Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
169/08.6TBMNC.G1
Relator: CONCEIÇÃO BUCHO
Descritores: EXECUÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE FACTO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/21/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (da relatora):

- Na execução para prestação de facto – positivo ou negativo - definida em sentença, ao exequente assiste o direito, para além da realização do facto ou destruição da obra, de pedir indemnização pelos prejuízos causados pela acção ou omissão do executado e assim como a sanção pecuniária compulsória.

- A sanção pecuniária compulsória deve ser liquidada na fase liminar da execução e a satisfazer segundo as regras da execução para pagamento de quantia certa, constituindo a sentença título executivo bastante para estes pedidos – artigos 868º, 870º a 872º, 876º e 877º do Código de Processo Civil.

- É nos casos em que a prestação dos executados consiste numa prestação duradoura, de natureza continuada, que se justifica o estabelecimento de uma sanção pecuniária compulsória, como meio de prevenir a continuação ou renovação do incumprimento.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I - Nos autos executivos, o exequente Armandino (…) requereu a execução da sentença proferida no processo principal, na qual foi declarada extinta, por desnecessidade, a servidão e passagem que onera o prédio do réu a beneficia o prédio dos autores, alegando para o efeito que os executados, Manuel (…) e Maria (…), continuam a passar pelo seu prédio.

Requereu a fixação e uma indemnização pelo prejuízo causado, não inferior a € 5.100,00, equivalente ao custo de um portão e respectiva colocação na entrada do dito caminho, de modo a obstar à passagem dos executados.

Requereu, ainda, a fixação e uma sanção pecuniária compulsória no valor de € 250,00 por dia, contada a partir da citação da presente execução.
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Por despacho datado de 17.07.2017, foi feito um convite ao aperfeiçoamento, a fim de o exequente esclarecer o requerimento executivo no que toca à peticionada indemnização.

O exequente veio dizer que os executados continuam a passar no dito caminho cerca de dez vezes por dia no caminho da extinta servidão, desrespeitando as decisões judiciais, pelo que, entende que deverá ser indemnizado pelo valor do portão (cinco mil e cem euros) e por danos não patrimoniais, no valor de € 3.000,00.

Por decisão de fls. 63 e ss., o tribunal fixou a indemnização devida ao exequente em € 5.000,00 e fixou uma sanção pecuniária compulsória no valor diário de € 25,00, por cada dia de atraso no cumprimento da sentença.

Após interposição de recurso por parte dos executados, a decisão acima mencionada foi revogada pelo Tribunal da Relação de Guimarães, que determinou o exercício do contraditório, em relação aos executados.

Tendo sido dado o exercício do contraditório, os executados vieram dizer que a sentença executada há muito que foi cumprida; os executados abriram uma entrada para o seu prédio, em 2015, e deixaram de passar no caminho; o exequente apenas despendeu a quantia de € 100,00 com o restauro de um portão antigo, que colocou no início do caminho e fechou-o com correntes e cadeado, deixando os executados de passar pela extinta servidão antes de lhe ter sido fixado uma prazo, após o trânsito em julgado da sentença, para esse efeito.

Concluem, alegando que não existiram quaisquer danos patrimoniais.

Por despacho de fls. 87, designou-se data para inquirição das testemunhas arroladas pelos executados, tendo as mesmas sido inquiridas, observando-se todos os formalismos legais, conforme se alcança da respectiva acta.
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Inquiridas as testemunhas foi proferida a seguinte decisão:

Pelo exposto, o tribunal decide julgar o presente incidente parcialmente procedente, por provado e, em consequência:

a) Fixar uma indemnização no valor de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros), a título de danos patrimoniais, e no valor de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros) a favor do exequente Armandino (..), a pagar pelos executados Manuel (…) e Maria (…);
b) Fixar em € 25,00 (vinte e cinco euros) a sanção pecuniária compulsória por cada dia atraso no cumprimento da sentença, a contar do presente despacho (data da sua fixação).

