Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
713/09.1GAFAF.G1
Relator: JOÃO LEE FERREIRA
Descritores: REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
REENVIO DO PROCESSO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/04/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: JULGADO PROCEDENTE
Sumário: I) Só com os elementos concretos e fiáveis se pode determinar, com a segurança exigível, se o incumprimento do dever de pagar a quantia arbitrada a título de indemnização se assume como grosseiramente culposo e inviabiliza definitivamente o juízo de prognose que esteve subjacente à suspensão de execução da pena.
II) Na sentença, o tribunal apenas pôde ter como provado sobre a situação económica e familiar que o arguido se encontrava desempregado, com um filho menor. Por outro lado, da situação económica posterior, sabe-se que o condenado foi emigrante na Suíça até Janeiro de 2014, que é dono de um prédio urbano no valor de cerca de €60.000,00 e que, em Outubro de 2014, não recebia qualquer pensão ou subsídio pela Segurança Social.
III) Assim , terá de de ser determinada a realização das diligências que se mostrem pertinentes para posteriormente se poder decidir se a suspensão se a suspensão da execução da pena deve, ou não, ser revogada e, em caso negativo, se deve haver imposição de novos deveres ou regras de conduta e/ou prorrogação do período de suspensão.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães,

1. Nestes autos de processo comum n.º 713/09.1GAFAF, a Exmª juíza da instância local de Fafe do Tribunal Judicial da Comarca de Braga proferiu em 16-10-2014 o seguinte despacho (transcrição):

