Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
140/12.3TELSB-M.G1
Relator: CÂNDIDA MARTINHO
Descritores: ARRESTO
FUNDAMENTOS PARA DECRETAMENTO
RECEIO PERDA GARANTIA PATRIMONIAL
NÃO VERIFICAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/27/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I) Ainda que o arresto vise o confisco de vantagens ilícitas decorrentes da prática do crime, é exigível para o seu decretamento que o requerente demonstre o periculum in mora, ou seja, o receio de perda da garantia patrimonial.
II) Não basta demonstrar que existem fortes indícios da prática de um crime e que este gerou vantagens, exigindo-se igualmente que se demonstre que os arguidos se preparam para dissipar esse património para que o Estado possa assegurar que esse montante, que não lhes pertence, será a final confiscado.
III) O artigo 228.º, n.º 1 do Código de Processo Penal preceitua que «a requerimento do Ministério Público ou do lesado, pode o juiz decretar o arresto, nos termos da lei do processo civil.».
IV) Como já se pronunciou o Tribunal Constitucional “(…) os requisitos de que depende o decretamento do arresto, também em processo penal por força da remissão consignada no art.º 228º, n.º 1, do CPP, respeitam tão só à aparência do direito de crédito e ao perigo da dissipação do património (cfr. artºs 391º e 392º, do CPC)” – Ac. do T. C. n.º 724/2014, de 28/10/2014.
V) Os fundamentos do arresto são, pois, os do artigo 391.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, de acordo com o qual «o credor que tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor.».
Dai que se afigura indefensável a tese de que o periculum im mora, de acordo com o citado artigo 228º, concretiza-se por referência “ao fundado receio de que faltem ou diminuam substancialmente as garantias de pagamento (…)”, tal como previsto no artigo 227º, nº1, do mesmo diploma legal.
Tal não foi a intenção do legislador, pois, se assim fosse, teria certamente feito constar tal remissão no citado artigo 228º, ao invés de consagrar expressamente que o arresto é decretado nos termos da lei do processo civil.
VI) Para além de tal consagração expressa, teve o cuidado de fazer constar as exceções que entendeu dever fazer em relação a esse regime, como é o caso da situação prevista na parte final do nº1, do artigo 228, do C.P.P., em que o legislador presume que a não prestação da caução, só por si, consubstancia o “fundado receio da perda da garantia patrimonial” ou a situação prevista no nº2, com a admissibilidade do arresto preventivo em relação ao comerciante.
Por conseguinte, o critério para avaliar o justo receio de perda da garantia patrimonial deve ser ponderado caso a caso, a partir de factos objetivos e concretos que denotem o perigo de se tornar mais difícil ou impossível a cobrança do crédito.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os juízes da secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

1.
No âmbito do procedimento cautelar de arresto preventivo que corre termos sob o nº140/12.3TELSB-F, por decisão proferida em 28/5/2021, foram julgadas procedentes as oposições deduzidas pelos arguidos/requeridos M. F., X- CONSULTING, SA e A. L. e, consequentemente, ordenado o levantamento do arresto decretado relativamente aos seguintes bens:
- Do arguido/requerido M. F.:
- Imóvel, inscrito sob o artigo … (…), da matriz predial urbana, na União de Freguesias de ..., ...,,, … e …, do concelho de .., do distrito do …, registado sob o nº … – fracção C), da CRP do …, sito na Rua …, nº .., da freguesia de .., do concelho do Porto (…), correspondendo a apartamento, com um valor patrimonial atribuído pela AT de €44.920,00 (quarenta e quatro mil, novecentos e vinte euros).
- Activos financeiros (com reporte a Abril/Maio de 2018):
1) Saldo da conta poupança rendimento nº .............101 (associado à conta de depósitos à ordem nº PT50.............182), do “BANCO ...”; e
2) Saldo da conta poupança nº ……….68, do “Banco ...”.

- Da arguida/requerida X- CONSULTING, SA :
Activos financeiros do “Banco ...” (com reporte a Dezembro de 2018):
1) Saldo das contas de fundos nº ..........051;
2) Saldo da conta de títulos nº ...........800;
3) Saldo da conta a prazo nº...............020;
4) Saldo da conta a prazo nº...............061;
5) Saldo da conta a prazo nº...............061;
6) Saldo da conta a prazo nº...............061-.....02;
7) Saldo da conta a prazo nº...............061-.....04; e
8) Saldo da conta a prazo nº...............020.

- Do arguido/requerido A. L.:
Imóveis:
1) Inscrito sob o artigo 92º, Secção AJ, da matriz predial rústica, na União das Freguesias de … e …, do concelho de …, do distrito de Lisboa, registado sob o nº …, da CRP de …, correspondendo a um terreno agrícola e com um valor patrimonial atribuído pela AT de €84,54 (oitenta e quatro euros e cinquenta e quatro cêntimos);
2)Inscrito sob o artigo …, da matriz predial urbana, na União de Freguesias de ... e ..., do concelho e distrito de Coimbra, registado sob o nº …, da 2ª CRP de Coimbra, correspondendo a uma vivenda para habitação, em compropriedade com R. E., com um valor patrimonial atribuído pela AT de €93.249,17 (noventa e três mil, duzentos e quarenta e nove euros e dezassete cêntimos);
3) Direito de superfície do imóvel inscrito sob o artigo …, da matriz predial urbana, na freguesia de ..., do concelho e distrito de Coimbra, registado sob o nº …, da 1ª CRP de Coimbra, correspondendo a um apartamento, em compropriedade com N. P., com um valor patrimonial atribuído pela AT de €35.623,11 (trinta e cinco mil, seiscentos e vinte e três euros e onze cêntimos);
4)Inscrito sob o artigo …, da matriz predial urbana, na freguesia de ..., do concelho de ..., do distrito de Coimbra, registado sob o nº …, da CRP de ..., correspondendo a uma garagem, com um valor patrimonial atribuído pela AT de €3.162,13 (três mil, cento e sessenta e dois euros e treze cêntimos); e
5) Inscrito sob o artigo …, da matriz predial urbana, na freguesia de ..., do concelho de ..., do distrito de Coimbra, registado sob o nº … – fracção …), da CRP de ..., correspondendo a um apartamento, com um valor patrimonial atribuído pela AT de €33.200,00 (trinta e três mil e duzentos euros).
Activos financeiros do “Banco ...” (com reporte a Dezembro de 2018): 1) Conta rendimento poupança nº..........020; e
2) Conta a prazo nº..........061.