Inconformados os executados interpuseram recurso, cujas alegações terminam com as seguintes conclusões:

1. Não foi produzida qualquer prova nos autos de que os executados não cumpriram a sentença exequenda;
2. Cabia ao exequente a prova de que o alegado por si no requerimento executivo corresponde à realidade;
3. No incidente declarativo destinado a comprovar o incumprimento da obrigação de facto negativo, o exequente não apresentou qualquer prova, nem fez qualquer prova dos factos alegados;
4. O exequente não fez qualquer prova do incumprimento da obrigação de abstenção dos executados, nem de quaisquer danos, por ele, sofridos;
5. Pelo que, está incorrectamente julgado o facto ínsito em 7. dos factos dados como provados, dada a ausência de prova sobre o mesmo, devendo ser dado como não provado;
6. O despacho recorrido viola o princípio do direito de defesa dos executados, pois, condena-os numa indemnização e numa sanção pecuniária compulsória sem lhes ter sido fixado um prazo para o cumprimento da sentença;
7. O preceituado nos artºs. 874º e 875º do CPC atribui à execução para prestação de facto negativo não represtinável, um procedimento distinto da execução para pagamento de quantia certa, exigindo uma fase declarativa preliminar para fixação de um prazo judicial, para o cumprimento da obrigação, mesmo que, não tivesse sido atribuído efeito suspensivo à sentença executada;
8. O exequente não fez qualquer prova sobre os danos sofridos, pois, se os danos de natureza patrimonial são susceptíveis de prova (reparação do portão e a sua colocação), sem necessidade de recurso ao juízo de equidade, já quanto aos danos de natureza não patrimonial não ficaram provados quais os direitos ou interesses desta natureza que foram ofendidos pelos executados, bem como, a sua gravidade;
9. A situação do caso concreto assim o impõe, pois, no caso “sub judice” estamos perante a extinção de uma servidão de passagem, por desnecessidade, face à confrontação do prédio dominante com a via pública, bastando ao dono deste, ora executados, segundo o título executivo, sentença transitada em julgado, realizar uma abertura, o que impõe, por si só, a concessão de um prazo para a realização desta obra, sem a qual o prédio dominante ficaria sem acesso, seguindo o entendimento da sentença recorrida;
10. A sentença recorrida não deu como provado que os recorrentes continuem a incumprir a sentença exequenda, posteriormente a 14.12.2012, porém, condenou-os ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso no cumprimento da sentença, a contar da decisão recorrida;
11. Se os executados já cumpriram a prestação continuam a ser penalizados pela sanção pecuniária compulsória agora fixada na sentença recorrida;

O exequente apresentou contra-alegações nas quais pugna pela manutenção do decidido.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II – É pelas conclusões do recurso que se refere e delimita o objecto do mesmo, ressalvadas aquelas questões que sejam do conhecimento oficioso – artigos 635º e 639º Código de Processo Civil -.

Impugnação da matéria de facto

Os recorrentes impugnam a matéria que foi dada como provada no ponto sob o n.º 7.
Alegam que a matéria que aí consta deve ser considerada como não provada, uma vez que não foi feita qualquer prova testemunhal ou documental do referido facto.

No ponto n.º 7 foi dado como provado o seguinte:

Pelo menos no período compreendido entre 13.04.2015 até 14.12.2015, os executados continuaram a passar no caminho da extinta servidão, quer a pé, quer com veículos

Os recorrentes alegam que do depoimento das testemunhas, nem de outros elementos constantes dos autos não resulta provada tal matéria.

Conforme resulta da fundamentação da decisão recorrida, o tribunal no que respeita a este ponto considerou o mesmo como provado porque os recorrentes na petição de embargos “Alegavam ainda, não existir outro acesso e que para existir outro acesso teria de ser construído a expensas do exequente – cf. artºs. 4º e 5º da petição inicial de embargos.

Ora, a confissão é irretractável – vide art. 465º do CPC.

