, no valor de € 968,00.
-Recibo n.º 0959518, de 15/04/2011, no valor de € 990,00.
-Recibo n.º 0959519, de 16/05/2011, no valor de € 770,00.
-Recibo n.º 0959520, de 15/06/2011, no valor de € 836,00.
-Recibo n.º 0959521, de 15/07/2011, no valor de € 770,00.
-Recibo n.º 0959522, de 16/08/2011, no valor de € 814,00.
-Recibo n.º 1, de 16/09/2011, no valor de € 473,00.
-Recibo n.º 2, de 16/10/2011, no valor de € 710,00.
-Recibo n.º 3, de 15/11/2011, no valor de € 640,00.
-Recibo n.º 4, de 15/12/2011, no valor de € 740,00.
14. De Janeiro a Dezembro de 2010 a ré pagou ao autor o valor global de €
9.911,00.
15. De Janeiro a Dezembro de 2005 a ré pagou ao autor o valor global de €
6.484,30.
16. De Janeiro a Dezembro de 2004 a ré pagou ao autor o valor global de €
6.186,16.
17. De Janeiro a Dezembro de 2003 a ré pagou ao autor o valor global de €
7.505,98.
18. De Janeiro a Dezembro de 2002 a ré pagou ao autor o valor global de €
6.325,85.
19. A ré pagava ao autor a sua prestação como professor de musculação e cardiofitness, consoante o número de aulas ministradas pelo mesmo no mês anterior, sendo que às aulas era atribuído o valor de € 10,00 hora, nos anos de 2011 e 2012, e de €10,35 e €11,00 nos anos anteriores.
20. O valor auferido pelo autor pela prestação das aulas era pago mensalmente, a meio do mês, habitualmente ao dia 15, porque, dependendo do número de aulas realizadas no mês anterior, só a meio do mês a ré finalizava a contabilização das mesmas e procedia ao seu pagamento.
21. O autor exercia a sua atividade nas salas de aulas e nas instalações da ré.
22. A ré sempre disponibilizou ao autor o espaço, equipamentos, meios físicos e técnicos necessários ao desempenho das suas funções.
23. A ré atribuiu um cartão de identificação de funcionário ao autor.
24. As horas das aulas sempre foram marcadas pela ré.
25. O autor estava obrigado a registar a hora de entrada e saída das instalações da ré, através das picagens manuais.
26. Bem como a elaborar um relatório mensal com o registo de frequência/assiduidade dos alunos.
27. O autor participava em reuniões cuja realização era determinada pela ré.
28. Sempre que não podia comparecer a prestar as aulas o autor tinha que comunicar tal facto com antecedência e proceder à sua substituição por outro professor.
29. O lugar e material de trabalho eram fornecidos pela ré.
30. O horário das aulas era definido pela ré.
31. A ré nunca pagou ao autor a remuneração correspondente a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.
32. O autor solicitou à ré, por email de 16 de Agosto de 2012, a comunicação do seu despedimento por escrito.
33. A ré nunca respondeu ao solicitado.
34. A ré não promoveu os termos do despedimento com justa causa.
35. Nem o fez preceder de processo disciplinar.
36. No ano de 2012, o autor recebeu a quantia de € 5.740,00, o que corresponde a uma média mensal de € 717,50.
37. No ano de 2011, recebeu a quantia de € 9.504,00, o que corresponde a uma média mensal de € 792,00.
38. No ano de 2010, recebeu a quantia de € 9.911,00, o que corresponde a uma média mensal de € 825,92.
39. Nos anos de 2009, 2008, 2007 e 2006, o autor recebeu as quantias de € 9.097,00, € 7.326,00, € 6.506,35 e € 7.696,12, respetivamente, o que corresponde a uma média mensal de € 758,03, € 610,50, € 542,20 e € 641,34, respetivamente.
40. No ano de 2005, recebeu a quantia de € 6.484,30, o que corresponde a
uma média mensal de € 540,36.
41. No ano de 2004, recebeu a quantia de € 6.186,16, o que corresponde a
uma média mensal de € 515,51.
42. No ano de 2003, recebeu a quantia de € 7.505,98, o que corresponde a
uma média mensal de € 625,50.