Por sentença proferida nos presentes autos Eduardo O. foi condenado pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152º, nºs 1 e 2, do Código Penal na pena de três anos de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período com a condição de no mesmo prazo pagar à ofendida Ana P. a quantia de € 3.000,00 a título de danos patrimoniais (fls. 198 e 199), acrescida de juros legais desde a sua notificação até efectivo e integral pagamento.
Decorrido aquele prazo sem que o condenado tenha cumprido a injunção referida, foi o mesmo ouvido nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 495º, n.º 2, do Código de Processo Penal, tendo argumentado que esteve emigrado na Suíça mas quando regressou ficou em emprego pelo que pretende regressar para aquele país, motivo pelo qual não teve dinheiro suficiente para entregar a quantia indemnizatória à ofendida. Mais alegou que o incumprimento da dita injunção não é culposo porquanto resulta da circunstância de o mesmo se ter visto privado dos rendimentos que habitualmente
Auferia, pelo que solicitou a prorrogação de prazo para comprovar a situação concreta e real do seu desemprego e, bem assim, para cumprir a condição de suspensão que lhe foi imposta por sentença.
Mais solicitou que fosse designada uma nova data para a continuação da sua audição a fim de comprovar nos autos esta situação, o que foi deferido, tendo sido, por isso, designada nova data.
Acontece, porém, que na segunda data designada nem o condenado apareceu, nem tão pouco justificou a razão da sua ausência.
Foi junto aos autos o Certificado de Registo Criminal do arguido a fls. 242 a 253, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais.
Cumpre, pois, apreciar e decidir.
Dispõe o artigo 56.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, que “a suspensão da execução da pena e de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado: (…) infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de readaptação social”.
É de referir que o instituto legal da suspensão da execução de pena de prisão surge inserido numa lógica jurídica em que as penas de prisão se apresentam como ultima ratio da política criminal, que se pretende evitar. Esta é uma matéria intimamente ligada à ideia de reintegração do delinquente na sociedade, que nos surge como uma das finalidades das penas imposta pelo artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal.
A suspensão da execução da pena de prisão é-nos apresentada no artigo 50.º do Código Penal que enuncia, também, as condições para a sua aplicação. Tal como escreve Figueiredo Dias (in Direito Penal Português, parte geral, Vol. II, Lisboa, 1993, pág. 342) “pressuposto material da aplicação do instituto é que o tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do delinquente…”.
É neste contexto jurídico que nos aparece a figura da revogação da suspensão da execução da pena de prisão, expressa no já referido artigo 56.º do Código Penal. Na verdade, podemos afirmar que opera essa revogação sempre que o raciocínio de prognose feito em sede de decisão de suspensão da pena não encontrou reflexos na realidade dos actos do delinquente.
Sucede, porém, que atendendo ao fim das penas ligado à ressocialização do agente do crime e a sua educação para o direito, a revogação da suspensão não pode operar automaticamente.
Uma vez verificados os pressupostos inscritos na lei, a revogação da execução da suspensão da pena apenas poderá ocorrer quando se verifique que, clara e frontalmente, o raciocínio de prognose feito em sede de julgamento não encontrou reflexos na conduta do delinquente posterior à condenação respectiva e na sua capacidade de adesão aos valores societários dominantes.
A este propósito escrevem Manuel de Oliveira Leal-Henriques e Manuel José Carrilho de Simas Santos (in Código Penal Anotado, 3ª edição, 1º Vol., Rei dos Livros, pág. 711) que “a revogação da suspensão tem de ser olhada como um expediente in extremis e sempre subordinado a apertadas limitações, como as que o preceito em análise contém”.
Urge então, após estas breves considerações, lançar um olhar cuidadoso sobre os elementos que os autos acolhem a fim de proferir decisão acerca da necessidade ou desnecessidade de revogar a suspensão da execução da pena aplicada ao condenado.
Assim, verifica-se desde logo que o condenado não procedeu ao pagamento da indemnização fixada a favor da ofendida, nem tão pouco requereu o seu pagamento em prestações mensais que durante o período da suspensão importaria uma prestação de € 83,33 mensais.
Mais se verifica que, notificado para comparecer neste Tribunal na segunda data designada por ter sido por este requerida, o condenado não o fez nem se dignou a justificar a sua ausência. Não foi possível proceder à elaboração de relatório social já que, convocado para o efeito duas vezes, não compareceu.
O condenado foi emigrante na Suíça até Janeiro de 2014, sendo que pelo menos até essa data, face ao vencimento que certamente ai auferia poderia ter pago senão a totalidade, pelo menos metade da quantia em dívida, o que não fez. Mais se apurou que o condenado é proprietário de um prédio urbano no valor de € 65.542,38 (fls. 303).
Assim, as causas de revogação da suspensão da execução não deverão ser entendidas formalmente, antes deverão indiciar o estrépito, irremediável, do juízo de prognose inicial que fundamentou a sua aplicação a anulação infalível da esperança de, por meio daquela, manter o delinquente, no futuro, afastado da criminalidade. Tendo tais considerações em mente, não temos dúvidas em afirmar que o condenado não interiorizou através da reprovação judicial da sua actuação nos presentes autos, como era suposto, a gravidade da mesma, e antes fez tábua rasa da solene advertência que qualquer sentença penal consubstancia para o seu destinatário. O comportamento ulterior do arguido veio confirmar inequivocamente tal constatação, já que desprezou as notificações do Tribunal para presencialmente oferecer as razões do incumprimento.
Ora, é evidente que a realização das diligências em causa foram determinadas no seu interesse do condenado, sendo óbvio que o tribunal pouco mais ou nada mesmo pode fazer quando é o maior interessado na decisão a proferir que se desliga completamente do destino dos autos.
Quanto à situação económica e financeira do condenado, já vimos que, o mesmo auferiu rendimentos pelo menos até Janeiro de 2014, tendo sido a sentença proferida em Novembro de 2010, sendo sabido os vencimentos no estrangeiro são elevados, pelo que a sua situação económica, pelo menos ate àquela data permitiu pagamento integral ou fraccionado da quantia indemnizatória.

Acresce que a sua situação patrimonial não é despicienda, já que é proprietário de um prédio urbano.
Sintetizando, revelou-se plenamente infundado o prognóstico favorável que presidiu à suspensão da execução da pena de prisão ao condenado, demonstrando o condenado um comportamento reprovável, ou seja, o condenado, passados mais de três anos sobre o trânsito da sentença condenatória não se dignou a entregar à ofendida uma quantia, por mínima que fosse, que demonstrasse o seu arrependimento e a consideração.
Em face do exposto, não resta a este Tribunal, em homenagem ao princípio da garantia da eficácia das penas e perante a necessidade de fazer vingar, como se impõe diante do circunstancialismo apurado, as expectativas comunitárias na reposição do Direito violado pela conduta antijurídica do condenado, bem como atendendo às prementes exigências de prevenção especial de ressocialização (afigurando-se que apenas o cumprimento efectivo de pena de prisão fará o condenado interiorizar o desvalor do seu comportamento), revogar a suspensão da execução da pena de prisão aplicada a Eduardo O..