2.
Inconformado com tal decisão veio o Ministério Público interpor o presente recurso, que após dedução da motivação, culmina com as seguintes conclusões e petitório (transcrição):
1- Por decisão proferida nos autos em 28-05-2021 julgaram-se totalmente procedentes, por provadas, as oposições deduzidas pelos arguidos/requeridos M. F., “X- Consulting, SA” e A. L., e, em consequência, ordenar o levantamento dos arrestos decretado relativamente a estes.
2- Para o efeito, considerou-se na douta decisão recorrida, que não existe, no caso concreto, relativamente aos requeridos M. F., “X – Consulting, S.A” e A. L., periculim in mora, requisito para o decretamento do arresto.
3-Tendo sido possível apurar e quantificar as vantagens resultantes da prática dos crimes imputados aos arguidos/requeridos e não existindo possibilidade da sua apropriação em espécie, na medida em que constituem montantes pecuniários que os arguidos foram integrando na sua esfera patrimonial, em conjunto com outros montantes de origem lícita e de que foram dispondo, foi pedida, na acusação, a condenação dos arguidos em pagamento ao Estado do valor corresponde a essas vantagens, ao abrigo do disposto no art. 110.º, n.º1, al.b) e n.º4, do Código Penal.
4- Considera a douta decisão recorrida que a aplicação do arresto previsto no art. 228.º do C.P.P. está sujeita aos requisitos específicos - fumus boni iuris e periculum in mora, admitindo a verificação, no caso sub iudice, do primeiro desses requisitos específicos -fumus boni iuris- e considerando não se encontrar verificado o periculum in mora.
5- Por terem sido considerados verificados todos os requisitos de que dependia o decretamento dos arrestos contra os requeridos M. F., “X” e A. L., incluindo o periculum in mora, em 25 de Julho de 2019 (cfr. fls. 52-123, referência 3873877), foi decretado o arresto relativamente ao arguido/requerido A. L. e, em 19 de Março de 2020 (cfr. fls. 267-312, referência 4122347), o arresto de bens dos requeridos/arguidos “X” e M. F..
6-O decretamento do arresto visou acautelar a perda a favor do Estado das vantagens patrimoniais obtidas com a prática dos ilícitos penais que são imputados na acusação deduzida no processo principal, contra os arguidos M. F., “X” e A. L., nos valores respectivos de 141.302,54€, 1.392.455,09€ e 1.817. 954,88 €.
7-Deduzida oposição pelos requeridos, considerou, porém agora, o M.mo. juiz a quo, pelas razões que exarou na douta decisão recorrida e as quais, salvo o devido respeito que muito é, não podemos sufragar, que assim não é, ou seja, que não se encontra verificado o periculum in mora.
8-Antes de mais, há que atender aos valores protegidos com o confisco das vantagens do crime.
9- Há que atentar que o Estado não reclama dos requeridos um crédito civil.
O que está em causa é o confisco das vantagens da prática de um crime, ou mais precisamente, de uma conduta ilícita e típica.
10- Assim, o confisco das vantagens da prática de crime tem uma finalidade preventiva, no sentido de que «o “crime” não compensa», tanto sobre o agente do ilícito-típico (prevenção especial ou individual), como sobre a sociedade no seu todo (prevenção geral), com reflexos ao nível da prevenção geral positiva ou de integração ao nível do reforço da vigência da norma violada.
11- Não pode pois, considerar-se que o arresto preventivo visa assegurar uma mera pretensão cautelar relativa ao recebimento de um “crédito”, ainda mais quando está em causa o único mecanismo eficaz e de dissuasão da criminalidade que visa o lucro, como é o caso dos ilícitos suficientemente indiciados nos presentes autos.
12- Acresce que, para além destas finalidades preventivas, o confisco tem ainda subjacente a necessidade de restauração da ordem patrimonial dos bens correspondente ao direito vigente, ou seja, a reposição da situação patrimonial do agente do crime no estado em que se encontrava antes do seu cometimento.
13- O confisco das vantagens não constitui um mecanismo eventual ou facultativo de assegurar as finalidades que lhe estão subjacentes.
14- O legislador nacional estabeleceu o confisco das vantagens como uma medida obrigatória, subtraída a qualquer critério de oportunidade, e que ocorrerá sempre, por imperativo legal, que com a prática do crime tenham sido gerados benefícios económicos.
15- No caso dos presentes autos, não se trata pois, da mera garantia de um crédito do Estado, mas antes da reposição dos arguidos/requeridos na situação patrimonial em que se encontravam, antes da prática dos factos ilícitos típicos de que se encontram acusados e logo, na entrega a favor do Estado das quantias por si assim obtidas ilegitimamente.
16- Para assegurar que assim vem efectivamente a suceder, foi pois, decretado o arresto de bens dos arguidos, ao abrigo do disposto no art. 228.º do C.P.P.
17- E não se tratando de garantir um “crédito” (ex. a título de custas e, ou indemnizações) do Estado, mas antes do confisco de vantagens ilícitas decorrentes da prática de crime, não é exigível para aplicação do arresto a demonstração do “periculum in mora” ou seja, do receio de perda da garantia patrimonial.
18- Se o MP demonstrar, como demonstrou neste caso, que existem fortes indícios da prática de um crime e demonstrar igualmente que esse crime gerou vantagens, não será de todo compreensível que se exija a demonstração que os arguidos se preparam para dissipar esse património para que o Estado possa assegurar que esse montante, que não lhes pertence, será a final confiscado.
19- O que se exige como pressuposto da aplicação do arresto nestes casos são os indícios da prática do facto ilícito e do valor por este gerado, não os perigos de dissipação.
20- O crime não é título aquisitivo da propriedade, e o arguido não pode dispor (ainda que temporariamente) desse incremento patrimonial, ainda que não tenha intenção de o dissipar. Isto significa que o arguido pode até ter vontade de não alienar um cêntimo do valor que obteve com a prática do crime, e pode até nunca ter praticado ou se prepare para praticar qualquer acto que indicie que pretende dissipar esse património, mas mesmo nesses casos deverão as vantagens do crime ou o seu valor ser arrestados, impedindo-se de imediato o arguido de a gozar. É apenas condição para tal que se demonstre a existência de fortes indícios do crime, e de que esse crimegerou vantagens (presumidas ou demonstradas).
21- Porém, ainda que assim se não entenda e sem prescindir, mesmo que a demonstração do periculum in mora fosse exigível, sempre neste caso este pressuposto estaria verificado.
22- De harmonia com o disposto no art.228.º do C.P.P., este perigo concretiza-se por referência ao “fundado receio enunciado de que faltem ou diminuam substancialmente as garantias de pagamento (…)”, tal como previsto no art. 227º, n.º 1, do mesmo diploma legal.
23- Importa a este respeito ter presente que o periculum in mora, (cuja demonstração é inclusivamente dispensada nos casos de criminalidade organizada nos termos do art. 10º, da Lei 5/2002, de 11-01, sempre que existam fortes indícios da prática do crime), para efeitos de decretamento do arresto nos termos do art. 228º, do Código de Processo, existe sempre quando há uma diminuição das garantias de pagamento, como sucede quando é alienado património imobiliário, que, pela sua natureza, oferece maior probabilidade de ser apreendido para pagamento da dívida, do que as correspondentes contrapartidas monetárias, de fácil disseminação e diluição.
24-Sucede ainda que, não são só justificativas da medida cautelar de arresto as atitudes predeterminada, intencionais, dolosas, por parte do devedor, no sentido de frustrar a realização do crédito, nomeadamente alienando ou dissipando bens do seu património, a fim de os subtrair à acção do credor, podendo haver circunstancias que, pese embora sem essa pré-intencionalidade, façam perspectivar o perigo de se tornar inviável ou altamente precária essa realização, sendo passíveis de conduzir ao decretamento de arresto.
25-É o caso, por exemplo, quando o requerido vende o único imóvel de que proprietário, porque prefere passar a viver em casa arrendada, usando a contrapartida obtida para a despender em viagens.
26-Ora, neste caso, pese embora a alienação não tenha o objectivo de obstar à garantia da recuperação das vantagens ilícitas, não se pode deixar de considerar evidente a existência de periculum in mora, justificando-se pois, o decretamento de arresto.

No que concerne ao requerido M. F.:
27-Considera-se na douta decisão recorrida que:
- resultou da prova produzida em sede do julgamento da oposição ao arresto por este deduzida que, pese embora a realização de buscas na sociedade “Y, Lda.”, dia 26 de Fevereiro de 2015, o requerido M. F. não previu a possibilidade de ser constituído arguido, nem de vir a ser acusado, na medida em que ficou convencido que os documentos que eram procurados respeitavam a um projecto que não estava relacionado com tais sociedades;
-Aliás, o prédio sito na Rua ..., nº .. – Porto, foi adquirido em 17 de Dezembro de 2015, pelo valor de €40.000,00 (quarenta mil euros), ou seja, cerca de 10 (dez) meses após as buscas efectuadas nas sociedades supra identificadas, pelo que aquele M. F., em lugar de delapidar o respectivo património, adquiriu mais património.
28-O certo é que, pese embora a data da referida aquisição, o arguido não manteve esse prédio no seu património, uma vez que, logo em 26 de Fevereiro de2018, procedeu à venda do mesmo.
29- Também é certo que, o arguido não manteve a correspondente contrapartida na sua posse, o que significa que, diminuiu substancialmente as garantias de pagamento da vantagem patrimonial por si ilegitimamente obtida com a prática dos crimes que lhe são imputados na acusação e, ainda que tenha entregue parte desta, a título de sinal e de pagamento parcial para aquisição de um novo imóvel, que não chegou a concretizar-se, por causa que não lhe é imputável, tal não invalida a existência de periculum in mora.
30-Com efeito, não se pode olvidar que o imóvel alienado pelo arguido (sito na Rua ..., nº.. – Porto), era o único sobre o qual era proprietário único uma vez que aquele que foi objecto de arresto lhe pertence apenas na proporção de 1/3- existência de periculum in mora.
31-Na senda do acima referido, ainda que neste caso, a referida alienação possa não ter tido como objectivo obstar à garantia da recuperação das vantagens ilícitas, não se pode deixar de considerar evidente a existência de periculum in mora, face à diminuição da garantia do confisco, justificando-se pois, o decretamento de arresto.
32-Mais sucede que, salvo o devido respeito, que muito é, neste ponto, a douta decisão recorrida padece de contradição na sua fundamentação: por um lado considera que, aquando da realização das buscas, o requerido não teve um conhecimento efectivo do âmbito do processo, devido à vaguidade do despacho respectivo, por outro, considera, em abono da tese defendida, de inexistência de periculum in mora que, apesar do conhecimento da pendência da investigação, o que sucedeu aquando da realização das buscas, ainda assim, o requerido aumentou o seu património através da aquisição do prédio Rua ..., nº .. – Porto.
33-Acresce que o valor dos bens arrestados é manifestamente inferior ao valor da vantagem ilegítima obtida com a prática dos crimes imputados ao requerido, de 141.302,54 €, cujo pagamento o arresto decretado visava acautelar, sendo manifestamente insuficiente para tal os rendimentos declarados pelo requerido em sede de IRS (cfr. doc. 7 junto com a oposição).