43. No ano de 2002, o autor recebeu a quantia de € 6.325,85, o que corresponde a uma média mensal de € 527,15.
44. Por contrato escrito datado de 29/11/2001, designado de Contrato de Prestação de Serviços”, o autor comprometeu-se a prestar serviços para a ré, no Pavilhão Municipal da Póvoa de Varzim, serviços esses consubstanciados no exercício de “funções de Professor das atividades a promover na sala de musculação".
45. Conforme previsto no n.º 4 da Cláusula Terceira do mencionado Contrato
de Prestação de Serviços, o mesmo podia “ser feito cessar a todo o tempo, por qualquer das partes, com aviso prévio de trinta dias e sem obrigação de indemnizar”.
46. Em 15/07/2011, por carta registada com aviso de receção, a ré comunicou ao autor a cessação do referido Contrato de Prestação de Serviços, com efeitos reportados a 15/08/2011.
47. Em Setembro de 2011, a ré procedeu à abertura de procedimento de ajuste direto para celebração de “Contrato de Prestação de Serviços de Monitorização e Orientação da Prática de Musculação e Cardiofitness”, tendo convidado o autor a apresentar proposta.
48. O autor apresentou Proposta no âmbito do referido procedimento de ajuste direto, declarando expressamente que “tendo tomado inteiro e perfeito conhecimento do caderno de encargos relativo à execução do contrato a celebrar na sequência do ajuste direto”, se obrigava “a executar o referido contrato em conformidade com o conteúdo do mencionado caderno de encargos, relativamente ao qual declara aceitar, sem reservas, todas as suas cláusulas”.
49. No âmbito do mencionado procedimento de ajuste direto, e conforme lhe incumbia, o autor comprovou perante a ré a titularidade do seguro de acidentes de trabalho, obrigatório para os prestadores de serviços, cujo prémio foi pago pelo autor.
50. A prestação de atividade pelo autor à ré foi sempre efetuada ao abrigo de denominados contratos de prestação de serviços, relativamente aos quais o autor nunca invocou falta ou qualquer vício de vontade.
51. Pelo menos relativamente ao contrato de prestação de serviços objeto do ajuste direto, o autor participou ativamente no procedimento de formação do contrato.
52. O autor esteve coletado nas finanças como profissional liberal, até 02/08/2012.
53. Era o autor quem planeava, programava, prescrevia e monitorizava os planos de treino dos utentes, fazendo-o do modo que entendia correto e adequado.
54. Os documentos constantes de fls. 110 a 133, tratam-se de documentos de índole técnica, elaborados pelo Diretor Técnico das instalações desportivas da ré, no exercício das funções, obrigatórias, que lhe estão legalmente cometidas.
55. O registo das horas de serviço prestadas pelo autor – inicialmente feito através do cartão mencionado em 23), e que foi entregue ao autor única e exclusivamente para esse fim, e posteriormente de modo manual - era feito para controlo/contabilização da respetiva retribuição.
56. A consequência que advinha para o autor da não prestação de atividade nos dias/horas em que se tinha obrigado era a não retribuição das horas em causa.
57. O autor recebia periodicamente honorários variáveis.
58. Os honorários variavam em função das horas de serviço efetivamente prestadas, nada recebendo o autor se, em dia e hora em que estava obrigado a prestar os serviços contratados com a ré, os não prestasse.
59. No que respeita aos honorários pagos pela ré ao autor:
- no ano 2010, a ré pagou ao autor um valor global de honorários de 9.911,00
€ ;
- no ano 2009, a ré pagou ao autor um valor global de honorários de 9.097,00
€ ;
- no ano 2008, a ré pagou ao autor um valor global de honorários de 7.326,00
€ ;
- no ano 2007, a ré pagou ao autor um valor global de honorários de 6.506,35
€ ;
- no ano 2006, a ré pagou ao autor um valor global de honorários de 7.696,12
€ ;
- no ano 2005, a ré pagou ao autor um valor global de honorários de 6.484,30
€ ;
- no ano 2002, a ré pagou ao autor um valor global de honorários de 6.325,85
€ .
60. A ré pagava ao autor, por cada hora efetivamente prestada:
- 10,35 €, até Fevereiro de 2007;
- 11,00 €, de Março de 2007 a Agosto de 2011;
- 10,00 €, a partir de Setembro de 2011.
61. O autor sempre deu quitação dos honorários recebidos da ré através dos chamados “recibos verdes”.
62. Sobre as quantias pagas ao autor nunca incidiram quaisquer descontos para a segurança social e a ré não pagou quaisquer contribuições à segurança
social relativas à atividade prestada pelo autor, factos que eram do conhecimento do autor, e em relação aos quais nunca se opôs sem solicitou à ré que efetuasse esses descontos ou pagasse essas contribuições.