***
Assim, ao abrigo do disposto no artigo 56.º, n.º 1, alínea b), e 2, do Código Penal, declaro revogada a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao condenado Eduardo O. e, consequentemente, determino o cumprimento efectivo da pena de três anos de prisão.
Notifique.
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Após trânsito, emitam-se os pertinentes mandado de detenção do condenado para cumprimento da pena em que foi condenado e remetam-se boletins ao registo. ".

2. Inconformado, o arguido interpôs recurso deste despacho judicial e das motivações extraiu as seguintes conclusões (transcrição) :

A- É evidente que os rendimentos auferidos pelo Recorrente é manifesto que o arguido não dispõe de capacidade económica para poder efetuar o pagamento do valor ainda em dívida, a título de indenmização, à ofendida, nem o contrário ficou provado em tribunal através da menção ao imóvel que era onerado com hipoteca e já está adjudicado ao credor hipotecária
B- A obrigação de indemnização recai sobre o arguido mas é manifesta a sua precariedade e fragilidade económica pela situação de desemprego.
C- É legítimo, razoável, justo e ponderado, concluir que o arguido não cumpriu até hoje integralmente com a obrigação indemnizatória que lhe foi estipulada, porque lhe foi de todo impossível fazê-lo, mesmo tendo tentado recorrer a terceiros para efetuar, o pagamento parcial da indemnização arbitrada e apesar de não conseguir ter uma ocupação profissional até à data da revogação.
D- O arguido não se alheou das suas obrigações, pelo contrário, esforçou-se e tentou cumpri-las, e cumpriu-as muito para além do que lhe era possível e razoável exigir, não se podendo concluir por isso, que durante o período de suspensão, o arguido tenha deixado de cumprir, por culpa sua, a obrigação que lhe foi imposta como condição de suspensão da execução da pena de prisão em que foi condenado.
E- Não se pode concluir, por ser completamente despropositado, desproporcionado, injusto e irrazoável, com o devido respeito, mas perante todo o circunstancialismo que os autos revelam, que o incumprimento da condição imposta ao arguido se traduziu numa violação grosseira dos deveres estipulados na sentença condenatória.
F- Não pode consequentemente, no caso dos autos, ser revogada a suspensão da execução e ordenado o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença condenatória.
G-- Muito menos de antes da revogação ter o tribunal deitado mão dos previsto nas alíneas a) a d) do artigo 55.° do CP, especialmente à d) permitindo dessa forma que o arguido pudesse continuar a tentar obter meios para fazer face à indemnização.
H- Bem como é manifesto que no despacho não resultam factos que se possam considerar suficientes para que se considere que o arguido infringiu de forma grosseira o dever que lhe foi imposto.
I-Deve antes, ser declarada extinta a pena aplicada ao arguido, sem prejuízo de lhe ser feita uma solene advertência e da imposição de novos deveres ou regras de conduta.
J- Foram violados os artigos 55° 56° e 57° do Cód. Penal., pedindo a revogação da decisão, invocando, em síntese, que no momento em que se procedeu à audição, o arguido já se encontrava em cumprimento de pena de prisão efectiva por condenação em outro processo e, no âmbito dos presentes autos as necessidades de prevenção geral e especial ficam acauteladas com a simples censura do facto e a ameaça de prisão”.

O Ministério Público, por intermédio do magistrado no Tribunal Judicial de Braga, formulou resposta, concluindo que o tribunal recorrido interpretou e aplicou de forma correcta as disposições legais, devendo manter-se a decisão recorrida de revogação da suspensão de execução da pena.

Neste Tribunal da Relação de Guimarães, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu fundamentado parecer no sentido da improcedência do recurso.

A assistente apresentou resposta ao parecer, concordando com a posição expressa pelo Ministério Público.