Nessa medida, pese embora em tribunal tenham prestado depoimento as testemunhas João (…), amigo dos executados, Manuel (…), irmão e cunhado dos executados e Maria Elisabete (…), conhecida dos executados, que vieram confirmar que os executados, em virtude da sentença proferida nos autos principais, abriram outra entrada no seu prédio, retiraram umas “pastas de pedra”, para poderem entrar com a sua viatura para o seu prédio, e tenham aventado que isto aconteceu no mês de Maio de 2015, não podemos considerar esta parte dos seus depoimentos no que se reporta à referida data. Isto porque, foram os próprios executados que vieram dizer, em Dezembro de 2015, que ainda passavam no caminho da extinta servidão!

Ainda assim, os depoimentos das testemunhas, pese embora a parcialidade denotada, relativamente à data, foram prestados de forma clara e corroborados pelas fotografias de fls. 82-verso e seguintes.

Conforme resulta da petição de embargos nos seus artigos 4º e 5º da petição os recorrentes alegaram que “não existe outro acesso” (para o seu prédio) – n.º 4 - e “para existir outro acesso terá de ser construído a expensas do exequente” – n.º 5.

A confissão é o reconhecimento de um facto, é a declaração através da qual se reconhece a realidade de um facto desfavorável ao declarante e favorável à parte contrária.

Assim a alegação pelos recorrentes nos embargos dizendo que se deixarem de passar pelo caminho que onera o prédio do exequente, ficam sem caminho para aceder ao seu prédio (…) e que não existe outro acesso, e que para existir outro acesso terá de ser construído a expensas do exequente, não consubstancia a confissão do facto que consta provado no ponto sob o n.º 7 (que os executados continuaram a passar pelo menos no período entre 13.4.2015 e 14.12.2015). Em lado algum da petição de embargos ou nestes autos os executados confessaram tal facto.

Deste modo esse facto terá de ser eliminado da matéria de facto provada, sendo os seguintes os factos provados e não provados.

1. A presente acção executiva foi intentada no dia 03.09.2015;
2. Por sentença proferida em 13 de Abril de 2015, transitada em julgado, nos autos aos quais os presentes se encontram apensos, foi decidido: "declarar extinta, por desnecessidade a servidão de passagem que onera o prédio do réu (ora exequente) melhor identificado em D) da factualidade assente e beneficia o prédio dos autores (ora executados) melhor identificado em A) da factualidade assente, servidão esta com a extensão melhor enunciada em E) a G) da factualidade assente";
3. Por requerimento datado de 14 de Dezembro de 2015, no âmbito do apenso B, os executados deduziram embargos de executado alegando, em síntese, que a sentença que serve de título executivo ainda não transitou em julgado, o requerimento executivo é inepto, e se os executados deixarem de passar no caminho que onera o prédio do exequente, ficam sem forma de aceder ao seu prédio (esgrimindo argumentos que já tinham sido julgados em sede de acção declarativa);
4. Concluíram, peticionando a “absolvição dos executados do pedido e a declaração de que os embargantes são titulares de um direito de servidão e a declaração de constituição de uma servidão de passagem por usucapião e por destinação de pai de família”;
5. Nos referidos embargos não alegaram ter dado cumprimento à sentença proferida nos autos principais a 13.04.2015;
6. Por despacho datado de 07.01.2016, já transitado em julgado, os embargos de executado foram liminarmente indeferidos, por falta de fundamento legal;
7. eliminado
8. O exequente, em data não concretamente apurada, mas posterior a 14.12.2015, colocou um portão no início do caminho da extinta servidão, junto à estrada, que é o mesmo que já se encontrava noutra parte do caminho, há muitos anos, tendo sido apenas restaurado;
9. Após, fechou-o com correntes e cadeados, a fim de impedir os executados de passar no caminho.
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Factos Não Provados

a) Que o custo de um portão no caminho da extinta servidão e respectiva colocação, seja de € 5.100,00;
b) Que os executados passassem diariamente no caminho, pelo menos, dez vezes;
c) Que o exequente não tenha despendido mais de € 100,00 com o restauro do referido portão;
d) Que os executados tenham deixado de passar no caminho da extinta servidão em 2015, logo após ter sido proferida a sentença dada à execução como título executivo.
7 - Pelo menos no período compreendido entre 13.04.2015 até 14.12.2015, os executados continuaram a passar no caminho da extinta servidão, quer a pé, quer com veículos;
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Insurgem-se os recorrentes no que respeita a condenação pelos danos não patrimoniais e bem assim do pagamento do custo do portão.