No que concerne à requerida “X”:
34- Considera-se na douta decisão recorrida ter-se apurado que:
-a sociedade requerida já pretendia vender o imóvel acima identificado (n.º .., da Rua ...) – loja que, pelo menos desde 2008, não era utilizada-, desde Janeiro de 2009, data em que celebrou um “Contrato de Mediação Imobiliária” com uma mediadora imobiliária, pelo target price de €60.000,00;
- que, as sucessivas tentativas de venda se frustraram, tendo culminado com a sua venda, em 19 de Abril de 2018, pelo preço de €30.000,00, o que representou um revés na situação patrimonial da X”, pois acabou por se realizar por valor inferior ao seu valor real;
- que esta decisão de venda, iniciada bastante tempo antes da instauração do presente processo crime, foi devidamente justificada, visando obstar a que o imóvel se mantivesse indefinidamente na possa da sociedade “X”, correndo o risco de se desvalorizar ainda mais, por se encontrar devoluto, sendo certo que o produto da venda foi mantido na posse da sociedade, já que, a 30 de Junho de 2018, integrou um depósito a prazo no Banco ....
35-Não obstante, se é certo que da prova produzida resultou que já era intenção da “X”, através do seu representante legal, a venda do imóvel em questão, desde 2009, também é certo que se apurou igualmente que este não for anteriormente vendido, porque o valor das ofertas obtidas eram inferiores ao seu valor real.
36-Ora, não se compreende pois, à luz das regras de experiência comum, a urgência súbita na venda, que teve lugar em 19 de Abril de 2018 (após a data da constituição como arguida da sociedade “X”), quando o valor obtido nessa data continuava a ser manifestamente inferior (metade) ao valor inicialmente peticionado (€60.000,00). O que é certo é que, desta venda resultou uma diminuição das garantias do confisco.
37- O facto de ter havido movimentações bancárias (as descritas no ponto 43 da oposição e seus subpontos e no ponto b) da decisão recorrida), não invalida o resgate que foi efectuado e bem assim, o facto de em 31 Dezembro 2018 existirem contas de depósito a prazo ou título nos Banco ... ( fls. 142, 172 a 178 anexo B).
38-Aliás o extracto bancário de 30.06.2018, junto como doc. 10 da Oposição, apenas prova que, nessa data, aí existia o saldo bancário aí reflectido e nada mais, designadamente, que destino lhe foi dado.
39-Por outro lado, no que concerne ao activo sedeado no Banco ...- depósito a prazo a 15 dias n.º …….032, constituído em 31.12.2017, valor 57.000,00€, é a própria requerente que diz no ponto 51 da aposição que a mesma foi usada no normal giro da sociedade “X”, confirmando aqui a volatilidade das quantias em dinheiro e a sua fácil dissipação/disseminação sem deixar rasto.
40-Resulta assim evidente que, com a venda do imóvel em questão, a requerida diminuiu substancialmente (não se pode olvidar que esse imóvel era o único de que era proprietária), as garantias de pagamento da vantagem patrimonial por si ilegitimamente obtida com a prática dos crimes que lhe são imputados na acusação e, ainda que a tenha recebido a correspondente contrapartida, e até a tenha mantido, pelo menos até determinada altura (30.06.2018), na sua posse, não invalida a existência de periculum in mora, já que esta, pela sua natureza é, como foi, de fácil dissipação/disseminação e ainda que tenha sido utlizada “no normal giro da sociedade”.
41-O art. 49.º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro, com a epígrafe “ Arresto preventivo” não tem aplicação, uma vez que esse mecanismo visa acautelar o pagamento de uma sanção penal e no presente caso, o que se pretende acautelar é o confisco da vantagem ilegítima obtida com a prática dos crimes suficientemente indiciados nos autos como tendo sido cometidos, com a natureza e objectivos já acima enunciados. Para garantia do confisco das vantagens decorrentes da prática de crimes, ainda que elencados nesse diploma, tem aplicação a lei geral, ou seja, o arresto previsto no art. 228.º do C.P.P.
42-Assim, os actos praticados pela requerida denotam a existência de periculum in mora e justificam, como justificaram, o decretamento do arresto, justificando agora a sua manutenção.
43-A tal não obsta, o facto de terem sido arrestados activos financeiros da titularidade da X, no “Banco ...”, no valor de €425.902,06.
44-Com efeito, esse valor é manifestamente inferior ao valor da vantagem ilegítima obtida cuja perda se pretende acautelar (1.392.455,09 €).
45- A diminuição das garantias do confisco, constitui apenas um dos fundamentos que podem ser invocados no momento de avaliar a existência do fundado receio. Quando as garantias faltem (cf. art. 227º, n.º 1) nomeadamente porque o valor a acautelar é incomparavelmente superior ao valor do património identificado e que poderá ser arrestado, estará então automaticamente demonstrado o periculum in mora e consequentemente legitimado o decretamento do arresto.
46-O facto de a “X”, no dia 29 de Maio de 2019, ou seja, já depois das buscas e da acusação pública ter visto o seu capital social aumentado, não impõe conclusão contrária.
47-Com efeito, o capital social não é o mesmo que património social: este é um conjunto de bens (dinheiro e outros), aquele apenas uma cifra, ou seja, uma expressão numérica de uma quantia, um valor contabilístico, que representa a soma dos valores das entradas dos sócios, não sendo aquele susceptível de penhora, nem susceptível de oneração.
48-Assim, tendo em conta a natureza do capital social (insusceptível de penhora ou de oneração), não faz sentido dizer-se, que, pelo simples facto de ter havido um aumento do capital social da “X”, em data posterior quer à realização das buscas, quer à constituição de arguida da sociedade (19.04.2017- fls. 10270), quer à dedução da acusação, o Estado viu aumentada a garantia de pagamento do valor que vier a ser declarado perdido a favor do Estado, ao abrigo do art. 110.º, do Código Penal, correspondente à vantagem ilegítima obtida pela “X” com a prática dos crimes de que se encontra acusada.
49-Sucede ainda que, neste ponto, a douta decisão recorrida padece de contradição na sua fundamentação: por um lado considera que, aquando da realização das buscas, a “X”, através do seu representante legal, não teve um conhecimento efectivo do âmbito do processo, devido à vaguidade do despacho respectivo, por outro considera, em abono da tese ai defendida, de inexistência de periculum in mora que, apesar do conhecimento da pendência da investigação, o que sucedeu aquando das buscas, ainda assim, foi aumentado o seu capital social.

No que concerne ao requerido A. L.:
50-Considerou-se na douta decisão recorrida que:
- a venda dos prédios referidos, teve a correspondente contrapartida para o arguido, não tendo resultado indiciado que a sua actuação nesses negócios tivesse como desiderato a dissipação do respectivo património;
-para além disso, as diligências de venda relativas ao prédio do imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o art. 576, descrito sob o n.º 614 da CRP de ..., freguesia de ..., iniciaram-se antes de 25 de Julho de 2016, ou seja, antes do arguido/requerido ter sido constituído arguido e ter sido proferida a acusação;
-quanto ao prédio inscrito na matriz predial urbana sob o art. …, descrito sob o n.º …, da CRP da ..., freguesia de ..., ficou demonstrado que a decisão de venda foi tomada aquando da separação de facto do casal, constituído pelo arguido e por V. L., em 2014, ou seja, em data anterior a terem sido realizadas buscas à sociedade “X”.
51-Ora, na senda do que vem sendo referido, para a verificação de periculum in mora, basta que exista uma diminuição das garantias do confisco, o que sucedeu no caso em apreço.
52-Efectivamente, pese embora até se possa dar por boa a explicação apresentada pelo requerido, no sentido de que a venda do imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o art. ..., descrito sob o n.º … da CRP da ..., freguesia de ..., com o valor patrimonial de 94.756,05€, (fls. 283, Anexo teve lugar no quadro do cumprimento do acordo para partilha de bens do casal, no âmbito do processo de separação, divórcio e partilha entre o arguido e ex-cônjuge V. L., que se iniciou em 13.06.2014, ou seja, antes da realização da busca à CH, em 26.02.2015, segundo o qual a ex-cônjuge do arguido ficaria com vários imóveis, sendo da responsabilidade do arguido liquidar os respectivos empréstimos bancários e remover os avais de V. L., tendo o arguido vendido imóvel em questão para amortizar os empréstimos em causa, pese embora ter diminuindo o passivo, desonerou a sua ex-cônjuge da sua co-responsabilidade, logo, agravou a sua situação patrimonial e diminuiu as garantias do confisco.
53-Da mesma forma, como já se referiu, não é necessário, que as actuações de alienação de património sejam praticadas com o desiderato de dissipação do património a fim de se frustrar o confisco, bastando que das mesmas resulte, efectivamente, esse perigo, como é o caso dos autos.
54-Conclusão idêntica cumpre retirar quanto aos resgates dos activos financeiros. Com efeito, pese embora, da mesma forma, se aceite por boa a explicação apresentada pelo requerido no sentido de que visaram fazer face às despesas correntes com a amortização dos referidos empréstimos, no âmbito do acordo de partilha, o certo é que daí resultou, conforme se disse e nos termos acima descritos, um agravamento do património do requerido e logo, uma diminuição da garantia do confisco.
55-Quanto ao prédio inscrito na matriz predial urbana sob o art. …, descrito sob o n.º … da CRP de ..., freguesia de ..., também em abono da inexistência de periculum in mora, considerou a douta decisão recorrida que as diligências para a sua venda já se haviam iniciado antes de 25 de Julho de 2016, data em que apenas haviam sido realizadas as buscas às instalações da “X”, tendo sido estabelecido o target price de € 20.000,00 e que, tal venda apenas se veio a concretizar em 19.12.2018, pelo valor de € 13.000,00, por não ter sido obtida, até então, melhor oferta.
56-Não obstante, se é certo que da prova produzida resultou que já era intenção do requerido, a venda do imóvel em questão, desde data anterior a 25 de Julho de 2016, também é certo que nunca este foi anteriormente vendido, porque o valor das ofertas obtidas eram inferiores ao seu valor real.
57-Não se compreende pois, à luz das regras de experiência comum, a urgência súbita na venda, que teve lugar em 19 de Dezembro de 2018 (após a data da notificação do arguido da acusação deduzida no processo principal), quando o valor obtido nessa data continuava a ser manifestamente inferior do valor inicialmente peticionado (€20.000,00). O que é certo é que, desta venda resultou igualmente, uma diminuição das garantias do confisco.
58-O facto de a “X”, no dia 29 de Maio de 2019, ou seja, já depois das buscas e da dedução e notificação da acusação pública ter visto o seu capital social aumentado, tendo, por via desse facto, segundo a decisão recorrida, o requerido aumentado o seu acervo patrimonial, não impõe conclusão contrária.
59- Na verdade, o valor patrimonial líquido equivalente ao capital social não pode ser reduzido discricionariamente pela própria sociedade, não podendo ser distribuído pelos sócios, nem a sociedade pode subsistir se extinguir esse capital social.
60-Assim, não pode pois dizer-se que, por força deste reforço do capital social, o Estado viu aumentadas as garantias do confisco, das vantagens ilegítimas obtidas pelo arguido/requerido com a prática dos crimes que lhe estão imputados.
61-Sucede ainda que, nesta parte, a douta decisão recorrida padece de contradição na sua fundamentação: por um lado considera que, aquando da realização das buscas, o arguido/requerido, não teve um conhecimento efectivo do âmbito do processo, devido à vaguidade do despacho respectivo, por outro considera, em abono da tese ai defendida, de inexistência de periculum in mora que, apesar do conhecimento da pendência da investigação, o que sucedeu aquando das buscas, ainda assim, o requerido aumentou o capital da sociedade “X”.
62-Sem prescindir, no que concerne à aquisição, em 4 de Junho de 2019, do direito de superfície sob o imóvel descrito sob o art. … da matriz predial, freguesia de ..., Coimbra, registado sob o art. … da mesma freguesia na CRP de …, correspondendo a um apartamento adquirido em compropriedade com N. P., que, aliás, veio a ser arrestado (verba 3 do arresto, fls. 120), tratando-se da aquisição de um mero direito de superfície, tal não é suficiente, pela sua natureza e valor, para suportar a conclusão pretendida pelo requerido, ou seja de que se encontrava antes num processo de aumento do seu património.
63- Também a aquisição, em 31/03/2016, do imóvel que constitui a actual residência do requerido, inscrito sob o art. …, da matriz predial urbana, da União de freguesias de ... e ..., concelho de Coimbra, registado sob o n.º … da CRP de …, que também foi alvo de arresto, não permite concluir que o requerido se encontrava num processo de aumento do seu património.
64-Na verdade, esta aquisição teve lugar antes de se iniciarem as vendas dos imóveis em causa, ou seja, antes do início do processo de dissipação de bens: em 19.12.2018 vende o imóvel aque corresponde o art. …, em 09.01.2019 o imóvel aquecorresponde o art. ..., em 31.12.2018 salda as contas, ou seja, datas muito próximas entre si, o que justamente fez recear que outros actos se seguissem de idêntica natureza, denotando assim a existência de periculum in mora.
65-Aliás, para que se considere verificado o periculum in mora, não é necessário (nem conveniente) que se alienem todos os bens, sendo que é precisamente isso que se visa acautelar com o arresto, pois se assim fosse, nada haveria pois para arrestar.
66-A tal não obsta, o valor dos bens arestados ao requerido. Aliás, o valor destes é inferior ao valor da vantagem ilegítima obtida, cuja perda se pretende acautelar (1.817.954,88 €).
67-Destarte, por tudo o que vem de se dizer, deverá a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue improcedentes as oposições deduzidas pelos requeridos M. F., “X Consulting, SA” e A. L. e mantenha os arrestos decretados quanto a estes (…)».