63. O autor nunca beneficiou de férias pagas, nem recebeu quaisquer montantes a título de subsídio de férias e/ou de Natal.
64. Sem que tivesse transmitido ou solicitado à Administração da ré o que quer que fosse, o autor remeteu ao Professor P.., funcionário da ré, o e-mail aludido no facto 32), com o teor constante do documento de fls. 138.
65. O autor não mais se apresentou nas instalações da ré para prestar os serviços.
66. Por correio eletrónico de 16/08/2012, foram comunicados ao autor – como aos demais professores - os horários que lhe estavam atribuídos para a época desportiva a iniciar a 1de Setembro.
67. O autor cessou a sua atividade nas finanças em 02/08/2012.
68. O autor, no ano de 2012, exerceu funções entre segunda e Sexta-feira, das 17H30 às 21H00.
69. O autor, no ano de 2011, exerceu funções entre segunda e Sexta-feira, das 17H00 às 21H00.
70. Nos anos anteriores a 2011, trabalhou sempre, pelo menos, 4 a 6 horas diárias.
71. O autor recebia instruções e diretivas referentes a assuntos administrativos e organizativos da ré e sobre o processo de gestão de atividades desportivas.
72. O autor gozava férias anuais.
73. A ré tinha trabalhadores a desempenhar funções idênticas às do autor.
74. O autor é pessoa com frequência académica.
75. O autor esteve inscrito na segurança social como trabalhador independente até, pelo menos, 31.07.2012.
76. Era o autor quem planeava, programava, prescrevia e monitorizava os planos de treino dos utentes, fazendo-o do modo que entendia por correto e adequado.
77. O autor, na estrutura organizativa da ré, desempenhava as funções referidas em 4).
78. O autor não participava em todas as reuniões organizadas pelo Diretor
Técnico e eventos organizados pela ré.
79. O registo mensal da frequência/assiduidade dos alunos, destinava-se, pelo menos, ao controlo da ré do número/frequência de utilizadores.
80. Até 23.01.2013, o autor nunca reclamou junto da ré férias remuneradas ou o pagamento de subsídio de férias e de natal.
81. O autor acumulava a prestação de serviços à ré com outras atividades, das quais retirava proveitos económicos.
82.Era a ré que elaborava a ficha técnica para as salas de musculação, nomeadamente programas, níveis de treino, métodos de treino.
83. Nos meses de Agosto e Setembro de 2011, o autor exerceu as suas funções para a ré, pelo menos, nos dias 11.08.2011, 12.08.2011, 17.08.2011, 18.08.2011, 19.08.2011, 05.09.2011, 06.09.2011, 07.09.2011, 08.09.2011, 09.09.2011, 12.09.2011, 03.09.2011, 14.09.2011, 15.09.2011, 16.09.2011 e
19.09.2011.

E ainda, por força da reapreciação da matéria de facto:
4)Sempre o autor exerceu as suas funções de modo assíduo, ininterrupto e com elevado nível de profissionalismo.
5)O Autor devia obediência ao regulamento interno.
6)O Autor dependia e respondia perante o responsável do gabinete das atividades desportivas.
7)O trabalho do autor era organizado pela ré.
13)O autor trabalhou ininterruptamente para a ré desde a data da sua admissão, 29 de Novembro de 2001 até 30 de Julho de 2012.
17)O registo das horas de serviço prestadas pelo autor, era feito para controlo dos horários de entrada e saída, o autor não podia chegar atrasado à aula, nem sair mais cedo da mesma.
***
APRECIAÇÃO JURÍDICA:
É chegado o momento de nos determos sobre a 2ª questão que elencámos, para, a partir da resposta à mesma, tirarmos conclusões quanto ao pedido formulado na ação - deve qualificar-se o contrato celebrado entre autor e ré como contrato de trabalho?
Na sentença recorrida, após se ter discorrido sobre a definição de contrato de trabalho e, muito concretamente, sobre o seu elemento diferenciador – a subordinação jurídica –, e após recurso a métodos indiciários em ordem a aferir da mesma, veio a concluir-se que “o autor não fez prova da verificação da subordinação jurídica, na medida em que, da matéria de facto provada não resultam factos consubstanciadores do exercício da atividade sujeita à autoridade, direção e fiscalização da ré.”