3. A questão fundamental a decidir consiste em saber se se deve manter a decisão judicial que determinou a revogação da suspensão de execução da pena aplicada nestes autos.

Segundo entendimento sedimentado na doutrina e na jurisprudência e frequentemente renovado, as razões de política criminal que estão na base do instituto da suspensão da execução da pena residem essencialmente, no objectivo de afastamento das penas de prisão efectiva de curta e média duração e da prossecução da ressocialização em liberdade. Uma vez verificado o pressuposto formal de que a pena de prisão previamente determinada não seja superior a cinco anos, é necessário que o julgador, sopesando em conjunto as circunstâncias do facto e da personalidade, atendendo às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto, possa fazer uma apreciação favorável relativamente ao comportamento do arguido baseada num risco prudencial, no sentido de antecipar ou prever que a ameaça da pena seja adequada e suficiente para realizar as finalidades da punição, o mesmo é dizer, para garantir a tutela dos bens jurídicos e a reinserção do agente na sociedade, entendida aqui como perspectiva que o condenado não volte a delinquir no futuro.

Como sabemos, o incumprimento do regime da suspensão de execução da pena pode ocorrer em dois níveis e impõe-se distinguir situações de diferente gravidade:

Num primeiro plano, quando no decurso do período de suspensão, o condenado, com culpa, deixa de cumprir qualquer dos deveres ou regras de conduta, ou não corresponde ao “plano de reinserção”, pode o tribunal optar pela aplicação de uma das medidas previstas no artigo 55.º do Código Penal, a saber: fazer uma solene advertência; exigir garantias de cumprimento das obrigações que condicionam a suspensão; impor novos deveres ou regras de conduta, ou introduzir exigências acrescidas no plano de readaptação; prorrogar o período de suspensão

Num segundo plano, quando na vigência da suspensão o condenado, de forma grosseira ou repetida, viola os deveres ou regras de conduta impostos ou o “plano de reinserção” ou comete crime pelo qual venha a ser condenado, a suspensão é revogada (artigo 56.º, n.º 1), o que determina o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença (artigo 56.º, n.º 2).

Quer se trate de uma hipótese de um comportamento grosseiro ou de um procedimento repetido de infracção dos deveres ou regras de conduta ou do plano de reinserção social, o requisito estabelecido na segunda parte da alínea b) do nº 1 do artigo 56º do Código Penal (ou seja, que por força desse comportamento, o condenadorevele que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas”) diz respeito a ambas as alíneas do nº 1. Como explicitou o Professor Figueiredo Dias nos trabalhos preparatórios desta norma, “as alíneas não são cumuláveis, mas a condição vale para ambas” “Actas e Projecto da Comissão de Revisão, MJ, 1993, pag. 66)

A jurisprudência tem entendido uniformemente que a constatação de que as finalidades punitivas visadas com a imposição de pena suspensa se encontram irremediavelmente comprometidas terá de ressaltar de uma situação concreta de fracasso, em definitivo, da prognose inicial que determinou a sua aplicação, a infirmação, certa, da esperança de, por meio daquela, manter o delinquente, no futuro afastado da criminalidade”(Acórdão da Relação de Lisboa de 03-07-2003 processo 5347/2003-9) entendo-se que “a escolha da mais severa sanção para a revogação da suspensão só deverá adoptar-se, sobretudo se se trata de pena de prisão, como ultima ratio, quando se mostrem ineficazes ou esgotadas as restantes medidas e o comportamento do arguido se revele doloso ou gravemente culposo» (Acórdão da Relação de Lisboa de 06-06-2006, processo 147/2006-5, ambos in www.dgsi.pt) ).

A lei não revela o que se deve considerar como uma infracção grosseira ou uma infracção repetida dos deveres ou regras de conduta impostos, mas a jurisprudência tem considerado que a situação de facto prevista na alínea a) do nº 1 do artigo 56.º do Código Penal há-de constituir um comportamento que se revele intolerável e inadmissível para o comum dos cidadãos (Acórdão da Relação de Lisboa de 19-02-1997, in CJ, XXII, t. 1, 166), que revele uma culpa temerária, o esquecimento dos deveres gerais de observância e signifique a demissão pelo agente dos mais elementares deveres (Acórdãos da Tribunal da Relação do Porto de 10-03-2004, processo 0345918, e de 05-05-2010, processo 259/06.0GBMTS.P1 www.dgsi.pt )

4. O arguido foi condenado pelo cometimento de um crime de violência doméstica na pena de três anos de prisão, de execução suspensa por idêntico período sob a condição de no mesmo prazo efectuar o pagamento à ofendida da quantia três mil euros.