3.
Os arguidos/requeridos vieram responder ao recurso, pugnando pela manutenção do decidido.

4.
Neste Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

5.
Cumprido o disposto no artigo 417º, nº2, não foi presentada qualquer resposta.

6.
Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência, por o recurso dever ser ai julgado, de harmonia com o preceituado no art.419º,nº3, al.b), do mesmo código.

Cumpre decidir.

II. Fundamentação

Como é consensual, quer na doutrina quer na jurisprudência, são as conclusões extraídas pelo recorrente da motivação, sintetizando as razões do pedido, que definem e determinam o âmbito do recurso e os seus fundamentos, delimitando para o tribunal superior as questões a decidir e as razões por que devem ser decididas em determinado sentido, sem prejuízo do conhecimento oficioso de certos vícios e nulidades, ainda que não invocados ou arguidas pelos sujeitos processuais.
Posto isto, atentas as conclusões apresentadas pelo recorrente e não tendo a matéria de facto apurado sido objeto de impugnação, a questão a decidir passa apenas por saber se em face da factualidade apurada, está ou não verificado o requisito do justo receio de perda da garantia patrimonial para que seja mantido o arresto relativamente aos bens supra identificados dos requeridos M. F., A. L. e X – CONSULTING, SA.
Ora, os arrestos em causa foram decretados nos termos do disposto no artigo 228.º do Código de Processo Penal, enquanto mecanismos de garantia patrimonial que operam no âmbito da denominada perda clássica, isto é, para garantir a eventual condenação dos arguidos no pagamento ao Estado do valor correspondente às vantagens resultantes dos crimes que lhes foram imputados - artigo 110.º, nºs 1, b) e 4 do Código Penal.
O confisco/perda clássica previsto neste diploma visa assim a declaração de perda dos instrumentos, produtos e vantagens de facto ilícito típico (todas as coisas, direitos ou vantagens que constituam vantagem económica, direta ou indiretamente resultante desse facto, para o agente ou para outem) – art110º, C.Penal (João Conde Correia, Da proibição do confisco à perda alargada, 2012, INCM, pág.66).
De acordo com a decisão recorrida, as oposições dos requeridos M. F., “X” e A. L. foram julgadas procedentes, com o consequente levantamento do arresto dos respetivos bens, porquanto se entendeu não ter o Ministério Público, requerente do arresto, demonstrado o receio de perda da garantia patrimonial.
Defende o recorrente que não se tratando de garantir um “crédito” do Estado (ex.a título de custas e, ou indemnizações), mas antes do confisco de vantagens ilícitas decorrentes da prática do crime, não é exigível para a aplicação do arresto a demonstração do periculum in mora, ou seja, do receio de perda da garantia patrimonial.
Assim, porque o arresto visa o pagamento do valor das vantagens, ou seja, a restauração da ordem patrimonial correspondente ao direito legítimo, pugna no sentido de que tendo demonstrado, como demonstrou neste caso, que existem fortes indícios da prática de um crime e demonstrou igualmente que esse crime gerou vantagens, não será de todo compreensível que se exija a demonstração que os arguidos se preparam para dissipar esse património para que o Estado possa assegurar que esse montante, que não lhes pertence, será a final confiscado.
Este entendimento, no sentido de que não é exigível para o decretamento do arresto a demonstração do mencionado perigo quando o arresto vise o pagamento das vantagens, ou seja a restauração da ordem patrimonial correspondente ao direito legítimo - que tem sido perfilhado, nomeadamente por Hélio Rigor Rodrigues, O confisco das vantagens do crime: entre os direitos dos homens e os deveres dos estados a jurisprudência do TEDH em matéria de confisco, in O Novo Regime de Recuperação de Ativos, INCM, 2018, pág. 81- não foi o acolhido pelo legislador que consagrou solução normativa diversa e que por isso importa respeitar.
Também quanto à alegação que o crime não é título aquisitivo da propriedade e que o arguido não pode dispor (ainda que temporariamente), desse incremento patrimonial, ainda que não tenha intenção de o dissipar, sem necessidade de quaisquer outras considerações, caberá apenas lembrar ao recorrente que os bens imóveis e valores arrestados são lícitos, em relação aos quais foi decretado o arresto para garantia do eventual confisco de valores, esses sim produto de eventuais atividades delituosas.
Em suma, feito este parêntesis, importa então assentar que impende sobre o requerente do arresto, no caso o Ministério Público, tendo em vista a garantia do confisco/perda clássica, o ónus de alegar e provar o periculum in mora.
O artigo 228.º, n.º 1 do Código de Processo Penal preceitua que «a requerimento do Ministério Público ou do lesado, pode o juiz decretar o arresto, nos termos da lei do processo civil.».
Como já se pronunciou o Tribunal Constitucional “(…) os requisitos de que depende o decretamento do arresto, também em processo penal por força da remissão consignada no art.º 228º, n.º 1, do CPP, respeitam tão só à aparência do direito de crédito e ao perigo da dissipação do património (cfr. artºs 391º e 392º, do CPC)” – Ac. do T. C. n.º 724/2014, de 28/10/2014.
Os fundamentos do arresto são, pois, os do artigo 391.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, de acordo com o qual «o credor que tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor.».
E cabe ao requerente alegar e provar factos que tornem provável a existência do crédito e justificam o receio invocado, relacionando os bens que devem ser apreendidos, nos termos do artigo 392.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
Assim, como já referimos, uma vez que o arresto foi requerido e decretado ao abrigo do disposto no 228.º do Código de Processo Penal, impende sobre o Ministério Público o ónus de alegar e provar o periculum in mora, salvo se tiver sido previamente fixada e não prestada caução económica, caso em que fica dispensado dessa prova.
O arresto é um procedimento cautelar que visa combater o “periculum in mora”, isto é, o prejuízo decorrente da demora do processo judicial normal e traduz-se numa apreensão judicial de bem tendente à garantia de um crédito, colocando-o na indisponibilidade do seu titular.
Por isso o decretamento do arresto preventivo depende da probabilidade da existência do crédito e do justo receio de que o devedor inutilize, oculte, se desfaça dos seus bens que em princípio integram a garantia do credor.