Conforme emerge de quanto expendemos acima, a matéria de facto sofreu alterações significativas. E, se em presença do decidido anteriormente já nos inclinávamos para ter como de trabalho a relação a que as partes se vincularam, as alterações agora introduzidas mais nos impõem essa conclusão.
Vejamos porquê!
Da análise da definição legal de contrato de trabalho decorrente da LCT pode, com facilidade, concluir-se que no âmbito do contrato de trabalho se proporciona uma atividade, mediante subordinação.
Dispunha-se ali que contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, sob autoridade e direção desta.
Esta noção, coincidente com o disposto no Artº 1152º do CC, perpassou para o CT de 2003, vindo, na mais recente formulação a sofrer algumas alterações decorrentes de uma modificação introduzida em 2009, sendo que, na sequência da reforma de 2012 se introduziu uma verdadeira presunção de laboralidade que facilita a integração do conceito.
Contudo, o elemento autoridade é intrínseco à noção de trabalho subordinado, distinguindo-o do trabalho autónomo.
Na verdade, o contrato de trabalho caracteriza-se essencialmente “pelo estado de dependência jurídica em que o trabalhador se coloca face à entidade empregadora, sendo que o laço de subordinação jurídica resulta da circunstância do trabalhador se encontrar submetido à autoridade e direção do empregador que lhe dá ordens, enquanto na prestação de serviço não se verifica essa subordinação, considerando-se apenas o resultado da atividade.
A subordinação jurídica que caracteriza o contrato de trabalho decorre precisamente daquele poder de direção que a lei confere à entidade empregadora (artigo 150.º) a que corresponde um dever de obediência por parte do trabalhador [artigo 121.º, n.os 1, alínea d), e 2]” (Ac. do STJ de 4/02/2015, Procº 437/11.0TTOAZ, in www.dgsi.pt)
A facilidade com que o conceito se apreende em tese depara-se, as mais das vezes, com dificuldades de relevo quando em presença da concreta situação de facto. Esta dificuldade acentua-se quando, como no caso concreto, o trabalhador dispõe de alguma autonomia técnica (vd. Pontos 53 e 76).
Assim, impõe-se que recorramos, tal como se sustentou na sentença recorrida e é jurisprudência uniforme, a indícios reveladores da existência de subordinação jurídica, que é o elemento por excelência caracterizador do contrato de trabalho. Neste sentido podem ver-se os Acórdãos do STJ de 4/05/2001 (proc.º 3304/06.5TTLSB.S1), 31/01/2012 (proc.º 121/04.0TTSNT.L1.S1), 12/01/2012 (proc.º 2158/07.9TTLSB.L1.S1) e 4/02/2015 (proc.º 437/11.0TTOAZ), disponíveis em www.dgsi.pt.
Tais indícios prendem-se com a existência de horário de trabalho, a prestação da atividade em local previamente definido pelo empregador, a existência de controlo no exercício da atividade, a utilização de bens do beneficiário da atividade, a sujeição a poder disciplinar, a modalidade de retribuição, a atribuição de categoria profissional, o não recurso, pelo executante, a colaboradores externos, a repartição do risco, ou mesmo a observância de um ou outro regime fiscal e de segurança social, enfim, impõe-se que recorramos a elementos próprios de uma organização laboral. Há, ainda, indícios externos ao próprio contrato que podem elucidar, como por exemplo, a prestação da mesma atividade para outrem.
Não é, contudo, imperativo que todos os indícios se verifiquem em cada caso.
Imperativo é, porém, que dos indícios presentes se possa, sem dúvidas razoáveis, concluir pela existência de contrato de trabalho.
Do mesmo modo, não é por nos depararmos com um desses indícios que, desde logo, podemos chegar a conclusões seguras, até porque cada indício pode assumir diferente valor em presença de cada caso, tudo dependendo do tipo de relacionamento entre as partes.
E, como bem nota Pedro Romano Martinez, “os tradicionais indícios desatualizaram-se com a evolução tecnológica, com diferentes modos de organização do trabalho” (Direito do Trabalho, Almedina, 5ª Ed., 336) ”.
No caso sub-júdice a relação laboral foi estabelecida em 2001, mediante o nomen iuris de contrato de prestação de serviços, para o exercício da atividade de professor de musculação.