A verificação do requisito de revogação da suspensão de execução da pena depende fundamentalmente da demonstração de que o arguido reunia condições económicas para efectuar o pagamento e não cumpriu de uma forma grosseiramente culposa, ou, então, que se colocou voluntariamente na situação de não poder satisfazer esse dever.

Logo na sentença, o tribunal apenas pôde ter como provado sobre a situação económica e familiar que o arguido se encontrava desempregado, com um filho menor. Da situação económica posterior, sabe-se que o condenado foi emigrante na Suíça até Janeiro de 2014, que é proprietário de um prédio urbano no valor de € 65.542,38 e que, em Outubro de 2014, não recebia qualquer pensão ou subsidio pela Segurança Social (fls. 302 e 303).

Em nosso entendimento, a circunstância de uma pessoa se encontrar “emigrada” na Suíça nada nos diz sobre a sua real situação económica, quando se desconhece em absoluto se durante esse período de três anos essa mesma pessoa teve trabalho efectivo nesse país, em que profissão, quais os rendimentos recebidos e as despesas fixas efectivamente suportadas.

Salvo o devido respeito, a afirmação constante da decisão recorrida de que os vencimentos são elevados no estrangeiro e que, face ao vencimento que certamente aí auferia, o condenado poderia ter pago senão a totalidade, pelo menos metade da quantia em dívida, não excede a mera suposição ou conjectura, sem o mínimo suporte, nem em factos concretos que tenham sido apurados, nem sequer em ensinamentos extraídos de situações semelhantes.

Na realidade, na actual conjectura económica, a precariedade no emprego e a redução de salários atingiram todos os países europeus e não é seguro que o arguido, só por ter estado na Suíça a trabalhar, tenha auferido rendimentos necessários para satisfazer a indemnização.

Também a singela constatação de propriedade de um prédio se revela de todo insuficiente para caracterizar a situação económica de uma pessoa, quando se desconhece o respectivo valor patrimonial, se esse prédio produz ou não algum rendimento para o dono.

Por fim, a ausência de justificação do incumprimento ou a omissão de comprovação dos elementos referidos pelo condenado na diligência de 17 de Junho de 2014 nada abona a favor do arguido mas não dispensava o tribunal do dever de advertir o condenado, de o notificar para apresentar os elementos probatórios num determinado prazo e, principalmente, de promover as necessárias averiguações, nomeadamente a solicitação de relatório social pela DGRSP com recolha de elementos junto de familiares e vizinhos, a junção elementos completos de natureza fiscal referentes ao IRS.

Na verdade, só com elementos concretos e fiáveis se pode determinar, com a segurança exigível, se o incumprimento do dever de pagar a quantia arbitrada a título de indemnização se assume como grosseiramente culposo e inviabiliza definitivamente o juízo de prognose que esteve subjacente à suspensão de execução da pena. Apesar de todo o tempo decorrido, afigura-se-nos manifesto que não se esgotaram as diligências exequíveis para se apurar da concreta situação familiar, social e profissional do condenado.

Assim, terá de ser determinada a realização das diligências que se mostrem pertinentes para posteriormente se poder decidir se a suspensão da execução da pena deve, ou não, ser revogada e, em caso negativo, se deve haver imposição de novos deveres ou regras de conduta e/ou prorrogação do período de suspensão.

5. Pelos fundamentos expostos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente o recurso e em revogar o despacho recorrido que deve ser substituído por outro, depois de terem sido efectuadas todas diligências viáveis com vista a apurar a situação económica e social de Eduardo O..

Guimarães, 4 de Maio de 2015.

Texto elaborado em computador e integralmente revisto pelos juízes desembargadores que o subscrevem.

João Carlos Lee Ferreira