Constituem, assim, requisitos para o decretamento do arresto:
- a probabilidade de existência de um crédito do requerente;
- o justo receio ou perigo de insatisfação desse direito de crédito

No caso em apreço, quanto à existência do direito de crédito, atentos os factos alegados pelo Ministério Público, concretamente por referência para a acusação, está demonstrada a probabilidade da existência de um crédito por parte do Estado em relação aos arguidos, traduzido nas vantagens obtidas por aqueles com a alegada prática dos crimes pelos quais foram acusados e posteriormente pronunciados.
Está igualmente indiciado que o Estado é lesado, no montante alegado pelo Ministério Público, na medida em que as referidas vantagens poderão vir a ser declaradas perdidas para o Estado.
Importa, agora, analisar a existência de fundado receio de perda da garantia patrimonial.
Para que se verifique o justo receio de perda da garantia patrimonial é necessário que se aleguem e provem factos concretos, objetivos, que demonstrem que o alegado receio é objetivamente fundado.
Embora não seja necessária a certeza de que a perda da garantia se torne efetiva mas apenas que haja um receio justificado de que tal virá a ocorrer, não basta qualquer receio, sendo necessário, no dizer da própria lei, que o receio seja justificado.
Significa isto que o requerente tem de alegar e provar factos concretos que o revelem à luz de uma prudente apreciação, não bastando o receio subjetivo, fundado em simples conjeturas, antes devendo basear-se “...em factos ou em circunstâncias que, de acordo com as regras de experiência, aconselhem uma decisão cautelar imediata como factor potenciador da eficácia da acção declarativa ou executiva.” - cfr. Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, IV vol., 2ª ed., pág. 187.
A este propósito, refere também Jacinto Rodrigues Bastos (Notas ao Código de Processo Civil, Vol.II, pág.191), que o receio do credor, para ser considerado justo, deve assentar em factos concretos, que se revelem à luz de uma prudente apreciação; não basta o receio subjetivo, porventura exagerado, de ver insatisfeita a prestação a que tem direito.
O justo receio de perda da garantia patrimonial ocorre sempre que o devedor adote, ou tenha o propósito de adotar, conduta, indiciada por factos concretos, relativamente ao seu património que, razoavelmente, interpretados inculquem a suspeita de que se prepara para subtrair os seus bens à ação dos credores - cfr. Alberto dos Reis, CPC Anotado, vol. II, págs. 19 e segs. e Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, vol. II, pág. 268.
Tendo presente então o que deve entender-se por justo receio de garantia patrimonial, também não podemos concordar com o recorrente quando defende que o periculum im mora, de acordo com o citado artigo 228º, concretiza-se por referência “ao fundado receio de que faltem ou diminuam substancialmente as garantias de pagamento (…)”, tal como previsto no artigo 227º, nº1, do mesmo diploma legal.
Tal não foi, porém, a intenção do legislador, pois, se assim fosse, certamente que teria feito constar tal remissão no citado artigo 228º, ao invés de consagrar expressamente que o arresto é decretado nos termos da lei do processo civil.
Para além de tal consagração expressa teve ainda o cuidado de fazer constar as exceções que entendeu dever fazer em relação a esse regime, como é o caso da situação prevista na parte final do nº1, do artigo 228, do C.P.P., em que o legislador presume que a não prestação da caução, só por si, consubstancia o “fundado receio da perda da garantia patrimonial” ou a situação prevista no nº2, com a admissibilidade do arresto preventivo em relação ao comerciante.
Por conseguinte, o critério para avaliar o justo receio de perda da garantia patrimonial deve ser ponderado caso a caso, a partir de factos objetivos e concretos que denotem o perigo de se tornar mais difícil ou impossível a cobrança do crédito.
O requerente do arresto terá assim de materializar os concretos comportamentos realizados pelo devedor em face dos quais o tribunal possa retirar a conclusão de que com os mesmos aquele está a dissipar o património, a desviar ou desfazer-se dos ativos, de molde a tornar bem mais difícil ou mesmo de todo impossível a cobrança de créditos.
Como se referiu no Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, de 17/1/2009, proferido no âmbito do processo 390/08.7 TBSRT.C1 “ (…) poder-se-á dizer que a fim de indagar sobre o preenchimento, ou não, do requisito geral do “justificado receio de perda de garantia patrimonial”, haverá que atender, designadamente, à forma da actividade do devedor, à sua situação económica e financeira, à sua maior ou menor solvabilidade, à natureza do seu património, à dissipação ou extravio que faça dos seus bens (quer se tenha já iniciado, quer existam sérios indícios de que o pretende fazer em breve), à ocorrência de procedimentos anómalos que revelem o propósito de não cumprir a obrigação, ao montante do crédito que está em causa, e, por fim, à própria relação negocial estabelecida entre as partes”.
Feitas estas considerações, importa agora analisar os concretos comportamentos imputados aos requeridos em ordem a apurar, à luz da factualidade supra enunciada, se os mesmos inculcam o justo receio de perda de garantia patrimonial.
Começando pelo arguido/requerido M. F., em causa está a venda de um imóvel/fração autónoma, no dia 26 de fevereiro de 2018, a qual o requerente considera constituir um ato de dissipação do património que põe em causa o crédito do Estado no montante de 141.302,54 €.
Segundo o recorrente, pese embora este imóvel tenha sido adquirido dez meses após as buscas, o certo é que o requerido não manteve esse prédio no seu património, uma vez que logo em 26 de fevereiro de 2018 procedeu à venda do mesmo.
Por outro lado, o requerido não manteve a correspondente contrapartida na sua posse, o que significa que diminuiu substancialmente as garantias de pagamento da vantagem patrimonial por si ilegitimamente obtida com a prática dos crimes.
Ainda que tenha entregue parte desta contrapartida a título de sinal e principio de pagamento parcial para aquisição de um novo imóvel que não chegou a concretizar-se, por causa que não lhe é imputável, tal não invalida a existência de periculum in mora.
O imóvel alienado era o único sobre o qual era proprietário único, uma vez que aquele que foi objeto de arresto apenas lhe pertence apenas na proporção de 1/3.
Por fim, considera ainda o recorrente que mesmo a admitir-se que tal alienação possa não ter tido como objetivo obstar à garantia da recuperação das vantagens, o periculum in mora é evidente, face à diminuição da garantia de pagamento, justificando-se o decretamento do arresto.
Pese embora as evidências do recorrente, não vislumbramos na sua alegação (conclusiva) a demonstração do justo receio da perda da garantia patrimonial.
Se bem percebemos o seu raciocínio, sempre que haja alienação do património imobiliário ter-se-à de considerar verificado o periculum in mora, atenta a diminuição dai decorrente das garantias de pagamento, independentemente do intuito com que tal disposição patrimonial foi feita e do seu reflexo no património do devedor.
Aliás, chegando mesmo admitir que a alienação em causa possa não ter tido como objetivo obstar à garantia da recuperação das vantagens ilícitas, acaba por concluir pela verificação do mencionado perigo com o único argumento da alienação em causa configurar uma diminuição da garantia de pagamento, tanto mais que se trata do único imóvel em que é proprietário exclusivo.
Salvo o devido respeito, não assiste qualquer razão ao recorrente.
Como já referimos, o receio de perda da garantia patrimonial não se concretiza por referência ao fundado receio a que se refere o invocado artigo 227º - desde que faltem ou diminuam substancialmente as garantias de pagamento.
Ademais, não estando o requerente do arresto, ora recorrente, ao contrário do que vem pugnar no presente recurso, dispensado de alegar e demonstrar o denominado “periculum in mora”, mesmo no caso de confisco das vantagens, certo é que os contornos que rodearam o ato de alienação em causa e com base no qual o requerente do arresto sustenta o justo receio de perda de garantia patrimonial, não permitem inferir, de modo algum, que o requerido M. F. se preparava para o subtrair à ação dos credores, no caso o Estado.
Ainda que se reconheça ser considerável o valor da vantagem ilegitimamente obtida cujo pagamento se pretende obter com o arresto, certo é que não permite inferir o “periculum in mora” e justificar o decretamento do arresto.
Ou seja, ainda que suscetível de fazer o credor recear ser difícil ou mesmo impossível a cobrança do crédito, não consubstancia um receio justo, o qual, como salientamos, tem de assentar em factos concretos que revelem esse receio de perda da garantia patrimonial e não em desconfianças ou meras suspeições.
Ora, tal não ocorreu no caso concreto, como de forma clara, objetiva e perfeitamente compreensível bem explicou o Mmo Juiz na decisão recorrida, a qual não merece reparo.