Como pontos muito fortes no sentido da caracterização de uma situação de subordinação jurídica temos desde logo, a caracterização de uma relação hierarquizada porquanto o Autor dependia e respondia perante o responsável do gabinete das atividades desportivas, sendo o seu trabalho organizado pela ré. Por outro lado, devia obediência ao regulamento interno, tendo-lhe sido atribuído um cartão de identificação como funcionário daquela organização. Não gozava de autonomia no agendamento, pois as horas das aulas sempre foram marcadas pela ré, sendo o respetivo horário também por ela definido. Ou seja, a calendarização não estava na livre disponibilidade do trabalhador. Não menos importante é o facto de o autor receber instruções e diretivas referentes a assuntos administrativos e organizativos da ré e sobre o processo de gestão de atividades desportivas. Do mesmo modo, também era esta quem disponibilizava o espaço, equipamentos, meios físicos e técnicos necessários ao desempenho das suas funções, o que, no contexto da relação, não assume igual importância, visto não poder ser de outro modo.
Importante era também a circunstância de o autor estar obrigado a registar a hora de entrada e saída das instalações da ré, através das picagens manuais, bem como a elaborar um relatório mensal com o registo de frequência/assiduidade dos alunos.
Por outro lado, ainda participava em reuniões cuja realização era determinada pela ré, sendo que estava obrigado a comunicar a sua ausência com antecedência e proceder à sua substituição por outro professor.
Também assume relevância a circunstância de o autor gozar férias anuais, embora nunca remuneradas.
Todos estes elementos estão presentes numa relação laboral típica, não estando minimamente caracterizada a autonomia própria do contrato de prestação de serviços.
Porém, há alguns pontos negativos. Desde lodo, o A. recebia uma remuneração variável, em função do número de horas ministradas, emitindo recibos verdes, estava coletado como profissional liberal, assegurava o seu próprio seguro de acidentes de trabalho e as suas contribuições para a segurança social eram efetuadas como independente.
Porém, estes fatores, considerando a relação em causa, não podem sobrepor-se ao modo como se desenrolava a prestação no dia-a-dia, pois é a partir do modus operandi no seio da organização empresarial que se deve aferir, em primeira linha, o tipo de contrato em presença. Sendo que é exatamente para evitar as obrigações próprias do contrato de trabalho que os empregadores recorrem a este tipo de expedientes.
Por outro lado, o autor acumulava a prestação de serviços à ré com outras atividades, das quais retirava proveitos económicos, o que, de algum modo, afasta a total dependência económica. Porém, não ao ponto de afastar a caracterização da relação como de emprego dada a vacuidade de tal factualidade, sendo que, não raro, os trabalhadores recorrem a outras formas de obtenção de proventos, não obstante manterem efetivos contratos de trabalho.
Como vimos acima, são vários e consistentes os elementos próprios da integração numa estrutura organizacional que conflituam com as características próprias da prestação de serviços propriamente dita - a sujeição a uma cadeia hierárquica, a conformação a ordens superiores.
Como acima dissemos, o traço diferenciador entre uma relação de trabalho subordinado e uma relação de trabalho autónomo reside na subordinação jurídica, figura que traduz uma posição de supremacia de uma das partes perante a outra.
Uma tal posição é absolutamente patente na relação que se estabeleceu entre o A. e a R., pelo que, sendo própria de uma relação de trabalho subordinado, não poderemos sufragar quanto se decidiu na sentença recorrida.
Recordamos que, tal como vem sendo defendido pela jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, “nos contratos de execução continuada, havendo contradição entre o tipo contratual inicialmente acordado e o realmente executado, prevalece a execução assumida, efetivamente, pelas partes” (Ac. de 10/12/2009, proferido no âmbito do proc.º 6/08.1TTPTG.S1, disponível em www.dgsi.pt).
Dito de outro modo, e tal como salienta João Leal Amado, do Direito emerge um princípio geral segundo o qual “os contratos são o que são, não o que as partes dizem que são” (Contrato de Trabalho, 2ª Ed., Coimbra Editora, pg. 72), pelo que a manipulação da qualificação do contrato assente na cor do recibo passado pelo prestador de atividade não prevalece sobre a realidade emergente da execução.
Termos em que, nesta parte, procede a apelação.

Urge, agora, retirar da caracterização da relação jurídica as devidas consequências relativamente ao demais pedido na ação.
