Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1089/15.3T8BRG.G1
Relator: ISABEL CERQUEIRA
Descritores: ALCOOLÍMETRO
VERIFICAÇÃO PERIÓDICA ANUAL
AUSÊNCIA DE PROVA
ABSOLVIÇÃO DO ARGUIDO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/22/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: JULGADO PROCEDENTE
Sumário: I) Se o alcoolímetro utilizado nas provas de detecção de álcool no sangue (artºs 152º e 153º do CE) não tiver sido sujeito à verificação anual imposta por lei, não pode merecer qualquer fiabilidade e, por isso, não pode servir como meio probatório incriminatório.
II) É o que sucede no caso dos autos, uma vez que o alcoolímetro fora inspeccionado pela última vez pelo IPQ em 19.10.2011, ou seja, não foi sujeito à verificação periódica em 2012, o que atentos os fins prosseguidos pela obrigatoriedade de verificações anuais, a fiabilidade do referido meio de prova encontra-se necessariamente afectada.
Decisão Texto Integral: TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

Acordam, em conferência, na Secção Criminal deste Tribunal:
Relatório
Nos autos de recurso de contra-ordenação que correram termos pelo Inst. Local de Braga – Secção Criminal – J2, por decisão datada de 19/03/2015 (fls. 32 a 34), foi a impugnação judicial de contra-ordenação apresentada pelo arguido Paulo E. julgada improcedente.
Desta douta decisão interpôs o arguido o presente recurso, a fls. 55 a 61, no qual alega que a decisão recorrida considerou erradamente que não impugnou a factualidade constante do auto de contra-ordenação, e que o alcoolímetro usado para medir a TAS não se encontrava nas condições legalmente impostas para que o seu uso constituísse meio idóneo a aferi-la.
O Magistrado do M.P. junto da 1ª instância pronunciou-se, a fls. 67 a 69, pugnando pela total improcedência do recurso interposto.
O Ex.mº Senhor Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o douto parecer que antecede, no qual se pronuncia pela existência de uma nulidade, por ter ocorrido decisão por mero despacho, sem que para tal o arguido tenha dado expressa anuência nesse sentido.
Foi cumprindo o disposto no n.º 2 do art.º 417º do C.P.P., foram colhidos os vistos legais, e procedeu-se à conferência, cumprindo decidir.
*****
Fundamentação de direito
No caso concreto, o arguido que já pagara voluntariamente a coima também aplicável, veio a ser condenado pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, na sanção acessória de 60 dias de inibição de conduzir, pela prática em 15/05/2013 de uma contra-ordenação p. e p. pelo art.º 81º n.ºs 1 e 5 do Código da Estrada, por naquela data conduzir um veículo acusando uma TAS de 1,01, deduzido o erro máximo admissível.
O recorrente alega constituir a prova efectuada com o alcoolímetro utilizado um meio não idóneo de provar aquela TAS, já que, o mesmo não fora sujeito à inspecção periódica prevista no art.º 7º do Regulamento do Controlo Metrológico de Alcoolemia.
Sendo certo que este Tribunal em matéria contra-ordenacional apenas dela pode conhecer nos casos previstos no art.º 73º do RGCC, este é um dos casos por implicar condenação em sanção acessória, já que, é indiferente à apreciação desta sanção, o facto de o arguido ter pago voluntariamente a coima aplicável (acórdão do TC de 23/01/2008), podendo na impugnação judicial impugnar os factos, como aliás fez ao afirmar não ter ingerido bebidas alcoólicas suficientes para apresentar a TAS supra referida.
Dispõem os art.ºs 152º e 153º do actual Código da Estrada que os condutores (no que interessa ao caso em análise) devem submeter-se às provas estabelecidas para a detecção dos estados de influenciado pelo álcool, mediante a utilização pela autoridade policial de aparelho aprovado para o efeito pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária ANSR), entidade administrativa que sucedera à Direcção-Geral de Viação (D.L. 77/2007, de 29/03), e à qual fora atribuída pelo n.º 5 do art.º 5º do D.L. 44/2005, de 23/02 a capacidade para a sua aprovação.
O alcoolímetro usado nos autos foi aprovado pelo Despacho de 19684/09 da ANSR, e em 20/09/1990 fora publicado o D.L. 291/90, que veio harmonizar o regime anteriormente aplicável ao controlo metrológico ao direito comunitário, prevendo a aprovação do modelo, a primeira verificação, verificações periódicas e verificações extraordinárias.
As verificações periódicas são o “conjunto de operações destinadas a constatar se os instrumentos de medição mantêm a qualidade metrológica dentro das tolerâncias admissíveis relativamente ao modelo respectivo” (art.º 4º n.º 1), e em matéria de alcoolímetros surge o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros (L. 18/2007, de 17/05 e Portaria 1556/2007, de 10/12), que impõe, em regra, verificações periódicas anuais a estes instrumentos de medição (art.º 7º n.º 2 daquela portaria).
No entanto, o n.º 5 do art. 4º do D.L. 291/90, prescreve que a verificação periódica é válida até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização, salvo regulamentação específica em contrário, que entendemos existir, designadamente face à Portaria supra referida (como aliás defendido no Acórdão da Relação de Évora de 13/11/2012, Relator Martinho Cardoso, in www.dgsi.pt).
Ora, no caso dos autos, e concretamente como resulta do auto de contra-ordenação de fls. 9, o alcoolímetro fora inspeccionado pela última vez pelo IPQ em 19/10/2011, ou seja, não fora sujeito à verificação periódica em 2012, o que atentos os fins prosseguidos pela obrigatoriedade de verificações anuais, a fiabilidade do meio de prova constituído pelo teste feito com aquele alcoolímetro, necessariamente afecta tal fiabilidade.
Não se trata de qualquer nulidade ou irregularidade daquela prova, mas sim da total ausência de prova de que na data em causa nos autos, o arguido conduzisse sob a influência de álcool, por o alcoolímetro utilizado, face à falta da verificação anual imposta por lei, não merecer qualquer fiabilidade e “não servir como prova incriminatória.” (Ac. supra citado).
Tem, pois, o arguido que ser absolvido da contra-ordenação que lhe era imputada, o que prejudica a apreciação das restantes questões aduzidas, designadamente pelo Ex.mº Senhor Procurador-Geral Adjunto no seu douto parecer.
*****
Decisão
Pelo exposto, julga-se procedente o recurso interposto, e absolve-se o recorrente Paulo E. da prática da contra-ordenação em causa nos autos.
Sem custas.
Guimarães, 22 de Junho de 2015