Conforme resulta da sentença dada à execução a mesma decidiu o seguinte : “declarar extinta a servidão de passagem que onera o prédio do réu ( exequente) e que beneficia o prédio dos autores (executados).

Dispõe o artigo 876º do Código de Processo Civil que: 1. quando a obrigação do devedor consista em não praticar algum facto, o credor pode requerer, no caso de violação que esta seja verificada por meio de perícia e que o juiz ordene:

a) A demolição da obra que eventualmente tenha sido feita;
b) A indemnização do exequente pelo prejuízo sofrido;
c) O pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória, em que o devedor tenha sido já condenado ou fixação o credor pretenda obter na execução.

2 — O executado é citado para, no prazo de 20 dias, deduzir oposição à execução, mediante embargos, nos termos dos artigos 729.º e seguintes; a oposição ao pedido de demolição pode fundar-se no facto de esta representar para o executado prejuízo consideravelmente superior ao sofrido pelo exequente.
3 — Concluindo pela existência da violação, o perito deve indicar logo a importância provável das despesas que importa a demolição, se esta tiver sido requerida.
4 — A oposição fundada em que a demolição causará ao executado prejuízo consideravelmente superior ao que a obra causou ao exequente suspende a execução, em seguida à perícia, mesmo que o executado não preste caução.

A tramitação subsequente vem prevista no artigo 877.º do Código de Processo Civil, nos termos que se transcrevem:

1 — Se o juiz reconhecer a falta de cumprimento da obrigação, ordena a demolição da obra à custa do executado e a indemnização do exequente, ou fixa apenas o montante desta última, quando não haja lugar à demolição.
2 — Seguem-se depois, com as necessárias adaptações, os termos prescritos nos artigos 869.º a 873.º.


Das normas que se transcreveram resulta imperativamente a existência de dois momentos no processo executivo de prestação de facto negativo: a verificação pericial; e o reconhecimento (ou não) pelo juiz da falta de cumprimento da obrigação (de non facere) do executado.

No entanto, e como no caso não há obra feita, a prova da actuação do executado poderá efectuar-se por outro meio de prova

Como refere Lebre de Freitas «se não houver obra feita e a violação não tiver deixado quaisquer vestígios materiais, a prova do acto ilícito do executado terá que ser feita por outros meios, inclusive pelo depoimento das testemunhas” [ A Acção Executiva depois da Reforma da Reforma, 5.ª edição, Coimbra Editora, pág. 3948].

O título executivo é um pressuposto da acção executiva na medida em que confere ao direito à prestação invocada um grau de certeza e exigibilidade que a lei reputa de suficientes para a admissibilidade de tal acção.

Na verdade “…a relevância especial dos títulos executivos que resulta da lei deriva da segurança, tida por suficiente, da existência do direito substantivo cuja reparação se pretende efectivar por via da acção executiva. O fundamento substantivo da acção executiva… é a própria obrigação exequenda, sendo que o título executivo é o seu instrumento documental legal de demonstração, ou seja, constitui a condição daquela acção e a prova legal da existência do direito de crédito nas suas vertentes fáctico-jurídicas” - Ac. do STJ de 18.10.2007, dgsi.pt,

Conforme consta dos autos apensos com base na sentença foi instaurada execução na qual se peticiona indemnização, alegando-se que os executados tem vindo a violar o decidido (nos termos do disposto no artigo 877º) equivalente ao custo de um portão no caminho e uma sanção pecuniária compulsória de 250 euros por cada dia a partir da citação, uma vez que não havia qualquer obra a demolir.

Conforme decorre da matéria de facto provada na sentença dada à execução os autores foram condenados (por força do pedido reconvencional) a ver declarado que a servidão que onerava o prédio do réu se extinguiu.