Esta assentava ainda na alegação de um despedimento individual ocorrido em 30/07/2012, despedimento esse que não se provou.
Assim, os pedidos que sejam corolário de uma tal conclusão, falecem.

Já no que tange ao pedido formulado sob a alínea q) – condenação da R. a efetuar os descontos para a Segurança Social à taxa legal desde 29 de Novembro de 2001 até à data da sentença -, sendo obrigação empresarial a inscrição na segurança social, conforme decorre do que se dispõe no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial e de Segurança Social, ainda assim deparamo-nos com uma questão de incompetência material para conhecer deste pedido.
Na verdade, só há obrigação de efetuar descontos para a Segurança Social quando praticado o ato administrativo de inscrição que leva à constituição da relação jurídica de vinculação (Artº 6º). Esta relação tem por objeto a determinação dos titulares dos direitos à proteção social, bem como dos sujeitos das obrigações (Artº 7º).
Tratando-se da constituição de uma relação de cariz administrativo, o tribunal de trabalho não é competente para o respetivo reconhecimento, sendo-o o tribunal tributário (Artº 49º/1-c) do ETAF).
Essa é, pois, uma questão a resolver entre a administração e o contribuinte, pelo que os tribunais de trabalho carecem de competência para a condenação reclamada.
Na verdade, a obrigação de liquidar e pagar as contribuições não decorre diretamente da violação do contrato de trabalho, mas sim da violação de um dever para-tributário.
Como se disse no Ac. de 19/10/2006 do Tribunal de Conflitos, “a prestação contributiva devida pela entidade empregadora tem como pressuposto a existência de um contrato de trabalho, a verdade é que essa obrigação concretiza-se através duma relação jurídica entre a mesma entidade e o Estado, que tem, como vimos, a natureza parafiscal.
…esta questão, embora resulte duma relação laboral, não respeita a direitos e deveres recíprocos das partes no contrato, a relações jurídicas entre elas diretamente estabelecidas. Razão pela qual não pode aqui ser aplicado o disposto no art° 85° alínea b) da LOFT, quando estabelece a competência dos tribunais do trabalho para conhecer das questões emergentes das relações de trabalho subordinado.”
Nessa medida, improcede a questão que nos ocupa.

Restam, pois, os créditos por férias, subsídio de férias e de Natal.
A este propósito peticionou-se a condenação da R.:
f) a pagar ao Autor a quantia de €1.739,28 referente a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal do serviço prestado em 2002, vencido em 01/01/2003 e 15 de Dezembro de 2002;
g) a pagar ao Autor a quantia de € 2.047,08, referente a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal do serviço prestado em 2003, vencido em 01/01/2004 e 15 de Dezembro de 2003;
h) a pagar ao Autor a quantia de €1.687,14, referente a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal do serviço prestado em 2004, vencido em 01/01/2005 e 15 de Dezembro de 2004;
i) a pagar ao Autor a quantia de €1.617,69, referente a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal do serviço prestado em 2005, vencido em 01/01/2006 e 15 de Dezembro de 2005;
j) a pagar ao Autor a quantia de €2.454,00, referente a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal do serviço prestado em 2006, vencido em 01/01/2007 e 15 de Dezembro de 2006;
k) a pagar ao Autor a quantia de €2.454,00 de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal do serviço prestado em 2007, vencido em 01/01/2008 e 15
de Dezembro de 2007;
l) a pagar ao Autor a quantia de €2.454,00 de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal do serviço prestado em 2008, vencido em 01/01/2009 e 15
de Dezembro de 2008;
m) a pagar ao Autor a quantia de €2.454,00 de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal do serviço prestado em 2009, vencido em 01/01/2010 e 15
de Dezembro de 2009;
n) a pagar ao Autor a quantia de €2.496,00 de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal do serviço prestado em 2010, vencido em 01/01/2011 e 15
de Dezembro de 2010;
o) a pagar ao Autor a quantia de €2.376,00 de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal do serviço prestado em 2011, vencido em 01/01/2012 e 15
de Dezembro de 2011;
p) a pagar ao Autor a quantia de €1.255,62 de proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal do serviço prestado em 2012.
q) a efetuar os descontos para a Segurança Social à taxa legal desde 29 de Novembro de 2001 até à data da sentença.