Como dela resulta:
“Produzida a prova da oposição, apurou-se que o apartamento supra mencionado foi vendido pelo preço de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), sendo certo que havia sido adquirido pelo aludido M. F. no dia 17 de Dezembro de 2015, pelo valor de €40.000,00 (quarenta mil euros), mediante recurso a crédito bancário junto do “Banco ...”.
Esse apartamento era usado pelo arguido/requerido como habitação própria e, na sequência da sua venda, liquidou o referido crédito bancário (mediante o pagamento da quantia de €37.579,90 – trinta e sete mil, quinhentos e setenta e nove euros e noventa cêntimos) e depositou a quase totalidade do dinheiro remanescente (€37.200,00 – trinta e sete mil e duzentos euros), numa conta de depósitos à ordem que titulava em conjunto com P. M. (sua companheira), no “Banco ...”, com o nº.............182.
Deste valor foi constituído um depósito a prazo (conta poupança rendimento nº.............101), no dia 02 de Março de 2018, no montante de €37.200,00 (trinta e sete mil e duzentos euros), associado àquela conta de depósitos à ordem.
Depois, aplicou uma parte desse dinheiro, em concreto, €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), como sinal e princípio de pagamento de um outro imóvel que pretende adquirir, tratando-se de um prédio sito na Rua ..., nº …, da freguesia ..., do concelho do Porto (…), cujo preço é de €117.500,00 (cento e dezassete mil e quinhentos euros).
Para tanto, no dia 18 de Janeiro de 2018, celebrou com R. P. – dono do prédio em causa – um ‘Contrato Promessa de Compra e Venda’.
O negócio definitivo de compra e venda ainda não foi realizado porque o identificado prédio necessitou de obras, assumidas pelo (promitente) vendedor, sendo certo que foram concluídas em Janeiro de 2021.
O arguido/requerido M. F., para além do valor de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), também já entregou a quantia de €33.750,00 (trinta e três mil setecentos e cinquenta euros).
Entretanto foi interpelado a celebrar a competente escritura pública de compra e venda.
Este arguido/requerido tinha em vista pagar o remanescente do preço mediante o recurso ao crédito bancário junto do “BANCO ...”, desta feita pedido pela sua companheira P. M., no qual figuraria na qualidade de fiador.
Sucede que o procedimento de atribuição de crédito não foi aceite por esta instituição bancária por força do conhecimento do arresto que recai sobre a conta identificada com nº.............182, cujo saldo actual é de €25,00 (vinte e cinco euros).
Relativamente às buscas nas sociedades “W, Lda.” e “Y – Consultoria em Organização e Estratégia Empresarial, Lda., à data em que foram realizadas, ou seja, dia 26 de Fevereiro de 2015, o mencionado M. F. não previu a possibilidade de ser constituído arguido, nem de vir a ser acusado, na medida em que ficou convencido que os documentos que eram procurados respeitavam a um projecto que não estava relacionado com tais sociedades.
Do que vem de expor-se é possível constatar que o prédio sito na Rua ...,.. – Porto, foi adquirido em 17 de Dezembro de 2015, pelo valor de €40.000,00 (quarenta mil euros), ou seja, cerca de 10 (dez) meses após as buscas efectuadas nas sociedades supra identificadas, pelo que aquele M. F., em lugar de delapidar o respectivo património, adquiriu mais património.
Posteriormente, a 26 de Fevereiro de 2018, isto é, já após as referidas buscas, vendeu esse prédio por €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), o que representa um ganho de €35.000,00 (trinta e cinco mil euros) sobre o preço que havia pago pela sua compra.
Esta operação económica teve a correspondente contrapartida para o arguido/requerido, expressa no valor do preço que recebeu, havendo movimentos bancários que o atestam.
Se fosse sua intenção diminuir a garantia patrimonial do crédito dos respectivos credores, sem grande custo lograria fazer desaparecer o dinheiro ganho com aquela venda, atenta a sua fácil volatilidade.
No entanto, investiu uma parte na aquisição de um outro prédio, sito na Rua ..., nº … – Porto, pelo preço de €117.500,00 (cento e dezassete mil e quinhentos euros), documentando-a através de um escrito, denominado ‘Contrato Promessa de Compra e Venda’, datado de 18 de Janeiro de 2018, tendo já entregue um total de €58.750,00 (cinquenta e oito mil, setecentos e cinquenta euros), sendo que o negócio está estacado devido à presente providência cautelar de arresto preventivo.
Sem prejuízo de o arguido/requerido ter estado presente aquando da realização das buscas nas instalações da sociedade “W, Lda.” e “Y – Consultoria em Organização e Estratégia Empresarial, Lda., no dia 26 de Fevereiro de 2015, a verdade é que, como se viu, não tomou conhecimento concreto da factualidade que se investigava em relação a tais empresas.
O aludido M. F. apenas voltou a ter contacto com o processo aquando da sua constituição como arguido, o que ocorreu no dia 17 de Agosto de 2018, ou seja, quando já passavam mais de 3 (três) anos daquelas buscas.
Ora, fazendo apelo ao que ditam as regras da experiência corrente, aqui aplicáveis, e da normalidade do acontecer, este (considerável) intervalo temporal determinaria para qualquer homem médio – que tivesse estado presente e colaborado com as diligências de busca em questão (sem desconfiar que pudesse vir a ser constituído arguido e acusado) – que fosse levado a acreditar que o processo não teve qualquer outro desenvolvimento – em lugar de antecipar o seu envolvimento e até a prolação de uma acusação contra si, como aponta o Digno requerente.
Não desconsideramos nesta apreciação o valor do crédito que se discute (€141.302,54 – cento e quarenta e um mil, trezentos e dois euros e cinquenta e quatro cêntimos), pois que considerável.
Todavia, para que seja decretado o arresto preventivo é indispensável que o devedor/requerido tenha praticado actos ou assumido atitudes que inculquem a suspeita de que pretende subtrair os seus bens à acção dos credores.
Não basta, portanto, o receio subjectivo – que, como reconhecemos, o montante do crédito suscita –, na medida em que também se exige que seja justificado.
(…)
Neste âmbito, no caso vertente, segundo consideramos, a venda do prédio situado na Rua ...,.., no Porto, não representa um acto praticado pelo arguido/requerido M. F. com vista a dissipar o respectivo património, mas antes traduz um investimento na aquisição de um bem imóvel de maior valor, o que é configura acto normal de gestão patrimonial e não um acto anómalo.
Na verdade, da mobilização probatória não resultou indiciado que a actuação do arguido/requerido tenha sido um acto de dissipação do património, que revele, sem mais ou com forte probabilidade, a ocorrência de fraude, conluio ou simulação.
É certo que os rendimentos auferidos pelo arguido/requerido resultam do seu trabalho por conta de outrem e que os mesmos, no confronto com o crédito indiciado, podem revelar-se insuficientes.
Contudo, ainda que assim seja – o que desconhecemos (no requerimento inicial nada se diz acerca dos rendimentos auferidos pelo identificado M. F.) –, a debilidade económica do devedor, per se, não constitui motivo suficiente para justificar o arresto preventivo.
Com efeito, nos termos já expostos, é preciso alegar e demonstrar uma actuação do devedor/requerido que permita extrair a conclusão de que pretende fazer desaparecer ou ocultar os respectivos bens com vista a inviabilizar a satisfação do crédito do requerente do arresto.
Não é o que sucede com o aludido M. F., tanto mais que, como resultou apurado, o imóvel arrestado, que pertenceu aos seus progenitores, foi adquirido na proporção de 1/3 em 31 de Julho de 1999, mantendo a sua situação inalterada, isto é, o arguido/requerido não tentou onerá-lo ou vendê-lo, seja antes, seja durante, seja depois do conhecimento de que corria contra si o processo-crime dos autos principais».
Por fim, contrário do que defende o recorrente, cumpre ainda referir que a decisão recorrida não padece de qualquer contradição na fundamentação quando considera que a aquando da realização das buscas o requerido não teve um conhecimento efetivo do âmbito do processo, devido à vaguidade do despacho respetivo, e por outro se considera, em abono da tese defendida, da inexistência do periculum in mora, que a apesar do conhecimento da pendência da investigação, aquando das buscas, ainda assim o requerido aumentou o seu património através da aquisição do prédio .
Com efeito, uma coisa é o arguido/requerido ter tido conhecimento das buscas, desde logo porque esteve presente nas instalações da sociedade “W” aquando da sua realização e, nessa medida, ter-se apercebido que se encontrava a decorrer uma investigação que envolvia a mencionada sociedade, outra bem diferente é o conhecimento efetivo por parte daquele do que realmente estava a ser investigado relativamente à mencionada sociedade, conhecimento este que o Mmo Juiz considerou não ter ocorrido, pelas razões que fez constar da sua motivação, pese embora a presença do requerido nas buscas.
Em face de tudo o exposto, sem necessidade de outras considerações, não assistindo razão ao recorrente quanto ao preenchimento do requisito do justo receio da perda da garantia patrimonial, improcede nesta parte o recurso, mantendo-se o decidido no que respeita ao arguido/requerido M. F..