Como já se referiu, o exequente pode requerer que a violação da obrigação seja verificada por meio de perícia e que o tribunal ordene a demolição da obra que porventura tenha sido feita, a indemnização do exequente pelo prejuízo sofrido e o pagamento da quantia eventualmente devida a título de sanção pecuniária compulsória, conforme ao caso couber (artigo 876, nº 1 do CPC).

Se o juiz reconhecer a falta de cumprimento da obrigação, ordenará a demolição da obra à custa do executado e a indemnização do exequente, ou fixará apenas o montante desta última, quando não haja lugar à demolição (artº 877º, nº 1 do CPC).

Se o exequente pretender a indemnização do dano sofrido, liquidará o seu valor e a execução será convertida em execução para pagamento de quantia certa, procedendo-se à penhora dos bens necessários para o pagamento da quantia apurada (artigos 877 n.º 2 e 867º, n.º 2 do CPC), seguindo-se os demais termos de execução para pagamento da quantia certa.

No caso dos autos não se apurou que os executados continuaram a passar pelo caminho pois o exequente não fez qualquer prova desse facto, assim como não se apurou o montante de prejuízo sofrido, nem o montante que o exequente gastou com a colocação do portão, assim como não se verificam os pressupostos para que seja fixada qualquer indemnização a título de danos não patrimoniais.

Assim sendo, também não se tendo provado que os executados violaram o disposto na sentença também não pode ser atribuída qualquer sanção compulsória.

Nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso.

Como refere Calvão da Silva, in Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, edição de 1995, pág. 407, “ Através da sanção pecuniária compulsória, na verdade, não se executa a obrigação principal, mas somente se constrange o devedor a obedecer a essa condenação, determinando-o a realizar o cumprimento devido e no qual foi condenado” e a inclusão da mesma como medida coerciva de cumprimento, visou, fundamentalmente, dois aspectos: por um lado, a importância que o cumprimento das obrigações assume, em particular para o credor; por outro lado, o respeito devido às decisões dos tribunais, enquanto órgãos de soberania e, por isso, é muito similar "à presunção adoptada pelo legislador em matéria de juros, inclusive moratórios, das obrigações pecuniárias" – vide Pinto Monteiro, in Cláusula Penal e Indemnização, pág. 112.

Como também defende Menezes Cordeiro in Direito das Obrigações, AAFDL, 1980, vol. I, págs. 336 a 338. o instituto em referência apenas está previsto como instrumento de coacção ao cumprimento de obrigações de prestação de facto, de facere, de realização (ou omissão) de uma actividade, e não de mera entrega de coisa ou de dare.

Sendo a prestação dos executados (a de não passarem pelo caminho) uma prestação duradoura, de natureza continuada, a sua violação não é instantânea, pois não se esgota num momento, podendo permanecer ou repetir-se no futuro. É precisamente nestes casos que se justifica o estabelecimento de uma sanção pecuniária compulsória, como meio de prevenir a continuação ou renovação do incumprimento, provocando a obediência do devedor à condenação inibitória e o respeito pela devida prestação originária – v. Calvão da Silva, BMJ 350, págs. 104/105 e Ac. STJ de 09.05.2002, em www.dgsi.pt.

Por constituir um meio de coerção ao cumprimento e ao respeito da condenação judicial, a sanção pecuniária compulsória não pode ter efeitos retroactivos, isto é, não pode ser fixada para uma data anterior à própria decisão que a ordena. Tal equivaleria a fazê-la retroagir, o que estaria em contradição com o carácter coercitivo preventivo da medida, destinada a provocar o futuro cumprimento da obrigação e o respeito, pelo devedor, da condenação judicial – vide, neste sentido Calvão da Silva, in ob. cit., pág. 86.

Assim sendo, não se tendo provado que os executados tivessem passado no caminho, nem que continuem a passar, e tendo sido dado como provado que o exequente no início do caminho da servidão (extinta) junto à estrada colocou um portão fechado a cadeado e com correntes a fim de impedir os executados de passarem no caminho, não estão constituídos os pressupostos para ser aplicada uma sanção compulsória.

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III- Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar a apelação procedente, revogando a decisão recorrida.
Custas pelos apelados.
Guimarães,21 de Fevereiro de 2019.