Como sabemos, é próprio do contrato de trabalho, beneficiar de férias e respetivo subsídio, bem como de subsídio de Natal, revelando-se despicienda a referência à legislação aplicável ao longo dos anos em que se desenvolveu a prestação.
Importante é que aquilatemos do valor auferido mensalmente pelo A. em cada um dos anos em referência.
Ora, provou-se que:
43. No ano de 2002, o autor recebeu a quantia de € 6.325,85, o que corresponde a uma média mensal de € 527,15.
42. No ano de 2003, recebeu a quantia de € 7.505,98, o que corresponde a
uma média mensal de € 625,50.
41. No ano de 2004, recebeu a quantia de € 6.186,16, o que corresponde a
uma média mensal de € 515,51.
40. No ano de 2005, recebeu a quantia de € 6.484,30, o que corresponde a
uma média mensal de € 540,36.
39. Nos anos de 2009, 2008, 2007 e 2006, o autor recebeu as quantias de € 9.097,00, € 7.326,00, € 6.506,35 e € 7.696,12, respetivamente, o que corresponde a uma média mensal de € 758,03, € 610,50, € 542,20 e € 641,34, respetivamente.
38. No ano de 2010, recebeu a quantia de € 9.911,00, o que corresponde a uma média mensal de € 825,92.
37. No ano de 2011, recebeu a quantia de € 9.504,00, o que corresponde a uma média mensal de € 792,00.
36. No ano de 2012, o autor recebeu a quantia de € 5.740,00, o que corresponde a uma média mensal de € 717,50.
Assim, sabendo-se que a remuneração nas férias é igual àquela que seria auferida se estivesse ao serviço, o mesmo acontecendo com os subsídios, conclui-se que são devidas, em face do pedido concretamente formulado, as seguintes prestações:
a) Subsídio de Natal 2002 – 527,15€
b) Férias e subsídio vencidas em 2003 – 1.251,00€
c) Subsídio de Natal de 2003 – 625,50€
d) Férias e subsídio vencidos em 2004 – 1.031,02€
e) Subsídio de Natal de 2004 – 515,51€
f) Férias e subsídio vencidos em 2005 – 1.080,72€
g) Subsídio de Natal de 2005 – 540,36€
h) Férias e subsídio vencidos em 2006 – 1.282,68€
i) Subsídio de Natal de 2006 – 641,34€
j) Férias e subsídio vencidos em 2007 – 1.085,40€
k) Subsídio de Natal de 2007 – 542,70€
l) Férias e subsídio vencidos em 2008 – 1.221,00€
m) Subsídio de Natal de 2008 – 610,50€
n) Férias e subsídio vencidos em 2009 – 1.516,06€
o) Subsídio de Natal de 2009 – 758,03
p) Férias e subsídio vencidos em 2010 – 1.651,84
q) Subsídio de Natal de 2010 – 825,92€
r) Férias e subsídio vencidos em 2011 – 1.584,00€
s) Subsídio de Natal de 2011 – 792,00€
t) Férias e subsídio vencidos em 2012 – 1.435,00€
u) Proporcionais – 1.255,63€
O valor global em dívida ascende a 20.773,36€.

Sobre o valor em dívida incidem juros de mora, á taxa anual de 4% desde a data de vencimento de cada uma das prestações até integral pagamento. Contudo, como os juros de mora vêm reclamados apenas desde a data em que se situou o alegado despedimento, assim se concederá, isto é, desde 31/07/2012.

Por último, nenhuma consequência se retira da factualidade constante dos pontos 46 a 51 da matéria fática, pois é claro para nós que a situação ali referenciada não é senão mais uma tentativa de mascarar a realidade vivida no contexto da relação jurídica estabelecida em 2001, sendo uma evidência que tal relação não sofreu qualquer interrupção até 30/07/2012.

Em conformidade com o exposto, acorda-se em julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência, e na revogação parcial da sentença, condena-se a Recrdª a:
a) A reconhecer que a relação laboral existente entre o Autor e a Ré configura um contrato de trabalho sem termo;
b) A pagar ao A. a quantia de vinte mil setecentos e setenta e três euros e trinta e seis cêntimos (20.773,36€), acrescida de juros de mora á taxa anual de 4% desde 31/07/2012 até integral pagamento.
Custas por ambas as partes na proporção de vencidas.
Notifique.
Guimarães, 14/05/2015
Manuela Fialho
Moisés Silva
Antero Veiga