Passando agora à arguida/requerida “X – CONSULTING, SA”, considera também o recorrente que os concretos atos com base nos quais requereu o arresto preenchem o requisito do justo receio da perda da garantia patrimonial.
Tais atos prendem-se com a venda pela arguida/requerida, em 19 de abril de 2018, de duas frações autónomas designadas pelas letras BJ) – correspondente ao estabelecimento nº10, destinado a comércio ou indústria, no rés-do-chão, com o valor patrimonial atribuído pela AT de €52.380,00 (cinquenta e dois mil, trezentos e oitenta euros) – e G) – correspondente a um aparcamento, designado pelo nº7, com o valor patrimonial atribuído pela AT de €1.870,00 (mil oitocentos e setenta euros) - no imóvel constituído em regime de propriedade horizontal, inscrito sob o artigo … da matriz predial urbana, na freguesia de ..., do concelho e distrito de Coimbra, registado sob o nº …, da 1ª CRP de …, situado na Rua ...,.., em … – … – Coimbra, pelo valor de €30.000,00 (trinta mil euros), ou seja, por um valor inferior ao atribuído pela AT (que totaliza €54.250,00 – cinquenta e quatro mil, duzentos e cinquenta euros).
E ainda com o resgate ocorrido em 25 de maio de 2018 de todos os depósitos de que a requerida “X”, à data de 29 de Dezembro de 2017, era titular no “BANCO ...” – no montante de €50.000,00 (cinquenta mil euros), tendo a 31 de dezembro deixado de existir contas de depósito a prazo e de títulos (estes no montante de €57.000,00 à data de 29 de dezembro de 2017) no “Banco ...”.
Sem pôr em causa o que a respeito do circunstancialismo em que ocorreu a venda das frações e aquilo que a motivou, ficou a constar da factualidade e provada, o ora recorrente vem novamente sustentar o mencionado perigo com o único argumento da alienação em causa configurar, de per si, uma diminuição da garantia de pagamento, tanto mais que este imóvel era o único de que era proprietária a sociedade arguida.
Considera o recorrente que apesar do recebimento da contrapartida por parte da arguida/requerida e desta ter-se mantido na sua posse até 30/6/2018, tal não invalida a existência do “periculum in mora”, já que a contrapartida monetária, pela sua natureza é, como foi, de fácil dissipação/disseminação, ainda que tenha sido utilizada “no normal giro da sociedade”.
Insiste, mais uma vez, no entendimento de que tal perigo tem-se por verificado por referência ao “receio de que faltem ou diminuam substancialmente as garantias de pagamento”, tal como determina o artigo 227º, do C.P.P.
A ser assim, a concretização dos pressupostos de que “faltem” ou “diminuam” substancialmente as garantias, não suscita quaisquer dificuldades para o recorrente, tendo-se por verificados, por exemplo, sempre que o requerido tenha alienado ou se prepare para alienar parte do seu património.
Com efeito, atenta a volatilidade das quantias em dinheiro, facilmente ocultáveis e dissipadas sem deixarem rasto, sempre que ocorra, como ocorreu no caso vertente, alienação de património imobiliário (este insuscetível de ocultação), torna-se “evidente” para o recorrente a diminuição das garantias de pagamento da vantagem patrimonial, independentemente do recebimento e montante da contrapartida, e, consequentemente, verificado o “periculum in mora”.
Evidencia essa que para o recorrente também ocorrerá quando se verifiquem quaisquer levantamentos ou transferências de ativos financeiros, independentemente do seu destino.
De modo algum se pode concordar com o recorrente.
Reafirmando o que vimos dizendo, o “justo receio de perda da garantia patrimonial”, fundamento do arresto preventivo, não se concretiza nos termos pugnados pelo recorrente, sendo necessária a demonstração de que as atos praticados pelo requerido do arresto façam antever o perigo de tornar difícil ou impossível a cobrança do crédito, ónus de que não está dispensado o recorrente, mesmo no caso de confisco das vantagens.
E na senda da decisão recorrida, entendemos também que não se mostra demonstrado o mencionado justo receio de perda da garantia patrimonial.

Como nela bem se argumentou:
“… a venda daquelas fracções autónomas BJ) e G), bem como os resgates supra referidos, embora anteriores à acusação pública (que data de 25 de Setembro de 2018), tiveram lugar já após a realização das buscas nas instalações da sociedade “X” – efectuadas no dia 26 de Fevereiro de 2015 –, bem como já após a constituição desta como arguida – o que ocorreu no dia 19 de Abril de 2017, na pessoa do seu representante legal, o arguido/requerido A. L..
(…)
Da prova realizada em audiência final verificou-se que as identificadas fracções autónomas (estabelecimento para comércio ou indústria aparcamento) funcionavam como um imóvel (“loja ...”), que foi adquirido em 1998, tratando-se da primeira sede da aludida “X”.
Pela sua localização esperava-se que se valorizasse bastante, com a chegada do projecto do metro de superfície de ligação da Lousã a Coimbra.
No entanto, tal expectativa não se concretizou, sendo que a loja em questão, pelo menos, desde Junho de 2008, que se encontrava devoluta.
Por esse motivo, tratando-se de um espaço que não era utilizado, a arguida/requerida tomou a decisão de vendê-la.
Para o efeito, em Janeiro de 2009, celebrou com uma mediadora imobiliária um ‘Contrato de Mediação Imobiliária”, pedindo como target price o valor de €60.000,00 (sessenta mil euros) – superior ao atribuído pela AT. Porém, apesar das diligências encetadas no sentido de alienar as referidas fracções, a mencionada “X” não conseguiu encontrar comprador, o que determinou que fosse baixando o preço pedido, acabando por realizar a venda pela quantia de €30.000,00 (trinta mil euros).
No que respeita à aplicação do “BANCO ...”, no valor de €50.000,00 (cinquenta mil euros): (i) no dia 08 de Maio de 2018 foi efectuado um reforço de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), passando-se para um saldo de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros); (ii) no dia 25 de Maio de 2018, foram liquidados os depósitos a prazo no “BANCO ...”, no valor total de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), que assim transitou para a conta à ordem associada na referida instituição bancária; (iii) no dia 31 de Maio de 2018, procedeu-se à transferência do montante referido em (ii) para a conta à ordem do “Banco ...”; e (iv) no dia 30 de Junho de 2018, esse montante de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros) foi utilizado para a constituição de um depósito a prazo no “Banco ...”, no valor de €125.000,00 (cento e vinte e cinco mil euros), coincidindo com a entrada do produto da venda das supra referidas fracções autónomas designadas pelas letras BJ) e G).
E em relação à aplicação do “Banco ...”, esta tinha um prazo de contratualização de (apenas) 15 (quinze) dias, tendo sida liquidada no seu vencimento, a 13 de Janeiro de 2018, altura em que foi constituída uma nova aplicação financeira, no montante de €55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros), que apresentou vários movimentos ao longo do ano de 2018 – relacionados com o giro operacional da arguida/requerida (em concreto, para fazer face a despesas de tesouraria corrente e amortização de Conta Caucionada) –, tendo sido saldada a 31 de Dezembro de 2018.

Do exposto resulta que:
(i) Quanto às fracções autónomas BJ) e G)
O processo de venda da “loja ...” iniciou-se, pelo menos, em Junho de 2008 – quando se encontrava devoluta –, isto é, antes das buscas efectuadas nas instalações da sociedade “X” (em 26 de Fevereiro de 2015), antes da sua constituição como arguida (a 19 de Abril de 2017) e antes da dedução da acusação pública (a 25 de Setembro de 2018).
Apesar de inicialmente ter sido pedido o preço de €60.000,00 (sessenta mil euros), a verdade é que as sucessivas tentativas de vendas frustraram-se, culminando com a sua alienação em 19 de Abril de 2018 (uma década depois, portanto), pelo valor de €30.000,00 (trinta mil euros).
Este negócio sem dúvida que representou para aquela “X” um revés na sua situação patrimonial, pois que a venda realizou-se por um valor inferior ao atribuído pela AT.
No entanto, cremos que essa decisão foi devidamente justificada: a arguida/requerida pretendeu evitar que o imóvel se mantivesse indefinidamente no seu património, correndo o risco de desvalorizar-se ainda mais, por encontrar-se devoluto e, até, por poder representar custos acrescidos, com as despesas a realizar na sua conservação.
Deste modo, dos factos (indiciariamente) provados constata-se que a intenção de venda surgiu bastante antes da existência do presente processo-crime e que a mesma concretizou-se no âmbito de uma “opção legítima de gestão empresarial” (cfr. artigo 34º, da oposição), sendo certo que o produto obtido (€30.000,00 – trinta mil euros) foi mantido no activo da arguida/sociedade, com a constituição, a 30 de Junho de 2018, de um depósito a prazo no “Banco ...”, no valor de €125.000,00 (cento e vinte e cinco mil euros), coincidindo com a entrada do dinheiro proveniente da alienação das fracções autónomas designadas pelas letras BJ) e G).
A referida operação económica teve, assim, a correspondente contrapartida para aquela “X”, expressa no valor do preço que recebeu e que foi utilizado para constituir uma nova aplicação financeira.
(…)
(ii) Quanto aos activos financeiros:
A aplicação do “BANCO ...” (€50.000,00 – cinquenta mil euros), não obstante ter sido resgatada no dia 25 de maio de 2018, isto é, em data anterior à acusação pública (de 25 de Setembro de 2018), mas posterior às buscas (a 26 de Fevereiro de 2015) e à constituição da “X” como arguida (a 19 de Abril de 2017), serviu para criar um depósito a prazo no “Banco ...”, no valor de €125.000,00 (cento e vinte e cinco mil euros).
Este acto não representou, portanto, uma pretensa manobra de dissipação do capital.
E o mesmo sucedeu com a aplicação do “Banco ...” (€57.000,00 – cinquenta e sete mil euros), pois que tinha um curto prazo de contratualização (de 15 (quinze) dias), sendo que o valor resgatado foi usado para constituir uma nova aplicação, na quantia de €55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros).
Conforme resulta do documento nº12, a fls.663, do presente apenso (junto com a oposição da arguida/requerida “X”), os movimentos realizados, sendo posteriores às buscas e à sua constituição como arguida, são anteriores à dedução da acusação pública (o último movimento data de 30 de Junho de 2018).
Tais movimentos, como se provou, relacionaram-se com o giro operacional da arguida/requerida (veja-se, uma vez mais, no documento em causa a referência a ‘amortização conta’), com o que reflectem um normal desenvolvimento da sua actividade comercial, nada tendo de anómalo, pelo que, como conclui a aludida “X” (…) não traduzem, em termos objectivos e com a necessária verosimilhança, uma situação de periculum in mora no que concerne à preservação da garantia patrimonial geral (cfr. artigo 52º, da oposição que deduziu).
Além disso, o Digno requerente, relativamente aos supra identificados activos financeiros, nunca alegou que esta arguida/requerida estivesse a efectuar quaisquer levantamentos ou transferências suspeitos.
(…)»
E tanto basta para poder concluir-se que o requerente não logrou, de facto, demonstrar que os atos com base nos quais pretendeu fundamentar o seu pedido de arresto são suscetíveis de justificar o justo receio de perda da garantia patrimonial para pagamento das vantagens ilegitimamente obtidas com a prática dos crimes imputados à sociedade arguida.
Também ao contrário do que afirma o recorrente, o facto de terem sido arrestados ativos financeiros da titularidade da X, no “Banco ...”, no valor de €425.902,06 e de esse valor ser manifestamente inferior ao valor da vantagem ilegítima obtida cuja perda se pretende acautelar (1.392.455,09 €) não significa que esteja automaticamente demonstrado o periculum in mora e, consequentemente, legitimado o decretamento do arresto.
Para que se verifique o justo receio de perda da garantia patrimonial é necessário que se alegue e prove que a requerida já praticou ou se prepara para praticar atos de alienação ou oneração, relativamente ao seu património que, razoavelmente interpretados, inculquem a suspeita de que se prepara para subtrair os seus bens à ação dos credores.
Assim, a circunstância de o valor correspondente à vantagem cuja perda se pretende acautelar ser superior ao valor dos ativos financeiros que foram arrestados à requerida não constitui, por si só, justificação para o decretamento do arresto, sendo necessário demonstrar uma atuação da requerida no sentido de fazer desaparecer ou ocultar os respetivos bens com vista a inviabilizar a satisfação do valor correspondente aquela vantagem.
Alega o recorrente que não sendo o capital social penhorável, nem suscetível de oneração, não faz sentido dizer-se que tendo havido um aumento do capital social da “X” em data posterior, quer à realização das buscas, quer à constituição de arguida da sociedade, quer à dedução da acusação, o Estado viu aumentada a garantia de pagamento do valor que vier a ser declarado perdido a favor do Estado.
Compulsada a decisão recorrida evola da mesma que o Mmo Juiz em reforço da posição aí defendida quanto à não demonstração por parte do requerente do “periculum in mora”, aduziu outros argumentos em reforço da sua convicção, um dos quais se prendeu com o comprovado aumento de capital da sociedade arguida em momento posterior à dedução da acusação.
Ora, a afirmação constante da decisão recorrida de que é através do aumento (do capital social) que uma sociedade reforça os meios para desenvolver a sua atividade, sendo este também o meio mais eficaz de reforço das garantias dos seus credores, incluindo o Estado, carece de alguma precisão.
A este respeito importa ter presente que o estatuto económico da sociedade comercial é fator decisório do crédito que lhe é concedido, não se limitando apenas ao capital social, mas também tendo em consideração o estofo patrimonial da empresa (sociedade) que possa «tranquilizar» os seus credores.
Como ensina o Prof. Pereira de Almeida, in Sociedades Comerciais, 3º edição, 2003, pág. 212, costuma-se dizer que o capital social é a garantia comum dos credores, carecendo tal afirmação de ser explicada porque, na verdade, o capital social figura no balanço como «rubrica do passivo» e a garantia dos credores é certamente constituída pelo «activo», distinguindo-se, assim, o capital social do património, o qual constitui efectivamente a garantia geral dos credores (art.º 601.º do Código Civil).
Mas, neste particular, como afirma a decisão recorrida, sendo desconhecido o valor do seu ativo e do seu passivo, não tendo sido alegado e provado que não exista outro património e que a arguida/requerida não esteja a exercer normalmente a sua atividade, assim como não resultando provado qualquer outro facto que indicie o propósito de ocultar ou delapidar o seu património, cremos pois que a dedução da acusação e do pedido de condenação no pagamento ao Estado do valor correspondente às vantagens resultantes dos crimes que lhe foram imputados não constituem critério que, por si só, justifique o arresto.
Por fim, quanto à invocada contradição da fundamentação de que padece a decisão recorrida, valem aqui as considerações já supra tecidas.
Por tudo o exposto, não assistindo razão ao recorrente quanto ao preenchimento do requisito do justo receio da perda da garantia patrimonial, improcede também nesta parte o recurso, mantendo-se o decidido no que respeita à arguida/requerida “X – CONSULTING,SA”.

Resta agora apreciar se os concretos atos com base nos quais o ora recorrente requereu o arresto relativamente ao arguido/requerido A. L. preenchem o requisito do justo receio da perda da garantia patrimonial.
Tais atos consistem na venda de dois imóveis e na liquidação de duas contas bancárias em 31 de dezembro de 2018 de que o arguido/requerido era titular no “Banco ...” e que em 01 de Janeiro de 2018, apresentavam os saldos de €4.772,38 (quatro mil, setecentos e setenta e dois euros e trinta e oito cêntimos) e de €3.364,32 (três mil, trezentos e sessenta e quatro euros e trinta e dois cêntimos).
Adiantando a nossa conclusão, entendemos que também em relação a este requerido bem andou o Mmo Juiz ao concluir no sentido da não verificação do denominado “periculum in mora”, não colhendo os argumentos aduzidos pelo recorrente, os quais, mais uma vez, entroncam no entendimento de que para a verificação do mencionado perigo basta que exista uma diminuição das garantias do confisco (51ª conclusão).
Não deixando o recorrente de reconhecer as razões que presidiram a tais vendas e resgates dos ativos financeiros, como aliás foi espelhado na factualidade provada, conclui no sentido de que configurando tais atos um agravamento do património do requerido e logo uma diminuição da garantia de confisco, na senda do que já aduzira quanto aos demais requeridos, mostra-se verificado o “periculum in mora”, desconsiderando que não está desonerado do ónus de demonstrar o justo receio da perda da garantia patrimonial a que alude o artigo 391,nº1, do C.P.C, o qual deverá assentar em indícios concretos. O receio é sempre subjetivo, mas para ser justificado tem de assentar em factos concretos que o revelem à luz de uma prudente apreciação (Ac. do STJ de 3/3/1998, CJ STJ, Ano VI, Tomo I, p.116).
Ora, tendo presente o contexto em que ocorreram os atos em causa, o que os determinou, os termos em que se desenvolveram, tudo bem espelhado na factualidade provada e devidamente ponderado na decisão recorrida, a que acresce a não indiciação de que a atuação do requerido nos atos em causa tivesse como desiderato a dissipação do respetivo património fundamento do arresto, bem andou o Mmo Juiz ao concluir também pela não demonstração do “periculum in mora”.

Como se fez constar da decisão recorrida:
Relativamente à venda dos prédios referidos em [A] e [B], apurou-se que se trataram de 2 (duas) operações económicas que tiveram a correspondente contrapartida para o arguido/requerido A. L., expressa no valor do preço que recebeu, não tendo resultado indiciado que a sua actuação nestes negócios tivesse como desiderato a dissipação do respectivo património ou que indiciasse possível fraude, conluio ou simulação.
Quanto ao prédio referido em [A], demonstrou-se que as diligências de venda iniciaram-se antes de 25 de Julho de 2016, numa altura em que o identificado A. L. ainda não tinha sido constituído arguido, nem havia sido proferida acusação.
O que se verificou com este prédio é, em tudo, similar ao sucedido com o processo de venda da “loja ...” (da sociedade “X”), pelo que, o que aí se consignou é, aqui, com as necessárias adaptações, plenamente válido, tendo-se, por esse motivo, por integralmente reproduzido, por brevidade de exposição.
Tratou-se de uma decisão do arguido/requerido de racionalidade económica, num negócio em que antevia obter mais lucro do que o que obteve (ou não obteve).
Quanto ao prédio referido em [B], ficou demonstrado que a decisão da sua venda foi tomada aquando da separação de facto do (extinto) casal constituído pelos aludidos A. L. e V. L., em 2014, numa altura em que nem sequer haviam sido realizadas buscas à sociedade “X”.
Acresce que a sua venda, em 09 de Janeiro de 2019, ultrapassou em €40.000,00 (quarenta mil euros) o preço de aquisição pelo (extinto) casal, o que representa um acréscimo para a esfera patrimonial do arguido/requerido (e não um decréscimo).
A movimentação de 2 (dois) activos financeiros, que totalizam €8.136,70 [€4.772,38 + €3.364,32] (oito mil, cento e trinta e seis euros e setenta cêntimos), tampouco representou um acto de dissipação, pois que se justifica pelo cumprimento das obrigações assumidas no acordo de partilha celebrado entre o mesmo (extinto) casal, que representou para o mencionado A. L. uma meação no valor de €1.079.961,40 (um milhão, setenta e nove mil, novecentos e sessenta e um euros e quarenta cêntimos).
Para além do que vem de expor-se, importa também atentar no facto de a posição patrimonial deste arguido/requerido ter valorizado de €70.500,00 (setenta mil e quinhentos euros) para €705.000,00 (setecentos e cinco mil euros), no seguimento do aumento do capital social da sociedade “X”.»
Também a respeito da contradição da fundamentação de que padece a decisão recorrida, valem aqui as considerações já supra tecidas.
Em suma, sem necessidade de outras considerações, não assistindo razão ao recorrente quanto ao preenchimento do requisito do justo receio da perda da garantia patrimonial, mantém-se também o decidido a respeito do requerido A. L..

III. Dispositivo

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes da secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar totalmente o recurso interposto pelo Ministério Público, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida.
Sem custas por não serem devidas.
Guimarães, 27 de setembro de 2021